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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.

Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa


Objeto de estudo da Filosofia no Oriente e no Ocidente
Autor: Jean Sidcley Álvares Teixeira (no prelo)
A Filosofia no Ocidente:
Quando nos deparamos com a Filosofia na Cultura Ocidental, podemos cair na dificuldade de não saber
exatamente o objeto de investigação deste campo do conhecimento. Em um mundo regido pelo que é pragmático,
técnico e prático, corremos o risco de olhar para a Filosofia e afirmar que ela é uma reflexão que, com a tal ou
sem a qual, o mundo continua tal, qual, igual. Tal atitude diante da Filosofia se liga a um mundo regido por
respostas imediatas e imediatistas, onde não existe espaço para a dúvida, a indagação e a reflexão do pensamento
sobre si mesmo.
Podemos afirmar que Filosofar é PENSAR. Mas, surge a primeira indagação: Será que tudo o que pensamos
pode ser considerado Filosofia? Somos capazes de mensurar e ter consciência de tudo o que pensamos em um
único dia? Confesso que quando comecei a conhecer e a me apaixonar pela Filosofia, cultivei uma impressão
ingênua e, por isso, achava que o simples fato de estar diante de um ser humano, era o suficiente para reconhecer
nele um filósofo. Sem conhecer as pessoas, partia sempre do princípio de que todo homem é necessariamente
um ser pensante (uma res cogita). Com o passar dos anos, percebi que mais sábio é afirmar que todo ser humano
possui capacidade de pensar e que, por isso, pode resolver utilizar tal potencial em algum momento ou
circunstância.
Hoje, quando me dedico a refletir sobre o pensar filosófico a fim de diferenciá-lo dos demais tipos de
pensamento, costumo perguntar para as pessoas o seguinte: Quando você pensa, você pensa para quê? Com esta
questão vou ouvindo várias respostas: “Penso para agir. ” “Penso para tomar decisões. ” “Penso para refletir. ”
“Penso porque não me desligo. ” “Penso para rever e avaliar. ” E aqueles que dizem que nunca pensaram nesta
questão.
Contudo, neste estudo, vamos partir do princípio de que só é considerado filosófico o pensamento cuja
intenção esteja voltada para o conhecimento. Isto não quer dizer que todas as vezes que filosofamos, estamos
necessariamente produzindo conhecimento. O simples fato de intencionar o conhecimento já é Filosofia. Na
Filosofia, a pergunta é sempre mais importante do que a resposta. Quando filosofamos, levantamos perguntas. A
pergunta filosófica não é fácil e nem difícil. A pergunta filosófica é GRAVE. A pergunta grave é aquela indagação
que nos desinstala e nos compele no dever de sermos mais nós mesmos, naquilo que já somos e fazemos, no que
falamos e ouvimos, no que tocamos e sentimos, no que cremos e esperamos.
Podemos dizer que tudo no mundo pode ser objeto de investigação da Filosofia. Ou tudo no mundo pode
ser Texto (tecido do latim). Por isso, para se compreender o filosofar, há que se afunilar o pensamento em duas
possibilidades. Quando pensamos, podemos produzir certezas sobre coisas (SUJEITO X OBJETO) e certezas sobre
pessoas (SUJEITO X SUJEITO).
Ao filosofar sobre coisas, a intenção é produzir dominação imaterial e posse interna de um determinado
objeto. Ter dominação imaterial ou posse interna de uma realidade é produzir um conceito sobre o ser.
Conceituar (do latim conceptum = conceber) é ter o domínio e a apreensão completa do ser.
Quando alguém faz opção pela área de saúde, automaticamente dizemos em Filosofia que esta pessoa está
fazendo opção pela relação de SUJEITO x SUJEITO. Contudo, salvo as justas exceções, no processo de formação
deste profissional, há um foco acentuado na doença e pouco envolvimento com a pessoa. Tal formação, de caráter
racionalista e mecanicista secciona o ser humano em peças anatômicas e o profissional se especializa no seu
recorte ou objeto de estudo. Assim, quase não conhecemos no Ocidente uma Medicina do doente, pois há um
grande esmero na Medicina da Doença. Assim, o ser humano em sua integralidade (ou continumfísico, espiritual,
mental e emocional) é desconsiderado quando da realização de diagnóstico e tratamento de patologias. Há
inclusive a ênfase na objetividade e imparcialidade na relação do paciente com o profissional da área de saúde.
Valoriza-se a impessoalidade, o não-envolvimento com questões que extrapolem os elementos do tratamento e
tudo isso respaldado na chamada Ética Profissional.
Quando filosofamos sobre Pessoas (SUJEITO X SUJEITO), deparamo-nos com a impossibilidade de
produzir dominação imaterial e posse interna do ser humano. Em filosofia, dizemos que refletir sobre pessoa é

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conhecer o ente ou parte do seu ser. Conhecemos dos outros somente aquilo que eles nos revelam. A pessoa que
desejo conhecer só revela para mim aquilo que ela consegue ou deseja revelar, dentro de sua sanidade, delírio ou
incerteza sobre si mesma.
Ao produzir conhecimento sobre pessoas perdemos a segurança conceitual, pois a pessoa é sempre
reveladora de novas nuances. Aquele que se dedica a uma Medicina do Doente, não se restringe aos conceitos já
cristalizados. Ele está sempre pesquisando e dialogando com outros profissionais e outras áreas. A cardiopatia
não é somente uma disfunção do coração... A lombalgia não se restringe à coluna... a hipertensão... O diabetes... a
depressão... Tudo carece de uma compreensão interdependente... Todas as áreas se tornam importantes, não
existem os detentores máximos do conhecimento. A vaidade cede espaço para o diálogo. O diálogo constrói as
conexões e o reconhecimento da própria ignorância sobre determinado assunto se torna o princípio da
Sabedoria.
Para fechar estas considerações sobre o objeto de estudo da Filosofia no Ocidente, há que se dizer que
Pensar é apreender de modo Lógico. Sabe-se que a Filosofia do Ocidente surgiu no século VI antes nas Colônias
Gregas da Ásia Menor, quando os gregos daquela região “descobriram” o Logus (Razão) na mente humana. A
partir daí, criou-se na Cultura Ocidental o pressuposto de que a Verdade é Lógica, isto é, produzida pelo
pensamento e pela especulação racional. Esta razão vai ao longo tempo sofrendo alterações até se chegar ao
recorte técnico, científico e tecnológico da Sociedade Contemporânea.
No Mundo Ocidental se desejo formar um ser humano pensante o lugar especifico para tal fim é a escola
ou o meio acadêmico. Quando no estudo da gramática de uma língua nos dedicamos à morfologia ou à sintaxe, o
objetivo primeiro é o desenvolvimento do raciocínio lógico e discursivo. Aprender o que seja artigo, pronome,
preposição, verbo, conjunção, advérbio, sujeito, predicado, oração, período e muitos outros é saber fazer análise
lógica e abstrata da língua e da linguagem, ou seja, quando escrevo este livro ou faço uma palestra, não estou o
tempo todo fazendo análise morfológica e sintática de todas as palavras, orações ou períodos que escrevo ou falo.
Por outro lado, nunca em minha infância resolvi um problema concreto de minha vida porque sabia a raiz
quadrada de 64. Nunca presenciei um diálogo ou um debate onde as pessoas chegassem a um consenso
existencial ou social tendo como caminho a resolução de um Sistema ou de uma Equação Matemática.
Estudamos e passamos muitos anos na Escola pois vivemos em uma Sociedade que separa o Mundo das
Ideias do Mundo Concreto. Uma vez ouvi de um filósofo, especialista em Teoria do Conhecimento: “Se você quiser
se afastar da realidade, teorize-a.” Nunca me esqueci desta fala tão polêmica. Será que tudo que aprendemos na
Escola e tudo que apreendemos em nossas avaliações foi realmente relevante para a nossa vida diária? Sabemos
que por que aprendemos?
Hoje, como educador e formador de novos pensantes, me pergunto: será que sei da validade da Filosofia
e do Pensamento quando entro em uma sala de aula para ensinar algo aos meus alunos?

A Filosofia no Oriente
Filosofar no Oriente é Intuir. Tal afirmação é enigmática, uma vez que nem sempre estamos habituados
culturalmente a acreditar ou dar confiança para a Intuição. Para mergulharmos fundo em busca de um
entendimento sobre o que seja a Intuição é interessante salientar que, na Cultura Ocidental, do século VI a.C.,
quando surgiu a Filosofia na Grécia até o século XIX d.C., criou-se uma mentalidade patriarcal e machista na
produção de conhecimento e, por isso, se concebeu durante muitos séculos a ideia de que o pensamento é uma
característica eminentemente masculina. Tal preconceito pode ser verificado quando olhamos para a História do
Conhecimento e percebemos a prevalência dos saberes masculinos ou de teorias produzidas unicamente por
homens nos períodos históricos da antiguidade ao mundo contemporâneo.
Por causa desta tendência, criou-se na Cultura Ocidental a ideia de que o homem nasceu para pensar. A
ele interessa o que é abstrato e essencial. Como ser pensante, ele deve ter a primeira e a última palavra em tudo.
Suas decisões são silenciosas e acertadas. Homem não chora e nem se ilude emocionalmente. A mulher por sua
vez, por ser desprovida da capacidade racional de fazer abstração, deve ser movida pelos sentidos e pelos
sentimentos. A ela interessa a aparência, os detalhes e uma postura emotiva diante da vida. A mulher é romântica
e pode manifestar o que sente. A ela é concedido o direito e o dever de enfeitar-se. Contudo, ela não deve se meter
em tramas masculinas, pois deve viver à sombra do homem (Pai, Irmão, Marido...).
Em algumas mulheres do Ocidente era possível verificar uma maneira diferenciada de produzir
conhecimento. Tal maneira suplantava os sentidos e brotava a partir de pistas que vinham mescladas de
sentimentos sobre o que fazer ou qual decisão tomar. Os antigos chamavam tal ferramenta de “Sexto Sentido”,
maneira até então pejorativa e preconceituosa de se considerar o que tratarei aqui neste estudo por Intuição.
Algumas mulheres intuitivas eram tidas como loucas ou desvairadas. Na Idade Média, eram vistas como bruxas

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ou aquelas que haviam vendido sua alma ao demônio. Deveriam ser expurgadas da Sociedade sendo incendiadas
nas fogueiras da Inquisição. Se fizermos um estudo do perfil de pessoas que passaram grande parte ou toda a sua
vida em manicômios, encontraremos muitas pessoas que foram tidas como loucas ou desequilibradas por
manifestarem uma sensibilidade intuitiva completamente repudiada pela Cultura Racionalista e Patriarcal.
Se pensar é apreender a realidade de modo lógico e abstrato, podemos afirmar que Intuir é sentir a
realidade de modo energético. Se quando pensamos, teorizamos e nos afastamos da realidade, quando intuímos
cultivamos sempre mais a capacidade de admiração com as coisas mais simples. Quando pensamos, enchemos a
mente de ideias e tomamos posse conceitual de todas as coisas. Quando intuímos nos esvaziamos para captar a
energia que emana de todas as coisas. O intuitivo é movido pela contemplação da interconexão existente entre
todas as coisas. Por isso, todos os detalhes são muito importantes, pois tudo se encontra interligado. O intuitivo
não censura o sentir e procura sempre decodificar de modo energético as emoções.
Se para formar um bom pensante, precisamos inseri-lo numa academia, para estabelecermos vínculos
energéticos oriundos da Intuição, precisamos fazer a experiência da Presença. Isto é, precisamos estar presentes
naquilo que somos e fazemos. Quando estou tomando banho, preciso presenciar e saborear o meu banho e a
revitalizada energética que ele me proporciona. O mesmo precisa se dar na alimentação, na relação com as
pessoas, nas nossas leituras, no lazer, no trabalho, etc. Muitas vezes, fazemos algo com a mente e alma voltada
para o que irá acontecer. Ficamos ausentes e sofremos de ansiedade, pré-ocupação e muita frustração. Quando
tomamos o nosso café da manhã, já estamos maquinando mentalmente o que irá acontecer após o café, o almoço
e a noite. Fazer da vida uma experiência de presença é fazer dela uma meditação constante, assim como fazem
as pessoas que praticam a filosofia zen. Muitas vezes, ouvimos dizer que uma pessoa zen é completamente
desligada e alheia a tudo e a todos. Grave engano. A experiência zen supõe uma presença cosmificadora no
Cotidiano. Isto é, quando estou presente, contribuo com a minha presença e intervenção para a harmonia do
universo. Aqui no Ocidente usamos uma expressão que retrata muito bem a falta de presença: dizemos tal pessoa
estava de “corpo-presente”, ou seja, o seu corpo estava ali mas a alma viajava para outras dimensões.
O ser que produz filosofia a partir da Intuição constrói uma única relação filosófica, a saber: SUJEITO X
COSMOS. Nesta relação, a meta é descobrir a teia que interliga todas as coisas. Assim, quanto mais a pessoa intui
sobre o Cosmos mais evidente e claro fica o entendimento de que quem intui é também Microcosmo. Produzir
conhecimento via intuição é auto conhecer-se como a personificação do Universo.
Para o Oriental Intuitivo, existem três elementos que não se separam na compreensão energética que
desenvolvemos sobre todas as coisas: EU-DEUS-NATUREZA. Vale dizer, há uma sintonia rítmica em que o
humano não se separa da natureza, a natureza não se separa de Deus, e Deus não se separa do Homem. Isto quer
dizer que tudo o que afeta a natureza, afeta o homem e afeta também a Deus, três realidades que personificam a
unidade interdependente entre todas as coisas. A ideia é que eu me olhe no espelho e diga para mim: Eu sou eu,
eu sou a natureza, eu sou deus...
Se um mestre intuitivo lhe oferece uma gota d’água e lhe dá como Missão não permitir que esta gota seque
jamais, você precisa lançá-la no Oceano. Se a gota d’água for você, é lançando-se no mundo, sendo plenamente
você mesmo em conexão com todas as coisas, é que você vai entender a imensidão da conexão energética,
respeitando o fluxo de todas as coisas.
Se percorrermos as Escolas Filosóficas Tradicionais do Mundo Oriental, vamos perceber a preocupação
com o elemento que unifica todas as coisas. Os hinduístas insistem no Brahman, a energia que se manifesta em
todo o universo, sendo o homem atman ou a manifestação mais sublime dessa energia. Para os Budistas, é
combatendo o apego e a frustração, decorrentes da desconexão energética com o cosmos, é que o homem vai
perceber a conexão existente entre todas as coisas. Para os Chineses (Confucionistas e Taoístas), o elemento
unificador é o eterno fluxo de yin/yang, polaridades energéticas opostas que mantém a harmonia do Universo.
Para os zen japoneses, o elemento unificador supõe a busca do equilíbrio no cotidiano, isto é, fazendo da rotina
uma forma de atingir o equilíbrio e uma existência cosmificada.
Para o intuitivo do Oriente, a Energia do Cosmos se manifesta em todas as coisas e a harmonia só é
possível quando há fluxo ou movimento. Para os indianos e chineses, a estagnação é sinônimo de pouco
crescimento espiritual e o primeiro sintoma das doenças. Para os chineses, o Chi ou a Energia Vital do ser humano,
herdada pelos pais no ato da concepção, é revitalizada e mantém o seu fluxo através do ar que respiramos, dos
alimentos que ingerimos e das relações que travamos com as pessoas e a natureza ou o mundo. Para os indianos,
o estado de maya ou o encantamento retratam a estagnação e o enfraquecimento da energia vital. Para as
Medicinas Energéticas, o lugar que ocupamos no mundo e a maneira como lidamos com as nossas questões são
os elementos mais importantes para a conquista e preservação da saúde e da qualidade de vida.

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Na literatura oriental, de um modo geral, há uma insistência na questão do Karma como uma forma de
entender o eterno fluxo de todas as coisas na condição humana. O karma é um dos elementos da Filosofia Oriental
que carecem de um significado preciso e profundo, visto que existem interpretações equivocadas sobre o mesmo.
Lembro-me que na infância, no interior onde morei, sempre ouvia as pessoas dizendo: “o meu karma é sofrer. ”
“Estou passando por isso pois estou pagando com o meu karma algo que fiquei devendo em outras vidas. ” Ao
estudar a Teologia Cristã e ler alguma literatura de base espírita, percebi que há um equívoco muito grande na
mente das pessoas da Cultura Ocidental quanto ao significado do que seja okarma. Pude notar que há uma
transposição da idéia de pecado e de culpa da doutrina cristã para a vivência do karma. Tal interpretação não se
liga a nenhuma literatura especifica de doutrinas espíritas, mas a uma má interpretação do senso comum.
Na Filosofia Oriental, o karma quer dizer ação. É pelo karma que a energia do universo flui em todas as
coisas. Quando escrevo este livro ou me dedico à educação de minhas duas filhas e à convivência harmoniosa e
amorosa com a minha esposa, estou realizando o meu karma. Trata-se de uma oportunidade de fazer fluir em
mim e em todas as coisas a energia produtora da harmonia do universo. O karma (a ação) impede a estagnação
e a doença. O karma nos faz vivos e nos compele no desejo de nos tornarmos melhores do que já somos. Sabemos
pela Física que toda ação produz uma reação. Contudo, não se trata de fardo, culpa ou dívida a ser paga. Não
somos culpados por nossas escolhas e ações, somos Sujeitos. Há um poeta que nos diz: “Ah, que bom que Deus
nos fez assim: Hoje, dizemos não, mas amanhã, dizemos sim. Lindo, é ver alguém se levantar, enxugar os olhos,
virar a página e recomeçar...” (Padre Élio Athayde)
Desde criança, sempre escuto alguém dizer: “Fulano é uma anta...” Há mais ou menos dois anos, escutei
em um retiro espiritual a seguinte explicação: “Anta é um animal que quando se encontra em apuros e não sabe
o que fazer, ela acaba batendo com a cabeça em todas as coisas e, se não for orientada, acaba se ferindo e pode
até morrer...” Quando escutei tal explicação, logo me remeti internamente ao Karma e refleti que as ações que
realizamos e escolhas que fazemos nem sempre plenificam o nosso karma. Não é por que estamos em atividade
que estamos fazendo acontecer o eterno fluxo do karma. Sabemos que algumas ações e escolhas contribuem para
o desequilíbrio e a desarmonia do Universo. Por isso, vez por outra, é bom que nos perguntemos: Será que sei
que o vim fazer neste mundo? (...) Estou desempenhando o que vim fazer neste mundo?
Você poderia se perguntar: Como saberei responder a estas duas questões? A resposta é simples: Sendo
quem você é, fazendo o que você faz, sonhando com o que você sonha, produzindo o que você produz e se
envolvendo com quem você se envolve, você se sente plenamente realizado? É este o tesouro que faz arder o seu
coração? É nisso que você quer gastar a sua vida?
A sua presença no mundo é cosmificadora ou caótica? As pessoas se alegram com a sua presença? Você é
uma pessoa pro-ativa? Que tipo de gente você atrai? Que assuntos você mais desenvolve? O que você gosta de
ler? Você repete para si mesmo expressões do tipo: “Tudo em minha vida é mais difícil do que na vida dos outros.”
“Nada em minha vida é fácil.” “Não tenho sorte com nada.” Estas e outras afirmações nos dizem de uma
desesperança e tendem a jogar a nossa anima (alma) sempre para baixo. Tais atitudes geram estagnação em
nosso karma e tudo desanda.
Você é daquelas pessoas que sempre que recebe um presente, trata logo de retribuí-lo? Quando é
elogiado por alguém sempre diz que é bondade do outro, pois você não é tão bom assim? Quando alguém diz
que você está bonito, você diz que a sua roupa é velha e que está mal arrumado? Cuidado com estas e outras
reações... Preste atenção no recado que você está dando para o Universo: Eu não sou competente... Eu não mereço
receber presentes... Eu não vejo beleza em mim...
Ouvi uma vez de um consultor de relações humanas em um curso de Gestão Administrativa o seguinte
relato. Segundo ele, em uma empresa ou empreendimento, há varias instâncias que dão certo e também coisas e
projetos que ficam emperrados.Para este consultor e também para mim, a estagnação é fruto da disposição
energética das pessoas. Há pessoas que estão sempre vibrando na possibilidade de que algo dê errado. Elas nunca
pensam que a inovação, a transformação e o empreendedorismo podem ser viáveis. Elas se apegam ao velho e
são sempre nostálgicas em qualquer época. Sempre dizem que no passado tudo era bem melhor. Estas pessoas
formam uma teia pesada, estão sempre exaustas e muito propensas a doenças. Olham para a novidade como
ameaça e por isso, fazem de tudo para vetar novos projetos e novas iniciativas. Em alguns casos, essas mesmas
pessoas criam um departamento perverso (mas bem vigoroso) chamado DIVA (Departamento de Informações
da Vida Alheia). Ali, elas maquinam contra os outros, fomentam conflitos nas relações e vibram com as quedas
e os fracassos das pessoas e dos empreendimentos. Quanto mais nos sobra tempo para o DIVA, mais carentes
estamos de projeto de vida. Mais distantes estamos de nosso karma. Agimos como “antas” e nem percebemos a
vida passar. Quando acordamos, estamos envelhecidos e doentes. Carregamos o fardo da desesperança, não
acreditamos mais na vida e na felicidade. Tornamo-nos pessimistas e afirmamos sempre que Viver é sofrer e a

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frustração é a norma. Não saboreamos a integridade do ego e, por isso, repetimos de tempos em tempos: “Ah, se
eu tivesse 18 anos com a cabeça que tenho hoje?” Quando alguém diz isso após os 60 anos, poderíamos indagar:
“O que você não fez aos 18?” Se tivermos uma pessoa de 18 anos com uma visão de mundo de quem tem 60,
estaremos diante de uma pessoa descompensada que precisa ser tratada a fim de não negligenciar a juventude.
Um outro elemento da Filosofia Oriental que nos é muito caro nesta reflexão é o DHARMA. Não teríamos
uma tradução literal na língua portuguesa para este termo, mas poderíamos dizer que o dharma é a orientação
do karma. O dharma nos aponta o sentido, a intenção ou o porquê da ação ou da escolha que vamos fazendo no
decorrer de nossa existência. Vez por outra me deparo com pessoas que dizem estarem fazendo uma síntese
pessoal e substantiva das experiências acumuladas na vida a fim de confirmar algumas coisas e empreender
algumas mudanças substanciais. A partir daí, muitas delas traçam metas, refazem caminhos, reduzem ou
prolongam a jornada de trabalho, o investimento intelectual, o lazer, o cuidado com a saúde, a relação com a
família, a afetividade, a sexualidade, etc. Elas entendem que quem nunca pára e olha para dentro de si mesmo, a
fim de estabelecer uma sintonia entre o karma e o dharma, tende a ficar vazia, isolada e sozinha.
Participando há muitos anos atrás (por volta de 2003) de um Seminário de Auto-Conhecimento, aprendi
e apreendi uma ferramenta que se tornou muito valiosa na minha consciência de karma e dharma. Com o
facilitador daquele seminário, aprendi que ninguém tem que... nada na vida. Há pessoas que dizem o seguinte de
si mesmas: “Tenho que acordar às 05 da manhã todos os dias, tenho que enfrentar o trânsito pesado para chegar
ao trabalho, tenho que trabalhar 10 horas por dia, tenho que almoçar fora de casa, tenho que economizar durante
o mês para que eu consiga saldar as minhas dívidas “, etc... Neste seminário, aprendi que posso substituir o
tenho que pelo eu escolho. Quando faço uma lista do meu cotidiano e digo que tenho que..., minha vida se torna
um fardo, sinto-me carregando uma cruz que depositaram em meus ombros. Percebo-me culpado e infeliz.
Quando substituo o eu tenho que pelo eu escolho, torno-me sujeito de minha história. Se aparece em minha
lista que escolho acordar às 05 da manhã e enfrentar todos os dias um trânsito carregado para chegar ao trabalho
e estas duas coisas não fazem parte das minhas escolhas fundamentais, neste momento, deparo-me com o meu
karma e dharma interpelando-me: que tipo de movimento ou de projeto posso construir para a minha existência
a fim de ser capaz de retirar do meu cotidiano e do meu viver tudo aquilo que não escolho ou não acredito? Neste
momento, estou me movimentando para sair da estagnação e dar um novo sentido para o meu viver. Isto é
conquistar a integridade do ego a fim de se evitar a desesperança.
Que pena que muitas pessoas só acordam para isso depois de uma doença grave ou algo que a limite ou
ameace a própria vida. Já escutei de pessoas que sobreviveram a tumores malignos: “Quando descobri que estava
doente e que havia maior possibilidade de morrer do que de me curar, fiz, naquele momento opção pela vida...
Decidi que queria viver e corri atrás dos recursos, lutando contra o tempo... Ao adoecer, descobri que estava
levando a vida dessa ou daquela maneira. Hoje, estou curado, e dei um novo sentido para a minha vida. Na
literatura sobre Medicina Energética dizemos que neste caso a doença foi o caminho primoroso para que esta
pessoa fizesse opção pela vida com um sentido dharmico e uma fluiçãokármica. Contudo, sabemos que nem
sempre as pessoas conseguem aprender com as doenças ou com aquilo que ameaça a vida. Há aquelas que
sobrevivem ao tumor maligno, não se refazem existencialmente e, por isso, a doença tende a voltar devastadora
arrebatando a vida daquela pessoa.
Em minhas aulas de Filosofia Oriental para os profissionais de saúde que se dedicam ao Estudo da
Medicina Tradicional Chinesa, costumo dizer aos estudantes que a fluição é sinônimo de harmonia e de saúde.
Por isso, vez por outra é interessante para a pessoa e para o Universo que se faça uma “faxina” energética do seu
entorno, dando um destino ou fluição para tudo o que se encontrar estagnado em nosso cotidiano. A harmonia e
a saúde supõe atividade e fluição. Por isso, ao abrirmos o armário onde guardamos nossas roupas, precisamos
nos livrar de tudo o que guardamos neste espaço e que não é utilizado em nenhum momento. Quando fazemos
isso, purificamos o nosso quarto ou o cômodo de nossa casa onde se localiza o armário. Da mesma forma,
devemos fazer fluir os nossos livros, os nossos papéis, tudo aquilo que guardamos em uma determinada época e
que, com o passar do tempo acaba perdendo o sentido. Papel, livro, apostilas entulhados tornam o nosso
escritório ou ambiente de estudo um lugar maçante e que não nos envolve para o estudo e o cultivo intelectual.
O que fazemos com as melhores toalhas de banho e rosto que temos em casa? Guardamos para as visitas? Elas
irão chegar quando? E as roupas de cama mais confortáveis e aconchegantes? Elas enfeitam os baús? Não somos
merecedores de um banho revitalizador? A nossa cama não deve ser mais confortável do que a poltrona que
compramos para a sala de visitas e que temos tão pouco tempo para repousar nela? Quantas horas você passa na
poltrona? E na sua cama?
Por que guardamos os copos de cristal e tomamos suco e água no copo de requeijão ou de extrato de
tomate? Por que guardamos na Cristaleira sombria e solitária as porcelanas, as xícaras de chá, o agueiro de prata,

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o faqueiro gigantesco que ganhamos de presente? Por que guardamos dinheiro e vivemos na miséria? Por que
tudo é para o futuro, quando a vida acontece a cada instante... Observe como estagnamos o nosso entorno...
Observe como a energia de nossa casa pode nos adoecer. Como entulhamos as coisas, nos apegamos e
esquecemos de zelar pela melhor parte que é a vida e vida em plenitude.
Há pessoas que vez por outra relatam: “Sábado fiz uma faxina lá em casa. Comecei bem cedo e fui até a
noite. Tirei tudo o que era velho e que não tinha mais sentido e dei um destino para o que não mais me servia.
Quando terminei tudo, estava exausto. Contudo, tomei um bom banho e senti que a minha casa estava muito mais
leve e aconchegante.” Esta atitude é sábia e é um dos melhores investimentos que podemos fazer em nossa vida
e no universo. Você quer mudar o mundo? Ok, bela iniciativa... Pode começar arrumando o seu quarto!

Os caminhos do conhecer no Ocidente e no Oriente


Quando dizemos neste livro que Filosofar no Ocidente é pensar e no Oriente é intuir, isto não quer dizer
que os orientais não pensem ou que os ocidentais não intuam. Na verdade, trata-se de uma questão de foco, isto
é, a formação do ocidental prioriza mais a dimensão racional e a do oriental a questão energética.
Em sala de aula, quando começamos a discutir as características da Intuição, pergunto aos estudantes se
alguém ali se considera uma pessoa intuitiva. Ao escutar aqueles que se dizem intuitivos, com raras exceções,
essas pessoas relatam as suas experiências energéticas a partir de alguma situação de dor, sofrimento ou choque.
Escuto coisas do tipo: “quando perdi minha mãe, abracei-a naquela manhã e senti que aquele seria o nosso último
contato” ou ainda: “quando o telefone tocou em minha casa, alguma coisa me dizia que meu pai havia morrido”,
“senti que não deveria ter estacionado o carro naquele lugar, mas não dei confiança para aquilo e, quando voltei,
o carro havia sido arrombado”...
Estas e outras experiências podem causar em nós a falsa impressão de que a Intuição é reveladora de
desgraças ou daquilo que causa o nosso desequilíbrio e sofrimento. Mas isto não é verdade. Isto acontece, porque
em momentos de grande choque, temos a tendência de perder a dimensão racional da realidade, não
conseguimos com o pensamento um entendimento daquele momento. Então, nos abrimos para outras maneiras
de apreender, contemplar e entender a realidade. Por isso, acabamos descobrindo o potencial intuitivo existente
em cada um de nós.
Com este capítulo, quero aprofundar ainda mais no paralelo que estamos realizando sobre a Razão e a
Intuição. Para tanto, vou me servir de algumas características que podem ser percebidas quando nos deparamos
com um conhecimento obtido pela abstração conceitual ou com um conhecimento construído a partir da conexão
energética. Para tanto, vou me servir de um quadro conceitual que será detalhado nas páginas seguintes:

Ocidente – PENSAR Oriente - INTUIR


Linear Cíclico
Progressivo Tradicional
Unilateral Holistico ou Sistêmico
Sentidos X Razão Sentimento + Intuição
Opostos: Contrário, Contraditório e Opostos: Complementares.
Subalterno

Linear – Cíclico
Uma formação que prioriza a racionalidade e uma leitura abstrata da realidade tem como característica
marcante o apreço pela linearidade. Ser linear é ter a capacidade de olhar para todas as coisas e eventos a partir
das categorias de princípio, meio e fim.
Assim, quando somos alfabetizados ainda na infância, aprendemos que uma produção de texto fica bem
escrita quando podemos perceber o princípio, o meio e o fim do texto. Na adolescência, aprendemos também na
escola que um trabalho bem feito precisa ser estruturado a partir de uma Introdução, Desenvolvimento e
Conclusão. No Ensino Superior, nas aulas de Metodologia Científica aprendemos que um Trabalho Científico é
constituído de uma parte pré-textual, uma parte textual e uma pós-textual. Aprendemos, ainda que a
apresentação deste material obedece regras rígidas de formatação e que podem mudar de tempos em tempos
(ABNT).
A linearidade desenvolvida na formação escolar é aplicada em todas as dimensões de nossa existência.
Partimos sempre da premissa de que a vida possui princípio meio e fim. Quando nos deparamos com um jovem
de 19 anos, muitas vezes dizemos: “Você nasceu ontem...” Quando alguém diz que tem 40 anos, dizemos: “Que
bobagem, a vida começa aos 40” (maneira carinhosa de dizer que tal pessoa já está no meio da vida...) e quando

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nos deparamos com alguém que já passou dos 70 anos, dizemos: “Não se preocupe, a medicina está muito
evoluída...” (maneira de sutil de dizer que tal pessoa já está no fim da vida ou fazendo hora extra). Além disso,
dividimos a vida em pedaços evolutivos: infância, puberdade, adolescência, juventude, maturidade ou idade
adulta e terceira idade. Quando encontramos um adulto infantilizado, temos o hábito de dizer que tal pessoa está
sem linha.
Para as pessoas de mente linear, o mundo também possui princípio, meio e fim. Vez por outra, alguém diz
estar chegando o fim do mundo... Somos lineares em praticamente tudo: aprendemos que se começamos
qualquer coisa, sempre devemos levá-la até o fim. Quando nos deparamos com pessoas que mudam sempre de
rotas, escolhem novas profissões, mudam o seu estilo, maneira de pensar e encarar a vida, temos a tendência de
achar que estas pessoas não possuem linha ou que estão sem identidade ou perdidas na vida...
Apesar de todo risco, não podemos radicalizar a linearidade enxergando-a unicamente em seus aspectos
limitantes. A linearidade é valorosa quando nos ajuda a organizar, estabelecer caminhos, conscientizar-se do que
já foi percorrido e prever o que virá. Tudo o que somos no Ocidente é fruto da linearidade. A nossa maneira linear
de produzir conhecimento nos conduz e nos gera segurança. O que não necessitamos é da radicalidade ou do
extremismo infundado.
Por outro lado, o intuitivo insiste em olhar para a realidade de modo cíclico. Isto é, para o intuitivo, as
coisas não possuem necessariamente princípio, meio e fim, elas duram de eternidade em eternidade. Vale dizer,
um adulto não foi criança, adolescente ou jovem... Ele é criança, adolescente e jovem. Isto é, de tempos em tempos
retomamos estes ciclos em nosso existir.
Há momentos em nosso existir que temos a sensação de que “um urubu defecou sobre nós”. Esta sensação
se liga ao fato de que tudo parece desandar em nosso cotidiano ou tudo parecer não dar certo. Na mentalidade
cíclica, saber e sentir isso é de suma importância. Primeiro, porque desenvolvemos a consciência de que esta não
é a nossa única realidade. Trata-se de um ciclo e não de uma resignação. Quando sabemos disso, nos fortalecemos,
enfrentamos os desafios e damos a volta por cima. Precisamos estar presentes na vida a fim de que possamos nos
inebriar do dia e da noite, da alegria e da tristeza, da saúde e da doença, do yin e do yang, do samsara e do nirvana,
da existência daliti e brâmane...
Acompanhando espiritualmente um grupo de profissionais de uma Instituição Educacional, tive a
oportunidade de escutar de uma senhora muito simples o seguinte relato sobre o seu viver: “Minha vida foi
sempre muito sofrida. Casei-me jovem e só depois descobri que meu marido era alcoólatra e violento... Fui
levando a cruz... Meus filhos cresceram e, entre eles, aquele que se tornou o meu protetor e guardião sofreu um
acidente de motocicleta e, hoje, está em cima de uma cama, de fraldas e completamente dependente... A minha
meta é aposentá-lo por invalidez... Mas, até isto está muito difícil...” Consternado com o relato, perguntei a ela: “A
senhora acredita em Deus?” Ela prontamente respondeu que sim. E mais uma vez, eu perguntei: “O que a senhora
aprende com Ele?” Ela me disse: “Deus me ensina todos os dias que devo aceitar resignada... Esta é a minha
realidade... Foi esta a cruz que Ele me deu para carregar!” Neste momento, tentei mostrar a ela que Deus é amor
e que por nenhum motivo Ele quer o nosso sofrimento ou dor. Disse a ela que Deus está dentro dela e, com esta
energia que ela precisa abastecer-se para alcançar um outro ciclo.
Relatos como esse estão sempre muito próximos de nós. Contudo, para que as pessoas consigam
conquistar outros ciclos é muito importante que elas se sintam merecedoras. Somos merecedores de saúde, de
paz, de tranqüilidade, de conforto, de afeto, de reconhecimento e de tudo o que pode nos fazer mais plenos e
cheios de vida. Se estamos presentes na dor e no sofrimento, precisamos começar a celebrar o contrário. Por isso,
aprenda sempre a receber elogios, sinta-se competente, conte com os verdadeiros amigos, receba e se dê
presentes. Invista em seus sonhos. É assim que nos habilitamos para darmos conta das tempestades e
intempéries que se nos ocorrerem.
Repare como a energia de sexta-feira à noite nos é agradável, quando teremos o final de semana para
descansar... Por que o domingo à noite nos angustia? Se nos sentimos merecedores da sexta-feira e de um bom
final de semana, automaticamente, estamos reabastecendo a nossa energia vital para o enfrentamento das
segundas-feiras da vida.
A dimensão cíclica na Filosofia Oriental nos desperta para a possibilidade energética das coisas e eventos
se repetirem em nós e na natureza. Assim, tudo o que é marcante em nós e no mundo, tende a estabelecer um
retorno. Por isso, precisamos estar presentes com a capacidade de admiração com as coisas mais simples. Todas
as Filosofias do Oriente partem do princípio da reencarnação. Tratam-se de ciclos de evolução e plenificação em
que o Espírito ou a Alma vai contemplando as polaridades opostas e complementares de todas as coisas
(nascer/morrer; yin/yang).

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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.
Progressivo – Tradicional
Em nossa formação sempre aprendemos que devemos progredir... Devemos ser o melhor filho, o melhor
aluno, o melhor marido (esposa), o melhor profissional, etc. Tal expectativa é colocada sobre todos nós e, às vezes,
damos conta, outras vezes, nem tanto...
Gosto sempre, quando discuto a idéia ocidental de progresso, de perguntar aos profissionais da área de
saúde e as pessoas de um modo geral, como elas acham que a nossa cultura lida com os idosos. Escuto sempre
dos profissionais que lidam muito com a terceira idade, relatos de um público carente, muito esquecidos pelos
entes queridos e que deseja falar, ser levado em consideração e, sobretudo, reconhecido em sua história de vida
e dignidade. O idoso tem necessidade de falar de si, de contar a sua história, de rememorar o passado e, muitos
deles, não encontram disposição nas pessoas mais jovens para a realização de tal intento. Por causa disso, na
Sociedade Brasileira, nos últimos anos, eles têm sido alvo de golpes, trotes, endividamento. Alguém liga apara a
casa do idoso solitário, lhe dá um pouco de atenção, o elogia e o suficiente para que aquela pessoa faça a
assinatura de revistas, forneça os dados de seu cartão de crédito, faça empréstimos com juros absurdos, etc. Com
raríssimas exceções, podemos dizer que envelhecer na cultura progressiva é tornar-se um “entulho”, um
“problema” para a família e a Sociedade. Observe o descaso dos nossos governos para com os aposentados... Há,
hoje, no Brasil uma porcentagem muito grande de idosos aposentados e de baixa renda endividados. Os bancos
e as instituições financeiras facilitam a negociação com desconto direto em folha de pagamento e, com isso,
muitos idosos sustentam suas famílias, pagam dívidas de filhos, netos, contraindo empréstimos e mais
empréstimos eternos.
Presenciei certa feita uma relação entre uma filha de mais ou menos 40 anos de idade com a mãe idosa
numa véspera de natal uma situação que expressa bem a nossa relação com os idosos. Aquela senhora havia
recebido o seu 13º salário e iria às compras obter uma lembrancinha para os seus filhos e netos. Uma de suas
filhas, ficou encarregada de acompanhá-la, apesar de sua pouca disposição para tanto. Um dia antes das compras,
esta mesma filha telefonou para a mãe e lhe deu as seguintes instruções: “Mãe, vamos sair às 10h em ponto. Por
isso, a senhora comece a se preparar às 07h, pois a senhora é muito lenta. Quando entrarmos em uma loja, preste
atenção, pois a atendente não quer saber que sou sua filha e que sou médica. Ela não quer saber o que a senhora
fez da sua vida... Seja objetiva. No caixa do supermercado, não bata papo com a moça que vai passar a sua
compra...” E as orientações se seguiram... Sabemos que esta atitude não é, infelizmente, uma exceção na sociedade
em que vivemos. Temos pouca tolerância para com os idosos.
Fico observando a preocupação excessiva que as pessoas tem com a estética neste mundo pós-moderno
que super valoriza a imagem e despreza qualquer tipo de narrativa e profundidade. De um tempo para cá, as
pessoas decidiram que não querem envelhecer jamais. A Medicina Estética se tornou nos últimos tempos uma
área milionária, visto o interesse das pessoas pelo elixir da eterna juventude. Além disso, a infância está cada vez
mais curta. Tenho duas filhas crianças (uma de 05 anos e outra de 02anos), às vezes, as vejo produzidas para uma
festa e enxergo mini-adultas: mini saia, botas, bolsa combinando, maquiagem, anéis nos dedinhos, pulseiras, etc.
A pureza infantil é desprezada e a velhice, a pior doença. Todo mundo precisa ser jovem, magro, musculoso, ter
os cabelos lambidos, precisa estar na moda, ouvir a música do momento. Enfim, tudo precisa soar como
progressivo.
Hospedado uma certa vez em um Hotel em Petrópolis, onde estava dando um Curso de Filosofia Oriental,
percebi que havia um grupo de idosos pertencente ao Movimento da Melhor da Idade que estava curtindo a
região serrana do Rio de Janeiro. Encontrava-me com alguns deles no café da manhã e ficava observando a euforia
e o vigor daquelas pessoas. Num determinado dia, assentei-me na mesma mesa com alguns deles e, conversando,
pude perceber nos mesmos um grande desprezo pela velhice. Eles diziam que possuíam uma rotina de jovens:
praticavam esportes (alguns, radicais), dançavam nos bailes a noite inteira, não se cansavam em viagens,
pintavam todos os fios de cabelos brancos e nunca se lembravam de que haviam chegado à terceira idade. Tive
um sentimento misto de encantamento e susto. Encantou-me o vigor e a disposição daquelas pessoas. Assustou-
me a censura àquelas características mais serenas e contemplativas de quem já viveu muitas coisas na vida... Qual
é o problema dos cabelos brancos, das agulhas de crochê, da cadeira de balanço?... Isto é completamente
censurado, pois não denota progresso!
Defino neste livro o progresso ou o progredir como a capacidade do ser humano de alcançar o novo,
abandonado e desprezando o velho. Almejamos o novo o tempo todo: o novo carro, a nova arquitetura para a
nossa casa ou escritório, o novo recurso tecnológico, o novo Best seller, o novo padrão de beleza, a nova moda
para o nosso guarda-roupa. Tudo o que é velho é desprezível. O velho é dogmático e supõe atraso.
Na mentalidade progressiva, desenvolve-se a cultura do descartável. Tudo possui prazo de validade, até
as relações e os valores éticos. Observe: no passado, as pessoas se enamoravam... Com o passar do tempo, as

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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.
pessoas ficavam... Hoje, os jovens dizem: “Estou pegando”. A afetividade ficou descartável. Tudo agora se
restringe ao jogo do prazer, a uma satisfação imediata e intimista de desejos. A lógica é: “salve-se quem puder, de
preferência eu...” Li certa feita em um jornal, que em uma grande capital brasileira, as casas mais badaladas de
festa de casamento, estavam financiando em até 07 anos uma festa de casamento... Na mesma matéria, o
jornalista dizia que era grande nas varas de família a briga na justiça pela decisão de quem continuaria pagando
a festa, pois o divórcio veio antes do término do financiamento.
No meu contato com os Profissionais da área de saúde, percebo a chamada “tirania da novidade”. Em
todas as áreas, aparecem todos os dias novidades tecnológicas e se o profissional não se apropria daquela
ferramenta ou não faz aquele curso, ele tende a ser visto como retrógado e parado no tempo. Às vezes, para seguir
a onda, incorporamos às nossas práticas elementos nem tão interessantes e abandonamos elementos essenciais
para o sucesso do nosso empreendimento...
Quando marcamos uma consulta médica e chegamos ao consultório e nos deparamos com um prédio
antigo, com uma sala de espera de layout antigo e desatualizado, temos a impressão de aquele médico pode não
ser tão bom ou já se encontra desatualizado. Julgamos muito as aparências e, muitas vezes, acabamos
descobrindo exatamente o contrário!
Por outro lado, quando nos abrimos para a conexão energética ou intuitiva com o mundo, passamos a
enxergar o valor e a perenidade da Tradição ou daquilo que é tradicional. Se fecharmos os olhos e começarmos a
entrar em um processo de meditação profunda, criaremos um cenário repleto de verde, de harmonia, serenidade
e muita paz. Caminhamos mentalmente por este cenário, contemplando a vida e a harmonia que emana de todas
as coisas... Se encontramos nesta experiência de meditação um templo, nele adentramos e percebemos que existe
um mestre que nos espera e, por isso, caminhamos em sua direção. Se neste momento, abrimos os olhos e alguém
nos pede para descrever o mestre, muitas das vezes, as pessoas dizem que se tratava de um velho, de olhar fixo
e sereno, com os cabelos e uma barba longa e branca...
Esta é uma imagem que expressa muito bem a idéia de tradição na cultura oriental. Para a filosofia dos
povos do Oriente, o idoso é um ancião, isto é, ele tem a sabedoria de quem já percorreu o karma, já contemplou
o fluxo dos antagonismos complementares. É zeloso com a tradição e, por isso, precisamos aprender dele e
reconhecê-lo como Mestre. A Filosofia Confucionista na China é considerada uma filosofia dos mais velhos para
os mais jovens. Isto é, cabe aos mais velhos assumir a tarefa de se tornarem mestres daqueles que estão em
formação. Por isso, os hábitos, a culinária, a medicina, a língua, a arte na China fazem parte de uma relação infinita
entre mestres e discípulos compondo uma tradição de mais de cinco mil anos. Aquelas pessoas aqui do Ocidente
que praticam algum tipo de arte marcial oriental são conduzidas, muitas vezes, na relação mestre-discípulo e se
voltam para o apreço com a tradição.
Se pararmos para refletir filosoficamente aqui no Ocidente sobre o termo Tradição, vamos perceber um
certo receio ou resistência de nossa parte em aceitar a validade e o valor de ser tradicional. Quando dizemos que
algo ou uma pessoa é tradicional, temos a impressão de algo rígido, pesado e dogmático. No caso específico do
Brasil e de alguns países da América Latina que passaram por Ditaduras Militares da década de 60 até a década
de 80, Tradição tem sabor de tortura e castração da liberdade e da democracia. Por este motivo, é muito
importante aqui, esclarecer o conceito energético de tradição.
Quando dizemos que a Filosofia Oriental preza a Tradição, estamos entendendo que ser Tradicional é
não precisar desprezar o velho porque o novo chegou. Isto é, para o Oriental, novo e velho podem conviver ao
mesmo lado. Eu não preciso descartar um dos dois. Uma das coisas que mais impressiona um profissional da
área de saúde daqui do Ocidente quando ele começa estudar a Medicina Tradicional Chinesa é saber da validade
dos conceitos desta Medicina mesmo depois de 5000 anos de História. Isto não invalida a novidade. O novo soma,
não exclui... A idéia de oposição cede espaço para a experiência da complementariedade. Hoje, grandes são as
ferramentas tecnológicas disponíveis no mercado para se trabalhar com a acupuntura: laser, eletro
estimuladores de última geração, localizador eletrônico de pontos de energia,moxa elétrica e muitos outros que
podem ter sido inventados ontem e que ainda não nos foram anunciados. Contudo, é fenomenal se perceber que
as novas tecnologias não invalidam as teorias de base, a importância das agulhas, o diagnóstico tradicional pelo
pulso, língua, etc. Ou seja, com tecnologia ou uma sacolinha de agulhas é possível aplicar a acupuntura e promover
a saúde.
Há uns anos atrás dei aulas de História da Medicina no Ocidente e no Oriente para estudantes que estavam
fazendo a formação completa em Medicina Chinesa. Foi surpreendente para aqueles estudantes saber que a
nossa medicina considera folclórica algumas práticas e intervenções que eram tidas como de excelência há 50
anos atrás... Ou seja, a novidade supõe o abandono de práticas antigas. Quando olhamos para as medicinas
energéticas nos surpreende o fato de que as pesquisas científicas contemporâneas realizadas neste campo não

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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.
invalidam a consistência mística e mitológica destas medicinas. Tive uma vez um estudante que, ao término da
pós-graduação em Acupuntura, quis desenvolver um Projeto de Pesquisa para, em uma monografia, retirar da
Medicina Chinesa os princípios de yin/yang. O seu argumento era de que se tornava necessário libertar esta
medicina de conteúdos místicos e mitológicos, fruto de contemplação realizada pelos chineses incultos no
passado e, que, por isso, careciam de justificativas mais plausíveis. Observe, caro leitor, o tamanho da pretensão
e vaidade deste moço! Sei que nunca deu entrada na faculdade a monografia daquele estudante. Ou ele entendeu
a Medicina Chinesa ou desistiu de seu intento, reconhecendo a sua própria ignorância, aliás, segundo o velho
Sócrates, este é o primeiro passo rumo à Sabedoria.
Tenha curiosidade de folhear os cadernos de economia dos jornais que circulam pelo nosso país e observe
o tamanho do crescimento econômico de alguns países da Ásia nos últimos anos. Observe a guinada econômica
dos chineses. A Índia é, hoje, uma das maiores produtoras de tecnologias virtuais do Planeta Terra. Nem seria
necessário citar, pois já nos é clara a posição e respeito devido aos japoneses quando o assunto é invenção
tecnológica. Mas, o que às vezes os jornais e a nossa leitura de mundo não percebe é que eles abraçam o novo,
mas não abrem mão de sua cultura tradicional. O chinês ama a sua língua, as suas práticas espirituais, a sua
medicina, a sua arte, a sua culinária, etc. Certa feita, dando uma entrevista para uma rede de TV sobre Filosofia
Oriental, fui interpelado pelo entrevistador sobre o risco dos chineses perderem esta identidade frente à
velocidade com que eles tem crescido economicamente. Na oportunidade disse ao entrevistador: “É mais fácil o
mundo virar chinês do que o chinês render-se ao mundo...” Em muitos casos, o chinês pode sair da China,
aprender outra língua, viver certo tempo fora do seu país, construir um patrimônio, mas depois de um certo
tempo, ele tende a voltar para a sua terra e sua cultura. Há também aqueles que mesmo distante continuam
vinculados ao seu patrimônio cultural.

Unilateral – Holístico ou Sistêmico


Tanto no Ocidente quanto no Oriente, quando o ser humano decide por produzir conhecimento, é possível
fazê-lo a partir de cinco campos do conhecimento, a saber: Senso Comum, Filosofia, Ciência, Religião e Arte.
 Senso comum: ou conhecimento popular, é o nível mais elementar de conhecimento que uma pessoa pode
produzir sobre a realidade. Ele é um conhecimento valorativo, pois se liga ao estado de ânimo do sujeito
cognoscente, bem como à utilidade prática daquele conhecimento para a sua vida. O conhecimento popular é
assistemático e inexato. Nele, a pessoa aceita como válido aquilo que se ouviu dizer sobre o objeto do
conhecimento. Se aponto para uma pessoa de conhecimento popular uma caneta esferográfica e lhe pergunto o
que é aquilo, ela me responde que é uma caneta e ela não precisa ser mais do que aquilo.
 Filosofia: é um tipo de conhecimento profundo que se baseia no questionamento constante da realidade e, no
caso da cultura ocidental, baseia-se no pensamento e na lógica. A Filosofia é um tipo de conhecimento em que a
pergunta é sempre mais importante do que a resposta. Se aponto uma caneta esferográfica para um filósofo e lhe
pergunto do que se trata, este pode me responder: “Isto é uma caneta por ser uma caneta ou por que me
alienaram e me convenceram de que é uma caneta?” Com isso, o filósofo é movido pela indagação e pelo
questionamento.
 Ciência: baseia-se numa acepção técnica e metódica da realidade. A ciência se caracteriza pela busca de
respostas. O papel do cientista é medir para mudar, prever para prover. O cientista é movido pelo desejo de
intervir na realidade a fim de dominá-la e modificá-la. Ele olha para o homem e o mundo como máquinas a serem
controladas pelo saber técnico. Na Cultura Ocidental, entendemos o saber científico como uma forma de saber
cada vez mais, de cada vez menos... Uma pessoa entra para a Universidade e recebe uma formação científica
generalista na graduação, ao fazer uma pós-graduação lato sensu, escolhe por uma área da formação generalista
a fim de especializar-se. Se toma a iniciativa de fazer especialização strictu sensu (Mestrado e Doutorado), vai
afunilando cada vez mais o seu campo de investigação ao ponto de fechar-se numa única maneira de enxergar a
realidade. Se aponto uma caneta esferográfica para um cientista e lhe pergunto do que se trata, ele vai dizer que
é necessário levantar hipóteses e testá-las em um laboratório antes de afirmar qualquer coisa sobre a caneta. Por
causa disso, podemos encontrar especialistas de tinta de caneta, tampa, layout, matéria-prima, etc. Aqui no
Ocidente, dizemos que o Cientista conhece o ser a partir de suas causas constitutivas. Se substituímos a caneta
pelo ser humano e refletirmos sobre as Ciências da Saúde no Ocidente, vamos perceber os campos de
especialização dos estudiosos, cada vez mais afunilados e restritos. Temos sempre que correr atrás do
especialista naquele assunto. Às vezes, brinco em sala de aula que seria muito interessante que os nossos
hospitais e clínicas disponibilizassem para os usuários carrinhos de supermercado ou de carregar malas de
viagem, uma vez que, a cada especialista que procuramos, cresce a lista de exames que devemos fazer e
apresentar.

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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.
 Religião: baseia-se numa leitura mística (=mistério) da realidade a partir da aceitação de um princípio divino
que rege e governa todas as coisas. A religião também é um conhecimento valorativo, pois se baseia numa
experiência de fé, de base inspiracional e não-verificável. Se aponto a caneta esferográfica para um religioso e
lhe pergunto do que se trata, a sua tendência, muitas vezes, é dizer-me que aquilo é fruto de uma ingteligência
iluminada por Deus. O religioso crê para compreender e quanto mais compreende mais crê. Partindo da
transcendência ou da imanência de Deus, o religioso faz da mística uma forma primorosa de entender a realidade
e tocar a sua vida em frente.
 Arte: baseia-se numa leitura estética da realidade pautada na idéia do belo. Lembro-me que a primeira exposição
de arte contemporânea que visitei foi na minha adolescência (por volta dos 16 anos), quando estive no Rio de
Janeiro com este fim. Quando recebi o convite, empolguei-me, comprei roupas novas, cortei os cabelos, deu um
lustro nos sapatos e, quando entrei para conhecer as instalações, as pessoas me olhavam pensando que eu fazia
parte de alguma instalação ou era alguma peça exposta. Até então, tinha a idéia ingênua de que só é arte o que é
bonito, o que enfeita e nos causa boa impressão na aparência. Ali, na exposição tive dificuldade de entender as
instalações e, ao estudar Estética na Filosofia pude saborear uma das ideias de que o belo é tudo o que é uno,
único e se propõe a estabelecer algum tipo de anúncio ou denúncia. A arte é um campo do conhecimento livre e
aberto à conexão e desconexão com o mundo. Se apresento a caneta esferográfica para o artista, a sua tendência
é investigá-la a partir das categorias do belo ou torná-la uma obra de arte.

Quando dizemos que na Cultura Racionalista, prevalece a visão unilateral da realidade, isso significa que, em
algum momento da vida, a pessoa ou ser pensante precisa decidir por um dos campos do conhecimento acima a
fim de especializar-se e construir o seu diferencial intelectual e profissional. Há, por isso, em alguns momentos,
uma certa rivalidade entre os campos do conhecimento: o homem do senso comum acha que o filósofo é louco; o
filósofo pensa que o homem do senso comum é alienado; para o cientista, a filosofia é algo dispensável; para o
filósofo, o cientista é um mecânico sofisticado; o cientista pode partir do princípio de que a religião é o ópio do
povo e o religioso tem certeza de que o cientista vai para o inferno. O artista prima pela liberdade e, por isso, não
deseja ligar-se ou afastar-se de ninguém. A arte é livre e possui aversão a qualquer afunilamento ou
categorização.
Assim, se sou filósofo, desconheço a ciência e vice-versa; se sou cientista, tenho aversão pela religião. Com
isso, ao invés de nossa formação alargar a nossa compreensão de mundo, ela tende a nos fechar.
Tenho experiência docente de trabalhar com estudantes de 1º período de cursos diversificados. Como
professor de Filosofia, Metodologia Científica e Ética para aqueles que estão ingressando no Mundo Acadêmico
ou Universitário, percebo uma certa incongruência nas grades curriculares (opinião particular). O estudante faz
vestibular para a área de saúde e, no primeiro período de seu curso tem aulas de Filosofia, Metodologia do
Trabalho Científico, Ética, Sociologia, Psicologia e outras disciplinares que, em algumas faculdades compõem o
chamado quadro do Departamento das Ciências Auxiliares. Estas disciplinas são ministradas em um momento
em que o estudante tem sede de conhecer aquilo que é específico de sua área. Ao meu ver, estes estudantes
deveriam primeiro conhecer a especificidade de seu curso, para depois, do meio do curso em diante ser
despertado para outras maneiras substanciais de olhar para o mundo. Aí, neste momento, ele teria sua vida de
mundo alargada e não afunilada.
Quando neste livro proponho a idéia de que no paradigma intuitivo de compreensão energética prevalece a
visão holística, penso e sinto ser necessário aprofundar e desmistificar este termo. Nas aulas com estudantes de
Medicina Energética já conheci muitas pessoas que diziam de seu interesse pelo estudo de energia por serem
portadoras de visão holística. Ao perguntá-las por que motivo elas tinham esta visão, surpreendia-me algumas
respostas: “tenho visão holística pois não como carne vermelha, sou místico, não entro em shopping, não tomo
coca-cola, não navego na internet, não faço uso de medicamentos químicos” e outras aberrações. Fui, por essas e
outras respostas percebendo o desgaste de alguns termos nesta área energética. O termo holístico vem do grego
hollos e significa totalidade. Uma pessoa de visão holística se encontra aberta ao diálogo com todas as maneiras
de se olhar para a realidade. Contudo, isso não nos leva a afirmar que o holístico é uma pessoa que aceita todas
as coisas como válidas e verdadeiras. Trata-se de uma abertura de diálogo e percepção da interconexão existente
entre todas as coisas. Conviver com o diferente e com uma maneira diversa da nossa de perceber a realidade é a
oportunidade primorosa de fazer a experiência da plenitude ou da totalidade (hollos).
Dando aulas de Filosofia da Ciência em um seminário católico certa feita, tive uma aluna, religiosa de vida
consagrada, que se mostrava muito interessada nas aulas e se esmerava em leituras e aprofundamento sobre o
assunto. No meio do curso, ela me procurou e marcou uma entrevista individual. Logo no início da conversa, ela
me disse de seu encantamento pela Filosofia da Ciência e seu interesse por saber ainda mais. Disse-lhe que já

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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.
havia percebido isso a partir de sua presença e que este era um bom retorno para qualquer professor. Contudo,
ela me disse estar sofrendo demasiadamente, pois estava perdendo completamente a fé em Deus. Ouvi o seu
depoimento e senti sua dor e pavor. Mas, não procurei consolá-la. Senti que aquela seria uma ótima oportunidade
para que aquela mulher tomasse consciência de sua luz natural e da certeza de suas próprias certezas. Então lhe
disse: “Irmã, você não está perdendo a sua fé em Deus.” E ela emendou: “Estou sim, professor, não estou
conseguindo me entregar à oração, fujo dos momentos celebrativos, ignoro o carisma de minha congregação e
estou muito confusa...” Neste momento lhe falei: “Irmã, pode ser que a senhora esteja descobrindo neste
momento que nunca teve fé ou que esta fé precisa amadurecer ao ponto de se tornar resistente diante daquilo
que a ameaça.” Neste momento, senti uma nova expressão em seu olhar e logo terminamos a conversa. Hoje, não
temos mais contato, mas sei por notícias de que ela é uma exímia religiosa (freira) e muito zelosa com a oração e
o cultivo intelectual. Ou seja, saiu de uma visão completamente unilateral de sua fé e se abriu para o diálogo com
outras maneiras de se conceber a realidade. Se mudamos a maneira de enxergar o mundo e a nós mesmos,
porque estamos lendo um livro, isto significa que aquilo que achávamos que era sólido e que nos sustentava, se
apresentou movediço e carente de ressignificação.
No meio acadêmico ocidental, há muitas maneiras de se referir à visão holística: alguns intelectuais insistem
em pensamento sistêmico, outros ainda em pensamento complexo, lei da interdependência entre todas as coisas,
etc. Na Pedagogia Contemporânea, há um realce muito grande na idéia de interdisciplinaridade,
transdisciplinaridade, termos que dentro de sua especificidade e significado pedagógico dizem da necessidade
de relação e comunhão entre os saberes. No ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) não se fala mais em
disciplinas, mas áreas de conhecimento. O ensino precisa superar o conteúdismo e a educação bancária e investir
na construção de habilidades e competências. Tais elementos têm uma ligação direta com a visão holística ou
sistêmica.
Participei a dois anos de um Congresso de Educação Católica em São Paulo e escutei de um dos
conferencistas algo muito sistêmico sobre o perfil do estudante do início do século XXI. Segundo ele, o estudante
do século XXI terá a mente aberta e alargada para o interesse por mais de uma área de conhecimento. Assim, será
muito comum encontrarmos no Mercado alguém que trabalhe e se identifique com a Medicina e a Engenharia
Elétrica. Para este pesquisador, as demandas desta geração não os possibilita ao fechamento por apenas uma
área de conhecimento. Mais uma influência das teias, da rede, e do pensamento holístico e sistêmico.
A partir de todas estas considerações, podemos dizer que na Cultura Oriental há um certo entrelaçamento
entre os campos do conhecimento. Assim, o senso comum não se separa da Filosofia, esta não se desvincula da
Ciência, não invalida a Religião e se mistura com a arte. Ao estudar a medicina chinesa, podemos afirmar que
grande parte de seus pressupostos antecederam o registro escrito e trata-se de um saber produzido por povos
desprovidos de formação intelectual diferenciada. Ou seja, é um conhecimento nascido no senso comum. Os
elementos Yin/Yang e o vínculo com os 05 elementos da natureza são o sustentáculo das escolas filosófico-
religiosas fundadas por Confúcio (Confucionismo) e LaoTsé (Taoísmo). A Medicina Tradicional Chinesa pode ser
aprendida nas melhores universidades da China como centros de produção científica e tecnológica nesta área. E,
por fim, as técnicas de localização de pontos de energia, a contemplação dos canais, meridianos e colaterais da
fisiologia energética, bem como a inserção, a retirada das agulhas atrelada à precisão do diagnóstico supõem
sensibilidade artística apurada. Por isso, estudar medicina chinesa é uma oportunidade de tomar contato com a
maneira holística de produzir conhecimento.
Os elementos Yin/yang transitam por todos os campos do conhecimento na China. Eles não pertencem à
academia e sim à cultura e à visão de mundo dos chineses. É muito comum entre as famílias chinesas acrescentar
o termo Yang ao nome de um menino e o termo Yin ao nome de uma menina. Se eles trazem no próprio nome e
identidade uma menção honrosa aos opostos complementares, isto significa que estas polaridades pertencem à
Tradição e, por isso, são disponíveis a todos.
Em sala de aula, por vezes, discuto com os estudantes de acupuntura a pretensão de nossa cultura de
estabelecer quais seriam os profissionais mais habilitados para trabalhar com as medicinas energéticas. Alguns
defendem: precisam ser médicos... Outros, precisam profissionais da área de saúde... Outros ainda, precisam ter
formação de nível superior... Tais reservas de mercado ignoram a própria identidade holística e sistêmica da
Medicina Tradicional Chinesa. Ela se ocupa da energia do universo como fonte de harmonia e saúde. Perceber
esta energia não é imbuir-se necessariamente de diplomas ou títulos, é necessária a disposição por cultivar a
admiração com as coisas mais simples e supõe a abertura da mente e do espírito para a contemplação da
interdependência e interconexão existente entre todas as coisas.
Já tive alunos que chegaram para o estudo das Medicinas Energéticas ressabiados e sempre com o “pé
atrás” a tudo o que era novo e que poderia bater de frente com as suas certezas fundamentais. Vi e ouvi de muitas

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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.
pessoas, o grande receio de que o estudo destas medicinas pudessem abalar as suas convicções espirituais. Em
minhas aulas de Filosofia, sempre insisti que a visão holística não nos faz perder nada. Se isso acontece, há aí um
sinal de que algo não foi bem assimilado no processo, uma vez que a visão sistêmica propõe exatamente o
contrário. Não é porque leio que a idéia de Deus em muitas culturas do Oriente é mais imanente do que
transcendente que isto invalida as minhas convicções cristãs de um deus todo-poderoso, criador do céu e da
terra. Estou apenas aprendendo que a minha maneira de enxergar e a da minha cultura não são as únicas
maneiras de enxergar e de refletir. Faço o exercício profundo e antropológico da alteridade. Sinto e aceito que o
mundo não gira em torno do meu umbigo. Entendo que o está claro na minha cabeça não precisa necessariamente
estar claro na cabeça do outro e vice-versa. Faço verdadeiramente a experiência da esferecidade do mundo, ou
seja, experiencio o ditado antigo que diz que “o mundo é redondo e há lugar para todo mundo”.

Sentidos X Razão – Intuição + Sentimento


Na história da filosofia na cultura ocidental há uma discussão alargada sobre o papel do sentidos e da
razão na produção de conhecimento. Tal discussão atinge a Pedagogia, a Psicologia, a definição das ciências
exatas, ciências da natureza, ou seja, há um consenso na idéia de que as ferramentas privilegiadas para se ter
conhecimento da realidade se dão a partir dos sentidos e da razão. Contudo, há que se apresentar neste estudo a
grande dicotomia existente na Filosofia e na Ciência do Ocidente quanto à validade destas duas ferramentas.
Antes de entrarmos nos pormenores desta discussão, vale observar de um modo simples a nossa maneira
de produzir conhecimento. Observe que, para uma criança, a realidade se restringe àquilo que ela percebe com
os sentidos. Isto é, o mundo real se restringe ao que a criança come, cheira, toca, escuta, ouve e enxerga. A criança
não faz abstração ou reflexão metafísica sobre si e o mundo. O mundo infantil é repleto de cores, sons, odores,
gostos... Apesar de viver no mundo da fantasia, a criança não se desvincula de sua percepção do mundo concreto.
A fantasia não se torna abstração. Quando éramos crianças, os nossos primeiros livros eram repletos de
ilustrações e poucas eram as palavras ou textos. A criança ama a narração de estórias por parte das vovós. Às
vezes, ela pede a repetição infinita de uma mesma narrativa... Isto faz parte de seu encantamento sensorial com
o mundo...
Ao evoluir em sua formação educacional, o adolescente, o jovem e adulto vão se apropriando da maneira
racional de conhecer e o mundo vai perdendo o seu colorido e a imaginação cede espaço aos conceitos oriundos
do Mundo das Ideias. Assim quanto mais o ser humano desenvolve a apreensão da realidade, mais distante ele
tende a ficar do conhecimento sensível. Tal perspectiva não acontece por acaso, mas tem suas raízes respaldadas
na própria Filosofia da Cultura Ocidental como se verá de modo panorâmico nas linhas que se seguem.
Ao surgir na Grécia no século VI antes de Cristo, os primeiros pensadores, chamados de Pré-Socráticos,
Cosmologistas ou Filósofos da Natureza partiram do princípio racional de que o mundo não havia nascido
(Cosmogonia), mas havia surgido a partir de um elemento da natureza de onde tudo vinha e para onde tudo
voltava (isto é, a physis). Ao investigar a physis, alguns pensadores acabaram iniciando a discussão sobre o
antagonismo ou dicotomia dos SENTIDOS x RAZÃO na aquisição do conhecimento. Assim, podemos destacar
nesta empreitada as propostas filosóficas de Heráclito e Parmênides.
O filósofo Heráclito viveu em Mileto (uma das colônias gregas da Ásia Menor) na mesma época em que
LaoTsé, fundador do Taoísmo viveu na China. Podemos dizer que esses dois homens tiveram leituras da realidade
um tanto quanto muito próximas. Segundo Heráclito, tudo no universo flui e o fluxo constante é harmônico e rege
todas as coisas. Ele afirmou que as coisas mudam tanto que tendem a alcançar o seu oposto: dia/noite,
claro/escuro, pequeno/grande, novo/velho, saúde/doença, vida/morte, etc. Observe que este pensador nunca
havia ouvido falar do yin e do yang e nem do Taoísmo de LaoTsé... Seria sintonia energética?...
Para Heráclito, conhecer o mundo era perceber com os sentidos a aparência e o eterno fluxo de todas as
coisas. Segundo ele, os sentidos tendem a fixar em nossa mente a realidade estática, contudo, o papel da razão ou
do pensamento é nos fazer refletir sobre as mudanças (esta é a principal diferença entre Heráclito e LaoTsé). A
frase que melhor encerra esta sua visão é: “Nenhum homem se banha duas vezes no mesmo rio.” Pois o rio não é
o mesmo e muito menos o rio... Heráclito diria que nenhum ser humano termina uma aula de Filosofia o mesmo:
alguns terminam a aula mais sábios, pois refletiram sobre o fluxo do universo, outros terminam a aula mais
ignorantes, pois além de não terem produzido nenhum conhecimento, perderam horas de vida que poderiam
investir em outras coisas e projetos. Contudo, ele diria: bendito seja o ignorante, pois só assim podemos perceber
o sábio. Ele não passaria por uma porta de madeira sem ter consciência de que aquilo ali já foi uma árvore e,
ainda pode se tornar, uma cama, mesa ou uma fogueira no futuro.
Para o filósofo Parmênides, a verdade deve ser buscada e conhecida no que é uno e indivisível. Por isso,
para ele, a mudança de todas as coisas era uma ilusão e os sentidos eram ferramentas enganosas na produção de

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Conhecimento. Para chegar à verdade, cabia ao filósofo desprezar os sentidos e tudo o que eles percebem. A
verdade supunha a capacidade de fazer abstração, isto é, o homem deve afastar-se da aparência a fim de conhecer
a essência imutável de todas as coisas. A aparência é uma ilusão dos sentidos e a essência só é alcançada pela
Razão ou pelo pensamento. Parmênides vai insistir que a verdade está no que é essencial, isto é, naquilo que não
pode faltar em um determinado ser ou objeto, as demais coisas que se lhe apresentam não passam de mera
aparência. Assim, diante de uma porta de madeira, o filósofo diria: a madeira, a forma retangular, a fechadura, a
cor, o ruído e tudo o mais que os sentidos puderem alcançar são meras aparências e, por isso, devem ser
ignoradas. De Parmênides encontramos o substrato para um ditado popular que nos diz que “as aparências
enganam”. Escutamos isso desde que nascemos... Parmênides vai defender que o ser é a essência, a verdade e o
não-ser é a aparência, a dissimulação. O ser é conhecido pela razão e o não-ser pertence aos sentidos. A frase que
melhor encerra sua proposta filosófica é: “O ser é, o não-ser não é.” Se fico parado numa porta impedindo a
entrada e a saída das pessoas, Parmênides diria que tenho problema com a compreensão e apreensão da essência
de porta na minha mente. Se ao, dar aulas, me assento sobre a mesa, tenho problema com a essência de mesa ou
de cadeira.
De tudo o que já refletimos e contemplamos neste livro, penso e sinto que o leitor já deve ter percebido
que, sem perceber a aparência e o eterno fluxo de tudo no mundo, não nos abriremos para uma apreensão
intuitiva e energética da realidade. A essência é também muito importante, mas não podemos encerrar o
conhecimento unicamente no conceito frio e abstrato. Perceber de modo energético supõe fazer as pazes com a
aparência e os sentidos, bem como contemplar a harmonia dos contrários no eterno fluxo de todas as coisas.
Contudo, prevaleceu na Cultura Ocidental o primado da essência e da abstração. A partir de Heráclito e
Parmênides deu-se início à dicotomia SENTIDOS x RAZÃO na produção de certezas. Por isso, vamos encontrar na
Filosofia Ocidental diversas dualidades excludentes: móvel X imóvel; aparência X essência; mudança X
permanência; opinião X conceito; corpo X alma; sombras X ideias; físico X metafísico; razão X fé; empirismo X
racionalismo; idealismo X materialismo; emoção X inteligência; sensível X inteligível; masculino X feminino. As
contendas filosóficas podem ser percebidas em Heráclito X Parmênides; Sofistas X Sócrates; Platão X Aristóteles;
Descartes X Hume; Hegel X Marx. Esta dicotomia acompanha a história da filosofia ocidental em praticamente
todos os períodos. Contudo, podemos perceber em Aristóteles, Kant e muitos outros intelectuais uma tentativa
de conciliar estes dois pólos.
No mundo contemporâneo, com as Correntes Existencialista e Fenomenológica, tal dicotomia perdeu um
pouco de sua expressão quando os intelectuais insistiram na precedência da existência sobre a essência. Vale
dizer, a filosofia contemporânea vive a crise da falência de significados que o homem produziu sobre si e sobre o
mundo e partiu do principio de que existir é mais urgente do querer nomear ou conceituar o mundo, tomando
posse de todas as coisas. A Filosofia Existencialista traz uma reflexão fatalista sobre a condição humana. Portador
de razão e sentidos, o homem contemporâneo mergulha profundamente na crise do vazio. Alguns filósofos vão
insistir que o homem é movido por desejos nunca saciados e, por isso, a infelicidade é a norma. Assim, angústia
e revolta marcam o olhar do homem sobre si e sobre o mundo na segunda metade do século XX. Condenado à
liberdade, o homem precisa assumir a tarefa de ser e saber o que se é.
Na Cultura Oriental, a primeira ferramenta a ser desenvolvida para a produção de conhecimento é o
sentimento ou as emoções. Torna-se necessário um aprofundamento muito bem consolidado desta afirmação,
vista a dificuldade de nossa cultura em lidar com o sentimento como forma de conhecer a realidade. Observe
como a criança é sincera e fiel a tudo o que sente. Assim, se ela possui empatia, não há de sua parte nenhuma
dissimulação. O mesmo ocorre quando não há identificação. A criança gosta ou não gosta... Se recebe um presente
e não gosta, ela não esconde o seu desprezo ou desgosto. Contudo, ao crescer, ela acaba aprendendo com sua
formação educacional a dissimular o que sente a fim de estabelecer uma boa convivência com todos. Assim,
vamos nos afastando cada vez mais do vínculo com os nossos sentimentos ao ponto de enfrentarmos dramas
emocionais por não assumirmos o que queremos e sentimos. Os estudantes de medicina energética ficam sempre
muito surpresos quando percebem que todas as doenças que temos possuem origem nas questões emocionais.
Quando tentamos explicar para um oriental a especificidade da Psicologia, há por parte deles uma
dificuldade muito grande, visto que eles não separam as questões emocionais das questões físicas, mentais e
espirituais. Por isso, todo tratamento energético leva em conta todos os aspectos do ser humano no mundo.
Dizer que a ferramenta principal para se produzir conhecimento intuitivo ou de base energética é o
sentimento, significa dizer que o oriental dá confiança e procura decodificar tudo o que sente. Contudo, não
podemos, com isso, pensar que o oriental é uma pessoa romântica o tempo todo. Sentir na perspectiva energética
não é achar tudo lindo e maravilhoso. É dar vazão e confiança para o que estamos sentindo...

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Já conheci e convivo com pessoas que dizem estarem desenvolvendo a intuição e, por isso, praticam
meditação diária, observam o ritmo de sua respiração em todos os momentos, reservam tempo e espaço para um
contato íntimo e profundo com a natureza, cuidam de uma alimentação e hábitos mais saudáveis, praticam algum
exercício corporal de base oriental e energética, fazem tratamentos energéticos, etc. Estas pessoas tendem a
começar a tomar consciência do que sentem pelo mundo, a partir do seu cotidiano e entorno. Algumas pessoas,
porém, acabam se descompensando um pouco quando confundem o sentir como a mera apreensão romântica de
tudo no mundo e nas pessoas.
Ao desenvolver a Psicanálise no século XIX, Freud propôs a idéia de que tudo pode ser percebido e
analisado a partir da sexualidade humana. Para ele, tudo o que nos gera prazer na vida é prazer sexual. E o que
nos leva à frustração, é também frustração sexual. Poderíamos transpor este raciocínio de Freud para a
compreensão da relação existente entre sentimento e intuição. Ou seja, toda compreensão de base energética é
fruto do que sentimos e toda desarmonia de base energética tem origem emocional.
Lembro-me certa feita, que um grupo de estudantes de medicina energética que estava fazendo um curso
de Medicina Chinesa com médicos chineses, descobriu que uma das médicas faria aniversário naquela semana...
Encantados com os chineses, os estudantes carinhosamente prepararam-lhe uma festinha surpresa, mas a
professora acabou sabendo antes da realização da mesma. Para a surpresa de todos os brasileiros, justamente no
dia da Festa a professora não compareceu na Faculdade. Foi dito aos alunos que a professora não estava passando
bem e eles, apesar de decepcionados, entenderam... Comeram o bolo sem a aniversariante. No outro dia, quando
disseram à professora sobre a festa e tentaram lhe presentear, ela assumiu que tinha ficado sabendo da festa e,
por isso, não havia ido à faculdade naquele dia. Houve um silêncio geral em sala... Contudo, ela quebrou o silêncio
se desculpando e dizendo aos alunos que ela também não poderia aceitar o presente que acabara de receber...
Outra vez, silêncio geral... Percebendo que havia um desencontro cultural, a professora lhes explicou:
“Desculpem-me mas não aprendi a celebrar a data do meu nascimento com pessoas que ainda não conheço o
suficiente... Não temos vivência o suficiente para que vocês me presenteiem... Sei que vocês podem estar tristes,
porque vejo que estão, mas não posso trair o que sinto e não sinto. Deixemos que o tempo e a nossa vontade nos
aproximem...” Percebi que uns entenderam, outros nem tanto... Eles ainda conviveram por mais dois anos e aí,
comeram churrasco, viciaram a chinesa em pão de queijo de Minas, ensinaram-na a dançar forró e choraram
muito com a despedida! Mas, no começo tiveram que aprender a não tocar nela, a não ter ousadia com perguntas
embaraçosas, etc.
Fiz o relato acima para tentar explicitar de modo mais palpável qual seria o papel do sentimento nas
relações energéticas. Já ouvi de várias pessoas que visitaram a Índia o quanto é marcante o olhar do indiano sobre
a pessoa que chega. Segundo uma amiga que ficou na Índia por alguns meses, em todos os lugares onde ele
chegava, ela se sentia percebida e perscrutada pelo olhar penetrante das pessoas de todas as faixas etárias e
condições sociais. Trata-se de um olhar que possibilita o sentir a fim de se decidir pela abertura ou não de
conexão energética.
Para o oriental, todas as nossas atitudes, escolhas e gestos estão carregados de intenção energética. Você
já comeu arroz com feijão de quem ama cozinhar? Já comeu um banquete preparado por quem odeia cozinhar?
A diferença se encontra exatamente na energia de quem faz... Observe como os bichos e as plantas se comunicam
conosco a partir do vínculo energético. Quando há algo errado no nosso entorno, as nossas plantas adoecem, os
nossos animais doméstico apresentam comportamento alterado, etc. Quando lemos nos jornais sobre os estragos
provocados pelas tsunamis, é possível perceber a decadência do homem diante desta intempérie. Há animais que,
pelo vento soprando, entendem o sinal e procuram um lugar seguro até que passe a catástrofe.
Se os bichos e as plantas se interagem energeticamente, precisamos desenvolver em nós, cada vez mais,
o apreço pela compreensão energética. Se somos movidos por intenções energéticas, precisamos ter mais
sabedoria no que falamos e com quem falamos, no que ouvimos e escutamos (escutar = ouvir com o coração), no
que tocamos e sentimos, no que cremos, no que esperamos, no que desejamos para nós e para os outros... Quando
criança ouvia sempre dos mais velhos: “Meu filho, as coisas boas de nossa vida não podem ser reveladas para
todos! Nem todo mundo vibra com o nosso sucesso! Lembre-se, quando tiver algo muito bom para acontecer em
sua vida, guarde para si, reserve o silêncio, pois se você fizer muito alarde, pode ser que dê tudo errado!” ou
ainda: “Cuidado com o olho gordo!” Por isso, precisamos de sabedoria na definição de quem incluímos em nossa
vida, quem freqüenta a nossa casa (o nosso templo...), quem participa de nossa intimidade, quem acessa a nossa
cozinha, o nosso banheiro, etc. Observe que em algumas culturas do Oriente, toda pessoa que chega em casa deve
tirar os sapatos, existem algumas partes da casa que não são acessíveis aos estranhos, o lugar onde se guarda os
alimentos não pode ser aberto a todos. É muito comum em alguns lugares da Ásia, a pessoa se enfeitar em casa
(roupas, jóias, adereços) e se esconder nas ruas e manter a sobriedade.

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Por todas estas considerações, penso e sinto que deve ter ficado claro que sentir é a mola propulsora da
intuição. No entanto, este sentir não é romantizado e nem imaturo. Trata-se do sentir que perscruta e decodifica
a realidade em sua intenção energética. Para desenvolver tal ferramenta, faz-se necessário o auto conhecimento
e a constante capacidade de admiração com as coisas mais simples (expressão já repetida de modo mântrico,
várias vezes neste livro).

Os opostos – Contrário, Contraditório, Subalterno – Complementares


A nossa visão linear e unilateral da realidade estão intimamente vinculadas à nossa maneira de lidar com
os opostos. Isto é, quando nos deparamos diante de algo, de alguém ou de uma idéia que é totalmente diferente
da nossa de perceber a realidade, podemos nos mostrar embaraçados o que nos leva a tomar três caminhos para
a reflexão sobre as oposições, a saber: os opostos podem ser contrários, contraditórios e subalternos.

A tábua de oposições, também chamado quadrado lógico ou quadrado dos opostos, tem origem obscura mas
geralmente se aceita que Boécio lhe deu a forma final. Trata-se de um artifício didático que indica as relações
lógicas fundamentais.
Nesta maneira de lidar com os opostos, podemos entender as oposições lógicas da seguinte maneira:
quando dizemos que uma relação é contrária significa que há uma discordância completa entre duas ideias (Ex.:
Todo homem é mortal/ Nenhum homem é mortal). Quando estabelecemos uma relação contrária ou sbcontrária,
a nossa tendência é que nos fechemos em nossa concepção de mundo e ignoremos aquilo que nos oponha ou nos
permita enxergar de modo diferente. De outra feita, quando percebemos uma relação contraditória,
estabelecemos uma discordância em parte entre as nossas ideias e aquelas ideias que se nos apresentam (Ex.:
Todo homem é mortal./ Sócrates não é mortal). Quando estabelecemos uma relação contraditória, a nossa
tendência é trabalhar com as exceções a fim de que possamos conviver com aquela idéia um pouco diferente.
Observação que neste, a oposição não é tão radical, quanto na relação contrária. E, por último, quando
percebemos uma relação subalterna, podemo dizer que uma idéia não acrescenta em nada à outra, pois que já
está contida na mesma. (Ex.: Todo homem é mortal / Sócrates é mortal.).
O quadrado dos opostos lógicos na Filosofia Ocidental pode ser uma boa referência para discutirmos a
nossa dificuldade de lidar com a oposição na Cultura do Ocidente. Essa dificuldade está necessariamente
vinculada à visão unilateral e progressiva tal como assimilada no nosso processo de formação. Quando aplicamos
esta reflexão sobre os opostos na História da Medicina Chinesa no Ocidente, podemos exemplificar a reação dos
franceses diante do contato com a Medicina Chinesa a partir do século XIX. Ao se estabelecer em Paris no século
XIX, a MTC foi vista pelo Conselho Federal de Medicina daquele país como uma prática completamente contrária
ao que os franceses pensavam e admitiam como diagnóstico e tratamento de patologias. Enquanto a MTC era
contrária à Medicina Francesa, havia por parte da classe médica um repúdio e o levantamento de pesadas críticas
à prática da acupuntura naquele país. Os jornais franceses daquele período traziam matérias de jornal alertando
à população sobre o charlatanismo praticado com o signo de Medicina Chinesa. O objetivo era minar os interesses
daquele povo por estas técnicas de tratamento. Contudo, o que se verificou foi uma grande procura da população
pelos tratamentos energéticos e logo sua eficácia começou a ser o assunto de todas as rodas de conversa. Com
isso, os médicos franceses começaram a estudar a MTC e o discurso mudou: A Medicina Chinesa não era mais
contrária à Medicina Francesa, mas Contraditória. Por isso, cabe aos médicos o estudo da MTC a fim de adequá-
la à Medicina Francesa. A idéia foi tornar a medicina energética uma medicina subalterna à medicina ocidental.

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Talvez, esteja aí a origem do termo pejorativo medicina alternativa, termo até pouco tempo utilizado até em
documentos oficiais da Organização Mundial de Saúde para se referir às Medicinas Energéticas.
Observe e reflita sobre a relação quadrada que podemos construir com as pessoas. Temos profunda
dificuldade de conviver e aceitar aquelas pessoas que pensam ou olham para a realidade de modo diferente de
nós. A nossa tendência diante do diferente é a retração, fechamo-nos e nos sentimos ameaçados em nossa zona
de conforto e certezas. Quando nos desarmamos e nos abrimos aos poucos, passamos a enxergar as ideias do
outro como uma contradição que pode ser transformada por nós. Não abrimos mão de nossas certezas e
passamos a investir no convencimento do outro sobre o nosso ponto de vista. Quando conseguimos tal intento, o
outro se torna nosso subalterno e nos sentimos vitoriosos por nossa visão unilateral e limitada. Podemos afirmar
que quando não suportamos o diferente, somos limitados e frágeis em nossas certezas. Ao estudar Filosofia e
Ciências Humanas, tive as minhas crises e vi muitos colegas (inclusive no seminário) questionarem sua fé e suas
certezas mais sólidas. Em uma aula de Teoria do Conhecimento na Faculdade, escutei de um professor que não
existe perda da fé. Segundo ele, quando uma pessoa deixa de acreditar em Deus (por exemplo), ela apenas
descobriu que não tinha esta certeza. Por isso, defendo que o contato com o diferente é sempre a oportunidade
primorosa que o Universo nos proporciona a fim de que conheçamos o todo e nos fortaleçamos em nossas
certezas ou nos livremos daquilo que achávamos que tínhamos até então.
Por mais que não creiamos, o ser humano tem uma atração muito forte pelo diferente. Observe como
amamos pessoas que são completamente opostas a nós... Trata-se de nossa intuição natural pela
complementariedade. Contudo, nem sempre as pessoas aceitam tal condição. Algumas se casam sabendo das
diferenças e possuem como Projeto mudar o outro ou adequá-lo à sua realidade. Ledo engano... Esta relação tende
a ser conflituosa ou pouco genuína. Os embates, desencontros, frustrações tornam-se as causas dos divórcios e a
dissolução das relações entre as pessoas...
Tal reflexão se aplica também às nossas amizades, às nossas relações profissionais e, sobretudo, à
maneira como lidamos com nossas questões internas e desafios do cotidiano. Muitas vezes, achamo-nos no
controle de nossa vida e, por isso, estabelecemosum programa contendo metas e métodos que deveremos
percorrer para alcançar a realização de nossa existência. Contudo, vez por outra, somos surpreendidos pelas
intempéries do cotidiano e temos nossas vidas alteradas e nosso método precisa ser modificado ou alterado. Se
não nos adaptamos, ficamos ansiosos e a frustração é inevitável. Assim, uma mudança de emprego, a
transferência para uma outra cidade, a perda de um ente querido, a queda do padrão de consumo, estas e outras
nuances podem ser reveladoras de nossa incapacidade de lidar com o diferente.
Para um Oriental e intuitivo, o oposto é complementar

Para o Oriental e para a mente intuitiva, tudo no universo flui ou muda sem cessar. As coisas mudam tanto
que tendem a alcançar o seu oposto: o dia vira noite, o claro escurece, o vivo morre, etc. A mudança é o movimento
do mundo. Tal movimento não é caótico e gera a harmonia entre todas as coisas. Sem o movimento ou a mudança,
ocorre a estagnação. Esta é a causa da desarmonia e de tudo o que impede o homem de ter saúde, bem como o
equilíbrio do universo. Para acompanhar e respeitar o eterno fluxo de todas as coisas, os Orientais se utilizam da
percepção energética e tudo passa a ser entendido a partir do intercâmbio de polos energéticos opostos.

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Na cosmogonia indiana, acredita-se que a origem do Universo se liga a uma peça rítmica onde o Brahman
se transforma no mundo e o mundo se transforma em Brahman. A ideia é de que deus se transforma no mundo
e o mundo se transforma em deus. O intercâmbio desta mutação energética entre o deus e o mundo pode ser
experenciado pelo homem a partir dos chamados chacras. Através da meditação (yoga), o indiano procura uma
harmonia e encontro entre a sua energia (alma), o universo e a energia divina, percebendo assim, o eterno fluxo
de todas as coisas.

Para os chineses, tudo no Universo se liga à confluência dos opostos complementares yin/yang. A
compreensão desta harmonia é a chave para o entendimento da saúde, da doença, da vida, da morte, do novo, do
velho, do masculino, do feminino, do dia, da noite, do claro, do escuro. Para os filósofos chineses Confúcio e
LaoTsé, tudo no Universo flui e muda sem cessar, podendo inclusive alcançar o seu oposto. Sem a oposição não
existe para a mente do chinês a totalidade. A conexão energética supõe a harmonia destes opostos. Em termos
filosóficos, é pela oposição que o ser humano entende os princípios da existência e da essência.
Os adeptos da Filosofia Zen sabem que o equilíbrio precisa ser mantido mesmo em situações de pleno
caos. Aliás, este é a oportunidade por excelência de fazer a experiência de uma presença cosmificadora, capaz de
resgatar a harmonia e o equilíbrio. O mundo se harmoniza nas oposições. Lembro-me das imagens horrendas
divulgadas pelos noticiários sobre os estragos causados pela última tsunami ocorrida no Japão. Víamos a todo
mundo um mar negro que carregava os destroços das cidades e os restos mortais de pessoas e animais que
haviam sido tragados por aquelas ondas devastadoras. Contudo, uma imagem causou-me perplexidade. Numa
das cidades mais destruídas pela catástrofe, o mundo pôde ver um grupo de japoneses que esperavam por longas
horas pela distribuição de comida e água que seriam trazidas de outro lugar e, em meio ao cansaço, destruição e
sensação de fracasso, todos eles ou a sua grande maioria liam jornais com notícias sobre o Japão e o mundo.
Poderíamos nos perguntar: Por que esta atitude? O mundo daquelas pessoas havia sido completamente destruído
e elas ao invés do desespero e revolta, liam jornais? A resposta é simples se se conhece o espírito zen: é na
desarmonia que somos testados na busca do equilíbrio. Que pena que os noticiários só se interessam pelo caos,
pois hoje, pouco tempo após a destruição causada pela tsunami muitos daqueles lugares já foram reconstruídos
e, aos poucos, os japoneses vão percebendo o ciclo da vida ser retomado.
A nossa dificuldade de lidar com a adversidade, faz-nos muitas vezes insatisfeitos e pouco realizados.
Pensamos que temos pleno controle sobre o mundo, sobre os outros e também sobre nós mesmos. Por isso, não
contamos com o imprevisto, o impensado e até com o improvável. A morte é para nós uma derrota, a velhice é o
castigo da juventude, o tempo é o nosso maior opositor e estamos sempre tentando fazer o mundo atender
unicamente ao que programamos.
Lidar com o imprevisto e a oposição é a oportunidade primorosa de fazer presente na vida, ocupando-se
do que se nos apresenta naquele momento. Não podemos antecipar o futuro, mas podemos viver intensamente
o presente. Caso contrário, a desesperança, o sentimento de impotência e a angústia serão nossas companheiras
inseparáveis. Quem se nega a aceitar o diálogo com a oposição teme a mudança, resiste aos desafios, procura
morar sempre no mesmo lugar, trabalhar na mesma empresa, fazer a mesma programação para a vida. Isto é, a
pessoa se aprisiona na unilateralidade e na linearidade da existência. Geralmente são pessoas que acreditam e se

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justificam no destino, são portadoras de culpa e se acham condenadas, sem nenhum direito de se tornarem
protagonistas de sua própria história, quando na verdade podíamos sempre dizer a nós: “Ah que bom que Deus
nos fez assim: Hoje, dizemos não, mas amanhã dizemos sim... Lindo é ver alguém se levantar, enxugar os olhos,
virar a página e recomeçar.
A New Âge, a Física Moderna e as Espiritualidades do Oriente

“Você não sente, não vê, mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo, que uma nova mudança em breve vai
acontecer! O que algum tempo era jovem, novo, hoje é antigo... E precisamos todos, rejuvenescer!!!”

Na segunda metade do século XX, várias mudanças no pós guerra fizeram com que os paradigmas passassem por
três momentos fundamentais: desconstrução, desapropriação e sacralização. Vejamos este percurso.

A desconstrução

Após a segunda guerra mundial, os países vencedores e vencidos do combate se empenham em reconstruir suas
bases políticas, econômicas e sociais. Se quisermos detalhar apenas um exemplo, podemos identificar em vários
países da Europa o estabelecimento do chamado Estado do bem-estar social, quando a política econômica investe
no bem estar do trabalhador e de sua família com o fito de manter a cidadania do consumidor, enquanto os países
retomam a sua estrutura na dinâmica capitalista. Contudo, em termos filosóficos e existenciais, a segunda metade
do século XX é marcada pela experiência da desconstrução. Trata-se do limiar de duas correntes da filosofia do
Ocidente que procuram abordar a trágica condição do ser humano: A Fenomenologia e o Existencialismo.

Vale dizer que, antes do estabelecimento destas duas escolas da filosofia contemporânea, Nietzsche no século XIX
já havia levantado pontos fundamentais para colocar lenha na fogueira da crise de sentido. Em sua reflexão
niilista, o filósofo já apontava a falência dos elementos que compõem a existência humana no mundo: deus, o
estado, a política, as instituições ou aquilo que o filósofo chamava de ídolos. Para propor a transmutação de todos
os valores, Nietzsche ataca de modo voraz a influência cristã nos rumos da existência do homem contemporâneo.
Para ele, esta espiritualidade faz do homem rebanho dependente e idiota, por ser completamente incapaz de
existir sem o Pastor. Ele vê na morte de Deus o nascimento do Super-homem, o único capaz de ressignificar a
própria existência e transmutar os valores.

Nesta mesma linha, podemos ainda contemplar Schopenhauer em seu discurso pessimista sobre o sentido da
existência. Para ele, o ser humano é movido por desejos nunca saciados, tendo na infelicidade a sua maior certeza.
O filósofo considera a arte e a filosofia a única maneira de sair do círculo vicioso do sofrimento existencial.

Quando adentramos o século XX, descobrimos que fenômeno é tudo aquilo que carece de significado para o
humano. A necessidade de significado pode ter duas causas: aquilo que é novo ou o que já não mais possui
nenhum sentido. Apoiando-se na segunda causa, os filósofos da fenomenologia apontam para a constatação de
uma crise profunda de sentido na condição humana. Utilizando um exemplo literário, poderíamos aqui citar o
texto de Ionesco em sua peça teatral Les Rhinocèros, quando a esposa acorda de manhã e se surpreende com o
fato de seu marido ter se tornado um rinoceronte. Carente de significado para aquele acidente, a mulher sai em
desespero à procura de alguém que pudesse lhe explicar o ocorrido. Contudo, quando chega até às outras pessoas,
a mulher descobre o mesmo acidente nelas. É como se tudo posse perdendo o significado e todas as pessoas
continuassem a existência sem se dar conta do desastre. Assim, a fenomenologia é uma corrente da filosofia que
vem acordar o homem contemporâneo de seu sono dogmático e aterrorizador. A pergunta fundante é: E o
homem, o que é afinal? E o mundo, o que é afinal?

A Filosofia Existencialista se nos apresenta a angústia de um homem que vive como estrangeiro (Albert Camus)
em um mundo desconhecido. Jean Paul Sartre insistia que a existência precede a essência. Por isso, procurar o
sentido e viver profundamente a liberdade como capacidade de ser causa interna de suas próprias deve ser a
meta de quem resolve pensar e investir em si mesmo. Sartre afirma que o ser humano é condenado à liberdade.
Não há mais espaço para justificar a própria vida e existência em algo fora de si mesmo. É como se tudo estivesse
falido ou pouco confiável e o homem tivesse que se garantir no plano da existência.

No contexto científico uma nova concepção de conhecimento vem a tona a partir de mudanças significativas na
Matemática, na Biologia e na Física. Na Matemática o desenvolvimento das chamadas Geometrias não-euclidianas
inauguram o novo pressuposto de exatidão na ciência. A exatidão matemática passa a ser vista e discutida pelos

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cientistas como ponto de partida e não mais como doutrina ou ortodoxia impermeável. Na Biologia, a Teoria da
Evolução e a Genética anunciam a biotecnologia ou a manipulação da vida a partir de interesses econômicos.
Também na química o Princípio da Incerteza de Heisenberg caminha na mesma direção da matemática
aproximadamente exata. Na física, as reflexões de Einstein sobre a Relatividade abalam o Mecanicismo (causa e
efeito) de Newton e, com isso, o conhecimento científico reelabora os seus pressupostos de veracidade e verdade.
Com estas mudanças, surge então uma nova concepção de ciência. Neste novo paradigma, os epistemólogos (Karl
Popper, Gaston Bachelard e Thomas Kuhn) partem do princípio de que a Ciência começa e termina com um
problema a ser discutido. Karl Popper defende que a não existe verdade na ciência, pois o cientista só é capaz
de detectar os erros de uma proposição. Assim, para ele, algo continua válido em ciência, equanto não for refutado
por uma nova teoria. Bachelard é mais otimista e sustenta a superação de obstáculos epistemológicos
(melhoramento metodológico e técnico) a fim de que o homem, através da ciência, se aproxime da verdade. Para
este filósofo, os erros cometidos ou a limitação de um determinado cientista são fundamentais para o andamento
de uma pesquisa continuada rumo às descobertas. Thomas Kuhn procurou alargar esta reflexão inserindo a
questão dos paradigmas nos rumos da ciência. Segundo ele, o ser humano é movido por paradigmas que definem
suas crenças, valores, hábitos e aquilo que se lhe como normal, confiável e justo. Kuhn afirma que não evolução
ou mudanças significativas nas certezas científicas, se não houver uma revolução nos paradigmas que regem um
determinado povo ou sociedade.

A desapropriação

A desconstrução operada na Filosofia, na Religião, na Antropologia e na Ciência geram na condição humana a


percepção de uma desapropriação de tudo aquilo que parecia sólido e gerador de segurança. Estaria aqui o
embrião do que chamamos a partir do final da década de 80 de Pós-Modernidade Líquida ou Fluida, cenário da
Globalização e da Sociedade de Consumo.

Neste fenômeno desapropriação, há que se reconhecer uma contribuição valiosa da Física que, a partir da década
de 50 começa a abrir-se para a discussão quântica ou energética do movimento. Tal guinada da física era um
tanto quanto ousada, pois quebrava com a dinâmica de evolução desta ciência desde o Renascimento, quando
Galileu inseriu a Matemática na Física de Aristóteles e defendeu o pressuposto de que tudo o que pode ser
medido, pode também ser mudado.

A física energética ou quântica se afasta um pouco da matematização das mudanças ou do movimento e se


aproxima da experiência filosófica da conexão ou interconexão de tudo com todos. Esta física se mistura com a
metafísica para contemplar o invisível, aquilo que está mais próximo do intuir do que do pensar, da meditação
do que do cálculo. Por isso, muitas universidades e centros de pesquisa passaram a ver estes estudos como pouco
acadêmicos e pouco confiáveis. Este preconceito não impediu o seu desenvolvimento e apresentação para o
mundo de uma nova maneira de ser, existir e conectar-se. A física quântica acabou aproximando a Ciência da
Filosofia e da Espiritualidade (mormente as Filosofias do Oriente).

Ao mesmo tempo que isto acontecia nos centros e laboratórios de pesquisa, o mundo ocidental assistia de
camarote ao fluir do Movimento Hippie na década de 60. É proibido proibir!...

A sacralização

A desconstrução dos ídolos e a desapropriação de todas as certezas teve uma consequência extremamente
inusitada. Na década de 50, o mundo ocidental esteve extremamente envolvido com a bipolaridade do bloco
capitalista encabeçado pelos EUA X o bloco socialista, representado pela URSS. Tratava-se de uma batalha
silenciosa, sem deixar de ser sangrenta.

Na América Latina, a experiência de Cuba, atiçava a curiosidade da classe trabalhadora e oprimida diante da
sujeição das economias dos países subdesenvolvidos ao poder da América do Norte. Assim, enquanto os EUA e a
Europa mergulham na Guerra Fria, muitos países da América Latina se fecham em ditaduras militares apoiadas,
estimuladas e financiadas pelos Estados Unidos. Os golpes de Estado e a concentração do poder nas mãos dos
militares era a expressão de uma resitência explícita ao Movimento Comunista que rondava o mundo na segunda
metade do século XX. Com este cenário, universidades, centros de estudo, bem como intelectuais, artistas,
filósofos, poetas e religiosos são completamente monitorados no direcionamento de suas posições. Da década de

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60 até a metade da década de 80, grande foi o número de latini-americanos perseguidos, torturados, censurados,
mortos e exilados pela Ditadura Militar.

Ao lado deste contexto político e econômico, vemos surgir no Mundo o Movimento hippie. Tratou-se de uma
reação intetelectual, artística, filosófica e romântica daquelas pessoas e grupos que tinham consciência de toda
desconstrução e desapropriação que discutimos nos tópicos anteriores. Dizemos, por isso, em filosofia, que o
movimento hippie foi gerado pela angústia existencial em mundo sem referências sólidas. Muitos hippies
pertenciam a uma elite intelectual bem formada e informada e, por isso, tinha consciência do desgaste das
referências acadêmicas, políticas e culturais que regiam a vida das pessoas até então.

O hippie é o primeiro responsável pela sacralização de si e do mundo. Não mais na perspectiva institucional e
transcendente, mas na imanência do existir e capacidade de contemplar a interconexão existente entre todas as
coisas. Consciente da falência da razão e da lógica, o hippie se abre para a experiência intuitiva, capaz de conferir
a ligação energética existente entre o homem e o mundo (Microcosmo).

Esta postura frente ao mundo e a si mesmo, faz do hippie um ser capaz de estabelecer uma conexão com o
presente dando confiança para o sentimento de si diante do mundo. O hippie não quer mais pensar o mundo e a
si mesmo, mas conectar-se com o mundo em si. Esta ideia da interconexão entre todas as coisas gera na cabeça
do hippie a ideia de Teia da Vida, de tao, como caminho primoroso de sentir-se uno-verso. Toda a concepção do
mundo parte do encontro consigo. Até então, o homem se sentia criatura de algo (de Deus, de seus pais, da
natureza, dos seres vivos). A partir de agora, o homem se sente CREATURA, isto é, a própria personificação do
universo.

O movimento hippie consistiu em uma volta para a natureza, a contemplação, a meditação, o esvaziar-se a fim de
contemplar a plenitude. Assim, atividades como respirar o ar puro, deixar-se massagear por uma queda de
cachoeira, desintoxicar com os tratamentos naturais (ervas medicinais, massoterapias, exercícios corporais...),
alimentar-se de modo mais saudável e menos químico, além de cultivar uma espiritualidade pautada na
imanência de Deus são alguns dos elementos que fizeram parte da rotina dos hippies na segunda metade do
século XX.

Podemos atestar a grande influência deste movimento nas produções artísticas (arte plástica, música, poesia),
na moda da época (estética), nas filosofias de vida tendendo para o o cinismo e o total despojamento de si para
se fazer a experiência univérsica.

Observe que esta nova tendência vinha de encontro aos estudos contemporâneos da física quântica, o que fez
com que estas pesquisas tivessem muita acolhida nestes grupos. Na vivência da espiritualidade, os cultos ao ar
livre, as meditações nas montanhas, a utilização de banhos de ervas e ingestão de chás passou a ser representação
de um movimento, extremamente combatido pela tendência pentecostal das Igrejas Evangélicas e também da
Igreja Católica, denominado “New Age”. A grande novidade trazida pela Nova Era foi a possibilidade de fazer a
experiência imanente de deus sem a necessidade de uma intermediação da instituição. Enquanto as religiões
cristãs, em sua catequese, insistiam na relação do homem com deus a partir do binômio eu X DEUS, a New Age
inaugura a relação eu-eu. Vale dizer, na relação eu x DEUS, o humano se apresenta minúsculo, por ser pecador,
limitado, ingrato e incapaz de corresponder ao amor e misericórdia de DEUS que é ONIPONTE, ONICIENTE e
ONIPRESENTE. Nesta relação, o homem é salvo pela graça de Deus, mesmo merecer tal redenção. Através da
Religião (Igreja), o ser humano vai se arrependendo de seus pecados a fim de imitar a Deus. Ele é criatura de
Deus, isto é, é semelhante ao Criador e não mais do que isso. Deus é Pai, mas é superior e perfeito. Em
contrapartida, na relação eu-eu tal como proposta pela New Age, o homem deve desenvolver a consciência de
que ele é o Microcosmo e, não só isso, a consciência de que o Universo é Deus e, por isso, o humano é divino. Dar
glória a Deus é bendizer o Universo e dar glória a si mesmo. “Eu sou deus”. “O Universo é deus.”

Esta sacralidade de si e do universo se fazem a partir da percepção energética de todas as coisas. A teia da vida e
a interconexão é a manifestação de deus imanente que está em presente e é tudo em todos. Observe que esta
postura espiritual não quer ressuscitar ídolos e ttradições do passado e, muito menos, ficar mergulhada na
angústia de um mundo fenomenológico e em crise de existências. Trata-se de uma nova postura diante de si e do
mundo. Uma postura cósmica, ordenadora, capaz de combater e superar o caos.

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Os intelectuais que se debruçaram nesta nova visão de homem e mundo acabaram encontrando nas Filosofias
Religiosas do Oriente o substrato para as suas assertivas, mormente, o Hinduísmo, o Budismo, o Confucionismo,
o Taoísmo e o Zen, a que nos dedicaremos nas linhas que se seguem.

As Filosofias Religiosas do Oriente

Fritjof Capra em sua obra clássica O Tao da Física faz um paralelo entre as principais filosofias religiosas do
Oriente e as máximas da física quântica ou energética. A ideia do físico é mostrar o quanto a humanidade e o
conhecimento acadêmico estão como que fazendo o caminho de volta. Isto é, para Capra o que é novo nas
descobertas da Física Moderna já faz parte da visão dos Orientais da Índia, China e Japão, muito antes de se
pensar em método científico ou nos princípios de uma razão lógica e universal.

No nosso contexto latino-americano, podemos remontar à sabedoria dos vários indígenas que ocuparam este
território antes da implantação do paradigma racional do Mundo Europeu. Assim, este paralelo estabelece
também uma comunhão íntima e profícua com os xamãs e a pajelança dos indígenas americanos. No Brasil,
mormente nas cidades pobres do interior e no meio rural é muito comum a existência de “benzedeiras” que,
através de plantas curativas limpam o corpo das pessoas, mesclando elementos energéticos com o sincretismo
cristão. Há relatos muito impressionantes do poder das “garrafadas” que são remédios feitos a partir de uma
combinação de ervas mescladas à oração de alguém que invoca da energia da natureza a cura ou a limpeza de um
ambiente. Estas práticas, vistas por um cético racionalista como devaneio ou crendice, ganham a partir de agora
novo contorno tendo como base uma compreensão sacralizada e científica do fluxo energético existente entre
todas as coisas.

No que tange à Filosofia Oriental (Hinduísmo, Budismo, Confucionismo, Taoísmo e Zen), o que salta aos olhos dos
físicos é o ponto comum existente entre estas correntes filosófico-religiosas. Todas elas, como se verá a seguir
partem do princípio da unidade dinâmica existente entre todas as coisas. Isto é, para estas correntes, nada vem
do nada e nada volta ao nada. Pois há um princípio comum (energético) que unifica todas as coisas. Tudo é
univérsico e oriundo de uma mesma arché ou fonte priomordial. A simplicidade destas filosofias não ofusca a sua
riqueza e profundidade. Trata-se de uma experiência místico-religiosa onde, a partir de uma abertura para a
Imanência de Deus em todas as coisas, o ser humano pode estabelecer um vínculo saudável consigo, com o outro,
com a natureza e as instituições por ele criadas. Este continuum se apresenta como as categorias da substância
divina. Imbuído de tais filosofias, o homem desenvolve a seguinte consciência: “eu sou a natureza, a natureza é
deus e deus sou eu”, como numa peça rítmica em eterno fluxo de movimento. Aliás, o fluxo ou o eterno movimento
são elementos fundamentais para se perceber a harmonia e a interconexão de tudo com todos. Para as filosofias
de base da Índia, China e Japão, o movimento é a expressão da vida, da saúde e da manifestação divina. A
estagnação e a resistência ao fluxo contínuo é doença, desequilíbrio, apego, encantamento, ilusão e, por isso,
mesmo desconexão com a energia divina.

Os dados das correntes da filosofia que apresento a seguir são pobres, uma vez que toda experiência intuitiva é
muito superior à sua transcrição racional. Vale dizer, as filosofias do Oriente não se apresentam como manual de
discussão acadêmica, mas como caminhos de Meditação e aprofundamento da consciência de si no mundo e do
mundo em si. Contudo, ouso apresentar alguns elementos de cada escola que nos ajudam a entender este
momento de sacralização e re significação de uma existente em decadência. Deter-me-ei em 04 questões
fundamentais:

01. Dado histórico;


02. Visão de Homem;
03. Visão de Mundo;
04. Caminho de Iluminação.

É claro que o leitor não vai se contentar com este recorte para buscar uma contemplação mais profunda destas
filosofias. Ao trabalhar com este conteúdo nos Cursos de Pós-Graduação em Saúde (Medicina Tradicional
Chinesa) sempre pergunto aos alunos o que os levou ao estudo da Medicina Energética e da Filosofia Oriental.
Ouço por vezes um ou outro argumento, mas tenho sempre a mesma percepção: há uma sede nos acadêmicos de
um novo paradigma, uma nova maneira de enxergar e digerir o mundo. Brinco (falando sério...) que os

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profissionais de saúde reunidos naquele auditório resolveram estudar Medicina Chinesa e Filosofia Oriental
porque estão doentes. Estão desequilibrados. E o nome do desequilíbrio é insatisfação paradigmática. Isto é,
médicos, fisioterapeutas, psicólogos, educadores físicos, farmacêuticos, enfermeiros, Terapeutas Ocupacionais,
Nutricionistas, dentistas que se reúnem nesta empreitada são tão bons no que fazem em suas respectivas
formações que já descobriram que não podem ser só isso. Ansiosos por novas técnicas ou ferramentas, estes
profissionais mergulham em novos paradigmas, tratando ou tomando consciência de seus próprios
desequilíbrios internos a fim de ajudar outros aflitos que chegam até aos seus consultórios.

Passemos então às Escolas da Filosofia do oriente a partir das quatro questões elencadas acima:

Hinduísmo

A Índia é uma civilização que possui aproximadamente cinco mil anos de existência. Trata-se, por isso, de um
povo portador de uma longa trajetória marcada pela tradição e pelo zelo com a história e suas riquezas. Apesar
das inúmeras diferenças regionais, sociais e linguísticas presentes no país, sempre existiu uma unidade básica na
cultura indiana. Além disso, ela manteve uma continuidade desde os tempos védicos até hoje, apesar das
constantes guerras, bem como da presença britânica durante dois séculos de neocolonialismo.

O centro vital da cultura indiana é a Espiritualidade. A Espiritualidade hindu está profundamente enraizada em
tradições filosóficas e religiosas. O contato do homem indiano com as concepções energéticas antecedem o
desenvolvimento da escrita naquela civilização. Por isso, dizemos que, a partir da sabedoria de povos ágrafos e
analfabetos, herdamos o legado de uma leitura intuitiva pautada na interconexão energética existente entre todas
as coisas.

A filosofia surgiu na Índia a partir do questionamento sobre os mistérios da vida e da existência. Estas questões
do homem indiano foram todas direcionadas para o seu mundo interior e sua relação íntima com o universo. As
máximas da filosofia indiana foram compiladas e escritas a partir de 1500 a.C., em livros chamados Vedas ou
Livro das Vidências (ou intuições primordiais). Não se sabe ao certo de onde teria vindo a autoria destes
compêndios de filosofia. Contudo, os povos da Índia se baseiam nos ensinamentos destes textos para a
compreensão de si e do mundo. Os Vedas são as escrituras mais antigas e respeitadas da Índia. Todos os outros
textos estão subordinados aos Vedas. Há quatro Vedas: Rig-Veda, Yajur-Veda, Sama-Veda e Atharva-Veda. Cada
um destes livros se divide em quatro partes: Samhita, Brahmana, Aranyaka e Upanishads. O Samhita apresenta
uma coletânea de hinos deidcados às várias deidades com um profundo significado místico. O Brahmana
apresenta a disposição dos rituais e o código moral. O Aranyaka contém várias meditações, sendo algumas
recriações mentais dos rituais exteriores. E os Upanishads apresentam registros de experiências transcendentais
vividas pelos rishis em decorrência de diferentes técnicas contemplativas. Estas verdades e princípios dos
eternos do mundo espiritual estão dispersos nos Upanishads e foram codificados por Badarayana, na forma de
Sutras e compõem os alicerces do sistema filosófico da Índia.

Os sábios indianos chamados rishis ou videntes, desenvolveram técnicas especiais para transcender os sentidos
(o mundo sensível) e a mente comum (a razão e o pensamento), coletivamente chamadas de yoga. Com o auxílio
destas técnicas, eles mergulharam fundo nas profundezas da consciência e descobriram verdades importantes
sobre a verdadeira natureza do homem e do universo.

Assim, no livro dos Vedas, é possível encontrar que a verdadeira natureza do homem não é o corpo ou a mente,
que estão sujeitos à mudança e à destruição, mas sim o Espírito que é imutável, imortal e consciência pura.

O eixo central da filosofia indiana é a ideia de que todas as coisas estão interconectadas energeticamente. Tal
ligação se deve ao fato da cosmovisão presente nesta filosofia. Para o Indiano tudo no Universo é Brahman, isto
é, tudo se origina deste Espírito Divino e Infinito e para ele tudo volta. Brahman é o absoluto que se inflou e
explodiu numa doação de amor dando origem a tudo e a todos. Todas as coisas que compõem o universo estão
em eterno fluxo de mudanças e tendem a voltar ao Brahman a fim de se iniciar um novo ciclo de mutações (daí a
crença na reencarnação). Observe que o universo não é uma criação de Brahman, mas a sua personificação. Por
isso, o mundo é sagrado ou tudo é deus. De todos os seres que povoam o Universo, o homem é atman, isto é, a
manifestação mais sublime de Brahman. Tal posição se deve ao fato de que este é o único a quem é dado saber
da condição brahmânica de todas as coisas. É através da yoga (meditação) é que o ser humano vai se tornando

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capaz de viver plenamente esta consciência cíclica em busca de iluminação. Assim, viver em estado de atman é
respeitar cada coisa e ser em karma (ação) e dharma (sentido e objetivo da ação).

Quando deixa de intuir sobre a sua condição, o homem se afasta da yoga e cai no encantamento de maya. Maya é,
por isso, a desconexão, a ausência da consciência de atman. Em estado de maya, o homem se afasta do seu carma
e dharma e danifica a trajetória de iluminação de todos os seres que estão em seu entorno. Maya é o
encantamento e a perda de horizontes. Nela, o homem perde a visão cíclica, holística e cai na linearidade
unilateral que reduz a sua existência à singularidade geradora de apego e frustração.

Ora, poderíamos nos indagar: O que podemos fazer com uma gota d´água para que ele não seque jamais? O sábio
diria: - É preciso lançá-lo no Oceano... E se esta gota for a sua existência e o Oceano o Universo?

A eternidade e a iluminação supõem o lançar-se no universo. Ninguém pode sair se não entrou. Se jogo um
pequeno galho em um filete de água, o que será dele? O pessimista diria: Ora, não será nada! Repare que o filete
faz uma curva e, por isso, o galho vai prender-se na curva e lá apodrecerá... Outro poderia supor: - Não, ele faz a
curva e alcança o riacho que existe lá em baixo! E no riacho, o que será dele? – Ah, diria outro, com certeza há de
afundar e vai apodrecer lá no fundo! E outro, ainda: - Não, ele não vai afundar. Ajudado pela correnteza ele vai
chegar ao Oceano, pois todo riacho deságua no mar! E o vidente oriental completaria: - E esta é a meta de todo
aquele que busca a iluminação!

Para iluminar-se a partir da filosofia indiana, há que se investir nos vários ciclos (encarnações) entender que
tudo é Brahman: a alegria e a tristeza; a saúde e a doença, o dia e a noite, a juventude e a velhice... É preciso, por
isso, passar por várias vidas, várias condições (mineral, vegetal, animal, racional, irracional...), várias castas a fim
de se entender a plenitude da peça rítmica em que deus se transforma no mundo e o mundo se transforma em
deus (mito de Lila).

A ligação do indiano com esta percepção é tão forte que podemos atestá-las em seus hábitos (culinária, vestuário,
frequência as práticas de meditação), estratificação social (castas), relação com a natureza, etc. Um bom exemplo
seria a própria medicina praticada por este povo: A Medicina Ayurvédica. Trata-se de um dos mais antigos
sistemas medicinais da humanidade. Ayurveda significa em sânscrito ciência da vida. A medicina ayurvédica é
conhecida como a mãe da Medicina, pois seus princípios e estudos foram a base para, posteriormente, favorecer
o desenvolvimento da Medicina Tradicional Chinesa, árabe, romana e grega. A doença, para a Ayurveda, é muito
mais que a manifestação de sintomas desagradáveis ou perigosos à manutenção da vida. Como ciência integral,
esta medicina considera que a doença inicia-se muito antes de se chegar à fase em que ela finalmente pode ser
percebida. Trata-se de uma desconexão energética (Maya). Assim, pequenos desequilíbros tendem a aumentar
com o passar do tempo, se não forem corrigidos, originando a enfermidade muito antes de podermos percebê-la.
A base da medicina ayurvédica parte, portanto, de uma visão holística do ser humano, onde conceitos integrativos
do indivíduo com o Universo (Atman-Brahman), os elementos e o espírito são as fontes de energia e equilíbrio
na busca da saúde. O tratamento supõe uma harmonia com a natureza, com a sociedade e consigo mesmo. A
doença é fruto da incapacidade humana de se encantar com as coisas mais simples (o fluxo da vida). O homem
doente é incapaz (estado de maya) de perceber os aspectos fundamentais da vida e, por isso, acaba perdendo a
harmonia consigo (atman), com o universo e se torna vulnerável às influências nocivas do meio.

Usando conceitos filosóficos dos Vedas, a Medicina Ayurvédica estabelece uma relação com elementos básicos
da natureza: ar, água, fogo, terra e vácuo – que se combinam e interagem na formação da vida e dos fenômenos
biológicos. A resultante dessa combinação nos seres humanos são definidos como doshas: vata, Pitta e kapha,
que são biótipos básicos dos indivíduos:

- Vata: Resultante do ar e do seu movimento, como o vento, por isso é seco, leve, sutil e agitado. São pessoas
aéreas, idealistas, sonhadoras e inteligentes.

- Pitta: resulta de uma combinação de fogo com a terra, gerando qualidades como quente, oleoso, viscoso e com
movimento para cima. São pessoas tensas, explosivas, calorentas, com um temperamento forte, decididas e
corajosas.

- Kapha: resulta de água com a terra, gerando qualidades como umidade, peso, força, frio e movimento para
baixo. São pessoas dóceis, emotivas, amorosas e compreensivas.

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O médico ayurveda identifica o dosha predominante do paciente e o nível de desequilíbrio pela análise do
temperamento, do biótipo, palpação dos chakras (que são os centros energéticos dentro do corpo humano, que
distribuem a energia – prana – através de canais – nadis – que nutre órgãos e sistemas), observação da textura
dos olhos, da pele, cabelos e palpação do pulso. De posse do diagnóstico, o tratamento supõe o reequilíbrio
energético da pessoa, o resgate de sua conexão com o universo.

Budismo

Buda, que em hindu quer dizer “Iluminado”, foi o nome dado a Siddhartha Gautama, líder religioso que viveu na
Índia, cuja bondade e sabedoria lhe valeram esse título. É considerado pelos budistas o “Supremo Buda”, o
fundador do budismo. O Budismo é uma das maiores religiões praticadas na Ásia. Ela é muito mais uma
psicoterapia, do que filosofia ou religião. A influência de Buda em países como China, Índia, Nepal, Japão e Tibet
é tão expressiva quanto a influência de Jesus Cristo na Cultura Ocidental.

Buda (Siddartha Gautama) nasceu por volta de 563 a. C. em Lumbini, sendo criado no pequeno principado de
Kapilavastu, situado numa região setentrional e montanhosa da Índia que hoje faz parte do território do Nepal.
Filho do rei da dinastia Sakia, ficou órfão de mãe poucos dias após seu nascimento. Seu pai o rei Sudoana deu-lhe
uma educação requintada, foi preparado para ser um guerreiro e líder político, era chamado de “Sakia Múni” – o
sábio da Sakia.

Nessa época, a vida na Índia era difícil, os habitantes eram numerosos, o alimento escasso, e a divisão dos bens
desigual, de modo que a fome e a miséria se integravam no dia a dia da maior parte da população. Siddartha
Gautama, jovem, rico e bem casado, tinha tudo para se sentir satisfeito, porém demonstrava tendência para a
meditação e para o pensamento filosófico e espiritual.

Miséria, velhice, doença e morte eram problemas dos quais jamais pensara em seus 29 anos de idade, até
descobri-los em um passeio pela cidade. Foi para ele um choque, em contraste com a beleza de sua esposa e de
seu filho, com o luxo que os cercava. A realidade passou a impressiona-lo. Essa perplexidade foi se avolumando
pouco a pouco, até o momento de raspar a cabeça em sinal de humildade, e trocar a suas suntuosas roupas pelo
despretensioso traje amarelo dos monges e afastou-se do palácio, abandonando família, bens e passado, e iniciou
a busca para chegar às verdades superiores.

Novato em questões espirituais, o andarilho juntou-se a cinco ascetas, e com eles passou a jejuar e fazer orações,
mas, com o estômago vazio não lhe ensinava nada de novo, perdeu a fé no sistema e voltou a comer. Durante os
seis anos seguintes passou o tempo meditando em total solidão. Conta a lenda que Siddhartha Guatama escolheu
a sombra de uma grande figueira, que os hindus chamam de “bodhi” e veneram como árvore sagrada.

Sentado sob a árvore, teve visões de Mara – o demônio da paixão, que hora lhe atacava com chuva e raios, ora lhe
oferecia vantagens para demovê-lo de seu propósito. Após 49 dias Mara teve de se conformar com a derrota,
deixando Gautama em paz. Observe o paralelo deste recorte com as Tentações de Jesus pelo demônio no deserto.
Ocorreu então o despertar espiritual que o jovem tanto procurava. Iluminado por um novo entendimento de
todas as coisas da vida rumou para a cidade de Benares, à margem do rio Ganges, a fim de transmitir o que lhe
acontecera.

Pouco a pouco, Gautama encontrou seguidores que reverenciaram sua iluminação, passando a tratá-lo por
“Buda”. Durante 45 anos em que pregou sua doutrina, por todas as regiões da Índia, o Buda mencionou sempre
as Quatro Verdades e as Oito Trilhas, acrescentando ainda uma sentença, resumo de todo o seu pensamento – A
Regra de Ouro: “Tudo o que somos é resultado do que pensamos”.

Os seguidores de Buda, embora desvinculados das coisas desse mundo, observam um profundo respeito por
todos que nele vivem. Consideram viver em paz com seus semelhantes, uma obrigação fundamental de todos os
indivíduos. O espírito pacifista que leva os monges budistas ao extremo de poupar a vida até dos insetos, tem
origem num ensinamento do próprio Buda, que dizia: “O ódio não termina com o ódio, mas com o amor”.

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Buda fez questão de propagar que não era Deus, mas queria servir de exemplo para outras pessoas em busca da
salvação do espírito e do caminho para atingir o Dharma - o processo de amadurecimento para a plena realização
espiritual. Buda faleceu por volta de 483 a. C. em Mallas, Kushinagar, Índia.

Tocado pelo sofrimento e pela miséria, Buda fez disto o tema central de sua proposta espiritual. O Budismo nos
propõe assim 04 verdades nobres que nos possibilitam uma compreensão e superação do sofrimento.

As Quatro Nobres Verdades

Ao iluminar-se, o Buda Shakyamuni ensinou primeiro as Quatro Nobres Verdades.

 verdade do sofrimento;
 verdade da origem do sofrimento;
 verdade da cessação do sofrimento;
 verdade do caminho que leva à cessação do sofrimento.

A palavra “sofrimento” nesse contexto é a tradução consagrada do sânscrito dukkha, cujo significado mais aproxi-
mado seria o de “insatisfação”.

É importante salientar que o uso da palavra “verdade” nas “Quatro Nobres Verdades” pode ser explicada da
seguinte maneira: “Da verdade do sofrimento à verdade do caminho que leva à cessação do sofrimento, não há
nada que seja falso ou enganoso e, portanto, tudo isso é considerado ‘verdadeiro’”.O termo “nobre”, nas “Quatro
Nobres Verdades” pode ser assim entendido: “Somente os nobres conseguem compreender essas verdades e
contemplá-las. Os ignorantes não conseguem compreendê-las ou contemplá-las. Portanto, essas verdades são
chamadas ‘Nobres’ Verdades”.

Estudiosos e praticantes do Budismo sabem que As Quatro Nobres Verdades são o ponto de passagem entre a
ilusão e a iluminação. Quando elas não são compreendidas, persiste o apego aos Seis Reinos. Se compreendidas,
alcança-se a santidade. Estas Quatro Nobres Verdades estão no cerne da vida e, por isso, explicam todos os esta-
dos de consciência existentes no universo e ensinam como se libertar de todas as formas de ilusão.

É necessário sabedoria, conexão energética e despertar intuitivo para compreender as Quatro Nobres Verdades.
A primeira verdade diz que a vida é cheia de sofrimento. A segunda, que o sofrimento é causado por nosso apego
à ilusão. A terceira verdade diz que a iluminação, ou a total libertação do sofrimento, é possível. A última diz como
alcançar a iluminação. As duas primeiras Nobres Verdades têm relação de causa e efeito entre si. A primeira é o
efeito; a segunda é a causa. Igual relação existe entre a terceira e a quarta, sendo a terceira o efeito causado pela
quarta.

O caminho escolhido por Buda para fundamentar estas quatro verdades foi primeiro descrever o problema, -
depois explicou sua causa, para, em seguida, apresentar a solução do problema ou o caminho para a iluminação.
Um elemento fundamental dos ensinamentos do Buda é a imensa compaixão que transparece na elaboração de
explicações, feitas de modo a serem compreendidas por qualquer pessoa que realmente se empenhe.

As Quatro Nobres Verdades foram os primeiros e também os últimos ensinamentos do Buda. Ao aproximar-se
do momento de sua morte, o Buda disse aos discípulos que, se tivessem alguma dúvida quanto à validade das
Quatro Nobres Verdades, deveriam se pronunciar, pois assim poderiam obter as respostas antes que fosse tarde
demais. A atenção que o Buda devotou às Quatro Nobres Verdades nos 45 anos em que se dedicou a ensinar
assinala a importância que atribuía a elas.

Como se vê assim, como o Hinduísmo, o Budismo parte do princípio da interconexão entre todas as coias. O apego,
a frustração e o sofrimento são gerados pela desconexão. Ou seja, a pessoa só se apega àquilo que não possui
vínculo energético. Tive certa feita, a oportunidade de conviver com uma estudante chinesa que vive no Brasil.
Ela foi minha aluna em um Curso de Pós-Graduação. Falando u pouco de si mesma, ela me disse ser budista e
também praticante de muitos hábitos e tradições da cultura chinesa. Apesar de bem jovem, ela já era uma senhora

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Filosofia, Filosofia Oriental e Filosofia Chinesa Jean Sidcley Álvares Teixeira.
casada e seu marido estava em Pequim trabalhando em uma empresa de tecnologias virtuais há seis anos. Neste
período, ela havia ido à China para estar com ele por três semanas e ele já havia vindo ao Brasil e aqui
permanecido trinta dias. Ao ouvir isso, perguntei-lhe: - Mas, você não tem saudade do seu marido? Ao que ela me
respondeu: - Não sei ao certo se compreendo o que seja a saudade, pois esta é uma palavra específica da língua
portuguesa. Se saudade for sentir falta de alguém ou de algo, posso lhe dizer que não tenho saudade do meu
marido. Olhando-a nos olhos perguntei mais uma vez: - Mas, por que você não tem saudade? – Ela me disse
sorrindo: - Jean, o meu marido nunca saiu de mim!!! A partir daquele momento aproximei-me da compreensão
do que seja o sofrimento no Budismo. Sofremos por aquilo que desejamos, mas não conectamos.

Veja a morte... Perdi o meu pai quando tinha apenas três anos de idade no final da década de 70. Cresci escutando
minha dizer que os seus filhos eram traumatizados com a morte do pai que havia sido barbaramente assassinado.
Durante muito tempo, cheguei a pensar em minha inocência que ser traumatizado era inerente à minha essência
e descendência. Cresci convivendo com a ideia de que a morte é a grande derrota e a maior tragédia de uma
família feliz. Sempre registrava que as piores coisas que ocorriam em minha vida tinham causa primeira o
assassinato de meu pai. Via minha chorar pelos cantos da casa, recitar lamentos, visitar o túmulo de meu pai e
vincular a morte à pior perda irreparável. Ao estudar o Budismo e as demais filosofias do Oriente, vemos que
podemos transformar as ideias de morte, sofrimento e frustração. Não é a presença física ou a eternidade
material que vão configurar o vínculo.

Sei da existência de cientistas que estão desenvolvendo técnicas de congelamento de corpos de pessoas
portadoras de doenças (hoje incuráveis) com a expectativa de devolver-lhes a cura em até 100, 200 anos (não sei
ao certo). Pergunto-me: - O que faria uma pessoa descongelada cem anos depois? Com quem ela viveria? Como
estaria o mundo? Não seria apego demais a uma existência singular?

Penso agora na tirania da estética, na busca do elixir da eterna juventude, no medo de envelhecer, de morrer, de
falir, de não ser feliz, de não ter, de não ser reconhecido pelos outros, de engordar e tantos outros que nos
impedem de construir a nossa trajetória de iluminação, de cumprir o nosso carma no Samsara a fim de atingir o
Nirvana. Na concepção budista, o homem é um ser apegado e frustrado quando se encontra preso na ilusão de
Maya e reduz a sua trajetória de iluminação a uma única existência singular. O mundo é o eterno fluxo de
mudanças, onde tudo tende a se tornar o seu oposto: dia/noite; alegria/tristeza; vida/morte... É neste fluxo
constante que tudo evolui, por isso, pressupõe desapego e disponibilidade para o caminhar. O caminho nunca
existe, ele se faz quando nos colocamos em marcha.

Confucionismo

Corrente filosófica que se original na China no século VI a.C.. O confucionismo é uma doutrina (ou sistema
filosófico) criada pelo pensador chinês Confúcio (Kung-Fu-Tzu) e possui, além das ideias filosóficas, abordagens
pedagógicas, políticas, religiosas e morais. Confúcio compilou e organizou antigas tradições da sabedoria chinesa
e elaborou uma doutrina assumida como oficial na China por mais de 25 séculos. Combatido como reacionário
durante a Revolução Cultural chinesa (1966-1976), o confucionismo toma novo impulso após as recentes
mudanças políticas no país. Atualmente, 25% da população chinesa declara-se adepta do confucionismo.

Trata-se de um rico compêndio onde os chineses se baseiam para a formação moral das crianças, bem como o
apreço pelas tradições. É também chamada de filosofia materialista chinesa, pois trata da realidade concreta dos
demais, vista como palco para a busca do aperfeiçoamento e da iluminação.

A principal ideia desta filosofia é a busca da realização de todas as aspirações e projetos que correspondem à
vida material (concreta). Através deste caminho é possível ter uma vida equilibrada e boa. Através desta
trajetória, os seres humanos podem viver, mantendo o equilíbrio entre as vontades materiais (prazeres, bens,
objetos, desejos) e o seu projeto interno de iluminação.

Os valores mais importantes no confucionismo são: disciplina, estudo, consciência política, trabalho e respeito
aos valores morais. Embora não seja uma religião, existem templos confucionistas, onde ocorrem rituais de
ordem social. Entre os séculos II e começo do XX, o confucionismo foi a doutrina oficial na China.

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A humanidade é o núcleo do confucionismo. Uma maneira simples de apreciar o pensamento de Confúcio é
considerá-lo como sendo baseado em diferentes níveis de honestidade, e uma forma simples de entender o
pensamento de Confúcio é examinar o mundo usando a lógica da humanidade. Na prática, os elementos do
confucionismo acumularam-se ao longo do tempo. Existe o clássico Wuchang (五常), constituído por cinco
elementos: Ren (仁, a Humanidade), Yi (义, justiça), Li (礼, ritual), Zhi (智, conhecimento) e Xin (信, integridade),
e há também o Sizi clássico (四字), com quatro elementos: Zhong (忠, lealdade), Xiao (孝 , a piedade filial), Jie (节
, continência) e Yi (义, justiça). Há ainda muitos outros elementos, tais como o Cheng (诚, honestidade), Shu (恕,
bondade e perdão), Lian (廉, honestidade e pureza), Chi (耻, vergonha, juízo e senso de certo e errado), Yong (勇
, bravura), Wen (温, amável e gentil), Liang (良, bom, bom coração), Gong (恭, respeitoso, reverente), Jian (俭,
frugal) e Rang (让, modéstia, discrição). Entre todos os elementos, o Ren (Humanidade) e o Yi (Justiça) são
fundamentais. Às vezes, a moralidade é interpretada como o fantasma da Humanidade e da Justiça

Quando fui seminarista durante quase dez anos, ouvi muito que precisamos abandonar este mundo para sermos
merecedores de um outro, único e verdadeiro no céu. Por isso, tudo no mundo terreno é efêmero e ilusório. Os
prazeres da carne e do mundo material não nos satisfazem. Por isso, para alcançar a salvação, é preciso uma vida
moderada e regrada com penitências e mortificações.

O Confucionismo, ao contrário parte do princípio do que se não mergulhamos no mundo com suas idiossincrasias,
não poderemos sair dele mais iluminados. Por isso, é comum na Cultura Chinesa, o ancião se encarregar da
educação das crianças e dos jovens. Como mestre que já percorreu aquele caminho (Tao), ele deve ensinar as
crianças e os mais jovens a terem disciplina e foco na realização de suas metas fundamentais.

Tendo como referência o eterno fluxo dos opostos complementares de yin/yang, o homem chinês deve abrir-se
para a vivência do Cotidiano, recebendo dos mais velhos a Tradição, realizando-se nela e repassando-a para
novos discípulos. É desta relação Mestre-Discípulo é que podemos atestar a perenidade da tradição milenar
chinesa. Os chineses aprender com a educação confucionista a amar e preservar os elementos primorosos de sua
Tradição: a língua, a culinária, a mitologia, a medicina, a filosofia, a espiritualidade, a arte, a genética e, etc. Um
chinês imbuído da formação confucionista, pode deixar a China e ir viver noutro país que jamais perde a sua
essência e apreço por sua tradição.

Para concluir podemos dizer que o mundo confucionista é a Tradição em eterno fluxo (Yin/Yang), o homem é o
ser da tradição e a trajetória de iluminação a ser apreendida é receber a tradição, basear-se nela e repassá-la.

Taoísmo
O taoismo, também chamado daoismo e tauismo , é uma tradição filosófica e religiosa originária da China que
enfatiza a vida em harmonia com o Tao (romanizado atualmente como "Dao"). O termo chinês tao significa
"caminho", "via" ou "princípio", e também pode ser encontrado em outras filosofias e religiões chinesas. No
taoismo, especificamente, o termo designa a fonte, a dinâmica e a força motriz por trás de tudo que existe.
É, basicamente, indefinível: "O Tao do qual se pode discorrer não é o eterno Tao." A principal obra do taoismo é
o Tao Te Ching, um livro conciso e ambíguo que contém os ensinamentos atribuídos a Lao Zi (chinês: 老子, pinyin:
Lǎozi, Wade-Giles: Lao Tzu). Juntamente com os escritos de Zhuangzi, estes textos formam os alicerces filosóficos
do taoismo. Este taoismo filosófico, individualista por natureza, não foi institucionalizado.
Ao longo do tempo, no entanto, foram sendo criadas formas institucionalizadas do taoismo na forma de diferentes
escolas que, frequentemente, misturaram crenças e práticas que antecediam até mesmo os textos-chave do
taoismo - como, por exemplo, as teorias da Escola dos Naturalistas, que sintetizaram conceitos como o do yin-
yang e o dos cinco elementos. As escolas taoistas tradicionalmente reverenciam Lao Zi e os "imortais" ou
"ancestrais" e possuem diversos rituais de adivinhação e exorcismo, além de práticas que visam a atingir o êxtase
e obter maior longevidade ou mesmo a imortalidade.
As tradições e éticas taoistas variam de acordo com a escola, porém, no geral, enfatizam a serenidade , a não ação
(wu-wei), o vazio, a moderação dos desejos5 , a simplicidade , a espontaneidade, a contemplação da natureza e os
Três Tesouros: compaixão, moderação e humildade.
O taoismo teve uma influência profunda na cultura chinesa no decorrer dos séculos. Os clérigos do taoismo
institucionalizado (chinês: 道士, pinyin: dàoshi), geralmente, tomam cuidado para deixar clara a distinção entre
suas tradições rituais e os costumes e práticas encontrados na religião popular chinesa, uma vez que estas

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distinções podem ser facilmente pouco perceptíveis. A alquimia chinesa (especialmente neidan), a astrologia
chinesa, o zen-budismo, diversas artes marciais, a medicina tradicional chinesa, o feng shui e diversos estilos de
qiqong têm suas histórias entrelaçadas com a do taoismo. Além da China em si, o taoismo teve grande influência
nas sociedades do leste da Ásia.
Após Lao Zi e Zhuangzi, a literatura do taoismo cresceu com regularidade e passou a ser compilada na forma de
um cânone, o Daozang, que, por vezes, era publicado a mando do Imperador da China. Ao longo da história
chinesa, o taoismo foi, por diversas vezes, decretado a religião do Estado. Após o século XVII, no entanto, ele
perdeu muito de sua popularidade. Tal como todas as outras atividades religiosas, o taoismo foi reprimido nas
primeiras décadas da República Popular da China e até mesmo perseguido durante a Revolução Cultural de Mao
Tsé-Tung; continuou, no entanto, a ser praticado livremente em Taiwan. Hoje em dia, é uma das cinco religiões
reconhecidas pela República Popular da China e, embora não costume ser compreendida com facilidade longe de
suas raízes asiáticas, tem seguidores em diversas sociedades ao redor do mundo.

A Filosofia Zen
Zen é o nome japonês da tradição (e filosofia) religiosa ch'an, que surgiu na China por volta do século VII . O zen
costuma ser associado ao budismo do ramo mahayana. Foi cultivado, inicialmente, na China, Japão, Vietnã e
Coreia. A prática básica do zen é o zazen (literalmente, "meditar sentado"), tipo de meditação contemplativa que
visa a levar o praticante à "experiência direta da realidade" através da observação da própria mente e da
paralisação dos pensamentos.
O zen, tal como o conhecemos hoje, só foi possível devido à forte influência que o budismo sofreu do taoismo.
Para alguns estudiosos, o zen nada mais é que a síntese dessas duas correntes de pensamento (budismo e
taoismo). Outros concluem que o zen deveria ser considerado à parte do budismo, pois sua natureza e tradição
tão peculiares só foram possíveis e criadas devido à influência do pensamento chinês.
No zen japonês, há duas vertentes principais: soto e rinzai. Enquanto a escola soto dá maior ênfase à meditação
silenciosa, a escola rinzai faz amplo uso dos koans, ou "enigmas". Atualmente, o zen é uma das escolas budistas
mais conhecidas e de maior expansão no Ocidente.
Segundo Alan Watts, inglês que se notabilizou no Ocidente pela divulgação do zen , este, em sua forma original
chinesa, não se encontra mais na China, e o que de mais próximo se pode conhecer desta versão original é
encontrado em formas de arte tradicionais do Japão que tenham sido cultivadas e transmitidas segundo esta
tradição.

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