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ACIDENTES OFÍDICOS:

INTRODUÇÃO: Não confundam animal peçonhento com animal venenoso. Peçonha é a presa para inocular veneno. Acidentes
Ofídicos: No Brasil nós temos mais de 300 espécies sendo 90 peçonhentas e 210 não peçonhentas. Das peçonhentas mais e 60 do
gênero Bothrops, 6 do gênero Crotalus, 2 do gênero Lachesis e 29 do gênero Micrurus; Cobra não pica, cobra morde. Quem pica é
quem tem ferrão. Cobra tem boca e dente, por isso ela morde. Classificação: São 4 grandes famílias : Boidae, Colubridae,
Elapidae e Vipiridae

BOIDAE: Matam por constricção: jibóia e sucuri; Jibóia, é uma cobra muito dócil, pouco agressiva, e NÃO ataca homens (muito
raro), ela ataca pequenos animais, e os mata por constricção. Sucuri, é uma cobra de hábitos anfíbios, comum no norte, pode
atingir 15m, é agressiva, não domesticável e pode atacar humanos.

COLUBRIDAE: São as Falsas-corais, Cobra-verde ,Caninana, Dormideira , Mussurana , Cobra d’água. A cobra verde é uma
cobra extremamente agressiva, ela dá bote e no vidro do cativeiro, mas ela não tem veneno. A caninana que eu tinha falado pra
vocês, é uma cobra muito procurada por causa do couro, que é preto e amarelo, e tem aquelas características de cobras não
venenosas que vocês estudaram láá no colegial. Ela tem a cabeça arredondada, as pupilas não são em fenda, ausência de fosseta
loreal, a cauda termina lentamente. Ela é uma cobra canibal, que se alimenta de outras cobras menores. A falsa coral, muito
comum na nossa região (aqui quase não há casos de acidentes com corais verdadeiras), tem os anéis, que não seguem nenhuma
sequência lógica. E na face ventral, na barriga, os anéis podem não ter continuidade, isto é, os anéis não se fecham. A dormideira
muito comum em galhos, é bem pequenina e chega no máximo a 30-40 cm. A mussurana é essa cobra preta, ela é muito agressiva
e também é uma cobra canibal que se alimenta de cobras menores. Também não é peçonhenta. A cobra d’água, muito comum em
beira de rio e água, muito confundida com a jararaca, mas a característica dela é que ela e mais dourada, ao contrario da jararaca
que vai mais pro lado do marrom

ELAPIDAE: Gênero Micrurus: São as corais-verdadeiras, Boicorá, Cobras-corais e Ibiboboca. Coral verdadeira: acidentes com
essas cobras são raros no nosso país, representam menos de 1% (graças a Deus, porque são os acidentes mais graves). Isto porque
o peso molecular do veneno é muito baixo e se difunde pelo corpo rapidamente. Causa parada respiratória pelo bloqueio da placa
mioneural, como eu irei falar mais na frente pra vocês.

VIPERIDAE: Maior parte das cobras peçonhentas . Gêneros Bothrops, Crotalus, Lachesis, Porthidium e Bothriopsis: Urutu-
cruzeiro, Jararaca, Jaracuçú, Cascavel, Surucucu, Surucucu-pico de jaca. A urutu-cruzeiro e a jaracuçú são muito parecidas, tem
essa formação amarronzada ou acinzentada. Tem aquele ditado popular: “Urutu-cruzeiro se não mata, aleija”, e isso tem um certo
fundamento, porque a característica do veneno que faz acontecer o que diz no ditado.

A JARARACA que é o acidente mais comum, notem a cauda afinando rapidamente, a cabeça triangular, a fosseta loreal e a
pupila em fenda. Ela é uma cobra extremamente covarde, do gênero Bothrops, que gosta de lugares úmidos como beira de rio,
grama e paiol (≠ cascavel, que prefere ambientes mais áridos, secos). Ela não é uma cobra agressiva que ataca, possui tendência a
fugir (≠ cascavél, que fica parada esperando para dar o bote). Ela ataca criaturas menores. As cobras reconhecem suas presas pela
fosseta loreal, através da diferença de calor, pela temperatura.

A CASCAVEL gosta de terrenos arenosos, pedregoso, lugares secos. E não é como dizem, ela não “corre” atrás de você (ate
porque ela não corre, ela rasteja. E não tem que correr em ziguezague pra fugir dela. Qualquer pessoa que andar um pouquinho
mais rápido já foge de uma cabra, porque elas não alcançam 30km/h!!. Então não é que ela corre atrás da pessoa, ela só não foge.
É assim: quando você esta chegando perto dela, ela avisa com seu chocalho, ela te alerta. E se você continuar se aproximando, aí
ela te ataca.

A SURUCUCU que é uma cobra muito procurada também pela beleza do couro, que é amarelo e preto também. O número de
acidentes é mais comum na região norte e menos comum na região sul e sudeste. Nõs temos muito acidentes na nossa região com
essa cobra.

EPIDEMIOLOGIA: Os acidentes predominam nas regiões Norte e Nordeste. Na região sudeste o número de casos também é alto
devido o grande contingente populacional. É mais frequente em homens (74,84%), de 15 a 49 anos, em lavradores e nos
membros inferiores. Acidente em membro superior é muito raro, acontece normalmente em pessoas que vão caçar tatu e enfiam a
mão no buraco, ou em cupinzeiro. No gráfico que mostra os acidentes mês a mês, nós vemos um pico nos meses de verão, de
novembro até março. O período de seca tem menor número de acidentes, mas a diferença não é tão expressiva e isso acontece
também porque o “turismo” agropecuário acontece mais nos meses mais quentes e úmidos de verão.

INCIDÊNCIA DE ACIDENTES POR GÊNERO:


Bothrops representa 87,33% dos acidentes no Brasil
Crotalus em torno de 7%,
Lachesis em torno de 1,37%
Micrurus (é a mesma coisa que elapídico) em torno de 0,4%.

Gravidade em ordem decrescente é:


elapídico  crotálico  laquético ≅ botrópico
Vocês tem que saber principalmente os crotálicos e os botrópicos, que correspondem a mais de 98% dos casos no país, ou seja,
quase 100%. Particularmente, eu, Frederico Zago, em todos os meus anos de profissão, nunca vi um acidente elapídico (ou
micrúrico) e laquético.

DIAGNÓSTOCO: Identificação da serpente; Observar a evolução clínica: Sintomas locais (pensar em brotrópico e laquético)
sintomas sistêmicos (pensar em crotálico ou micrúrico); TC (tempo de coagulação) e TS (tempo de sangramento) – não precisa
gastar com exame caro. TS e Tc vc praticamente só precisa de uma agulha e um pote pra analisar! Se o tempo for maior que 3min
é porque é incoagulável. Hemograma; Uréia e creatinina

TRATAMENTO
Limpeza da lesão.
Antibiótico.
Esquema anti-tetânico.
Profilaxia contra anafilaxia com anti-histamínicos e corticóides.

VENENOS

BOTRÓPICO: (1). Tem ação pró-coagulante, ou seja, ele ativa e consome os fatores X, V e VII e plaquetas. Entao ele ativa a
cascata de coagulação (vias intrínseca e extrínseca), ele consome os fatores de coagulação, formando pequenos trombos ate levar
o sangue a um estado de incoagulabilidade e isso é chamado de CIVD. É óbvio que parar chegar nesse estagio de CIVD leva
tempo, e eu não estou dizendo que todo acidente leva a isso. Mas pode chegar lá, quanto mais próximo chegar disso, mais grave é
o acidente. As cobras mais jovens tem ação pró-coagulante mais forte, e por isso os pacientes evoluem mais rápido. (2). Tem ação
proteolítica, que causa efeitos locais, como edema, dor, calor, necrose no local da mordedura, pois consome as proteínas no local.
(3). Tem ação vasculotóxica, em que uma lesão endotelial destrói a membrana basal de capilares e depois os rompe, causando
sangramento.

Então, tem ação citotóxica, vasculotóxica e pró-coagulante. E cursa com muito sangramento, dor, necrose edema local. Por isso
que tem aquele ditado que eu contei antes: “Urutu-cruzeiro, ou mata ou aleija”, porque as pessoas antigamente faziam o
torniquete. Se eu fizer isso, vou represar todas essas ações em apenas uma perna (concentra o veneno), levando à morte da
perna. Se chega um paciente com mordida de cobra, só dele estar com torniquete o caso já não é leve. Por mais distante que vc
esteja do socorro, nunca façam torniquete! Se você não represar o veneno naquele local, o veneno vai circular e diluir mais, e a
ação não vai ser concentrada em um só local e vai ser mais branda. Então só de fazer o torniquete, vc transformou um acidente
que poderia ser leve (uso de torniquete já transforma o acidente em moderado ou grave, nunca leve), em um acidente grave.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
 Dor, edema, calor e rubor local (efeito proteolítico)
 Aumento do tempo de coagulação
 Hemorragias e choque nos casos mais graves
 Necrose e síndrome compartimental- Esses cortes são feitos pelo próprio médico. É chamado fasciotomia. Ele conta o
caso de um médico de Iturama que fez isso na perna inteira de um paciente, da raiz da coxa até o tornozelo, e por isso
salvou a perna do paciente. Isso tem que ser feito porque o edema é tão importante que causa compressão do feixe
vasculo-nervoso e ocorre a isquemia da perna inteira (Sd. compartimental).
 IRA pelas hemorragias.

TRATAMENTO ACIDENTE BOTRÓPICO:


 Acidente leve: Manifestações locais discretas, Manifestações sistêmicas ausentes, TC normal, Veneno 100mg, Não houve uso
de garrote, Atendimento médico em menos de 6 horas – Administrar Soro em 2 – 4 ampolas EV
 Acidente moderado: Manifestações locais evidentes, Manifestações sistêmicas ausentes ou presentes, TC normal, Veneno de
200mg, Houve ou não uso de garrote, Atendimento médico de 6 horas – Adminitrstar Soro em 4 – 8 ampolas EV.
 Acidente grave: Manifestações locais intensas, Manifestações sistêmicas Evidentes, TC alterado, Veneno de 300mg, Houve
ou não uso de garrote, Atendimento médico demorou mais que 6 horas – Administrar Soro em 8 – 12 ampolas EV.

Depois de 6 horas do primeiro atendimento, vc faz o teste. Se o paciente permanecer incoagulável, você faz metade das ampolas
que vc fez inicialmente. Se por exemplo eu classifiquei como moderado, e fiz 8 ampolas, se 6 hras depois ele permanecer
incoagulável, eu faço mais 4.
Soro anti-brotrópico e anti-crotálico é disponível em QUALQUER cidade. Se na sua cidade tem um posto de saúde, então lá tem
soro. Muita gente pensa naquele soro polivalente, o soro antiofídico. A gente geralmente não usa, porque a diferença entre os
acidentes é muito gritante.
E PRESTEM ATENÇÃO nisso! Se o paciente chega com todas as características de um acidente leve, mas demorou 10 horas pra
procurar o posto, É ACIDENTE GRAVE! Vai cair na prova? VAI!

CROTÁLICO: (1). Tem uma ação miotóxica, que é a ação da crotoxina (veneno da serpente crotálica) que leva à destruição
muscular (estriada), rabdomiólise e mioglobinúria. Então eu tenho destruição muscular, com ação sistêmica e não somente local.
(2). Ação neurotóxica que leva à uma paralisia curare-símile, vômitos, sialorréia, convulsão, bloqueio da transmissão
neuromuscular (paciente adquire aquela fascies miastênica: ptose palpebral, alteração da visão, diplopia, visão borrosa).
(3). Ação nefrotóxica: ocorre devido à mioglubinúria (causada pela destruição muscular) e por ação direta do veneno.
(4). Ação hepatotóxica: lesão direta com acúmulo de bromossulfaleína (BSP) e lesão mitocondrial.

É importante perceber a diferença entre Botrópico e Crotálico. No Brotrópico nós temos efeitos locais: edema, necrose, dor e
sangramento. No Crotálico os sintomas são sistêmicos: mialgia intensa pela rabdomiólise, mioglobinúria, lesão neurológica, lesão
hepática e renal. A primeira vista, quando você olha pra dois pacientes, um com um acidente Brotrópico e um com um acidente
Crotálico, parece que o acidente Brotrópico é mais grave, porque tem muito sintoma local. Então, a primeira vista, um leigo pode
pensar que o acidente crotálico é mais tranquilo. NÃO É! Não existe acidente crotálico leve! Ele ou é moderado ou é grave. Então
não se deixem confundir com a aparência!!

MANIFESTAÇÕES:

 Aumento do TC
 Mialgia generalizada intensa
 Mioglobinúria
 Rabdomiólise
 IRA precoce – Anúria.
 Alterações neurológicas: diplopia, anisocoria, ptose palpebral, dores
musculares, fascies miastênica (de Rosenfeld).

TRATAMENTO ACIDENTE CROTÁLICO: Não há acidente leve.

 Acidente moderado: Facies miastênica e visão turva discretas ou evidentes, Mialgia discreta, Urina marrom pouco evidente,
Oligo-anúria ausente, TC normal ou alterado, Veneno 200mg – Administrar 10 ampolas de soro via EV.
 Acidente grave: Facies miastênica e visão turva evidentes, Mialgias intensas, Urina marrom presente, Oligo anuria presente
ou ausente, TC alterado, Veneno 300mg – Administrar 20 ampolas de soro via EV.

MICRURUS (ELAPÍDICO): cobra coral (não vai cair na prova, nem elapídico nem laquético por são muito raros!)
Ação Neurotóxica: atuam na pré ou na pós-sinapse bloqueando a junção mioneural e tem ação rápida, devido o baixo peso
molecular das neurotoxinas (se espalha e mata muito rápido). Devido a esse bloqueio que ela causa o paciente pode evoluir para
uma insuficiência respiratória e morrer por apnéia.
LAQUÉTICO ≅ BOTRÓPICO: surucucu
É muito semelhante ao veneno brotrópico. Tem as mesmas ações dele: ação pró-coagulante, proteolítica e vasculotóxica.

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