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Grupo II

Perante o caso do Grupo II, teremos de – incontornavelmente – nos debruçar sobre


as matérias referentes ao regime da menoridade, em especial os requisitos para a validade
dos negócios efetuados por menores de 16 anos e, subsequente anulação e; o regime do
maior acompanhado e a capacidade de autodeterminação do benificiário para a aceitação de
uma doação.

Primeiramente, tratemos de saber se os pais de Ana podiam ou não recusar o prémio


de EUR 500,00 que a filha ganhou por fazer parte da vitoriosa equipa de voleibol da escola.

Efetivamente, o regime da menoridade é de grande elasticidade porque reconhece


ao menor a capacidade para realizar atos. Porém, a lei faz as suas restrições nos art. 127º
nº1, al. B) pressupondo cumulativamente:

(i) Que se trate de um negócio jurídico próprio da vida corrente do menor;


(ii) Que o negócio esteja ao alcance da sua capacidade natural e;
(iii) Que o negócio só implique uma despesa ou disposição de bens de pequena
importância.

Dada esta flexível concretização, os requisitos terão de ser examinados casuisticamente


dependendo da idade, maturidade e condições socioeconómicas concretas de cada menor.

No art. 127º CC, o legislador estabelece um limite mínimo de idade – 16 anos – para
a validade dos atos de administração ou disposição de bens que o menor haja obtido por seu
trabalho. No entanto, deveremos, neste sentido, ter em atenção a exceção do art 68º CT nº3:

“O menor com idade inferior a 16 anos que tenha concluído a escolaridade obrigatória ou
esteja matriculado e a frequentar o nível secundário de educação pode prestar trabalhos
leves que consistam em tarefas simples e definidas que, pela sua natureza, pelos esforços
físicos ou mentais exigidos ou pelas condições específicas em que são realizadas, não
sejam suscetíveis de o prejudicar no que respeita à integridade física, segurança e saúde,
assiduidade escolar, participação em programas de orientação ou de formação,
capacidade para beneficiar da instrução ministrada, ou ainda ao seu desenvolvimento
físico, psíquico, moral, intelectual e cultural”.

A propósito, podemos incluir a prática extracurricular de Ana como sendo de


natureza definida – voleibol – mas, ademais, não só não é uma atividade suscetível de
prejudicar o seu “(…) desenvolvimento físico, psíquico, moral, intelectual e cultural (…)”,
como acaba por favorecê-lo – atendendo aos benefícios da prática desportiva.

Segundo os dados facultados pelo caso, os pais terão consentido que Ana
participasse nos torneios, não havendo menção a nenhum rapto da menor a fim de a levar
para o estrangeiro para realizar uma competição internacional. A este propósito, o art.
125º CC determina que “os negócios relativos ou praticados no exercício de profissão, arte
ou ofício são válidos, desde que o menor tenha sido autorizado a exercer essa profissão, arte
ou ofício”.
Desta forma, acabamos por recair sobre o art. 70 nº3 CT: “O menor tem
capacidade para receber a retribuição, salvo oposição escrita dos seus representantes
legais”. Neste âmbito, sabemos que os pais da jovem para além de aterem deixado
participar nas competições, não se opuseram de forma escrita a qualquer retribuição,
aliás apenas “(…) recusam os EUR 500,00 (…)”.

Por outro lado, se assumíssemos que o treinador teria dado o montante a Ana,
apesar de saber e haver oposição escrita dos pais desta, então, constituiria uma
“contraordenação grave (…)”, de acordo com o Nº6 do art. 70º CT.

Efetivamente, torna-se relevante a audição da menor a fim de expressar a sua


vontade, dado que, em vista do seu desenvolvimento psicológico, biológico e social – que
se tem entendido atingido a partir dos doze anos – depreende-se uma maturidade bastante
para participar ativamente no processo que tanto lhe diz respeito: o que fazer com o prémio
monetário ganho pelo seu esforço desportivo. Neste sentido, os pais terão de moderar a
sua vontade, por ex. abrindo uma conta poupança. Conquanto, parece-nos um pouco
arbitrária e radical a entrega total do montante.

Por outro lado, o suprarreferido requisito para a efetuação de negócios por menores,
assenta a tónica no pressuposto que estes sejam normais na vida de um menor na idade
daquele que o efetuou. Assim sendo, só pode ser tido como próprio da sua vida corrente o
negócio que esteja ao alcance da sua capacidade natural e não envolva o dispêndio de
quantias importantes.

Por conseguinte, sustentamos que a compra de um Kayak Y por EUR 650,00 não
se coadunaria como um negócio da vida corrente por se tratar de um valor avultado
quando desembolsado por uma menina de 14 anos de classe média – presunção nossa.

Deste modo, no exercício das responsabilidades parentais e estarem –


presumidamente – de acordo, os pais de Ana têm legitimidade para pedir a anulação
deste negócio de compra do Kayak Y. Evidentemente, estão dentro do prazo de início de
contagem para anulação: a partir da data do conhecimento do ato até a maioridade ou
emancipação da filha (por força do art. 125º CC).

De outro modo, o art. 126º CC determina que “não tem direito de invocar a
anulabilidade o menor que para praticar o ato tenha usado de dolo com o fim de se fazer
passar por maior ou emancipado”. Portanto, o ordenamento jurídico tutela primeiramente a
confiança de terceiros de boa fé quando contra estes tenha sido usado dolo, fazendo-se
passar por maior ou emancipado. Não sendo tal indicado no enunciado, refrearemos
dilações.

No entanto, surge pertinente saber se, igualmente, poderiam os pais de Ana requer a
anulação dos negócios referentes à venda da medalha por EUR 100,00 e da hoodie por
EUR 50,00, respetivamente a Hugo de 17 e Rita de 12 anos.
Para isso, reiteramos os preceitos de validade – constantes art. 127º nº1, al. B) CC –
que se revelam imprescindíveis no ordenamento jurídico, uma vez que sem eles a vida
diária seria impraticável: o negócio deve ser de carácter normal e corrente na vida de um
menor daquela idade e a disposição de bens deverá ser de pouca importância.

Sem dúvida, na ótica de Ana, a venda de uma camisola por EUR 50,00 e de uma
medalha por EUR 100,00 seria tratar de valores de pouca importância, para além de que
os atos à venda relativos são devidos à disposição de bens adquiridos pelo seu
“trabalho” – na senda do abordado em parágrafos atrás.

Com isto, culminamos com a acessão que, pela vontade dos pais de Ana, não
seriam anuláveis os negócios de venda da medalha e da hoodie. Por outro lado, tal já
seria possível se da ótica dos representantes legais de Rita nos referíssemos – que por não
ser pedida no enunciado, a esta nos coibiremos.

Por fim, atentemos na pretensão dos pais de João (25 anos), beneficiado pelo
regime de maior acompanhado, para a devolução a camisola doada ao filho. Temos
conhecimento que os pais possuem administrar a totalidade dos seus bens (art. 145º nº2-c)),
mas que implicações tem para a aceitação de uma doação? Vejamos.

Em primeiro lugar, este regime está circunscrito à área patrimonial, correspondente


a uma verdadeira medida de substituição, mas que, todavia, não implica que se afaste a
possibilidade de o beneficiário atuar de forma paralela ou complementar, no âmbito da
sua concreta capacidade remanescente. Conforme enunciado, João “padece de uma doença
grave que lhe afeta a audição e a fala”, nada do foro psíquico.

Assim sendo, será necessário saber qual seria a vontade imperiosa do jovem em
relação à receção da hoodie, em conjunto com a ponderação do interesse. Outrossim, deverá
ser salvaguardada a vontade quando o interesse a tal não se tornou um obstáculo. Com
efeito, a autorização dos pais de João servirá somente para moderar a vontade, no caso
em que não há uma carência absoluta de autodeterminação.

De facto, estamos perante uma doação que não contêm quaisquer cargos – uma
doação pura – consequentemente, de acordo com o disposto no artigo 951º do Código
Civil, as doações puras feitas a pessoas que não têm capacidade para contratar produzem
efeitos independentemente de aceitação em tudo o que beneficie aos donatários. Desta
forma, não haverá necessidade de aceitação pelos pais do jovem.

Em suma, consideramos Ana capaz de receber o valor monetário do prémio do


torneio, por não ter havido oposição escrita dos seus pais. Consequentemente, serão válidos
os atos de administração ou disposição de bens que Ana obteve na competição,
especialmente as hoodies e a medalha. Porém, o contrato de compra do Kayak Y poderá ser
anulado por não se coadunar com o requisito um negócio da vida corrente, em razão do seu
valor avultado. Por último, os pais de João não poderão devolver a hoodie sem (i) terem em
mente a vontade e o interesse do filho e, (ii) por se tratar de uma doação pura.

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