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ABOTA CA E A POLITICA
IMPERIAL:
a introdução e a domesticação
de plantas no Brasil
WarrenDean

Bone Deus! Si Hispani et Lusitani diretamente sobre os ecossistrmas natu­


noscent sua bona naturae, quam rais, moditicandoo()S e às vezes simplifi­
infelices essent plerique alii, qui non candQo()S drasticamente. O grande reino
possident terras exóticas. neotropical da nature2JI foi as�im transfor­
mado para sempre.
Unnaeus (Epistolae 1765) Estes priu..,ires atos <Ao lembrados qua­
se sempre na> relatos históricos tio-6Ornen­
te em tennos de suas eventuais oonseqiiên­
s primeiras tentativas de coloniza­ cias econOmicas. A inlroduçáo de espécie<!
-o portugt.esa ao longo da costa do de interesse co"o:mal deu illll'ulso 1 colo­
Brasil foram marcadas pela inlroduçáo de nização durante OS longos � em que
um certo mlmuo de espécies de animais e OS invasores, desvairados, se perdiam m'ma
plantas domesticados que se encontravam busca de ouro e esmeraldas. A rentabiljd,­
já aclimatados em Portugal ou nas suas de do açúcar e dos couros no mercado
ilhas aUAnticas. Estas transferências foram europeu fortaleceu os laços colonieis.
detenninadas no primeiro momento pelos
Além destes efeitos, deve ser lembrado que
preconceitos dos invasores - eles simples­
a capacidade dos portugueses de detcnni­
uo:nte não gostavam da comida dos tupis.
nar a transferência de plantas e animeis
O motivo era mesquinho, porém as conse­
do mesticados entre Portugal, o Brasil e as
qüências foram de enonne alcance. Estas
suas outras colônias foi uma das mais po..
espécies exóticas domesticadas diversifi­
dernsas umas do imperialismo lusitaoo.
caram e aumentaram as fontes de nutrien­
tes disponíveis para a população humana, Trata-se de um aspecto cri\ico da "conquis­
pennitindo assim um eventual aumento da ta de culturas", na frase de George Foster,
sua densidade. Além disso, estas espécies, na qual OS e1eu>tntos culturais eram sele­
e outras que se seguiram depois, atuaram cionados pelos invasores de ,cordo com a

P,cu
lo,Hisl«icos. Rio deJ.dr� Yà. 4, D." 1991, p. 216-228
A IlOTÁNlCA EA POÚ11CAIMPER1AL 217

sua utilidade na manutenção e na amplia po mente decisivo no estabelecimento de


do controle sobre a sociedade colonial. planJaliolls nos climas tropicais, onde a
RecentementeAlfred Crosby desenvol­ problemática do parasitismo era muito
veu a idéia de um "imperialismo ecológi­ mais grave. Lembre-se que naqueles tem­
co". Ele demonstrn que o sucesso dos pos nem a causa micr6bica das doenças era
europeus nas regiões onde eles consegui­ conhecida, quanto mais as possíveis curas.
ram implantar suas colônias foi devido à No Brasil, mesmo assim, OS exóticos en­
rápida e fácil reprodução de suas plantas, contraram um cortejo impressionante de
animais e parasitas, que colonizavam os inimigos nativos - a saúva, por exemplo -
ecossistemas invadidos mais efetivamente que em muitos casos dificultou a aclimação
do que os próprios conquistadores. No rápida. Evidentemente as condições ecoló­
Brasil, o açúcar e o gado foram instrumen­ gicas que governam a viabilidade de trans­
tos que permitiram aos portugueses inten­ ferências são complexas e especilicas.
silicar a exploração dos indígenas. En­ Em um sentido mais amplo e mais pro­
quanto o comércio permaneceu baseado fundo, os portugueses, naqueles seus atos
no escambo de produtos nativos coletados, de transferir plantas e animais economica­
não era possível sujeitar os índios a nenhu­ mente interessantes, estavam acelerando o
ma disciplina. Com o cultivo e a criação de processo natural da cosmopolitização das
domesticados exóticos, sob o controle dos floras e faunas terrestres, desvanecendo
europeus, começou porém uma coloniza­ assim a tendência à diferenciação e ao
ção base.da na ocupação lixa e segura e no endemismo iniciada com a separação dos
processo de redução dos índios à condição continentes em tempos remotos. De fato,
de escravos e servos? a cosmopolitização já fora iniciada no con­
É interessante acompanhar este proces­ tinente com o surgimento do istmo do Pa­
so de reorgani2JIção da paisagem brasileira namá, uns dois milhões de anos atrás, que
e de desenvolvimento de novos recuJSOS ligou a América do Sul àAmérica do Nor­
agrícolas via domesticação de espécies sil­ te. E foi intensilicada quando os primeiros
vestres nativas e via aclimação de espécies invasores humanos chegaram a este conti­
domesticadas exóticas. Ao longo da histó­ nente, uns 12 mil anos antes do presente.
ria brasileira, os resultados destas experiên­ Nesta perspectiva abrangente, a segunda
cias influenciaram a posição que a colônia invasão humana no Novo Mundo, a dos
e, mais tarde, o império independente con­ europeus, faz parte da universalização do
seguiram manter na economia mundial. O domínio sobre todos os ecossistemas ter­
que é especialmente curioso é que estes restres de um complexo humano-agro-pe­
resultados dependiam fu ndamentalmente cuário acompanhado de todos os seus res­
de p rocessos botânicos e ecológicos que pectivos parasitas e pragas. No caso da
escapavam aos conhecimentos dos bomens invasão européia da costa do Brasil, a cos­
até o presente século. Quase sempre, na mopolitização a que se p rocedeu foi pan­
organização das planJations, o cultivo era tropical. Aquelas plantas que se aclimata­
de uma planta exótica. Isto não é uma coin­ vam mais facilmente eram geralmente de
cidência, mas um fato essencial. A facilida­ origem africana ou sul-asiática. Ass im os
de com que se aclimataram espécies exóti­ portugueses atuaram como agentes da dis­
cas, livres das doenças e pragas co-evoluí­ persão de floras que eram exóticas não
das no seu habitat natural, diminuiu muito somente fara o Brasil, mas também para
os custos da produção. Se isto era impor­ Portugal.
tante no estabelecimento de cultivos ou Um entrave óbvio à introdução d e n0-
animais em c limas temperados, era real- vos cultivos na imensa e despovoada colô-
218 ESllJOOS IOSTÓRJOOS - 199118

nia brasileira (despovoada por causa da péia. Teria sido economicamente muito
destruição da população indígena com a proveitosa para o reino a lransferência das
introdução de doenças também exóticas) especiarias asiáticas para o Brasil: assim
foi a possibilidade de basear a subsislência leria sido reduzida a dispendiosa ad minis­
e até o comércio no extrativismo. Uma tração e transporte, para não falar do custo
parte considerável do consumo da colônia em vidas! - uma oportunidade perdida ra­
não era cultivada, e sim caçada e coletada. ramente comentada nas histórias do impé­
Os materiais de construção e os combustí­ rio asiático português. De fato, parece que
veis provinham de árvores silvestres. A ao longo do século XVI sementes destas
proteína que acompanhava o milho e a plantas chegaram ao Brasil várias vezes. A
mandioca no regime brasileiro vinha prin­ sua plantação, porém, foi proibida, para
cipalmente da caça, e não de animais do­ manter o monopólio dos mercadores inte­
mesticados. A pesca, a caça e a coleta de ress ados nas feitorias asiáticas. Por outro
plantas silvestres como goiaba, caju, ma­ lado, do Brasil foram transferidos para Goa
mão e palmito forneciam boa parte da dieta o mamão, a mandioca, a pitanga e o caju, e
popular, inclusive dos habitantes das cida­ para a África, a mandioca, o cará e a batata
des. O país, afinal, foi batizado com o doce. Como compensação parcial, o Brasil
nome de uma árvore da qual se extraía tinta receheu o dendezeiro e o i nhame , sob aus­
e que nunca chegou a ser plantada. Ocacau pícios incertos, mas possivelmente via São
s
e o algodão também eram, nos primeiros Tomé.
séculos da colonização, produtos coleta­ A invasão do Nordeste pelos holandeses
dos e não plantados. Exportavam-se tam­ marcou um segundo surto na dominação
bém madeiras de lei, óleos de tartaruga e colonial do meio ambiente brasileiro. Os
peixe - que se misturavam com o breu na bolandeses trouxeram especialistas talento­
construção naval -, animais vivos, peles e sos que produziram trabalhos sistemáticos
penas de vários animais e pássaros, esto­ e detalhados de história natural. O maior
pas, cordagem, graxas, óleos e "drogas" - golpe da Companlúa das Índias Ocidentais,
quer dizer, plantas e essências medicinais, além de transferir técnicas avançadas de
. . . .
especlanas, ervas aromatlcas, resmas, go-
,

heneficiamento do açúcar para o Carihe, foi


4
mas, ceras, cora otes e venenos. a transferência do cacau, já cultivado em
Mesmo que os seus cronistas te nham plallla/ians na Venezuela espanhola, para o
encetado o arrolamento de algumas espé­ Ceilão. A Companhia, porém, tomou a de­
cies cultivadas ou conhecidas pelos índios, cisão atrevida de plantar no Brasil as espe­
os esforços dos portugueses para racionali­ ciarias asiáticas, desafiando assim o mono­
zar a colonização do meio ambiente não pólio da Companhia das Índias Orientais,
foram impressionantes. Outros países apro- que na mesma época já conquistara dos.
portugueses as feitorias cingalesas e indo­
• • • • •

veltaram as poucas lfuClallvas portuguesas.


O tabaco, por exemplo, plantado no Horto nésias. Esta rivalidade entre as duas com­
Real de Usboa, em 1558, foi levado à panlúas foi uma causa indireta da derrota
França pelo embaixador daquele país, um dos holandeses em Pemarnbuco. Depois
certo Jean Nicot, e de lá provavelmente da reconquista da colônia, os holandeses
para os países asiáticos. O relatório de Gar­ ameaçaram Portugal com represálias se não
cia da Orta sobre as plantas cultivadas asiá­ erradicasse as espécies cobiçadas, e parece
ticas, publicado obscuramente em Goa em que durante algum tempo a nova e fraca
6
1564, foi rapidamente tntduzido para o la­ monarquia concordou.
tim também por um francês, e assim espa­ Mesmo assim, a crise imperial produzi­
lhado entre a comunidade científica euro- da pela tntnsferência dos segredos do he-
A BOTÁNlCA E A POUllCA IMPERIAL 219

neficiamento do açúcar para as ilhas do das outras especiarias asiáticas foi rec0-
Caribe e pela perda do comércio asiático mendada em 1675, por Duarte Ribeiro de
de especiarias levou os portugueses a in­ Macedo, o embaixador português em Pa­
vestigar, depois de 1670, a conveniência de ris. Ele foi avisado pelos ingleses de que
cultivar alguns dos produtos brasileiros até eles já seguiam esta estratégia na Vuginia.
aquele momento simplesmente coletados. As investigações de Macedo o levaram a
O cultivo do cacau, nativo da Amazônia, acreditar que não existia nenhum obstácu­
foi introduzido no Maranhão pelo jesuíta lo à aclimação no Brasil de espécies asiá­
Bettendorff em 1674. O regente dom Pe­ tiOls. É a ele que devemos a primeira
dro tomou nota desta iniciativa, e também notícia de que o café já tinha chegado ao
do plantio da baunilha, e recomendou mais Brasil, bem antes de uma suposta transfe­
esforços nesse sentido. Os governadores, rência em 1727. E o jesuíta Antônio Viei­
nos anos seguintes, montaram expedições ra, amigo e de Macedo,
para localizar e plantar especiarias, coran­ reclamou contra as proibições ao plantio
tes e plantas medicinais nativas. Houve destas plantas no Brasil. Estes conselhos
uma expectativa de que apareceriam plan­ tiveram seu efeito. A perspectiva deJucrar
tas nativas com as mesmas qualidades das com esta transferência e de arruinar o co­
asiáticas, um engano botânico da época mércio dos rivais holandeses foi suficien­
muito difundido, aliás? temente atraente para justificar os custos e
Já em 1671 el-rei sentiu-se suficiente­ os perigos. Desse modo, o príncipe regen­
mente seguro para encetar uma política te, em 1677, ordenou ao governador de
vigorosa em relação às especiarias asiáti­ Goa o envio de sementes de cravo, canela,
cas, até aquele momento formalmente pimenta, noz mascada, e - curiosamente­
proibidas no Brasil. A concorrência dos gengibre.9
comerciantes portugueses nas s"as poucas OJidadosas remessas de sementes fo­
colônias orientais caíra a níveis ínrunos, e ram feitas nos anos seguintes a tndas as
a ameaça dos bolandeses não causava mais capi tanias do Brasil e a Angola, Cabo Ver­
espanto. Baixou-se um édito permitindo de e São Tomé. Esta nova política ficou
aos brasileiros enviar à metrópole o gengi­ mais prática quando a coroa permitiu esca­
bre, reconhecendo-se assim implicitamen­ las da frota asiática em Salvador, a partir
te um fato consurnado - a existência da de 1671. A canela foi especialmente difícil
planta proibida na colônia. O gengibre, de conseguir, porque os holandeses manti­
um rizoma subterrâneo que, ao que parece, nham com desvelo o seu monopólio no
se aclimatou tão bem no Brasil que se Ceilão. Em 1661 eles mandaram uma ex­
tomou quase silvestre, teria sido impossí­ pedição à costa de Malabar, para destruir
vel de erradicar, e era muito comum na todas as plantas dos seus concorrentes. No
colônia. Aliás, não existia um monopólio Ceilão, rnantinham o preço alto, via limi­
do produto, uma vez que os espanhóis já o tação da colheita. O cravo, nativo das Ilhas
haviam introduzido e comercializado na Molucas, foi impossível de conseguir, lá
Jamaica entre 1525 e 1547. Quando o os holandeses eram por demais receosos.
governador c a Câmara Municipal do Rio No Brasil, os jesuítas receberam estas se­
de Janeiro receberam a notícia da liberação mentes, e mais as sementes de jaqueiras,
do gengibre, pois, foram diretamente à ma­ lnangueiras e açafrão. O cultivo da canela,
triz, para dar graças a Deus.8 permitido finalmente a particulares em
É provável que o gengibre tenha sido a 1692, foi difícil de iniciar. De fato, o as­
única especiaria que sobreviveu à antiga sunto não er. fácil para o governador de
proibição. Uma política de transferência Goa resolver. Lá a canela não era cultiva-
220 ESTUDOS I-DSTóRJC )S - 1991J1

da, mas oolet,da, como também o era no tentativas de aproveilCJ( mais racionalmen­
Ceilão na época em que os portugueses o te os recursos botânicos do império, desta
,,,,,trolavam. Foram os holandeses que vez com o apoio da ciência. Na segunda
rrtl"Íonalizaram o cultivo, melhorando as� metade do século xvrn era forte a pene­
sim II produto. Alguns goenses suposta­ tração em Portugal dos valores científicos
mente especialistas no ramo mandados à da llustração francesa, especialmente nas
Bahia não ajudaram muito. Uma tentativa ciências naturais. Em 1764 o hábil botâni­
de contrabandear um cingalês especiali7JI­ co paduano Domenico Vandelli foi contra­
do no ramo, empreendida por um padre tado pela Universidade de Coimbra, onde
ilegalmente residente na ilha, fracassou. começou a formar a próxima geração de
Dessa forma, não foi Il'.alizado o objetivo naturalistas, na sua maioria brasileiros.
principal da conquista do comércio de es­ Passou a dirigir o Real Jardim e o Gabinete
peciarias. Os morosos esforços das auto­ de História Natural d'Ajuda. Entrou em
ridades coloniais para transferir especia­ correspondência com amadores nas colô­
rias gradativamente se perderam com o nias e com Linnaeus e outros botânicos na
descobrimento do ouro no Brasil. Uma Europa, e estimulou a organização de ex­
carta régia de 1731 oferecia isenção de pedições botânicas e zoológicas. O traba­
direitos alfandegários, mas não está claro lho de Vandelli ganhou força institucional
se houve alguma produção comerciali2li­ com a formação, em 1 n9, da Real Acade­
!O
vel n. época. mia das Ciências de Lisboa. Foram orga­
O começo do século XVlll, porém, foi nizados no Brasil alguns hortos ou jardins
marcado pela emergência de novos e pode­ botânicos - no Rio de Janeiro, em 1772,
rosos instrumentos de intercâmbio de espé­ ligado a uma sociedade científica patroci­
cies tropicais: o jardim botânico colonial e nada pelo vice-rei Lavradio; em São Paulo,
o hcrbário. O herbário pemútiu o estudo em 1779, mas este "não teve andamento'",
comparAtivo na Europa de espécimens se­ em Belém, em 1796, e em Salvado r e Ouro
cos enviados de cada canto do mundo tro­ Preto depois de 1802. Infelizmente, os
pical. Os jardins botânicos, formados em planos de estabelecer jardins em Macau e
redes centradas nas respectivas metrópoles, Goa não foram concretizados. A socieda­
facilitaram o intercâmbio de plantas entre de carioca promoveu o cultivo do bicho­
colônias tropicais e a sua aclimatação. Os da-seda, cocbonilha e índigo, e o Jardim
holandeses estabeleceram um jardim no Botânico de Belém conseguiu da faunda
cabo da Boa Esperança em 1694, e os fran­ colonial La GabrieUe, na Guiana Francesa,
ceses fiuram o mesmo na ilha de Mauritius re messas de pimenta, canela, fruta-pão, do
em 1735 e na Guiana Francesa. A possibi­ muito desejado cravo, e possivelmente da
lidade de gerar informações a respeito das cana taitiana descoberta por Bougainville
novas plantas para acompanhar as transfe­ e apelidada "caiena" no Brasil.12
rências com técilicas culturais testadas au­ Em 1786, Baltasar da Silva Lisboa, um
mentou consideravelmente, como também aluno brasileim de Vandelli, aprEsentou
aumentou a capacidade de disseminar estas uma memória sobre "a frlosofra natural por­
informações entre os faundeiros poten­ tuguesa'" rom "algumas reflexões" sobre o
ciais. Além disso, a investigação foi assim Brasil, na qual recomendava o envio de
colocada numa base científica, com maior rraturalistas à colônia e aconselhava que
potencialidade de acumulação e sistemati- eles aprendessem com os índios, que c0-

.11
zação das informações nheciam plantas I1teis. Em 1789, um e_io
Em Portuga� sob o enérgico ministério de Manuel Ferreira da Câmara, editado pela
do marquês de Pombal, recomeçaram as Academia de Usboa, revelou os conselhos
A BOTÁNICA EA POÚ1lCA IMPEIUAL 221

de Duarte Ribeiro de Macedo, que até aque­ exclusividade da exportação de tabaco,an­


le momento nunca tinham sido publicados. teriormente outorgada a Salvador. O arroz
E Domingos Vandelli, na mesma época, e o trigo, já aclímatados no BllISiI, ganha­
publicou uma revisão das informações ad­ ram isenções de direitos na esperallÇll de
quiridas dos seus correspondentes blllS ilei­ que pudessem suprir a aw;trópoJe,cuja pro­
lOS a respeito dos produtos extrativistas

dução era sempre deficitária. O cânhamo,


blllS ileiros,num evidente esfo� de avaliar que fornecia a ".,lhor qualidade de corda­
as vantagens de domwticá-Ios. 3 gem para a construção naval,já introduzi­
Olm a fundação de alguns jardins botâ­ do sem sucesso mllltiplas vezes no BllISil,
nicos na colônia e o apoio à investigação finalmente vingou em Santa Catarina e Rio
cient(fica oferecido pela Academia, o de­ Grande do Sul. Agora a ciência e a atuação
senvolvimento botânico ganbou alguma oficial funcionavam juntas. O anil, deriva­
coordenação. Alexandre Rodrigues Ferrei­ do de várias espécies delndigofera, era um
ra foi encarregado da mis�ã o de transferir produto produzido tradicionalmellte na
sândalo e, nova".,nte, canela do Oriente. América Central e na índia, e foi transferi­
José Olnêa da Serra [oi mandado a Lon­ do para São Domingos, Luisiana e Guiana
dres, onde colheu, entre outras coisas, in­ pelos franceses, e Jamaica e Carolina do
formações a respeito de vários cultivos
Sul pelos ingleses. A planta era nativa da
coloniais dos ingleses, holandeses e fran­
costa blllS ileira, e bem conhecida dos ÚI­
ceses, e mandou para Portugal se.nentes de
dios por seu uso tintorial, mas nunca foi
várias plantas. Assim conseguiu-se uma
plantada por eles. Otriósamente esta in­
planta forrageira africana,já introduzida na
formação não chegou aos colonos, uma
Jamaica, que no BllISil chegou a ser cha­
vez que, em 1689, o governador da Bahia
mada de "capim colonião". A pecuária no
pediu remessas de sementes do índigo da
BllISil, que sofria pela falta de g l3rníneas
nativas co-<lvoluídas com herbívolllS de
lndi a! A planta foi domesticada sob o pa­
trocínio da Academia Científica do Rio de
grande porte, lucrou bastante com esta in­
Janeiro, as técnicas de beneficiamento fo­
trodução. Introduziu-se também sementes
ram ensinadas, e a sua comercialização foi
da teca da Índia, uma iniciativa esquecida

promovida pelo vice-rei. Até 1779 as ex­


mas interessante, que possivelmente teria
portações blllSileiras de anil satisfizeram o
oferecido uma fonte de madeira de lei de 1S
rápido crescimento em regiões do BllISiI já mercado português.
desmatadas. Novas remessas de canela A descoberta mais curiosa daquela épo­
enviadas de Goa foram acompanhadas ca, aliás, foi a da cochonilha. Um belo dia,
desta vez com detalhados memoriais sobre UJIloficial do exército espanbol mostrou ao
seu colega português, na comissão de fron­

os métodos de cultivo. E uma expedição


técnica, liderada por Hipólito José da Ols­ teira entre Paraguai e BllISiI, urna cactácea
ta Pereira, foi enviada aos Estados Unidos de que ele se lembrava, dos tempos em que
para investigar todos os ramos da produ­ estava aquartelado 00 México. Disse que
ção, inclusive a agricultura, e para desco­ lá a planta era parasitada por u m bicho que
brir melhoramento> que podiam ser trans­ os inexicanos coletavam para produzir
feridos para Portugal e para o BllISil. De uma tinta vermelha muito ap.eciada. O
lá chegaram, via Lisboa! s"".,nles de taba- oficial português, Mauricio da Olsta, de
. . .
co vuguuano em 1799. 4 volta ao Rio de Janeiro, onde era a.,mbro
Estas iniciativas científicas caminha­ da Academia, procurou este cado e encon­
vam paralelas com outras medidas oficiais trou o mesmo inseto valioso. Informou o
de estímulo a produtores. Ficou abolida a vice-rei Lavradio, que, entusiasmado, ore-


222 FSruDOS msTÓRlOOS -1991A

receu incentivos a potenciais produtores imponente eram ainda escassos. As obras


brasileiros.!6 botânicas mais importantes desse período
O cacau, o índigo e a cocbonilha ofere­ foram a Flora fluminense, do padre José
cem contrastes interessant es entre as expe­ Mariano Conceição Veloso, e a viagem
riências de domesticação das colônias es­ amazônica feita por Rodrigues Ferreira en­
panholas e portuguesas. As três plantas tre 1783 e 1792 Infelinnente, nem uma
eram todas nativas, mas somente os mexi­ nem outra destas importantes � ui..s
canos as cultivavam, e parece que os tupis chegou a ser publicada na época. 8
nem conheciam o uso da tuceira. Eviden­ Conceição Velloso chegou a publicar,
temente, os espanhóis, ao domesticar pri­ porém, entre 1789 e 1805, uma série de
medo os povos por eles subjugados, obti­ panfletos intitulada "O fazendeiro no Bra­
veram uma forte vantagem na rápida co­ sil". Os textos resumiam informações em­
cia1ização de tais produtos. Por outro
lne.. píricas sobre vários cultivos, e na sua maio­
lado, parece que os colonos evidenciavam ria eram traduções do inglês e do francês.
o que um botânico brasileiro mais tarde Entre OS autores brasileiros enco ntram-6C
denominou "inércia", ao fechar os olbos Manuel de Arruda Câmara, que escleveu
"de propósito" a plantas tão ubíquas como sobre o algodão e mais tarde publicou um
o índigo. O cacau continuou sendo coleta­ estudo sobre plantas brasileiras que p0-
do na Amazônia, um procedimento dis­ diam ser utilizadas como conlagem na
pendioso que R odrigues Ferreira estra­ construção naval. Bemardo Antônio ao­
nhou. O cacau transferido para a Bahia no "... publicou na mesma época estudos
século anterior já se havia tornado silves­ sobre a ipecacuanha (ou poaia -vma planta
tre, e também era coletado!!7 medicinal), e sobre as caneleiras aclimata­
Os esforços oficiais se multiplicarain das no Rio de Janeiro.!9
nas 1lltirnas décadas do século xvm. O 1bdas estas iniciativas foram um mero
ministro Rodrigo de Souza Coutinho era prelúdio ao programa de investigação em­
especialmente atento às possibilidades de preendido depois da fuga da Corte para o
domesticar e transferir espécies. Mandou Rio de Janeiro. Em 1808, no terreno ocu­
que os governadores no Brasil enviassem pado por uma fábrica de pólvora ao lado
amostras das madeiras nativas com indica­ da lagoa Rodrigo de Freitas, foi eslllhele­
ções dos seus usos e que se contratassem cido um jardim de aclimação. A sua fina­
jardineiros peritos para colecionar e enviar lidade teria sido, além de introduzir novas
sell""ttes de espécies nativas de interesse espécies, o plantio de madeiras aproveit{­
econômico, ou cultivadas ou silvestres, ao veis na construção naval e o melhoramento
Jardim da Ajuda. Manuel Ferreira da Câ­ das pastagens. Arruda Câmara recomen­
mara foi mandado ao Brasil, encarregado dou que fossem fundados jardins nas ou­
da coordenação destes esforços, inclusive tras capitanias do Brasil. Achava que Por­
o de transferir os novos exóticos de Belém tugal já perdera muito tempo, e muito san­
para Salvador e Rio de Janeiro. Os gover­ gue, para manter um monopólio em favor
nadores da Bahia reiniciaram as experiên­ do seu império asiático, e insistia na supe­
cias do século anterior, de cultivo da pi­ rioridade da colônia sobre a metrópole em
mentein. e da caneleira, desta vez com termos de aptidão agrícola: se um pa&
algum suresso. O plano ambicioso de estéril como Portu gal podia florescer lOS
Souza Coutinho era publicar uma flora pés de uma monarquia boa, "como não
"completa e geral do Brasil e de todos os florescerá este, de sua natureza fértil!"
domínios de Portugal", porém os rccursos Uma charmosa inversão do preconceito
humanos para empreender uma tarefa tão europeu contra a natureza neotropical, que
A BOTÀNlCA liA POúnCA IMPfRIA.l... V3

chegou a ser considerada inferior na medi­ maio, um francês que depois se tomou
da em que a conquista dos seus habitantes diretor do Janlim Botânico de Olinda. Pa­
tomou- se mais sangrenta. Arruda Câmara rece que o chi chegou ao Janlim Botânico
apresentou uma lista de espécies exótiOls do Rio deJaneim em 1812, enviado porum
que seria útil transferir. A finalidade dos amigo de 1uiz d' Abreu que em senador em
janlins não era promover o meramente Macau. Como não havia nenhuma infor­
agradivel; "o seu principal fim é o útil". mação a respeito do seu cultivo, o diretor
Possivelmente influenciado por este docu­ do janlim, general Carlos Antônio Napion,
.!-ento, el·rei ordenou mais urnjardim, em procurou janlineiros chi,,= parn tomar
Pernambuco, em 1811. Para conseguir se­ conta das plantas. Um grupo deles chegou
m"ntes e espécimens para estas novas ins­ dois anos depois?!
tituições científicas, o governo oferecia às Os diretores do Janlim Botânico do Rio
pessoas que as remetessem prêmios, me­ de Janeiro anima0'8m-se a conseguir espé­
dalhas e isenção de impostos e de serviço cimens de plantas de potencial valor CC(}­
militar. Aparentemente, uma medida pro­ nômico: aparentemente contratamm cole­
visória, talvez porque as comuniOlções tores itinemntes e publicamm, parn sua
com as colônias asiitiOls e africanas se orientação, conselhos sobre os métodos
20
encontrassem enfraquecidas. adequados de embrulhar e despachar re­
A primeira rellKssa importante foi, II0'-SS8S e instruções sobre os relatórios que
aliás, aleatória. Chegou ao Rio em 1809 deviam emitir. Estavam extremanw:nte in­
um oficiai de Marinha, Luiz d' Abreu Viei­ teressados em locali711r uma fonte douVs­
ra e Silva. Captumdo pelos franceses nu­ tiOl de quina, ou ciochona, a planta que
. . . 22
ma viagem pelo Oceano fndico, fom leva­ smtehza qUlruna.

do para a ilha Maurícia. Solto, conseguiu A fuga da familia real pam o Rio de
obter sementes de virias espécies, inclusi­ Janeiro, a chegada de diplomatas ueden­
ve de noz mosca da, diofo ra, manga,lichia, ciados à Corte e a abertum dos portos
abaOlte, e da palmeirn que viria a ser o trouxeram como conseqüência o apareci­
ornamento mais distintivo do Janlim Bo­ mento na colônia, pela primeirn vez, de
tânico do Rio de Janeiro. O abacate é uma naturalistas estrangeiros. Em contraste
espécie centro-americana e é curioso que dramitico com a polltiOl praticada ante­
tenha chegado ao Brnsil via uma ilha do riormente, de sigilo e exclusão, v4rios
Oceano fndico -se éque esta foi realmente cientistas fomm admitidos, associados a
a sua primeim introdução. Outro grnnde missões diplomitiOls inglesas, austríaOls,
momento foi a ocupação, em 1809, da e, depois do término das guerras napoleô­
Guiana Fmncesa , em represilia à invasão niOlS, até francesas. As realizações destes
da metrópole. Souza Coutinbo, agora con­ naturalistas eram real"w:nte impressionan­
de de Linbares e ministro da Guerra e tes. O botânico Auguste de Saint-Hilaire,
Relações Exteriores, estava decidido a pro­ por exemplo, durante sete anos de viagens
mover a "ruína total" daquela colônia mes­ penosas e constantes por todo o sul e su­
quinha; Arruda amara, porém, achou que deste do Brnsil, colecionou perto de mil
o seu janlim de aclimação em de grande plantas, 2 mil pãssaros, e 6 mil insetos.
valor e devia ser preservado. De li os Saint-Hilaire, entre todos os "viajantes" o
portugueses trouxeram novamente a cana mais interessado em botânica aplicada, pu­
caiena, a noz moscada, o cravo, a fruta­ blicou, entre outros estudos, uma lista de
pão, e quiçá a cammbola e a fruta-do-con­ plantas úteis, de potencial valor coflw:rcial,
de. É interessante que uma das remessas e sugeriu o cultivo de virias espécies sil­
tenha sido acompanhada por Paul Ger- vestres. Parcialmente em resposta a este
224 ES1lJDOS lDS1ÚRIros - 199111

influxo de especialistas estrangeiros, João A cana ucaiena", que se mostrou bem


VI autorizou em 1818 o restabelecimento mais produtiva no Caribe, não foi aceita
de um modesto museu de história natural, em grande escala no Brasil, pelo menos até
predecessor do Museu Nacional, que ele o fmal do século. Possivelmente trata-se
23
(echara sete anos antes. de uma evidência de pre(erencia pela roti­
Os incentivos reais 11 aclimação de es­ na, mas a CJliena também era di(ícil de
pécies exótiCJls e ao cultivo de espécies beneficiar nas engenhocas por causa da
nativas resultaram, na região da Corte pelo grande quantidade de bagaço que produ­
numa horticultura bem mais diver­ zia. Como a lenha não fazia falta na maio-
sifiCJlda. O cultivo do chá, efetivamente ria das fazendas brasileiras, esta qualidade

implantado pela primeira vez (ora da Chi­ não era economiCJlmente atraente. O inte­
na e do Japão, (oi ensaiado por vários resse na introdução de nOvas variedades
fazendeiros no sudeste do Brasil, mais no­ não se apagou, porém: por volta de 1850
tadame/lte por José Aroucbe de Toledo chegou de Java olltra variedade de CJlna, a
Rendon, que publicou um memorial sobre risCJlda ou batava. Curiosamente, o produ­
o seu beneficiamento em 1834. Este pro­ to mais importante na pauta de exportaÇÕes
duto, infeliwlente, não conseguiu aceita­ do novo império - o café - não (oi objeto
ção no merCJldo externo. Não se pode de grandes cuidados oficiais. O café foi
alegar neste CJlSQ a concorrência de fazen­ transferido para o Nordeste bem antes de
deuos coloniais dentro dos impérios euro­ qualquer iniciativa real, e durante muito
peus: o chá só veio a ser cultivado em Java tempo foi um produto vendido à metrópole
um pouco antes de 1839 e na índia em em pequena escala. O seu peso no comér­
1848. A imagem dos velozes veleiros cio começou a aumentar somente depois
da épGCJl, os famosos clippers, da chegada da planta ao Rio de Janeiro, nos
dobrando Cabo Frio numa busCJl desvaira­ meados do século XVII1, mas ainda assim
da do chá da China, quando era possível demorou muitos anos a ser aceito pelos
conseguir o mesmo produto muito mais lavradores. Há notícia da captura pela ma­
convenientemente, é realmente estranha. rinha portuguesa, em certa OCJlsião, de se­
Durante certo tempo pelo menos algumas mentes de café mOCJl, mas não é certo se
das especiarias - gengibre, noz mosCJlda e esta remessa chegou a ser plantada. O
cravo - chegaram a ser exportadas. O sucesso que o café começou a experimen­
índigo sumiu da lista de exportaÇÕes, pos­ tar nos mercados europeu e americano evi­
sivelmente por CJlusa do aparecimento de dentemente compensou em grande parte
uma doença, noticiada na épGCJl -sempre os fracassos com os outros cultivos, mas o
houve o perigo da explosão de algum fim­ Brasil estava mais uma vez a caminho de
25
go C<Hlvoluído nos cultivos nativos, ou uma monocultura arriscada.
devido a muitas adulterações, que o gover­ Os jardins hotâniros, depois da partida
no não sabia suprimir. Oauril A1den enfa­ dos portugueses, viraram rapidamente me­
tiza, porém, a enorme dificuldade que os ros passeios públicos, ainda que ao lado da
brasileiros experimentaram em manter os lagoa Rodrigo de Freitas os jardineircl
seus novos merCJldos depois da paz de chineses continuassem por alguns anos
Viena, que normalizou as rotas comerciais, cuidando do seu chá. Estes exilados, coi­
e depois da decisão da Companhia das tados, nunca conseguiam beneficiar as fo­
Índias Orientais de investir muito capital lhas corretamente-provavelmente não era
na expansão da sua produção de índigo, este o seu ofício Já na China. O diretor do
el iminando assim todos os produtores no Jardim, porém, os acusou de ter fingido
24
hemisfério Oeste. ignorar o segredo, por motivos de patrio-
A BOTÃN1CA E A POÚllCA lMPERlAL 225

tismo saudosista. Este diretor, Leandro do tais como o chá-mate, o guaraná, e ainda
Sacramento, é mais conhecido pelo embe­ experimentalmente, a seringueira. A intro­
lezamento do terreno do que por suas ini­ dução e a domesticação de cada nova es­
ciativas científicas, ainda que tenha pro­ pécie ou variedade representa uma mudan­
movido alguns intercâmbios importantes ça, não somente na balança comercial do
de st:illentes, ioclusive a introdução do eu­ pais, mas também no balanço dos elell",n­
calipto. O museu de história natural, agora tos que compõem os ecossistemas e a pro..
chamado Museu Nacional, passou a ser pria sociedade.
durante este período um gabinete de curio­
sidades. Os seus diretores aplicavam o seu
minúsculo orçamento no estudo da mine­
ralogia?6
Parece que, com o desligamento do Notas
Brasil do projeto imperial mercantilista
português, o motivo do desenvolvimento 1. G. Foster, Cu/fure and conqut:St (New

botânico também sumiu. Em todo caso, a York, 1960). O autor agradea: à 10hn Corter
Browo Library pela boi .. de esludos que facili­
possibilidade de formação de uma nova
tou este estudo.
geração cientrfica ficou muito mais proble­
2. A. Crosby, Ecological imperialirm; IM
nútica. Alguns poucos brasileiros que iam
biologiCDI aponsiOll ofEuropa, 900·1900(New
estudar na França conseguiam este tipo de York, 1986). Veja lambém B . H. SliàJer VID
fonnação, mas não em número suficiente Bath, "De kolonisatie van hei milieu: europese
para revivificar os estudos botânicos, um flora en fauna in Latijns-Amerika", in Slicber
processo que se iniciou principalmente via van 68th eA. C. van Oss, Geschiedenis van
contratação de europeus e americanos no moolschappij o. cultuur (o. p. 1978), p. 194-
fmal do século XIX. 207.
A transferencia de espécies exóticas e a 3. Sobre esta perspectiva, veja H. G. Bater,
domesticação de espécies nativas são evi­ Pia",. ond civilizoli

dentemente atividades que apresentam Veja lambém T. C. Weiskel, • AgeolS Df empire;


steps lOward an eooJogy of imperialism",Envi.


significados diferentes dentro de contextos
1"0.,.0.'01 Review, 11 (Wio ler 1987), 275-88.
""'lC8ntilistas e liberais, dentro de contex­ Sobre as lraruiferências feitas durante os desco·
tos científicos e comerciais, e estas ativida­ brimentos. veja A Crosby. Tlte. Columbian a·
des oferecem também uma perspectiva útil change: biologiCIJI anti cultural consequt:llCl!S of
para a interpretação destes contextos. Por 1492 (Weslporl, cr,1972).
si SÓ, elas oferecem explicações parciais 4. Veja J. Jobson de Arruda, O Brasil no

para o sucesso ou insucesso de certos ra­ comércio colo.iol (São Paulo, 1980), p. 479-80,
mos de desenvolvimento agropecuário e 484·5,613.
industrial e demonstram a complexidade 5. Edgar Valles, "lolrOdução da alllura das
do relacionamento do bomem com o resto plantas de especiarias do Oriente no Brasil".
do mundo biótico. O surto de transferen­ Garcia da Orla, 6 (1958), p. 712. Em coolraste,
cias da época de dom Jnão não foi o último parece que a ooroa fez mais esforços para apren­

capítulo na história da domesticação. O der os oonhecimenlOs asiáticos: veja Luís de


Pina.As ciências na hisrória do impériocolollial
Brasil continuou a receber dezenas de es­
porluguês (Porlo,1945), p. 53·58. WilsoD Pope­
pécies e milhares de variedades e clones noe, Manual Df tropical and subtropical fruÍJs
n""horados, alguns de enorme importân­ (New York, 1974 [1920]), p. 148,286·290. C.
cia econômica, como o gado zebu e a soja. )'Ecluse,Aromatunt el simplicimum aliquol me­
Simultaneamente, tem domesticado espé­ diCIJmefl/orum apud lruios ntJSce ntium historiD
cies nativas até então caçadas ou coletadas, (AnlUerpia, 1567).


226 ESruDOS IIISTÓRlCOS - 199""

6. C. França "Os portugueses do 5tculo XVI cultura e principalmente da cultivaçQo das


e 8 bistória natural do Brasil", Revista de Hist6- charnecas (Usboa, I nO). O impacto da ilustra­
ria, 15 (1926), 54-5; Frcderic Mauro, Ú Brisil ção é. uma tese de F. Novaes, Portugal e Brasil
du XV. à laJin du XVlIle siec/e (Paris, 1977), p. na crise do antigo sistema colonial (1777-1808)
lOS, 119. De 800rdO com D. Alden, 8 coroa (São Paulo, 1979), p. 224. Almeida, "Aclimala­
autorizou o plantio de gengibre e fndigo em ção·, p. 399, 402, 413; A1den, Royal govun­
1642: "The groWlh and decline of indigo pro­ ment, p. 377; D. P. Müller, Ensaio d'um quadro
duction in rolonial Brazil",Journa/ ofEconomic estatístico da Província de S. Paulo (São Paulo,
History, 25 (mar., 1965), p. 46. O autor lamenta 1923 [1837]), p. 260; F. Frei re Alemão,Mem6ria
não ter oonseguido encontrar uma cópia de J. A. quais são as principais plamas que hoje se
Gonsalves de Mello, Notas aarra da introdu­ acham aclimatadas noBras;l? ([Rio de Janeiro],
ção de vegetais exóticos em Pernambuco (Reci­ 1856), p. 559-60. Sobre as sociedades cienUfi­
fe, 1954). cas, veja Moreira de Azevedo, "Sociedades fun­
7. Sobre o cultivo, comércio e transferência dadas no Brasil desde os tempos coloniais",
das especiarias entre os impérios holandeses e Revista do Instituto Hist6rico e Geográfico [da­
ingleses, veja H. N. Ridley, Spices (London, qui em diante RlHGBJ, 48 (1885), pt. 2, 265-
1912). Sobre a dermla dos portugueses na As", 332.
• •

veja A. R. Disney. Twilighl oflM �pper empire 13. Silva üsboa, Discurso histórico, político
(Cambridge, MA, 1978). L. Ferrand de Almeida, e econâmico dos progressos, e estado aClual da
•Aclimatação de plantas do Oriente no Brasil philosophia natural portuguesa acompanhado
durante os séculos XVU e XVIII", Revista Por­ de algumas reflexões sobre o estado do Brasil
tuguesa deHist6ria, I5 (1975), 337-8. L. Brock­ (Lisboa, 1786), p. 42, 67; amara, "Ensaio·, p.
way,Science and colonial upansion: lhe role of 304-80; Vandelli, "Memória sobre algumas pro­
lhe BriJish Royal Botanic Gardens (New York, duçoeos naturaes das oonquistas", Mem6rias
1979), p. 53-4. J. R. do Amaral Lapa, "O Brasil Econômicas, 1 (1789), 187-206. Há velSÕeS des­
e 8S drogas do Oriente", Studia, 18 (agoslo tes artigos em manuscrito na Biblioteca Nacio­
1966), 18. nal, Rio de Janeiro [daqui em diante BN.RJ].
8. M. J. Nogueira da Gama, Memória sobre 14. Almeida, "Aclimatação", p. 404; J. Cor­
a Ioureira cillllamomo 'Vulgo caneleira de Cey·
rêa de Serra, "Cartas de... a um destinatário não
100 . . para acompanhar a remessa das plantas
declarado fRodrigo de Souza Coutinho?], refe­
.

que pelas reaes ordens "ao ser transportadas ao


rindo-se a assuntos náutioos, botlinioos. e agri­
Brasil (Usboa, 1797), p. 12-13; B. da Silva
cultura, 1797-1798·, ms.-BN-RJ; F. da Cunha
U sboa Anaisdo Rio deJane;ro (Rio de Janeiro,
Menezes, Mem6ria sobre a cultura do loureiro
,

1973 [1834]), 4:247. A. Fernandes Brandão, no cil1fJmomo (Usboa. 1797); Memória sobre a ca­
seu Diálogo das grandezas do Brasil (Lisboa, nel/eira, para acompaMar a remessa das plan­
1618) já tinha sugerido a transferencia de espe­ tas que o Príncipe, n. senhor manda transportar
ciarias; veja AJmeida, "Adimatação", p. 354. J. pora o Brasil (Lisboa, s.d.); Costa Pereira, "Me­
M. Purseglove, Tropical crops: mOnDCOIyledons
mória sobre a viagem aos Estados Unidos",
(Harlow, Essex , 1988), p. 534.
RlHGB, 21 (1858), n' 3, p. 351, 365. Sobre a
9. A. de Lima Junior, Notícias hist6ricas de teca: Amaral Lapa, A Bahia, p. 27n; Valles,
norte a sul (Rio de Janeiro, 1953), p. 9·24; "Introduçáo·, p. 713. Rodrigo de Souza Couti­
Almeida, "Aclimatação', p. 358- 9. nho a Fernando Jo5t de Portugal, Queluz, 10
10. Nogueira da Gama, Memória, p. 4; AJ· junho 1799, ms.-BN-RJ. Veja também "Catálo­
meida, "Aclimalaçiio', p. 387, 391-2; Amaral go de vários gêneros do Brazil, e mais oolOnias
Lapa, "O Brasil e as drogas·, 18-25, 36n. E. porluguesas que ainda não estão no ordinário
Valles, "Introdução da cultura das plantas de comércio· s.d. [entre 1798-1805?J, ms.-BN-RJ.
especiarias do Oriente no Brasil", Garcia da
15. J. R. do Amaral Lapa,A Bahia e a carrei­
Orta, 6 (1958), 111-117.
ra da /ndia (São Paulo, 1968), p. 95, 102; D.
11. Brockway, Scienu, p. 58. A1den. Royal government in colonial Brazil
12. Veja D. Vandelli, Mem6ria sobre a utili­ (Berkeley, CA, 1968), p. 359, 363-4, 367,372-3;
dade dos jardins boIânicos a respeito da agri· Idem. "The growth and decline", p. 4O-51� Idem,
A BOTÁNlCA E A POI1"nCA IMPERIAL 227

"Manuel Luís Vieira: entrepreneur in Rio de 1983). Vej. lambém F. A. de Sampaio. "Hiatória
Janeiro durãog Brazil's eighteenth-century re· dos reinos vegetal, animal e minenl no Bralil,
naissance", Hispanic Amer;can Historielll Re­ pertencente 1 medecina-, Ana;.r da Bibüouca
view. 39 (agosto 1959). 521-37; M. M. Ramos Nacional. 89 (1969). 5-95. 1-91.
de Souza Silva, "Os produtos coloniais e a eco­ 19. ConQOição Velloso. O fazendeiro (u.­
oomi, europ<!ia do s6culo XVIII" (fese de mos­ boa. 1798-1B05); Gomes,Plalllas m.dici.. isdo
Irado. UFRJ. 19&1). p. 106-9. 110; J. Barbosa Brasil (Sio P.ulo. 1972 [Rio de J,neiro. 1798]),
Rodrigues, Hortus flum;nmsis (Rio de Janeiro, p. 8-51; Om... ·Di. ....ertaçdo sobre as plalfliU
1893). p. 109. do Braz;1 quepoJDtf dar linhospara muitos UJO'
16. "Sumário da história do desoobrimento da sociedade, e suprir a falia tU cQ,w;,mo (Rio
da cochonilha no Brasil", O PaJriOllJ, 3 (jan.-fev. de J.neiro. 1810).
1814). eitado por Alden. Royal governmelll. p. 20. Portugal. Código brasi/iense (Rio de Ja­
376-l!. neiro. 1811). l:s.p.; M. Arruda da Om.... Dis­
17. J. M. ConQOição Velloso. O fazendeiro do curso sobre Q utilidade da instituição dejardiM
Brasil. . . 77l11ura,"o, parte I, culJura do índigo nas principaes pro\l(ncias do Brasil (Rio de
(Lisboa, 1798). p. v. A. Rodrigues Fem:ira. Janeiro. 1810).
"Diário da viagem philosophica pela Capirania 21.J. Barbos. Rodrigues.HortusflumÚtensis
de 510 José do Rio Negro". RJHGB. 48 (1885). (Rio de Janeiro. 1893), p. ii-vii, xx ii i. L.
pt. 1:66; M. Ferreira da Clmara, "'Ensaio de d'Abreu. "Relação das pl.ntas exóticas e de
descripção frzica e eoonômica da comarca dos especiarias, cultivadas no Real Jardim di Lagoa
IIM.us na América", Memórias Econômiou da de Freitas·, O Patriota; Jomal Liller4rio, PoU­
Academia Real das Sciências de Lisboa, 1 tico, Mercanti' dc., do Rio tkJtuteiro. l (Mar­
(1789). 316. '1'. 1813). 19-22; Almeida. "Aclimala<;lo". p.
405; Arruda da amara, Discurso sobre a utili­
18. R. de Souza Coutinho Aviso de . . . que
dade. p. 13-14; C. F. S. Cardoso. Ec"""",", e
• •

se poblique uma flora complela e geral.. . " 12 de


sodedad� em áreas coloniaisperifiricas: Guia­
novembro de 1801, ms.-BN- RJ; lbid., "Estabe­
nafrancesa ePará (1750-1817) (Rio deJ.neiro.
lecimento de um jardim botlnioo", Lisboa, S de
1984). p. 156. O mesmo autor ore..." mais
junho de 1802. ms.-BN-RJ; "Antônio Manoel de
detalhes sobre a introdução das especiarias DI
Mello Castro e Mendonça . Rodrigo de Souza
sua tese de douto.. mento: "La Guyanne mnçal­
Cootinho. 510 P.ulo. 12 de outubro de 1802".
se (1715-1871); .speds économiques et so­
DoclUflerllos iIIIerossallles. 93 (1980). "Inspec­
eisux" (Université de Paris X. 1971). p. 349-
<;lo da Mesa de Inspecçio sobre as experi!neias
354.
a que mandara proceder para a cultura da Erva
da Gui� que era oonsiderada um magn([jco 22. D·Abreu. "Relação". p. 22; "Nola sobre
pasto para o gado". 10 de setembro de 1803. e plantas exóticas·, Lagoa de Freitas, 4 de outubro
-Ofiào da mesa da Inspecção para o Visconde de 1811. ms.-BN-RJ; [José Felieiano Castilho]
de Anadia sobre a cultura da herva de Guiné'\ Instrução para os viajantes e empregados IUIJ
10 de .bril de 1804. Arquivo Histórico Ultrama­ colônias... prec:düla de algumas reflaõu so­
riDO, Lisboa, citado em A. L. Cardoso Dias la­ bre a hist6r;a natural doBrazil, (Rio de Janeiro,
neira, et a I . , Trópico/6gicas, rdatório de 1819); Moraes. (mons.) 1n.strucção para os v",­
pesquisa l/(Rio de Janeiro. 1979). Amaral Lapa. jantes e empregados nas colônias sobre a ""'­
"O Brasil e .5 drogas". p. 27-32. Conceição fieira de colher; conservar e remeller os objeclo.s
VeJlooo. Florafluminense (P.ris. 1835). Sobre s i Natural (Rio de Janeiro. 1819). Este
d. Hinóra
história desta obra, veja M. Ferreira Lagos, "Elo­ último � uma indicação de que as colOnias ofi­
gio histórico do padre mestre rr.José Mariano da ciais recentemente instaladas eram amsideradas
Conceição Velloso." RJHGB. 2 (1840). n' 8. uma fonte patenaa! de informações botlnicas.
suplemento; p. 596. Rodrigues Ferreira, Viagem 23. fncontra-se uma lista dos viajantes natu­
filosóf/Cil ao Rio Negro (Beltm. s.d.). Veja • ralistas em J. Monteiro CaminhoA,Elemmlos de
an"ise das expedições pertuguesas por W. J. botânica gual e miJiCil (Rio de Janeiro, 1879),
Simon, Scientific apedirions in lhe Portuguese p. xiii. Saint-Hilaire, Histoire des plaltlu Ies
overseas re"irories ( 1783- 1808) (Lisbo •• plus remarquables du Brisil et du Parapay
228 ES'IlIDOS IDSTORlOOS - 1991/8

(Paris, 1824), p. Ixvii; e Idem, Plo.ntes usu<lIes 25. Sobre caiena, veja J . H . Gallow8y, TN!
du bri.siü<1IS (paris, 1824-28), s.p. suggar ClJIU induslry: an historica{ geograpny
24. Andnde Arruda, O Brasil, p. 613. Sobre /ror. i/$ origi,.. lO 1914 (Cambridge, 1989), p.
o estado dos cultivos exóticos, veja "Prov(ncia de 96-97� Stuart B. Scbwartz, Sugar planta/íons ;,.
lhe forma/ion ofBTluilian society: Bahia 1550- .
Rio de Ianeiro [1814]", PublieaÇÕ<.ooArquivo
PrlNico Na ciOtlal, 9 (1909), 101-26. Sobre fndi­ 1835 (Cambridge. I985), p. 431; 1. Ch. HtU'ser

go e adionilha: J. LIJCCOCk, Notes 011 Rio de e G. aaraz, "Des prinàpeux produits des pro­

Jtuleil'OaM lhe.outloernp<lrts ofBrazjl (London, vinces de Rio-de-Janeiro el de Minas-Gerais",

1820), p. 318; R. Southey, History 01 Brazil, Flores des senes et jardiM de /'Europe, 14
(London, 1819),3:813. Sobre o eM: L do Sacn­ (1859), p. 191. En� as tentativa. de reconstruir
mento, Memória ecorlÔm.;ca sobre a plantação, a história da introdução do car�, veja: [D.J B[oc­
ges de Barros], "Memória sobre o caf�, sua
cultura e p�paração do cNi (lUa de Janeiro,
1825); ToIedo Rendon, "Pe<juena memória de história, cultura e amanhos",O Patriota (maio, '

plantação e cultura de cb'", Auxiliador da IndCls­ 1813), p. 11; e Freire Alemão, M.",ória.
Iria Nacional, 2 (maio 1834), 145-52, (junho 26. A documenlação do Museu Nacional,
1834), 179-85; C. I. Fox Bunbury, "Narrativa de livros 1 a 9, referente aos anos 1810-1869, de­
viagem de um naturalista inglês ao Rio deJaneiro monstra uma preocupação quase exclusiva oom
e Minas Gerais (1833-1835)",Ana" da Bibli",<­ as minas. Sobre a decadência do Jardim Boti­
ea Nacional, 62 (1940), 26; A. Caldcieugh, Tra­ nioo e do cullivo do chá, veja Heusser e Oaraz,
vels in Sou/h America during lhe years "Dez prinàpaux produits," p. 183-189, 1900 .
1819-20-21 (London, 1825), 1:27-9, 30; Samuel
BaII,AII account o/lhe cu!t;1.IQIÜHt and manufac­
lIue of I<a in China (London, 1848), p. 36()'1,
368. O aJltivo do chá roi tentado sem SIJCeSSO na
Carolina do Sul por voltade 1813; veja William
Saunders, Tea-cubure as Q probable American
iMUJ1Ty (Washington, 1879), p. 5. Alden, Wa rren Dean � professor do Depa rtamenlo
"Growtb and productivity," p. 58-60. de História da New York University.

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