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ANÁLISE ERGONÔMICA DO POSTO DE TRABALHO DO

OPERADOR DE CARGA DE UMA DISTRIBUIDORA DE


GLP (GÁS LIQUEFEITO DE PETRÓLEO)

ERGONOMIC ANALYSES OF THE WORK PLACE OF


THE CARGO OPERATOR OF A LPG (LIQUEFIED
PETROLEUM GAS) DISTRIBUTOR

André Luiz Ferreira de Barros


Engenheiro Mecânico
Universidade Federal de Mato Grosso
Faculdade de Arquitetura, Engenharia e Tecnologia
Rua K, 91, Residencial Green Park, Casa 07, Village Flamboyant, Cuiabá, MT
Fone: (65) 3025 1973. E-mail: andrebarros@bol.com.br

Profa. Dra. Denise Cardoso Gonçalves


Universidade Federal de Mato Grosso
Faculdade de Arquitetura, Engenharia e Tecnologia
Depto. de Arquitetura e Urbanismo. Fone: (65) 3615 8711.
E-mail: ddgonçalves@uol.com.br

Profa. Dra. Marta Cristina de Jesus Albuquerque Nogueira


Universidade Federal de Mato Grosso
Faculdade de Arquitetura, Engenharia e Tecnologia
Depto. de Arquitetura e Urbanismo. Fone: (65) 3615 8711. E-mail: mcjan@ufmt.br

Profa. Ms. Joceli Fernandes Alencastro B. de Albuquerque Lins


Universidade Federal de Mato Grosso
Faculdade de Arquitetura, Engenharia e Tecnologia
Depto. de Enfermagem. Fone: (65) 3615 8711. E-mail: jocelilins@yahoo.com.br
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RESUMO

O presente estudo foi realizado junto aos trabalhadores da área de expedição de uma
distribuidora de GLP (Gás Liquefeito de Petróleo), e teve por objetivo geral analisar
qualitativamente as condições do trabalhador no exercício desta atividade, evidenciando
os problemas de saúde oriundos deste tipo de atividade. A intenção foi utilizar as
ferramentas da análise ergonômica do trabalho para descrever os problemas críticos do
posto em questão e sugerir melhorias que resultem em melhor qualidade de vida para o
trabalhador deste setor.

Palavras-chave: GLP, Saúde, Postura, Ergonomia, Trabalho.

ABSTRACT

The present study was carried out with workers of the dispatch sector of a LPG
(Liquefied Petroleum Gas) distributor; it has like general objective to do a qualitative
analyze of the workers conditions in the exercise of their activity, showing the health
problems from its kind of activity. It pretended to use the ergonomics works analyze
tools to describe critical problems of the work post and to suggest improvements that
result in a best life quality to the workers of this sector.

Keywords: LPG, Health, Posture, Ergonomics, Work.


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1. Introdução

A comercialização de GLP (gás liquefeito de petróleo) surgiu no Brasil nos


anos 50, para facilitar a vida das pessoas que até então utilizavam lenha e carvão
para cocção dos alimentos. Atualmente, o GLP está presente em quase 100% dos
lares brasileiros e gera milhares de empregos diretos e indiretos.
A distribuidora de GLP consiste em um estabelecimento industrial cuja
finalidade principal é o envasamento do produto em embalagem adequada e sua
distribuição através de caminhões específicos para tal.
Entre as várias atividades desempenhadas pelos trabalhadores de uma
distribuidora de GLP, a atividade de carga dos caminhões de distribuição vem a ser
uma das mais desgastantes, exigindo grande esforço físico dos trabalhadores e
colocando em risco a saúde do trabalhador.

Justificativa

As condições do trabalhador no carregamento de botijões de gás no Brasil,


com raras exceções, não evoluiu nas últimas décadas. O sistema de carregamento
dos caminhões que transportam o produto, ainda é manual.
Sabe-se que a atividade de carregamento de caminhões de gás é comum e
necessária no processo produtivo de uma distribuidora de GLP. Entretanto, com
relação aos problemas de saúde que possam ser oriundos desta atividade laboral,
percebe-se que, em geral, não são levadas em consideração, tanto pelos próprios
trabalhadores quanto pelos responsáveis ou empresários. Deste modo, este estudo
visa à análise crítica deste tipo de atividade, ou seja, uma avaliação qualitativa das
condições em que estes trabalhadores executam suas atividades laborais.

Objetivos

1.2.1 Gerais

Analisar as atividades exercidas pelos trabalhadores do setor de expedição de


uma distribuidora de GLP no carregamento de caminhões.

1.2.2 Específicos

a) Observar as condições de trabalho dos trabalhadores das distribuidoras no


carregamento de cilindros de GLP;
b) Identificar os problemas que poderão afetar a saúde do trabalhador deste setor;
c) Evidenciar indicadores qualitativos da análise do trabalho;
d) Propor melhorias no processo com o objetivo de melhorar a qualidade de vida
dos trabalhadores;
e) Conscientizar trabalhadores e empregadores sobre a importância da ergonomia
na organização do trabalho.
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2. Pressupostos teóricos

2.1 Análise ergonômica do trabalho: indicadores qualitativos, segundo


GONÇALVES (2004).

a) Análise da demanda: Definição do problema a ser analisado, é o ponto de partida


da análise ergonômica do trabalho. A demanda pode ter origem de pessoas ou de
grupos diversos da empresa, isto é, diretamente dos trabalhadores, das
organizações sindicais ou ainda da direção da empresa. A análise da demanda é
parte integrante da analise da situação de trabalho e ao analista cabe conduzir
esta análise.
b) Análise da tarefa: A tarefa é um objetivo a ser atingido. Sua análise coincide
com a análise das condições dentro das quais o trabalhador desenvolve suas
atividades de trabalho; para tanto é conveniente distinguir três fases distintas,
que estão inter-relacionadas: sistema homem-tarefa a ser analisada, identificação
das exigências do trabalho e avaliação destas exigências.
c) Análise das atividades: São as atividades que podem ser levantadas, através dos
métodos e técnicas que podem ser aplicáveis numa situação de trabalho.

2.2 Modelo Biomecânico de Chaffin (1984)

Segundo o modelo biomecânico de Chaffin (1984), a relação entre a carga


suspensa e a sua distância da coluna vertebral permite calcular o momento (força x
braço da alavanca) no nível dos quadris, que vai derivar na força de compressão dos
discos intervertebrais. O resultado é mostrado na figura 1. Podemos deduzir destes
dados que a força de compressão cresce com o aumento do peso e com a distância
mão-coluna vertebral.

Figura 1: Força de compressão calculada sobre o disco intervertebral entre o sacro e


a L5 para diferentes pesos na mão e quatro distâncias diferentes entre a mão e a
coluna vertebral. 9,8 N (Newton) = 1 kgf. (Fonte: GRANDJEAN, E. Manual de
Ergonomia, 1998, 90).
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2.3 Valores Limites da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Genebra,


1969.

Estes valores limites, mostrados na tabela 1, são recomendações da


Organização Internacional do Trabalho. Assim como os valores anteriormente
apresentados para o levantamento de cargas, devem ser tomados apenas como
orientação geral, e não oferecem, sob nenhuma condição, uma segurança absoluta de
evitar complicações de coluna.

Tabela 1: Cargas possíveis (em kg) no levantar esporádico e freqüente.

Adultos Jovens
Homens Mulheres Estudantes Meninas
Eventualmente 50 20 20 15
Freqüentemente 18 12 11-16 7-11

Fonte: Organização Internacional do Trabalho (OIT), Genebra, 1969.

2.4 Valores limites para o calor, segundo a norma NR-15, da Portaria nº 3.214 de
08 de junho de 1978.

O anexo 3 da NR-15 (1978) estabelece os limites de tolerâncias para


exposição ao calor, ou seja, intensidade máxima relacionada com a natureza e o
tempo de exposição ao agente, que não causará dano à saúde do trabalhador, durante
sua vida laboral. O referido anexo dispõe:

Limites de Tolerância para exposição ao calor, em regime de trabalho intermitente


com períodos de descanso no próprio local de prestação de serviço.

1. Em função do índice obtido, o regime de trabalho intermitente será definido no


Quadro Nº 1.

QUADRO Nº 1: Limites de Tolerância de IBUTG para trabalho intermitente com


períodos de descanso no próprio local de trabalho

REGIME DE TRABALHO INTERMITENTE COM TIPO DE ATIVIDADE


DESCANSO NO PRÓPRIO LOCAL DE TRABALHO
(por hora) LEVE MODERADA PESADA
Trabalho contínuo até 30,0 até 26,7 até 25,0
45 minutos trabalho
31,0 à 30,6 26,8 à 28,0 25,1 à 25,9
15 minutos descanso
30 minutos trabalho
30,7 à 31,4 28,1 à 29,4 26,0 à 27,9
30 minutos descanso
15 minutos trabalho
31,5 à 32,2 29,5 à 31,1 28,0 à 30,0
45 minutos descanso
Não é permitido o trabalho, sem a adoção de acima de acima de acima de
medidas adequadas de controle 32,2 31,1 30,0

Fonte: Anexo 3, NR-15, da Portaria nº 3.214 de 08 de junho de 1978


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2.5 Parâmetros estabelecidos para levantamento, transporte e descarga individual


de materiais segundo a norma NR-17, da Portaria nº 3.751 de 23 de novembro
de 1990.

A NR-17 (1990) estabelece os parâmetro de condições de trabalho com as


características psicofisiológicas, de modo a proporcionar o máximo de conforto,
segurança e desempenho eficiente. Os subitens 17.2.3 e 17.2.4 dispõem:

Todo trabalhador designado para o transporte manual de cargas, que não as leves,
deve receber treinamento ou instruções satisfatórias quanto aos métodos de
trabalho que deverá utilizar com vistas a salvaguardar sua saúde e prevenir
acidentes.

Com vistas a limitar ou facilitar o transporte manual de cargas deverão ser usados
meios técnicos apropriados.

2.6 Características da carga

2.6.1 Produto

Nomenclatura comercial: GLP (Gás Liquefeito de Petróleo); Química:


Aproximadamente 50% Propano (C3H8) e 50% Butano (C4H10); Densidade: Fase
líquida 550 kg / m³; Fase vapor 2,2 kg / m³; Limites de inflamabilidade: 2-10%;
Poder Calorífico: 11.500 kcal/kg.
O GLP não possui cor nem odor, no entanto por segurança, é adicionado ao
mesmo, uma quantidade muito pequena de mercaptana, conferindo ao GLP forte
odor em caso de vazamento; Toxidez: Não é tóxico, no entanto, pode causar asfixia
ao homem.

2.6.2 Embalagem

Nomenclatura comercial: Botijão de 13 kg ou P13; Construção: Aço carbono


repuxado e soldado; Volume interno: 31 litros ou 0,031 m³; Carga de GLP: 13 kg
(fase líquida); Massa do botijão cheio: em torno de 28 kg; Pressão interna: entre 7 e
8 kgf/cm².
O botijão (cilindro) de GLP não explode. Ele é construído para suportar uma
pressão de aproximadamente de 80 kgf/cm². Todo botijão dispõe de válvula de
segurança ou plugue fusível, material fabricado de estanho, que se abrirá a uma
temperatura, geralmente de 70ºC, permitindo a liberação do gás e conseqüentemente
a perda de pressão no interior do vasilhame, impedindo a ruptura da chapa.
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Figura 2: Botijão de 13 kg de GLP

3. Metodologia e observações

Para obtenção dos dados utilizados no trabalho, inicialmente foram feitas


entrevistas com dois trabalhadores de carga de caminhões, sobre as atividades
realizadas pelos mesmos durante suas rotinas de trabalho em dias e horários
alternados. A partir dos dados reunidos foram identificados os problemas,
atribuições do posto de trabalho e aspectos da vida pessoal dos funcionários.
As atribuições do posto de trabalho dos trabalhadores é exclusivamente o
carregamento de botijões de gás em caminhões específicos para a distribuição do
produto. O trabalho não exige grande utilização dos estímulos visuais e auditivos,
mas, um grande esforço muscular. No decorrer das verificações foi observado que
os trabalhadores descansam períodos intercalados no próprio posto de trabalho
(Figura 11).
Através das observações in loco do posto de trabalho foi possível perceber os
diversos movimentos constrangedores associados ao enorme esforço físico
despendido pelos trabalhadores, tais como, carregamento contínuo de botijões, com
a coluna vertebral e pernas curvadas e torcidas, permanecendo de pé toda a jornada
de trabalho (Figuras 6 a 11).
É importante salientar que no período vespertino os trabalhadores ficam
expostos ao sol, conseqüentemente a altas temperaturas. Na coleta de dados para
análise do conforto térmico, foi utilizado um termômetro de globo.
Para coleta dos dados referentes a salários, jornada de trabalho e benefícios,
foram entrevistados o gerente e o encarregado de produção, os quais, apresentaram o
organograma da empresa estudada (Figura 3).
O organograma abaixo nos dá uma idéia geral da estrutura organizacional da
empresa, destacando os responsáveis pelo setor operacional da distribuidora.
Geralmente uma distribuidora é formada por várias unidades espalhadas por pontos
comercialmente estratégicos do território nacional, os setores operacionais das
unidades são comandados pelos supervisores de operações que, por sua vez,
responde ao gerente de operações, responsável por várias unidades. Assim, dada a
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grande pressão por resultados, no sentido vertical do organograma. É nesse cenário


– no final do organograma – que se encontra o operador de carga de uma
distribuidora.

Figura 3: Organograma de uma distribuidora de GLP

Por fim, através de visitas a outras distribuidoras de GLP e após ouvir


diversos trabalhadores deste setor, foram levantadas algumas sugestões de melhoria
do posto de trabalho visando amenizar o esforço dispendido neste tipo de atividade.

4. Compreensão do ambiente de trabalho dos operadores de carga nas


distribuidoras de GLP.

O trabalhador de carga de uma distribuidora de GLP é, em geral, um


trabalhador proveniente dos segmentos de transportes, logística e construção civil. A
maioria destes trabalhadores passa a vida trabalhando com carga e descarga de
produtos diversos.
O trabalhador de carga trabalha 8h48min por dia de segunda-feira à sexta-
feira, completando assim às 44h semanais. O horário de início das atividades é as
07h30min e término às 17h18min, tendo 1h00min para almoço e descanso, das
11h30min às 12h30min e, 10 min para lanche e descanso, das 15h00min às
15h10min.
A remuneração do trabalhador do setor é razoável quando comparamos com
a remuneração de outros trabalhadores do segmento de transportes de outras
empresas. Embora razoável esta remuneração atende com alguma dificuldade as
necessidades básicas da família do funcionário.
O trabalhador deste setor recebe um salário base de R$ 576,23, salário
estabelecido pela Convenção Coletiva de Trabalho 2005/2006 entre sindicatos do
setor de gás e empresas, a partir de setembro de 2005.
Por ser o GLP um combustível de considerável poder calorífico e pelo seu
manuseio ser regimentado por criteriosas normas de segurança, o profissional do
setor recebe ainda um adicional de periculosidade igual a 30% do salário base, ou,
R$ 172,87 somados no valor acima, totalizando R$ 749,10.
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Uma prática desenvolvida no setor é a remuneração correspondente a 70%


do salário base do trabalhador denominado PL (Participação dos Lucros), pago todo
ano no mês de outubro. É importante destacar que, no que se refere aos benefícios
oferecidos pelas distribuidoras de GLP, houve conquistas para os trabalhadores do
setor, proveniente das negociações entre sindicatos e empregadores, tais como,
assistência médica e odontológica, vale gás, vale refeição, seguro de vida, auxílio
creche (R$ 60,00), vale transporte, vale alimentação (cartão de débito automático
válido nas principais redes de supermercados da cidade – valor R$ 148,00) e
reajuste anual do salário obtido através de dissídio coletivo da categoria, tendo como
data base o mês de setembro.
É importante salientar que, todos os benefícios oferecidos pelas
distribuidoras de GLP, assim como a faixa salarial diferenciada na qual se encontra
o trabalhador, não elimina para o trabalhador, os riscos à sua saúde, geralmente
graves e irreversíveis, pois, foi observado que a atividade exige do trabalhador que o
mesmo assuma posturas constrangedoras e utilize grande esforço físico, uma vez
que a atividade, se resume a empilhar botijões construídos em aço carbono,
armazenando GLP líquido e totalizando aproximadamente 28 kg por botijão –
análise das atividades.
Levando-se em conta que são expedidos em média 7.000 botijões por dia,
cada operador de carga, num total de 02, ergue e empilha manualmente 98 toneladas
por dia, metade desta carga manuseada sob o sol (figura 4), uma vez que o setor de
expedição da empresa estudada se encontra, durante os períodos vespertinos,
desprotegidos dos raios solares – análise da tarefa.
O trabalho desenvolvido pelos carregadores exige além de uma boa condição
física, movimentos repetitivos associados a um grande esforço físico considerado
penoso (empilhamento de botijões de GLP) – análise da demanda.
Como se pode observar através das figuras 6 a 10, cada botijão é empilhado
sem a utilização de quaisquer equipamentos ou meios técnicos apropriados que
facilitem o carregamento realizado pelos trabalhadores, como estabelece a norma
NR-17 supracitada. Infelizmente esta norma, assim como as recomendações da
Organização Internacional de Trabalho para levantamento de carga, que limitam a
18 kg a carga possível no levantamento freqüente para homens, não são seguidas
pelas distribuidoras de GLP.
Sob o ponto de vista do conforto térmico, através de visitas ao posto de
trabalho entre os dias 21 e 23 de novembro de 2005, ficou evidenciado que pela
manhã os trabalhadores demonstravam mais motivação e vigor na realização de suas
atividades e conseqüentemente maior produtividade, fato este confirmado pelo
Encarregado de Produção, enquanto que no período vespertino, sem a proteção dos
raios solares, os mesmos trabalhadores expressavam sonolência, cansaço,
impaciência e ritmo de trabalho mais lento, ocasionando baixa produtividade.
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Tabela 2: Tempos de trabalho e descanso na carga de caminhões.

Período Tempo Trabalhado Tempo de Descanso


60 min 23 min 26 seg 36 min 34 seg
60 min 25 min 03 seg 34 min 57 seg
60 min 23 min 30 seg 36 min 30 seg
60 min 24 min 18 seg 35 min 42 seg
60 min 24 min 12 seg 35 min 48 seg

Analisando os limites de tolerância para exposição ao calor, em regime de


trabalho intermitente com períodos de descanso no próprio local de prestação de
serviço, obtiveram-se as leituras constantes na Tabela 3, colhidas no dia 23 de
novembro de 2005 com o auxílio do Termômetro de Globo Instrutherm Modelo
TGD-100.

Tabela 3: Temperaturas medidas no local de trabalho, carga de caminhões.

Ativ. Metab. Tempo


Atividade Tbn (ºC) Tg (ºC) Tbs (ºC)
(kcal/h) (min)
Carregar 27,0 47,0 40,8 450 24
Descansar 27,3 50,1 41,1 150 36

Onde: Tbn, Temperatura bulbo úmido natural; Tg, Temperatura de globo e; Tbs,
Temperatura de bulbo seco. Para ambientes externos com carga solar IBUTG = 0,7
Tbn + 0,1 Tbs + 0,2 Tg.

IBUTG = (∑ IBUTGi x ti) / (∑ ti) = 32,8ºC


M = (∑ Mi x ti) / (∑ ti) = 270 kcal/h

Onde: IBUTG é o Índice de Bulbo Úmido – Temperatura de Globo e; M é a taxa de


metabolismo média ponderada.

A partir dos resultados obtidos e considerando o tempo de descanso e a


atividade como sendo pesada, conclui-se que a atividade é insalubre, pois, o Anexo
Nº 3 da NR-15, Portaria nº 3.214 de 08 de junho de 1978, estabelece que, o máximo
IBUTG permitido para uma atividade pesada está compreendido entre 26,0ºC e
27,9ºC para um regime de trabalho intermitente com períodos de descanso no
próprio local de trabalho. Como esse local apresentou IBUTG médio igual a 32,8ºC,
concluímos que há risco de sobrecarga térmica, e deste modo, o IBUTG encontrado,
caracteriza a atividade como insalubre e gera o direito a aposentadoria especial.

4.1 Riscos envolvidos na atividade de carga

a) Queda de botijões devido empilhamento instável, provocando lesões ou até


fraturas nos membros inferiores;
b) Quedas e tropeços devido às precárias condições dos assoalhos de madeira dos
caminhões transportadores;
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c) Fadiga muscular: acontecimento agudo, doloroso, que o atingido sente em sua


musculatura sobrecarregada de forma localizada (GRANDJEAN, 1998);
d) Dores musculares: provocada por uma seqüência rítmica de contração e extensão
– portanto de tensionamento e afrouxamento – da musculatura em trabalho;
e) Lesões de discos intervertebrais: causados pelo sobrecarregamento da coluna
vertebral e por posturas não naturais do corpo;
f) LER / DORT (colocar por extenso);
g) Incêndio e explosão: pode ser causada pela coincidência da ocorrência de uma
centelha em meio a uma concentração entre 2 e 10% de GLP no ar, suficiente
para ocorrer a combustão do GLP.

Em relação às doenças do Calor, destacam-se as seguintes:

a) Insolação: sensação geral de mal-estar; apesar da boa vontade, falta de


capacidade de produção; pele avermelhada e freqüência cardíaca fortemente
elevada com um pulso de tato difícil; fortes dores de cabeça, tonturas, falta de ar
e às vezes, vômitos e após grandes perdas de sal, câimbras musculares, e por
fim, inconsciência;
b) Exaustão do calor: decorre de uma insuficiência do suprimento de sangue do
córtex cerebral, resultante da dilatação dos vasos sangüíneos. Uma baixa pressão
sangüínea é o evento crítico resultante;
c) Desidratação: inicialmente reduz o volume do sangue, promovendo a exaustão
do calor, podendo chegar à deterioração do organismo. A desidratação acarretará
na ineficiência muscular, redução da secreção, acúmulo de ácido nos tecidos,
febre e morte quanto mais elevada for a intensidade;
d) Câimbras de calor: são os espasmos musculares, seguindo-se uma redução do
cloreto de sódio no sangue;
e) Choque térmico: quando a temperatura do núcleo do corpo põe em risco algum
tecido vital.

4.2 Perfil do trabalhador estudado

Com o propósito de conhecer o perfil deste trabalhador, optamos por agrupar


as condições de trabalho observadas, o discurso do trabalhador através de entrevista
(conforme modelo anexo).
Para desenvolver as atividades deste setor, é exigida altura mínima de 1,78m,
idade entre 18 e 25 anos e porte físico compatível com a função segundo o Gerente
de Produção entrevistado.

4.2.1 Quem são estes trabalhadores?

Visando preservar as identidades dos trabalhadores estudados, foram eleitos


nomes fictícios, alfa e beta.
Trabalhador Alfa: 24 anos de idade, altura 1,83 m, casado, dois filhos,
residente do bairro Pedra 90 no município de Cuiabá, meio de transporte é o ônibus,
moradia alugada, escolaridade 2º grau completo, possui atividade extra como
desenhista arquitetônico, possui computador e pretende fazer faculdade em
computação para conseguir um emprego melhor.
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Trabalhador Beta: 27 anos de idade, altura 1,85 m, casado, dois filhos,


residente do bairro Industriário no município de Cuiabá, meio de transporte é a
bicicleta, moradia própria, escolaridade 1º grau completo. Após o expediente de
trabalho, o trabalhador executa pequenas atividades domésticas, consideradas leves,
tais como, lavar louça, varrer o quintal e cuidar das crianças. Está satisfeito com o
trabalho atual.
Através da entrevista, observamos que o trabalhador Alfa demonstrou ser
mais crítico e determinado a mudar às suas condições atuais, enquanto o trabalhador
Beta demonstrou ser acomodado e não possuir grandes aspirações.
Ao perguntar como o trabalhador se sentia desempenhando suas atividades,
foram obtidas as seguintes respostas:
“Nos dois primeiros meses eu sentia dores musculares terríveis. Eu tinha
que tomar analgésicos para conseguir dormir, pois, acordava no meio da noite com
câimbras”.
“As dores eram horríveis, muitas noites eu tinha pesadelos de tanto que
eram as dores musculares. Minha esposa me pedia para mudar de emprego”.
Nestas respostas, verificamos que o trabalho é extremamente pesado e
fatigante, principalmente para os iniciantes.
Quando perguntado sobre a relação com os superiores, foram obtidas as
seguintes respostas:
“O chefe é muito estressado e exigente, não existe amizade entre nós”.
“O chefe é muito exigente, só se preocupa com a produção”.
Percebemos nas respostas acima, que não existe bom relacionamento entre o
superior e seus subordinados, o superior não compartilha com os subordinados dos
momentos de descanso.

Figura 4: Incidência de raios solares ao longo do dia no ambiente de trabalho do


operador de carga
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Figura 5: Veículo de distribuição

Figuras de 6 a 10: Seqüência de movimentos realizados pelos trabalhadores de carga


durante a jornada de trabalho.

Figura 6: Costas inclinada e torcida, ambos os braços abaixo dos ombros e de pé


com uma das pernas esticadas.
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Figura 7: Costas inclinadas, ambos os braços abaixo dos ombros e de pé com as


pernas esticadas.

Figura 8: Costas inclinada e torcida, ambos os braços abaixo dos ombros e de pé


com uma das pernas esticadas.
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Figura 9: Costas inclinada e torcida, ambos os braços abaixo dos ombros e de pé


com uma das pernas esticadas.

Figura 10: Costas inclinadas e torcida e ambos os braços abaixo dos ombros.
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Figura 11: Descanso no local de trabalho

5. Recomendações e Sugestões

A partir da análise dos dados obtidos durante as observações no


carregamento de caminhões com botijões de gás de cozinha, foi possível propor
algumas modificações visando melhorias nas condições de trabalho no posto
estudado. Dentre as sugestões propostas estão algumas alterações mecânicas nos
equipamentos que fazem parte do processo produtivo e aquisição de equipamentos
para dinamizar e melhorar o posto de trabalho.

Sugestões recomendadas

a. Instalação de lança telescópica com regulagem de altura e controle do


movimento longitudinal. Através desta melhoria, o trabalhador não estará sujeito
a movimentos de flexão da coluna vertebral e das pernas, pois o produto estará
numa altura adequada para o carregamento, conforme figuras 12 e 13.
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Figura 12: Retração do transportador tipo lança telescópica a medida que o


caminhão é carregado.

Figura 13: Exemplo prático de um transportador tipo lança telescópica utilizada


para auxiliar o carregamento de caminhões.
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b. Utilização de cilindros leves para armazenamento de gases liquefeitos sob


pressão. Fabricados de materiais compostos (plástico reforçado), ou seja,
cilindros plásticos totalmente revestidos por plástico reforçado, acarretando
numa redução de peso entre 60 e 80% quando comparado com cilindros de aço.
Isto acarretaria um aumento de 2 a 4 vezes o custo final do cilindro, no entanto,
traria benefícios enormes para o trabalhador, uma vez que a massa total do
cilindro cheio reduziria de 28 para 17 kg, deste modo, obedecendo os valores
limites recomendados pela Organização Internacional do Trabalho;
c. Utilização de paletes e elevador hidráulico conforme utilizado em alguns países
europeus;
d. Implementar sistema de adaptação por etapas para novos trabalhadores e os que
retornam de férias, por exemplo, começar com uma fração do tempo de trabalho
sob calor e nos dias subseqüentes, cada dia adicionar ao tempo anterior mais
uma pequena fração até perfazer às 8h48min diárias;
e. O estudo acima nos mostra que, pelo IBUTG obtido, ainda que aumentássemos
o tempo de descanso, não sanaríamos o problema, teríamos que efetivamente
adotar medidas de controle, tais como, insuflação de ar fresco no local onde
permanece o trabalhador, utilização de barreiras refletoras colocadas entre a
fonte e o trabalhador e descanso fora do local onde a atividade é realizada;
f. Utilização de bloqueador solar pelos trabalhadores expostos aos raios solares;
g. Hidratação contínua dos trabalhadores;
h. Implantação de sistema de rodízio entre os trabalhadores de produção e os
trabalhadores de expedição (carga) com o objetivo de diminuir a carga de
trabalho e quebrar a rotina dos trabalhadores do posto estudado;
i. Treinamento freqüente dos trabalhadores sobre postura, radiações não
ionizantes, alimentação, hidratação e qualidade de vida.

6. Considerações finais

Através da realização deste trabalho foi possível observar a importância da


Análise Ergonômica do Trabalho como forma de intervir na relação entre o trabalho,
todas as variáveis que ele engloba, e o trabalhador. A aplicação dessa metodologia
traz benefícios não só para os trabalhadores, mas também para a empresa. Ficou
claro que é impossível descartar a importância da ergonomia de correção, dado que
o planejamento de postos de trabalho nem sempre é feito seguindo as orientações da
ergonomia. É preciso que cada vez mais, as pequenas e grandes empresas, se tornem
cientes da importância da ergonomia como forma de proporcionar mais conforto e
segurança a seus funcionários e como um investimento que acarretará um ganho de
produtividade e diminuição dos custos relacionados a problemas de saúde e
acidentes. A partir desta conscientização, a ergonomia deixará de ser uma
preocupação ligada a custos operacionais e passará a ser vista como um
investimento primordial para a garantia de qualidade, produtividade e saúde do
trabalhador.
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7. Bibliografia

GONÇALVES, D. C. O discurso sobre as relações educação-saúde-trabalho, de


professores universitários e trabalhadores da construção civil – Dissertação de
Mestrado. Florianópolis: UFSC, 1996.

____________. Introdução à Análise Ergonômica do Trabalho in Manual da


Disciplina de Ergonomia. Cuiabá: UFMT, 2004.

DURANTE, L. Calor e Frio nos Ambientes de Trabalho in Manual da Disciplina de


Higiene do Trabalho. Cuiabá: UFMT, 2004.

SALIBA, T. M. Manual Prático de Avaliação e Controle de Calor – PPRA. 2ª ed.


São Paulo: LTr, 2004. ISBN 85-361-0565-8.

GRANDJEAN, E. Manual de Ergonomia – Adaptando o trabalho ao homem. 4ª ed.


Porto Alegre: Bookman, 1998. Reimpressão 2004. ISBN 85-7307-353-5.

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BRASIL. Portaria Nº 3.214, de 8 de junho de 1978. Aprova as Normas


Regulamentadoras – NR – do Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do
Trabalho, relativo à Segurança e Medicina do Trabalho. Diário Oficial da União, de
06 de julho de 1978.

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Sons, New York, 1984.

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Sistemas a Gás, SENAI – RN, 2004.

MOREIRA, Guilherme J. P. Cilindros Leves: Usos para GLP e GNV.


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Anexo 1 – Questionário utilizado na entrevista com os trabalhadores de carga

1. Como você se sente desempenhando suas atividades no trabalho?


2. O Que leva você a sentir-se bem?
3. O Que leva você a sentir-se mal?
4. Qual o período que você sente mais dificuldade para desempenhar sua função?
5. Você tem alguma dificuldade na atividade de carregamento de caminhões?
Quais?
6. Você se entrega totalmente à atividade de carregamento de caminhões? Porque?
7. O que você mais gosta no seu ambiente de trabalho?
8. Qual sua opinião sobre a utilização das EPI’s?
9. Que melhorias poderiam ser implantadas no carregamento de caminhões?
10. Como é o seu relacionamento com seus superiores?
11. Você se sente pressionado pelos seus superiores?
12. Acha que sua remuneração é suficiente pela atividade desenvolvida?
13. Você está satisfeito com os benefícios recebidos?
14. Como você se sente depois do trabalho?
15. Qual o meio de transporte utilizado para chegar ao trabalho? E vice-versa?
16. Quais são suas atividades de lazer?
17. Exerce alguma atividade após o expediente normal de trabalho?
18. Você faz algum curso de qualificação?
19. Quando é necessário trabalhar em regime especial (hora extra), você acha sua
remuneração adequada?

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