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SIMPLICIDADE TÁTICA
Escrito em 26/04/2020 por Capitão Calaça

Mesmo com quase todos os filmes tentando mostrar o contrário, a simplicidade


sempre foi o maior vetor de sucesso para as ações policiais.

Introdução

Leo Frankowski é um brilhante engenheiro com várias patentes e muitos

livros de ficção científica em seu nome. Ele e eu colaboramos em várias

obras militares de ficção científica. Ele diz que, “nas paredes dos vestiários

dos engenheiros, você encontrará uma placa onde se lê ‘KISS!’ Quando

alguém pergunta do que se trata, lhe dizem que significa “Keep It Simple

Stupid” (Que em tradução livre pode ser interpretado como “não

complique seu estúpido!”) . Esta regra fundamental também se aplica no

treinamento e preparação de guerreiros para o combate.

(GROSSMAN, 2017, p. 27)

Mesmo com quase todos os seriados policiais tentando mostrar o contrário, a


simplicidade sempre foi o maior vetor de sucesso. Mesmo para as ações mais
audaciosas já vistas, em termos táticos. Quem já participou de uma operação policial,
com ou sem confronto armado, vai entender e concordar com a importância da
simplicidade e com o poder que a tensão das ocorrências tem de complicar as coisas e
fazê-las darem errado para quem não se preparou para situações absurdamente
óbvias. Precisamos entender por que a simplicidade é tão importante para a tática e
como devemos buscá-la.

Simplicidade, ciência e a atuação policial

A atuação policial é extremamente complexa por si só, pois precisamos tomar


decisões vitais em segundos, com consequências muito sérias para a sociedade e para
a integridade física do próprio operador. Além disso, o policial precisa dominar o uso
de uma série de equipamentos que podem estar disponíveis para o seu trabalho,
como armas de fogo, instrumentos de menor potencial ofensivo, equipamento
radiotransmissor, dentre outros. A demanda de treinamento específico é gigantesca,
uma vez que o policial precisa estar preparado para fazer uso de cada instrumento e
equipamento, de forma rápida, precisa, sob grande tensão e realizando análises
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jurídicas sob pena de ser responsabilizado pelo abuso de sua autoridade, excesso no
uso da força ou pela omissão de dever agir.
O psicólogo experimental William Edmund Hick, em 1952, pesquisou e escreveu sobre
um assunto que ficaria conhecido posteriormente como “lei de Hick”. Em seu trabalho,
ele analisou o tempo de tomada de decisão mediante o número de escolhas
apresentadas como opção. Com isso, chegou à conclusão de que ao aumentar o
número de opções de uma para duas, o tempo de resposta sobe mais de 50%, de
maneira logarítmica. Esse tempo de resposta é chamado de “taxa de ganho de
informação”.
Algumas questões interferem nesse tempo de resposta e a principal delas é o
estímulo ser conhecido ou não, pois estímulos conhecidos geram respostas mais
rápidas, e é aí que precisamos trazer essas noções da ciência para nossa realidade da
atuação policial e metodologia de treinamento, pois precisamos refletir sobre a
relação entre carga horária e conteúdo ministrado para desenvolver uma nova
habilidade.

Treinamento eficiente

Algo que sempre observei nas instruções de tiro que ministrei formalmente pela
minha instituição, nos cursos de formação, é que dificilmente o aluno saía preparado
para solucionar uma pane de tiro, simplesmente pelo fato de que passávamos mais de
uma forma de solucionar a pane e não havia tempo para simular essas panes e
transformar o estímulo em algo conhecido, além do aluno ser bombardeado com
várias opções, que iriam demandar maior tempo para uma resposta adequada no
cenário real.
No manual sobre armamento e tiro dos Marines, eles ensinam uma técnica para
solução de panes chamada “Tap Rack and Bang” (Bater, ciclar e atirar), que se resume a
bater no carregador, manobrar o ferrolho da arma e tentar atirar novamente. Essa
solução serve para a maioria das panes e se torna muito mais simples de ser ensinada
no curso de formação e é muito mais compatível com o cenário de prejuízo cognitivo
das situações de estresse. A simplicidade da ação torna o procedimento eficiente,
mesmo que não resolva todos os casos.

Planejamento operacional

Quem planeja e/ou executa operações táticas, tanto de cunho convencional quanto
de ações táticas especiais, consegue perceber com maior facilidade quais são as
fricções envolvidas em cada situação e como se preparar melhor para isso.
Outro aspecto a ser observado é sobre a simplicidade da orientação aos operadores
que participarão da ação, a respeito do que devem fazer e qual objetivo deve ser
atingido. Para isso, faço referência ao trabalho dos pesquisadores Franklin Henry e
Donald Rogers, que em 1960 verificaram em suas pesquisas que aumentar o número
de tarefas aumenta também o tempo de execução da primeira tarefa. Você pode estar
achando que isso parece óbvio, mas te convido a tentar enxergar de outra forma.
Eles mediram o tempo em que uma pessoa levava para cumprir uma tarefa simples
(acender uma luz), depois adicionaram outras tarefas e mediram novamente o tempo
que esse mesmo indivíduo levava para cumpri-las, porém só estava sendo analisado o
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tempo levado para execução da primeira, que não tinha mudado. Pelo fato de ter
outra atividade para executar após acender a luz, a pessoa demorava mais para
acender. Isso nos mostra o motivo pelo qual precisamos ser objetivos nas orientações,
de modo a exigir o mínimo possível do cognitivo do operador com questões
desnecessárias à compreensão da tarefa dele e do objetivo da missão.
Para além da ciência, William McRaven, em seu livro "Spec Ops" (1996), listou seis
princípios para condução de Operações Especiais:

Simplicidade
Segurança
Repetição
Surpresa
Rapidez
Propósito

Fonte: McRaven (1996, p. 11).


Simplicidade é o primeiro item e isso não é à toa, pois, segundo o autor:

"Simplicidade é o mais crucial e algumas vezes o princípio mais difícil de

cumprir. Como se faz um plano simples? Existem três elementos da

simplicidade que são críticos para o sucesso: Limitar o número de objetivos,

boa inteligência e inovação."

MCRAVEN (1996)

Para ser simples e ter maior chance de fazer o plano dar certo, não podemos querer
tudo ao mesmo tempo. Limitar o número de objetivos é vital para vitória. Sobre a
observação do autor a respeito da boa inteligência, isso se refere às informações
obtidas sobre a missão. Quanto menos incógnitas tivermos, melhor será o
planejamento. Sobre inovação, podemos entender como o uso da tecnologia e a
criatividade para pensar soluções não convencionais para os problemas. Atentar para
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essas características é a chave para tornar todos os passos seguintes mais favoráveis e
menos arriscados.

Conclusão

Analisando os dados da ciência, da história e da prática policial enquanto operador e


instrutor, não tenho receio algum em dizer que buscar excelência e alta performance é
sinônimo de buscar a simplicidade em sua essência. Entretanto, gostaria de encerrar
esse texto com o aviso do autor Kenneth Murray, que em seu livro "Training at the
speed of life" (2004) alerta para a diferença entre simplicidade e facilidade, dizendo

que simplicidade é buscar o menos complexo, enquanto facilidade significa buscar


menor esforço. Nem sempre a solução mais simples será a mais fácil, mas certamente
terá maior chance de dar certo por ser a menos complexa para solucionar o problema.
Busque simplicidade, não facilidade!

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