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Anais do 44º Congresso Brasileiro de Cerâmica 30801

31 de maio a 4 de junho de 2000 - São Pedro – S.P.

PROPRIEDADES ELÉTRICAS EM CERÂMICAS SUPERCONDUTORAS

L. A. A. Pereira , V. Soares, M. C. S. Nóbrega e R. Nicolsky

COPPE/UFRJ, Caixa Postal 68505 - Ilha do Fundão, CEP: 21945-970, Rio de Janeiro-
RJ, Brasil, Fax: (021) 290-6626. E-mail: americo@metalmat.ufrj.br

COPPE/UFRJ Programa de Engenharia Metalúrgica e de Materiais


Instituto de Física — UFRJ

RESUMO

Aplicações tecnológicas de cerâmicas supercondutoras em sistemas elétricos, tais


como cabos de transmissão, motores e geradores, fazem uso das elevadas densidades
de corrente elétrica por elas transportadas. Estas cerâmicas também possuem um
grande potencial para aplicações em sistemas eletrônicos e em levitação magnética . A
produção de cerâmicas supercondutoras que resultem em amostras com contornos
entre grãos de baixo ângulo e menor porcentagem de material isolante entre grãos é
de crucial importância para a otimização das propriedades de transporte elétrico
nesses materiais. Neste trabalho medidas elétricas em conjunto com técnicas de
microscopia eletrônica foram empregadas como ferramentas para compreender os
processos de transporte destas cerâmicas supercondutoras. Foram feitas medidas
elétricas em pequenas barras secionadas de um cilindro supercondutor de YBCO
produzido pelo processo de texturização por fusão. Relações entre microestrutura e
propriedades de transporte de corrente elétrica nesses materiais foram discutidas.

Palavras-Chaves: Cerâmicas Supercondutoras, propriedades de transporte,


microestrutura

INTRODUÇÃO

Materiais cerâmicos supercondutores possuem um grande potencial para aplicações


em sistemas elétricos, eletrônicos e em levitação magnética. Pela sua capacidade de,
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sob condições apropriadas, transportar correntes elétricas com resistências


praticamente nula, os supercondutores podem ser utilizados para a produção de fios
para redes de distribuição de energia elétrica e para enrolamentos de motores e
(1),
geradores. Dispositivos eletrônicos supercondutores, tais como junções Josephson,
(2)
podem ser utilizados em osciladores, misturadores, geradores de sinais ou
elementos computacionais para regimes de trabalho em baixas temperaturas. , (3), (4), (5)
Pela sua natureza diamagnética, pastilhas supercondutoras podem ser utilizadas em
sistemas de levitação magnética, tais como mancais, e em sistemas de transporte de
carga ou passageiros.
O principal problema a ser solucionado para a viabilidade da aplicação destas
cerâmicas supercondutoras é o baixo valor da corrente elétrica transportada por
amostras policristalinas. Apesar da corrente elétrica ser elevada (10 5 A/cm2) em
monocristais supercondutores, ela é muito reduzida entre grãos adjacentes devido aos
contornos entre grãos de alto ângulo e a presença de fases não supercondutoras.
O processo de texturização por fusão, (6) o qual consiste na fusão da pastilha
supercondutora em elevadas temperaturas (maiores do que 1000 0C e seguido de
resfriamento lento), produz amostras supercondutoras com grãos supercondutores da
ordem de centímetros e bem alinhados entre si. Isto reduz o número e o ângulo dos
contornos entre grãos, aumentando o valor da corrente elétrica por elas transportadas.
Neste trabalho é estudado o transporte de corrente elétrica em pequenas barras
supercondutoras obtidas a partir de um cilindro supercondutor de YBa 2Cu3O7-x (YBCO)
(7)
produzido pelo processo de texturização por fusão.

MATERIAIS E MÉTODOS

Do cilindro supercondutor foram cortadas pequenas barras, utilizando-se um disco


diamantado, em diferentes alturas ao longo do eixo do cilindro. As amostras 1 e 2 são
resultantes da subdivisão de uma barra à metade, assim como as amostras 3 e 4. No
total foram produzidas seis amostras cujas dimensões são mostradas na Tabela I.
A caracterização elétrica foi feita pelo método padrão de medidas de quatro pontas. Os
contatos elétricos nas amostras foram feitos com cola prata para a medida da voltagem
em função da corrente aplicada. As medidas elétricas foram realizadas em temperatura
ambiente e em nitrogênio líquido (77 K).
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A partir das amostras foram fabricadas as junções, através da redução progressiva da


largura da região situada entre os contatos destinados à medida da voltagem, como
esquematizado na Figura 1.
Para cada largura da junção mediu-se os valores das voltagens em temperatura
ambiente e em nitrogênio líquido. As resistências das amostras e das respectivas
junções foram calculadas a partir dos valores das correntes e das voltagens.

Tabela I: Dimensões e resistência elétrica das amostras cortadas do cilindro


supercondutor.

Amostra Largura Altura Comprimento Resistência


(mm) (mm)
(mm) ()
1 4,15 1,00 11,4 0,12
2 4,10 1,45 10,8 0,13
3 4,00 1,45 11,4 0,06
4 4,15 1,00 6,20 0,06
5 4,25 1,00 7,65 0,10
6 4,00 0,60 6,80 0,07

A largura das junções 2 e 3 foram diminuídas para cerca de 0,75 mm e a altura para
cerca de 0,2 mm. Novas medidas da voltagem em temperatura ambiente e em 77 K
foram realizadas. Os valores das resitências calculadas a partir dos dados obtidos em
temperatura ambiente são mostrados na Tabela II.
Tabela II: Resistências a temperatura ambiente calculadas para as junções 2 e 3.

Junção Resistência () Área (mm2)


2 0,73 0,15
3 5,89 0,15
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Figura 1: Representação esquemática da junções, para uma dada largura.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

As amostras 1 e 2 foram produzidas a partir da subdivisão de uma barra cortada


perpendicularmente ao eixo do cilindro supercondutor, o mesmo ocorrendo para as
amostras 3 e 4. A partir desse fato e da Figura 2 podemos ver que, com a diminuição
da seção reta, a variação da resistência das amostras 3 e 4 é mais acentuada do que
para as amostras 1 e 2.
Outro fato que pode ser observado é que as diferença entre as resistências das
amostras 3 e 4 é praticamente nula para as diferentes dimensões da seção reta, sendo
que o mesmo não ocorre para as amostras 1 e 2, a resistência da amostra 1 apresenta
um crescimento mais acentuado do que a da amostra 2. Os valores das resistências
das junções produzidas a partir das amostras 1 e 2, as quais possuem dimensões
muito similares, mostraram-se muito diferentes (ver Tabela II) , sendo de
aproximadamente 0,73 para a amostra 2 e de 5,89  para a amostra 3.
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4.0

Resistência da junção/Resistência da amostra


T = 300 K amostra 1
amostra 2
3.0 amostra 3
amostra 4

2.0

1.0

0.0
0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
Área da seção da junção/Área da seção da amostra

Figura 2: Gráfico da resistência versus área da seção reta

As curvas características da corrente versus voltagem (CVC) obtidas em temperatura


de nitrogênio líquido são representadas na Figura 3.

120

T = 77K
100

80
corrente I (mA)

junção 2
60

40 junção 3

20

0
0 5 10 15 20 25 30 35 40

voltagem V(mV)

Figura 3: Curva característica da corrente versus voltagem (CVC) das junções 2 e 3


obtidas em temperatura do nitrogênio líquido.
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Micrografias de regiões do cilindro supercondutor produzidas através de microscopia


eletrônica de varredura (MEV) foram obtidas para o estudo da microestrutura. Elas são
mostradas nas Figuras 4 e 5.

Figura 4: Micrografia de uma região fraturada do supercondutor mostrando o


empilhamento dos grãos supercondutores ao longo do eixo do cilindro.

Figura 5: Micrografia perpendicular ao eixo do cilindro supercondutor, na qual é


possível observar a presença de fases não supercondutoras.
As curvas características da corrente versus voltagem das junções 2 e 3 (Figura 3),
obtidas a partir de medidas realizadas em nitrogênio líquido, mostram que essas
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junções possuem naturezas diferentes. A CVC da junção 2 possui um aspecto típico de


uma junção SNS,(8), ( 9 ), (10) enquanto a CVC da junção 3 parece ter uma natureza tipo
ôhmica.
A amostra é constituída em sua maior parte por regiões supercondutoras, sendo que
outras fases aparecem apenas em regiões isoladas (Figura 5) , à medida que se
diminui a seção reta da constrição há uma maior probabilidade dessa região ser
supercondutora, o que explicaria o fato das resistências das junções diferirem pouco
entre si. Entretanto, à medida que se diminui ainda mais a seção reta, pode-se
aleatoriamente isolar uma característica microestrutural — como, por exemplo, uma
fase não supercondutora, um poro, uma microtrinca etc. — de tal maneira que a
passagem da corrente pela constrição é bastante prejudicada. Isto explicaria a
diferença entre os valores das resistências em temperatura ambiente e também da
CVC das junções 2 e 3.
Apesar de técnicas de preparação produzirem pastilhas supercondutoras com altas
temperaturas de transição e elevadas densidades de corrente elétrica, é importante ter
em mente que o material possui uma microestutura bastante diversificada,
apresentando regiões não supercondutoras, poros etc. Em determinadas aplicações,
onde o supercondutor é submetido a um campo magnético externo, os defeitos e
imperfeições do material são benéficos, pois eles funcionam como centro de
aprisionamento de fluxo de campo magnético. Este processo reduz a dissipação
causada pelo movimento desses fluxos na presença de uma corrente elétrica (força de
Lorentz).

CONCLUSÕES

Junções do tipo ponte fabricadas a partir de um mesmo bloco supercondutor podem


apresentar curvas características bem diferentes, dependendo da microestrutura da
região selecionada para a confecção da constrição. O controle destas características é
altamente relevante para a fabricação de junções cerâmicas supercondutoras como
dispositivos eletrônicos, tendo em vista a reprodução de suas propriedades elétricas.

REFERÊNCIAS
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1. B. D. Josephson, Phys. Lett., 1 (1962) 251.


2. K. K. Likharev, Dynamics of Josephson Junctions and Circuits, Gordon and
Breach Science Publishes, Filadelfia (1991).
3. A M. Luiz and R Nicolsky, IEEE Trans. on Appl. Sup., 3 (1993) 2714 .
4. A. M. Luiz and R Nicolsky, IEEE Trans. on Magnetics, 27 (1991) 2712.
5. V. Soares, A. M. Luiz and R. Nicolsky, IEEE Trans. on Magnetics, 35 (1999)
4100.
6. K. Salama and D. Lee, Supercond. Sci. Technol., 7 (1994) 177.
7. IPHT — Institut für Physikalische Hochtechnologie, Jena, Germany.
8. D. E. McCumber, J. Appl. Phys., 39 (1968) 3113.
9. G. Alvarez, K. N. R. Taylor e G. J. Russel, Physica C, 165 (1990) 285.
10. L. A. A. Pereira and R. Nicolsky, PhysicaC, 282-287 (1997) 2411.

SUPERCONDUCTING CERAMICS: PROPERTIES AND APPLICATIONS

ABSTRACT

Technological applications of superconducting high critical temperature ceramics in


electric systems — like transmission cables, motors and generators —, make use of
high current densities, carried by them. These ceramics also have a large potential for
electronic and magnetic levitation applications. The superconducting ceramics
manufactured with low angle grain boundaries and very few dielectric materials between
the grains are very important to optimize the electric transport properties of these
materials. In this work electric measurements and electronic microscopy techniques
were used to understand the superconducting transport process in these ceramics. The
electric measurement was made in one type of microbridge built on YBCO
superconducting cylindrical samples prepared by top seed melt texturing process.
Relationship between microstructure and electric current and transport properties in
these materials are discussed.

Key words: Superconductor ceramics, transport properties, microstructure.

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