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Gil Vicente - O Auto Da Barca Do Inferno (Versão Atualizada)
Gil Vicente - O Auto Da Barca Do Inferno (Versão Atualizada)
Resende, 2010.
O AUTO DA BARCA DO INFERNO
Aprovado por:
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Professor(a)
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Nota
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Resende, 2010.
O primeiro interlocutor é um Fidalgo que chega com um Pajé, que lhe leva um rabo
muito comprido e uma cadeira de espadas. E começa o Arrais do inferno antes que o
fidalgo venha
Embarca – ou embarcai
Que haveis de ir depois!
Mandai arrumar a cadeira,
que assim passou vosso pai.
FIDALGO Quê? Quê? Quê? Assim lha vai?
DIABO Vai ou vem? Embarca logo!
Segundo lá você escolheu,
assim agora vos contentai.
Diz cantando:
Vós meveniredes a lá mano
A lá nano me venereis
PARVO Ei da barca!
ANJO O que quer?
PARVO Posso entrar?
ANJO Você pode entrar se quiser,
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Vem um sapateiro com seu avental e carregando várias formas e chega a barca do
inferno, e diz:
Hei da barca,
Posso ir nessa?
ANJO Seus roubos te condenam.
SAPATEIRO Mas Deus não pode me perdoar?
ANJO Ta vendo aquela barca lá?
Ela é para quem rouba como você.
SAPATEIRO Por favor, me deixa ir, não tem nenhum cantinho ai pra mim?
ANJO Se tivesse vivido corretamente não iria pro inferno.
SAPATEIRO Então você vai me mandar pro inferno?
ANJO Assim está escrito..
Vem um frade com uma moça pela mão e uma espada na outra. Também levava um
capacete debaixo do capuz, estava dançando e dizendo:
Entra aí Padre!
FRADE Para onde você vai nos levar?
DIABO Para o inferno,
O qual não teve medo
a sua via toda.
FRADE Juro por Deus que não te entendo,
E a minha batina não vale de nada?
DIABO Gentil padre mundano,
Ao inferno te mando.
FRADE Como pode Deus?! Eu vou ser condenado?
DIABO Para de me encher o saco,
Entra aí e vamos embora.
FRADE Não vou mesmo!.
DIABO Sinto muito, mas.
Não tenho nada a fazer.
FRADE A meu Deus só me faltava essa.
Só porque eu tenho uma mulher,
E os salmos que eu rezei?!
DIABO Até parece que você não sabia.
DIABO Padre pegador o inferno te espera.
Eu vou, eu vou,
para casa agora eu vou,
parara-tim-bum,
parara-tim-bum...
Tanto que o Frade foi embarcado, veio uma cafetina, que chamava-se Brízida Vaz, que
chegou a barca do inferno e disse:
BRÍZIDA Ei barqueiros
Onde é o meu lugar ai?
Já tem tempo que estou
Aqui fora e estou cansada.
Tanto que Brízida Vaz se embarcou, veio um Judeu, com um bode às costas; e, à barca
dos danados dizendo:
CORREGEDOR Ei da barca!
DIABO Que quer?
CORREGEDOR O senhor juíz está aqui?
DIABO Oh amigo de perdedores.
DIABO Então, entra ai.
CORREGEDOR E para onde vai a barca?
DIABO Olha, te deixaremos no inferno.
CORREGEDOR Como? Vocês vão
Colocar um corregedor na terra dos demônios?
DIABO Santo descorregedor,
Entra ai, e remaremos!
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E Tanto que foram dentro no batel condenados, disse o Corregedor a Brizida Vaz,
por que a conhecia:
Vêm quatro cavaleiros cantando, aos quais cada um a Cruz de Cristo, pelo qual
senhor e acrescentamento de Sua santa fé católica morreram em poder do mouros.
Absolvidos a culpa e pena por privilégio que o que assim morrem tem dos mistérios da
Paixão daquele que por que padecem outorgados por todos os Presidentes Sumos
Pontífices de Madre Santa Igreja. E a cantiga que assim cantavam quanto à palavra
dela, é a seguinte.
Vigiai pecadores
que depois da morte
neste rio esta a escolha
da vida eterna ou da morte
E assim embarcaram.