Você está na página 1de 6

PASQUAL M; SOARES JDR; RODRIGUES FA; ARAUJO AG; SANTOS RR. 2011.

Influência da qualidade de luz e silício no crescimento in vitro de


orquídeas nativas e híbridas. Horticultura Brasileira 29: 324-329.

Influência da qualidade de luz e silício no crescimento in vitro de


orquídeas nativas e híbridas
Moacir Pasqual; Joyce DR Soares; Filipe A Rodrigues; Aparecida G de Araujo; Roseneide R dos Santos
UFLA-Depto Agricultura, C. Postal 3037, 37200-000 Lavras-MG; mpasqual@dag.ufla

RESUMO ABSTRACT
Objetivou-se avaliar a influência do ambiente de cultivo e de Light quality and silicon on growth in vitro of native and
concentrações de silicato de cálcio no crescimento in vitro de uma hybrid orchid species
espécie nativa de orquídea (Brassavola perrine) e de um híbrido The vegetative propagation techniques using tissue culture can be
[(Laelia cattleya Culminant “Tuilerie” x Laelia cattleya Sons Atout a valuable tool in the production of orchid seedlings. The objective
Rotunda) x Brassolaelia cattleya Startifire Moon Beach]. Plântulas of this study was to determine the concentration of calcium silicate
oriundas de sementes germinadas in vitro com aproximadamente 0,5 and light quality that provides better growth in seedlings of native
cm de comprimento foram inoculadas em frascos com capacidade orchid (Brassavola perrine) and hybrid [(Laelia cattleya Climax
para 250 mL contendo 60 mL de meio de cultura MS, acrescido de “Tuilerie” x Laelia cattleya Sons Atout Rotunda) x Brassolaelia
silicato de cálcio (0; 0,5; 1,0 e 2,0 mg L-1) em ambientes de cultivo cattleya Startifire Moon Beach]. Seedlings from seeds germinated
[natural (casa de vegetação) e artificial (em sala de crescimento)], in vitro with approximately 0.5 cm long were inoculated in 250
em todas as combinações possíveis. O meio de cultura teve seu pH mL flasks containing 60 mL of culture medium MS, plus calcium
ajustado para 5,8±0,1 e geleificado com 5,5 g L-1 de ágar antes do silicate (0, 0.5, 1.0 and 2.0 mg L-1) in environments of culture [natural
processo de autoclavagem a 121ºC e 1 atm por 20 minutos. Ao final (a greenhouse) and artificial (in a growth room)] in all possible
de 150 dias foram realizadas avaliações biométricas e análises mi- combinations. The culture medium had its pH adjusted to 5.8 ± 0.1
cromorfológicas (miscroscopia de varredura) nas plântulas. Maior and solidified with 5.5 g L-1 of agar before autoclaving at 121º C and
crescimento foi obtido com a utilização de 2,0 mg L-1 e 1,0 mg L-1 1 atm for 20 minutes. After 150 days biometrics and ultrastructural
de silicato de cálcio para o híbrido e espécie nativa, respectivamente, analysis (scanning microscopy) were carried out. Greater growth
em sala de crescimento. As orquídeas em estudo são espécies anfies- of seedlings was obtained with the use of 2.0 mg L-1 and 1.0 mg
tomáticas, com estômatos do tipo tetracítico (híbrida) e anomocítico L-1 of calcium silicate for hybrid and native species, respectively.
(nativa). A presença do silício na estrutura foliar proporcionou o The orchid species in study are anfistomatic with the type tetracytic
correto desenvolvimento (ausência de deformações estruturais) de (hybrid) and anomocytic (native) stomata. The presence of silicon in
plântulas de orquídeas. the leaf structure provided correct development (absence of structural
deformations) of seedlings of orchids.

Palavras-chave: Brassavola perrine, Laelia cattleya, Brassolaelia Keywords: Brassavola perrine, Laelia cattleya, Brassolaelia
cattleya, cultura in vitro, microscopia, anatomia vegetal, biometria. cattleya, in vitro culture, microscopy, plant anatomy, biometrics.

(Recebido para publicação em 25 de março de 2010; aceito em 19 de agosto de 2011)


(Received on March 25, 2010; accepted on August 19, 2011)

A s orquídeas estão entre as plantas


ornamentais mais apreciadas e
de grande valor comercial, devido,
visando diminuição dos custos de pro-
dução, obtida através da substituição das
lâmpadas fluorescentes utilizadas nas
de cultivo, como a adição de fontes de
silício, promovem efeitos benéficos nas
plantas, elevando o conteúdo de hemi-
principalmente, à sua capacidade de salas de crescimento pela luz natural, e celulose e lignina, aumentando assim a
combinação genética e à beleza, forma modificações na formulação do meio de rigidez na parede celular, fazendo com
e cor de suas flores. Dificilmente essas cultivo (Rocha et al., 2007). Gastos com que sejam alcançadas elevadas taxas
espécies formam sementes na nature- iluminação artificial nas salas de cultivo de sobrevivência de plantas na aclima-
za, e, quando formam, apenas 3 a 5% somam, aproximadamente, 65% do total tização (Camargo et al., 2007). A ação
germinam (Tombolato & Costa, 1998). de energia elétrica utilizada nos labora- benéfica do silício tem sido associada a
A cultura de tecidos se destaca como tórios de cultura de tecidos de plantas diversos efeitos indiretos como aumento
uma técnica que viabiliza a germinação (Standaert-de-Metsanaere, 1991). da eficiência da capacidade fotossintéti-
de sementes possibilitando a obtenção Efeitos benéficos da luz natural e de ca, redução da transpiração, crescimento
de grande quantidade de mudas em curto modificações na composição nutricional de plantas e aumento da resistência
espaço de tempo. As primeiras aplica- dos meios de cultura foram observados mecânica das células (Zhou, 1995). Em
ções da micropropagação na multiplica- na micropropagação de coqueiro (Cocos estudo com morangueiro, Braga (2009)
ção e crescimento de espécies do gênero nucifera L.) cv. Yellow Malayan Dwarf verificou que a deposição de cera foi
Orchidaceae datam da década de 1960 com redução nos custos de produção observada com a utilização de silicato
(Tombolato & Costa, 1998). Desde en- das mudas (Talavera et al., 2005). de sódio (NaSiO3) evitando com isso a
tão, houve intensificação nas pesquisas Modificações na composição do meio perda de água pela epiderme.

324 Hortic. bras., v. 29, n. 3, jul.- set. 2011


Influência da qualidade de luz e silício no crescimento in vitro de orquídeas nativas e híbridas

A utilização da microscopia eletrôni- crescimento), por 150 dias. Foram tocolo pré determinado (Alves, 2004).
ca de varredura possibilita a produção de realizados dois experimentos idênticos, O delineamento experimental foi
imagens de alta resolução da superfície sendo um para a espécie nativa e outro inteiramente casualizado, tanto no
de uma amostra, devido à maneira com para o híbrido. experimento com orquídea nativa
que as imagens são criadas, fornecendo No ambiente artificial, na sala de (Brassavola perrine) quanto para o
uma aparência tridimensional em que crescimento, a iluminação foi forneci- híbrido [(Laelia cattleya Culminant
as características são úteis para avaliar da por lâmpadas fluorescentes do tipo “Tuilerie” x Laelia cattleya Sons
a estrutura superficial de uma dada luz do dia especial (OSRAM® 20 W), Atout Rotunda) x Brassolaelia cattleya
amostra (Alves, 2004). com irradiância média de 42 W/m2, Startifire Moon Beach], ambos em
Diante do exposto, objetivou-se ava- fotoperíodo de 16 horas e temperatura esquema fatorial 2x4, sendo dois
liar a influência da qualidade de luz no de 25 ± 2oC. No ambiente natural a casa ambientes (natural e artificial) e 4
ambiente de cultivo e de concentrações de vegetação tinha iluminação natural, concentrações de silicato de cálcio
de silicato de cálcio no crescimento in sombreamento de 70% (Sombrence®), (CaSiO3 = 0,0; 0,5; 1,0 e 2,0 mg L-1), 4
vitro de uma espécie nativa de orquí- apresentando os seguintes parâme- repetições formadas de 3 plântulas, ou
dea (Brassavola perrine) e um híbrido tros ambientais: temperaturas máxi- seja, 12 plântulas por tratamento.
[(Laeliacattleya Culminant “Tuilerie” mas, mínimas e médias de 26ºC/32ºC, Os dados obtidos foram submetidos
x Laeliacattleya Sons Atout Rotunda) 16ºC/16ºC e 20ºC/23°C e níveis de ir- à análise de variância usando-se o pro-
x Brassolaeliacattleya Startifire Moon radiância, máximos, mínimos e médios, grama estatístico Sisvar 4.3 (Ferreira,
Beach], por meio de análise fitotécnica de 93,95 W/m2/199,69 W/m2, 11,13 W/ 2000), sendo as médias comparadas pelo
e micromorfológica. m2/10,66 W/m2 e 49,38 W/m2/99,43W/ Teste F, a 5% de probabilidade sem que
m2, referentes a dias nublados e claros houvesse transformação de dados.
MATERIAL E MÉTODOS típicos do período de condução do ex-
perimento.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O trabalho foi conduzido entre Dados referentes à radiação solar
os meses de março e agosto de 2008, diurna, incidente na altura dos frascos na
sala de crescimento e casa de vegetação, Interação entre os fatores estudados
em laboratório do Departamento de (concentrações de silicato de cálcio e
Agricultura, da UFLA, no município foram obtidos por sensores de radiação
(LI-200SA, Li-cor, Lincoln, Nevasca, ambientes de cultivo) foi observada nas
de Lavras. variáveis relativas à parte aérea (compri-
Plântulas de uma espécie nativa de USA), acoplados a um sistema de regis-
tro (LI 1400; Li-cor.Neb), a cada meia mento médio dos brotos e da parte aérea,
orquídea (Brassavola perrine) e um número de folhas) e também na massa
híbrido [(Laelia cattleya Culminant hora, durante 11 horas (das 7:00 às 18:00
horas). Para o ambiente de sala de cres- seca de plântulas de ambas as espécies
“Tuilerie” x Laelia cattleya Sons Atout (Figuras 1 e 2).
Rotunda) x Brassolaelia cattleya cimento, foi feita apenas uma medida da
radiação, durante 6 horas, visto tratar-se Foi verificado maior comprimento
Startifire Moon Beach], advindas
de ambiente controlado. Para a coleta médio dos brotos (1,34 cm) no genótipo
de germinação in vitro de sementes
de dados referentes às temperaturas híbrido (Figura 1A), a utilização de 1,0
oriundas de autofecundação (nativa)
mínimas, médias e máximas semanais, mg L-1 de silicato de cálcio e luz arti-
ou polinização cruzada (híbrido) foram
empregou-se um termo-higrógrafo. ficial na sala de crescimento, mostrou
utilizadas. As sementes foram germi-
Ao final de 150 dias foram avaliados maior eficiência (1,34 cm) em termos
nadas em meio de cultura Knudson
o número de brotos e folhas emitidos, de aumento de tamanho, sendo que a
C (Knudson, 1946) modificado em
comprimento médio de brotos e da parte partir desse valor houve decréscimo de
ZnSO4.7H2O (de 0,331 para 6,62 mg
aérea e massa seca de plântulas (após forma quadrática no tamanho dos brotos.
L-1), H3BO3 (de 0,056 para 1,4 mg L-1)
secagem em estufa, a 60ºC, por 72 horas, Na espécie nativa (Figura 1B), maior
e MnSO4 H2O (de 7,5 para 15 mg L-1)
até peso constante). comprimento dos brotos (6,62 cm) foi
(Carvalho et al., 2009), onde permane-
Amostras do terço mediano de 3 obtido com a máxima concentração de
ceram por três meses. Após este período,
folhas em 5 plantas foram fixadas em silicato de cálcio testada (2,0 mg L-1),
cada plântula de aproximadamente 0,5
Karnovsky (Karnovsky, 1965), pós fi- também em sala de crescimento. Nas
cm de comprimento foi inoculada em
frascos com capacidade para 250 mL xados em tetróxido de ósmio (OsO4) e, duas espécies, o tamanho dos brotos em
contendo 60 mL de meio de cultura MS em seguida, desidratados em soluções casa de vegetação foi significativamente
(Murashige & Skoog, 1962), acrescido crescentes de acetona (30%, 50%, 70%, menor, sendo que o híbrido apresentou
de silicato de cálcio (0; 0,5; 1,0 e 2,0 90% e 100%), sendo então submetidas maior comprimento (0,9 cm) com 2 mg
mg L-1), pH ajustado para 5,8±0,1 e à secagem ao ponto crítico, utilizando- L-1 e a nativa mostrou maior resultado
gelificado com 5,5 g L-1 de ágar antes -se CO 2 como líquido de transição (1,35 cm) com 0,5 mg L-1de silicato de
do processo de autoclavagem a 121ºC (Robards, 1978). Posteriormente, cálcio.
e 1 atm por 20 minutos. As culturas foram recobertas com ouro (20 nm) e Quanto ao crescimento da parte
foram mantidas sob luz natural (casa analisadas ao microscópio eletrônico aérea no híbrido (Figura 1C), o maior
de vegetação) e luz artificial (sala de de varredura LEO-EVO, seguindo pro- resultado (2,84 cm) foi obtido com a uti-

Hortic. bras., v. 29, n. 3, jul.- set. 2011 325


M Pasqual et al.

A B

C D
Figura 1. (A) comprimento médio dos brotos do genótipo híbrido e (B) da espécie nativa; (C) comprimento da parte aérea (cm) do genótipo
híbrido e (D) da espécie nativa de orquídea utilizando diferentes concentrações de silicato de cálcio e em ambientes de cultivo (luz artificial
e natural) ((A) shoots average length of hybrid and (B) native species, (C) aboveground part length (cm) of hybrid and (D) native species
of orchid using different concentrations of calcium silicate and cultivation environments (artificial and natural light)). Lavras, UFLA, 2010.

lização de 2 mg L-1 de silicato de cálcio nativa, o acréscimo de silicato de cálcio Os maiores valores para crescimento
em sala de crescimento. Já em casa de promoveu crescimento da parte aérea de plântulas tratadas com Si sugerem
vegetação, o maior resultado (1,9 cm) dessas plântulas, fato que foi observado que, além dos efeitos benéficos do Si
também foi observado com a mesma por Zhou (1995), onde o aumento de em reter água (Trenholm et al., 2004),
concentração, porém o comprimento foi tamanho das folhas de Phalaenopsis foi aumentando assim a eficiência na fase
significativamente menor. Para a espécie obtido com a adição de concentrações de aclimatização, o mesmo pode estar
nativa (Figura 1D), o maior comprimen- de 0,1-1,0 mg L-1 de silicato de cálcio ao envolvido no metabolismo da parede
to foi obtido com a utilização de 0,5 meio de cultura VW modificado (Vacin celular, melhorando a capacidade das
mg L-1 de silicato de cálcio, atingindo & Went, 1949), e por Romero-Aranda células em expandir, e consequente-
um máximo de 7,1 cm em luz artificial et al. (2006), em que o máximo com- mente, aumentando o dimencionamento
(sala de crescimento), resultado este que primento das folhas de Lycopersicon da célula (Romero-Aranda et al., 2006).
foi superior ao obtido sob condições de esculentum (tomateiro) foi encontrado Analisando-se o número de folhas
luz natural (3,57 cm), mesmo com uma com concentrações de 0,1-1,0 mg L-1 de das duas espécies de orquídeas, observa-
concentração maior de silicato de cálcio silicato de potássio em solução nutritiva se um comportamento semelhante. As
(0,90 mg L-1). de Hoagland. duas obtiveram melhores resultados
Os dados apresentados sugerem Essa diferença de resultados po- na presença de luz artificial, sendo que
efeitos benéficos na adição de sílicio deria ser explicada pelo fato de que o a orquídea híbrida apresentou maior
(Si) ao meio de cultura e no cultivo de crescimento de plantas, órgãos, tecidos número de folhas (6,56) com a utilização
plântulas em sala de crescimento (luz e células in vitro depende do desenvol- de 1,1 mg L-1 (Figura 2A) e a espécie
artificial), corroborando resultados obti- vimento de meios de cultura otimizados nativa (7,72) com a utilização de 0,7
dos em estudos com Phalenopsis (Zhou, para cada espécie e da perfeita interação mg L-1 (Figura 2 B). Ambas mostraram
1995) e Lycopersicon esculentum de componentes essenciais como fontes decréscimo no número de folhas com o
(Romero-Aranda et al., 2006). Tanto de carbono e nutrientes minerais aumento na concentração de silicato de
para o híbrido, quanto para a espécie (Pasqual, 2001). cálcio, provavelmente devido ao fato de

326 Hortic. bras., v. 29, n. 3, jul.- set. 2011


Influência da qualidade de luz e silício no crescimento in vitro de orquídeas nativas e híbridas

A B

C D
Figura 2. Número de folhas no genótipo híbrido (A) e na espécie nativa(B); matéria seca de plântulas (g) do genótipo híbrido (C) e da
espécie nativa (D) em diferentes concentrações de silicato de cálcio e ambientes de cultivo (luz artificial e natural) ((A) leaf number of
hybrid and (B) native species, (C) dry mass of seedlings (g) of hybrid and (D) native species at different concentrations of calcium silicate
and culture environments (artificial and natural light)). UFLA, Lavras, 2010.

que todo nutriente em excesso provoca do que este elemento é absorvido pelas al., 2002).
desbalanço nutricional causado por sua raízes e translocado para a parte aérea, Nas superfícies adaxial e abaxial
maior concentração na planta ou por onde desempenha papéis fisiológicos e (folha anfiestomática) foi verificada a
interações com outros elementos provo- estruturais na anatomia da folha (Barros presença de estômatos do tipo tetracítico
cando deficiência ou acúmulo excessivo et al., 2002). tanto no híbrido quanto na espécie nativa
(Malavolta, 2006). De modo semelhante, Romero- independente do tratamento com silício.
Comportamento semelhante tam- -Aranda et al. (2006) evidenciaram Estudos da anatomia do estômato, em
bém foi observado para massa seca de maior massa de plântulas de tomate conjunto com respostas fisiológicas, po-
plântulas do híbrido e da espécie nativa, com a utilização de silicato de potássio dem mostrar evidências de aclimatação
observando-se maior incremento no e de cloreto de sódio. Trabalhando com adaptativa a determinados ambientes
ambiente de sala de crescimento (LA) orquídea Phalaenopsis, Zhou (1995) (Dunlapp & Stettler, 2001). A deposição
acrescido de 1,0 mg L-1 de silicato de também constatou incremento em massa de cera epicuticular foi visualizada nas
cálcio, onde obteve-se 0,22 g para o com a utilização de silicato de cálcio. duas epidermes das folhas de orquídea
híbrido (Figura 2C) e 0,0438 g para a O silício tende a acumular-se nas submetidas a tratamento com diferentes
espécie nativa (Figura 2D). folhas, formando uma barreira protetora concentrações de silício, em relação
Os dados positivos para número de e regulando a perda de água da planta ao tratamento controle (ausência de
folhas e massa seca de plântulas são con- por transpiração, auxiliando o processo CaSiO 3) (Figura 3). A deposição de
cordantes com resultados encontrados de aclimatização das plantas micropro- cera também foi observada na cultura
por Silva (2007) que, trabalhando com pagadas. Ao serem transferidas para do morangueiro com a utilização de si-
gérbera (Gerbera jamesonii), verificou o ambiente ex vitro, a principal causa licato de sódio (NaSiO3) por Braga et al.
maior número de folhas utilizando de mortalidade durante esse processo (2009). Com isso, evitou-se a perda de
silicato de cálcio em relação às demais é devido à perda de água, pela baixa água pelas células da epiderme. Zanega-
fontes de silício (silicato de sódio, cálcio funcionalidade dos estômatos e camada -Godoy & Costa (2003) observaram es-
e de potássio e ácido salicílico), indican- delgada de cera epicuticular (Barros et tômatos tetracíticos para quatro espécies

Hortic. bras., v. 29, n. 3, jul.- set. 2011 327


M Pasqual et al.

matização das espécies (Hanba et al.,


A B 2002). Assim, a presença do silício no
cultivo in vitro das espécies estudadas
neste trabalho proporcionou benefícios
estruturais que fizeram com que a planta
mantivesse um correto desenvolvimen-
to. Apesar do tempo de cultivo ter sido
relativamente maior, quando comparado
a outras espécies de orquideas in vitro
(Zhou, 1995), a presença desse elemen-
to, conferiu às plantas maior resistência
C D à perda de água quando comparado ao
tratamento controle, proporcionando o
correto arranjo das células da epiderme,
sem que houvesse desidratação dos
tecidos, que por sua vez prejudicaria o
processo de aclimatização.
O híbrido [(Laelia cattleya
Culminant “Tuilerie” x Laelia cattleya
Sons Atout Rotunda) x Brassolaelia
Figura 3. Eletromicrografia feita em microscópio de varredura em folhas de dois genótipos de cattleya Startifire Moon Beach], teve
orquídeas submetidas a diferentes concentrações de silicato de cálcio em sala de crescimento: seu maior crescimento sob a utiliza-
ausência de silicato de cálcio, (A) espécie híbrida e (C) espécie nativa; espécie híbrida com ção de 2,0 mg L-1 de silicato de cálcio
2,0 mg L-1 de CaSiO3 (B) e espécie nativa 0,5 mg L-1 de CaSiO3 (D) (electron micrograph of enquanto a espécie nativa Brassavola
orchid leaves exposed to different concentrations of calcium silicate and culture environments: perrine apresentou maior crescimento
Room for growth and absence of calcium silicate (A) hybrid species and (C) native species; de plântulas com a utilização de 0,5 mg
room for growth and 2.0 mg L-1 CaSiO3 (B) and 0.5 mg L-1 CaSiO3(D)). UFLA, Lavras, 2010. L-1 de silicato de cálcio. Tanto o híbrido
quanto a espécie nativa são anfiestomá-
ticas, com estômatos do tipo tetracítico
do gênero Cattleya (nativas do planalto 2008). A má formação dessas estru- e anomocítico, respectivamente. A
central brasileiro), em ambas as faces turas que ocasionaram deformações presença do silício na estrutura foliar
foliares, como no presente estudo em estruturais, podem não ter se restringido das espécies estudadas proporcionou o
que foram observados estômatos do tipo apenas à epiderme, mas possivelmente adequado desenvolvimento de tecidos
tetracítico nas faces abaxial e adaxial. ao parênquima, devido a um aumento de plântulas de orquídeas.
O tratamento controle, tanto no da sinuosidade dessas paredes.
ambiente de casa de vegetação quanto Na epiderme foliar, o silício com- REFERÊNCIAS
em sala de crescimento, apresentou de- bina-se com a celulose, podendo estar
formações na epiderme em relação aos presente nas células-guarda dos estôma- ALVES E. 2004. Introdução à microscopia
tratamentos que continham concentra- tos e nos tricomas (Silva et al., 2005). eletrônica. Lavras: UFLA/FAEPE. 88 p.
ções de silício em ambos os ambientes Segundo estes autores, o silício também BARROS LU; CUNHA CF; MIGUENS FC. 2002.
(Figura 3A, B, C e D). Em algumas pode ser encontrado nos elementos vas- Structure, morphology, and composition of
silicon biocomposites in the palm tree Syagrus
espécies da família Orchidaceae, ocor- culares. A deposição de silício na parede coronata (Mart.). Becc Protoplasma 220: 89-
rem células chamadas stegmatas, que das células torna a planta mais resistente 96. Disponível em: http://www.springerlink.
são células de morfologia variada, mas, à ação de fungos e insetos e evita a perda com/content/5u5cw1eectg5hh3w/.
geralmente elipsoides ou arredondadas. excessiva de água, diminuindo a taxa de BRAGA FT; NUNES CF; FAVERO AC;
Esses stegmatas possuem impregnação transpiração (Silva, 2007). PASQUAL P; CARVALHO JG; CASTRO EM.
2009. Características anatômicas de mudas de
de sílica e necessitam desse nutriente De modo geral, informações a morangueiro micropropagadas com diferentes
para o adequado desenvolvimento ana- respeito das contribuições acerca da fontes de silício. Pesquisa Agropecuária
tômico (Piwpuan & Thammathaworn, estrutura foliar e crescimento das plantas Brasileira 44: 128-132. Disponível em: http://
2008; Stern & Carlsward, 2008). podem contribuir para um melhor en- www.scielo.br/pdf/pab/v44n2/v44n02a03.pdf.
A deformação das células da epider- tendimento ou mesmo permitir a eluci- CAMARGO MS; KORNDÖRFER GH;
PEREIRA HS. 2007. Solubilidade do silício
me foi verificada nos tratamentos sem dação de lacunas relativas às diferenças em solos: influência do calcário e ácido
silício. Isto pode ser comprovado devido nas taxas de crescimento de plantas silícico aplicados. Bragantia 66: 637-647.
ao fato de que este nutriente pode se (Schluter et al., 2003). Adicionalmente, Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/brag/
depositar nas paredes celulares dessas as alterações que ocorrem na estrutura v66n4/14.pdf.
células e assim conferir resistência ao interna das folhas constituem aspectos CARVALHO MAF; PASQUAL M; SANTOS
FC; RODRIGUES VA; REZENDE JC;
tecido (Piwpuan & Thammathaworn, determinantes na capacidade de acli-

328 Hortic. bras., v. 29, n. 3, jul.- set. 2011


Influência da qualidade de luz e silício no crescimento in vitro de orquídeas nativas e híbridas

CARVALHO JG. 2009. Efeito do boro Lavras: UFLA/FAEPE, 97p. Economic considerations. In: DEBERGH
(H3BO3) e manganês (MnSO4.4H20) na PIWPUAN N; THAMMATHAWORN A. 2008. PC; ZIMMERMAN RH. Micropropagation
micropropagação de Cattleya loddigesii Lindl. Leaf and root anatomy of acriopsis reinw. tecnhnology and application 1: 131-140.
(Orchidaceae). Revista Ceres, 56: 322-325. ex blume (Orchidaceae) in Thailand. KKU STERN WL; CARLSWARD BS. 2008. Vegetative
DUNLAPP JM; STETTLER RF. 2001. Variation Science Journal 36: 58-63. anatomy of Calypsoeae (Orchidaceae).
in leaf epidermal and stomatal traits of Populus ROBARDS AW. 1978. An introduction to Lankesteriana 8: 105-112.
trichocarpa from two transects across the techniques for scanning electron microscopy TALAVERA C; CONTRERAS F; ESPADAS
Washigton Cascades. Canadian Journal of of plant cells. In: HALL JL. (ed). Electron F; FUENTES G; SANTAMARÍA JM. 2005.
Botany 79: 528-536. microscopy and cytochemistry of plant cells. Cultivating in vitro coconut palms (Cocos
FERREIRA DF. 2000. Sisvar 4.3: sistema de 1: 343-444. nucifera) under glasshouse conditions with
análise estatística. Lavras: UFLA/DEX, ROCHA HS; SILVA CRR; ARAUJO AG; SILVA natural light, improves in vitro photosynthesis
Software. AB. 2007. Propagação in vitro de bananeira nursery survival and growth. Plant Cell, Tissue
HANBA YT; KOGAMI H; TERASHIMA L. Prata Anã (AAB): intensidades luminosas and Organ Culture 83: 287-292. Disponível
2002. The effects of growth irradiance on leaf e concentrações de sacarose nas fases de em: http://www.springerlink.com/content/
anatomy and photosynthesis in Acer species multiplicação e enraizamento. Plant Cell l861454879q5gv72/.
differing in light demand. Plant Cell and Culture & Micropropagation 3: 10-16. TOMBOLATO AFC; COSTA AMM. 1998.
Enviroment 25: 1021-1030. ROMERO-ARANDA M; JURADO O; Micropropagação de plantas ornamentais.
KARNOVSKY MJ. 1965. A formaldehyde- CUARTETO J. 2006. Silicon alleviates the Campinas: Instituto Agronômico (Boletim
glutaraldehyde fixative of high osmolality deleterious salt effect on tomato plant growth técnico, 174).72 p.
for use in eletron microscopy. Journal of Cell by improving plant water status. Journal of TRENHOLM LE; DATNOFF LE; NAGARA
Biology 27: 137-138. Plant Phygiology 163: 847-855. RT. 2004. Influence of silicon on drougth
KNUDSON L. 1946. A new nutrient solution SCHLUTER U; MUSHAK M; BERGER and shade tolerance of St. Augustinegrass.
for the germination of orchid seed. American D; ALTMANN T. 2003. Photosyntetic HortTechnology, 90:14-48.
Orchid Society Bulletin 14: 214-217. performance of an Arabidopsis mutant VACIN EF; WENT FW. 1949. Some pH changes
with elevated stomatal density (sdd1-1) in nutrient solutions. Botanical Gazette 110:
MALAVOLTA E. 2006. Manual de nutrição
under different light regimes. Journal of 605-613. Disponível em: http://www.jstor.org/
mineral de plantas. Piracicaba: POTAFOS,
Experimental Botany, 54:867-874. pss/2472666.
638p.
SILVA DP. 2007. Meios de cultura e fontes de
MURASHIGE T; SKOOG FA. 1962. Revised ZANEGA-GODOY R; COSTA CG. 2003.
silício no desenvolvimento in vitro de gérbera.
medium for rapid growth and bioassays Anatomia foliar de quatro espécies do gênero
Lavras:UFLA. 84p (Tese mestrado).
with tobacco tissue cultures. Physiologia Cattleya Lind. (Orchidaceae) do Planalto
SILVA LP; SILVA LS; BOHNEN H. 2005. Central Brasileiro. Acta Botanica Brasiliense
Plantarum 15: 473-497. Disponível em:http://
Componentes da parede celular e 17: 101-119. Disponível em: http://www.
www.garfield.library.upenn.edu/classics1978/
disgestibilidade in vitro de palha de arroz scielo.br/pdf/abb/v17n1/a08v17n1.pdf.
A1978FR51 700002.pdf.
(Oryza sativa) com diferentes teores de silício.
ZHOU TS. 1995. The detection of the accumulation
PASQUAL M. 2001. Curso de especialização à Ciência Rural 35: 1205-1208.
of silicon in Phalaenopsis (Orchidaceae).
distância cultura de tecidos vegetais (CTV). STANDAERT-DE-METSANAERE REA. 1991. Annals of Botany 75:605-607.

Hortic. bras., v. 29, n. 3, jul.- set. 2011 329

Você também pode gostar