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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.16, n.1, p.40-5, jan./mar.

2009 ISSN 1809-2950

Efeito de um programa de fisioterapia funcional em crianças com paralisia


cerebral associado a orientações aos cuidadores: estudo preliminar
Effect of a functional physical therapy program on cerebral palsy children,
associated to guidance for their caregivers: a preliminary study
Ana Carolina Gama e Silva Brianeze1, Andréa Baraldi Cunha2, Sabrina Messa Peviani3, Vanessa Cristina Ribeiro Miranda4,
Virlaine Bardella Lopes Tognetti5, Nelci Adriana Cicuto Ferreira Rocha6, Eloisa Tudella6

Estudo desenvolvido no Núcleo RESUMO: O objetivo foi verificar o efeito de um programa de fisioterapia funcional
de Estudos em Neuropediatria e para crianças com paralisia cerebral, associado a orientações aos pais e/ou
Motricidade do Depto. de cuidadores; e verificar a correlação entre as habilidades funcionais e a assistência
Fisioterapia da UFSCar – do cuidador, utilizando o Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade (PEDI).
Universidade Federal de São Participaram quatro crianças entre 24 e 43 meses de idade, hemiplégicas, espásticas
Carlos, São Carlos, SP, Brasil e nível I no sistema de classificação da função motora ampla (GMFCS). Foram
1 realizadas quatro avaliações – uma antes do início do programa, as demais aos 30,
Fisioterapeuta Ms. Especialista 60 e 90 dias após a primeira –, empregando-se as partes I (Habilidades funcionais)
em Neurologia Infantil
e II (Assistência do cuidador) do PEDI. As crianças foram submetidas a sessões de
2
Fisioterapeuta Especialista em uma hora de fisioterapia funcional três vezes por semana, durante três meses: duas
Neurologia Infantil; mestranda vezes a sessão era de fisioterapia com base no conceito neuroevolutivo Bobath e
em Fisioterapia na UFSCar uma vez, treino de atividades da vida diária. Também foram dadas orientações por
escrito aos pais e/ou cuidadores quanto à assistência à criança, incentivando-os a
3
Fisioterapeuta; doutoranda em praticá-la em casa. A análise dos resultados mostrou que, na última avaliação, as
Fisioterapia na UFSCar crianças obtiveram escores significativamente maiores que na primeira. Foi
4
verificada correlação altamente significativa (r=1,0; p=0,083) entre as partes I e II.
Fisioterapeuta; mestranda em O programa de fisioterapia funcional associado às orientações aos pais e/ou
Clínica Médica na Faculdade cuidadores foi efetivo em melhorar o desempenho funcional de crianças nível I
de Medicina da Universidade com hemiplegia espástica.
de São Paulo, São Paulo, SP
DESCRITORES: Criança; Cuidadores; Modalidades de fisioterapia; Paralisia cerebral
5
Fisioterapeuta Ms.; doutoranda
em Educação do Indivíduo ABSTRACT:The purpose was to verify the effect of a functional physical therapy program
Especial na UFSCar on children with cerebral palsy, associated to guidance to parents and/or caregivers;
6 and to search for correlations between the child’s functional abilities and caregivers’
Fisioterapeutas; Profas. Dras. do assistance, by means of the Pediatric Evaluation Disability Inventory (PEDI). Four
Depto de Fisioterapia da
hemiplegic, spastic children between 24 and 43 months old, classified at the Gross
UFSCar
Motor Function Classification System level I, were submitted to four evaluations,
ENDEREÇO PARA the first prior to program onset, and the others 30, 60, and 90 days after the first
CORRESPONDÊNCIA one. PEDI parts I (Functional abilities) and II (Caregivers’ assistance) were used.
Caregivers were provided with written instructions on how to best deliver care at
Ana Carolina G. S. Brianeze home. The physical therapy program consisted of three weekly 1-hour sessions for
R. Latino Coelho 1301 ap. 1 three months; two sessions were of physical therapy based on Bobath concept, and
Bloco A Parque Taquaral one, of daily activities training. The analysis of results showed children obtained a
13087-010 Campinas SP significantly higher score at the last assessment as compared to the first. A high,
e-mail: carolcpcp@yahoo.com.br significant correlation was found between PEDI parts I and II (r=1.0; p=0.083). The
functional physical therapy program associated to instructions to caregivers proved
Trabalho apresentado ao IV thus effective to improve the functional performance of level-I children with spastic
Congresso Brasileiro de hemiplegia.
Comportamento Motor da
Universidade de São Paulo, KEY WORDS: Caregivers; Cerebral palsy; Child; Physical therapy modalities
São Paulo, jul. 2008, com
publicação de resumo.

APRESENTAÇÃO
jul. 2008
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
mar. 2009

40 Fisioter Pesq. 2 0 09;16(1)


09;16(1):40-5
Brianeze et al. Fisioterapia na PC com orientação a cuidadores

INTRODUÇÃO também pela demanda da tarefa, pelo


ambiente onde a criança está inserida e
bilidades funcionais de crianças com
paralisia cerebral e verificar possível cor-
O termo paralisia cerebral (PC) des- pela dinâmica familiar10,11. relação entre as habilidades funcionais e
creve um grupo de desordens do desen- a assistência do cuidador, utilizando o
A habilidade de uma pessoa ao cum-
volvimento do movimento e da postura, Inventário de Avaliação Pediátrica de
prir as demandas da tarefa por meio da
atribuídas a distúrbio não-progressivo Incapacidade, PEDI (Pediatric Evaluation
interação com o ambiente determina sua
que ocorre no encéfalo em desenvolvi- Disability Inventory)19,20.
capacidade funcional. Assim, as estraté-
mento. As desordens motoras da PC cau- gias terapêuticas que auxiliam o pacien- A hipótese deste estudo é que a fisio-
sam limitações das atividades de vida te a aprender ou reaprender a executar terapia funcional associada às orientações
diária (AVD) e são freqüentemente as tarefas funcionais são essenciais para aos pais e/ou cuidadores favorecerá po-
acompanhadas por distúrbios da sensa- a independência funcional12. A interven- sitivamente o desempenho funcional da
ção, percepção, cognição, comunicação ção assume o importante papel de criança com PC. Este estudo pretende
e comportamento, por epilepsia e por minimizar as dificuldades apresentadas contribuir para o embasamento clínico
problemas musculoesqueléticos secun- e deve ser direcionada para promover de fisioterapeutas ao estabelecer seus
dários1,2. experiência e prática dos movimentos a objetivos a médio e longo prazo no de-
A classificação da PC pode ser basea- serem incorporados no repertório mo- senvolvimento e aperfeiçoamento do
da na distribuição topográfica do compro- tor da criança. Tanto pais quanto profis- repertório funcional da criança com PC,
metimento, no nível de funcionalidade e sionais devem, portanto, estimular o além de destacar a importância da par-
no tônus muscular. Quanto à distribuição desenvolvimento da capacidade funci- ticipação ativa dos pais e/ou cuidadores
topográfica, pode ser classificada como onal dessas crianças. na prática diária dessas crianças, em to-
hemiplegia, diplegia e quadriplegia3. dos os ambientes que as cercam e em
Fisioterapia funcional é a terapia com
Quanto ao nível de funcionalidade, o todas as atividades que executam.
ênfase na prática de atividades funcio-
mais utilizado atualmente é o sistema de nais. Prioriza o aprendizado de habili-
classificação de função motora ampla
(Gross motor function classification
dades motoras que sejam significantes
no ambiente da criança, nas quais ela
METODOLOGIA
system, GMFCS), que é baseado no mo- deseje se engajar, e que sejam percebi- Este estudo foi aprovado pelo Comitê
vimento auto-iniciado, com ênfase no das como problemáticas pela criança e de Ética em Pesquisa da Universidade
sentar e andar. Apresenta cinco níveis seus pais ou cuidadores13,14. A interven- Federal de São Carlos. Participaram do
diferentes de função motora, de acordo ção para a criança com PC realça suas estudo longitudinal quatro crianças com
com a limitação funcional e necessida- habilidades no contexto da vida diária, diagnóstico médico clínico de PC, clas-
de de assistência externa. Crianças clas- relacionando limitação motora com ati- sificadas como hemiplégicas, espásticas
sificadas no nível I do GMFCS apresen- vidade funcional15. Utilizar os resulta- e nível I na classificação do GMFCS,
tam baixa severidade, bom desempenho dos de avaliação funcional é pertinente com idade entre 24 e 43 meses (mé-
motor e limitações funcionais pouco para estabelecer um tratamento eficaz, dia=33,5±9,8), sendo uma do sexo fe-
pronunciadas; as do nível V são crian- pois os terapeutas são capazes de iden- minino e três do sexo masculino. Ape-
ças com múltiplas desordens, que apre- tificar o nível funcional atual da criança nas essas quatro crianças, dentre as aten-
sentam limitações no controle voluntá- e documentar mudanças ao longo do didas no serviço de fisioterapia da Uni-
rio dos movimentos e na habilidade de tempo16. versidade, se enquadravam no nível de
manter postura antigravitária do pescoço
Demonstrando a importância de dar funcionalidade e distribuição topográfi-
e do tronco4. Quanto ao tônus muscular,
orientações aos pais e/ou cuidadores das ca estabelecidos como critérios de in-
a PC pode ser classificada em espástica,
crianças com PC, Mancini et al.17 rela- clusão, com a finalidade de manter a
discinética, atáxica e mista, sendo a for-
tam estudo em que aqueles foram fre- homogeneidade da amostra. Crianças
ma espástica a mais freqüente, represen-
qüentemente orientados por terapeutas com alterações associadas, como genéti-
tando 75% dos casos de PC3,5.
a estimular as crianças em diferentes cas, comportamentais, deficiência auditi-
Estudos têm evidenciado que a habilidades e promover sua independên- va e/ou visual, malformações no siste-
espasticidade leva a alterações em pro- cia funcional. A importância da partici- ma nervoso central, e que foram subme-
priedades como redução da força mus- pação dos pais na terapia da criança tidas a procedimentos cirúrgicos ou à
cular e da velocidade do movimento, contribui para a otimização do progra- aplicação de toxina botulínica nos seis
gerando modificações adaptativas no ma de fisioterapia, bem como nos be- meses anteriores ao estudo foram exclu-
comprimento muscular e na amplitude nefícios aos pais, pois os integra nas ati- ídas. Ainda, para a inclusão no estudo,
do movimento ativo6-8. Esses distúrbios vidades funcionais do dia-a-dia da cri- os pais ou responsáveis deveriam assi-
comprometem o processo de aquisição ança, levando à redução no estresse e nar o termo de consentimento livre e
de marcos motores (rolar, sentar, engatinhar, ansiedade deles18. esclarecido; as crianças deveriam estar
andar) e também o desempenho nas AVD em tratamento fisioterapêutico há pelo
(banhar-se, alimentar-se, vestir-se)9,10. Deve- O presente estudo teve como objeti- menos 12 meses e deveriam apresentar
se ressaltar porém que o desempenho vo verificar o efeito de um programa de nível semelhante de compreensão, ou
funcional é influenciado não só pelas fisioterapia funcional associado a orien- seja, capazes de atender aos comandos
propriedades intrínsecas da criança, mas tações aos pais e/ou cuidadores nas ha- do terapeuta.

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Procedimentos Quadro 1 Atividades funcionais realizadas com base no conceito neuroevolutivo
Bobath
As crianças foram avaliadas por meio Preparação (15 minutos) Alongamentos e mobilizações articulares por
do PEDI 19, questionário que avalia o meio de manuseio com rolos e bolas
desempenho funcional de crianças en-
Atividades de ativação e Exercícios ativos e resistidos para grupo
tre 6 meses e 7 anos e meio em ativida- controle muscular (30 minutos) musculares dos membros superiores e
des relevantes de sua vida diária. No inferiores, especialmente do hemicorpo
Brasil, esse instrumento foi validado e comprometido e de tronco
adaptado com permissão e colaboração
Treino da atividade funcional Alimentação
dos autores, para contemplar as espe- (15 minutos) Higiene pessoal
cificidades socioculturais das crianças Vestir-se
brasileiras20. O PEDI é aplicado em en- Banheiro
trevista estruturada com os pais ou res- Transferências
ponsáveis pela criança, que possam in-
formar sobre seu desempenho funcional Quadro 2 Treino de AVD associado a orientações aos pais e/ou cuidadores
em atividades da rotina diária. É dividi- Autocuidado (partes I e II do PEDI):
do em três partes (parte I - Habilidades Alimentação Utilização de utensílios para comer e recipientes para beber
funcionais, parte II - Assistência do Experimentação de diferentes texturas de alimento
Cuidador e parte III, Modificação do Higiene pessoal Utilização de escovas, pentes, sabonetes e toalhas
ambiente), que informam sobre as três
Vestir-se Vestir e tirar vestimentas, sapatos e meias
áreas do desempenho funcional: autocui-
Abrir fechos e botões
dado, mobilidade e função social.
Banheiro Como usar o vaso sanitário, a pia, o papel higiênico, o
Na parte I, os itens da cada escala são chuveiro; abrir e fechar box
somados, resultando em um escore to- Mobilidade (partes I e II):
tal bruto para cada uma das três áreas Transferências Em ambientes internos e externos, em diferentes terrenos e
de habilidades funcionais. Na parte II, a desníveis
pontuação dada para as tarefas em cada Subir e descer escadas
uma das três áreas funcionais é somada, Entrar e sair de meios de locomoção (carro, ônibus)
resultando em três escores totais brutos Treino de marcha em distâncias longas, curtas e em velocidade
de independência11. Neste estudo foram
utilizadas somente as áreas de autocuidado na realização das AVD (Quadro 2). Por ficativos e, inferiores a 0,05, altamente
e mobilidade das partes I e II do instru- fim, foram realizadas reuniões com os significativos.
mento e foi utilizado o valor do escore pais e/ou cuidadores para esclarecer
bruto. Quanto maior o escore, melhor o dúvidas, caso houvesse dificuldades nas
desempenho nas habilidades funcionais orientações dadas. RESULTADOS
e maior a independência da criança em
relação ao cuidador nas AVD. A Tabela 1 apresenta as médias dos
Análise dos dados escores brutos no PDEI e os respectivos
Foram realizadas quatro avaliações, valores de p da comparação entre os
sendo a primeira antes do início da in- Como apenas quatro crianças foram
escores obtidos na primeira e quarta ava-
tervenção fisioterapêutica, a segunda estudadas, optou-se pelo uso de medi-
liações realizadas; o valor do teste de
após 30 dias da primeira avaliação, a das não-paramétricas para a análise. Para
Wilcoxon para dados pareados foi zero.
terceira após 60 dias e quarta após 90 verificar o efeito do programa fisiote-
Pode-se notar que todos os valores de p
dias da primeira avaliação, ou seja, ao rapêutico e das orientações aos pais e/
são inferiores a 0,1, indicando que na
ou cuidadores, foram utilizadas a primei-
final do programa. última avaliação os escores foram signi-
ra e a quarta avaliações, em cada parte
As crianças foram submetidas à fisio- ficativamente maiores que na primeira.
do PEDI, utilizando-se o teste de
terapia funcional três vezes por sema- Wilcoxon pareado. As médias dos esco- Quanto à correlação entre habilida-
na, com uma hora de duração, durante res brutos das quatro crianças nas áreas des funcionais e assistência do cuidador
três meses. Duas vezes na semana foi de autocuidado e mobilidade nas par- nas avaliações das quatro crianças, o
aplicada fisioterapia com base no con- tes I (Habilidades funcionais) e II (Assis- Gráfico 1 traz os valores médios obti-
ceito neuroevolutivo Bobath (Quadro 1). tência do cuidador) foram usadas para dos em cada uma das avaliações das
Uma vez por semana foi realizado trei- calcular o coeficiente de correlação en- partes I e II do PEDI. Constatou-se cor-
no das AVD e fornecidas orientações por tre ambas. Essa associação foi analisada relação altamente significativa (r=1,0;
escrito aos pais e/ou cuidadores quanto pela correlação de Spearman. Foi utili- p=0,083), mostrando que, quanto mai-
à assistência prestada à criança, de acor- zado o programa estatístico R (v. 2.7). or o nível de habilidades funcionais da
do com as respectivas limitações, de Em todas as análises, os valores de p in- criança, maior é sua independência em
modo a estimularem sua independência feriores a 0,1 foram considerados signi- relação ao cuidador nas AVD.

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Brianeze et al. Fisioterapia na PC com orientação a cuidadores

Tabela 1 Escores brutos médios obtidos pelas quatro crianças no PEDI na primeira Jansen et al.18 e Palisano et al.26, as me-
e última avaliações e valor de p da comparação entre ambas lhoras obtidas nas habilidades dessas
Escore médio crianças foram devidas ao fato de o pro-
Parte do PEDI 1a avaliação 4a avaliação p* grama ser focado nas limitações das AVD
consideradas problemáticas pelos pais
Autocuidado 36,75 54,25 0,0625
Habilidades funcionais e/ou cuidadores, e por contarem com a
Mobilidade 44,50 54,50 0,0625 participação ativa destes nas atividades.
Autocuidado 9,00 26,00 0,0625
Assistência do cuidador Um aspecto relevante do presente
Mobilidade 28,50 34,25 0,0488 estudo foi ter evidenciado a relação en-
* Sob a hipótese nula de que a diferença entre a 4a e 1a avaliações é maior ou igual a zero tre habilidades funcionais e assistência
do cuidador. Os resultados indicaram
que, quanto maior o nível de habilida-
des funcionais da criança, maior é a sua
65
Escores médios da assistência do

A4
independência em relação ao cuidador
nas AVD. Esses resultados foram atribu-
A3 ídos ao treino das limitações funcionais
55 e à participação ativa dos cuidadores,
cuidador

buscando a independência das crianças


A2 nessas atividades. A intervenção terapêu-
45 tica, o treinamento específico e as ori-
entações aos pais e/ou cuidadores são
A1
fatores determinantes, pois encorajam a
35 criança a realizar atividades que melho-
80 85 90 95 100 105 110 ram seu desempenho27.

Escores médios das habilidades funcionais Esses resultados estão de acordo com
os de Mancini et al.10, Ketelaar et al.13,
Gráfico 1 Médias dos escores das quatro crianças em cada uma das quatro
Knox et al. 27 e Formiga et al.28, segundo
avaliações das partes I e II do PEDI; A1 = 1a avaliação; A4 = 4a avaliação;
os quais o desempenho funcional de
A2 e A3 = avaliações intermediárias
crianças com PC é influenciado pelo pai
e/ou cuidador através da orientação
DISCUSSÃO tica e da experiência, proporcionando
mudanças na capacidade de movimen-
dada a ele de como assisti-las. Tal orien-
tação, adicionada ao treino direcionado,
Os resultados obtidos neste estudo tação. Isso ocorreu pela melhora do de- interferiu no aprimoramento e eficiência
revelaram que o programa de fisiotera- sempenho motor global, por desenvol- da execução da tarefa e seu uso rotinei-
pia funcional associado às orientações ver ações funcionais de movimentos ati- ro, revelando-se útil por tornar as crian-
aos pais e/ou cuidadores favoreceu o vos que requerem que a criança atenda ças mais independentes.
desempenho das habilidades funcionais ao objetivo da tarefa e aperfeiçoe suas
e o aumento do nível de independência habilidades. Os resultados aqui obtidos Apesar de contribuir para o embasa-
estão de acordo com os de Shumway- mento clínico de fisioterapeutas, este
das crianças com PC em relação ao
Cook & Woollacott12, Howle21 e Held22, estudo apresenta limitações, dado o re-
cuidador.
para os quais a fisioterapia funcional duzido número de casos, não-inclusão
Quanto à fisioterapia funcional, fo- manipulada corretamente beneficia cri- de grupo controle e não-verificação dos
ram enfatizadas técnicas de mobilização anças com limitações na tarefa. efeitos em longo prazo, sendo necessá-
articular e ativação de grupos muscula- rios mais estudos nessa área.
Outros estudos confirmam que a fisi-
res durante o treino das AVD da crian-
oterapia funcional direcionada às habi-
ça, tais como trocar de roupa, utilizar
utensílios domésticos e transferir-se em
lidades funcionais é mais eficaz em cri-
anças hemiplégicas do que o tratamen-
CONCLUSÃO
diferentes ambientes. A realização do to convencional23-25.
treino baseado nas dificuldades da cri- Apesar de não apresentar grupo con-
ança contempla sua capacidade de Destacamos ainda que os pais e/ou trole, os resultados deste estudo indica-
cuidadores exercem um papel de agen- ram claramente que o programa de fisio-
aprender a resolver problemas inerentes
tes cooperadores para as modificações terapia funcional associado às orienta-
à tarefa funcional, mais do que praticar
do comportamento motor no desenvol- ções aos pais e/ou cuidadores foi efeti-
repetitivamente padrões de movimentos
vimento de crianças com incapacidades vo em melhorar o desempenho funcio-
normais13.
motoras. Por isso, as orientações apro- nal de crianças nível I com hemiplegia
Inferimos que esse modelo de fisiote- priadas a eles, sua adesão e participa- espástica. Com a melhora no desempe-
rapia proporcionou a aquisição de no- ção ativa no programa geraram resulta- nho nas habilidades funcionais, as cri-
vas habilidades funcionais e o aumento dos satisfatórios no desempenho de suas anças demonstraram maior independên-
das estratégias motoras por meio da prá- habilidades funcionais. De acordo com cia em relação ao cuidador nas AVD.

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