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Ensaio HRIC Segundo semestre /2017

Universidade de Brasília
Prof. Pio Penna Filho Ensaio III
Melissa Fernanda Ribeiro Vale Matrícula: 160138744
A influência dos EUA na eclosão da guerra do Irã contra o Iraque

O Irã foi palco de uma revolução islâmica xiita no final da década de 1970 (que durou de
janeiro de 1978 até fevereiro de 1979). Na ocasião, as massas instituíram uma república
teocrática, com bases no Islã e reintroduziram costumes considerados conservadores para os
padrões ocidentais. Muito provavelmente, é sensato raciocinar que este foi o início da política
do fundamentalismo islâmico radical. A própria história do Irã, oficialmente República
Islâmica do Irã, ajuda a compreender as razões que levaram ao levante.
Primeiramente, o país citado foi um dos raros territórios de população de caráter
majoritariamente muçulmano que teve êxito em manter a autonomia política no fim do século
XIX. No século posterior, estabeleceu uma certa institucionalidade política constitucional,
incluindo uma parcela significativa da população (CORDIOLLI, 2009).
Durante a Guerra Fria, especialmente durante as décadas de 1950 e 1960, a região do
Oriente Médio passou a ser estratégica nas Relações Internacionais. Tendo em vista esse
contexto, a República Islâmica do Irã aliou-se aos Estados Unidos, tornando-se um relevante
agente do capitalismo na área em que se encontrava. Encantada com o prestígio político no
ocidente e enriquecida com o comércio de petróleo, a realeza iraniana 1 implementou pesadas
medidas de ocidentalização cultural, além de ostentar sua riqueza em um país em que a
maioria da população era pobre.
Esses aspectos, contudo, não foram suficientes para criar um clima de insurreição.
Inicialmente, os intelectuais promoviam leituras de textos críticos ao Instituto Goethe do
Teerã e os religiosos não se manifestavam. Em 3 de novembro de 1977, o filho de Ruhlloh
Khomeini, morre envenenado do Iraque (suspeita-se de que a Savak, serviço de inteligência
Real do Irã, tenha sido responsável). Multidões choraram a morte de Mustafá, mas ainda
assim não havia indícios de que uma revolução estava próxima. No dia 13 de novembro,
Pahlevi viajou aos Estados Unidos onde se encontrou com o então presidente Jimmy Carter.
Na virada de 1977, Carter visitou o Teerã em um momento delicado culturalmente. O xá

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Em 1962, o então xá Mohammed Reza Pahlavi anunciou a “Revolução Branca”. Era baseada principalmente no
capitalismo de Estado, na abolição das formas semifeudais de distribuição de renda e na popularização do
ensino. O xá cortejava os interesses dos Estados Unidos e apoiava o Estado de Israel, obtendo dessa forma apoio
do Ocidente, que o recompensava com investimentos no Irã, portanto contribuindo para com a economia. A
população iraniana não ficou satisfeita, pois era favorável a causa palestina (TRAUMANN, 2002).
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havia acabado de proibir manifestações de luto por Mustafá (segundo a tradição xiita, deve
ocorrer 40 dias após a morte do indivíduo). Por viajar para o Irã nessas circunstâncias para
apoiar o xá, a população local passou a enxergar Carter como inimigo. Os iranianos
questionavam, pensamento este que compartilho, como um presidente que se apresentava
cristão poderia dar suporte a um governante que reprimia e torturava seu povo, até em
momentos de luto.
O estopim da Revolução foi quando, no início de 1978, o xá espalhou panfletos que
acusavam Khomeini de trabalhar para o Serviço Secreto Inglês (o que não tem lógica) e
questionavam a sua integridade moral (TRAUMANN, 2002). A oposição ao regime
autoritário da Dinastia Pahlavi foi hegemonizada pelos fundamentalistas xiitas. Em 1979,
liderados pelo aiatolá Ruhlloh Khomeini e apoiados por ampla mobilização social, os
revolucionários radicalizaram as suas posições ideológicas, derrubaram a monarquia,
instituíram a república islâmica e organizaram a sociedade e o Estado com elementos
teocráticos conservadores2 (CORDIOLLI,2009).
A vitória da revolução xiita no Irã foi uma derrota política para o Ocidente, em especial os
Estados Unidos. Tendo em vista que a monarquia destituída era favorável aos interesses do
Ocidente, defendo a tese de que os EUA, como uma forma de represália, financiaram o ataque
militar do Iraque ao Irã. As ameaças dos Estados Unidos da América, entretanto, acabaram
por reforçar o regime xiita, que foi se tornando cada vez mais radical como uma resposta ao
modo de vida e imposições ocidentais. O Irã pós-revolução passou a convidar outros povos
islâmicos à Guerra Santa contra os ocidentais e cristãos. Frente a tal cenário, a guerra contra o
Iraque (de 1980 até 1988) pode ser entendida como uma possibilidade de expansão da
ideologia da revolução xiita, pois assim como no Irã, a população iraquiana apresenta um
grande número de xiitas. Destaco que parte dos iraquianos passaram um período considerável
da guerra lutando contra Saddam Hussein3(ZANONI, 2014).
Gostaria de ressaltar o fato de que os Estados Unidos, nos anos de 1980, tentaram conter a
expansão da revolução xiita, fortalecendo movimentos sunitas nos países vizinhos. Apoiaram
o governo ditatorial de Sadam Hussein no Iraque e a guerrilha sunita fundamentalista do
Taleban, no Afeganistão, que lutava contra a ocupação soviética. Estes dois agentes políticos,
anos depois, rebelaram-se contra os Estados Unidos, seus antigos financiadores
(CORDIOLLI,2009).

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As mulheres foram forçadas a serem submissas aos homens e a cobrir o corpo todo com o shador, além de
outras obrigações.
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Os Estados Unidos da América apoiavam o Saddam Hussein na Guerra Irã x Iraque;
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O processo iniciado em 1979 com a Revolução Iraniana foi um momento de ruptura em
relação a política interna e externa e ao posicionamento do Irã no sistema internacional, tendo
em vista que ao assumir um governo com um posicionamento independente, e com um
sistema de governo de caráter religioso, o país passava a representar uma ameaça a muitos
atores regionais que se alinhavam com as potências ocidentais, como por exemplo o Iraque. É
possível perceber, desse modo, a relevância do conflito com o Iraque entre 1980 e 1988 como
essencial para o sustento do novo governo de Teerã e consolidação do papel do Irã como uma
potência regional de atuação autônoma no oriente médio, sendo fundamental para a
compreensão das dinâmicas de poder na região.
Após a revolução iraniana, o modelo político xiita encontrou expressivo número de
simpatizantes no Líbano e no Iêmen, países com significativa população xiita. A revolução
também serviu de modelo para o fundamentalismo sunita, que também, da mesma forma,
radicalizou as suas posições e participou da guerra santa contra os Estados Unidos, liderados
por Osama Bin Laden e a organização Al-Qaeda ( CORDIOLLI, 2009).
Concluo que o conflito entre os EUA e o fundamentalismo radical islâmico almejava
atingir dois interesses. O primeiro relacionado a ameaça norte-americana, que seria o seu
combustível mobilizador; e o segundo, o próprio fato de que os EUA fizeram e ainda fazem
do crescimento do radicalismo islâmico a sua justificativa para manter os gastos militares.
          
“Revoluções são como febre”
- Crane Brinton, professor da Universidade de Harvard em 1965
Bibliografia:

CORDIOLLI,Marcos.REVOLUÇÃO XIITA E CONTRADIÇÃO NORTE


AMERICANA. Artigo publicado na edição nº 402, jornal Mundo Jovem, 2009. Acesso em
<http://www.pucrs.br/mj/artigo-revolucao-xiita-e-a-contradicao-norte-americana.php >
02/12/2017

TRAUMANN, Andrew P. TURBULENCIA NO ORIENTE MÉDIO: COMO A


REVOLUÇÃO IRANIANA DE 1979 FOI RETRATADA PELA MÍDIA IMPRESSA
BRASILEIRA. Revista Urutaguá, quinta edição, 2002. Acesso em <
file:///C:/Users/melis/Pictures/Saved%20Pictures/17pol_traumann%20(1).pdf > 02/12/2017

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KARSH, Efraim, The Iran Iraq War 1980-1988, Reino Unido, Osprey Publishing, 2002

WORKMAN, Thom. THE SOCIAL ORIGINS OF THE IRAN-IRAQ WAR. Centre for
International and Strategic StudiesYork University, Ontario, mar 199, Disponível em:
http://yciss.info.yorku.ca/files/2012/06/WP05-Workman.pd . Acesso em: 02/12/2017

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