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Características acústicas do piano.

Introdução

O piano acústico foi criado por volta de 1722, produto do trabalho do criador italiano
de instrumentos musicais, Bartolomeo Cristofori (PERSONE, 2009). O instrumento criado
por Cristofori não era exatamente semelhante ao piano, tal como é conhecido atualmente, a
inovação ocorreu principalmente devido ao desenvolvimento de um sistema eficaz de
martelos percutivos, que permitiu um maior controle das dinâmicas forte e piano, tal
instrumento recebeu o nome de “Fortepiano”.

Depois de ser amplamente explorado e melhorado durante o período romântico, o


piano chegou à forma que conhecemos atualmente, sendo amplamente utilizado em diversas
formações, da música erudita à popular. Devido sua ampla utilidade, e grande complexidade
de seu mecanismo, o modo de construção do instrumento promove a ele características únicas
(mesmo considerando a produção em massa, que ocorre nas linhas “populares”). Com base
nisso, o objetivo deste trabalho é demonstrar alguns dos aspectos estruturais que promovem a
individual acústica dos pianos.

A tábua harmônica

A principal função da tábua harmônica é a de amplificar o som das cordas, segundo


Suzuki (apud GUIGUE; BRAGAGNOLO, 2014), a tábua harmônica ocupa uma função
semelhante àquela do alto-falante, além disso, também ressoa de modo não homogêneo, tal
fator, aliado a outros contribui para a variedade timbrística do instrumento. Outra
característica interessante ressaltada por Suzuki e Nakamura (1990, p.194, apud. GUIGUE;
BRAGAGNOLO, 2014), é que quanto maior o tamanho da tábua harmônica, menor será a
ressonância obtida.

A madeira com que a tábua é produzida também influi de modo significativo nas
características acústicas do instrumento. Em geral prefere-se madeiras com maior densidade
possível, pois materiais “moles” acabam absorvendo o som. Segundo Souza (2009), algumas
das madeiras mais utilizadas para fabricação dessa peça são a Picea glauca (encontrada no
Alasca, Canadá e EUA); Pinho do Paraná, Peroba; Pinheiro Suiço; Pinheiro Cuiabano (Brasil;
e países da América Latina) e outras. Em geral, as árvores utilizadas são coníferas.
Cordas

Apesar de ter apenas 88 teclas, o piano apresenta um conjunto aproximado de 220


cordas feitas de aço. Elas são divididas em regiões graves, médias e agudas. As cordas da
região grave são as mais espessas feitas de aço e revestidas de cobre (SENDINO, 2004), e
geralmente são únicas, as cordas da região média geralmente são duplas (cada martelo
percute em um conjunto de duas cordas, também revestidas em cobre), enquanto as da região
aguda são triplas e sem o revestimento em cobre.

Para que seja possível a afinação correta das cordas, é preciso que elas sejam esticadas
em uma determinada tensão (como em todo instrumento de corda). A tenção gerada no
conjunto de todas as cordas do piano é de aproximadamente 30 toneladas para um piano de
cauda e 14 para um piano vertical (SENDINO, 2004). Devido ao comprimento das cordas
graves, é preciso que elas sejam posicionadas de modo cruzado (ficando posicionadas em
cima das outras cordas) no instrumento, poupando espaço na caixa do instrumento.

A peculiar característica do piano em apresentar sistemas com cordas duplas e triplas,


faz com que ocorra o fenômeno acústico do batimento:

Da mesma forma que em outros sistemas vibratórios, um efeito acústico


particularmente relevante ao técnico e afinador de pianos, denominado
batimento, ocorre quando duas cordas de freqüências sonoras bastante
próximas são estimuladas ao mesmo tempo. Trata-se de uma breve
modulação em volume (e timbre) cuja frequência de oscilação fica menor à
medida que as frequências se aproximam. (GOLDEMBERG, p.2, 2005)

Tal fenômeno acústico pode ser entendido considerando a grande dificuldade de se


afinar duas cordas em uníssono (como é o caso do sistema duplo), além das imperfeições dos
feltros dos martelos, que acabam por percutir na corda de modo irregular (PETIT; VILA,
2012), deste modo, torna-se impossível evitar tal fenômeno.

Martelos

Os martelos do piano são responsáveis pela percussão das cordas. Os mecanismos são
compostos por complexos mecanismos de alavancas, que buscam aumentar o controle do
pianista no momento do toque:

Todas as peças que são progressivamente interpostas entre a tecla


e o martelo têm por função aumentar o refinamento do controle da ação
mecânica de percussão das cordas pelo toque do pianista. Em outras
palavras, a evolução da fabricação do piano é governada
pelo desejo de reduzir ao máximo possível a distância psicológica, ou
psicoacústica, entre o gesto e o som, elaborando um mecanismo cada vez
mais apto a responder, com a menor defasagem possível, às mais sutis
inflexões do toque [...] (GUIGUE; BRAGAGNOLO, p.142, 2014)

A grande maioria destas peças são feitas de madeira, cada martelo tem sua ponta
(responsável por percutir nas cordas) revestida feltro, sendo que a densidade desse material
definirá o tipo de timbre que o piano terá, quanto mais denso for o feltro mais “brilhante” será
o som do instrumento.

Outro aspecto interessante em relação aos martelos e a compressão dos feltros, está
relacionada à velocidade e energia com que o martelo atinge a corda:

A compressão do feltro durante o contato [com a corda] faz com que o


martelo aumente momentaneamente de dureza. Como consequência, quanto
mais velocidade adquirir o martelo maior será a excitação [da corda]. [...]
Por esta razão, as notas fortíssimo são muito mais ricas na parte alta do
espectro [...] (SENDINO, p. 17, 2004, tradução nossa)

Os pedais também alteram a sonoridade do instrumento. Quando os martelos são


percutidos juntamente com o uso do pedal una corda, “usado para recuar lateralmente o
mecanismo do teclado e marteleira do instrumento, a fim de que os martelos toquem uma
corda a menos, modificando assim o timbre [...]” (POZZI; MARTIN, p.4, 2011). O recurso
do pedal una corda só age como descrito em pianos de cauda, em pianos verticais (ou de
armário), os martelos não são deslocados, são apenas aproximados das cordas, além disso,
quando o pedal é acionado todas as cordas são cobertas por uma capa de feltro, de modo que
ao percuti-las, o som resultante é menos intenso e mais abafado.

Inarmonicidade dos pianos

A inarmonicidade trata de um fenômeno acústico de desvio de uma série harmônica


ideal (GOLDEMBERG, p. 1594, 2011), tal fenômeno está presente em maior ou menor grau
em diversos instrumentos musicais. A irregularidade harmônica da inarmonicidade é mais
acentuada em pianos de cauda, devido ao maior comprimento das cordas:

Embora uma certa quantidade de inarmonicidade caracterize o timbre de um


instrumento como o piano, sua presença em excesso é indesejável e resulta
em notas mal definidas. Visto que essa quantidade está fortemente
relacionada ao comprimento da corda, é possível compreender o motivo
pelo qual pianos de concerto são considerados melhores e de sonoridade
mais rica e estável quando comparado a pianos de pequeno porte.
(GOLDEMBERG, p. 1595, 2011)
O controle do nível de inarmonicidade do instrumento, bem como o controle dos
batimentos, ficará por conta da afinação, que visará equilibrar tais irregularidades.

Conclusões

É impossível negar as diferenças acústicas entre os diversos tipos de piano, seja ele
produto de uma linha de produção, ou ainda de um trabalho artesanal, cada instrumento
apresenta um tipo de perfil acústico, resultado de processos de montagem diversos,
variabilidade dos materiais utilizados em sua construção, ação do tempo, desgaste do
instrumento e outros.
Referências

GOLDEMBERG, Ricardo. Aspectos acústicos da afinação de pianos. In: Proceedings of


the 2. II Seminário de Música, Ciência e Tecnologia. 2005

_______________________ Harmônicos e Inarmonicidade. XXI Congresso da Anppom,


Brasil, mai. 2011. Disponível em:
<http://www.anppom.com.br/congressos/index.php/21anppom/Uberlandia2011/paper/view/6
00>. Data de acesso: 16 Out. 2017
GUIGUE, Didier; NODA, Luciana; MARIA BRAGAGNOL, Bibiana. Timbre e Escrita ao Piano:
por uma Incorporação do Comportamento Acústico do Piano na Composição e Análise Musical.
Revista Música Hodie, [S.l.], v. 14, n. 1, nov. 2014. ISSN 1676-3939. Disponível em:
<https://www.revistas.ufg.br/musica/article/view/32930/17483>. Acesso em: 15 out. 2017.

PERSONE, Pedro. A aurora do (forte)piano. Per musi, Belo Horizonte , n. 20, p. 22-33, 2009.
Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/pm/n20/a04n20.pdf >. Acesso em 14 de Outubro de 2017.

PETIT, Jessica Mora; VILA, Rubén Picó, Caracterización acústica del piano de cola,
Universade Politécnica de Valência, trabalho final de curso, Gandia, 2012

POZZI, Luiz Guilherme; MARTIN, Maurícy Matos. Reflexões sobre o uso dos pedais–Critérios
usados na pedalização da peça Guaratuba e Antonina, de Harry Crowl, 2011

SOUZA, Maria Helena; BRASILEIRO–MMA, Serviço Florestal, Brasília, Madeiras Utilizadas para
a Fabricaçao de Instrumentos Musicais. 2009.

SENDINO, Juan José Burred, La Acústica del Piano, Conservatório de Música Arturo Soria,
Madrid, 2004.

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