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A LVIN T OFFLER
E XPO MANAGEMENT 2003 Alvin Toffler
E X ATA M E N T E O Q U E É U M A S O C I E DA D E DE
I N F O R M A Ç Ã O DA T E RC E I R A O NDA ?
A
Primeira Onda de mudanças, sos deslocamentos sociais, culturais, ins-
inaugurada pela revolução agríco- titucionais, morais e políticos. A Terceira
la há 10 mil anos, provocou a tran- Onda ajuda-nos a explicar por que tantas
sição do sistema de caça e coleta para as instituições da era industrial – das gran-
grandes sociedades campesinas do passa- des corporações aos governos – torna-
do. A Segunda Onda de mudanças, provo- ram-se dinossauros prestes a dar o último
cada pela Revolução Industrial há cerca suspiro. É por causa dela que os Estados
de trezentos anos, engendrou uma nova Unidos enfrentam crises simultâneas em
civilização baseada em organizações fa- todas frentes – desde o sistema educacio-
bris. Ela ainda está se disseminando em nal, de saúde e familiar, até o sistema
algumas partes do mundo, pois centenas judiciário e político. Esses sistemas foram
de milhões de camponeses, desde o Mé- concebidos para funcionar numa socie-
xico até a China, continuam chegando às dade industrial de massa, mas nos Esta-
cidades em busca de empregos pouco espe- dos Unidos esse tipo de sociedade já fi-
cializados nas linhas de montagem das cou para trás.
fábricas. Movido pela competição global e por
Porém, ao mesmo tempo em que a outros fatores, os Estados Unidos estão
Segunda Onda se desenrola no cenário hoje completando a transição de uma
mundial, os Estados Unidos e outros paí- nação da Segunda Onda, com uma econo-
ses já estão sentindo o impacto de uma mia enferrujada de chaminés e linhas de
gigantesca Terceira Onda, baseada em par- montagem, para uma economia e siste-
te na substituição na economia da força ma social esguios, informatizados e den-
braçal pela economia da força mental. sos de informações e meios de comunica-
Contudo, a Terceira Onda diz respeito ção – que, surpreendentemente, possuem
a mais do que apenas tecnologia e econo- muitas das características do passado pré-
mia. A transição de uma economia basea- industrial. Empurrados pela Terceira
da na força bruta para uma baseada na Onda da história, estamos criando uma
força cerebral é acompanhada de doloro- nova civilização.
Veja nas páginas seguintes as diferenças en-
© Copyright de Alvin e Heidi Toffler. tre a Segunda Onda e a Terceira Onda.
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Sistema Econômico
ERA DA SEGUNDA ONDA ERA DA TERCEIRA ONDA
1650–1955, aproximadamente 1955–?
Fatores de Produção
Terra, mão-de-obra, capital. Informação/conhecimento adequados
substituem todos os demais fatores.
Capital
Baseado em bens tangíveis Cada vez mais baseado em bens intangíveis
(exemplo: Bethlehem Steel). (exemplo: Microsoft).
Recurso escasso. Essencialmente ilimitado.
Moeda
Ouro, notas etc. Eletrônica, digital.
Estado detém monopólio de emissão. Emissores privados multiplicam-se. Moedas
alternativas surgem na Internet e em outros
lugares.
Trabalho
Trabalho físico predomina. Trabalho de conhecimento predomina.
Rotineiro, repetitivo, fundamentalmente Mais criativo, menos intercambiável.
intercambiável.
Lotes de produção. Horário fixo. Fluxo contínuo. Ininterrupto (24 horas).
Em fábricas e escritórios. Em casa, no carro, no avião etc.
Inovação
Intermitente. Constante.
Escala
Predomínio de grandes empresas e grandes As pequenas empresas e pequenas unidades
unidades de trabalho. de trabalho são mais importantes.
Organização
Vertical. Burocrática, rígida, duradoura. Virtual. Antiburocrática. Em forma de rede.
Flexível. Tarefas ad hoc.
Infra-Estrutura
Ênfase no transporte. Ênfase na comunicação.
(Ruas, estradas, pontes, portos.) (Sistema neural eletrônico baseado em
redes superinteligentes.)
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Sistema Social
ERA DA SEGUNDA ONDA ERA DA TERCEIRA ONDA
1650–1955, aproximadamente 1955–?
Indivíduo
Produção, distribuição, educação, mídia e Produção, distribuição, educação, mídia e
entretenimento massificados criam entretenimento desmassificados criam
sociedade de massa altamente homogênea. sociedade desmassificada altamente
A individualidade é suprimida. heterogênea.
A individualidade é incentivada.
Família
Família despojada de funções como Trabalho e outras funções-chave retornam
educação, saúde, cuidar do idoso etc. O ao lar – educação, compras, assistência à
trabalho é transferido para fora do lar. saúde, cuidados com os idosos e serviços
bancários por computador.
Sociedade Civil
Enfraquecida à medida que as funções do Fortalecida à medida que as funções do
governo se multiplicam. governo são reduzidas.
População
Altamente urbanizada. Cada vez mais pós-urbana.
Cidades gigantescas, onde estão os Os centros das cidades se esvaziam à
empregos. medida que os empregos se dispersam
geograficamente.
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Sistema Político
ERA DA SEGUNDA ONDA ERA DA TERCEIRA ONDA
1650–1955, aproximadamente 1955–?
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O E S TA D O A TUAL DA R E VO L U Ç Ã O D I G I TAL –
UM M O M E N TO M A RC A N T E NA H I S T Ó R I A
T
rês eventos inter-relacionados tor- quelas semanas deram nova vida à dis-
naram a primavera de 2000 um cussão que fazia muito tempo vinha se
momento decisivo na história da desenrolando discretamente entre investi-
revolução digital. O primeiro foi o pânico dores, funcionários governamentais, líde-
provocado pelo colapso dos preços das res empresariais e o público em geral no
ações de empresas ligadas à Internet na mundo inteiro, de Seul a São Paulo. Será
Nasdaq e outros mercados de ações. O que a “nova economia” existe de fato?
segundo foi o encontro de cúpula, reali- De um lado, ainda encontramos fun-
zado em clima tenso, dos líderes euro- damentalistas financeiros que insistem
peus em Lisboa. O terceiro foi a dissemi- que o colapso no preço das ações de
nação explosiva do Love Bug, o “vírus do empresas de alta tecnologia prova que a
amor”, nos computadores do Parlamento nova economia é mais exagero do que
britânico, da Câmara de Representantes realidade. Os preços ensandecidos das
dos Estados Unidos, da CIA e de milhares ações de tecnologia avançada eram ape-
de empresas – inclusive algumas das maio- nas uma bolha, semelhante à tulipoma-
res e, supostamente, mais seguras. nia holandesa do século 17. A economia
Juntos, esses três eventos, comprimi- das ponto.com e os planos de comércio
dos em algumas poucas semanas, revelaram- eletrônico seriam apenas um aperitivo e o
nos que a adolescência da revolução finda- verdadeiro colapso ainda estaria por vir:
ra e que um novo patamar fora alcançado. punição divina por uma exuberância in-
justificada.
ANSIEDADE NO MERCADO DE AÇÕES O outro lado argumenta que está
As tremendas oscilações nos preços dos acontecendo uma verdadeira revolução –
mercados de ações em toda a parte na- a mais profunda desde a Revolução In-
dustrial. Cada vez mais, a riqueza está
baseada no conhecimento, não nos fato-
© Copyright de Alvin e Heidi Toffler. res clássicos de terra, trabalho ou capital,
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fator acaso está sempre presente. Elas vão Existem 70 milhões de telefones celu-
às alturas. Sobem repentinamente. Des- lares nos Estados Unidos e a ITU prevê
pencam. Põem abaixo todas as antigas que 1 bilhão de pessoas estarão portando
definições, modelos e parâmetros. E de- um aparelho dentro de alguns poucos
voram seus próprios filhos. anos. Acesso a Internet logo estará dispo-
A idéia de que a revolução digital irá nível para todo tipo de dispositivos por-
gerar anos de prosperidade sem extrema táteis. E grandes investimentos já estão
turbulência e grandes convulsões é, por- sendo feitos para oferecer banda larga a
tanto, tão ingênua quanto a noção de que preços bastante acessíveis.
a nova economia não existe. Será que todos os usuários de telefo-
nes celulares irão simplesmente jogar
A NOVA ECONOMIA EXISTE fora seus aparelhos? A transformação di-
Existem hoje mais de 20 bilhões de chips gital vem acompanhada de exagero, efei-
de computador no planeta, cada um com tos de fumaça e espelhos, vigarices, diver-
mais de 1 milhão de transistores. Isso timento e jogos. Mas será que isso
significa mais de 3 milhões de chaves significa que a universalização da banda
digitais para cada ser humano da Terra. larga irá parar? Que todos os dispositivos
Há também mais de 300 milhões de portáteis irão evaporar? E será que al-
microcomputadores no mundo – cerca guém realmente imagina que o comércio
de um para cada vinte seres humanos. De eletrônico entre empresas e consumido-
acordo com a International Communica- res, entre empresas e empresas, e também
tion Union (ITU), dentro de alguns anos exclusivamente entre consumidores irá
a proporção chegará a um computador acabar? Ou que não transformará as eco-
para cada 13 ou 14 seres humanos. Nos nomias do futuro?
Estados Unidos, a proporção já é 1 micro- A revolução do conhecimento da Ter-
computador para cada 2,5 pessoas. ceira Onda já está reestruturando as eco-
E mesmo essas cifras logo deixarão de nomias em seu âmago. Muitos empregos
ter significado. A convergência acelerada já deixaram o local de trabalho. Hoje
entre microcomputadores, televisores e mais de 30 milhões de trabalhadores
telefones, associada à queda livre dos pre- norte-americanos realizam todo ou parte
ços do poder de computação e da banda do seu trabalho em casa, em hotéis, em
larga, significa que em breve qualquer aviões – na realidade, em qualquer lugar,
indivíduo com um televisor disporá, na a qualquer hora. As transações econômi-
realidade, de um computador e uma co- cas e as atividades produtivas estão dei-
nexão com a Internet. xando de ser intermitentes e se tornando
Mais da metade dos norte-america- contínuas – dia e noite, no mundo inteiro.
nos adultos já estão on-line. Mais de um Ou, como se diz, tudo agora está aberto
quarto – cerca de 28% – usa a Internet em 24 horas por dia, 7 dias por semana.
suas casas todos os dias. A Ford Motor Company está ofere-
Alguém realmente acredita que todos cendo computadores e acesso à Internet
esses chips, computadores e conexões por uma taxa simbólica a todos os seus
com a Internet irão simplesmente desa- 350 mil funcionários ao redor do globo.
parecer porque o preço de algumas ações Após anos resistindo à passagem da Se-
caiu? Ou em virtude do “vírus do amor”? gunda Onda para a Terceira Onda, o mo-
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gião não pode ignorar essa revolução”. E falso senso de segurança, mas essa tran-
o diretor da International Telecommuni- qüilidade está acabando. O sangue frio
cations Union advertiu a América Latina de muitos executivos que acreditavam ser
para que se ampliassem os esforços de al- possível ignorar questões de segurança de
cançar as economias mais avançadas – o computador, desde que tivessem algum
que já começou a acontecer. tipo de seguro contra lucros cessantes,
No Brasil, 85% dos formulários de talvez esteja enfim começando a esquen-
imposto de renda são entregues via Inter- tar. O certo é que líderes políticos e em-
net. No México, os dois principais candi- presariais passarão a reagir à medida que
datos à presidência em 2000 – Francisco se for tornando inequivocamente eviden-
Labastida e Vicente Fox – discutiam não te que a malha elétrica, a produção de
se o México precisava se digitalizar, mas petróleo, as finanças, os satélites e outras
como. infra-estruturas críticas são, na realidade,
altamente vulneráveis a um ataque sis-
O VÍRUS DO AMOR têmico.
Por fim, mais ou menos na mesma época, De repente, até mesmo alguns dos
o mais avassalador vírus de computador líderes políticos mais dedicados à Segunda
já lançado atacou muitas das mais pode- Onda estão despertando para o fato de
rosas corporações do mundo, provocan- que a revolução da Terceira Onda veio
do prejuízos avaliados em centenas de para ficar, a despeito do descontrole dos
milhões, ou mesmo alguns bilhões, de preços das ações e dos devastadores vírus
dólares. Por ter se disseminado naquele de computador. Na realidade, podería-
exato momento, o vírus, conhecido mos afirmar que a primeira primavera do
como Love Bug, serviu para ressaltar o novo século trouxe consigo um despertar
quanto a economia mundial está depen- político e cultural em todo o mundo: foi
dente da infra-estrutura eletrônica e da o momento em que, pela primeira vez,
Internet. políticos e líderes empresariais, e até
O fato de que o novo século começou mesmo economistas, não puderam mais
sem o grande colapso do Bug do Milênio, ignorar as transformações da Terceira
que muitos haviam previsto, fez com que Onda e a nova economia que vem a galope
várias grandes empresas adquirissem um em nossa direção.
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A C O R R I DA PA R A C L O N A R O V A L E DO S I L Í C I O
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m 1981, do alto de uma colina ao variações inspiradas ou copiadas do mo-
sul de São Francisco, nós dois e delo do Vale do Silício.
uma equipe de TV observávamos a O original amadureceu e tornou-se
região hoje conhecida como Vale do Silí- um centro que hoje possui não apenas
cio. “Este foi o local de nascença de uma uma força de trabalho altamente especia-
nova civilização vindoura”, declaramos lizada e cara, com uma cultura hipercom-
na frente da câmera. Passados quase vinte petitiva e laboriosa própria, mas também
anos, uma pesquisa que realizamos iden- todo um circuito de capitalistas de risco,
tificou nada menos do que 35 projetos ao advogados, negociadores, intermediários
redor do mundo que são, em essência, e outros serviços de apoio. Por outro
tentativas de clonar o Vale do Silício. Um lado, as pessoas e a comunidade vivem
estudo mais aprofundado provavelmente hoje sob a pressão de um estresse exces-
teria revelado um número três vezes maior. sivo. Os custos de moradia são astronô-
De Bangalore, Índia, a Hong Kong, de micos, o trânsito impossível. À medida
Israel à Irlanda, e em cidades de várias que essas desvantagens se acumulam,
regiões dos Estados Unidos, foi dada a outros centros vão se tornando compara-
largada para replicar as maravilhas do tivamente mais atraentes.
Vale do Silício. Não há nenhuma garantia de que
O Vale do Silício tornou-se o símbolo esses novos projetos de “Siliclones” pipo-
mundial da inovação e da nova econo- cando em todo o mundo terão sucesso e
mia. Cidades, Estados e nações estão pro- muitos deles carecem dos pré-requisitos
movendo e até financiando pólos de pes- culturais e políticos – para não falar das
quisa, núcleos de alta tecnologia, precondições econômicas – para serem
incubadores de novas empresas e outras bem-sucedidos. O ambicioso projeto do
Supercorredor Multimídia da Malásia,
por exemplo, atraiu empresas do Japão,
© Copyright de Alvin e Heidi Toffler. Estados Unidos e outros países com uma
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hoje está pagando um alto preço, à medi- revolucionar o seu sistema educacional –
da que empresas mais digitalmente sofis- não aos poucos, mas mediante uma pro-
ticadas de serviços financeiros dos Esta- funda mudança na sua concepção de
dos Unidos estão comprando as corretoras educação. Pode estar numa reestrutura-
e bancos japoneses. ção fundamental das instituições públi-
Assim, nem todo país precisa produ- cas de tal modo que, por exemplo, o rit-
zir chips, software, computadores, pagers mo das decisões políticas e legislativas
ou telefones celulares para enriquecer. A acompanhe o ritmo cada vez mais acele-
adoção rápida e estratégica da tecnologia rado das decisões empresariais.
da informação pode ser igualmente im- Ou pode estar em modificar a dinâ-
portante. Por exemplo, alguns países po- mica risco/recompensa no que diz res-
deriam exportar ciber-educação e serviços peito à inovação. Pode estar em desco-
de telemedicina via satélite, mesmo que brir maneiras criativas de indenizar
eles próprios não produzam satélites. aqueles que forem deixados para trás
Seja como for, o fato é que qualquer tec- com a ascensão para a nova economia.
nologia – digital ou não – só será econo- Em suma, num mundo repleto de Vales
micamente útil na medida em que a cul- do Silício, a criação de mais um centro
tura e instituições do país permitirem que similar pode ser útil, mas não será sufi-
ela o seja. Não pode haver uma nova ciente. Países e regiões têm de abordar a
economia sem uma nova sociedade; e questão do desenvolvimento de maneira
não pode haver uma nova sociedade sem muito mais ampla e bem mais sofistica-
novas instituições. da. Precisam começar a pensar para além
A vantagem competitiva de um país da nova economia e considerar a nova
no mundo de amanhã talvez esteja em sociedade.
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