Você está na página 1de 50

Funções contı́nuas


Rodrigo Carlos Silva de Lima
Universidade Federal Fluminense - UFF-RJ
rodrigo.uff.math@gmail.com

1
Sumário

1 Funções contı́nuas 3
1.1 Funções contı́nuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.1.1 Função contı́nua e limite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.1.2 Funções contı́nuas e sequências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.2 Funções contı́nuas e operações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.3 Funções contı́nuas e desigualdades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
1.3.1 Hölder- contı́nua . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.4 Funções contı́nuas em intervalos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.4.1 Teorema do valor intermediário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.4.2 Função contı́nua e abertos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
1.5 Funções contı́nuas em intervalos compactos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
1.6 Continuidade uniforme . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
1.6.1 Função lipschitziana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
1.6.2 Critério de sequências para continuidade uniforme . . . . . . . . . . 37
1.7 Funções contı́nuas em espaços métricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
1.7.1 Função Lipschitziana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
1.7.2 Propriedades elementares de funções contı́nuas . . . . . . . . . . . . 44
1.8 Homeomorfismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
1.8.1 Métricas equivalentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
1.9 Continuidade uniforme em espaços métricos . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

2
Capı́tulo 1

Funções contı́nuas

1.1 Funções contı́nuas

Definição 1 (Função contı́nua em a-Definição de Cauchy.). Uma função f de A em R é


contı́nua em a ∈ A quando

∀ε > 0, ∃δ > 0, x ∈ A, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε.

Chamamos esse tipo de definição de definição por epsillon e delta. Uma definição
similar a essa foi dada por Bernard Bolzano em 1817, depois independentemente por
Cauchy, porém a definição formal e distinção entre continuidade pontual e uniforme é
considerada obra de Karl Weierstrass.

Definição 2 (Função descontı́nua em a). Uma função f de A em R é descontı́nua em


a ∈ A quando não é contı́nua no ponto a. Logo f é descontı́nua em a sse

∃ε > 0, ∀δ > 0, ∃xδ ∈ A | |xδ − a| < δ e |f (xδ ) − f (a)| ≥ ε.

Definição 3 (Função contı́nua.). Uma função f de A em R é dita contı́nua, quando é


contı́nua em todos pontos x tal que x ∈ A.

Propriedade 1. Se a é um ponto isolado de A então toda função f : A → R é contı́nua


no ponto a.

3
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 4

Demonstração. Vale que

∀ε > 0, ∃δ > 0 | x ∈ A, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

pois podemos tomar δ que satisfaça (a − δ, a + δ) ∩ A = {a}, tal δ existe pelo fato de a
ser ponto isolado, nesse caso x só poderá ser a, daı́ tem-se f (x) −f (a) = 0 < ε, ∀ε.
|{z}
=f (a)

Propriedade 2. Seja g : A → R dada por g(x) = k ∀x ∈ A, onde k é uma constante


real, tal função é contı́nua.

Demonstração.

∀ε > 0, ∃δ > 0, x ∈ A, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

pois f (x) − f (a) = k − k = 0 < ε, para qualquer δ escolhido.

Propriedade 3. f : A → R dada por f (x) = x é contı́nua em a ∈ A.

Demonstração. Para todo ε > 0 tomamos δ = ε e daı́ |x−a| < δ implica |f (x)−a| =
|x − a| < ε = δ.

1.1.1 Função contı́nua e limite

Propriedade 4. Seja a ∈ A ∩ A′ . f : A → R é contı́nua em a sse lim f (x) = f (a).


x→a

Demonstração. ⇒. Se f é contı́nua em a, então vale

∀ε > 0, ∃δ > 0 | |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε.

o conjunto dos pontos |x − a| < δ nunca é vazio por a ser ponto de acumulação, então faz
sentido falar em limite e existem valores que satisfazem 0 < |x − a| < δ, daı́ a propriedade
segue pela definição de limite.
⇐ . Se lim f (x) = f (a), então vale
x→a

∀ε > 0, ∃δ > 0 | 0 < |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

como vale também para x = a, pois |f (a) − f (a)| = 0 < L então tem-se |x − a| < δ
implicando |f (x) − f (a)| < ε o que pela definição garante que f é contı́nua.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 5

Então a função é contı́nua em a quando os limites laterais são iguais

lim f (x) := f (a+ ) = lim− f (x) := f (a− )


x→a+ x→a

f (a− ) = f (a) = f (a+ ).

Definição 4 (Contı́nua à direita e contı́nua à esquerda). Dizemos que f é contı́nua à


esquerda quando f (a− ) = f (a) , f é contı́nua à direita quando f (a+ ) = f (a).

Definição 5 (Descontinuidade de primeira e de segunda espécie). Uma função possui


descontinuidade de primeira espécie se os limites laterais existem, porém são diferentes,
todo outro tipo de descontinuidade é chamado de descontinuidade de segunda espécie.

Definição 6 (Salto). Em um ponto a onde existem os limites laterais, definimos

s(a) = f (a+ ) − f (a− )

e chamamos de salto de f em a.
Se a função é contı́nua em a então S(a) = 0.

Exemplo 1. Toda função f : Z → R é contı́nua, toda função f : N → R é contı́nua,


então as sequências são funções contı́nuas.

Propriedade 5. Sejam f : A → R contı́nua no ponto a ∈ A, B ⊂ A um conjunto tal que


a ∈ B então g : f |B é contı́nua em a, isto é, a restrição de uma função contı́nua é uma
função contı́nua.

Demonstração. Se a é ponto isolado em B então então g é contı́nua em a, se não,


para todo e qualquer ε > 0, existe δ > 0 tal que x ∈ A com |x − a| < δ implica
|f (x) − f (a)| < ε, todo x ∈ B satisfazendo |x − a| < δ implica |f (x) − f (a)| < ε, pois
x ∈ B com |x − a| < δ implica x ∈ A com |x − a| < δ, pois B ⊂ A.

Propriedade 6. Seja B = (a − δ, a + δ) ∩ A para algum δ > 0, se f |B é contı́nua então


f : A → R é contı́nua.

Demonstração. Se f |B é contı́nua então ∀ε > 0 ∃δ1 > 0 | x ∈ B com |x − a| < δ1


implica |f (x) − f (a)| < ε, significa que x ∈ (a − δ, a + δ) e x ∈ (a − δ1 , a + δ1 ) implica
|f (x) − f (a)| < ε, mas a primeira frase significa que x ∈ A com x ∈ (a − δ2 , a + δ2 ), onde
δ2 = min{δ1 , δ2 } implicando |f (x) − f (a)| < ε, daı́ f : A → R é contı́nua pela definição.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 6

1.1.2 Funções contı́nuas e sequências

Propriedade 7 (Funções contı́nuas e sequências-Definição de Heine). f : A → R é


contı́nua em a ∈ A ⇔ ∀(xn ) em A com lim xn = a se tenha lim f (xn ) = f (a).

Demonstração. Se a ∈ A′ então f é contı́nua em A ⇔ lim f (x) = f (a), que por sua


x→a
vez para qualquer sequência (xn ) em A com lim xn = a se tenha lim f (xn ) = f (a).
Se a é ponto isolado então toda sequência que converge para a é uma sequência even-
tualmente constante, onde vale xn = a para n grande e daı́ f (xn ) = f (a) para n grande.
1
Exemplo 2. Seja a função f : R → R dada por f (x) = se x ̸= 0 e f (0) = 0. Então
x
1
f não é contı́nua em 0, pois tomando uma sequência que tende à 0 , xn = , temos
n
f (xn ) = n que não converge para f (0).
Podemos provar pela definição, se fosse contı́nua em 0, para todo ε > 0 existiria ∆
1 1
tal que x ∈ (−δ, δ) implicaria < ε, mas se vale essa segunda então < |x| daı́
|x| ε
1 1
x ∈ (−∞, − ) ou x ∈ ( , ∞), o que não pode valer.
ε ε
Temos então que funções contı́nuas preservam limite e vale lim f (xn ) = f (lim xn ).1

Exemplo 3. Seja a função f : R → R definida como f (x) = x se x é irracional e


1
f (x) = 1 − x se x é racional, então f é contı́nua em x = e descontı́nua em todos outros
2
pontos.
Dado a ∈ R, podemos tomar uma sequência de números irracionais (xn ) que converge
para a e temos f (xn ) = xn , logo lim f (xn ) = lim xn = a.
Podemos também tomar uma sequência (yn ) de números racionais que converge para
a, nesse caso temos f (yn ) = 1 − yn e lim f (yn ) = 1 − lim yn = 1 − a, os limites devem
1 1
ser iguais, logo a = 1 − a, a = , então, em todo ponto diferente de a = a função é
2 2
descontı́nua.
1 1
Mostramos agora que f é contı́nua em , tomando δ = ε, temos que se |x − | < ε e x
2 2
1 1 1 1
racional então f (x) = 1 − x e f (x) − = −x + , seu módulo é |f (x) − | = |x − | < ε,
2 2 2 2
1
no caso de x irracional temos f (x) = x, daı́ |x − | < ε, como x ∈ R, então x é racional
2
1
Heinrich Eduard Heine (Março 15 de 1821- outubro 21 de 1881) foi um matemático alemão.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 7

1 1
ou irracional, segue que pra todo x ∈ R vale |x − | < ε implica |f (x) − | < ε logo f é
2 2
1
contı́nua em . Poderı́amos trocar os racionais e os irracionais por outros dois conjuntos
2
A e B, disjuntos, densos em R, a propriedade seria a mesma.

Exemplo 4. Dada uma sequência finita e crescente de números reais (xk )n1 , construir
uma função f : R → R tal que ela seja contı́nua apenas nos pontos (xk )n1 .
Particionamos a reta como

n−1 ∪
n
R = (−∞, x1 + a2 ] ∪ (xk − ak , xk + ak ] ∪ (xn − an , ∞) = Ak .
| {z } | {z } | {z }
A1 k=2 Ak An k=1

xk − xk−1
onde ak = , isto é, dividimos a reta em n partes onde cada conjunto Ak ,
2
excetuando A1 e An tem centro em xk . Definimos fAk , a função restrita à Ak como


 x se x é racional
f (x) =
 2x − x se x é irracional
k

Em cada conjunto Ak , vamos estudar os pontos em que f é contı́nua. Tomamos


uma sequência (zn ) de racionais, convergindo para x ∈ Ak , daı́ lim f (zn ) = lim zn =
x, tomando uma sequência de irracionais (yn ) convergindo para o mesmo x , tem-se
lim f (yn ) = lim −yn + 2ak = −x + 2ak , para a função poder ser contı́nua nesse ponto
é necessário que o resultado dos limites sejam iguais, isto é, x = −x − 2xk ⇒ x = xk ,
então em cada conjunto Ak da partição a função só pode ser contı́nua no ponto xk sendo
portanto descontı́nua nos outros pontos.
Mostramos agora que f é contı́nua em xk , tomando δ = ε pequeno o suficiente para que
os pontos x que satisfazem |x − xk | < ε estejam no intervalo Ak , temos que se |x − xk | < ε
e x racional então f (x) = x e f (x) − xk = x − xk , seu módulo é |f (x) − xk | = |x − xk | < ε,
no caso de x irracional temos f (x) = −x + 2xk , f (x) − xk = −x + 2xk − xk = −x + xk ,
seu módulo é |f (x) − xk | = | − x + xk | = |x − xk | < ε como x ∈ R, então x é racional ou
irracional, segue que pra todo x ∈ R com |x − xk | < ε implica |f (x) − xk | < ε logo f é
contı́nua em xk .
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 8

Consideramos agora o caso de termo uma sequência infinita de termos isolados (xk ),
podemos da mesma maneira construir uma função f de R em R que seja contı́nua apenas
nesses pontos. A demonstração de que ela é contı́nua apenas nesses pontos é a mesma, o
que muda é a maneira de particionar a reta.

ˆ Se a sequência possui mı́nimo, podemos reordenar a sequência de maneira que ela


seja crescente , daı́ dividimos a reta da seguinte maneira


R = (−∞, x1 + α2 ] ∪ (xk − ak , xk + ak ]
k=2

ˆ Se a sequência possui maior elemento podemos reordenar como um sequência de-


crescente e tomar a partição


R= [xk − ak , xk + ak ) ∪ [x1 − a2 , ∞)
k=2

ˆ Se a sequência não possui maior nem menor elemento, podemos enumerar a sequência
com ı́ndices em Z de maneira crescente e escrever a partição


R= (xk − ak .xk + ak ]
k=−∞

em cada um desses casos podemos usar o mesmo argumento para a continuidade.

Exemplo 5. A função f : R → R definida como f (x) = 1 x ∈ Q e f (x) = 2 caso contrário


não é contı́nua em nenhum ponto, pois tomando uma sequência (xn ) de racionais tal que
lim xn = a tem-se lim f (xn ) = 1 e tomando uma sequência de irracionais (yn ) vale que
lim f (yn ) = 2, para a ∈ R arbitrário.

Exemplo 6. Dada uma sequência finita (xk )n1 definir uma função descontı́nua apenas
nesses pontos.
Definimos f (x) = 1 se x < x1 , f (x) = k se x ∈ [xk , xk+1 ), 1 ≤ k < n e f (x) = n se
x ∈ [xn , ∞), f é descontı́nua em cada xk pois

lim f (x) = k − 1 ̸= lim+ f (x) = k


x→x−
k x→xk
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 9

nos outros pontos a função é constante, logo é contı́nua. Essa função é um tipo de função
escada.
Da mesma maneira, dada uma sequência de pontos (xk ), tal que sejam pontos isolados
na reta, podemos definir uma sequência descontı́nua apenas nesses pontos e contı́nua em
todos os outros pontos. Se a sequência não possui mı́nimo nem máximo, enumeramos a
sequência usando os números inteiros (xk )∞
−∞ , tal que xk+1 > xk ∀k definimos f (x) = k

se x ∈ [xk , xk+1 ), daı́ usamos o mesmo argumento já usado.


Se a sequência possui mı́nimo tomamos sua enumeração crescente (xk ) e definimos
da mesma maneira que no primeiro exemplo,f (x) = 1 se x < x1 , f (x) = k se x ∈
[xk , xk+1 ), 1 < k porém agora os intervalos [xk , xk+1 ) são infinitos.
Se a sequência possui máximo tomamos uma enumeração decrescente (xk ), com isso
definimos f (x) = 1 se x > x1 e para os outros intervalos f (x) = k se x ∈ (xk+1 , xk ], k ≥ 1.

Propriedade 8. Seja f : R → R contı́nua e f (x) = c uma constante para todo x ∈ A


um conjunto denso em B, então f (x) = c para todo x ∈ B.

Demonstração. Dado a ∈ B arbitrário, por A ser denso em B, podemos tomar uma


sequência (xn ) em A tal que lim xn = a daı́ f (xn ) = c e lim f (xn ) = c = f (a), logo
f (a) = c para todo a ∈ B.

Corolário 1. Em especial A é denso em A, daı́ f (x) = c ∀x ∈ A.

1
Exemplo 7. Seja f : R → R, tal que f (x) = xsen( ) se x ̸= 0 e f (x) = 0 se x = 0,
x
então f é contı́nua em toda reta.
Para x ̸= 0 a função é contı́nua, agora se x = 0, tomamos uma sequência arbitrária
1 1
(xn ) em R com lim xn = 0, temos f (xn ) = xn sen , yn = sen é uma sequência
xn xn
1
limitada, logo lim f (xn ) = lim xn sen = 0 = f (0), logo a função é contı́nua em 0.
xn
Propriedade 9. Se f, g são funções contı́nuas de R em R e f (x) = g(x)∀x ∈ A denso
em R, então f (x) = g(x)∀x ∈ R.

Demonstração. Seja a ∈ R então ∃(xn ) em A tal que lim xn = a e vale f (xn ) = g(xn )
assim lim f (xn ) = f (a) = lim g(xn ) = g(a), logo f (a) = g(a)∀a ∈ R.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 10

Propriedade 10. f : R → R é contı́nua sse ∀A ⊂ R vale f (A) ⊂ f (A).

Demonstração. ⇒. Supondo f contı́nua, vamos mostrar que dado a ∈ f (A) então


a ∈ f (A). Seja a ∈ f (A), então existe y ∈ A tal que f (y) = a, mas como y ∈ A,
então existe uma sequência (xn ) em A tal que lim xn = y, por f ser contı́nua segue que
f (xn ) ∈ f (A) e lim f (xn ) = f (y) = a ∈ f (A), o que concluı́ a demonstração.
⇐. Vamos usar a contrapositiva, se f é descontı́nua, então existe um ponto a ∈ R tal
que f é descontı́nua em a, assim existe uma sequência (xn ) em R tal que
1 1
∃ε > 0 ∀ > 0 |xn − a| < e |f (xn ) − f (a)| ≥ ε
n n
tomando A como conjunto dos termos da sequência (xn ) segue que a ∈ A, logo f (a) ∈ f (A)
mas a propriedade |f (xn ) − f (a)| ≥ ε nos garante que f (a) ∈
/ f (A), de onde segue o
resultado.

Propriedade 11. Seja f : A → R descontı́nua em a ∈ A. Então existe ε > 0 tal que

ˆ Existe (xn ) em A com lim xn = a e f (xn ) > f (a) + ε ∀ n ∈ N , ou

ˆ existe (yn ) em A com lim yn = a e f (yn ) < f (a) − ε ∀ n ∈ N .

Demonstração. Usamos o critério de sequências, usando a negação da continuidade


∃(xn ) ∈ A com lim xn = a e lim f (xn ) ̸= f (a) (podendo não existir), disso segue que
|f (xn ) − f (a)| > ε para n ∈ N ′ um subconjunto infinito de N . Para cada n ∈ N ′ vale

ˆ f (xn ) − f (a) > ε ou −f (xn ) + f (a) > ε

uma das duas condições é satisfeita para um número infinito de ı́ndices, logo podemos
tomar uma subsequência (tn ) de (xn ) que satisfaz lim tn = a (pois toda subsequência
tende ao mesmo limite) e vale uma das propriedades citadas acima para todo n ∈ N .

Propriedade 12. Seja f : R → R contı́nua tal que

f (x + y) = f (x) + f (y) ∀x, y ∈ R.

Nessas condições f é uma função linear.

Demonstração.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 11

ˆ Vale f (0) = 0 pois f (0 + 0) = f (0) + f (0) = 2f (0) = f (0) se fosse f (0) ̸= 0


chegarı́amos no absurdo de 2 = 1 então vale f (0) = 0.

ˆ Dado x real arbitrário, vale que f (−x) = −f (x) pois f (x − x) = f (x) + f (−x) = 0
portanto f (−x) = −f (x).

ˆ Vale que f (nx) = nf (x) para qualquer x real e n natural pois, por indução f (1.x) =
1.f (x), supondo f (nx) = nf (x) tem-se que

f ((n + 1)x) = f (nx) + f (x) = nf (x) + f (x) = (n + 1)f (x).

ˆ f (−nx) = −f (nx) = −nf (x) logo a propriedade f (nx) = nf (x) vale para n inteiro.
x f (x) nx x f (x)
ˆ Dado n natural vale que f ( ) = pois f ( ) = nf ( ) = f (x) logo =
n n n n n
x
f ( ) isso para x real arbitrário.
n
px p p
ˆ Daı́ concluı́mos que f ( ) = f (x) onde é um número racional.
q q q
ˆ Podemos denotar f (1) = a daı́ vale f (x) = xf (1) = ax onde x é racional.

ˆ Tomamos uma sequência (xn ) de números racionais que convergem para um valor
x real arbitrário (racional ou irracional), vale que

f (xn ) = xn .f (1) = xn .a

aplicando o limite e usando a continuidade segue que

lim f (xn ) = f (x) = lim xn .a = a.x

logo f (x) = a.x.

Propriedade 13. Seja f : R → R não-decrescente tal que

f (x + y) = f (x) + f (y) ∀x, y ∈ R.

Nessas condições f é uma função linear.

Demonstração. Seguimos o mesmo procedimento da propriedade anterior para


os números racionais, vamos provar agora para os números irracionais, tomamos uma
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 12

sequência (xn ) crescente e (yn ) decrescente , ambas de números racionais que convergem
para um número x, nessas condições

xn ≤ x ≤ yn

pelo fato de f ser não decrescente segue que

f (xn ) = xn .a ≤ f (x) ≤ f (yn ) = yn .a

tomando o limite
x.a ≤ f (x) ≤ y.a.

Portanto f (x) = a.x para qualquer x real .

1.2 Funções contı́nuas e operações

Corolário 2. Dadas f.g : A → R contı́nuas em a ∈ A então f + g e f.g são contı́nuas, se


g(a) ̸= 0 então f /g é contı́nua em a. Tais propriedades são válidas pois

lim f (x) + g(x) = lim f (x) + lim g(x) = f (a) + g(a)


x→a x→a x→a

lim f (x).g(x) = lim f (x). lim g(x) = f (a).g(a)


x→a x→a x→a

f (x) f (a)
lim = lim f (x).(lim g(x))−1 = .
x→a g(x) x→a x→a g(a)

Corolário 3. O produto de uma função f : A → R contı́nua em a por uma constante c


é uma função contı́nua, pois é o produto de duas funções contı́nuas.

Corolário 4. O produtório de funções contı́nuas é uma função contı́nua. O somatório de


funções contı́nuas é uma função contı́nua.

Corolário 5. f : A → R dada por f (x) = xn , com n natural é uma função contı́nua em



n
a ∈ A, pois f (x) = x.
k=1


n
Corolário 6. Todo polinômio f : A → R dado por f (x) = ak xk é contı́nuo em a ∈ A,
k=0
pois cada ak xk é contı́nua em a e daı́ a sua soma também é contı́nua.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 13

Corolário 7. Funções racionais, que são dadas pelo quociente de dois polinômios , são
funções contı́nuas nos valores onde o denominador não se anula, pois tem-se o quociente
de funções contı́nuas.

Corolário 8. A composição de funções contı́nuas é uma função contı́nua. A propriedade


segue da propriedade de limites.

Propriedade 14. Sejam A ⊂ F1 ∪ F2 com F1 e F2 fechados. Se as restrições f |A∩F1 e


f |A∩F2 são contı́nuas então f é contı́nua.

Demonstração. Seja a ∈ A, se a ∈ F1 ∩ F2 , f |A∩F1 e f |A∩F2 são contı́nuas em a,


então
∀ε > 0 ∃δ1 > 0 | x ∈ A ∩ F1 |x − a| < δ1 ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

∀ε > 0 ∃δ2 > 0 | x ∈ A ∩ F2 |x − a| < δ2 ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

tomando δ = min{δ1 , δ2 } , tem-se com x ∈ A e |x − a| < δ então x ∈ F1 ou x ∈ F2 , em


qualquer dos casos vale |x − a| < min{δ1 , δ2 } daı́ |f (x) − a| < ε.
Sem perda de generalidade se a ∈ F1 e a ∈
/ F2 então f |A∩F1 é contı́nua em a, logo

∀ε > 0 ∃δ1 > 0 | x ∈ A ∩ F1 |x − a| < δ1 ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

como F2 é fechado, podemos obter δ2 > 0 tal que não exista x ∈ F2 com |x − a| < δ2 , pois
se houvesse para todo δ2 então terı́amos uma sequência convergindo para a com elementos
de F2 e como F2 é fechado implicaria a ∈ F2 . Tomamos δ = min{δ1 , δ2 } , então x ∈ F1 e
vale |f (x) − f (a)| < ε.

Corolário 9. Sejam A = F1 ∪ F2 com F1 e F2 fechados. Se f |F1 e f |F2 são contı́nuas


então f é contı́nua.

Propriedade 15. Sejam A ⊂ Ak , uma cobertura por meio de abertos Ak e f : A → R.
k∈L
Se todas as restrições f |Ak ∩A são contı́nuas, então f é contı́nua.

Demonstração. Tomamos a ∈ A. Vamos mostrar que f : A → R é contı́nua em a.



Como A ⊂ Ak , então existe u ∈ L tal que a ∈ Au como Au é aberto, então existe
k∈L
δ1 > 0 tal que x ∈ (a − δ1 , a + δ1 ) ⊂ Au , por termos f |Au ∩A contı́nua então

∀ε > 0 ∃δ2 > 0 | |x − a| < δ2 ⇒ |f (x) − f (a)| < ε


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 14

tomando δ = min{δ1 , δ2 } tem-se x ∈ A, |x − a| < δ implicando x ∈ Au ∩ A que implica


|f (x) − f (a)| < ε.

Propriedade 16. Se f : A → R é contı́nua em a então |f | : A → R também é contı́nua


em a.

Demonstração. Vale ||f (x)| − |f (a)|| ≤ |f (x) − f (a)| < ε.

Propriedade 17. Dadas f, g : A → R contı́nuas, então h, t : A → R dada por h(x) =


max{f (x), g(x)}e t(x) = max{f (x), g(x)} são contı́nuas.
f (x) + g(x) + |f (x) − g(x)|
Demonstração. Vale h(x) = max{f (x), g(x)} = e t(x) =
2
f (x) + g(x) − |f (x) − g(x)|
min{f (x), g(x)} = , daı́ h e t são contı́nuas.
2
Propriedade 18. Seja f : R → R tal que f (y.x) = yf (x) para todos y, x ∈ R, então f é
contı́nua.

Demonstração. Se f (1) = 0 temos f (x) = 0 para todo x, pois f (x.1) = f (x).f (1),
ε
se não, tomamos δ = logo
|f (1)|
ε
|x − a| < δ = ⇒ |x − a||f (1)| < ε
|f (1)|
|f (x) − f (a)| < ε.

Propriedade 19. Sejam a ≥ 0, b ≥ 0 então

1 1 1
|a n − b n | ≤ |a − b| n
1 1
Demonstração. Supondo a ≥ b , definindo c = a n e d = b n , então c − d ≥ 0 por
expansão binomial tem-se
∑n ( )
n
c = ((c − d) + d) =
n n
(c − d)k dn−k ≥ dn + (c − d)n ≥ 0
k=0
k

daı́ cn − dn ≥ (c − d)n ≥ 0 implicando


1 1
|a − b| ≥ |a n − b n |n

e daı́
1 1 1
|a n − b n | ≤ |a − b| n .
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 15

1 1
Propriedade 20. Se xn ≥ 0 e lim xn = a então lim(xn ) p = a p

Demonstração. Como lim xn = a então ∀ε > 0 conseguimos n0 ∈ N tal que para


1
n > n0 tem-se |xn − a| < εp e daı́ |xn − a| p < ε, da desigualdade anterior temos que
1 1 1
|xnp − a p | ≤ |xn − a| p < ε
1 1
e daı́ lim(xn ) p = a p .

1
Propriedade 21. Seja f : R → R+ contı́nua, então f p (p ∈ N ) é contı́nua em R.

Demonstração. Tomamos uma sequência (xn ) com lim xn = a, vale que lim f (xn ) =
1 1 1
f (a) pois f é contı́nua, daı́ lim f (xn ) p = (lim f (xn )) p = f (a) p , pela propriedade de
1
sequências, logo f p é contı́nua.
Demonstração.[2] Como f é contı́nua em um ponto arbitrário a, então para todo
ε > 0 existe δ > 0 tal que
p
|x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

que implica
1 1 1
|f p (x) − f p (a)| < |f (x) − f (a)| p < ε

Exemplo 8. Vamos mostrar que f : [0, ∞) → R com f (x) = x é contı́nua no seu
domı́nio.
1 1 1
Primeiro mostramos que |a 2 − b 2 | ≤ |a − b| 2 . Dados a e b, podemos supor sem perda
1 1
de generalidade que a ≥ b ⇒ a 2 ≥ b 2

1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
a = (a 2 − b 2 + b 2 )2 = (a 2 − b 2 )2 + 2(a 2 − b 2 )b 2 + b ≥ (a 2 − b 2 )2 + b

1 1 1 1 1
daı́ a − b ≥ (a 2 − b 2 )2 ⇒ (a − b) 2 ≥ (a 2 − b 2 )2 .
1
Tomando δ = ε2 para |x − a| < ε2 tem-se |x − a| 2 < ε ⇒

√ √ 1
| x − a| ≤ |x − a| 2 < ε

pelo resultado que acabamos de provar.


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 16

1.3 Funções contı́nuas e desigualdades

Propriedade 22. Se f : A → R é contı́nua no ponto a ∈ A então f é limitada numa


vizinhança de a.

Demonstração. Tomamos ε = 1 e temos

∃δ > 0|x ∈ A, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < 1

daı́ tem-se x ∈ (a − δ, a + δ) ⇒ |f (x)| < |f (a)| + 1 = K , veja o argumento de que se


o limite da função existe então ela é limitada numa vizinhança.

Propriedade 23. Se f, g : A → R são contı́nuas no ponto a ∈ A e f (a) < g(a) então


∃δ > 0 tal que f (x) < g(x) ∀x ∈ A com |x − a| < δ.

Demonstração. Demonstração similar ao caso de limita de funções.


Pela definição de continuidade tem-se ∀ε > 0, ∃δ1 > 0 tal que x ∈ A , |x − a| < δ1
implica f (x) ∈ (f (a) − ε, f (a) + ε) e o mesmo para g(x) , ∃δ2 > 0 tal que x ∈ A ,
|x − a| < δ2 implica g(x) ∈ (g(a) − ε, g(a) + ε), podemos tentar tomar g(a) − ε = f (a) + ε,
g(a) − f (a)
com isso = ε, como g(a) > f (a) tal ε cumpre a condição ε > 0, tomando
2
g(a) − f (a)
ε = e δ = min{δ1 , δ2 } tem-se f (x) < f (a) − ε = g(a) − ε < g(x), isto é,
2
f (x) < g(x) para x ∈ A, |x − a| < δ.

Corolário 10. Se f : A → R contı́nua no ponto a ∈ A e k ∈ R uma constante, se


f (a) < k então ∃δ > 0 tal que f (x) < k ∀x ∈ A com |x − a| < δ.
Tome a função g(x) = k∀x ∈ A.

Corolário 11 (Preservação de sinal numa vizinhança). Seja h : A → R contı́nua no


ponto a ∈ A. Se h(a) ̸= 0 existe δ > 0 tal que ∀x ∈ A ∩ (a − δ, a + δ) h(x) tem o mesmo
sinal de h(a).
Se h(a) < 0 tomamos f (x) = h(x) e g(x) = 0 ∀x ∈ A na propriedade. Caso 0 < h(a)
tomamos f (x) = 0 ∀x ∈ A e g(x) = h(x).

Propriedade 24. Seja f : A → R contı́nua em a ∈ A. Se para toda vizinhança de a


existem x e y ∈ A tais que f (x) e f (y) tem sinais contrários então f (a) = 0.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 17

Demonstração. Usando a contrapositiva, temos que mostrar que se f (a) ̸= 0 então


existe vizinhança do ponto a tal que para todos x e y em tal vizinhança vale f (x) e
f (y) tem o mesmo sinal. Essa propriedade vale realmente para funções contı́nuas, logo a
proposição é verdadeira.

Exemplo 9. A função f (x) = |x| definida de R em R é contı́nua. Temos que mostrar


que em qualquer ponto a ∈ R

∀ε > 0, ∃δ > 0 | x ∈ R, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| = ||x| − |a|| < ε

pois f (x) = |x| podemos tomar δ = ε e segue da desigualdade ||x| − |a|| ≤ |x − a| e de


|x − a| < δ = ε que ||x| − |a|| < ε.

Propriedade 25. Sejam f, g : B → R contı́nuas

Y = {x ∈ B | f (x) < g(x)}

Z = {x ∈ B | f (x) ≤ g(x)}

então existem A aberto e F fechado tais que Y = B ∩ A e Z = B ∩ F.

Demonstração. Pela continuidade de f e g, para cada y ∈ Y existe um intervalo Iy


de centro y, tal que
{y} ⊂ B ∩ Iy ⊂ Y

daı́
∪ ∪
Y = y⊂ (B ∩ Iy ) ⊂ Y
y∈Y y∈Y
∪ ∪ ∪
logo Y = (B ∩ Iy ) e por identidade de conjuntos temos que (B ∩ Iy ) = B ∩ ( Iy ),
y∈Y
∪ y∈Y y∈Y

tomando A = Iy segue que A é aberto por ser união de abertos, daı́ Y = B ∪ A.


y∈Y
Vale que Z = B \ {ξ ∈ B, g(x) < f (x)}, pelo que provamos acima, existe B aberto tal
que
Z = B \ (B ∩ A) = B ∩ (R \ A)

onde essa última passagem se deu por identidade de conjuntos, temos que R \ A = F é
um conjunto fechado, logo provamos que Z = B ∩ F , onde F é fechado.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 18

Corolário 12. Se B é aberto Y = B ∩ A é aberto por ser intersecção de abertos, se B é


fechado então Z = B ∩ F é fechado por ser intersecção de fechados.

Corolário 13. Se f, g : B → R são contı́nuas e B aberto então {x ∈ B | f (x) ̸= g(x)}


é aberto pois {x ∈ B | f (x) < g(x)} ∪ {x ∈ B | f (x) > g(x)} onde ambos conjuntos são
abertos.

Corolário 14. Se f, g : B → R são contı́nuas e B fechado então {x ∈ B | f (x) = g(x)}


é fechado pois {x ∈ B | f (x) ≤ g(x)} ∩ {x ∈ B | f (x) ≥ g(x)} onde ambos conjuntos são
fechados.

Definição 7 (Semi-contı́nua superiormente (scs)). f : A → R é scs em a ∈ A quando

∀ c > f (a) ∃ δ > 0 | ∀ x ∈ A, |x − a| < δ ⇒ f (x) < c.

Definição 8 (Semi-contı́nua inferiormente (sci)). f : A → R é sci em a ∈ A quando

∀ c < f (a) ∃ δ > 0 | ∀ x ∈ A, |x − a| < δ ⇒ c < f (x).

Propriedade 26. f : A → R é contı́nua em a ∈ A ⇔ f é sci e scs em a.

Demonstração. ⇒). Se f é contı́nua em a então

∀ ε > 0 ∃ δ > 0 | ∀x ∈ A, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε

temos então f (x) < f (a) + ε e f (a) − ε < f (x). Sendo c > f (a) arbitrário, podemos
tomar ε = c − f (a), ε + f (a) = c, logo ∃ δ > 0 | ∀x ∈ A, |x − a| < δ implicando
f (x) < f (a) + ε = c, portanto f é scs em a.
Da mesma maneira se c < f (a), tomamos ε = f (a)−c ⇒ f (a)−ε = c e a continuidade
garante que ∃ δ > 0 | ∀x ∈ A, |x − a| < δ implicando c = f (a) − ε < f (x), logo f é sci em
a.
⇐). Suponha que f seja scs e sci em a, seja ε > 0 arbitrário então pela primeira
condição podemos tomar c − f (a) = ε que fica garantida a existência de δ1 , tal que
|x − a| < δ1 implica f (x) < c, f (x) − f (a) < ε, por f ser sci em a para qualquer, podemos
tomar f (a) − c2 = ε e daı́ existe δ2 tal que |x − a| < δ2 implica c2 < f (x), f (a) − ε < f (x),
daı́ tomando δ = min{δ1 , δ2 } as duas condições são satisfeitas logo vale |f (x) − f (a)| < ε
e f é contı́nua em a.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 19

Propriedade 27. Se f é scs e g é sci em a e f (a) < g(a) então existe δ > 0 tal que
x ∈ A, |x − a| < δ implica f (x) < g(x).
f (a) + g(a)
Demonstração. Como f é scs tomamos c = > f (a), então existe δ1 > 0,
2
f (a) + g(a)
x ∈ A, |x − a| < δ1 ⇒ f (x) < . Da mesma maneira como g é sci, tomando o
2
f (a) + g(a) f (a) + g(a)
mesmo c = < g(a) existe δ2 > 0, x ∈ A, |x − a| < δ2 ⇒ < g(x).
2 2
f (a) + g(a)
Tomando δ = min{δ1 , δ2 } tem-se com x ∈ A , |x − a| < δ que f (x) < e
2
f (a) + g(a)
< g(x) que implica f (x) < g(x).
2

1.3.1 Hölder- contı́nua

Definição 9 (Hölder- contı́nua). Uma função f : A → R é Hölder contı́nua se existem


constantes a, c > 0 tais que
|f (x) − f (y)| ≤ c|x − y|a

, para todo x, y ∈ A. A constante c é chamada de constante de Hölder.

Propriedade 28. Toda função Hölder contı́nua é contı́nua.

Demonstração.

1.4 Funções contı́nuas em intervalos

1.4.1 Teorema do valor intermediário

Teorema 1 (Teorema do Valor intermediário-TVI). Seja f : [a, b] → R contı́nua. Se

f (a) < d < f (b)

então existe c ∈ (a, b) tal que f (c) = d.

Demonstração. Seja o conjunto A = {x ∈ [a, b] | f (x) < d}, tal conjunto é não vazio,
pois a ∈ A, temos também que o intervalo [a, b] não é degenerado pois f (a) < d < f (b)
implica f (a) ̸= f (b), logo a ̸= b. Tem-se também que b ∈
/ A e A é limitado superiormente,
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 20

então possui supremo. Seja c = sup A, vamos mostrar que o conjunto A não possui
máximo, logo o supremo não pertence ao conjunto.
Suponha que A possua um máximo α, de f (α) < d segue 0 < d − f (α), tomamos
ε = d − f (α) e por continuidade de f em α segue

∃δ > 0 | x ∈ X, |x − α| < δ ⇒ |f (x) − f (α)| < ε

x ∈ (α − δ, α + δ) ⇒ f (x) ∈ (f (α) − ε, f (α) + ε)

como f (α) + ε = d, podemos tomar δ de forma que [α, α + δ] ∈ [a, b] e para todo
x ∈ [α, α + δ) vamos ter x ∈ A com f (x) < d, que é absurdo logo A não possui máximo.
Tomamos uma sequência crescente de elementos de A, ela converge para o supremo c,
lim xn = c logo lim f (xn ) = f (c) ≤ d . Tal elemento c pertence ao intervalo (a, b), pois
não pode ser a, pois se não intervalo A teria um máximo, não pode ser b pois d < f (b) e é
uma sequência de elementos com elementos em [a, b] logo está dentro do intervalo. Como
A não possui maior elemento, não temos f (c) < d de onde segue f (c) = d .

Propriedade 29. Seja f : I → R contı́nua, I um intervalo, então f (I) é um intervalo.

Demonstração. Tomamos a = inf f (x) e b = sup f (x). f (I) é um intervalo com


x∈I x∈I
extremos a e b. Dados a < y < b existem x1 e x2 tais que a < f (x1 ) < y e y < f (x2 ) < b,
por definição de supremos e ı́nfimo, isto é , f (x1 ) < y < f (x2 ), pelo T V I existe x tal que
f (x) = y, logo a imagem é um intervalo.

Exemplo 10. Seja f : R → R definida por f (x) = xsen(x), então para todo c ∈ R existe
(xn ) em R com lim xn = ∞ e lim f (xn ) = c.
Para x suficientemente grande a oscilação de f (x) é tão grande quanto queremos e a
oscilação é crescente.

π π
ˆ Para x2 = + 2πn, vale sen(x) = 1 e f (x2 ) = + 2πn.
2 2
π π
ˆ Para x1 = − + 2πn, vale sen(x) = −1 e f (x1 ) = − 2πn.
2 2

ˆ Daı́ segue que f (x2 ) − f (x1 ) = 4πn, a oscilação cresce pois

π π
ˆ Para x4 = + 2π(n + 1), vale sen(x) = 1 e f (x4 ) = + 2π(n + 1).
2 2
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 21

π π
ˆ Para x3 = − + 2π(n + 1), vale sen(x) = −1 e f (x3 ) = − 2π(n + 1).
2 2

ˆ Segue que f (x3 ) − f (x2 ) = 4π(n + 1) > f (x2 ) − f (x1 ) = 4πn, portanto a oscilação
da função é tão grande quanto queremos e cresce.

π π
Então, dado c ∈ R existe n0 ∈ N tal que c ∈ [ − 2πn0 , + 2πn0 ] e por continuidade
2 2
π π
existe x1 ∈ [− + 2πn0 , + 2πn0 ] tal que f (x1 ) = c. Da mesma maneira existe x2 ∈
2 2
π π π
[− + 2π(n0 + 1), + 2π(n0 + 1)] tal que f (x2 ) = c, em geral xn ∈ [− + 2π(n0 + n −
2 2 2
π
1), + 2π(n0 + n − 1)] tal que f (xn ) = c, valendo lim xn = ∞ e lim f (xn ) = c.
2

Propriedade 30. Seja uma função contı́nua f : I → A onde A ⊂ R é um conjunto de


pontos isolados e I é um intervalo, então f é constante.

Demonstração.[1] Suponha que existam x1 e x2 ∈ I tais que f (x1 ) ̸= f (x2 ), supondo


f (x1 ) < f (x2 ), pelo T V I, existe x3 ∈ I tal que f (x1 ) < f (x3 ) < f (x2 ), seguindo esse
procedimento construı́mos uma sequência (f (xk )) limitada de termos contidos em A,
que possui ponto de acumulação por ser uma sequência limitada e infinita, porém isso é
absurdo pois A não possui ponto de acumulação.
Temos como exemplos A = Z, A = N.
Demonstração.[2] f (I) = A é um intervalo por f ser contı́nua e I intervalo. Suponha
que A não seja unitário, tomando y ∈ A, temos a cisão de A A = {x} ∪ (A \ {x}) que
é uma cisão não-trivial de A pois (A \ {x}) não é vazio por A não ser unitário . Com
isso conseguimos uma cisão não trivial de A o que é absurdo pois A é um intervalo, que
é conexo2 .

Exemplo 11. Seja f : R → R contı́nua, então existe t ∈ R tal que f (t) = f (−t).
Temos é claro o ponto trivial t = 0 satisfazendo tal identidade, existem funções contı́nuas
que possuem apenas esse ponto, mas vamos usar o TVI para concluir que podem haver
eventualmente outros pontos, seja g : R → R definida como g(x) = f (x) − f (−x),
tomando t ∈ R, se vale g(t) = f (t) − f (−t) = 0 então a demonstração terminou, se não
g(t) = k ̸= 0 e g(−t) = g(−t) − g(t) = −k, como g é contı́nua, vale que existe w ∈ (−t, t)
tal que g(w) = 0, logo f (w) = f (−w).
2
Solução por Danilo Barros
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 22

Corolário 15. Seja f (x) uma função contı́nua em [a, b] . Se f (a).f (b) < 0, então existe
y ∈ (a, b) tal que f (y) = 0, pois os sinais de f (a) e f (b) são contrários. Se f ′ (x) preservar
o sinal em (a, b) então o intervalo contém um único zero de f , pois a função será crescente
ou decrescente no intervalo (a, b).

Propriedade 31 (Ponto fixo). Seja f : [0, 1] → R contı́nua tal que f (0) ≤ 0 e f (1) ≥ 1,
então existe c ∈ [0, 1] tal que f (c) = c.

Demonstração. Definimos g : [0, 1] → R tal que g(x) = f (x) − x, daı́ g(1) =


f (1) − 1 ≥ 0 e g(0) = f (0) ≤ 0 pelo teorema do valor intermediário, existe c ∈ [0, 1] tal
que g(c) = f (c) − c = 0 logo f (c) = c.

Propriedade 32. Seja f : A → R contı́nua em a ∈ A. Se para toda vizinhança de a


existem x e y ∈ A tais que f (x) e f (y) tem sinais contrários então f (a) = 0.

Demonstração. Usando a contrapositiva, temos que mostrar que se f (a) ̸= 0 então


existe vizinhança do ponto a tal que para todos x e y em tal vizinhança vale que f (x) e
f (y) tem o mesmo sinal. Essa propriedade vale realmente para funções contı́nuas, logo a
proposição é verdadeira.

Corolário 16. Sejam f, g : A → R contı́nuas no ponto a, tal que para toda vizinhança
V de a existam pontos x e y, tais que f (x) < g(x) e f (y) > g(y) então f (a) = g(a).
Tomamos h : A → R com h(x) = f (x) − g(x) daı́ em toda vizinhança de a existem
x, y tais que h(x) < 0 e h(y) > 0, portanto pelo resulado anterior vale que h(a) = 0 =
f (a) − g(a) ⇒ f (a) = g(a).

Propriedade 33. Sejam p ≥ 0 real, f : [0, 2p] → R contı́nua com f (0) = f (2p). Então
existe c ∈ [0, p] tal que f (c) = f (c + p).

Demonstração. Definimos g : [0, p] → R, por g(x) = f (x + p) − f (x). Temos

g(p) = f (2p) − f (p) = k

g(0) = f (p) − f (0) = −k


|{z}
=f (2p)

como g é contı́nua, por ser soma de funções contı́nuas, segue que, existe c ∈ [0, p] tal
que g(c) = 0 = f (c + p) − f (c), logo f (c + p) = f (c).
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 23

1
Exemplo 12. Tomando p = então f : [0, 1] → R contı́nua com f (0) = f (1) implica
2
1 1 1
que existe c ∈ [0, ] tal que f (c) = f (c + ). Da mesma maneira tomando p =
2 2 3
2 2 1
então f : [0, ] → R contı́nua com f (0) = f ( ) implica que existe c ∈ [0, ] tal que
3 3 3
1
f (c) = f (c + ).
3

Definição 10 (Função localmente constante). f : A → R é localmente constante, quanto


todo x ∈ A possui uma vizinhança V tal que f é constante em V ∩ A.

Propriedade 34. Toda função f : I → R localmente constante é constante, onde I é um


intervalo.

Demonstração. Dado a ∈ I, definimos

A = {x ∈ I | f (x) = f (a)}, B = {x ∈ I | f (x) ̸= f (a)},

vale que A ̸= ∅, pois a ∈ A, vale também que I = A ∪ B. Como f é localmente constante,


∀x ∈ A existe Ix = (x − ε, x + ε) tal que f (Ix ) = {f (a)} logo Ix ∩ B = ∅, daı́ não poder
existir sequência em B tendendo à x, portanto x ∈
/ B ⇒ A ∩ B = ∅. Suponha por absurdo
que exista pelo menos um y ∈ B, então para y ∈ B arbitrário vale f (y) = cy ̸= f (a) e
existe ε tal que, para Iy = (y − ε, y + ε) tem-se f (Iy ) = {cy }, portanto (y − ε, y = ε) ∩ A
é vazio, logo y ∈
/ A, A ∩ B = ∅. Daı́ temos que A ∩ B = I é uma cisão não trivial de um
intervalo, o que é um absurdo, logo B = ∅ e f é constante. Suponha por absurdo que B
não seja vazio.

Propriedade 35. Seja f : I → R uma função monótona, I um intervalo. Se f (I) é um


intervalo então f é contı́nua.

Demonstração. Seja a ∈ int(I). Suponha f não-decrescente. Existem3 os limites


laterais l = lim− f (x) e L = lim+ f (x), onde
x→a x→a

ˆ L = inf{f (x) , x ∈ A, x > a)} = inf B

ˆ l = sup{f (x) , x ∈ A, x < a)} = sup C sendo que f (a) é cota superior de C e cota
inferior de B pelo fato da função ser não-decrescente. Além disso vale l ≤ L.
3
Essa propriedade segue por resultado já demonstrado para limite de funções
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 24

Como a ∈ int(I) então existem x, y ∈ I com x < a < y. Suponha por absurdo que f seja
descontı́nua em a, daı́ L > l e vale uma das possibilidades

ˆ l < f (a) ≤ L ou

ˆ l ≤ f (a) < L, pois não pode acontecer de L = f (a) = l, se não f seria contı́nua em
a. Por isso podemos tomar z ̸= f (a) tal que l < z < L, valendo f (x) < z < f (y) ,
temos também que z ∈
/ f (I), portanto f (I) não é intervalo, o que é absurdo.

O caso de a ser uma extremo inferior ou superior do intervalo se fazem de maneira


similar.
Se a é extremidade inferior do intervalo, existe L = lim+ f (x) = inf{f (x) , x ∈ A, x >
x→a
a)}, vale L ≥ f (a) pelo fato de f ser não-decrescente. Suponha que L > f (a) (f ser
descontı́nua em a), então existe z tal que L > z > f (a), daı́ de x > a segue f (x) > z
ez ∈
/ f (I), logo f (I) não é intervalo. Se a é intervalo inferior procedemos de maneira
similar.

Definição 11 (Propriedade do valor intermediário). f : I → R, onde I é um intervalo


tem a propriedade do valor intermediário quando para todo intervalo J ⊂ I tem-se f (J)
é um intervalo.

1
Exemplo 13. f : R → R dada por f (x) = sen( ) para x ̸= 0 e f (0) = 0, tem a
x
propriedade do valor intermediário, porém é descontı́nua em 0.
Separamos os intervalos de R em dois tipos:

ˆ Os intervalos que contém 0.

ˆ Os intervalos que não contém 0.

Em todo intervalo que contém 0 a imagem da função é o intervalo [−1, 1], que já mostramos
1
por meio de sequências da forma xn = , onde c é tal que sen(c) = v ∈ [−1, 1],
2nπ + c
todo intervalo que contém 0 possui termos desse tipo para n suficientemente grande.
Em intervalos que não contém 0, a função f é contı́nua logo sua imagem é um intervalo.
Portanto para qualquer tipo de intervalo vale a propriedade do valor intermediário para
a função f .
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 25

Propriedade 36. Seja f : I → R com a propriedade do valor intermediário. Se ∀ c ∈ R


existe apenas um número finito de pontos x ∈ I tais que f (x) = c, então f é contı́nua.

Demonstração. Suponha que exista a ∈ I, em que f seja descontı́nua. Pelo critério


de sequências, existe (xn ) em I com lim xn = a e f (xn ) > f (a) + ε ∀n ∈ N (ou f (xn ) <
f (a) − ε, garantido por resultado já mostrado). Tomando algum c ∈ (f (a), f (a) + ε),
observamos o intervalo (f (a), f (xn )), como f (xn ) > f (a) + ε segue que

c ∈ (f (a), f (a) + ε) ⊂ (f (a), f (xn )) ∀n ∈ N

a propriedade de valor intermediário garante a existência de z1 entre a e x1 tal que


f (z1 ) = c, como lim xn = a, podemos tomar xn1 tal que z1 não esteja entre a e xn1 , porém
novamente a propriedade de valor intermediário garante a existência de z1 entre a e xn1
tal que f (z1 ) = c, com esse processo conseguimos infinitos valores z tais que f (z) = c, o
que contraria a hipótese, então a função deve ser contı́nua.

Propriedade 37. Se f é contı́nua em (a, b) = I com lim+ f (x) = −∞ , lim− f (x) = ∞


x→a x→b
então f (I) = R.

Demonstração. Seja y ∈ R arbitrário, vamos mostrar que existe x tal que f (x) = y.
Como lim+ f (x) = −∞ , lim− f (x) = ∞ então para quaisquer A, B positivos , existem
x→a x→b
δ1 , δ2 positivos tais que x ∈ (a, a+δ1 ) = I1 ⇒ f (x) < −A, x ∈ (b−δ1 , b) = I2 ⇒ f (x) > B,
podemos tomar A e B tais que y ∈ (−A, B), existindo x1 < x2 tal que f (x1 ) < −A
|{z} |{z}
∈I1 ∈I2
, f (x2 ) > B, f (x1 ) < y < f (x2 ) logo existe em [x1 , x2 ] um número x3 tal que f (x3 ) = y
pelo TVI .
Se o intervalo é (a, ∞) com lim f (x) = ∞ então para todo B2 > 0 existe B1 > 0
x→∞
tal que para x > B1 tem-se f (x) > B2 . Tomando B2 > y existe x2 > B1 , tal que
f (x2 ) > B2 > y então usamos o mesmo argumento anterior no intervalo [x1 , x2 ].

Exemplo 14. Seja (xk )n1 uma sequência crescente de números reais. A função f : R \
∑n
1
{xk , , k ∈ In } → R com f (x) = é sobrejetora e possui exatamente n raı́zes
k=1
x − xk
cada uma em um intervalo do tipo (xk , xk+1 ) com k em In−1 .
Vale

n
1 ∑n
1
lim+ = ∞ e lim− = −∞
x→xk
k=1
x − xk x→xk
k=1
x − xk
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 26

então existe raı́z em cada (xk , xk+1 ) e a função assume cada valor real nesse tipo de
intervalo, temos n − 1 desses tipos de intervalo, logo n − 1 raı́zes.
∑n
1 ∏n
= 0 multiplicamos por (x − xk ) em ambos lados, o que resulta
k=1
x − xk
k=1


n ∏
n
(x − xt ) = 0
k=1 t=1,t̸=k

que é um polinômio de grau n − 1 , logo possui no máximo n − 1 raı́zes reais, que estão
no intervalo que achamos anteriormente, as duas expressões são equivalentes em termo de
raı́zes.

1.4.2 Função contı́nua e abertos

Propriedade 38. Seja A um aberto . f : A → f (A) é contı́nua ⇔ f −1 (A′ ) é aberto onde


A′ é um aberto qualquer de f (A).

Demonstração.
⇒). Supondo f : A → f (A) contı́nua. Como A é aberto f (A) possui um conjunto
aberto pelo T V I, pois a imagem de um intervalo de A é um intervalo de f (A).
Tomamos A′ ⊂ f (A) aberto. Dado a ∈ f −1 (A′ ) arbitrário tem-se f (a) ∈ A′ , como A′
é aberto existe ε > 0 tal que (f (a) − ε, f (a) + ε) ⊂ A′ , por f ser contı́nua, existe δ > 0
tal que x ∈ (a − δ, a + δ) ∩ A ⇒ f (x) ∈ (f (a) − ε, f (a) + ε), por A ser aberto o δ pode ser
escolhido de maneira tal que (a − δ, a + δ) ∩ A = (a − δ, a + δ), logo

f ((a − δ, a + δ)) ⊂ (f (a) − ε, f (a) + ε) ⊂ A′

disso concluı́mos que (a − δ, a + δ) ⊂ f −1 (A′ ), logo o conjunto é aberto.


⇐). Supondo que ∀A′ aberto f −1 (A′ ) é aberto vamos mostrar que f : A → f (A) é
contı́nua.
Dado a ∈ A′ arbitrário tomamos f (a) e (f (a) − ε, f (a) + ε) = A′ . Vale que a ∈ f −1 (A′ )
f −1 (A′ ) é aberto por hipótese, logo existe δ > 0 tal que x ∈ (a − δ, a + δ) ⊂ f −1 (A′ ) ⇒
f (x) ∈ (f (a) − ε, f (a) + ε) daı́ f é contı́nua em a.

Propriedade 39. Seja A um aberto. Se f : R → R é contı́nua, então f −1 (A) é aberto.


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 27

Demonstração. Seja a1 ∈ f −1 (A) então existe a ∈ A tal que f (a1 ) = f (a). Vamos
mostrar que a1 é ponto interior de f −1 (A).
Como A é aberto, dado a ∈ A existe δ > 0 tal que (a − δ, a + δ) = Ia ⊂ A, a imagem
desse intervalo é um intervalo( pois a função é contı́nua) que contém um intervalo aberto
centrado em f (a), por isso podemos tomar ε > 0 tal que (f (a) − ε, a + ε) ⊂ f (Ia ) ⊂ f (A).
Ainda por continuidade existe δ1 > 0 tal que para x ∈ (a1 − δ1 , a1 + δ1 ) tem-se f (x) ∈
(f (a1 )−ε, f (a1 )+ε) = (f (a)−ε, f (a)+ε) ⊂ f (A) disso segue que (a1 −δ1 , a1 +δ1 ) ⊂ f −1 (A)
pois a imagem desse conjunto está contida em f (A), logo a1 é ponto interior de f −1 (A).

Exemplo 15. Dadas as funções f, g, h : R → R com f (x) = ax + b, a ̸= 0, g(x) = x2 e


h(x) = x3 então para qualquer aberto A ⊂ R tem-se f −1 (A), g −1 (A) e h−1 (A) abertos,
pelo resultado anterior, já que as funções são contı́nuas.

Definição 12 (Homeomorfismo). Uma função f : A → B é dita ser um homeomorfismo


quando é uma bijeção contı́nua com inversa continua.

Propriedade 40. Seja f : A → B um homeomorfismo, então A é aberto ⇔ B é aberto.

Demonstração.
⇒). Suponha A aberto, considere a função g : B → A, inversa de f , vale que g −1 (A) =
B por g ser bijeção, então por continuidade B é aberto.
⇐). Suponha B aberto. f −1 (B) = A por ser bijeção e por resultado anterior A é então
aberto.
Com isso concluı́mos que um homeomorfismo leva abertos em abertos.

Exemplo 16. Dadas f e h do exemplo anterior elas são bijeções com inversas contı́nuas
portanto levam abertos em abertos, dado A aberto vale que f (A) e h(A) são abertos.
Existe A aberto tal que g(A) não é aberto, como por exemplo A = (−1, 1) que possui
imagem [0, 1).

1.5 Funções contı́nuas em intervalos compactos

Propriedade 41. A imagem f (A) de um conjunto compacto A por uma função contı́nua
f : A → R é um conjunto compacto.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 28

Demonstração. Para mostrar que f (A) é compacto, vamos mostrar que toda sequência
(yn ) em f (A) possui subsequência convergente em f (A).
∀(yn ) em f (A) definimos (xn ) tal que yn = f (xn ), com (xn ) em A. Como A é compacto
a sequência (xn ) possui subsequência (xnk )k que converge para um ponto a ∈ A. Sendo
f contı́nua em a e lim xnk = a concluı́mos que lim f (xnk ) = f (a) ∈ f (A), logo (yn ) em A
k k
arbitrária possui subsequência f (xnk ) que converge, assim f (A) é compacto.

Teorema 2 (Weierstrass). Sejam f : A → R contı́nua e A compacto, então existem


x0 , x1 ∈ A tais que f (x0 ) ≤ f (x) ≤ f (x1 ), ∀x ∈ A, isto é, f assume máximo e mı́nimo
absoluto no intervalo.

Demonstração. Dado A compacto e f contı́nua, temos que f (A) é compacto, logo


possui máximo e mı́nimo, existem então x0 , x1 ∈ A tais que f (x0 ) ≤ f (x) ≤ f (x1 ),
∀x ∈ A.

1
Exemplo 17. Seja f : [0, 1] → R com f (x) = max{x, } , f possui mı́nimo e máximo
2x
global, pois é contı́nua e definida em um compacto .
1
Definindo g : [0, 1] → R com g(x) = x − x então f possui raiz em [0, 1], pois é
2
1
contı́nua e tem-se g(0) = −1 e g(1) = .
2

Corolário 17. Se A é compacto, então toda função contı́nua f : A → R é limitada, pois


f (A) é compacto logo limitado.

Propriedade 42. Seja A ⊂ R compacto. Se f : A → R e contı́nua então

∀ε > 0, ∃cε > 0 | |y − x| ≥ ε ⇒ |f (y) − f (x)| ≤ cε |y − x|.

Demonstração. Vamos usar a contrapositiva

∃ε > 0, ∀cε > 0 |y − x| ≥ ε e |f (y) − f (x)| > cε |y − x| ≥ cε ε

a relação |f (y) − f (x)| ≥ cε ε ∀cε > 0 implica que f (A) não é limitado, logo f não pode
ser contı́nua, pois a imagem do compacto A seria o compacto f (A) que é limitado.

Propriedade 43. Se f : [0, ∞) → R é contı́nua e existe lim f (x), então f é limitada.


x→∞
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 29

Demonstração. Como lim f (x) = k então tomando ε = 1, existe A > 0 tal que para
x→∞
x > A vale |f (x) − k| < 1, como no conjunto [0, A] a imagem da função admite máximo
e mı́nimo, então f é limitada em [0, A], sendo que para x > A vale |f (x) − k| < 1, então
f é limitada.

Propriedade 44. Sejam f : [a, b] → R uma função contı́nua , (xk )uk=v pontos do intervalo
[a, b] para u e v inteiros com u ≥ v. Então existe um ponto c ∈ (a, b) tal que se verifica

u
f (xk ) = (u + 1 − v)f (c).
k=v

Demonstração. f é contı́nua num intervalo compacto, logo sua imagem é um inter-


valo compacto, para todos (xk )uk=v existem y, z ∈ [a, b] tal que f (z) ≤ f (xk ) ≤ f (y), daı́
aplicamos a soma em ambos lados

u ∑
u ∑
u
f (z) = f (z)(u + 1 − v) ≤ f (xk ) ≤ f (y) = f (y)(u + 1 − v)
k=v k=v k=v

como u ≥ v, temos u + 1 > v, u + 1 − v > 0 logo



u
f (xk )
k=v
f (z) ≤ ≤ f (y)
(u + 1 − v)
| {z }
=t

Se a igualdade acontecer em algum dos lados nossa propriedade está demonstrada pois
aconteceria

u
f (z)(u + 1 − v) = f (xk )
k=v
ou

u
f (xk ) = f (y)(u + 1 − v)
k=v

supomos então que as igualdades não ocorrem

f (z) < t < f (y)

se z < y tomamos o TVI com o intervalo [z, y], assim irá existir c ∈ (z, y) ⊂ (a, b) tal que
f (c) = t daı́

u
f (xk ) ∑
u
k=v
f (c) = , (u + 1 − v)f (c) = f (xk ).
(u + 1 − v) k=v
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 30

Se y < z, tomamos o intervalo [y, z] daı́ temos

−f (y) < −t < −f (z)

tomando a função g(x) = −f (x) ela é contı́nua no intervalo, aplicamos então o TVI de
onde segue que existe c ∈ (y, z) ⊂ (a, b) tal que g(c) = −t ou −f (c) = −t, f (c) = t daı́

u
f (xk ) ∑
u
k=v
f (c) = , (u + 1 − v)f (c) = f (xk ).
(u + 1 − v) k=v

Então em qualquer caso temos a propriedade válida.

Corolário 18. Sejam f : [a, b] → R contı́nua e (xk )nk=1 pontos de [a, b] então existe
c ∈ (a, b) tal que

n
f (xk ) = nf (c).
k=1

Propriedade similar vale para produtos quando a função é contı́nua e positiva.

Propriedade 45. Sejam f : [a, b] → R uma função contı́nua com f (x) > 0∀x ∈ [a, b],
(xk )|uk=v pontos do intervalo [a, b] para u e v inteiros com u ≥ v. Então existe um ponto
c ∈ (a, b) tal que se verifica

u
f (xk ) = f (c)(u+1−v) .
k=v

Demonstração. A demonstração pode ser feita de maneira similar a propriedade da


soma, porém temos que usar a propriedade que o produtório não altera a desigualdade
quando os termos multiplicados são positivos.
f é contı́nua num intervalo compacto, logo sua imagem é um intervalo compacto, para
todos (xk )|uk=v existem y, z ∈ [a, b] tal que 0 < f (z) ≤ f (xk ) ≤ f (y), daı́ podemos aplicar
o produtório em ambos lados

u ∏
u ∏
u
0< f (z) = f (z) (u+1−v)
≤ f (xk ) ≤ f (y) = f (y)(u+1−v)
k=v k=v k=v

como u ≥ v, temos u + 1 > v, u + 1 − v > 0 logo


(∏
u ) (u+1−v)
1

f (z) ≤ f (xk ) ≤ f (y)


| k=v
{z }
=t
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 31

Se a igualdade acontecer em algum dos lados nossa propriedade está demonstrada pois
aconteceria

u
(u+1−v)
f (z) = f (xk )
k=v
ou

u
f (xk ) = f (y)(u+1−v)
k=v

supomos então que as igualdades não ocorrem

f (z) < t < f (y)

tomamos o TVI , assim irá existir c ∈ (z, y) ⊂ (a, b) tal que f (c) = t daı́
(∏
u ) (u+1−v)
1

u
(u+1−v)
f (c) = f (xk ) , f (c) = f (xk ).
k=v k=v

Corolário 19. Sejam f : [a, b] → R contı́nua com f ≥ 0 e (xk |nk=1 ) pontos de [a, b] então
existe c ∈ (a, b) tal que

n ( )n
f (xk ) = f (c) .
k=1

Propriedade 46. Se f : A ⊂ R → R é contı́nua então f (A) ⊂ f (A).

Demonstração. Seja a ∈ f (A), vamos mostrar que a ∈ f (A).


Se a ∈ f (A) então ∃y ∈ A tal que f (y) = a , como y ∈ A então existe (xn ) em A tal
que lim xn = y, como f é contı́nua, vale lim f (xn ) = f (y), mas f (xn ) é uma sequência em
f (A), logo f (y) = a ∈ f (A), daı́ f (A) ⊂ f (A).

Propriedade 47. Toda função contı́nua periódica f : R → R é limitada e atinge valores


máximo e mı́nimo.

Demonstração. Seja p o perı́odo da função, então ∀x ∈ R vale f (x + p) = f (x) , a


função repete os valores de sua imagem no intervalo [0, p] logo estudamos a sua restrição
ao compacto [0, p]. f |[0,p] é contı́nua e sua imagem é um compacto, logo ela possui máximo
e mı́nimo, existindo x1 , x2 ∈ R tal que f (x1 ) é mı́nimo e f (x2 ) é máximo.

Propriedade 48. Sejam A um conjunto compacto, f : A → R contı́nua com f (x) > 0


para todo x ∈ A, então existe c > 0 tal que f (x) ≥ c , ∀x ∈ A.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 32

Demonstração. Como a função é contı́nua definida num compacto, então sua imagem
é um compacto, implicando que existe x0 ∈ A tal que f (x) ≥ f (x0 )∀x ∈ A, como vale
f (x0 ) > 0 tomamos f (x0 ) = c.

Propriedade 49. Seja f : R → R contı́nua com lim f (x) = lim f (x) = ∞. Então
x→∞ x→−∞

existe x0 ∈ R tal que f (x0 ) ≤ f (x) ∀ x ∈ R. f possui mı́nimo global.

Demonstração. Tomamos a ∈ R qualquer, da definição dos limites infinito temos

ˆ ∃ B > 0 tal que x > B ⇒ f (x) > f (a)

ˆ ∃ B1 > 0 tal que x < −B1 ⇒ f (x) > f (a).

Podemos tomar A > 0 tal que A > B, A > a, −A < −B1 , −A < a, logo para x > A, y <
−A tem-se f (x) > f (a), f (y) > f (a), f restrita à [−A, A] possui mı́nimo f (x0 ) pois o
conjunto é compacto, além disso como a ∈ [−A, A] segue que f (x0 ) ≥ f (a), tal valor f (x0 )
é mı́nimo global da função, pois em [−A, A] tal valor é mı́nimo e fora desse intervalo a
função assume valores maiores que f (x0 ).

Propriedade 50. Seja f : R → R contı́nua com lim f (x) = ∞ e lim f (x) = −∞.
x→∞ x→−∞
Então para todo c ∈ R existe entre as raı́zes da equação f (x) = c uma cujo módulo é
mı́nimo.

Demonstração. Começamos de maneira similar ao resultado anterior, pela definição


dos limites infinitos

ˆ ∃ B > 0 tal que x > B ⇒ f (x) > c

ˆ ∃ B1 > 0 tal que x < −B1 ⇒ f (x) > −c.

Podemos tomar A > 0 tal que A > B, A > c, −A < −B1 , −A < −c, logo para x >
A, y < −A tem-se f (x) > c, f (y) < −c. As raı́zes de f (x) = c pertencem ao conjunto
[−A, A]. Seja V = {|x| ∈ [−A, A] | f (x) = c}, tal conjunto é limitado inferiormente, logo
possui ı́nfimo. Seja t = inf V . Se o ı́nfimo pertence ao conjunto nada precisamos fazer,
essa é nossa raı́z com módulo mı́nimo. Se não, existe (xn ) ∈ V tal que lim xn = t, vale
f (xn ) = c ∀n ∈ N e por continuidade de f temos lim f (xn ) = f (t) = c, então o ı́nfimo
pertence ao conjunto, logo existe sempre uma raı́z cujo módulo é mı́nimo.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 33

Propriedade 51. Não existe f : [a, b] → R contı́nua que assume cada um dos seus valores
f (x) exatamente duas vezes.

Demonstração. [a, b] possui apenas dois extremos , temos 2 pontos de máximo e


2 pontos de mı́nimo da função f , então obrigatoriamente teremos que um desses pontos
crı́ticos deve ser imagem de um ponto interior de [a, b]. Suponha que seja o máximo.
O valor máximo de f será então assumido num ponto xm1 ∈ int[a, b] vamos supor o
outro ponto xm2 em que a função atinge máximo também no interior do intervalo , com
xm1 > xm2 .
Tomamos x3 < xm2 , xm2 < x2 < xm1 , xm1 < x1 e A = max{f (x3 ), f (x1 ), f (x2 )}, pelo
T V I existe valores x ∈ [x3 , xm2 ), y ∈ [x2 , xm1 ) e z ∈ (xm1 , x1 ], tais que f (x) = f (y) =
f (z) = A, absurdo, pois deveria haver apenas 2 valores distintos em [a, b] tais que suas
imagens fossem iguais.

1.6 Continuidade uniforme

Definição 13 (Função uniformemente contı́nua). Uma função f : A → R é uniforme-


mente contı́nua quando vale

∀ε > 0, ∃δ > 0 | x, y ∈ A, |x − y| < δ ⇒ |f (x) − f (y)| < ε.

Propriedade 52. f : R → R dada por f (x) = c , a função constante é uniformemente


contı́nua.

Demonstração. Dado ε qualquer vale |f (x) − f (y)| = |c − c| = 0 < ε para qualquer


escolha de δ e ε.

Propriedade 53. f : R → R dada por f (x) = cx onde c ̸= 0 é constante é uniformemente


ε
contı́nua, pois tomando um ε qualquer, existe δ = tal que
|c|
ε
|x − y| < δ < ⇒ |cx − cy| = |f (x) − f (y)| < ε.
|c|

Propriedade 54. Toda função f : N → R é uniformemente contı́nua.


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 34

Demonstração. Podemos tomar δ < 1 daı́ |x − y| < δ implica x = y, que implica


|f (x) − f (y)| = 0 < ε.
N é fechado, porém não é limitado, toda sequência é uma função uniformemente
contı́nua.

Propriedade 55. Se toda função f : A → R é uniformemente contı́nua então A é fechado,


porém não necessariamente compacto.

Demonstração. Usaremos a contrapositiva. Se A não é fechado então existe função


f : A → R que não é uniformemente contı́nua. Daremos então um exemplo desse tipo de
função. Como A não deve ser fechado então deve existir a ∈ A tal que a ∈ / A, tomamos
1
f : A → R definida como f (x) = o limite lim f (x) não existe então A não pode ser
x−a x→a
uniformemente contı́nua.

Propriedade 56. Dada f : A → R uniformemente contı́nua, definimos g : A → R como


g(x) = f (x) se x ∈ A é um ponto isolado e g(a) = lim f (x) se a ∈ A′ . Nessas condições g
x→a
é uniformemente contı́nua e vale g(x) = f (x) ∀x ∈ A.

Demonstração. Vamos mostrar inicialmente que vale g(x) = f (x) ∀x ∈ A. Se x é


ponto isolado sabemos por definição de g que tem-se g(x) = f (x). Seja agora um ponto
a ∈ A que não seja isolado, então existe (xn ) ∈ A tal que lim xn = a, por f ser contı́nua
vale que lim f (xn ) = f (a) = lim f (x) = g(a), onde a última passagem foi pela definição
x→a
da g. Fica provado então que g(x) = f (x) ∀x ∈ A.
Vamos mostrar agora que g é uniformemente contı́nua. f é uniformemente contı́nua,
ε
daı́ para x, y ∈ A com |x − y| < δ tem-se |f (x) − f (y)| < , sendo a, b ∈ A existem
2
(xn ), (yn ) em A, tais que lim xn = a, lim yn = b, se |a − b| < δ temos |xn − yn | < δ para n
grande, por causa da desigualdade

|xn − yn | ≤ |xn − a| + |yn − b| + |a − b|


ε
isso implica que |f (xn ) − f (yn )| < , passando o limite temos |g(a) − g(b)| = lim |f (xn ) −
2
ε
f (yn )| ≤ , daı́ g é uniformemente contı́nua.
2

Propriedade 57. Seja f : R → R contı́nua. Se existem lim f (x) = L e lim f (x) = l


x→∞ x→−∞

então f é uniformemente contı́nua.


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 35

Demonstração. Pela definição de limite temos que


ε
ˆ ∀ ε > 0 ∃A > 0 | x > A ⇒ |f (x) − L| <
4
ε
ˆ ∀ ε > 0 ∃B > 0 | x < −B ⇒ |f (x) − l| < .
4
ε ε
Se x > A, y > A vale que |f (x) − L| < e |f (y) − L| < , daı́
4 4
ε ε ε
|f (y) − f (x)| ≤ |f (x) − L| + |f (y) − L| < + = .
4 4 2
ε ε
Da mesma maneira se x < −B, y < −B vale que |f (x) − l| < e |f (y) − l| < , daı́
4 4
ε ε ε
|f (y) − f (x)| ≤ |f (x) − l| + |f (y) − l| < + = .
4 4 2
O conjunto [−B, A] é compacto, então f é uniformemente contı́nua em tal conjunto, daı́
ε
se x, y ∈ [−B, A] com |x − y| < δ tem-se |f (x) − f (y)| < . Caso x < −B e y ∈ [−B, A]
2
com |x − y| < δ temos também que | − B − y| < |x − y| < δ, pois x < −B ≤ y, a distância
de y até B é menor que a distância de y até x, portanto
ε ε
|f (x) − f (y)| ≤ |f (x) − f (−B)| + |f (−B) − f (y)| < + = ε.
2 2
Da mesma forma se x > A e y ∈ [−B, A] com |x − y| < δ vale y ≤ A < X daı́
|A − y| < |x − y| < δ e vale
ε ε
|f (x) − f (y)| ≤ |f (x) − f (A)| + |f (A) − f (y)| < + = ε.
2 2
Concluı́mos que f é uniformemente contı́nua em qualquer um dos casos

ˆ x, y > A

ˆ x ∈ [−B, A] y > A

ˆ x, y ∈ [−B, A]

ˆ x, y < −B.

Logo f é uniformemente contı́nua em R.

Exemplo 18. A condição anterior não é necessária para que uma função seja uniforme-
mente contı́nua, como mostra o caso da função real com f (x) = x , cujos limites não
existem.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 36

Exemplo 19. Suponha f : R → R contı́nua , então g : R → R dada por g(x) = f (x) − x


também é contı́nua, se existem lim g(x) = L e lim g(x) = l então g é uniformemente
x→∞ x→−∞
contı́nua. A soma de funções uniformemente contı́nuas é uniformemente contı́nua então
g(x) + x = f (x) também é uniformemente contı́nua.

1 1
Exemplo 20. A função f : R → R dada por f (x) = é contı́nua e vale lim =
1 + x2 x→∞ 1 + x2
1
lim = 0 logo f é uniformemente contı́nua.
x→−∞ 1 + x2

1.6.1 Função lipschitziana

Definição 14 (Função lipschitziana). Uma função f : A → R é lipschitziana quando


existe uma constante c > 0, tal que ∀x, y ∈ A ⇒ |f (x) − f (y)| ≤ c|x − y|, c é chamada de
constante de lipschitz.
Para mostrar que uma função não é Lipschitziana basta mostrar que o quociente
|f (y) − f (x)|
não é limitado .
|x − y|
1
Exemplo 21. A função f : R → R com f (x) = xsen( ), x ̸= 0 e f (0) = 0 não é
x
1 1
lipschitziana , pois tomando xn = e yn = podemos concluir que o
2πn + 3π
2
2πn + π2
|f (yn ) − f (xn )|
quociente não é limitado .
|xn − yn |

Propriedade 58. Toda função lipschitziana é uniformemente contı́nua.

Demonstração. Sabendo que a função é lipschitziana, existe c > 0 tal que ∀x, y ∈
ε
A ⇒ |f (x) − f (y)| ≤ c|x − y|. Para cada ε > 0 tomamos δ = logo
c
ε
∀ε > 0, ∃δ > 0 | x, y ∈ A, |x − y| < δ = ⇒
c
multiplicando por c não altera a desigualdade pois c > 0, c|x − y| < ε e usando a condição
de ser lipschitziana segue
|f (x) − f (y)| ≤ c|x − y| < ε

logo |f (x) − f (y)| < ε que implica a função ser uniformemente contı́nua.

Propriedade 59. f : R → R dada por f (x) = ax + b (a ̸= 0)é lipschitziana.


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 37

Demonstração. Pois |f (x) − f (y)| = |ax + b − ay − b| = |a||x − y| é lipschitziana de


constante de lipschitz |a|, logo é uniformemente contı́nua.

Propriedade 60. A soma de funções lipschitzianas é uma função lipschitziana.

Demonstração. Para todo x, y em A existem c1 , c2 > 0 tais que |f (x) − f (y)| ≤


c1 |x − y|,
|g(x) − g(y)| ≤ c2 |x − y|

onde f, g : A → R são lipschitzianas , logo somando as desigualdades , tomando c = c1 +c2


e usando desigualdade triangular tem-se

|g(x) + f (x) − (g(y) + f (y))| ≤ |g(x) − g(y)| + |f (x) − f (y)| ≤ c|x − y|

logo a soma é lipschitz .

Exemplo 22. A função f : R → R dada por f (x) = |x| é lipschitziana, pois vale

||x| − |y|| ≤ |x − y|.

1.6.2 Critério de sequências para continuidade uniforme

Propriedade 61. Seja f : A → R e (xn ), (yn ) sequências em A tais que lim xn − yn = 0.


f é uniformemente contı́nua ⇔ lim f (yn ) − f (xn ) = 0.

Demonstração. ⇒. Se f é uniformemente contı́nua vale que

∀ε > 0 ∃δ > 0 | |x − y| < δ ⇒ |f (x) − f (y)| < ε

como lim xn − yn , existe n0 ∈ N tal que n > n0 implica |xn − yn | < δ que implica pela
condição de continuidade uniforme que |f (xn ) − f (yn )| < ε, logo lim f (xn ) − f (yn ) = 0.
⇐. Na volta vamos usar a contrapositiva. Temos que provar então que se f não é
uniformemente contı́nua, então existem (xn ), (yn ) em A com lim xn − yn = 0 e lim f (yn ) −
f (xn ) ̸= 0. Como f não é uniformemente contı́nua podemos tomar pontos (xn ) e (yn ) em
1
A tais que |xn − yn | < e |f (xn ) − f (yn )| ≥ ε, daı́ lim xn − yn = 0 e lim f (xn ) − f (yn ) ̸= 0,
n
o que demonstra a proposição.
Esse critério pode ser de grande utilidade para decidir quando uma função não é
uniformemente contı́nua, veremos um exemplo a seguir.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 38

Propriedade 62. f : R → R dada por f (x) = x2 não é uniformemente contı́nua.


1
Demonstração. Tomamos as sequências (xn ), (yn ) dadas por xn = n e yn = n + ,
n
1 1 1
tem-se lim xn − yn = n − n − = 0 e f (xn ) − f (yn ) = n − (n + 2 + 2 ) = 2 − 2 , vale
2 2
n n n
lim f (xn ) − f (yn ) = 2 ̸= 0 logo f não pode ser uniformemente contı́nua.
√ √
Outro exemplo que podemos tomar são as sequências xn = n + 1 e yn = n, daı́
1
xn − yn = √ √ →0e
n+1+ n
f (xn ) − f (yn ) = n + 1 − n = 1

que não tende a zero.

Exemplo 23. A função real dada por f (x) = ex não é uniformemente contı́nua, pois
tomamos xn = ln(n+1) e yn = ln(n), valendo lim xn −yn = 0 e f (xn )−f (yn ) = n+1−n = 1
que não tende a zero.
π π
Exemplo 24. A função f : (− , ) → R com f (x) = tg(x) não é uniformemente
2 2
π π
contı́nua pois tomando xn = artg(n + 1) e yn = arctan(n) então lim xn − yn = − = 0
2 2
e f (xn ) − f (yn ) = n + 1 − n = 1.

Exemplo 25. A função f : (0, ∞) → R com f (x) = ln(x) não é uniformemente contı́nua,
2 1
pois tomando xn = e yn = temos lim xn − yn = 0 e
n n
2 1 2n
lim f (xn ) − f (yn ) = lim ln( ) − ln( ) = lim ln( ) = ln(2) ̸= 0.
n n n

Exemplo 26. A função f : R → R dada por f (x) = sen(x2 ) não é uniformemente


contı́nua. √
1 √
Tomamos xn = (n + )π e yn = nπ, então
2

1 √ π
yn − xn = (n + )π − nπ = √ 2
√ →0
2 1
(n + 2 )π + nπ

onde acima racionalizamos a fração. Porém

1 1
f (yn ) − f (xn ) = sen((n + )π) − sen(nπ) = sen((n + )π)
2 2

e tal sequência não tende a zero.


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 39

1
Propriedade 63. A função f : [0, ∞) → R com f (x) = x p é uniformemente contı́nua.

Demonstração. Sejam (xn ) e (yn ) duas sequências em [0, ∞) tais que lim xn − yn = 0
1
então lim |xn − yn | = 0 ⇒ lim |xn − yn | p = 0, agora usamos a desigualdade
1 1 1
|a p − b p | ≤ |a − b| p

tomando a = xn e b = yn tem-se
1 1 1
|xnp − ynp | ≤ |xn − yn | p
1 1 1 1
pelo teorema do sanduı́che tem-se lim |xnp − ynp | daı́ lim xnp − ynp = 0 o que implica f ser
uniformemente contı́nua pelo critério de sequências.

Exemplo 27. Em especial a função f : [a, ∞) com f (x) = x é uniformemente contı́nua,
pelo critério de sequências.
Sejam (xn ) e (yn ) duas sequências em [a, ∞) tais que lim xn − yn = 0 então lim |xn −
1
yn | = 0 ⇒ lim |xn − yn | 2 = 0, agora usamos a desigualdade

1 1 1
|a 2 − b 2 | ≤ |a − b| 2

tomando a = xn e b = yn tem-se

1 1 1
|xn2 − yn2 | ≤ |xn − yn | 2

1 1 1 1
pelo teorema do sanduı́che tem-se lim |xn2 − yn2 | daı́ lim xn2 − yn2 = 0 o que implica f ser
uniformemente contı́nua pelo critério de sequências.

Propriedade 64 (Continuidade uniforme e sequências de Cauchy). Seja f : A → R


uniformemente contı́nua, se (xn ) é de Cauchy em A então (f (xn )) é de Cauchy.

Demonstração.

∀ε > 0 ∃δ > 0 | |x − y| < δ ⇒ |f (x) − f (y)| < ε

∀δ > 0 ∃n0 ∈ N | n, m > n0 ⇒ |xn − xm | < δ

daı́ |f (xn ) − f (xm )| < δ logo f (xn ) é de Cauchy.


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 40

Propriedade 65. Seja f : A → R uniformemente contı́nua, então para todo a ∈ A′


existe lim f (x).
x→a

Demonstração. Dada uma sequência arbitrária (xn ) em A tal que lim xn = a, tal
sequência é sequência de Cauchy, logo f (xn ) também é de Cauchy, logo convergente, pela
arbitrariedade da sequência (xn ), segue que lim f (x) existe pelo critério do limite.
x→a

Propriedade 66. Seja f : A → R contı́nua. Se A é compacto então f é uniformemente


contı́nua.

Demonstração. Suponha por absurdo A seja compacto e que f não seja uniforme-
1
mente contı́nua, então existe ε > 0 tal que ∀n ∈ N , existe xn , yn ∈ A com |xn − yn | <
n
e |f (xn ) − f (yn )| ≥ ε. Como A é compacto, existe uma subsequência (xnk )k de (xn ) tal
que lim xnk = a ∈ A pela desigualdade |xn − yn | segue também que lim ynk = a, como f
é contı́nua lim f (xnk ) = lim f (ynk ) = f (a) o que contradiz |f (xnk ) − f (ynk )| ≥ ε logo f é
k k
uniformemente contı́nua.

Propriedade 67. Se f, g : A → R são uniformemente contı́nuas, então f + g é uniforme-


mente contı́nua.

Demonstração. Dado ε arbitrário existe δ1 > 0 tal que |x−y| < δ1 ⇒ |f (x)−f (y)| <
ε ε
e δ1 > 0 tal que |x − y| < δ2 ⇒ |g(x) − g(y)| < tomando δ = min{δ1 , δ2 } segue que
2 2
ε ε
|g(x) − g(y)| < e |f (x) − f (y)| < , pela desigualdade triangular tem-se
2 2
ε ε
|g(x) + f (x) − g(y) − f (y)| ≤ |g(x) − g(y)| + |f (x) − f (y)| < +
2 2
logo f + g é uniformemente contı́nua.

Exemplo 28. f , g : R → R podem ser uniformemente contı́nuas, porém f.g ser não
uniformemente contı́nua. Como exemplo tomamos funções com lei f (x) = x = g(x) e
f (x).g(x) = x2 não é uniformemente contı́nua.

Propriedade 68. Sejam f, g : A → R limitadas e uniformemente contı́nuas, então f.g é


uniformemente contı́nua.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 41

Demonstração. Tomamos duas sequências (xn ), (yn ) em A tais que lim yn − xn = 0.


Escrevemos

f (yn ).g(yn ) − f (xn ).g(xn ) = f (yn ).g(yn ) − f (xn ).g(yn ) + f (xn ).g(yn ) − f (xn ).g(xn ) =

= [f (yn ) − f (xn )] g(yn ) + f (xn ) [g(yn ) − g(xn )] → 0


| {z } | {z }
→0 →0

pois (f (xn )) e (g(yn )) são limitadas, usamos também que f e g são uniformemente con-
vergentes e o critério de sequências. Portanto vale que lim f (yn ).g(yn ) − f (xn ).g(xn ) e daı́
f.g é uniformemente contı́nua.

Propriedade 69. Nem toda função uniformemente contı́nua é Lipschitziana.



Demonstração. Considere a função f : [0, ∞) → R dada por f (x) = x então vale
√ √
f (y) − f (x) y− x
=
y−x y−x
√ √
multiplicando por y + x tem-se
(√ √ )√ √ ( )
y− x y+ x y−x 1 1
√ √ = √ √ =√ √
y−x y+ x y−x y+ x y+ x
logo
f (y) − f (x) 1
=√ √
y−x y+ x
|f (y) − f (x)|
isso implica que não é limitada, pois quando y → 0 e x → 0 tem-se
|y − x|
|f (y) − f (x)|
→ ∞, porém f é uniformemente contı́nua.
|y − x|
Propriedade 70. Seja f : A → R uma função uniformemente contı́nua. Se A é limitado
então f é limitada.

Demonstração. Suponha por absurdo que A seja limitado e f seja ilimitada supe-
riormente então existe x ∈ A tal que f (x) > k para qualquer k natural, então podemos
construir uma sequência (f (xk )) tal que vale f (xk+1 ) > f (xk ) + 1, podemos tomar um
ponto x1 ∈ A tomando f (x1 ) e como f é ilimitada podemos escolher x2 ∈ A tal que
f (x2 ) > f (x1 ) + 1, assim definimos indutivamente a sequência (xn ), como (xn ) ∈ A é
uma sequência num conjunto limitado, então ela possui uma subsequência (xn )n∈L que
é convergente, com tal subsequência podemos definir naturalmente uma sequência (zn )
convergente em que vale a propriedade f (zk+1 ) > f (zk ) + 1, existindo lim zn = a ∈ R.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 42

Tomando a sequência (yn ) definida como yn = zn+1 , ela é uma subsequência de (zn ),
logo converge para o mesmo limite, temos então lim yn − zn = 0 e f (yn ) − f (zn ) > 1 logo
não vale lim f (zn ) − f (yn ) = 0 o que é deveria valer pois f é uniformemente contı́nua,
então chegamos num absurdo.

1
Corolário 20. A função f : (0, 1) → R, com f (x) = não é uniformemente contı́nua,
x
pois ela é definida num conjunto limitado, porém não é limitada.

Propriedade 71. Se f : A → R é uniformemente contı́nua então cf : A → R onde c ∈ R


é uniformemente contı́nua.

Demonstração. Se c = 0 a função constante é uniformemente contı́nua, caso contrário,


ε
tem-se pela continuidade uniforme de f que para existe δ > 0 tal que |x−y| < δ implica
|c|
ε
|f (x) − f (y)| < e daı́ |cf (x) − cf (y)| < ε.
|c|

Corolário 21. Dada f uniformemente contı́nua então −f também é uniformemente


contı́nua.

Propriedade 72. Se f : A → R é uniformemente contı́nua então |f | : A → R também é


uniformemente contı́nua.

Demonstração. Vale ||f (x)| − |f (y)|| ≤ |f (x) − f (y)| < ε.

Propriedade 73. Dadas f, g : A → R uniformemente contı́nuas, então h, t : A → R dada


por h(x) = max{f (x), g(x)}e t(x) = max{f (x), g(x)} são uniformemente contı́nuas.
f (x) + g(x) + |f (x) − g(x)|
Demonstração. Vale h(x) = max{f (x), g(x)} = e t(x) =
2
f (x) + g(x) − |f (x) − g(x)|
min{f (x), g(x)} = , daı́ h e g são uniformemente contı́nuas.
2

1.7 Funções contı́nuas em espaços métricos

Definição 15 (Funções contı́nuas). Sejam M e N espaços métricos. A aplicação

f :M →N
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 43

é dita contı́nua no ponto a ∈ M quando

∀ε > 0, ∃δ > 0 | dM (x, a) < δ ⇒ dN (f (x), f (a)) < ε.

Onde dM é métrica em M e dN é métrica em N .


Se f é continua em todo ponto a ∈ M , então f é dita função contı́nua.
dM (x, a) < δ significa que x ∈ B(a, δ) e dN (f (x), f (a)) < ε significa que

f (x) ∈ B(f (a), ε).

Então para que seja contı́nua, temos que ter

∀ε > 0, ∃δ > 0 | x ∈ B(a, δ) ⇒ f (x) ∈ B(f (a), ε)

∀ε > 0, ∃δ > 0 | f (B(a, δ)) ⊂ B(f (a), ε).

1.7.1 Função Lipschitziana

Definição 16 (Função Lipschitziana). f : M → N é dita função de Lipschitz se existe


c > 0 tal que
dN (f (x), f (y)) ≤ c.dM (x, y) ∀x, y ∈ M.

Propriedade 74. Toda função f : M → N de Lipschitz é contı́nua.

Demonstração. Temos que mostrar que

∀ε > 0, ∃δ > 0 | dM (x, a) < δ ⇒ dN (f (x), f (a)) < ε.


ε
Tomando δ = , se dM (x, a) < δ implica cdM (x, a) < ε, mas como a função é de Lipschitz
c
segue que dN (f (x), f (y)) ≤ cdM (x, a) < ε, daı́ vale a continuidade.

Definição 17 (Contração fraca.). Uma função f : M → N é dita contração fraca se

dN (f (x), f (y)) ≤ dM (x, y) ∀x, y ∈ M.

Assim uma contração fraca é uma função Lipschitz para c = 1, logo é contı́nua.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 44

Exemplo 29. Seja a ∈ N a função f : M → N dada por f (x) = a é uma imersão fraca,
pois dN (f (x), f (y)) = dN (a, a) = 0 e vale sempre

0 ≤ d(x, y) ∀x, y ∈ M.

Exemplo 30. Toda imersão isométrica é uma contração fraca, pois vale dN (f (x), f (y)) =
d(x, y).

Propriedade 75 (Projeção). Sejam k ∈ In , (Mk )nk=1 espaços métricos. A projeção pk :


∏n
Ms → Mk definida por pk (xs )ns=1 = xk é uma contração fraca com a métrica do máximo
s=1
para produtos cartesianos. (mostrar para outras depois)

Demonstração. Dados dois elementos do produto cartesiano x = (xs )n1 e y = (ys )n1
a distância entre eles é dada por

dc (x, y) = max{ds (xs , ys ), s ∈ In } = dv (xv , yv )

para v ∈ In e por ser máximo vale ds (xs , ys ) ≤ dv (xv , yv ) para todo s ∈ In , em particular
vale também para s = k,dk (xk , yk ) ≤ dv (xv , yv ) . Na imagem da função projeção temos
pk (x) = xk e pk (y) = yk , daı́ dk (pk (x), pk (y)) = dk (xk , yk ) mas temos que dk (xk , yk ) ≤
dc (x, y) logo a função é uma contração fraca, logo contı́nua.

Propriedade 76. Se a é um ponto isolado de M então f : M → N é contı́nua em a.

Demonstração. Temos que provar que vale

∀ε > 0, ∃δ > 0 | d(x, a) < δ ⇒ d(f (x), f (a)) < ε

como a é ponto isolado existe δ > 0 tal que o único ponto x que satisfaz d(x, a) < δ é
x = a, mas em x = a vale f (x) = f (a) daı́ ⇒ d(f (x), f (a)) = 0 < ε para qualquer ε,
então f é contı́nua em a.

1.7.2 Propriedades elementares de funções contı́nuas

Propriedade 77. A função f : M → N1 × N2 é contı́nua no ponto a ∈ M sse suas


coordenadas f1 : M → N1 e f2 : M → N2 são contı́nuas no ponto a.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 45

Propriedade 78 (Composição de funções contı́nuas). Se f : M → N é contı́nua no ponto


a e g : N → P é contı́nua no ponto f (a) então g ◦ f : M → P é contı́nua no ponto a.

Demonstração. Dado ε > 0 pela continuidade de g em f (a) temos para y ∈ N que


existe δ1 > 0 tal que
d(y, f (a)) < δ1 ⇒ d(g(y), g(f (a)) < ε

pela continuidade de f em a existe δ > 0 tal que

d(x, a) < δ ⇒ d(f (x), f (a)) < δ1

como f (x) ∈ N segue da propriedade anterior que d(g(f (x)), g(f (a)) < ε daı́

d(x, a) < δ ⇒ d(g(f (x)), g(f (a)) < ε

logo a função é contı́nua.

1.8 Homeomorfismo

Definição 18 (Homeomorfismo). Sejam M e N espaços métricos. Um homeomorfismo


de M sobre N é uma bijeção contı́nua f : M → N cuja inversa f −1 : N → M também é
contı́nua, neste caso dizemos que M e N são homeomorfos.

Propriedade 79. Se f : M → N e g : N → P são homeomorfismos então g ◦ f : M → P


é homeomorfismo.

Corolário 22. Se f : M → N então f −1 : N → M é homeomorfismo.

1.8.1 Métricas equivalentes

Definição 19. Dizemos que a métrica d1 é mais fina que d2 quando existe uma constante
c > 0 tal que
d2 (x, y) ≤ cd1 (x, y)

para todos x, y ∈ M. Nesse caso escrevemos d1 ≻ d2 .


CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 46

1.9 Continuidade uniforme em espaços métricos

Definição 20 (Continuidade uniforme). Uma função f : M → N é uniformemente


contı́nua quando

∀ε > 0, ∃δ > 0 | x, y ∈ M, d(x, y) ≤ δ ⇒ d(f (x), f (y)) < ε.

Corolário 23. Toda função f uniformemente contı́nua é contı́nua.

Definição 21 (Homeomorfismo uniforme). Uma função bijetora f : M → N é um ho-


meomorfismo uniforme quando f é uniformemente contı́nua e sua inversa f −1 também
é.

Definição 22 (Homeomorfismo uniformemente contı́nuo). Uma função bijetora f : M →


N é um Homeomorfismo uniformemente contı́nuo quando f é uniformemente contı́nua e
f −1 é contı́nua.

Propriedade 80. Se f : M → N e g : N → A são uniformemente contı́nuas então a


composta g ◦ f : M → A também é uniformemente contı́nua.

Demonstração. Como g : N → A é uniformemente contı́nua vale que ∀ε > 0 ∃δ1 > 0


tal que x′ , y ′ ∈ N ,
d(x′ , y ′ ) < δ1 ⇒ d(f (x′ ), f (y ′ )) < ε

Por f : M → N é uniformemente contı́nua tem-se que existe δ > 0 tal que

d(x, y) < δ ⇒ d(f (x), f (y)) < δ1 ⇒ d(f (g(x)), f (g(y))) < ε

logo a composição é uniformemente contı́nua.

Propriedade 81. Sejam f : M → N uniformemente contı́nua e A ⊂ M então f |A é


uniformemente contı́nua.

Demonstração. Tem-se que f |A = f ◦ g onde g : A → M dada por g(x) = x.

Propriedade 82. Se f e g de M em N são uniformemente contı́nuas, então f + g é


uniformemente contı́nua.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 47

Propriedade 83. Toda função f : M → N lipschitziana é uniformemente contı́nua.

Demonstração. Para todos x, y ∈ M vale d(f (x), f (y)) ≤ cd(x, y) para algum c > 0.
ε
Para qualquer ε > 0 podemos tomar δ = , daı́ se d(x, y) < δ , cd(x, y) < cδ = ε, logo
c
d(f (x), f (y)) ≤ cd(x, y) < ε o que implica a função ser uniformemente continua.

Definição 23 (Função de Urysohn). Dados dois conjuntos fechados disjuntos A e B num


espaço métrico M . Podemos obter uma função contı́nua f : M → [0, 1] com f (x) = 0
para todo x ∈ A e f (x) = 1 para todo x ∈ B. Chamamos tal função f de função de
Urysohn do par A, B.

Propriedade 84. Seja I ⊂ R um intervalo limitado , então toda função f : I → B


uniformemente contı́nua é limitada.

Demonstração. Como a função é uniformemente contı́nua podemos tomar ε = 1, daı́


existe δ > 0 tal que |x − y| < δ implica d(f (x), f (y)) < 1. Podemos tomar n pontos (ak )n1
dividindo o intervalo em n + 1 segmentos de comprimento menor que δ. Dados x, y ∈ I
seja k ≤ n a quantidade de pontos da primeira divisão entre x e y. Se k = 0 então x e y
estão num mesmo intervalo, daı́ |x − y| < δ implica d(f (x), f (y)) < 1. Se k ̸= 0 , existe
temos os pontos (bs )k1 (pontos da primeira divisão) entre x e y, onde b1 e x estão num
mesmo intervalo de comprimento menor que δ e y e bk estão também num intervalo de
comprimento menor que δ, e os outros pontos de ı́ndice consecutivos também (bs e bs+1 ).
Pela desigualdade triangular, temos que

d(f (x), f (y)) ≤ d(f (x), f (b1 )) + d(f (y), f (b1 ))

em geral, tem-se também

d(f (y), bs ) ≤ d(f (bs+1 ), f (bs )) + d(f (y), bs+1 )

0 ≤ d(f (bs+1 ), f (bs )) + ∆s d(f (y), bs )



k−1
tomando a soma segue
s=1


k−1 ∑
k−1 ∑
k−1
0≤ d(f (bs+1 ), f (bs ))+ ∆s d(f (y), bs ) = d(f (bs+1 ), f (bs ))+d(f (y), bk )−d(f (y), b1 )
s=1 s=1 s=1
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 48

´por soma telescópica, daı́


k−1
d(f (y), b1 ) ≤ d(f (bs+1 ), f (bs )) + d(f (y), bk )
s=1

com a primeira desigualdade, segue


k−1
d(f (x), f (y)) ≤ d(f (x), f (b1 )) + d(f (bs+1 ), f (bs )) + d(f (y), bk )
s=1

como cada uma das parcelas acima está num intervalo de comprimento menor que delta,
tem-se

k−1
d(f (x), f (y)) ≤ 1 + 1 + 1 = 1 + k − 1 + 1 = k + 1 ≤ n + 1.
s=1

Propriedade 85. Sejam A ⊂ R é um subconjunto qualquer e B ⊂ R um intervalo


limitado. Toda função monótona sobrejetiva f : A → B é uniformemente contı́nua.

Demonstração. Dado ε > 0 dividimos o intervalo B em n pontos interiores (yk )n1


ε
crescentes, (logo temos n + 1 intervalos) de comprimento menores que . Suponha f
2
crescente. Como f é sobrejetora, , para cada yk ∈ B existe xk ∈ A tal que f (xk ) = yk ,
por f ser crescente, é garantido que (xk )n1 é crescente. Definimos δ como o menor dos
números ∆xk = xk+1 − xk . Se temos x, y ∈ A tais que |x − y| < δ então entre x e y existe
no máximo um dos pontos xk . Como f é monótona, entre f (x) e f (y) existe no máximo
um dos pontos xk = f (yk ) daı́ |f (x) − f (y)| < ε.

Corolário 24. Se f : I → R é contı́nua , monótona e limitada então ela é uniformemente


contı́nua. Pois f (I) = B é um intervalo, limitado pelo fato da função ser limitada, sendo
intervalo pelo fato da função ser contı́nua, implicação do T V I.

Exemplo 31. f pode ser uniformemente convergente e não ser lipschitziana. Por exemplo

a função f : [0, ∞) → [0, ∞) dada por f (x) = x.

Corolário 25. Qualquer homeomorfismo de R sobre um intervalo limitado é uniforme-


mente contı́nuo.

n
Propriedade 86. Uma função f : M → Nk é uniformemente contı́nua sse cada uma
k=1
das suas coordenadas for uniformemente contı́nua.
CAPÍTULO 1. FUNÇÕES CONTÍNUAS 49

Propriedade 87. Sejam (Ek )n1 espaços vetoriais normados com n ≥ 2. Uma aplicação

n
n-linear f : Ek → f é uniformemente contı́nua sse é identicamente nula.
k=1

Propriedade 88. Se o espaço M tem a métrica zero-um, então toda aplicação f : M → N


é uniformemente contı́nua.

Definição 24 (Métricas uniformemente equivalentes). Dadas duas métricas d1 e d2 no


mesmo conjunto M , definimos M1 = (M, d1 ) e M2 = (M, d2 ).
As métricas d1 e d2 são uniformemente equivalentes sse a aplicação identidade i :
M1 → M2 for um homeomorfismo uniforme.

Propriedade 89. Se existem constantes c > 0 e b > 0 tais que vale

cd1 (x, y) ≤ d2 (x, y) ≤ bd1 (x, y)

∀x, y ∈ M , então as métricas d1 e d2 são uniformemente equivalentes.



n
Exemplo 32. No produto cartesiano M = Mk , as três métricas usuais são uniforme-
k=1
mente equivalentes.

Exemplo 33. Se duas métricas d1 e d2 provêm de normas em E, então elas são equiva-
lentes sse são uniformemente equivalentes.

Propriedade 90. Sejam f : M → N e sequências (xn ), (yn ) em M . f é uniformemente


contı́nua sse lim d(xn , yn ) = 0 implica lim d(f (xn ), f (yn )) = 0.

Você também pode gostar