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Rio de Janeiro
2017
ADAELSON CAMPELO MEDEIROS
Rio de Janeiro
2017
M488 Medeiros, Adaelson Campelo.
Índice de qualidade das águas (IQA) em áreas de exposição a
poluentes domésticos e industriais em abaetetuba e barcarena, Pará-Brasil /
Adaelson Campelo Medeiros. – Rio de Janeiro: UFRJ / Instituto de
Estudos em Saúde Coletiva, 2017.
97 f.:il.; 30 cm.
Referências: f. 87-97.
CDD 363.7394
ADAELSON CAMPELO MEDEIROS
Aprovado em:___/___/_____.
Banca Examinadora
A Deus, por ser o centro de minha vida e o caminho para a paz interior.
Ao Instituto Evandro Chagas (IEC), pela oportunidade de aprendizado ao longo dos
anos e grande contribuição para a realização deste estudo.
À Dra Elisabeth Conceição de Oliveira Santos, pela oportunidade profissional
concedida há anos atrás.
Ao orientador Prof. Dr. Raphael Mendonça Guimarães pela amizade, instruções,
confiança e paciência no desenrolar deste estudo.
Ao amigo Marcelo de Oliveira Lima pela oportunidade de desenvolvimento deste
trabalho em áreas de monitoramento contempladas em projeto sob sua coordenação e por toda
ajuda fornecida.
Aos amigos da Seção de Meio Ambiente (SAMAM), em especial, aos amigos
Antônio Marcos, Bruno, Kelson, Kleber e Rosivaldo.
À Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coordenação, Docentes e Secretaria do
Curso de Pós-Graduação em Saúde Coletiva/IESC) pelo apoio acadêmico e ensinamentos em
cada disciplina ministrada.
Aos integrantes da banca examinadora pela participação e contribuições na avaliação
desta defesa de tese que serão importantes para melhoria deste estudo.
Ao amigo Dr. Ricardo Jorge Amorim de Deus e toda equipe do Laboratório de
Pesquisa em Meio Ambiente e Conservação (LPMAC) por todo apoio concedido na
elaboração dos mapas referentes à localização das áreas de estudo.
À minha esposa Iris Danielly pelo companheirismo, apoio familiar e dedicação
incondicional nos cuidados com nossa amada filha Alice.
Aos meus pais pelos seus bons exemplos de vida e meus irmãos pela boa
convivência e apoio a cada conquista ou dificuldade.
A todos em geral, familiares e amigos, que através de orações e incentivos me deram
forças para enfrentar as grandes dificuldades da vida.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Curvas médias de variação de qualidade para temperatura (a), pH (b), OD (c),
DBO (d), coliformes termotolerantes (e), nitrogênio total (f), fósforo total (g), resíduo
total (h) e turbidez (i) ................................................................................................................ 30
Figura 2: Intensidade pluviométrica no município de Barcarena/PA ....................................... 34
Figura 3: Localização da Comunidade Maranhão e Vila do Conde ......................................... 36
Figura 4: Área de estudo e respectivos pontos de amostragem ................................................ 38
Figura 5: Fluxograma do resumo das etapas e atividades desenvolvidas no estudo ................ 39
Figura 6: Trabalho de campo nos rios monitorados. a) coleta de água para análise
físico-química; b) coleta de água para exame microbiológico; c e d) determinação “in
loco” de variáveis físico-químicas; e) registro de informações no momento da coleta e f)
acondicionamento e preservação de amostras em caixa isotérmica ......................................... 41
Figura 7: Análises físico-químicas (A, B e C) e exames microbiológicos (D, E e F) .............. 43
LISTA DE TABELAS
λ Comprimento de onda
º Graus
ºC Graus Celsius
Grau de Liberdade
I, II, III... Incisos
+ Adição
− Subtração
± Mais ou menos
> Maior
≥ Maior ou igual
< Menor
≤ Menor ou igual
µ Micro
’ Minutos
α Nível de significância
‰ Partes por mil
% Percentagem ou porcentagem
” Segundos
S Siemens
® Marca registrada
p p-valor ou nível descritivo de significância
* Multiplicação
∆T Variação de temperatura
RESUMO
Foi utilizado neste estudo, o cálculo do Índice de Qualidade das Águas (IQA) para avaliação da
qualidade das águas subterrâneas consumidas por duas comunidades ribeirinhas denominadas
de Comunidade Maranhão e Vila do Conde, ambas localizadas respectivamente nos municípios
de Abaetetuba e Barcarena no Estado do Pará. O IQA também foi utilizado para avaliar a
qualidade das águas do rio Murucupi em Barcarena. Foram realizadas quatro campanhas de
amostragem trimestrais no ano de 2012 nas duas comunidades e as variáveis utilizadas no
cálculo do IQA das águas subterrâneas foram: pH, sólidos totais, cloreto, fluoreto, dureza e
N-Nitrato. As águas consumidas na Comunidade Maranhão, onde não há contaminação por
poluentes industriais, apresentaram amostras adequadas para o consumo nas águas
subterrâneas, com IQAs em condição aceitável (5%), boa (80%) e ótima (15%) no período
chuvoso e boa (55%) e ótima (45%) no seco. As amostras de água de domicílio da Comunidade
Maranhão seguiram o mesmo padrão de qualidade das águas subterrâneas, com IQAs aceitável
(10%), bom (65%) e ótimo (25%) no período chuvoso e bom (75%) e ótimo (25%) no seco,
percebendo-se uma melhora no período seco. As águas de Vila do Conde, local próximo à
atividade industrial, estiveram em ambos os períodos sazonais com valores de IQA inaceitável
para consumo humano na maioria das amostras, pelo menos em 64,28% (águas subterrâneas),
65,39% (águas de domicílio) e 88,46% (águas de rede de abastecimento) no período chuvoso e
de 78,57%, 65,38% e 92,31% respectivamente no seco, evidenciando-se pior qualidade no
período seco e nas águas da rede de abastecimento. As variáveis que mais influenciaram
negativamente nos resultados dos IQAs nas duas comunidades foram o pH, com a maioria dos
valores em desacordo com a legislação brasileira para águas de consumo humano (6,0-9,5) e o
N-Nitrato, com variações de 10 a 25 vezes acima da referida legislação (10 mg.L-1). Esses
resultados indicaram maior interferência antrópica no entorno da Vila do Conde em Barcarena,
necessitando-se de avaliações clínicas por profissionais especializados sobre o estado de saúde
desta população, pois a mesma consome essas águas há décadas. No rio Murucupi, foram
realizadas quatro campanhas de amostragem trimestriais nos anos de 2009 e de 2012, com a
utilização das variáveis temperatura, pH, sólidos totais, oxigênio dissolvido, DBO, nitrato total,
fosfato total, turbidez e coliformes termotolerantes no cálculo do IQA. Os dados de IQA nas
amostras, em média, variaram de médio a bom, com uma amplitude de 13,50 (mínimo=59,13,
máximo=72,63). A análise bivariada permitiu dizer que houve uma diferença estatisticamente
significativa (p-valor≤0,005) sobre os valores médios dos IQAs para as categorias estação de
ano (p-valor<0,001; chuvoso=61,29 e seco=69,42), regime de marés (p-valor=0,001;
vazante=62,10 e enchente=68,60), pontos de amostragem (p-valor<0,001; P01=59,13;
P02=61,13; P03=62,38; P04=66,44; P05=70,44 e P06=72,63) e o ano de coleta (p-valor=0,004;
2009=68,15 e 2012=62,56). Na Associação por regressão linear múltipla foi observada uma
redução de qualidade em -5,583 pontos nas águas do rio Murucupi comparando-se os anos de
2009 e 2012, comparando-se as estações do ano e o regime de marés, a qualidade das águas
melhoraram em 8,125 e 6,500 pontos respectivamente, no período seco e na enchente. Ficou
evidente que há uma tendência entre os pontos de amostragem a medida que se aproxima da foz
deste rio, notando-se uma melhora na qualidade das águas em 13,500 pontos entre P01 e P06.
Mesmo após três anos (2009 a 2012), os resultados dos IQAs no rio Murucupi mostraram que
os acidentes ambientais e a poluição por esgotos domésticos e industriais têm prejudicado
gradativamente a qualidade dessas águas e a saúde ambiental no entorno dessa área portuária.
The Water Quality Index (WQI) was used to evaluate the quality of the groundwater consumed
by two riverside communities called Maranhão Community and Vila do Conde, located in the
State of Pará in the municipalities of Abaetetuba and Barcarena respectively. The WQI was also
used to evaluate the water quality of the Murucupi River in Barcarena. Four quarterly sampling
campaigns were carried out in 2012 in the two communities and the variables used in the
calculation of the WQI of the groundwater included the pH, total solids, chloride, fluoride,
hardness, and nitrate-N. The samples of the groundwater consumed in the Maranhão
Community, an area that is not contaminated by industrial pollutants, tested as suitable for
consumption and had WQIs rated as acceptable (5%), good (80%), and optimal (15%) in the
rainy season and good (55%) and optimal (45%) in the dry season. Samples of household water
from the Maranhão Community followed the same standard of groundwater quality, with WQIs
rated as acceptable (10%), good (65%), and optimal (25%) in the rainy season and good (75%)
and optimal (25%) in the dry season, with an improvement in the dry period. The water of Vila
do Conde, an area located near industrial activity, was unacceptable for human consumption
with low WQI values in both seasons and in the majority of the samples. The WQI values were
at least 64.28% (groundwater), 65.39% (household water), and 88.46% (water supply network)
in the rainy season and 78.57%, 65.38%, and 92.31% respectively in the dry season, showing a
lower quality in the dry period and in the water supply network. The variables that had the
largest negative influence on the WQI results in the two communities included the pH, with the
majority of the values in disagreement with the Brazilian legislation for water for human
consumption (6.0-9.5), and Nitrate-N, with variations of 10 to 25 times above the
recommended value (10 mg.L-1). These results indicated a considerable anthropogenic impact
in the surrounding area of Vila do Conde in Barcarena, requiring clinical evaluations by
specialized professionals on the health status of this population, which has consumed this water
for decades. In the Murucupi river, four quarterly sampling campaigns were carried out in 2009
and 2012, evaluating temperature, pH, total solids, dissolved oxygen, BOD, total nitrate, total
phosphate, turbidity, and thermotolerant coliforms. The WQI sample data, on average, ranged
from medium to good, with an amplitude of 13.5 (minimum=59.13, maximum=72.63). A
bivariate analysis indicated statistically significant differences (p-value≤0.005) for the mean
values of the WQIs for the season (p-value <0.001, rainy=61.29 and dry=69.42), the tide
conditions (p-value=0.001, ebb tide=62.10 and flood tide=68.60), the sampling points
(p-value<0.001, P01=59.13, P02=61.13, P03=62.38, P04=66.44, P05=70.44, and P06=72.63),
and the year (p-value=0.004, 2009=68.15 and 2012 = 62.56). Using a multiple linear regression
analysis, a quality reduction was observed in -5.583 points in the waters of the Murucupi River
when comparing the data for 2009 and 2012; a comparison of the seasons and the tidal regime
showed that the water quality improved by 8.1 and 6.5 points in the dry season and for the flood
tide, respectively. There was a trend of improving water quality with closer proximity to the
mouth of the river and this improvement reached 13.5 points between P01 and P06. The results
of the WQI analysis in the Murucupi River have shown that environmental accidents and
pollution from domestic and industrial sewage have gradually decreased the water quality and
environmental health around the port area during only three years (2009 to 2012).
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 14
2 OBJETIVOS ........................................................................................................................ 18
2.1 OBJETIVO GERAL ........................................................................................................... 18
2.1.1 Objetivos Específicos ..................................................................................................... 18
3 REVISÃO DA LITERATURA ........................................................................................... 19
3.1 QUALIDADE DAS ÁGUAS ............................................................................................. 19
3.2 QUALIDADE DAS ÁGUAS DE CONSUMO HUMANO .............................................. 21
3.3 VIGIÁGUA ........................................................................................................................ 23
3.4 ÍNDICE DE QUALIDADE DAS ÁGUAS ........................................................................ 26
3.5 CARACTERÍSTICAS DAS ÁREAS DE ESTUDO ......................................................... 32
3.5.1 Características da área de estudo em Abaetetuba/PA ................................................ 32
3.5.2 Características da área de estudo em Barcarena/PA ................................................. 33
4 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................. 35
4.1 DESCRIÇÃO DAS ÁREAS DE ESTUDO ....................................................................... 35
4.1.1 Comunidades Estudadas e Águas Subterrâneas ........................................................ 35
4.1.2 Rio Murucupi ................................................................................................................. 37
4.2 PROCEDIMENTOS DE COLETA .................................................................................... 39
4.3 VARIÁVEIS ANALISADAS ............................................................................................. 41
4.3.1 Análises Físico-Químicas e Exames microbiológicos .................................................. 41
4.4 CÁLCULO DO IQA .......................................................................................................... 43
4.5 ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................................... 46
4.6 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS ............................................................................................ 47
5 RESULTADOS ..................................................................................................................... 48
5.1 ARTIGO 1........................................................................................................................... 48
5.2 ARTIGO 2........................................................................................................................... 69
6 CONCLUSÕES.................................................................................................................... 85
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 87
14
1 INTRODUÇÃO
Á água é um recurso natural essencial para a sobrevivência dos seres terrestres, sua
distribuição ocorre de forma desigual gerando escassez em muitas partes do mundo. A
disponibilidade de água para consumo humano se dá a partir de várias possibilidades como
captação em lagos, rios, aquíferos subterrâneos, etc. (TUCCI et al., 2001; GIATTI; CUTOLO,
2012).
A oferta de água em quantidade e qualidade é um dos grandes percalços enfrentados
na atualidade pela população mundial e este problema teve início com o crescimento
demográfico e urbanização acelerada ocorridos a partir da segunda metade do século XX, essa
mudança global intensificou o consumo dos recursos hídricos, hoje por exemplo, esses níveis
de consumo já chegam a mais da metade da água superficial disponível, com estimativa de
70 % em 2025 (SHERBININ, 1997; VENDRAMEL, 2002).
O Brasil recebe intensa descarga pluviométrica que abrange mais de 90% do seu
território com variações em torno de 1.000 a 3.000 mm/ano. Apesar de ser considerado um
dos países mais ricos em água doce, algumas cidades do país enfrentam crises de
abastecimento, não escapando nem as cidades da região Norte do país, que concentram 80 %
das descargas de águas dos rios nacionais, dentre elas, destacam-se Manaus, Belém e
Santarém que apresentam abundância em recursos hídricos, contudo, os problemas de
saneamento básico pouco diferenciam de outras cidades do país com reservas hídricas
inferiores. De acordo com pesquisas do censo IBGE em 2000, dos 170 milhões de habitantes
no Brasil, cerca de 138 milhões residiam em cidades, com mais de 80 % da população
brasileira ocupando áreas urbanas, situação que deve ter se intensificado nos dias de hoje.
Neste período, 64 % das empresas brasileiras responsáveis por serviços de saneamento não
coletavam os esgotos domésticos, 100 milhões de brasileiros não tinham seus esgotos tratados
e a população mais pobre, cerca de 11 milhões de pessoas não tinham água potável para beber.
Situação que deveria exigir uma melhor atenção por parte das autoridades competentes do
país quanto á tomada de medidas mitigadoras sobre a falta de serviços de saneamento
adequados, serviços urbanos de fundamental importância para a saúde da população e que
estão diretamente associados à qualidade das águas no entorno das grandes cidades no mundo.
Como é sabido, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a cada dólar
investido em saneamento básico em uma cidade, representa a redução de cerca de quatro
15
2 OBJETIVOS
3 REVISÃO DA LITERATURA
consumido pela matéria orgânica presente dificultando o controle de poluição das águas, visto
que, o oxigênio é o parâmetro que permite a avaliação de condições aeróbicas de cursos dágua
que poderão ser utilizados para consumo da população (JORDÃO et al., 2007).
As águas dos rios podem ser classificadas em três categorias, águas brancas, pretas e
claras. As brancas possuem altas concentrações de sólidos em suspensão e sais dissolvidos,
seu pH está em torno de 7,0; as pretas são ricas em ácidos húmicos e fúlvicos dissolvidos
e seu pH está próximo de 4,0 ; as águas claras são límpidas e apresentam características de
transição entre as duas já mencionadas com pH variando entre 4,5 e 7,0 (SIOLI; KLINGE,
1962; QUEIRÓZ et al., 2009).
Segundo Silva et al. (2009) a maioria dos poluentes atingem os rios e lagos através
do escoamento superficial oriundos de atividades agrícolas e urbano-industriais. A inserção de
efluentes domésticos e industriais não tratados ou tratados inadequadamente nos cursos
hídricos afeta tanto a vida aquática quanto a saúde da população que se utiliza da mesma para
vários fins, estas ações também proporcionam o aumento na quantidade de nutrientes como N
e P nos cursos de água que acarretam o aparecimento de algas tóxicas prejudicando a vida dos
seres aquáticos (JORDÃO et al., 2007). O Conselho Nacional do Meio Ambiente através da
resolução nº 357 estabelece alguns valores máximos para determinados parâmetros físicos,
químicos e biológicos que são necessários para que os cursos hídricos ofereçam água de boa
qualidade proporcionando saúde e bem-estar da população (BATALHA et al., 2014).
Uma das maiores dificuldades encontradas nos países em desenvolvimento é como
controlar a poluição das águas dos rios, lagos e bacias hidrográficas haja vista a imensa
quantidade de despejos domésticos e industriais inseridos por fontes difusas nestes ambientes
aquáticos diminuindo a sua qualidade (TUCCI, 2004; VARIS et al., 2006; CUNHA et al.,
2011).
De acordo com Azevedo (2006) as águas subterrâneas apresentam algumas
vantagens em relação ao seu uso como fonte de abastecimento humano pelo fato de ser
encontrada em abundancia na natureza e de ótima qualidade, sua captação pode ser prática e
econômica devido dispensar tratamentos com a utilização de produtos químicos, exceto a
desinfecção. No entanto, apesar das vantagens relacionadas ao uso das águas subterrâneas, na
região amazônica o investimento em pesquisas para verificar as melhores maneiras de
captação destas águas para consumo da população ainda é mínimo, consequentemente várias
tentativas de utilização desses sistemas tem fracassado devido à má qualidade das águas dos
lençóis captados ou à técnicas ineficientes usadas na construção dos poços.
21
2005).
No período de expansão comercial no mundo, formaram-se pequenos povoados em
cidades cercadas por mosteiros e castelos de senhores feudais nas margens de rios e orlas
marítimas que eram utilizados para navegação e captação de água. Apesar desses povoados
utilizarem essas águas para abastecimento, o consumo diário era em pequena escala com
menos de um litro por habitante e reduzidas possibilidades de banho (SILVA, 1998;
PITERMAN; GRECO, 2005). Essas condições proporcionaram agravantes para a saúde
destas populações, marcando na história duas epidemias conhecidas como peste de Justiniano
em 543 e Peste Negra em 1348 (ROSEN, 1994; PITERMAN; GRECO, 2005).
As enfermidades eram frequentes neste período com o desconhecimento total de suas
causas, porém, em lugares como claustros de igrejas onde havia água encanada, latrinas
apropriadas e sistema de aquecimento adequado, a higiene e a saúde eram preservadas. No
geral, a maioria da população vivia amontoada em cortiços confinada com animais e
possuiam hábitos de higiene desfavoráveis para ambientes saudáveis como, por exemplo, o
acúmulo de lixo na porta das casas e outros comportamentos inadequados. Com o passar do
tempo, o abastecimento de água foi disponibilizado para a maioria da população através da
construção de cisternas, poços cavados e fontes naturais. O primeiro poço artesiano foi
construído na França apenas em 1126, marcando o início do desenvolvimento de novas
tecnologias nos sistemas de abastecimento de água (RESENDE; HELLER, 2002;
PITERMAN; GRECO, 2005).
A qualidade da água se tornou interessante para a saúde pública no final do século
IXX e início do século XX, porém, neste período, a qualidade da água era associada apenas a
aspectos estéticos e sensoriais como cor, gosto e odor. Alguns métodos para melhorar esses
aspectos na água eram utilizados em 4.000 a.C conforme documentos escritos em sânscrito,
por exemplo, na Grécia antiga utilizavam-se as técnicas de filtração, exposição ao sol e a
fervura para melhorar a qualidade da água. Os gregos faziam relações empíricas sobre o
aparecimento de doenças de acordo com a qualidade das águas, pois as mesmas apresentavam
elevada turbidez, fato que foi comprovado por cientistas na métade do século IXX, onde os
mesmos descobriram que a turbidez não estava associada somente a aspectos estéticos, mas o
material particulado em água poderia conter organismos patogênicos e material fecal. A
relação água contaminada e doenças foi representativa a partir do trabalho realizado por John
Snow em 1885, que provou que um surto de cólera em Londres estava associado a
contaminação de poços de abastecimento público por esgotos domésticos. Em 1880, Louis
23
Paster demonstrou pela teoria dos germes que microrganismos poderiam contaminar a água e
transmitir doenças (USEPA, 1999; FREITAS; DE FREITAS, 2005).
Como importante veículo de enfermidades dirréicas e outras, a água de consumo
humano deve ser avaliada criteriosamente, principalmente sob o aspecto microbiológico. Os
agentes microbiológicos patogênicos responsáveis por essas enfermidades são de origem
entérica de animais e humanos e as principais doenças de veiculação hídrica são causadas
através da via fecal-oral, isto é, por meio da ingestão de águas ou alimentos poluídos com
fezes (ISAAC-MARQUEZ et al., 1994, GRABOW, 1996; AMARAL et al., 2003).
A qualidade da água utilizada para consuno humano depende de diversos fatores
como: a qualidade da água bruta, estado de conservação dos equipamentos e instalações dos
sistemas de abastecimento coletivos ou individuais e o rigor nos processos operacionais
realizados nestes sistemas (CARMO et al., 2008).
As interferências na qualidade da água de consumo humano podem ocorrer desde a
captação no manancial até os pontos de abastecimento no interior das residências. Esses
perigos e riscos que circundam as águas de abastecimento público estão realcionados à
introdução de agentes externos que contém materiais danosos à saúde da população
abastecida proporcionando diversas situações negativas como: óbitos, doenças, desordens, etc.
Nos setores de abastecimento público de água, os perigos são constantes e de naturezas e
origens diversas que podem expor uma população à riscos causados por microrganismos
patogênicos, substâncias químicas ou materiais radioativos, portanto, essas situações de
exposição requerem cuidados redobrados e melhorias sobre as práticas convencionais de
controle de qualidade das águas utilizadas para consumo humano (BEVILACQUA et al.,
2002; CARMO et al., 2008).
3.3 VIGIÁGUA
(final e início dos anos 80 e 90 respectivamente), o Brasil iniciou uma forte atuação em
vigilância em saúde a partir do movimento sanitário, com um amplo conceito em saúde
pública consolidado na Constituição Federal de 1988 e na lei 8.080 de 1990. Ambas
contribuíram para a intensificação sobre discussões no sentido de se reorganizar o sistema de
vigilância epidemiológica na perspectiva do Sistema Único de Saúde-SUS. O objetivo
principal seria a tomada de ações baseadas em vigilância em saúde para que se identificasse
alguns fatores como: condições e estilo de vida da população e determinantes socioambientais
dos problemas de saúde. Essas ações serviriam de base para a articulação de um conjunto de
políticas econômicas e sociais que atuariam na intervenção sobre as causas e riscos de
doenças e outros agravos (IESUS, 1993; FREITAS; DE FREITAS, 2005).
Novas discussões surgiram no final dos anos 90 com preocupações voltadas para o
âmbito ambiental, após diversas situações de danos ambientais iniciados a partir da
intensificação dos processos produtivos realizados por alguns países industrializados. Estes
países apresentaram propostas para a criação de setores que atuariam de forma
descentralizada, porém, integrada no sentido de intervir sobre os problemas ocasionados sobre
a saúde da população, dentre eles, citam-se a vigilância epidemiológica que atuaria como
vigilância de efeitos sobre a saúde como agravos de doenças, a vigilância sanitária que atuaria
como vigilância sobre perigos causados por agentes químicos, físicos e biológicos que
viessem causar doenças e a vigilância ambiental que se encarregaria da vigilância de
exposição de indivíduos ou grupos populacionais a um agente ambiental ou seus efeitos
clinicamente ainda não aparentes (THACKER et al., 1996; FREITAS; DE FREITAS, 2005).
Influenciado pelas propostas dos países industrializados na época e, através do
financiamento do Banco Mundial, o Brasil iniciou um projeto de estruturação do Sistema
Nacional de Vigilância em Saúde (VIGISUS) e a estruturação e institucionalização da
vigilância ambiental no âmbito do Ministério da Saúde. Em maio de 2000, foi publicado o
decreto nº 3.450 que estabeleceu a gestão do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde
(SINVAS) dentro do Centro Nacional de Epidemiologia (CENEPI), porém, em 2005, após
publicação da instrução normativa SVS nº 1 em Diário ficial, o SINVAS foi redefinido para
Subsistema de Vigilância em Saúde Ambiental (SNVSA), o qual dispõe de um setor de
vigilância da qualidade da água para consumo humano que tem como finalidade o
mapeamento de áreas de risco em determinado território para avaliação das características de
potabilidade, com objetivo de assegurar a qualidade da água e evitar que as pessoas adoeçam
pela presença de patógenos e contaminantes presentes nos corpos hídricos utilizados para
25
sendo possível listar outras variáveis não incluídas neste questionário. As variáveis
selecionadas com o item incluir deveriam receber um peso variando de 1 a 5. Um sumário
desse questionário foi enviado aos participantes, junto com o segundo questionário, para que
comparassem as respostas dos grupos e as reavaliassem, sendo também solicitada uma lista
das 15 variáveis mais importantes. Finalmente, a partir das informações geradas nas respostas
dos questionários, definiu-se uma lista composta por nove (09) variáveis e respectivos pesos
integrantes do IQA. Um terceiro questionário serviu para que o painelista desenhasse as
curvas de acordo com o seu julgamento, com a variação da qualidade da água produzida pelas
várias possíveis medidas das variáveis. Foram geradas nove curvas para o cálculo do IQA
constituídas das curvas médias obtidas das respostas de todos os especialistas (LIBÂNIO,
2008).
Com objetivo de gerar informações importantes para abastecimento público, a
Companhia Ambiental do Estado de São Paulo-CETESB adaptou e desenvolveu o IQA
tomando como base o estudo realizado pela NSF em 1970, incorporando nove (09) variáveis
consideradas relevantes para a avaliação da qualidade das águas. O início ocorreu em 1974
com a operação da Rede de Monitoramento da Qualidade das Águas Interiores (rios e
reservatórios), que possibilitaram o conhecimento adequado das condições principais nos
cursos d’água do Estado de São Paulo (CETESB, 2017). O uso do IQA no Brasil se consolidou
na década de 80, na maioria das vezes adotando-se os IQAs desenvolvidos em outros países,
destacando-se a utilização da técnica de análise fatorial no Rio Grande do Sul em 1989 e a criação
do Índice de Proteção das Comunidades Aquáticas pela CETESB em 1995 (MATTOS; VON
SPERLING, 1999). Com vistas ao aperfeiçoamento da avaliação ambiental, a CETESB iniciou
a partir de 1998, o desenvolvimento de outros índices de qualidade da água como: Índice de
Qualidade das Águas Brutas para Fins de Abastecimento Público (IAP); Índice do Estado
Trófico (IET); Índices de Qualidade das Águas para Proteção da Vida Aquática e de
Comunidades Aquáticas (IVA); Índice da Comunidade Fitoplanctônica (ICF); Índice da
Comunidade Bentônica (ICB) e Índice de Balneabilidade (IB) (CETESB, 2017).
O cálculo do IQA segundo a CETESB é realizado pelo produtório ponderado dos
valores das notas de qualidade (qi) de cada variável conforme as curvas de qualidade das
mesmas, elevados aos seus respectivos pesos (wi). As variáveis utilizadas no cálculo são:
Temperatura, pH, percentual de saturação de oxigênio dissolvido, demanda bioquímica de
oxigênio (5 dias, 20ºC), coliformes termotolerantes, nitrogênio total, fósforo total, resíduo
total e Turbidez.
29
i 1
i 1
(Equação 02)
As curvas médias de variação de qualidade em função das concentrações ou medidas
de cada variável, assim como, os pesos (wi) referentes a importância para a conformação
global de qualidade de cada variável podem ser observadas na Figura 1. Portanto, os valores
de qi podem ser obtidos em função dos resultados analíticos determinados de cada variável
conforme as suas curvas médias de variação.
30
Figura 1: Curvas médias de variação de qualidade para temperatura (a), pH (b), OD (c), DBO
(d), coliformes termotolerantes (e), nitrogênio total (f), fósforo total (g), resíduo total (h) e
turbidez (i)
ilhas, tais como: Urubuéua, Sirituba, Capim, Compopema, entre outras. Importante, também,
é o rio Abaeté que banha a sede do Município e deságua na baía do Capim. Outros rios que
deságuam na baía do Capim são: Guajará de Beja, Arapiranga de Beja e o Arienga, este
último fazendo limite com Barcarena, a nordeste. Destaca-se, ainda, o rio Itanambuca, que
serve de limite natural, a sudoeste, com o município de Iguarapé-Miri.
O clima no município de Abaetetuba é do tipo Am, segundo a classificação de
Köppen, que corresponde à categoria de super úmido. Apresenta altas temperaturas,
inexpressiva amplitude térmica, e precipitações ambulantes.
Fonte: Elaborado a partir de dados mensais fornecidos pelo Instituto de Metereologia do Brasil (INMET), 2015.
35
4 MATERIAL E MÉTODOS
Fonte: Trindade1.
Fonte: Deus2.
2
O mapa elaborado por Ricardo de Deus (Currículo Lattes http://lattes.cnpq.br/2786835009160625) a partir de
coordenadas geográficas registradas em trabalho de campo pelo Instituto Evandro Chagas, Ananindeua-PA.
39
2ª ETAPA
1ª ETAPA
(Atividades de Campo e
(Planejamento)
Laboratório)
3ª ETAPA
(Avaliação de Resultados)
líquidos e do Standard Methods for Examination of Water and Wastewater (ANA, 2011;
APHA, 2012).
As amostras de água subterrânea, dos domicílios e da rede de distribuição foram
coletadas respectivamente diretamente nos poços com auxílio de balde inox ou na tubulação
de sucção antes de caixas d’água ou reservatório, dos recipientes utilizados para
armazenamento considerados neste estudo como água de domicílio e nas torneiras dos ramais
prediais da rede de distribuição do sistema coletivo de abastecimento sempre após 2 ou 3
minutos de escoamento das primeiras águas acumuladas na extremidade das canalizações.
A amostragem de água superficial fora do tipo simples e utilizando-se a técnica de
imersão do frasco numa profundidade máxima de 30 cm da coluna d’água.
Para as análises físico-químicas foram utilizados frascos de polietileno com
capacidade de 1 L, sendo as amostras coletadas e transportadas logo após as coletas para o
Laboratório de Toxicologia da Seção de Meio Ambiente do Instituto Evandro Chagas em
Ananindeua/PA. As amostras foram conservadas sob refrigeração (± 4ºC) em caixas
isotérmicas durante o transporte de campo até o laboratório. Para a análise de DBO, foram
utilizados frascos de polietileno âmbar com capacidade de 1 L, utilizando-se o mesmo critério
de conservação comentado anteriormente.
Na amostragem de água para os exames microbiológicos, foram utilizadas bolsas
NASCO® de 100 mL, sendo as amostras acondicionadas em caixas isotérmicas (± 4ºC) e
transportadas ao Laboratório de campo em Barcarena, onde foram realizados os
procedimentos necessários para os exames microbiológicos.
Na Figura 6 pode ser observado o trabalho desenvolvido em campo envolvendo as
seguintes atividades: coleta de água para análises físico-químicas e exames microbiológicos,
determinação de algumas variáveis no momento da coleta, registro de informações locais e
armazenamento e preservação de amostras para análises e exames em laboratório.
41
Figura 6: Trabalho de campo nos rios monitorados. a) coleta de água para análise
físico-química; b) coleta de água para exame microbiológico; c e d) determinação “in loco” de
variáveis físico-químicas; e) registro de informações no momento da coleta e f)
acondicionamento e preservação de amostras em caixa isotérmica.
0,0 2,0 2
-37,1085+41,91277*pH-15,7043*pH2+
2,0 6,9
2,417486*pH3-0,091252*pH4
-4,69365-21,4593*pH-68,4561*pH2+
pH (-) 6,9 7,1
21,638886*pH3-1,59165*pH4
-7.698,19+3.262,031*pH-499,494*pH2+
7,1 12,0
33,1551*pH3-0,810613*pH4
12,0 - 3
100,9571-10,7121*DBO+0,49544*DBO2
0 30
DBO (mg.L-1) -0,011167*DBO3+0,0001*DBO4
30 - 2
0 10 -5,1*NO3+100,17
10 60 -22,853*ln(NO3)+101,18
Nitrato (mg.L-1)
60 90 10.000.000.000*(NO3)-5,1161
90 - 1
0 10 79,7*(PO4+0,821)- 1,15
-1
Fosfato (mg.L )
10 - 5
As equações e as curvas desenvolvidas pela NSF, levam em
consideração as características dos corpos de água e variações climáticas
dos EUA, sendo a variação de temperatura de equilíbrio o principal
Diferença de
parâmetro afetado. Segundo a SEMAD (2005), os corpos hídricos
Temperatura
brasileiros não recebem cargas térmicas elevadas, portanto, as equações
(°C)
não condizem com a realidade brasileira, pois a variação da temperatura
de equilíbrio é próxima de zero, então tem-se para -0,625<∆T≤0,625 a
seguinte equação: qTemperatura 48 x ∆T + 93 48 x (0) + 93 93.
Fonte: SEMAD (2005). ∆T= Variação de Temperatura.
Obs.: Os valores de qi para os dados de DBO acima de 5 mg/L, foram obtidos de acordo com a curva média de
variação de qualidade para DBO conforme a Figura 2.5, item 2.2. do capítulo 2.
45
transformações lineares das variáveis originais em novas variáveis, surgindo assim, novos
conjuntos de dados até ao ponto que essas variações de conjuntos tenham sido explicadas
(GOMES, 1985; LUDWIG; REYNOLDS, 1988; ODDEN; KVALHEIM, 2000; BERNARDI
et al., 2009; LANDIM, 2011). É uma técnica estatística multivariada onde o raciocínio central
é reduzir dimensionalmente um conjunto de dados que apresentam muitas variáveis
inter-relacionadas (LIMA et al., 2011). Os dados originais são definidos em um novo conjunto
de variáveis sintéticas chamado de componentes principais ou fatores, definidos através da
combinação linear das variáveis iniciais (BOUROCHE, 1982; VICINI, 2005).
Na análise de componentes principais foi utilizado o tipo de matriz por nível de
correlação sobre os dados dos IQAs, com a geração de gráficos de escores para os dois
primeiros componentes (CP1 e CP2).
Para o tratamento estatístico descritivo e analítico foi utilizado o software Excel 2013
da Microsoft Corporation© e para as Análises de Componentes Principais o software Minitab
17 OnTheHub Inc.® com os direitos para uso de acordo com a licença número
317201144883580098.
5 RESULTADOS
5.1 ARTIGO 1
RESUMO
Apesar dos grandes avanços tecnológicos introduzidos nos processos de tratamento das águas
de consumo humano, as utilizadas para abastecimento tornaram-se um grande problema de
saúde pública. O objetivo deste estudo foi avaliar a qualidade das águas consumidas em duas
comunidades ribeirinhas no Estado do Pará expostas a poluentes domésticos e industriais.
Foram realizadas quatro campanhas de amostragem nas duas comunidades e as variáveis
utilizadas para o cálculo do Índice de Qualidade da Água (IQA) foram pH, Sólidos Totais,
Cloreto, Fluoreto, Dureza e N-Nitrato. As águas utilizadas para consumo humano na
Comunidade Maranhão, onde não há contaminação por poluentes industriais, apresentaram
amostras adequadas, com melhora no período seco; já as águas de Vila do Conde, local próximo
à atividade industrial, estiveram em ambos os períodos sazonais com qualidade inaceitável para
consumo humano. Os principais parâmetros afetados foram o pH e o N-Nitrato, com valores até
25 vezes a referência da legislação brasileira para água de consumo humano. Esses resultados
indicaram maior interferência antrópica no entorno da Vila do Conde em Barcarena,
necessitando-se de avaliações clínicas por profissionais especializados sobre o estado de saúde
desta população.
INTRODUÇÃO
A água é um bem essencial que garante saúde à população. Neste sentido, trata-se de
um bem essencial, e que é considerada uma prioridade das ações de vigilância em saúde
ambiental no Brasil1. Entretanto, padrões de desenvolvimento não sustentáveis vêm
favorecendo a degradação ambiental, graças a alterações significativas no meio natural e
adestruição de diversos ecossistemas (dentre os quais se destacam os aquáticos), que levam a
mudanças nos padrões de distribuição de doenças e nas condições de saúde dos diferentes
grupos populacionais2.
A Constituição Federal de 1988 atribui ao Sistema Único de Saúde (SUS), em seu
Artigo 200, a competência de fiscalização e inspeção de água para consumo humano, além da
participação na formulação da política e da execução das ações de saneamento básico, entre
outras atribuições3. Em atendimento à Constituição Federal, a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº
8.080/1990), em seu Artigo 6º, também descreve dispositivos específicos, relacionados ao
campo de atuação do SUS no que se refere à fiscalização da água para consumo humano no
Brasil4.
O debate sobre as questões relativas à qualidade da água e, consequentemente, a
atuação do Ministério da Saúde sobre os parâmetros de potabilidade não é recente. Desde o
ano de 1977 foi atribuída ao Ministério da Saúde a competência para elaborar normas e
padrões de potabilidade da água para consumo humano. Assim, a Vigilância da Qualidade da
Água para Consumo Humano foi a primeira área de atuação da vigilância em saúde ambiental
no Brasil5.
A vigilância da qualidade da água para consumo humano atua sobre as diferentes
formas de seu abastecimento, seja de gestão pública ou privada, na área urbana ou rural, e
inclusive em áreas indígenas e em comunidades isoladas. As formas de abastecimento de água
podem apresentar características bastante variadas, como por exemplo, pode ser distribuída
por rede ou por meio de veículos transportadores; seu fornecimento pode ser restrito a um
único domicílio ou ser para vários bairros ou municípios; os mananciais de captação da água
podem ser superficiais ou subterrâneos; o tratamento da água pode ser completo ou
simplificado, com apenas desinfecção. Neste sentido, é importante reconhecer o
monitoramento da qualidade da água como o instrumento de verificação da sua potabilidade
para consumo humano, conforme padrão estabelecido na legislação. Para o monitoramento da
qualidade da água devem ser realizadas análises laboratoriais das amostras, de acordo com os
51
ocorrem acidentes ambientais no entorno desse polo insdustrial, tendo como consequências a
poluição/contaminação dos corpos hídricos superficiais e subterrâneos e outros
compartimentos ambientais, causando prejuízos consideráveis à flora, fauna e saúde da
população11,12.
Desta forma, o objetivo do presente estudo é apresentar o resultado do
monitoramento de águas subterrâneas utilizadas para consumo humano no entorno de
comunidades ribeirinhas expostas à poluentes/contaminantes ambientais nos municípios de
Abaetetuba e Barcarena no Estado do Pará.
MATERIAIS E MÉTODOS
Ramal do Maranhão, uma comunidade ribeirinha situada à margem esquerda do rio Guajará
do Beja, o qual é tributário do rio Pará. Já a Vila do Conde é um dos distritos pertencentes ao
município de Barcarena e está localizada no entorno da área portuária de Vila do Conde, onde
estão instaladas indústrias que atuam no beneficiamento e exportação de caulim, alumina,
alumínio, cabos para transmissão de energia elétrica e outras atividades produtivas do
agronegócio10,11,13.
As águas consumidas nas duas localidades são originárias de aquíferos subterrâneos,
não existindo qualquer tipo de tratamento nessas fontes de abastecimento, apenas captação
canalizada ou não, armazenamento em caixas d’águas ou reservatório elevado e distribuição
para os pontos de consumo. O poço usado para o abastecimento geral em Vila do Conde
através de distribuição canalizada pelo serviço de saneamento do município é realizada de
maneira intermitente, isto é, não funciona 24 horas no dia.
COLETA DE DADOS
ANÁLISE DE DADOS
IQNAS= qiwi
i=1 (Equação 01)
55
Tabela 01: Equações matemáticas das curvas de qualidade das variáveis pH, sólidos totais,
cloreto, fluoreto, dureza e N-nitrato para a determinação de qi.
Intervalos de Pesos
Variáveis Unidades Equações Matemáticas (qi) R2
Validade (wi)
qpH=1,7354*(pH)2 [2≤pH≤7,34]
pH - -2,5
0,990 0,05
qpH=16405*[(pH) ]-17 [pH≥7,35]
Sólidos qST=79-0,167284*ST+EXP[(ST)0,228] [0≤ST≤1630]
mg.L-1 0,990 0,22
Totais qST=27,7 [ST>1630]
(ST) qCl=100 [Cl<4,86]
Cloreto
mg.L-1 qCl=138,9*(Cl)-0,19561-(Cl)0,42 [4,86≤Cl≤3000] 0,916 0,26
(Cl-)
qCl=0,0 [Cl>3000]
Fluoreto -1
qF=80+21*F-(F)11,6263 [0,0≤F≤1,5]
-
mg.L 0,924 0,16
(F ) qF=0,0 [F>1,5]
N-Nitrato
-
mg.L-1 qN-NO3=100*EXP(-0,0994*N-NO3) [N-NO3≥0,0] 0,993 0,15
(N-NO3 )
CONSIDERAÇÕES ÉTICAS
RESULTADOS
A análise das águas foi realizada considerando sua fonte, entre subterrânea, de
domicílios e de rede. Cabe ressaltar que são apresentados dados a respeito da água de rede
apenas para a Vila do Conde, pois a Comunidade Maranhão não possui esta opção de
distribuição de água.
ÁGUAS SUBTERRÂNEAS
ÁGUAS DE DOMICÍLIOS
ótimo (80 a 87) em 75% e 25% respectivamente. Na Vila do Conde em período chuvoso, as
águas dos poços avaliados apresentaram qualidades imprópria (IQA de 12 a 34) em 65,39%
das amostras, aceitável (IQA=43 e 47) em 7,69% das amostras, boa (IQA de 52 a 65) em
15,38% das amostras e ótima (IQA de 82 a 85) em 11,54% das amostras. No período seco, a
qualidade das águas nos domicílios da Vila do Conde foi imprópria (IQA de 7 a 35) em
65,38% das amostras, aceitável (IQA de 39 a 48) em 11,54% das amostras, boa (IQA=54 e
65) em 15,39% das amostras e ótima (IQA de 82 a 85) em 7,69% das amostras.
As águas nos domicílios da Comunidade Maranhão e Vila do Conde também
apresentaram qualidades diferentes quando comparadas nos dois períodos sazonais (Figura 2c
e 2d) e mantiveram padrões idênticos às suas as fontes de captação (poços), isto é, a
Comunidade Maranhão apresentou uma qualidade boa na maioria das amostras avaliadas e a
Vila do Conde uma qualidade imprópria no maior percentual das amostras. Isto é evidenciado
nas Figuras 2c e 2d, a CP1 (66,6%) demonstrou no período chuvoso boa separação de dois
grupos no eixo y associado com as características das águas de domicílio entre as
comunidades Maranhão e Vila do Conde. Este resultado confirma uma diferença significativa
na qualidade das águas coletadas nos recipientes destas comunidades. Na comunidade
Maranhão as águas apresentam um padrão melhor de IQAs, porém os resultados de Vila do
Conde mostram a degradação da qualidade das águas subterrâneas consumidas, refletindo as
mesmas características dos aquíferos utilizados para abastecimento da população. A CP2
(33,4%) não apresentou uma boa separação no eixo x. Estes resultados se repetiram no
período seco no qual as CP1 (85,9%) e CP2 (14,1%) demonstraram um maior distanciamento
e separação no eixo y no que concerne a qualidade das águas de domicílios nas comunidades
avaliadas.
Figura 01: Análise de Componentes Principais (ACP) tipo escore plot sobre os dados de água subterrânea em
período chuvoso (a) e seco (b); de água de domicílio em período chuvoso (c) e seco (d) e de água de domicílio e
de rede em período chuvoso (e) e seco (f) para Comunidade Maranhão e Vila Conde. Legenda: CMAS:
Comunidade Maranhão Água Subterrânea; VCAS: Vila do Conde Água Subterrânea; CMAD: Comunidade
Maranhão Água de Domicílio; VCAD: Vila do Conde Água de Domicílio; VCAR: Vila do Conde Água de Rede.
61
Tabela 02: Estatística descritiva aplicada sobre os dados das amostras de água segundo localidade e período.
ÁGUA SUBTERRÂNEA ÁGUA DE DOMICÍLIO ÁGUA DE REDE
LOCAL PERÍODO VARIÁVEIS UNIDADE N N N
MG±DP MIN MAX MG±DP MIN MAX MG±DP MIN MAX
pH - 20 4,62±0,25 4,17 5,09 20 5,12±0,53 4,47 6,61 - - - -
Sólidos Totais mg.L-1 20 30±19 10 76 20 24±20 6 69 - - - -
-1
Cloreto mg.L 20 9±8,91 2,31 34,68 20 10±8,14 1,45 33,79 - - - -
Chuvoso Fluoreto mg.L-1 20 0,011±0,00 0,005 0,030 20 0,013±0,008 0,005 0,030 - - - -
-1 9
Dureza mg.L 20 4,74±7,70 0,02 35,32 20 3,91±5,80 0,15 22,51 - - - -
N-Nitrato mg.L-1 20 11,21±8,89 1,96 37,48 20 10,78±11,73 1,32 39,76 - - - -
Comunidade
Maranhão
-1 61,35±48,7 80,08±26,7
N-Nitrato mg.L 14 17,46 186,88 26 43,74±37,68 1,75 124,22 26 19,86 139,86
4 3
IQA - 14 24±20 4 65 26 31±23 12 85 26 21±12 9 61
pH - 14 3,96±0,33 3,48 4,58 26 4,11±0,58 3,40 5,31 26 3,95±0,41 3,41 5,15
Sólidos Totais mg.L-1 14 109±51,99 19 212 26 92±52,40 10 233 26 124±18,85 70 155
Cloreto mg.L-1 14 29±12,47 11 52 26 20±14,72 2 57 26 27±5,78 16 38
Seco Fluoreto mg.L-1 14 0,026±0,02 0,006 0,068 26 0,025±0,020 0,006 0,089 26 0,037±0,04 0,006 0,150
1 7
Dureza mg.L-1 14 4,76±8,05 0,75 32,60 26 4,65±4,85 0,52 17,99 26 8,18±3,57 1,00 16,81
N-Nitrato mg.L-1 14 77,52±59,5 20,03 258,55 26 46,06±41,55 1,45 158,72 26 72,86±21,6 26,00 119,84
0 3
IQA - 14 19±16 2 62 26 29±24 7 85 26 25±10 13 54
N: Número de dados; MG: Média geométrica; DP: Desvio padrão; MIN: Mínimo; MAX: Máximo.
62
DISCUSSÃO
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
5.2 ARTIGO 2
Índice de qualidade das águas em rio amazônico impactado por esgotos domésticos e
industriais, Barcarena-Pará, Brasil: avaliação sazonal e do regime de marés.
Proposta de submissão Water Research
70
Índice de qualidade das águas em rio amazônico impactado por esgotos domésticos e
industriais, Barcarena-Pará, Brasil: avaliação sazonal e do regime de marés.
RESUMO
Este estudo teve como objetivo a avaliação sazonal e do regime de marés em rio amazônico
exposto a poluentes domésticos e industriais no Município de Barcarena, Estado do Pará.
Foram realizadas quatro campanhas de amostragem nos anos de 2009 e 2012, no primeiro ano
ocorreu um acidente ambiental através do transbordo de lama vermelha de uma bacia de rejeito
localizada à montante deste corpo hídrico. Na comparação sazonal e do regime de marés foi
observada através da redução dos valores médios dos IQAs determinados em 2009 e 2012, que
os acidentes ambientais e o lançamento constante de esgotos domésticos e industriais têm
prejudicado gradativamente a qualidade dessas águas superficiais e saúde ambiental no entorno
dessa área portuária, mesmo com a dinâmica de marés que proporcionam uma melhor dispersão
e autodepuração dos poluentes/contaminantes que são lançados neste corpo hídrico.
INTRODUÇÃO
O Brasil recebe intensa descarga pluviométrica, que abrange mais de 90% do seu
território com variações em torno de 1.000 e mais de 3.000 mm/ano. Apesar de ser considerado
um dos países mais ricos em água doce, a região Norte do país concentra 80 % das descargas de
águas dos rios nacionais, dentre elas, destacam-se Manaus, Belém e Santarém que apresentam
abundância em recursos hídricos (Rebouças, 2003).
As águas superficiais da Amazônia apresentam características físico-químicas naturais
diferenciadas que as classificam a partir de suas colorações, por exemplo, as águas brancas ricas
em nutrientes (orgânicos e inorgânicos) com origem nas regiões andinas, carreiam sedimentos
das montanhas para a planície central formando os solos de várzeas mais férteis da Amazônia.
As águas negras ricas em substâncias húmicas, transparentes, escuras e de baixa carga de
sedimentos, nascem nos escudos pré-cambrianos das Guianas e Brasil Central ou nos
sedimentos terciários da bacia Amazônica. Finalmente, as águas claras que são pobres em sais
minerais e ácidas apresentam pouco material suspenso, aparência cristalina e nascem nos
sedimentos terciários da bacia Amazônica ou escudo do Brasil Central, porém, ao norte e sul do
Baixo Amazonas no Pará são neutras e ricas em sais minerais (Walker, 1990; ANA, 2005).
Apesar da disponibilidade hídrica, os corpos hídricos da região Amazônica também
sofrem grande influência dos poluentes domésticos e industriais resultantes das atividades nos
centros urbanos. As atividades agropecuárias e de mineração também têm proporcionado
grandes prejuízos aos corpos hídricos na Amazônia através dos garimpos, queima da biomassa
florestal, degradação dos solos, desmatamentos, etc. As atividades de extração do ouro e do
manganês resultaram na poluição/contaminação por mercúrio e arsênio na Bacia do Tapajós e
Serra do Navio nos Estados do Pará e Amapá respectivamente (Telmer et al., 2006; Fenzl e
Mathis, 2003).
As atividades econômico-produtivas desenvolvidas nos grandes centros urbanos trazem
grandes benefícios para o desenvolvimento de um país, contudo, a grande desvantagem está
relacionada aos riscos que ocorrem no entorno dessas áreas produtivas que acabam
desorganizando e inviabilizando a permanência de agrupamentos humanos, dificuldades
observadas em detrimento de danos ambientais, surgimento de doenças e situação de pobreza.
Realidade observada no município de Barcarena no Estado do Pará, intensamente impactado
após a instalação de indústrias no Distrito de Vila do Conde (IEB, 2012). Na produção
industrial desenvolvida no porto de Vila do Conde destaca-se o beneficiamento e exportação de
72
caulim, alumina, alumínio, cabos para transmissão de energia elétrica, etc (CDP, 2010). A falta
de serviços de saneamento adequados e os recorrentes acidentes ambientais no entorno deste
pólo industrial resultaram na poluição/contaminação dos corpos hídricos superficiais e outros
compartimentos ambientais (MP-PA/MPF-PA, 2015).
No processo de beneficiamento da bauxita (conhecido como processo Bayer), ocorre a
formação de resíduos ricos em ferro, alumínio e soda caustica (NaOH) e outras substâncias.
Os hidróxidos e óxidos de ferro são as principais substâncias que conferem a coloração
avermelhada aos resíduos denominados de lama vermelha (Sampaio et al., 2005; Silva Filho
et al., 2007). Em 28 de abril de 2009, houve o transbordo desses resíduos em direção ás
nascentes do rio Murucupi, se expandindo para os corpos hídricos e provocando grandes
prejuízos à fauna, flora e população local. O Instituto Evandro Chagas realizou amostragens
nessas águas um dia antes (27/04/2009) do acidente ambiental e no ponto de amostragem mais
próximo da bacia de rejeito (MUR 01), o pH sofreu variação brusca em pouco tempo passando
de condições ácidas (6,11) para alcalinas (8,32). Outras variáveis como condutividade elétrica,
cor, turbidez, sólidos totais dissolvidos e suspensos, oxigênio dissolvido, ferro e sódio também
sofreram grandes alterações, o que causou a mortandade de peixes e problemas á saúde da
população local com relatos de queimaduras e irritação na pele após o contato com essas águas
(IEC, 2009).
Uma forma conveniente de se resumir dados de qualidade da água usando diferentes
grupos de analitos em um monitoramento ambiental é através do Índice de Qualidade das
Águas (IQA), método ad hoc baseado em painéis, reuniões ou grupos de especialistas, no qual,
indicadores analíticos ambientais são usados em cálculos matemáticos para a classificação da
qualidade das águas (Horton, 1965; Wills e Irvine, 1996; Giljanovic, 1999; Magalhães Júnior,
2007; Lumb et al., 2011). Neste sentido, o objetivo do presente estudo foi avaliar a variação da
qualidade da água no Rio Murucupi de acordo com a sazonalidade e o regime de marés, em
2009 e 2012.
MATERIAL E MÉTODOS
ÁREA DE ESTUDO
quadrados, com população estimada em 2016 de 118.537 habitantes (IBGE, 2017). O rio
Murucupi tem cerca de 10 km de extensão e suas nascentes estão localizadas perto de uma bacia
de decantação (lama vermelha) do processo de produção de alumina. Este rio transcorre os
distritos urbanos de Vila dos Cabanos e Comunidade Laranjal no município de Barcarena-PA e
desagua em um corpo hídrico denominado Furo do Arrozal. Observa-se o lançamento de
esgotos domésticos não tratados provenientes desses distritos e suas matas ciliares foram
parcialmente devastadas pela ocupação humana (IEC, 2009).
A legislação Brasileira dispõe sobre a classificação das águas superficiais e diretrizes
ambientais para o seu enquadramento (Resolução CONAMA 357/2005), quanto à salinidade
dos corpos hídricos, o rio Murucupi apresenta característica de águas doces. De acordo com
Horbe e Santos (2009), os rios da Amazônia são classificados em águas brancas, escuras e
claras. O rio Murucupi apresenta características de águas escuras e claras.
O rio Murucupi está localizado em zona de influência de marés do estuário do
Amazonas e sob influência de inundações, em suas margens há predominância de matas
primárias de terra firme, capoeiras, matas de várzea e campinas arenosas. A temperatura
regional é do tipo Am e quente equatorial (classificação de Köppen) com média anual de 27°C
e períodos sazonais bem definidos: chuvoso de janeiro a junho e seco nos últimos meses do ano
(Amaral et al., 2002; Souza e Lisboa, 2005).
AMOSTRAGEM
CÁLCULO DO IQA
W I qi i
i 1
Onde:
IQA: Índice de Qualidade das Águas, um número entre 0 e 100;
qi: qualidade da i-ésima variável, um número entre 0 e 100, obtido da respectiva "curva
média de variação de qualidade", em função de sua concentração ou medida;
wi: peso correspondente a i-ésima variável, um número entre 0 e 1, atribuído em função da
sua importância para a conformação global de qualidade.
ANÁLISE DE DADOS
Inicialmente, os IQAs foram descritos de acordo com os períodos sazonais (chuvoso e
seco), diferenças entre as marés (vazante e enchente) e os anos de 2009 (ano do desastre
ambiental) e 2012 (último ano de observação). Em seguida, foram realizados testes para
verificação da associação simples entre as variáveis. Foram testadas as diferenças no IQA a
partir da hipótese de que há diferença na qualidade da água de acordo com o período de chuva,
a diferença entre as marés e as coordenadas. Isto posto, as diferenças foram testadas através do
teste t de Student. Foram considerados testes significativos os que tiveram p-valor menor ou
igual a 0,05 (5%), indicando rejeição da hipótese nula. A rejeição da hipótese nula, indica que
76
existe diferença entre o período (chuvoso e seco) ou maré (vazante e enchente) entre pelo
menos um dos anos e coordenadas dos pontos de amostragem.
Finalmente, considerando aquelas características que se mostraram estatisticamente
significativas, foi realizado modelo de regressão linear múltipla para testar a força de
associação entre as variáveis de exposição (climáticas e o ano) e desfecho (IQA). Foram
analisados os pressupostos de normalidade e não correlação dos resíduos, bem como a
homocedasticidade da variância.
RESULTADOS
Os dados de IQA nas amostras, em média, variaram de médio a bom, com uma
amplitude de 13,50 (valor mínimo=59,13, valor máximo=72,63). A análise bivariada permite
dizer que há uma diferença estatisticamente significativa para as categorias de estação de ano,
regime de maré, pontos de amostragem e o ano de coleta (tabela 1). De uma forma geral, os
melhores valores do indicador de qualidade da água foram observados no ano de 2009, no
período seco, na enchente, e no ponto de coleta mais distante dos distritos urbanos de
Barcarena (ponto 6).
Estação do ano
Período Chuvoso 61,29 11,48 <0,001
Período Seco 69,42 5,03
Regime da maré
Vazante 62,10 9,93 0,001
Enchente 68,60 8,40
Pontos de Amostragem
Ponto 01 59,13 11,01
Ponto 02 61,13 10,47
Ponto 03 62,38 7,74 <0,001
Ponto 04 66,44 8,45
Ponto 05 70,44 6,25
Ponto 06 72,63 6,43
77
A modelagem por regressão linear múltipla (tabela 2) tomou por base o ano de 2009,
o período chuvoso, o regime de maré vazante e o ponto de amostragem mais próximo aos
distritos de Vila dos Cabanos e Comunidade Laranjal em Barcarena. Observou-se que houve
uma associação entre o IQA e o ano de amostragem, evidenciando que a poluição se manteve
mesmo após passados 3 anos desde o acidente, reduzindo a qualidade da água, sugerindo que
a atividade antrópica no curso do rio manteve o cenário de poluição. Comparado ao período
chuvoso, pode-se dizer que o período seco apresenta um melhor desempenho do IQA,
aumentando-o, em média, em 8,125 pontos. Já com relação ao regime de marés, percebe-se
que a enchente influencia positivamente, aumentando o IQA, em média, em 6,5 pontos. Já
com relação ao ponto de amostragem, observa-se, à medida em que o rio vai se afastando do
centro da cidade, a qualidade da água melhora. Os dois pontos de amostragem mais próximos
ao primeiro ponto (utilizado como baseline) não apresentam diferença estatisticamente
significativa. Entretanto, os pontos 4, 5 e 6, mais distantes, possuem diferença significativa,
tendo o último ponto (mais distante) apresentado um IQA 13,5 pontos maior que o baseline.
Vale destacar que há uma tendência no IQA dos pontos de amostragem (p<0,001). Ainda, vale
mencionar que os parâmetros de evidenciaram que o modelo, ao final, encontrava-se bem
ajustado (R2=0,59, p valor com o teste de Shapiro-Wilk=0,18; Teste de Goldfeld-Quandt =
0,35).
Tabela 2: Associação por regressão linear múltipla entre variáveis climáticas, de tempo e
localização espacial e a qualidade da água. Barcarena, 2009 e 2012.
Variáveis/Categorias IC 95% P valor
LI LS
Ano
2009 1 <0,001
2012 -5,583 -8,079 -3,087
Estação do ano
Período chuvoso 1 <0,001
Período Seco 8,125 5,629 10,621
Regime da maré
Vazante 1 <0,001
Enchente 6,500 4,004 8,996
Pontos de Amostragem
Ponto 01 1
Ponto 02 2,000 -2,323 6,323 0,360
Ponto 03 3,250 -1,073 7,573 0,139
Ponto 04 7,313 2,990 11,635 0,001
Ponto 05 11,313 6,990 15,635 <0,001
Ponto 06 13,500 9,177 17,823 <0,001
78
DISCUSSÃO
Os resultados deste estudo mostraram que a qualidade das águas do rio Murucupi
sofreram mudanças significativas de 2009 para 2012 e entre a sazonalidade anual,
apresentando pequenas variações entre os IQAs das marés vazante e enchente, com melhora
de qualidade na maré enchente. Particularmente nos pontos, não houve diferença significativa
entre as amostragens, no entanto, os valores dos IQAs determinados neste corpo hídrico foram
melhorando à medida que se aproximava da foz e no período chuvoso tiveram uma variação
de qualidade ruim a boa no sentido nascente-foz, evidenciando-se maior influência antrópica
nos pontos localizados na área das nascentes, à montante dos distritos urbanos de Vila dos
Cabanos e Comunidade Laranjal.
São diversos os acidentes ambientais no município de Barcarena no Estado do Pará.
Contudo, a partir de 2000 houve aumento nos relatos, devidamente noticiados através dos
órgãos de fiscalização ambiental (FGV, 2009; Pereira 2009; Silva e Bordalo, 2017, Câmara dos
Deputados, 2017). Destacam-se o naufrágio de uma balsa em frente ao Porto de Vila do Conde,
que continha dois milhões de óleo BPF no rio Pará, e cem quilos de coque (pó preto derivado do
petróleo conhecido como carvão mineral), e que foram derramados neste corpo hídrico,
provocando uma mancha negra de aproximadamente dois quilômetros; o vazamento de caulim
e de lama vermelha provenientes de bacias de rejeitos de indústrias instaladas no local, que
acarretaram a poluição/contaminação dos igarapés Curuperê e Dendê e do rio Murucupi; e a
poluição atmosférica, com deposição de fuligem (material particulado com coloração preta) nas
praias, rios, residências e estabelecimentos comerciais, que chegaram a uma espessura de cinco
centímetros, gerando reações alérgicas e complicações respiratórias em um número
considerável de pessoas (MP-PA/MPF-PA, 2015).
A reincidência de acidentes ambientais nessa área portuária é frequente, porém,
destaca-se para este estudo, o acidente ocorrido em 2009, quando houve o transbordo do
material de uma bacia de rejeito contendo lama vermelha, resíduo gerado no processo Bayer
utilizado para o refino de bauxita (Silva Filho et al., 2007) nas nascentes do rio Murucupi,
gerando impactos ambientais com a dispersão do rejeito por toda extensão deste corpo hídrico e
outros mais distantes (Pereira et al., 2007; IEC, 2009; MP-PA/MPF-PA, 2015).
Cabe ressaltar que a avaliação sazonal e do regime de marés no rio Murucupi não se
restringiu aos possíveis efeitos negativos na qualidade dessas águas após o episódio de 2009,
mas também aos outros poluentes de origem antrópica como os esgotos produzidos pela
79
população local que são lançados neste corpo hídrico ao longo dos anos (Pereira et al., 2007).
Estudos internacionais mostram o comportamento deste tipo de poluente no ambiente
após a ocorrência de acidentes, por exemplo, no entorno de uma indústria de produção de
alumina na Hungria, quase um milhão de metros cúbicos de lama vermelha escoaram para os
rios Torna, Marcal e Rába, inundando áreas mais baixas nas Vilas de Devecser, Kolontar e
Somlovasarhely, causando a morte de dez pessoas e contaminando rios e grandes áreas
territoriais (Ruyters et al., 2011). Esses resíduos tóxicos alcalinos, também atingiram depois de
dois dias o rio Danubio, reduzindo significativamente as comunidades de rotíferos planctônicos,
mesmo após três semanas, os níveis das diversidades e densidades planctônicas não retornaram
ás condições iniciais (Schöl e Szövényi, 2011). Segundo a Environmental Protecy Agency, a
lama vermelha não é classificada como tóxica, porém a sua elevada alcalinidade e capacidade
de troca catiônica pode causar sérios danos ao meio ambiente (Collazo et al., 2005).
A poluição dos corpos hídricos proporcionam situações que prejudicaram bastante o
uso das águas, inclusive para o próprio abastecimento público. Em uma avaliação sobre a
evolução de aglomerados urbanos ao longo dos anos em cidades da China, foi observada que a
rápida urbanização e a escassez de recursos hídricos agravaram a falta de água potável de
qualidade aceitável para o consumo. Nesses conglomerados, o lançamento das águas
residuárias industriais foram estabilizados com o passar do tempo, porém, o lançamento de
esgostos domésticos nos corpos hídricos aumentou consideravelmente, mantendo a baixa
qualidade das águas (Shao et al., 2006). Esse rápido desenvolvimento econômico ao longo dos
anos também proporcionou a ocorrência de constantes acidentes e poluição das águas na China,
registrando-se 6677 acidentes com a poluição das águas de 2000 a 2008 que ameaçam a
qualidade das águas tomadas como fonte de abastecimento, dentre eles, o derramamento de
aproximadamente cem toneladas de nitrobenzeno, benzeno e anilina no rio Songhua após a
explosão de uma indústria petroquímica. A poluição provocada por este acidente persistiu por
um período de aproximadamente trinta dias e acabou paralisando o abastecimento de água por
quatro dias em Harbin, capital da província de Heilongjiang (Zhang et al., 2011).
Em média, os valores dos IQAs determinados no rio Murucupi em 2009 e 2012
variaram de médio a bom, porém, foram registrados valores de qualidade ruim no período
chuvoso. As contribuições de poluentes/contaminantes provenientes de esgotos domésticos e
industriais lançados no rio Murucupi sem qualquer tipo de tratamento ou até mesmo ineficaz, os
acidentes ambientais recorrentes e o possível desprendimento gradativo do material de fundo
(sedimento) do acidente de 2009, contribuem para a degradação da qualidade dessas águas ao
80
longo dos anos, apesar da dinâmica de marés que ajudam no processo de autodepuração, os
resultados das análises bivariadas e de regressão linear múltipla sobre as variáveis climáticas,
de tempo e localização espacial e qualidade da água (IQA) de 2009 e 2012 corroboraram essas
mudanças (Medeiros, Lima e Guimarães, 2016).
A matriz energética das indústrias de alumínio supõe que se trata de energia limpa.
Entretanto, estudos já demonstram que esta afirmação se trata de uma falácia, uma vez que
elas tem causado profundo impacto ambiental em tono o mundo (Dupas, 2008). Esta relação
tem sido avaliada com a identificação de alterações nas propriedades físicas, químicas e
biológicas originadas graças á implantação, operação da indústria e sua interação com as
características dos locais de sua instalação (Bermann, 2007). Somam-se a estas caracterísiticas
dos locais a sazonalidade e do regime hidrológico, muitas vezes caracterizado pelas fases de
marés, cuja ação na turbidez da água e movimentação dos sedimentos influencia diretamente
a qualidade da água, conforme observado no presente estudo.
É importante destacar que, a exemplo de outros desastres ambientais ocorridos no
Brasil, há uma situação de injustiça ambiental (Porto e Finamore, 2012; Porto, Rocha e
Finamore, 2014), caracterizada por uma desigualdade na distribuição de riscos e benefícios do
desenvolvimento econômico. O histórico do Brasil na produção e exportação do alumínio
demonstra a sua importância no contexto econômico do país. Em especial, a transformação
estrutural da indústria do alumínio, responsável pela criação de commodities inclusive para os
produtos derivados, como a bauxita, trouxe como consequência a emigração das indústrias
altamente poluidoras e com grande impacto ambientais para países de economia periférica,
como é o caso do Brasil (Henrique e Porto, 2014; Freitas et al, 2003).
Ainda que o presente estudo tenha a limitação de não analisar indicadores sociais
locais (por uma limitação da disponibilidade de dados), vale lembrar que a população do
entorno da área de contaminação pertence a uma comunidade, por definição, de maior
vulnerabilidade aos riscos provocados por esse avanço no desenvolvimento local . Nesse
sentido, a falta de contextualização da exposição aos riscos e efeitos sobre a saúde é uma
barreira par a análise adequada do impacto ambiental do desenvolvimento econômico e dos
potenciais desastres associados ao uso da tecnologia industrial (Rouanet, 1993; Reuter, 2001).
Considerando os problemas decorrentes do modelo de industrialização implantado na região,
e a vulnerabilidade da população local, cabe portanto discutir avaliação dos instrumentos de
licenciamento e fiscalização, visando verificar sua eficiência no contexto social, tecnológico e
ambiental da região (Nascimento, 2010).
81
CONCLUSÕES
AGRADECIMENTOS
REFERÊNCIAS
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85
6 CONCLUSÕES
águas, de forma a compreender melhor a rota de contaminação para apontar uma remediação
adequada, para que a água possa novamente ser consumida.
As variáveis utilizadas no cálculo do IQA sobre as amostras de águas subterrâneas e
superficiais mostraram uma boa sensibilidade para os níveis de qualidade encontrados.
Apesar dos critérios utilizados nas expressões matemáticas criadas com base nos
métodos da NSF conforme as notas de qualidade (qi) para cada variável, existem situações
peculiares nas águas da região estudada como o próprio pH que apresenta características ácidas
em condições naturais e requer uma atenção quanto à validação do IQA em caráter regional.
As ferramentas estatísticas serviram de grande auxílio na identificação das áreas mais
afetadas pela poluição nas áreas estudadas e melhor avaliação dos níveis de qualidade das águas
nessa área portuária em diferentes compartimentos ambientais (subterrâneo e superficial).
87
REFERÊNCIAS
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