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Sebenta de

Direito do Trabalho
Aulas Teóricas
Prof. Dr. Francisco Liberal Fernandes

Faculdade de Direito da Universidade do Porto


Nota introdutória:

Esta sebenta respeita às aulas teóricas de Direito do Trabalho do ano letivo de 2019/2020,
lecionadas pelo docente Francisco Liberal Fernandes. A sebenta foi realizada com base nos
apontamentos das vogais do Departamento de Pedagogia Rita Gomes e Inês Brandão e no manual
“Contrato de Trabalho” de João Leal Amado.

A sua elaboração foi realizada com o objetivo de auxiliar os estudantes para o exame de
Direito do Trabalho. Relevamos ainda que, a leitura desta sebenta não substitui a leitura da
bibliografia obrigatória ou recomendada, sendo apenas um instrumento de auxílio ao estudo.

Caso sejam detetados alguns erros, agradecemos que estes sejam comunicados através do e-
mail da CC3: cc3fdup1920@gmail.com de modo a que o documento seja aperfeiçoado.

Bom estudo!

A Comissão de Curso do 3º ano de Direito


AULA DE 19/09/2019

1. INTRODUÇÃO AO DIREITO DO TRABALHO


Ao longo da cadeira só vamos falar do direito individual de trabalho, o qual trata do
contrato de trabalho: o seu nascimento, vida, morte e alterações.
O direito coletivo de trabalho, do qual não vamos falar a fundo, regula as relações
entre grupos: dos trabalhadores, dos empregadores e do Estado (papel interveniente e tutelar
do Direito do Trabalho). Do lado dos trabalhadores há várias estruturas representativas
(sindicatos, confederações, etc.).
O direito internacional do trabalho, no qual se inclui o direito comunitário, tem uma
influência que se traduz na transposição/adaptação (depende do tipo de documento) que o nosso
legislador faz a essas normas a que está vinculado.
Depois há um outro ramo que em certos países, como em Espanha, é considerado direito
do trabalho: o direito da segurança social. Entre nós, há muitos anos que está separado, sendo
este ramo de direito público (direito administrativo).

O Direito do Trabalho não se ocupa de todas as formas de trabalho humano. O trabalho


que aqui releva é aquele que se analisa numa atividade paga (trabalho assalariado), realizada
por conta de um terceiro (o empregador), com vista à realização de fins que não fomos nós
próprios a escolher, e segundo modalidade e horários fixados por aquele que nos paga.
No seu núcleo essencial, o Direito do Trabalho regula uma relação que se estabelece
entre trabalhador e empregador, marcada pelo sinalagma entre trabalho e salário, por força do
qual o trabalhador se compromete a prestar a sua atividade de acordo com as ordens e instruções
que lhe serão dadas pela contraparte. Note-se que a relação de trabalho é muito assimétrica,
pois o trabalhador, além de (em regra) carecer dos rendimentos do trabalho, também fica sujeito
à autoridade e direção do empregador em tudo o que diz respeito à execução do trabalho
(subordinação jurídica: a vontade do trabalhador compromete-se no contrato, mas também
se submete nesse contrato). O objetivo do direito do trabalho consiste, justamente, em tentar
harmonizar estes interesses conflituantes, funcionando como plataforma de compromisso de
interesses sociais e económicos, não podendo descurar ainda de uma preocupação com o
trabalho digno e com a salvaguarda dos direitos humanos.

O contrato de trabalho traduz-se num negócio jurídico de direito privado.

Definição de Direito do Trabalho do professor Leal Amado: “conjunto de normas


jurídicas, de origem estadual e convencional, que visam regular, com vista à sua
normalização, as relações individuais e coletivas que têm como seu elemento unificante e
desencadeante o trabalho assalariado”. Vamos analisar esta definição:
 “De origem estadual e convencional”: as normas jurídicas de Direito do Trabalho
não se cingem às emancipadas pelo Estado, há outras fontes, como veremos adiante;

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 “Com vista à sua normalização”: o Direito do Trabalho visa limitar e legitimar os
poderes empresariais, bem como proteger os trabalhadores e ainda legalizar a
posição dominical dos empregados;

 “Relações coletivas de trabalho”: o Direito do Trabalho visa regular, não só a


relação bilateral entre trabalhador e empregador, mas também as relações coletivas
de trabalho.

AULA DE 03/10/2019 (páginas 31 a 45 do livro do professor Leal Amado, 2º edição - 2018)


2. FONTES DO DIREITO DO TRABALHO
O contrato de trabalho é um contrato de subordinação, neste caso, como é óbvio,
falamos em subordinação jurídica. Essa dimensão de subordinação manifesta-se através das
fontes de direito.
no o re to do Trabalho on t t do or onte
a) Estaduais: preceitos da CRP, lei e decretos-lei;

b) Intraestaduais: em particular, os instrumentos de regulação coletiva (IRC),


nomeadamente as convenções coletivas de trabalho;

c) Internacionais: convenções internacionais (DUDH, Pacto relativo aos direitos


civis e políticos, Pacto sobre os direitos económicos, sociais e culturais);
convenções da organização internacional do trabalho.

d) Supranacionais: direito comunitário.


Uma particularidade do Direito de Trabalho ao nível das fontes é a autonomia coletiva:
a CRP prevê que os trabalhadores tenham o direito de participar na elaboração da legislação
do trabalho, quer através das comissões de trabalhadores (artigo 54º, nº5, al. d) CRP), quer
através das associações sindicais (artigo 56º, nº2, al. a) CRP). A autonomia coletiva pode ter:
 Carácter instrumental:
o Liberdade Sindical;
o Greve.

 Carácter final:
o Mecanismos de conflito.
A negociação coletiva, que é o mecanismo previsto para a efetivação da autonomia
coletiva, dá-se entre os parceiros sociais (nomeadamente as associações sindicais, que são as
associações de trabalhadores que melhor representam e aos seus interesses) e as entidades
governais.

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2.1. Fontes específicas do Direito do Trabalho
O artigo 1º CT revela depois as fontes específicas do Direito do Trabalho, isto é, aquelas
que vão além das fontes gerais do direito privado. São estas: os instrumentos de regulamentação
coletiva de trabalho e os usos laborais que não contrariem o princípio da boa fé.
Lê-se, no artigo 2º CT, quais são esses instrumentos de regulamentação coletiva.
Podemos ter:
a) Instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho NEGOCIAIS:

 Convenção coletiva:
o Contrato Coletivo;
o Acordo Coletivo;
o Acordo de empresa.

 Acordo de adesão: há uma convenção coletiva e as entidades aderem;

 Decisão arbitral em processo de arbitragem voluntária.

b) Instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho NÃO NEGOCIAIS:

 Portaria de extensão: quando a administração alarga o âmbito de uma


determinada convenção coletiva;

 Portaria de condições de trabalho: criação ex novum de condições


de trabalho);

 Decisão arbitral em processo de arbitragem obrigatória ou


necessária.

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A arbitragem, seja voluntária ou necessária/obrigatória, é um mecanismo de resolução
de conflitos.
Fontes de carácter administrativo: portaria de condições de trabalho; a portaria de
administração de trabalho; e a portaria de extensão.

2.1.1. A convenção coletiva


A convenção coletiva é uma das mais importantes fontes de trabalho.
Definição de convenção coletiva do professor Leal Amado: acordo escrito
celebrado entre instituições patronais (empregadores e as suas associações), por um lado, e,
por outro, as associações representativas de trabalhadores (em princípio serão as associações
sindicais), com o objetivo principal de fixar as condições de trabalho (salários, férias, regime
disciplinar, horas de trabalho, etc.) que hão de vigorar para as categorias abrangidas.
Dupla dimensão de convenção coletiva em sentido amplo: as cláusulas normativas da
convenção são materialmente contratos (resultam de um acordo), mas também condicionam
diretamente os contratos individuais de trabalho por ela abrangidos (independente de qualquer
manifestação de vontade do trabalhador ou do empregador).
Ver artigo 476º CT: as disposições de instrumento de regulamentação coletiva de
trabalho só podem ser afastadas por contrato de trabalho quando este estabeleça condições mais
favoráveis para o trabalhador.

2.1.1.1. Relação das convenções coletivas com a lei (artigo 3º CT):


Uma convenção coletiva, ao ser publicada num jornal oficial, entra em vigor. As
convenções impõem-se como se fossem uma lei. A diferença é que a convenção só vincula as
pessoas abrangidas pelas associações que a negociaram (e ainda assim nem todas), isto é,
vincula os empregadores que direta ou indiretamente celebraram as convenções e, quanto aos
trabalhadores, vincula os trabalhadores filiados nos sindicatos ou organizações sindicais que
celebraram a convenção e que sejam trabalhadores dos empregadores que subscreveram a
convenção.
Segundo o professor Leal Amado, a convenção coletiva não chega a ser uma lei, mas
também não se reduz à mera condição de contrato (“tem or o de ontrato e alma de le ”).
Significa isto que, ao lado das leis laborais, há esta fonte especial que é a convenção coletiva,
a qual, de certa forma, tem uma força vinculativa semelhante à lei.
Por relações hierárquicas, as fontes legais sobrepõem-se às fontes convencionais. No
entanto, a razão de ser das convenções é criar condições que a lei não regula.

As convenções visam fixar normas diferentes das legais e essa diferença pode
manifestar-se em dois aspetos essenciais:

 Na criação de condições novas que a lei não regula.


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Tem aqui, portanto, uma função reguladora (porque se as fontes superiores, isto é,
a lei, não regulasse determinada matéria, as partes teriam liberdade de o fazer);

 Na modificação das leis (que é o que trata o artigo 3º CT).

É aqui que temos um problema de hierarquia, porque a lei é uma fonte superior.
Temos de atender ao contexto: a economia é dinâmica (há períodos de crise, outros
de maior desenvolvimento, etc.). Além disso, as relações de concorrência estão
sempre a modificar-se. Se há dinamismo, a lei tem de se adaptar. As leis também
vão atrás da economia, ou da sua evolução, ou da sua não-evolução.

A convenção coletiva faz o trabalho de responder às vicissitudes económicas e às


necessidades de reorganizar o trabalho e as empresas.
A convenção coletiva vocacionalmente tinha essa função de permitir que as novas
necessidades das empresas se refletissem na regulação do trabalho (possibilitar uma adaptação
das condições de trabalho) e de refletir o aumento da riqueza através de novas regras de
distribuição de rendimentos (modificar as relações de trabalho num sentido mais favorável ao
trabalhador, acompanhando o aumento da riqueza).
Distribuição dos rendimentos como? Através de alterações ao tempo de trabalho,
através dos salários, etc.
Outra dimensão muito importante é a saúde no trabalho, que também pode ser
melhorada.

Ou seja, a convenção coletiva era caracterizada pelo facto de estabelecer condições mais
favoráveis para o trabalhador e este modelo foi juridicamente incorporado. Em Portugal, até
2003, as convenções coletivas só podiam modificar as leis nos casos de melhoramento das
condições dos trabalhadores (princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador/princípio
do favor laboratoris). No entanto, o nosso legislador esgotou o modelo antigo de convenção
coletiva pelas novas aplicações da atividade económica e pelo desenvolvimento económico.
Ou seja, a preocupação central do Direito do Trabalho, hoje, consiste em garantir a eficiência
económica das empresas e só em segundo plano garantir as condições mais favoráveis e a
equidade das relações de trabalho.
Hoje, estamos perante um Direito do trabalho mais flexível, no qual a contratação
coletiva já não é concebida como um instrumento primordialmente vocacionado para melhorar
as condições de trabalho relativamente à lei, mas antes como um puro mecanismo de adequação
da lei às circunstâncias e às conveniências da organização produtiva.

O princípio do tratamento mais favorável foi liquidado em 2003.

Em 2009, o artigo 3º, nº1 passou a ter uma nova letra: “as normas legais reguladores
de contrato de trabalho podem ser afastadas por instrumentos de regulamentação coletiva de
trabalho, salvo quando delas resultar o contrário”.

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Ou seja, as convenções podem modificar as leis, tanto para sentido mais favorável para
ambas as partes, tanto para sentido mais favorável apenas a uma (princípio da natureza
convénio-dispositiva das normas trabalhistas).
As convenções podem modificar as leis, salvo quando das leis resultar o contrário, isto
é, quando as leis especificam que não podem ser modificadas.
As leis são imperativas, mas agora temos aqui uma especificidade: essa imperatividade
pode ou não obstar serem modificadas pelas convenções coletivas. Como é que sabemos se a
lei pode ser modificada? Através da interpretação da lei (mecanismos, meios e critérios da
interpretação da lei - devemos remeter a questão para o código civil).
As leis que admitem sempre ser modificadas são leis imperativas relativas (há quem
lhes chame leis expositivas). Temos de introduzir uma divisão, que se retira da interpretação
da lei através dos critérios gerais, entre leis imperativas relativas e leis imperativas absolutas.
Esta modalidade de modificação da lei característica das convenções coletivas não se
entende às portarias (estas não podem alterar a lei).

Ideia de subordinação: artigo 3º, nº 4 – o contrato de trabalho individual só pode afastar


as normas legais reguladoras se for para favorecer o trabalhador e se dessas normas não resultar
o contrário.
O contrato de trabalhado é em si mesmo uma regulação dos interesses das partes e daí
que, embora formalmente não se possa dizer que o contrato de trabalho é uma fonte,
materialmente podemos dizê-lo.

3. O CONTRATO DE TRABALHO
(páginas 47 a 52 do livro do professor Leal Amado)
A definição e as características do contrato de trabalho constam do artigo 11º CT: “o
contrato de trabalho é aquele no qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a
prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade
destas”.

Desta definição conseguimos perceber quais são os três elementos essenciais que
compõem o contrato de trabalho: a prestação de trabalho de uma pessoa singular; a retribuição;
e, por fim, a subordinação jurídica.

Vamos analisar cada um destes elementos.


Em primeiro lugar, na prestação de trabalho inclui-se qualquer atividade humana
lícita e apta a corresponder a um interesse do empregador que seja digno de proteção legal
(artigo 115º CT). O contrato de trabalho destina-se ao trabalhador singular. Um grupo de
trabalhadores não pode ser parte de um contrato de trabalho, este tem de ser individual. O

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contrato vincula cada trabalhador per si. Do lado do empregador, este já pode ser uma pessoa
singular, uma pessoa coletiva ou várias pessoas. Discute-se agora se o direito do trabalho não
deve ser alargado, nomeadamente aos trabalhadores autónomos. A subordinação,
historicamente, era uma subordinação pessoal. A discussão foi desencadeada pelo trabalho
desenvolvido pelas plataformas digitais (isto porque a Uber, por exemplo, restringe as situações
em que os seus agentes sejam contratados como trabalhadores).
Sobre a retribuição: o objeto do contrato de trabalho versa sobre uma prestação de
trabalho remunerada. O trabalhador compromete-se a estar à disposição do trabalhador para
prestar a atividade contratada no local contratado e à hora contratada e, por sua vez, o
empregador compensa essa atividade. O contrato de trabalho é sempre oneroso. Temos uma
relação patrimonial.
Por fim, num contrato de trabalho, a relação de subordinação/dependência traduz-se
no facto de uma pessoa exercer uma atividade de acordo com as instruções que lhes são dadas.
Há, claro, regras de enquadramento das regras laborais, que veremos mais à frente. Uma pessoa
celebra um contrato de trabalho e abdica parcialmente da sua liberdade/autonomia, mas, como
é obvio, continua a ser uma pessoa com direitos, liberdades e garantias. Fica, no entanto,
dependente economicamente (em princípio) e no exercício do seu tempo.

Apesar destes três elementos, nem sempre é fácil determinar se há ou não uma
subordinação jurídica. Como tal, no artigo seguinte, no artigo 12º CT, temos uma presunção
do contrato de trabalho. O legislador selecionou um determinado conjunto de elementos
indiciários, considerando que a verificação de alguns dele do ) ba tar ara a n er n a da
subordinação jurídica. Note-se, contudo, que esta é uma presunção relativa, pelo que pode ser
afastada por prova em contrário. Provando o prestador que, in casu, se verificam algumas
daquelas características, a lei presume que ha era m ontrato de trabalho abendo
contraparte fazer prova em contrário. Tratando-se de uma presunção iuris tantum (artigo 350º
CC), nada impede o beneficiário da atividade de ilidir essa presunção, no entanto, note-se que
o ónus de prova passa a ser seu, pelo que, não sendo a presunção ilidida, o tribunal qual ar
aquele contrato como umcontrato de trabalho, gerador de uma relação de trabalho subordinado.

Aula de 4/10/2019
3.1. Formação do contrato de trabalho
Em matéria de formação do contrato de trabalho, temos sempre de ter em conta dois
fatores essenciais: a capacidade jurídica/capacidade de gozo (aptidão para ser titular de certas
relações jurídicas); e a capacidade de exercício (aptidão para atuar juridicamente por ato
próprio e exclusivo).

3.1.1. Trabalho de menores


(páginas 131 a 140 do livro do professor Leal Amado)
(artigo 66º e seguintes CT e artigo 2º e seguintes da lei 105/2009)

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No âmbito da capacidade negocial jurídica, temos de destacar a problemática do
trabalho dos menores.
Em sede de contrato de trabalho não se pretende apenas salvaguardar a posição do
menor enquanto sujeito que emite uma determinada declaração de vontade, mas sobretudo
evitar que a execução do contrato comprometa o normal e saudável desenvolvimento do menor,
bem como a sua educação e adequada formação.
Regra geral, a idade mínima de admissão para prestar trabalho é de 16 anos
(artigo 68º, nº2 CT).

No entanto, o menor que tenha 16 anos só pode prestar trabalho se tiver concluído a
escolaridade obrigatória, ou esteja matriculado e a frequentar o nível secundário de educação
e disponha capacidade física e psíquica para o posto de trabalho (artigo 68º, nº1 CT). Temos,
portanto, 4 condicionamentos. O professor acredita que há uma desadaptação entre o
propósito e a realidade. A lei limita a liberdade de trabalho do trabalhador e a liberdade de
contratar do empregador.
Contudo, se, em regra, a fasquia é colocada nos 16 anos, a verdade é que a lei, ora
suaviza as exigências (no caso dos trabalhos leves), ora endurece o regime (no caso dos
trabalhos prejudiciais):
 Artigo 68º, nº3: o menor com idade inferior a 16 anos que tenha concluído a
escolaridade obrigatória ou esteja matriculado e a frequentar o nível secundário de
educação pode prestar trabalhos leves (...).

Referência ao artigo 2º da Lei 105/2009: o menor de 16 anos, desde que esteja


inscrito num sistema de ensino e que o trabalho seja leve, pode ser admitido a
trabalhar. Há uma questão muito específica relativamente aos menores no âmbito
da atividade cultural (novelas, anúncios): admite-se que os representantes desses
menores possam celebrar um contrato de trabalho relativamente a aos mesmos.
Uma coisa é ser admitido outra é celebrar o contrato de trabalho.

 Artigo 72º, nº2: os trabalhos que, pela sua natureza, ou pelas condições em que são
prestados, sejam prejudiciais ao desenvolvimento físico, psíquico e moral dos
menores, são proibidos ou condicionados por legislação especifica.

Quem celebra o contrato de trabalho é o menor, em seu nome. Tem as seguintes


condicionantes:
 Artigo 70º, nº2: o contrato celebrado diretamente com o menor que não tenha
completado 16 anos (ou seja, em trabalhos leves), ou não tenha ainda concluído a
escolaridade obrigatória nem esteja matriculado e a frequentar o nível secundário
de educação só é válido mediante a autorização escrita dos seus representantes
legais;

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 O contrato celebrado diretamente com o menor que tenha completado 16 anos de
idade e tenha concluído a escolaridade obrigatória ou esteja matriculado e a
frequentar o nível secundário de educação é válido, salvo oposição dos seus
representantes legais.

Ou seja, há o direito de celebrar o contrato, mas é um direito condicionado, pois os


pais podem opor-se ou podem ter de autorizar essa celebração. Os pais são, em última
instância, os responsáveis pelo desenvolvimento do menor. Não têm sequer de fundamentar a
sua oposição.
A retribuição deverá ser para o menor, visto que é ele quem trabalha. No entanto, no
artigo 70º, nº3 CT, os representantes podem opor-se a que seja o menor a receber a retribuição,
no pressuposto de que o representante irá gerir a retribuição de forma mais cuidadosa do que o
menor. Se o menor quisesse reter a retribuição, teria de recorrer ao MP.
Celebrado o contrato, não cessa o poder de vigilância do representante. O representante,
em todo o caso, pode opor-se ou revogar a autorização. O trabalho dos menores está sempre na
pendência do representante. Entende-se sempre que o representante atua no melhor interesse
do representado.
Artigo 71º CT: o menor, para poder ser admissível ao trabalho, tem de ter concluído a
escolaridade obrigatória ou estar matriculado e a frequentar o nível secundário de educação. Se
o menor denunciar o contrato, tem de pagar as despesas que o empregador suportou, seja se a
denúncia for durante a formação, seja subsequente à mesma. O menor tem um regime
semelhante ao do trabalhador-estudante. Se um trabalhador estudante denunciar um contrato,
contudo, não há nenhum dever de indemnizar. A questão é: porque é que o menor tem de
suportar esta responsabilidade e o maior não? O professor considera isto incoerente.
NOTA 1: trabalho de menores é diferente de trabalho infantil: este último diz respeito
ao trabalho ilegal de menores, trabalho proibido e que o ordenamento jurídico tenta combater,
utilizando, até, para o efeito, mecanismos do Direito Penal.
NOTA 2: a emancipação do menor não prejudica a aplicação de normas relativas à
proteção da saúde, educação e formação do trabalhador menor, como esclarece o nº4 do artigo
66º CT.

3.1.2. Promessa de contrato de trabalho


Promessa de contrato de trabalho (artigo 103º CT e 410, nº1 CC): o contrato de
promessa é admissível no âmbito do contrato de trabalho. O contrato promessa já é um
verdadeiro negócio jurídico. O seu objeto é a celebração futura de um outro contrato, o contrato
prometido. O contrato promessa está sujeito a forma escrita e deve contar os elementos
previstos no artigo 103º CT.
Por norma, o contrato promessa é bilateral. No entanto, podemos ter uma promessa
unilateral, prevista no artigo 411º CT.

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Há um aspeto relevante que importa destacar: temos de saber distinguir a existência de
um contrato-promessa da celebração de um contrato de trabalho ao qual foi aposta uma
condição ou um termo suspensivo (artigo 135º CT).
O não cumprimento da promessa dá lugar à responsabilidade nos termos gerais de
direito (artigo 103º, nº2 e 3 CT).

3.1.3. Contratos de adesão


Os contratos de adesão são contratos tipo, compostos por cláusulas contratuais gerais,
as quais são apenas aceites pelo trabalhador. Nos termos do artigo 105º CT, neste tipo de
contrato, aplica-se, de forma subsidiária, o regime das Cláusulas Contratuais Gerais (DL
446/85).
No artigo 104º, nº2, a lei prevê uma situação em que a unilateralidade do contrato de
adesão, se transforma em bilateralidade: vamos supor que a entidade empregadora quer alterar
o regulamento interno que estabelece as condições de adesão do trabalhador. Sabemos que a
alteração não foi referida no momento da adesão do trabalhador àquele contrato de trabalho.
Por isso, as alterações só podem ser efetuadas se, de facto, houver concordância do trabalhador
com as mesmas. A lei estabelece uma presunção da aceitação do trabalhador se ele não se
manifestar por escrito num certo período.

3.1.4. Dever de Informação


Em ambos contratos referidos é de destacar o dever de informação do empregador
(Artigo 106º CT, que transpõe a diretiva 91/533, a qual foi revogada em 2018). É um dever que
decorre de direito comunitário. É o dever de o empregador informar o trabalhador das
condições contratuais, ainda que haja o velho princípio de que não podemos invocar o
desconhecimento do direito. É muito comum o trabalhador não ter acesso a todas as fontes que
lhe são aplicadas. O que acontece é que o trabalhador pode não ter acesso aos elementos que
lhe conferem direitos e obrigações. Assim, este princípio surge por uma questão de segurança.

3.2. A invalidade do contrato de trabalho:


(páginas 155 a 163 do livro do professor Leal Amado)

 Invalidade parcial (artigo 121º CT): no CC, o critério geral das questões de
Invalidade parcial assenta no recurso à chamada vontade hipotética ou
conjectural das partes.

O número 1 do artigo 121º CT estabelece o mesmo regime: “a nulidade ou a


anulação parcial NÃO DETERMINA A INVALIDADE DE TODO O
CONTRATO de trabalho, salvo quando se mostre que este não teria sido
celebrado sem a parte viciada”. Quer isto dizer que a nulidade ou anulação
parcial não determina a nulidade de todo o contrato de trabalho sem que se prove
que este não teria sido celebrado sem a parte viciada.

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Já o número 2 do artigo 121º acrescenta que, “a cláusula do contrato de trabalho
que viole uma norma imperativa considera-se substituída por esta”. eja
quando a invalidade parcial resultar do facto de haver cláusulas contratuais que
violam normais imperativas (constitucionais, legais ou convencionais), o
critério é diferente do nº1. O contrato não é nulo, apenas há uma substituição
(retroativa) da parte invalida pela parte válida: eliminam-se as cláusulas viciadas
e estas são substituídas pelas normas que estavam a ser violadas.

 Invalidade total (artigo 122º CT): o aspeto mais diferenciador aqui é que a
invalidade total do contrato não tem efeito retroativo: produz efeito como
válido, a invalidade só opera para o futuro. Se houvesse eficácia retroativa,
teríamos uma situação na qual o trabalhador deveria devolver o salário e o
empregador deveria devolver o trabalho prestado. Este segundo aspeto é
impossível (não de pode devolver a atividade). Daí que a retroatividade não
pudesse acontecer. Estamos a pressupor sempre que se trata de trabalho
declarado.
Há um outro aspeto decorrente deste regime e daí que vigore o regime da convalidação
(diverge da TGDC). Há contratos de trabalho que podem ser nulos porque a atividade é ilícita.
Se o objeto for nulo, o contrato também é nulo.

AULA de 10/10/2019
3.3. Tutela do trabalhador
(páginas 187 a 191 do livro do professor Leal Amado)
“Ao contratar um par de mãos, receberá também um ser humano” – Henry Ford.
Antes e mais do que trabalhador, este é uma pessoa e um cidadão, ainda que, ao celebrar
e executar o contrato de trabalho, ele fique colocado sob a autoridade e direção de outrem.

No que toca a direitos da personalidade, a relação laboral reclama naturalmente uma


tutela mais concretizada, mais específica (para o trabalhador) do que a prevista no código civil.
Este regime específico decorre da especial vulnerabilidade em que o trabalhador se encontra,
uma relação de dependência pessoal (subordinação jurídica), fruto da relação laboral com o
empregador. Dado a continuação dessa disponibilidade para com o outro, leia-se, o
empregador, compreende-se que a posição do trabalhador deve ser mais tutelada.
Depois há ainda legítimos interesses em jogo, com maior assiduidade no trabalhador
(interesses económicos, sociais, etc.), mas também no empregador (interesse na prestação de
trabalho). Face a esta duplicidade, deve haver uma especial atenção à legitimação do controlo
do empregador sobre o trabalhador, pelo que este último tem uma esfera de liberdade e
autonomia que deve ser preservada.

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Não se trata aqui propriamente dos direitos do trabalhador enquanto trabalhador (direito
à greve, à liberdade sindical, direito a férias, etc.), mas antes dos seus direitos enquanto pessoa
e cidadão. Neste âmbito, temos os artigos 14º, 15º e 16º, os quais não se estreiam no código
do trabalho, pois têm fundamento constitucional. No código de trabalho não haverá um ativo
jurídico diferente do protegido constitucionalmente.
Por exemplo: quando entramos mais especificamente na contratação e até na prestação
de trabalho (momento de atividade), a liberdade, a autonomia, as convicções pessoais, etc. do
trabalhador muitas vezes podem ser postas em causa pelo empregador, especialmente no
momento da celebração do contrato: as partes ainda não estão vinculadas, mas pretendem
vincular-se. É neste momento que o empregador procura devassar essa esfera de reserva da
vida privada. Daí que o artigo 17ºCT tenha essa preocupação específica o de proibir: tanto a
devassa pela esfera privada, como a devassa pela esfera íntima do trabalhador são proibidas.
Isto porque essas esferas não são relevantes para a prestação de serviços, contrata-se apenas
uma parte do trabalhador, não a sua personalidade.
Depois há uma obrigação de controlo, a qual decorre do facto de o trabalhador
fornecer certas informações no momento contratação. O empregador pode fazer perguntas e
obter respostas, mas não as pode divulgar num momento posterior. Portanto, há toda esta
tentativa de proteção que cada vez tem mais vínculos. No entanto, hoje em dia, muitos dos
nossos dados constam da internet. Ainda por esta via pública, aquilo o empregador encontrar,
tem a obrigação de não os divulgar. A lei é um bocadinho limitada neste sentido da
divulgação digital.
Comissão nacional de proteção de dados: tem a finalidade de zelar pela tutela dos
diretos pessoais que possam ser postos em causa (isto é, pelos direitos que podem ser
conhecidos e ser usados positiva ou negativamente).
Outra forma de controlo é através dos exames/testes médicos: se há profissões em que
esses exames não são necessários, há também outras em que os testes são admissíveis por
razões de segurança. Por exemplo, no setor dos transportes públicos, uma vez que aqui está em
causa a vida de milhares de pessoas, as empresas têm uma obrigação de fazer um controlo do
estado de saúde dos seus trabalhadores. Todavia, há um limite: nas profissões de risco
compreende-se que haja, em primeiro lugar, um princípio de responsabilidade pessoal (o
trabalhador tem de ser responsável por denunciar a sua falta de saúde), e ao mesmo tempo
compreende-se que esses trabalhadores não sejam diariamente sujeitos a esses exames, pois
apesar de se justificarem em certas alturas, podem também tornar-se evasivos da sua intimidade
física (artigo 19º CT).
Outro aspeto: o médico responsável pelos testes/exames só pode partilhar a informação
com o empregador de forma limitada: só pode revelar se o trabalhador está, ou não, apto para
trabalhar. Informação adicional sobre o seu estado de saúde não é de divulgação permitida.
Depois temos a questão dos meios de vigilância à distância. Há aqui um princípio que
consta do artigo 20º CT: o empregador não pode utilizar meios de vigilância à distância no
local de trabalho com fim de controlar o desempenho do trabalhador. No entanto, esses meios
de vigilância à distância são admitidos sempre que tenham por finalidade a proteção e

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segurança das pessoas e bens, tendo em conta a profissão em causa. Têm-se levantado
problemas, por exemplo, em relação ao GPS: o GPS indica onde está o trabalhador a toda a
hora. Até que ponto não é o GPS um instrumento de controlo da atividade? Naturalmente que
é, mas não é apenas isso.

3.3.1. Assédio
(páginas 191 a 195 do livro do professor Leal Amado)
Consta a definição no artigo 29º, nº2 CT. No nº3 do mesmo artigo temos a
particularidade do assédio sexual.
O assédio é talvez a manifestação de maior fragilidade que o poder de direção pode
permitir. O assédio, seja de carácter sexual ou não, é sempre um comportamento
discriminatório (a não ser que o empregador esteja a assediar todos os empregadores). São
comportamentos lesivos da esfera mais íntima da liberdade pessoa: quer da dignidade, da
liberdade, da liberdade sexual, quer do direito a exercer a sua atividade de forma não
constrangida. Claro que está aqui em causa a segurança do trabalhador.
A entidade empregadora dispõe do poder de dirigir, conformar, controlar e fiscalizar a
atividade dos respetivos trabalhadores. Ponto é que, contudo, o exercício destes poderes
empresariais se processe de acordo com a boa fé, não originando constrangimentos ao
trabalhador, não afetando a sua dignidade, não lhe criando um ambiente intimidativo, hostil,
degradante, humilhante ou desestabilizador.
Exemplos: injúrias, agressões verbais, afirmações humilhantes, ameaças, difusão de
calúnias, isolamento do trabalhador, privação de aquecimento, proibição de acesso à casa de
banho, atribuição de tarefas excessivas ou demasiado exigentes para qualificação do
trabalhador, etc.
O assédio pode ser:

 Vertical: assédio entre o empregador/superior hierárquico e o trabalhador;


 Horizontal: assédio entre trabalhadores.

 Duradouro
 Reiterado
 Persistente

 Intencional: há um objetivo;
 Não intencional: há apenas um efeito.
A lei considera o assédio uma contraordenação que pode originar responsabilidade
penal (artigo 29º, nº5 CT).
Outras possíveis consequências do assédio laboral (moral ou sexual):

13
 Confere ao trabalhador lesado o direito a ser indemnizado pelos danos
patrimoniais e não patrimoniais sofridos (artigo 29º, nº4 CT);
 Pode dar azo ao despedimento com justa causa do autor do assédio;
 Constituirá justa causa de resolução do contrato por iniciativa do trabalhador;

Relacionado com a liberdade sexual e com a diferença de género, temos o artigo 30º e
o artigo 31º, refletem uma garantia especial sobre a tutela da igualdade e da não
discriminação por razões do género e da orientação sexual.

4. MODALIDADES DO CONTRATO DE TRABALHO


(páginas 71 a 93 do livro do professor Leal Amado)
Ainda hoje, o paradigma, a relação laboral standard o em re o normal o t o
de er de er a) er o “em re o or tem o ndeterm nado”. e te o arad ma or e de de
logo, é isto que resulta do texto constitucional. O artigo 53º CRP implica que o emprego deve
ser, por princípio, estável, pois um certo grau de estabilidade no emprego aumenta a qualidade
geral de vida do trabalhador e diminui a sua posição de debilidade face ao empregador. Só uma
relação temporalmente indeterminada é que confere estabilidade no emprego.
Contrato de duração indeterminada: não tem prazo previamente determinado pelas
partes. Pode durar 15 dias, como 15 anos.
Contrato a tempo completo: a duração esgota os limites máximos, atinge-os. O
contrato tem uma duração de 40 horas semanais e não tem prazo para ser finalizado.
Todo o nosso direito assenta neste paradigma. Todas as outras relações ditas “e e a ”
diferem em alguma destas coisas, ou em ambas. Quando a lei se refere às modalidades do
contrato de trabalho, nos artigos 139º CT e seguintes, refere-se a essas relações especiais do
trabalho, diferentes das paradigmáticas (de trabalho indeterminado ou completo).
Estas normas especificas têm uma natureza imperativa relativamente à fixação das
figuras especiais do contrato, pois estas figuras estão constituídas taxativamente. Não podem
ser criadas novas relações especiais de trabalho, apesar das que existem são flexíveis. Além de
taxativas, têm caracter excecional (embora os dados estatísticos pareçam discordar).

Vamos analisar os contratos a prazo.

4.1. Contrato a termo


(páginas 73 a 103 do livro do professor Leal Amado)
Um contrato a termo é um contrato de trabalho temporário no qual a terminação do
mesmo está previamente determinada. Isto restringe um princípio fundamental do direito à

14
segurança, pois entende-se que segurança é uma pessoa assumir um contrato com duração
indeterminada e este ser estável (direito à segurança no trabalho: artigo 73º CT).
Se o contrato a termo põe em causa um princípio/direito fundamental, porque é que não
é avaliado constitucionalmente? Porque às vezes as empresas têm atividades esporádicas e/ou
temporárias e compreende-se que devem poder contratar trabalhadores para satisfazer essas
necessidades. Numa economia de mercado, regulada pela oferta e pela procura, estas situações
são frequentes. Há aqui um grau de discricionariedade do empregador, que vai determinar se,
depois de satisfeita a necessidade esporádica, o trabalhador contratado a termo poderá trabalhar
de forma permanente. Esta discricionariedade é controlada obrigatoriamente, claro.
Por exemplo: quando o empregador tem uma necessidade temporária, de aumentar a
produção e sabe que os trabalhadores ao seu serviço não conseguem dar resposta, compreende-
se que possa contratar mais trabalhadores temporariamente.
Nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira, o preceito constitucional
ramen onado art o 53º CPR) n a e “a relação de trabalho de e er
temporalmente indeterminada, só podendo ficar sujeita a prazo quando houver razões que o
exijam, designadamente para ocorrer a necessidades temporárias das entidades empregadoras
e pelo período necessário at ação de a ne e dade ”.
Ou seja, se a necessidade for transitória, o correspondente contrato de trabalho pode
ser temporário, se a necessidade for permanente, então o contrato de trabalho deverá ser de
duração indeterminada.
Quando falamos do contrato a termo temos de distinguir dois aspetos: a justificação
objetiva do termo (o que significa que não há liberdade de contratação, há uma liberdade
condicionada a necessidades de natureza objetiva que sejam em si mesmas comparáveis aos
critérios objetivos de apreciação que a lei estabelece no artigo 140º); e a natureza do termo:
termo certo e termo incerto.
A lei estabelece critérios parcialmente diferentes para a contratação a termo certo e para
a contratação a termo incerto, como veremos adiante.
Em termos quantitativos, o termo certo é muito mais frequente.

4.1.1. Requisitos materiais do contrato a termo


V ta de ma orma teór a oder amo d zer e “então o empregador contrata a
termo quando quer”. Na erdade a no a le e tabele e re to de er ação obr atór a
para que seja validamente celebrado um contrato a termo.

No artigo 140º, nº1 CT temos a cláusula geral de admissibilidade dos contratos a


termo resolutivo. O artigo 140º, nº1 foi alterado pela Lei 93/2019 e foi acrescentada uma
expressão que, de certa forma já e ta a m l ta “objetivamente definidas pela entidade
empregadora”. Com isto, pretendeu-se mitigar alguma subjetividade que pudesse surgir (e
que ainda surge).

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Este número vem a ser complementado pelo número 2 do mesmo artigo, que fornece
uma enumeração exemplificativa daquilo que se entende or “ne e dade tem or r a da
em re a”. eja a no a le prevê aqui os fundamentos para essa contratação a termo. Esta
regulação das situações que legitimam a contratação a termo são um reflexo do princípio da
segurança: há uma liberdade, mas esta está fundada em situações que a lei tipifica.
laro e a de r ção do n mero de tal modo am la e abar a a e todo o
t o de ne e dade orrendo- e o r o de e “ ejam tem or r a a ne e dade eo
em re ador de na omo ta ”.
E, além das situações previstas no número 2, além as “ t açõe l a ” nas quais o
contrato a termo surge como instrumento privilegiado de satisfação de necessidades
temporárias, este pode ainda surgir, de acordo com o número 4, como:
a) Instrumento de dinamização do investimento empresarial;
b) Medida de fomento do emprego.
Em ambos casos é possível que se recorra ao contrato de trabalho a termo para satisfazer
necessidades permanentes das empresas.
Um critério explícito na alínea a) do nº4 é que, quando temos uma nova atividade, a lei
facilita uma contratação. Isto porque, quando uma empresa se constitui, a empresa dura a até o
mercado permitir que ela dure. A atividade é incerta. A lei pretende facilitar este tipo de
investimento nas empresas porque tal permite que, na possibilidade recorrente de surgir uma
nova atividade ou uma nova empresa, todos os trabalhadores sejam contratados a termo, uma
vez que, sendo contratados a termo, os benefícios que terão depois relativamente às
compensações (se o contrato vier a terminar) serão diferentes. Temos aqui uma restrição ao
princípio da segurança em nome do fomento do investimento. Claro que muitas empresas irão
falir, mas outras também irão prosperar. E, de qualquer dos modos, o que se pretende é
mitigar os riscos de abrir uma nova empresa e incentivar ao desenvolvimento.
Outro critério, este já em razão do fomento do emprego, estabelece uma discriminação
positiva dos desempregados de longa duração. Um trabalhador que sempre trabalhou a termo é
um trabalhador que não se pode dizer que seja um desempregado de longa duração, mas é um
trabalhador que vai beneficiar de alguns tipos de discriminação positiva também.
Por sua vez, o número 5 estabelece que cabe ao empregador a prova dos factos que
justificam a celebração do contrato de trabalho a termo.
Quanto à admissibilidade dos contatos a termo incerto: o número 3º expressa que a
contratação a termo incerto apenas pode ter lugar em certas situações tipificadas no número
dois. Ou melhor, o número 3 diz qual é a situação do número 2 em que a contratação a termo
não pode ser incerta, tem de ser certo: a situação da alínea f).
NOTA: o artigo 139º também sofreu uma alteração: hoje o contrato de trabalho a termo
resolutivo não pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho,
enquanto que anteriormente podia. Estas normas, que hoje são imperativas face ao contrato de
trabalho, não o eram para a contratação coletiva. Hoje, à exceção do número 2) do artigo

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140º e do artigo 145º, estas normas só podem ser modificadas por instrumentos legais, não
por contratação coletiva. São normas não dispositivas e imperativas absolutas.

4.1.2. Requisitos formais do contrato a termo


Depois temos a questão da limitação formal dos contratos a termo (artigo 141º CT).
Os requisitos formais estão nas alíneas do artigo. Um contrato a termo, para ser válido, tem de
conter estes elementos, qualquer inobservância leva à nulidade da cláusula de termo resolutivo
e o contrato será convertido num contrato standard (artigo 147º, nº1, al. c) CT).
Há dois elementos que são mais relevantes: um contrato tem de ter uma data de início
do trabalho e, se for um termo certo, uma data da terminação; se for a termo incerto, a indicação
do acontecimento resolutivo; além disso, cada contrato tem de discriminar também um
fundamento específico, dentro daquelas necessidades objetivas tipificadas no número 2 ou
no número 4 do artigo 140º. E não só: deve ser feita indicação expressa dos factos que
originam a necessidade (do motivo da contratação). A fundamentação é individualizante, deve
ser ad hoc. É preciso declarar no contrato que contratamos por motivo x e y. Este é um motivo
pelo qual muitos contratos a termo são inválidos.
Quer do ponto de vista material, quer do ponto de vista normal, o legislador pretende
não tornar a contratação a termo em algo sem controlo, mas sim limitada objetivamente.

4.1.3. Duração
O contrato tem uma duração pré-determinada pelas partes, sendo que esta pode ser certa
ou incerta. A lei admite e compreende que as partes convencionem a duração de um contrato a
termo, mas esse período convencionado terá de respeitar as balizas legais.

4.1.3.1. Duração dos contratos a termo certo


O contrato a termo certo tem uma duração máxima de 2 anos, artigo 148º, nº1 CT. Não
há prazo mínimo para o contrato a termo (embora muita gente diga que é 6 meses), há apenas
prazo máximo.
O contrato a termo, como qualquer contrato, pressupõe o acordo das partes. Ou seja, há
uma liberdade (quase) total de para fixar a duração do contrato. Porque é que é quase total?
Podemos dizer que, em matéria de duração, a lei dá uma primazia à satisfação das
necessidades do trabalhador, mas há um limite da liberdade do empregador imposto pelo
número 2 do artigo 148º CT. Esta norma limita parcialmente a liberdade de escolha do
empregador, pois estabelece uma contemporização, introduzindo aqui um limite de
segurança, que acaba por ser parcialmente incompatível com o artigo 140º, nº1 CT.
Quando o empregador pretende contratar a termo certo por duração inferior a seis
meses, a lei impõe dois cuidados:

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 O contrato só pode ser celebrado em situação prevista em qualquer das alíneas
a) a g) do número 2 do artigo 140º CT;

 O empregador deve pautar ou definir a duração do contrato com maior


aproximação possível à necessidade objetiva – tem de equiparar ou tornar
equivalente a duração do contrato com a duração da necessidade temporária.
Temos aqui quase uma imposição legal de equiparar estas duas vertentes. Ou
seja, a duração do contrato não pode ser inferior à duração prevista para a tarefa
ou serviço a realizar.
Se se verificar, em condições de normalidade, que a duração da necessidade for superior
à duração do contrato, há aqui um desajustamento. Como é que a lei resolve isto? O número 3
do artigo 148º resolve a questão: haverá aqui uma conversão da contratação. Há um descuido
imputável ao empregador, há uma censura. O número 3 implica, para estes casos de
desajustamento, que haverá uma responsabilidade por parte do empregador durante 6 meses
(salarial, etc.), pois o contrato (que foi celebrado com uma duração demasiado curta para a
necessidade) passará a considerar-se celebrado pelo prazo de seis meses.

Quanto à renovação de contratos a termo certo (artigo 149º CT):


Por regra, o contrato renova-se no final do termo, por igual período, se outro não for
acordado pelas partes (número 2 do artigo 149º CT). Para o contrato não ser renovado, as partes
têm de acordar que assim o seja (número 1 do artigo 149º), pelo que alguma das partes terá de
acionar a caducidade (artigo 344º CT).
O contrato pode ser renovado até 3 vezes, sendo que a duração total das renovações não
pode exceder a do período inicial daquele (número 4 do artigo 149º CT).
Qualquer alteração em matéria de duração terá de ser expressa. A renovação, em teoria,
não pode ser uma forma de fraudar a necessidade temporária na qual teve origem o contrato,
ou seja, a necessidade que esteve na origem da constituição do contrato a termo deve manter-
se na renovação (artigo 149º, nº3 CT). Se já não subsistir o motivo justificativo da contratação
original, já não ocorrerá a renovação contratual. Esta temporalidade objetiva deve
acompanhar toda a vida/duração do contrato a termo. A lei só exige que haja esta duração
temporária e depois o controlo verificar-se-á posteriormente.
Se as partes pretenderem renovar o contrato por período diferente do inicialmente
acordado, essa prorrogação deverá observar os requisitos formais constantes do artigo 141º.

4.1.3.2. Duração dos contratos a termo incerto


O contrato a termo incerto tem duração máxima de 4 anos (antes era 5), artigo 148º,
nº5 CT.

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Nos contratos a tremo incerto há uma maior instabilidade para o empregador no sentido
de saber quando termina a necessidade. Para estes casos, a duração tem um regime especial de
caducidade de contrato: Artigos 147º, nº2, al. c); 345º CT.

4.1.3.3. Contratos de muito curta duração


A nossa lei admite ainda e tipifica um regime especial para os contratos de muito curta
duração (duração máxima de 35 dias): artigo 142º CT.
Não deveremos ter o mesmo tratamento, a nível de segurança no emprego, quando a
duração é fugaz (1 semana, 2 semanas, etc.). Quanto a estes contratos: o regime anterior
centrava-os nas empresas turísticas, mas agora o regime alargou-se, por exemplo, a
necessidades no setor agrícola.

Nestes casos de atividade cuja duração não seja superior a 35 dias, o contrato não está
sujeito a forma escrita para efeitos de validade. O empregador deve comunicar a sua celebração
e o local de trabalho ao serviço da segurança social, mediante formulário eletrónico. Note-se
que, a duração total destes contratos de trabalho entre o mesmo trabalhador e o mesmo
empregador, não pode exceder os 70 dias de trabalho no ano civil.

Em suma, temos 3 regimes de duração: regime normal (para o termo certo); regime de
contratos a termo certo inferiores a 6 meses; e regime de contratos de muito curta duração.
Não se considera como regime de duração o que falamos para os contratos a termo incerto
porque estes caem sobre um regime de caducidade que vermos mais tarde.

4.1.4. Sucessão dos contratos a termo


Há um outro aspeto que foi uma consequência da diretiva sobre a contratação a termo
e tem que ver com a sucessão dos contratos a termo (artigo 143º CT).
A lei limita a sucessão destes contratos. Porquê? Bom, se a necessidade é temporária,
ela, ou se esgota, ou pode acontecer de estas necessidades se tornarem atividade normal (e aí
deixar de fazer sentido haver contratos a termo). A lei pretende que não se abuse do contrato a
termo para satisfazer necessidades permanentes. Formalmente, a lei entende que uma
necessidade deixa de ser temporária quando o mesmo trabalhador a satisfaz por mais de 2
anos. A partir daí, torna-se atividade normal e cabe ao empregador contratar como tal. O que
acontecia é o empregador deixava acabar o contrato de um trabalhador, esse trabalhador ia de
férias e quando voltasse era contratado de novo a termo (e até com as mesmas condições). Isto
é uma forma descarada de contornar a lei, porque na verdade não há interrupção no contrato de
trabalho (o trabalhador também tem direito a férias), o trabalhador continuará a satisfazer as
mesmas necessidades por mais de 2 anos.

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O artigo 143º estabelece que o empregador que tenha celebrado um contrato a termo,
o qual tenha cessado, não pode celebrar um contrato a termo para o mesmo posto de trabalho
sem ter decorrido um período de tempo equivalente a um terço da duração do contrato.
E se fosse uma prestação de serviços inicialmente e depois celebra um contrato a termo?
A lei, como desconfia destas manobras, equipara os dois. Ou seja, o artigo 143º aplica-se tanto
à prestação de serviços, como aos contratos a termo. A lei, de certa forma, desvaloriza aqui a
figura do contrato e aplica a norma a todas as figuras de trabalho temporário.
A violação desta regra tem uma consequência: o contrato converte-se num contrato sem
termo. Há outro aspeto ainda mais curioso: se o contrato é celebrado com a mesma pessoa para
o exercício da mesma atividade, o contrato transforma-se num contrato sem termo; mas e se
forem pessoas diferentes contratadas para o mesmo? (Por exemplo: acaba o contrato de
prestação de serviços de A com B para fazer X e B contrata com C uma prestação de serviços
para fazer X também) Aqui não há equiparação. A lei preocupa-se mais com o tipo de
atividade/necessidade em causa do que com quais os trabalhadores que satisfazem a mesma.
Ou seja, há mais preocupações objetivas do que subjetivas. O demonstrado no exemplo é
permitido pela lei.

4.1.5. Contrato de trabalho sem termo (consequência)


O artigo 147º: se o contrato não cumprir a forma, também será convertido num contrato
sem termo. Todos estes limites que sancionam o contrato a termo tem a consequência de haver
uma conversão do contrato. Se o empregador não se preocupou com evitar estas limitações no
contrato a termo, ele considera-se ab initio contrato sem termo.

AULA DE 17/10/2019
4.1.6. Caducidade dos contratos a termo
4.1.6.1. Caducidade dos contratos a termo certo
Está regulada no artigo 344º CT.

Uma vez que o contrato foi fixado por um prazo temporal, vencido este, o contrato
caduca. No entanto, aqui a figura da caducidade não opera nos moldes tradicionais. Nos
contratos em geral, o contrato caduca automaticamente. Nos contratos de trabalho a termo certo
temos uma peculiaridade: o contrato, para caducar, está dependente de uma comunicação do
empregador ou do trabalhador à outra parte.
Ou seja, a caducidade não opera aqui automaticamente, carecendo de ser acionada pelo
sujeito nela interessado. Isto é, nos termos do artigo 344º, o contrato só caduca no final do
prazo estipulado quando o empregador ou o trabalhador comuniquem à outra parte essa
vontade 15 ou 8 dias antes, respetivamente (denúncia escrita com aviso prévio).

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O contrato, vencido o respetivo prazo, se não for denunciado pela entidade empregadora
ou pelo trabalhador, renova-se. Portanto, a caducidade tanto pode operar no primeiro contrato
como num contrato sucessivo.
Caso o contrato a termo certo caduque por iniciativa do empregador, é justo que o
trabalhador seja compensado pela perda do emprego, em cuja continuidade estava interessado.
O trabalhador, nestes moldes, tem direito a compensação correspondente a 18 dias de
retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, nos termos do artigo
366º CT.
Caso o contrato caduque em virtude de declaração do trabalhador, a lei já entende que
aquela compensação não lhe será devida, pois a perda do emprego deve-se aqui à decisão do
trabalhador.
Há uma omissão no artigo 344º no que toca à compensação do trabalhador nos casos
em que as partes inserem no contrato uma cláusula de caducidade automática (artigo 149º, nº1
CT). Nesta hipótese, o contrato caducará pelo simples decurso do prazo, sem prévia
comunicação de qualquer um dos sujeitos. O professor Leal Amado julga que o trabalhador
terá na mesma direito à compensação prevista no nº2 do artigo 344º. Aqui temos de apelar à
interpretação racional. A inclusão desta cláusula de caducidade no contrato dever-se-á, na
maior parte das vezes, à vontade da entidade empregadora, à qual o trabalhador se limita a
aderir. Ou seja, neste caso, o contrato caducará também por vontade do empregador. E, mais
ainda, a lei não parece ter criado esta compensação em ordem a compensar a frustração de uma
legítima expectativa do trabalhador, a expectativa de renovação do seu contrato a termo, mas
antes concebeu a lei esta figura de um modo mais lato, em vias de compensar o trabalhador
pela perda do seu emprego. É isto que justifica que este seja compensado na mesma no caso de
uma cláusula de caducidade automática.

4.1.6.2. Caducidade dos contratos a termo incerto (artigo 345º CT)


No contrato a termo incerto, como não temos prazo pré-definido, a caducidade pode
operar a partir do momento em que a função do trabalhador se vá esgotando. Aliás, em bom
rigor, pode dizer-se que o contrato a termo incerto caduca, automaticamente, aquando da
verificação do termo resolutivo. Ainda assim, o CT procura evitar que o trabalhador seja
surpreendido pela brusca extinção do seu contrato, pelo que obriga o empregador a proceder a
um aviso prévio.
O empregador, portanto, tem de comunicar a cessação do contrato ao trabalhador com
antecedência mínima de 30 (se o contrato tiver durado até 6 meses) ou 60 dias (se o contrato
tiver durado de 6 meses a 2 anos ou período superior).
No entanto, a falta de cumprimento deste dever do empregador de conceder o pré-aviso
não implica qualquer renovação do vínculo contratual, nem significa que, por si só, o contrato
se transformará num contrato sem termo. O aviso prévio não é condição indispensável para a
caducidade do contrato. Isto porque, nos contratos a termo incerto, há uma indeterminação da
cessação das funções. A duração do serviço não é certa. Prevendo esta possibilidade, o

21
legislador não associa ao incumprimento pré-aviso a mesma consequência no contrato incerto
que associa no termo certo. No caso do termo incerto, se o empregador não respeitar os
prazos de pré-aviso, o contrato não se converte imediatamente, mas daí decorrerá um dever
de indemnizar o trabalhador pelo não cumprimento do prazo.
Essa compensação pelo incumprimento do dever de emissão do aviso prévio adicionar-
se-á ao montante indemnizatório previsto no nº3 do artigo 345º CT, ao qual o trabalhador tem
sempre direito e que é calculada nos termos do nº4 do mesmo artigo.
Modalidade especial da caducidade: artigo 147º, nº2, al c): considera-se sem termo o
contrato de trabalho quando, celebrado o contrato a termo incerto, o trabalhador permaneça
em atividade após a data de caducidade indicada na comunicação, ou, na falta desta,
decorridos 15 dias após a verificação do termo.
O que é especial sobre esta modalidade? Os prazos de pré-aviso, se não forem
cumpridos, dão lugar a uma indemnização. Vamos supor que se esgotam as funções de certo
trabalhador. Se o empregador não deu a comunicação em forma pré-aviso e/ou se a atividade
do trabalhador cessou, o empregador ainda pode fazer caducar o contrato nos 15 dias seguintes
(tendo de indemnizar nos dias o trabalhador em falta). Só se esses 15 forem ultrapassados é
que o contrato se converte num contrato sem termo.
NOTA: muitas vezes são contratados 30 trabalhadores a termo incerto no mesmo dia
para a mesma obra. Mas depois não acaba a necessidade dos mesmos no mesmo dia. Aqui a
caducidade não opera para todos em simultâneo. A caducidade vai-se verificando na medida
em que a atividade do trabalhador se vai esgotando. Os contratos vão cessando sucessivamente.

5. PODERES DA ENTIDADE EMPREGADORA

5.1. Breve referência ao período experimental


(páginas 157 a 163do livro do professor Leal Amado)
O primeiro período do contrato não deixa de ser uma fase de adaptação. Essa fase tanto
se pode verificar na esfera do empregador, como na esfera do trabalhador. Este período de
adaptação é designado por período experimental.
Con orme d õe o art o 111º nº1 do CT “o período experimental corresponde ao
tempo inicial de execução do contrato de trabalho, durante o qual as partes apreciam o
interesse na sua manutenção”.

Trata-se, em boa verdade, de uma figura cautelar, uma medida de precaução ou


prudência.

O período experimental consiste num elemento natural do contrato, não carecendo de


ser estipulado para existir, antes carecendo de ser expressamente excluído, por escrito, para
não nascer com o contrato (artigo 111º, nº3 CT).

22
Neste período experimental vigora o princípio da segurança, mas vigora numa vertente
mais relaxada. Isto porque a lei confere ao período experimental (que já decorre dentro da
execução do contrato) uma particularidade: durante o período experimental qualquer das partes
pode por fim ao contrato sem qualquer fundamentação. Isto é, pode denunciar o contrato sem
aviso prévio, com a exceção do nº4 do artigo 114º CT, e sem invocação da justa causa, não
havendo lugar a qualquer indeminização ou consequência.
Verdadeiramente, não há aqui segurança no emprego. Mas não há uma liberdade total,
porque não podem ser invocados motivos discriminatórios (despedir a trabalhadora porque esta
engravidou não cabe aqui, por exemplo). Não é preciso nenhuma fundamentação, mas não pode
haver motivo discriminatório. E porque é que hiberna aqui o princípio da segurança? Porque,
sendo um período de prova, o empregador vai avaliar o trabalhador e pode concluir que, afinal,
este não corresponde à sua necessidade (o empregador aprecia negativamente o trabalhador).
Do lado o trabalhador passa-se a mesma coisa, este vai-se adaptando ao ambiente de trabalho,
à sua função e aos seus colegas e pode decidir que não corresponde o emprego às suas
expectativas.

Este relaxamento excessivo do princípio da segurança não deixa de poder ser abusado.
O nosso legislador, na verdade, fomenta esse abuso. E com a legislação atualizada este ano
fomenta-o ainda mais.
Não será isto inconstitucional?

Durante o período experimental, a lei permite aquilo que a CRP proíbe no seu artigo
53º: o despedimento sem justa causa. O período experimental traduz-se, na verdade, num
instituto que coloca o trabalhador numa posição de extrema vulnerabilidade, visto que, ao longo
desse período, vigora a regra do “de ed mento l re”. Q er to dizer que o período
experimental é inconstitucional? Não, mas encontra-se no limiar de inconstitucionalidade. Isto
porque o período experimental surge como um instituto vocacionado para reduzir o risco
empresarial, conferindo ao empregador e ao trabalhador a possibilidade de verificar a
posteriori aquilo que não são capazes de verificar a priori (no processo de recrutamento). Aqui,
o que salva esta figura da inconstitucionalidade é a sua duração, a qual deve respeitar o
princípio da proporcionalidade: o período experimental só deve existir durante o espaço de
tempo necessário para se verificar se o trabalhador possui ou não as qualidades requeridas para
o desempenho do cargo para o qual foi contratado.

5.1.1. Duração do período experimental


As normas quanto à duração do período experimental são nomas relativamente
imperativas, visto que as fontes inferiores não podem aumentar a duração deste período, apenas
podem reduzi-la (artigo 112º, nº5 CT).

23
 Tratando-se de um contrato a termo: durará 30 ou 15 dias, consoante a duração
do contrato atinja, ou não, os 6 meses;

 Tratando-se de um contrato por tempo indeterminado:

o 90 dias para a generalidade dos trabalhadores;

o 180 dias para trabalhadores em cargos de complexidade técnica; elevado


grau de responsabilidade ou especial qualificação; que desempenhem
funções de confiança; que estejam à procura do primeiro emprego;
desempregados de longa duração

o 240 dias para os cargos de direção ou cargo superior.


Relativamente aos trabalhadores que exercem funções de direção, temos uma situação
muito sensível, porque a confiança pessoal é determinante para a prestação de trabalho.
Compreendem-se os 240 dias porque são trabalhadores que ficarão a conhecer os negócios e
os segredos da empresa. Logo, é necessário um prazo experimental maior. Ainda assim, a
questão do prazo é pouco explicada.

Onde as coisas são inconstitucionais é no que toca período experimental de 180 dias
para desempregados de longa duração e para quem está à procura do primeiro emprego, leia-
se, primeiro emprego sem termo.
A norma foi objeto de muitas críticas, porque não está aqui em causa se estes
trabalhadores são bons ou maus. A lei expressamente admite, por razões subjetivas, que o
contrato destes trabalhadores possa cessar sem qualquer fundamento técnico ou recompensação
num período até 180 dias. Porque é que isto é inconstitucional? Estes trabalhadores têm mais
dificuldades porque ou são de jovens sem experiência, ou desempregados de longa duração,
que são maioritariamente pessoas de mais idade. E, portanto, esta norma traduz uma
discriminação em razão das pessoas e da sua capacidade profissional. É uma discriminação
subjetiva. Temos uma norma discriminatória que não fomenta o emprego (ou apenas o fomenta
até 180 dias).
No meio disto tudo o certo é que esta duração de 180 dias de período experimental
tem uma razão estatística: fica mal ao país dizer que tem muitos desempregados ou que tem
muitos trabalhadores com contratos de trabalho a termo.
Por exemplo, quanto à duração do período experimental para os trabalhadores em geral:
esses 90 dias podem ser os 3 meses de verão. E enquanto que a fundamentação do contrato a
termo é por vezes difícil, aqui não é necessária fundamentação para contratar. Contrata-se por
90 dias e depois termina-se sem necessidade de fundamentar ou indemnizar (no contrato a
termo é necessário indemnizar). Além disso, no contrato a termo, ainda há aquela possibilidade
de conversão do contrato. Aqui não há nada disso, há uma facilidade de contratar e de terminar
contrato.

24
Um jovem trabalhador com contrato sem termo e cujo primeiro contrato termine com o
fim do período experimental (neste caso, de 180 dias), já deixa de ser um trabalhador à procura
do primeiro emprego. Estes deixam de beneficiar do estatuto de discriminação positiva.

5.2. Poder de direção


(páginas 181 a 185 do livro do professor Leal Amado)

Sendo o contrato bilateral, o contrato de trabalho impõe um conjunto de deveres e de


direitos para ambas as partes. A relação laboral analisa-se numa relação de poder na qual o
trabalhador surge como sujeito juridicamente subordinado e adstrito, entre outros, ao dever de
obediência relativamente às ordens e instruções do empregador. Assim, a inequívoca posição
de domínio ocupada pelo empregador nesta relação decompõe-se na seguinte tríade de poderes
patronais: poder diretivo, poder regulamentar e poder disciplinar.

A. Poder de direção propriamente dito


O empregador goza de uma espécie de poder de comando, cabendo no âmbito do poder
de direção a faculdade de determinar a concreta função a exercer pelo trabalhador, o poder de
conformar a prestação laboral e ainda poderes de vigilância e controlo sobre a atividade
desenvolvida pelo trabalhador em sede de execução contratual.

A lei enumera no artigo 127º CT e seguintes o conjunto de direitos e deveres de ambas


as partes. O princípio geral é o princípio da boa fé (as partes devem proceder de boa fé), sendo
este um princípio pré-contratual.

B. Poder disciplinar
O empregador, além de governar e legislar, tem o poder de julgar e punir, nos termos
do artigo 98º CT.
O poder disciplinar é um poder sensível, visto que, no âmbito das relações de trabalho,
admite-se que um privado possa impor sanções a outro privado. Ainda para mais é um privado
com interesse direito da relação contratual e no possível conflito. Estamos perante um genuíno
poder punitivo privado.
Este poder constitui um desvio a dois princípios basilares do Direito: o princípio da
justiça pública e o princípio da igualdade das partes.
Infração disciplinar: violação, por culpa do trabalhador, de um dos seus deveres no
âmbito da relação laboral, os quais são elencados pelo artigo 128º CT. A lei prevê que o
empregador (particular afetado pelo comportamento do trabalhador), que é um juiz em causa
própria, deva ajuizar esse comportamento.

25
O arsenal sancionatório à disposição do empregador encontra-se estabelecido no artigo
328º, nº1 CT. No entanto, um instrumento de regulação coletiva de trabalho pode prever outras
sanções disciplinares, desde que não prejudiquem os direitos e as garantias do trabalhador.
Este poder de sancionar está restringido pela lei através de normas procedimentais.
Podemos verificar dois tipos de limites:

 Limites processuais/procedimentais:

o Está sujeito à legalidade processo de despedimento por justa causa, não pode
simplesmente despedir um trabalhador sem fundo legal;

o Está sujeito aos procedimentos legais do processo disciplinar:

i. Fase da acusação: a acusação tem de circunstancial, tem de ser


descrita/fundamentada. O trabalhador tem de saber de que é que está a
ser acusado para se pode defender. Ao empregador cabe em qualquer
processo disciplinar discriminar a infração e fundamentar a mesma.

ii. Fase de defesa (princípio do contraditório): ao trabalhador tem de


ter garantido, em prazo razoável, o seu direito de defesa. Cabe ao
empregador atender aos meios de prova que o trabalhador invoca em
sua defesa. O empregador está obrigado às diligências exigidas pelo
trabalhador.

iii. Fase de decisão: o processo termina com a aplicação da sanção.

o O empregador não dispõe de quaisquer poderes criativos unilaterais, não


podendo inventar (por exemplo em sede de regulamentação interna), nem
aplicar sanções disciplinares distintas das previstas na lei no artigo 328º, ou
nos instrumentos de regulamentação coletiva;

o O poder disciplinar do empregador está sujeito ainda aos princípios gerais


consagrados no Código de Trabalho:

i. Princípio da proporcionalidade: a sanção deve ser proporcional à


gravidade da infração e à culpabilidade do infrator (artigo 330º, nº1
CT);

ii. Princípio non bis in idem: não pode ser aplicada mais do que uma
sanção pela mesma infração (artigo 330º, nº1, in fine CT);

ii. Princípio do contraditório: a sanção disciplinar não pode ser


aplicada sem a audiência prévia do trabalhador (artigo 329º, nº6 CT)

26
iv. Princípio da celeridade: o trabalhador não deve ficar sujeito, por longo
período de tempo, à ameaça de vir a ser punido pelo empregador
(artigo 329º e nº3 do artigo 330º CT).

 Limites temporais:

o Quanto aos prazos: uma infração disciplinar (grave ou não grave) não deve
acompanhar indefinidamente a vida do trabalhador nesse emprego. Logo, há
prazos. Passados estes prazos, a infração deixa de ser relevante do ponto de
vista disciplinar. Não se pretende que a infração afete toda a vida do contrato
de trabalho, nem o seu desenvolvimento

 Prazos de prescrição para conhecer da infração: o empregador


tem um ano para conhecer da infração. Se o empregador não agir
dentro de um ano da prática da infração, não pode agir mais;

 Prazos de caducidade para exercer o processo disciplinar: a


partir do momento em que o superior hierárquico/empregador tiver
conhecimento da infração, tem os 60 dias subsequentes para intentar
o processo. Não interessa o modo de conhecimento. Estes 60 têm de
se conjugar com o ano de prescrição. Decorrido um ano, se o
empregador nada fizer, a infração prescreve. Se conhecer da infração
1 dia antes de a infração completar um ano desde que foi realizada,
o empregador só tem 1 dia para intentar a ação. O prazo de 60 dias
decorre dentro do prazo de um ano;

 Prazo do nº3 do artigo 329º CT: iniciado o processo dentro do prazo


regular, o empregador tem um ano para decidir. Se não o fizer, a
infração prescreve.

 Artigo 330º, nº2: tomada a decisão, o empregador tem 3 meses


subsequentes para a aplicar.
Iniciado o procedimento disciplinar, o empregador pode suspender o trabalhador se a
presença deste se mostrar inconveniente. A suspensão, neste caso, priva o trabalhador de
exercer o seu direito ao trabalho. Daí que, uma vez que estão aqui dois interesses em confronto,
há que estabelecer uma conformação. Primeiro, a presença do trabalhador é inconveniente para
quê/quem? Para o empregador? Para os colegas? O professor crê que apenas razoável que o
trabalhador seja suspenso quando a sua presença seja inconveniente ao apuramento da verdade
ou possa pôr em causa o normal desenvolvimento do procedimento. No entanto, os tribunais
aplicam esta norma à letra. Note-se que a suspensão pode também funcionar como uma sanção
prévia.

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Ao trabalhador cabe sempre o recurso hierárquico ou o recurso judicial. O empregador
não só faz de ministério público como faz de juiz. Naturalmente, acima do trabalhador na
empresa não há ninguém, portanto o meio de defesa aqui será o recurso judicial. No caso de
ter sido sancionado pelo superior hierárquico há sempre as duas possibilidades de recurso. De
todo modo, o recurso hierárquico não afasta o recurso judicial.
Ainda assim há um controlo legal: nº1, artigo 331º CT (sanções abusivas). A própria
lei introduz, de certa forma, alguma restrição à falta de prudência do empregador. Estas
restrições estão diretamente relacionadas com a tutela de garantias do trabalhador. Porque é
que a lei considera estas sanções abusivas? Porque todas elas têm que ver com a defesa do
trabalhador e põe em causa as suas garantias (artigo 129º CT).
A lei também estabelece uma presunção de sanção abusiva (nº2 do artigo 331º CT): o
trabalhador é sancionado por uma falta, mas, se essa sanção tiver lugar até 6 meses depois dos
factos mencionados no nº1 do mesmo artigo, ou até 1 ano após a denúncia, presume-se o abuso.

AULA DE 18/10/2019
C. Poder regulamentar
Regulamento interno (artigo 99º CT)

Funciona como uma proposta contratual.

Uma coisa é no âmbito do poder de direção o empregador determinar aspetos da relação


de trabalho, outra coisa é no âmbito do regulamento interno o empregador determinar certas
alterações à relação de trabalho.
A lei impõe, por uma questão de controlo, que o regulamento interno, na sua elaboração,
deva ouvir a comissão de trabalhadores ou, na falta desta, o representante dos sindicatos dos
trabalhadores que existam nessa empresa. A lei impõe que, além de disto, que o regulamento
seja publicado.
O regulamento interno pode funcionar como uma proposta contratual. O empregador,
através do regulamento interno pode alterar determinadas condições de trabalho. Nos termos
do artigo 104º, a vontade do empregador pode-se manifestar através de regulamento interno da
empresa, e a do trabalhador pela adesão expressa ou tácita ao mesmo. Ou seja, presume-se a
adesão do trabalhador se este nada disser dentro dos limites da lei (número 2 do mesmo artigo).
Isto, claro, porque foram ouvidos os representantes dos trabalhadores e porque o regulamento
foi publicado. Esta proposta, elaborada por via do regulamento, acaba por produzir efeitos se
o trabalhador não se opuser por escrito (artigo 104º, nº2 CT). Isto, no entanto, não deixa de
limitar a liberdade de escolha do trabalhador, pois cria uma situação de constrangimento da
esfera de quem crê que se deve impor contra o regulamento.

6. FORMAS ESPECIAIS DE TRABALHO


(páginas 103 a 185 do livro do professor Leal Amado)

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Algumas estão contempladas no nosso código, outras não. São abordadas em Direito
do Trabalho II (4º ano).
A partir dos artigos 150º e seguintes a lei regula os contratos de trabalho especiais:

 Trabalho de contrato a tempo parcial (não tem grande especificidade): permite


conciliar a vida pessoa/as aulas com a vida laboral. É um contrato com muito
alarido, mas, no entanto, a grande maioria dos trabalhadores que celebram contrato
a tempo parcial fazem-no porque não têm oportunidade para celebrar um contrato a
tempo completo. A única exceção é a Holanda, onde a cultura é uma de celebração
de contratos a tempo parciais;

 Trabalho intermitente: tem em vista as empresas que exerçam a sua atividade com
intensidade variada ou com descontinuidade. Ou seja, tem uma atividade irregular
ao longo do ano. Pode, no entanto, haver nestas empresas períodos de não trabalho,
o que torna este tipo de contrato menos apetecível. É um tipo de contrato duradouro,
de certa forma. Se for um contrato sem termo, que é normalmente, tem este
problema a nível económico;

 Comissão de serviço: têm e le antado d da anto re et a


on t t onal dade. t re ta ara l are ara a ela nçõe “lo a ”. ão
os lugares de confiança e de administração das empresas. São funções em que o
trabalhador tem conhecimento dos segredos da empresa. Os cargos de
administração ou de chefia pressupõe certa competência técnica, claro, mas não é
isso que é de mais relevante aqui. Neste caso, prima-se pela confiança do
empregador. Qualquer das partes pode fazer cessar, a todo o tempo, a comissão de
serviço, sem ter de evocar o despedimento por justa causa. Isto precisamente por
causa deste carácter predominantemente pessoal em que se insere a confiança. Se o
trabalhador perder a confiança do empregador, não fará mais sentido a comissão de
serviço. Nestes casos, e por isto mesmo, não há segurança, nem estabilidade, nem
garantia de emprego. Daí a dúvida sobre a sua constitucionalidade.

Comissão de serviço in: recruta-se/promove-se internamente um trabalhador à


comissão de serviço.

Comissão de serviço out: alguém que não pertence à empresa é contratado para a
comissão de serviço.

Na in o trabalhador mantém o contrato original/anterior. Na comissão out, como o


trabalhador não pertencia à empresa, não tem qualquer contrato prévio na empresa,
logo, não tem uma garantia.

 Teletrabalho: é uma atividade a realizar por meio dos meios de comunicação. Por
outro lado, é uma atividade que não é prestada no local de trabalho habitual

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(habitualmente fora da empresa). É caracterizado pelo meio de trabalho e pelo local
de trabalho;

 Trabalho temporário: é uma modalidade 100% especial. Temos uma relação de


trabalho de partida: empregador, trabalhão e há um terceiro a conferir ao contrato
temporário a sua especificidade. Como é que são designadas estas três pessoas?
Trabalhador, empresa de contrato temporário e o terceiro, que é o
utilizador/empresa utilizadora. Porquê? Porque a empresa de trabalho temporário
não exerce qualquer atividade senão agir como um intermediário e colocar os
trabalhares noutras empresas utilizadoras. O contrato de trabalho temporário, entre
outras coisas, tem a natureza especifica: o trabalhador compromete-se a trabalhar
nas empresas que lhe seja designada pela empresa de trabalho temporário. Onde ele
irá exercer o seu trabalho é na empresa utilizadora, na verdade. Outra diferença:
quem dirige o contrato de trabalho não é a empresa de trabalho temporário, é a
empresa utilizadora. O trabalhador pode até trabalhar para 5 empresas utilizadoras
ao mesmo tempo. Há, portanto, uma divisão da entidade empregadora relativamente
à direção da atividade do trabalhador.

AULA DE 24/10/2019
7. OBJETO (QUID) DO CONTRATO DE TRABALHO
(páginas 197 a 200 do livro do Professor Leal Amado)
A estabilidade do objeto laboral tem algum interesse e é objeto de proteção entre os
artigos 115º a 120º do CT. Isto porque a mutação desse mesmo objeto, a atividade laboral, pode
criar no trabalhador situações de inabilidade para exercer essa atividade. Daí que o princípio
geral entre nós seja aquele plasmado no artigo 115º, nº1: aquando da celebração do contrato de
trabalho, as partes devem determinar por acordo o conjunto de tarefas ou serviços
concretamente definidos ou individualizáveis que o trabalhador irá prestar.

A nossa lei consagra o princípio da estabilidade do objeto contratualizado. Quer isto


dizer que, muito embora sejam as partes a fixar o quid (o objeto) do contrato, uma vez fixado
esse objeto, ele deve permanecer constante no tempo, pelo que as expectativas das partes
recaem nesse conjunto de atividades acordado.

Como é que essa atividade/objeto é determinada? Pode ser determinado em contrato,


ou pode também ser determinada através da remissão para o regulamento interno ou para a
convenção coletiva aplicável, que muitas vezes contém um conjunto de indicações
relativamente à limitação da atividade (artigo 115º, nº2 CT). Temos uma delimitação funcional.

Ou o contrato enumera as diversas funções que são objeto do negócio, ou então o


contrato limita-se a indicar uma certa categoria profissional, cujo conteúdo vai limitar o objeto
da prestação. O que é isso da categoria profissional? Professor, arquiteto, soldador, etc, são
categorias profissionais. Essas categorias estão associadas a um conjunto de funções, são uma
forma de exprimir o objeto do contrato de trabalho. As convenções coletivas contêm quase um

30
dicionário dessas categorias, especificando as funções adstritas a cada uma. No entanto, a
empresa também pode especificar as funções de cada categoria.
A lei acautela também as situações em que o objeto da atividade laboral implica a
prática de negócios jurídicos: o contrato de trabalho confere legitimidade aos trabalhadores
para negociarem em nome da entidade empregadora (em nome de outrem), se assim for
necessário.
No exercício da atividade do trabalhador, o empregador dirige e o trabalhador deve
submeter-se de acordo com essas ordens (dentro do exigível pela boa fé). No entanto, há
atividades em que, por motivos técnicos, os trabalhadores devem gozar de alguma autonomia
ou independência técnica/deontológica de exercício maior e, nesses casos, o contrato de
trabalho não a pode prejudicar em detrimento do poder de direção do empregador (artigo 116º
CT). Por exemplo: profissão de médico, de enfermeiro, onde há deveres de confidencialidade
que a relação de trabalho não pode anular. Portanto, dentro da sua atividade laboral, gozam
dessa autonomia, até porque, não raras vezes, o trabalhador é o que mais conhece da sua
profissão, da sua arte em específico, não se devendo ter de justificar por certas escolhas.
Há ainda determinadas atividades (e cada vez mais), que exigem carteira
profissional/título formação profissional para atestar as capacidades do trabalhador. Quer isto
dizer que estas atividades só poderão ser exercidas por quem tiver certa carteira profissional,
sendo esta um título habilitante para exercer aquelas funções. A lei considera que o contrato
celebrado por quem não tenha essa carteira profissional e/ou essa competência, é nulo, pois
essas competências são um requisito/elemento indispensável para o celebrar (são requisitos
legalmente indispensáveis), como consta do artigo 117º, nº1 CT.
Pode também acontecer o caso de o trabalhador, que inicialmente era titular de uma
carteira profissional, ficar sem a mesma. O contrato caduca por falta deste elemento essencial
(artigo 117º, nº2 CT).
Voltando à questão principal: os contratos devem ser cumpridos nos termos em que
foram fixados: nos termos do artigo 118º, nº1 CT, o trabalhador deve poder exercer as funções
para as quais foi contatado (princípio da estabilidade).

No entanto, compreende-se que, sendo dinâmica a atividade (há muitas mudanças da


tecnologia e do saber, por exemplo), os trabalhadores, que têm determinada formação de base,
têm de estar preparados para um conjunto de funções, não apenas aquelas para as quais estão
contratados.
A necessidade de flexibilizar a gestão de mão-de-obra leva o le lador a “de ment r”
o princípio da estabilidade do objeto contratado. Com efeito, a lei prevê, no nº2 do artigo 118º
CT, que o trabalhador, contratado para uma certa atividade ou categoria profissional, possa
exercer funções afins ou funcionalmente ligadas àquelas para as quais foi contratado: a lei
amplia as funções do trabalhador.
Desta forma, a ideia de categoria profissional torna-se insuficiente em ordem à
identificação e delimitação do objeto contratual, funcionando a categoria como um mero ponto
de partida para avaliar o referido objeto. Agora o objeto do contrato será formado, em princípio,

31
pelas tarefas compreendidas na categoria e pelas funções que lhe sejam afins ou funcionalmente
ligadas.
Há ainda situações em que podemos ter uma mudança de categoria profissional, seja
para categoria inferior, ou superior. Se há uma mudança de categoria, há uma mudança de
condições de trabalho. Quando se trata de descida de categoria, em que há uma redução, por
regra, das relações de trabalho, a lei tem mais cuidado, tutelando esta situação no artigo 119º
CT. Isto porque pode haver aqui direitos que sofram uma restrição, por exemplo. Com efeito,
a lei estabelece alguns requisitos para a mudança para categoria inferior:
 Tem de haver uma justificação objetiva: ou que tenha que ver com o trabalhador,
ou com o empregador. Ou seja, a mudança de categoria profissional para categoria
inferior não pode depender de uma mera vontade, mas de uma necessidade que se
pode verificar na esfera de uma qualquer das partes.

Por necessidade do empregador, por exemplo, a descida de categoria pode surgir


como uma opção alternativa ao despedimento (ou porque a função acabou, ou
porque o trabalhador agiu erradamente). Pode dever-se a uma necessidade na esfera
do trabalhador quando, por exemplo, este fica incapacitado fisicamente ou
mentalmente para exercer a mesma (situação esta que tem de ser verificada pela
entidade externa de controlo).

A descida de categoria é, normalmente, uma alternativa à caducidade do contrato,


à perda do emprego.

 Além disso, essa mudança tem de ser autorizada pela autoridade das comissões
de trabalho. Ou seja, a verificação desse facto objetivo não pode ficar entre as
partes, pois a lei exige que uma entidade externa comprove que a situação de
necessidade se verifica (ou não).
E quando se é promovido? A lei não diz nada porque, normalmente, só surgem
vantagens para o trabalhador. Naturalmente que a subida de categoria, sendo proposta pelo
empregador, pode ser recusada pelo trabalhador, não querendo este exercer outras funções (não
podendo o trabalhador sofrer quaisquer sanções pela recusa).

7.1. Mobilidade funcional


A lei prevê ainda, apesar do princípio da estabilidade de prestação de trabalho, o
fenómeno de mobilidade profissional/funcional.
Também há a possibilidade de que o empregador, unilateralmente e por razões
objetivas, modifique temporariamente as funções da atividade do trabalhador e assim se prevê
no artigo 120º CT: o trabalhador pode, por razões objetivas, exercer funções não entendidas na
fixação do contrato, desde que tal não implique a modificação substancial da sua posição. Este
critério pode ter mais que ver com uma posição hierárquica, com o lugar que o trabalhador tem

32
na empresa. Quando ele sobe na hierarquia, esta subida não pode comprometer a sua função
substancial na empresa.
Quando a lei alarga o âmbito às funções afins ou funcionalmente ligadas, a própria lei
engrossa o leque de prestações está obrigado, temos uma mudança definitiva. Por outro lado,
a modificação unilateral terá de ser temporária.
A justificação desta figura é, novamente, a exigência de flexibilidade empresarial, que
reclama que o trabalhador seja funcionalmente móvel.
No artigo 120º, nº1 CT, a lei prevê que as funções do trabalhador possam ser ampliadas,
ou ser reduzidas. Por exemplo, a mudança de categoria profissional, seja para uma mais ampla,
ou mais reduzida.
Há duas modalidades de mobilidade funcional: uma mobilidade funcional temporária
(até dois anos) que decorre do contrato; e uma mobilidade funcional que altera a categoria,
que decorre da lei.
Se a atividade de mobilidade é temporária, o trabalhador, no caso de mudança de
categoria, não adquire a categoria profissional a que essas funções estão ligadas (artigo 120º,
nº 5 CT). Há um limite de temporalidade para o exercício destas funções, que é de dois anos.
Se um trabalhador estiver mais de dois anos a exercer determinada função, então
adquire o título dessa categoria, pois entende-se que não se trata de algo temporário. Por outro
lado, este prazo não significa que essa mudança não se possa tornar definitiva antes do fim
desses dois anos de acordo com a situação em causa. Ou seja, não é necessário esperar esses
dois anos para que a categoria seja alterada, poderá acontecer antes. Tudo vai depender da
mudança e da causa da mesma, tudo irá depender da circunstância em causa.
Um outro aspeto que a lei estabelece é que, se a essa mudança temporária corresponder
uma atribuição superior, o trabalhador deve ter direito às condições mais favoráveis; pelo
contrário, se essa mudança corresponder a uma atribuição inferior, ele mantém a sua posição
original (artigo 120º CT). Ou seja, não pode esta mobilidade implicar uma retribuição inferior,
apenas superior.

8. LUGAR DA PRESTAÇÃO DE TRABALHO


(páginas 203 a 217 do livro do professor Leal Amado)
No contrato não se estabelecem apenas as funções a exercer pelo trabalhador, mas
também o local de trabalho. Resulta do próprio contrato, de modo expresso ou tácito, o local
da prestação de trabalho. Não se pode, portanto, verificar no contrato uma total indeterminação
do local de trabalho, pois o trabalhador não se poderá obrigar a prestar toda e qualquer
atividade, em todo e qualquer lugar, sob a autoridade e direção do empregador. E o trabalhador
cria legítimas expectativas quanto ao mesmo, como é claro.
Tendo uma natureza contratual, vigora o princípio pacto sunt servanda, isto é, o contrato
deverá ser pontualmente cumprido. Resulta isto, no nosso ordenamento jurídico, na garantia de

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inamovibilidade: a entidade patronal, em princípio, não pode transferir o trabalhador para outro
local de trabalho (artigo 129º, nº1, al. f) e artigo 193º, nº1 CT).
Mas qual é a importância do local de trabalho? O local de trabalho condiciona muito a
vida pessoal do trabalhador, especialmente a sua vida familiar. Quando uma pessoa é
contratada para um determinado local de trabalho, tem de organizar a sua vida familiar de
acordo com o mesmo (põe os filhos na escola perto do local, compra uma casa, etc.).
A importância tem que ver, também, com a organização da vida do trabalhador em
geral (extraprofissional), pode não haver família envolvida.

Também é a questão relevante na esfera do empregador que, ao contratar um


determinado trabalhador, visa obter a sua disponibilidade para prestar trabalho na empresa e
contribuir para a sua produtividade.
Daí que a lei estabeleça algumas regras relacionadas com o local de trabalho,
nomeadamente com a sua mudança, visto que esta implica sempre um sacrifício para o
trabalhador, bem como despesas.
Prescreve o artigo 194º, nº1 CT que “o empregador pode transferir o trabalhador para
outro local de trabalho, temporária ou definitivamente”. Claro que a lei enuncia aqui várias
condições que limitam a transferência.
Em que é que isto se manifesta? Em primeiro lugar, podemos estar perante mudanças
de local de trabalho definitivas ou temporárias. Compreende-se que a lei seja um bocadinho
mais exigente relativamente à mudança definitiva. A mudança temporária pode provocar
alterações, mas não deixa de ser temporária. Quando a mudança é definitiva é que já temos
uma mudança substancial das condições do contrato.
Em qualquer um dos casos, o empregador deverá justificar o motivo da transferência:
seja por mudança ou extinção do estabelecimento onde o trabalhador presta serviço; seja por
outro motivo de interesse que a empresa exija. Este requisito, que consta do artigo 194º, nº1
CT, apesar de bem-intencionado, não evitará os riscos que pretende acautelar. Isto porque quem
decide os motivos de interesse urgentes da empresa é a entidade empregadora, logo, este exigirá
uma transferência de local quando lhe convier.

No caso de transferência temporária, a entidade empregadora deverá indicar o tempo


previsível da alteração, o qual não deverá exceder o prazo de 6 meses, salvo no caso de
exigências imperiosas da empresa (artigo 194º, nº3 CT). Também deverá ser o empregador a
suportar as despesas que o trabalhador possa ter com a mesma (artigo 194º, nº4 CT).
No caso de transferência definitiva, como temos uma modificação substancial do
contrato, a lei confere ao trabalhador o direito de fazer extinguir o contato se tiver prejuízo
sério com a mudança. O que é uma modificação substancial/prejuízo sério? Temos aqui um
conceito indeterminado. Há decisões do tribunal que não consideram substancial um
trabalhador trabalhar em Lisboa e ser colocado em Santarém, por exemplo (porque há
comboios e autoestradas, etc.); também entendeu o tribunal que, uma mudança de 2 horas por
dia em transportes (de Arrábida para Senhora da Hora em transportes públicos), não é

34
substancial. O problema é que não estão só em causa as horas de viagem, os trabalhares têm
outros deveres: levar os filhos à escola, trabalho em casa, etc. Felizmente, não há muitos casos
como estes enunciados, pelo que normalmente os trabalhadores conseguem facilmente resolver
o contrato.
Temos ainda a hipótese que consta do nº2 do artigo 194º CT: as partes pode alargar ou
restringir a possibilidade de transferência do local de trabalho (cláusula de mobilidade). Esta
norma or na al ma ol m a o er nta- e “ er adm el e e te re e to olo e
a transferência individual do trabalhador à mercê do puro arbítrio da entidade empregadora?
Ou que estipule a total inamovibilidade do trabalhador, mesmo em caso de deslocalização do
e tabele mento onde re ta er ço?”. ntende-se que a resposta a ambos casos deverá ser
negativa. Nem a mobilidade, nem a inamovibilidade, deverão ser absolutas. Através da
estipulação contratual que decorre do nº2 deste artigo, as partes poderão restringir ou alargar
as faculdades patronais da transferência, mas restringir é diferente de suprir totalmente e alagar
é diferente de dar total liberdade ao empregador.
No mesmo número, o legislador mostra também preocupação em relação a estas
cláusulas, estabelecendo um período de caducidade: se não forem ativadas pelo empregador
num período de 2 anos, estas caducaram.
O professor Lebre Freitas fala, neste âmbito, da transferência como direito do
trabalhador, que consta do artigo 195º CT, mas o professor não abordou este artigo nas aulas
teóricas.

9. O TEMPO DA PRESTAÇÃO DE TRABALHO


(páginas 219 a 249 do livro do professor Leal Amado)
Quando se celebra um contrato de trabalho, as partes estabelecem a duração da
atividade laboral. As partes têm uma certa liberdade no que toca a estabelecer essa mesma
duração. Compreende-se, no entanto, que a ordem jurídica se preocupe com essa liberdade,
pelo que o trabalhador aliena o seu tempo. A esse propósito, estabelece a CPR, no artigo 59º,
que: todos os trabalhadores têm direito ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada
de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas, bem como a uma garantia de conciliação
entre o trabalho e a vida pessoal e a familiar.
Uma das restrições impostas pela lei é a limitação de tempo de trabalho: a lei estabelece
limites máximos ao trabalho normal/regular: 40 horas semanais e 8 horas diárias (artigo 203º,
nº1 CT). Portanto, o trabalhador, em condições normais, não pode consentir a um período
normal superior a 40 horas de trabalho por semana e 8 horas por dia. Haverá uma nulidade
parcial do contrato se forem fixadas mais horas.

Estes limites são fixados visando a segurança e a saúde dos trabalhadores, sendo estes
direitos fundamentais dos trabalhadores. Uma prática regular que ultrapasse estes limites não
tem apenas implicações na saúde do trabalhador, mas também no seu rendimento, que se reflete

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na produtividade da empresa. Como tal, ultrapassar estes limites também não interessa ao
empregador.
O período normal de trabalho (artigo 198º CT) é o período contratualizado pelas partes
inicialmente, é o período que o trabalhador se obriga a prestar, medido em número de horas
por dia e por semana (é o quantum da prestação). A determinação deste período normal cabe
às partes, mas não pode estas exceder, em princípio, os limites do artigo 203º, nº1 CT.
O trabalhador compromete-se a trabalhar 8horas por dia. Se este estiver sempre a
trabalhar efetivamente, não é difícil contabilizar horas. No entanto, isto nem sempre acontece.
Há trabalhadores que às vezes não têm trabalho suficiente para trabalhar 8 horas por dia,
ando “de mão r zada ” e era de l ente or e em lo). e tem o ontab l zado?
Sim, nos termos do artigo 197º, nº1 CT, considera-se prestação de trabalho quando o
trabalhador está disponível para trabalhar, não apenas quando está efetivamente a prestar
serviço:
“Considera-se tempo de trabalho qualquer período de tempo durante o qual o
trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como
as interrupções e os intervalos”.
Pode não haver aqui uma exata correspondência entre o nosso direito e o direito
comunitário, mas o professor não vai abordar esta discrepância.

Há um conjunto de pausas que a lei equipara ao tempo de trabalho, as quais a lei vem a
enumerar no artigo 197º, nº2 CT.
Em suma, a lei não distingue entre o tempo de disponibilidade para trabalhar (períodos
de inatividade) do tempo de trabalho efetivo. Temos períodos de não trabalho que a lei
equipara a período de trabalho, devendo ser contabilizados para efeito das 40 horas/8horas.

Tudo o que não seja tempo de trabalho, a lei considera tempo de descanso (artigo 199º
CT). Considera-se tempo de descanso os períodos nos quais o trabalhador não está disponível
para trabalhar do ponto de vista contratual: quando o trabalhador não tem o dever de estar
disponível para trabalhar. Hoje este conceito não é uma hoje realidade, pelo que se exige, com
as novas tecnologias, que o trabalhador esteja quase sempre disponível.

Depois há uma outra noção, que é o horário de trabalho (artigo 200º CT). Em que
partes/horas do dia se trabalha? Em que dias se trabalha? Como é que se distribuem essas 40
horas semanais? O horário de trabalho determina as horas de início e termo do período normal
de trabalho diário e do intervalo de descanso, bem como do descanso semanal (o quando da
prestação). O horário de trabalho está regulado entre os artigos 212º e 217º do CT.
O horário de trabalho também condiciona muito a vida e, especialmente, a rotina do
trabalhador. O horário diário não deve implicar o esgotamento da energia do trabalhador, que
se leva ainda à perda de produtividade de trabalho.
Intervalo de descanso: período entre prestações de trabalho, que normalmente
corresponde ao período noturno.

36
O horário de trabalho está, claro, limitado pelo período normal de trabalho (artigo 198º
CT) estipulado pelas partes. Se as partes estipularam que o trabalhador trabalharia 6 horas por
dia, o horário tem de refletir e organizar essa estipulação.
O horário está também limitado pelo período de funcionamento do lugar de trabalho
(fixado, muitas vezes, pelas autarquias locais. Por exemplo: se fecham às 18h ou às 19h), o
qual está previsto no artigo 201º CT. Chama-se de período de abertura ao período de
funcionamento dos institutos que abrem ao público, e período de laboração ao período de
funcionamento dos restantes estabelecimentos industriais.
Admitem-se também estabelecimentos de laboração continua, que são aqueles que
funcionam 24h e 365 dias por ano. Por exemplo: hospitais públicos, empresas de energia, etc.
Nestas empresas, os horários de trabalho poderão ser diferentes, podendo seguir um regime de
turnos (fixos ou rotativos): artigos 220º a 222º CT.

Entre nós há um preceito clássico, que surgiu agora em Espanha e está a dar que falar,
que é o registo do tempo de trabalho (artigo 202º CT): o empregador deve manter o registo
dos tempos de trabalho com a indicação das horas de início e de termo de trabalho, bem como
das interrupções ou intervalos que nele não se compreendam, de forma a permitir apurar o
número de horas de trabalho prestadas por trabalhador por dia e por semana (nº2 do artigo 202º
CT). Os trabalhadores isentos de horário de trabalho também devem manter um registo (nº1 do
artigo 202º CT). Depois há ainda o registo do tempo de trabalho suplementar, do qual vamos
falar mais tarde. O registo está relacionado com dois aspetos: controlo da duração da atividade
do trabalhador pela entidade empregadora; também é vantajoso para o trabalhador, que fica a
saber se têm débitos ou créditos relativamente à entidade empregadora.

9.1. Exceções ao período normal de trabalho


A lei estabelece o limite máximo 8/40 horas, mas contempla algumas exceções.
Podemos ter exceções temporárias e exceções permanentes.

9.1.1. Exceções permanentes


Uma destas está prevista no artigo 203º, nº2 CT, estando as outras previstas no artigo
210º CT.
Sobre o 203º, nº2: os estabelecimentos têm de fechar durante dois dias, um por descanso
obrigatório (artigo 232º, nº1 CT), outro por descanso facultativo (artigo 232º, nº3). Nas
empresas que não cessam atividades, uma das formas de manter o funcionamento da empresa
é o empregador contratar trabalhadores para preencherem o período de descanso dos restantes
na mesma atividade. A lei, nestes casos, permite que para esses trabalhadores possa ser fixado
o período normal de 12 horas diárias: por exemplo, trabalham 12 horas no sábado e 12 horas
no domingo. Claro que a empresa, ao funcionar 24h, contratará duas equipas. Isto significa

37
que, com menos trabalhadores, satisfaz as necessidades normais ao fim de semana. A lei apenas
admite isto para estes trabalhadores que são contratados para suprir a ausência dos
trabalhadores semanais que estão em período de descanso.
No artigo 210º, nº1, al. a), há duas expressões que precisam de ser complementadas:
“em relação ao trabalhador de entidade sem fim lucrativo ou estritamente ligada ao interesse
público em sentido técnico-jurídico, desde que a sujeição do período normal de trabalho a
esses limites seja incomportável do ponto de vista económico”. Ou seja, só se podem praticar
estes horários excecionais quando o recurso às 8h seja incomportável do ponto de vista
económico no caso de a entidade empregador não ter fins lucrativos ou ter interesses públicos.
O artigo 210º determina uma faculdade discricionária. O professor crê que a lei
erm te e a d ldade e onóm a / nan e ra da n t t ção “ obrem ara o
trabalhadore ” e t m de ortar er odo de trabalho er ore ao l m te le al odendo
não auferir mais por isso.

AULA DE 25/10/2019
9.1.2. Exceções temporárias

9.1.2.1. Regime da adaptabilidade do tempo de trabalho


Até agora, tirando estas exceções permanentes, vimos que os trabalhadores não podem
prestar mais do que 8 horas por dia e 40 horas semanais. Vamos ver agora situações em que,
temporariamente, os trabalhadores prestarão serviços por tempo superior aos limites máximos.
São situações em que horário de trabalho deixa de ser constante, mas isto não altera o
princípio legal, nem o período normal de trabalho.
Isto ocorre porque o modelo comum de prestação de trabalho, por exemplo, 8 horas de
trabalho, de segunda à sexta, perfazendo isto 40 horas por semana e descansando ao sábado e
ao domingo, é muito pouco flexível às flutuações produtivas sentidas pelas empresas de hoje,
visto que, se a empresa necessitasse de maior volume de trabalho durante um certo período de
tempo, então teria de contratar mais trabalhadores ou, em alternativa, recorrer ao trabalho
suplementar, sempre com custos inerentes.
Há certas modalidades, portanto, nas quais o trabalhador pode ultrapassar as 40 por
semana ou as 8horas por dia, mas, no final deste período excecional, chamado período de
referência, não pode o trabalhador ter trabalhado mais do que a média das 8horas por dia ou
40horas por semana.

Temos, então, a figura da adaptabilidade do tempo de trabalho: permite que o


período normal de trabalho seja definido em termos médios, com base num período de
referência alargado (isto é, não semanal). A adaptabilidade permite, portanto, adaptar o período
normal de trabalho às necessidades da empresa. O empregador pode aqui redistribuir o tempo
de trabalho devido pelo trabalhador num determinado arco temporal, designado por período de

38
referência, concentrando numa parte deste algum tempo de trabalho que deveria ser prestado
na outra.
Ou seja, o trabalhador poderá prestar, por exemplo, 50 horas de trabalho em algumas
semanas, compensadas com a prestação de 30 horas noutras semanas. Assim, o período de 40
horas semanais continua a ser respeitado e consegue-se adaptar a prestação de trabalho às
necessidades da empresa. No global (e em média), como vimos, nem em trabalhar mais, nem
menos.
O período de referência (artigo 207º CT) é adotado em regime de adaptabilidade.
Chama-se período de referência porque a duração média de trabalho em regime de
adaptabilidade deve ser apurada por referência a período estabelecido em instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho que não seja superior a 12 meses ou, na sua falta, a um
período de quatro meses, como consta do número 1º deste artigo,

O Código prevê três modalidades de adaptabilidade, atendendo à sua natureza:


 Adaptabilidade coletiva (artigo 204º CT): aplica-se o regime de adaptabilidade
aos trabalhadores abrangidos pelo instrumento de regulamentação coletiva que
o estabelece;

 Adaptabilidade individual (artigo 205º CT): resultante do acordo entre as partes;

 Adaptabilidade grupal (artigo 206º): o empregador, por decisão unilateral,


verificados que estejam os requisitos (previsto no nº1, alíneas a) e b) do artigo
206º), pode aplicar o regime de adaptabilidade a trabalhadores não abrangidos
pelo Instrumento de Regulação coletiva de trabalho, previsto no artigo 204º, ou
que não tenham aceite a proposta patronal, prevista no artigo 205º.

A lei ainda garante outra via para o empregador estabelecer a adaptabilidade


grupal: se a proposta que o empregador faz ent dade olet a de trabalhadores
sobre este tipo de matéria for aceite por, pelo menos, 75% dos trabalhadores, o
empregador pode alargar, aos restantes trabalhadores, esse acordo (artigo 206º,
nº2 e 20º5, nº4). O professor levanta questões sobre isto, nomeadamente anto
a tonomia individual.

Na adaptabilidade, independentemente da modalidade, como já vimos, a lei permite que


os tempos de trabalho variem diária e semanalmente, o que significa que, durante
determinados períodos os trabalhadores podem trabalhar mais de 8 horas, mas tem de ser
compensados com regressão do tempo de trabalho para que no fim do período de referência o
tempo de trabalho não ultrapasse aquele tempo.
Na adaptabilidade coletiva, o período normal de trabalho, sendo definido em termos
médios, pode ser aumentado diariamente até 4 horas e a duração de trabalho semanal pode
atingir as 60horas, só não se contando nestas o trabalho suplementar por motivo de força maior

39
(artigo 204º, nº1). Depois o número 2 do mesmo artigo estabelece uma contemporização desse
limite.
Período da referência (artigo 207º): a convenção coletiva pode prever adaptabilidade
coletiva, no período máximo de 12 meses. Se a convenção não disser nada, mas prever a
adaptabilidade, a lei estabelece o período superveniente a 4 meses. O número dois do mesmo
artigo comporta uma exceção a esta regra, estendendo o período de referência para 6 meses.
A adaptabilidade individual resulta de um acordo entre a entidade empregadora e o
trabalhador, que deverá prever o aumento do período normal de trabalho diário até duas horas
e que o trabalho semanal possa atingir as 50horas. Este acordo pode ser celebrado mediante
proposta do empregador, por escrito, presumindo-se a aceitação do trabalhador que a ela não
se oponha nos 14 dias seguintes ao conhecimento da mesma (nº4 do artigo 205º CT).
A adaptabilidade grupal é uma adaptabilidade por secções de empresa. Às vezes
compreende-se que nem todos os grupos funcionem em harmonia e faz sentido este tipo de
regime.
Uma das consequências da adaptabilidade é que, para o trabalhador, nos dias em que é
ultrapassado o seu tempo normal de trabalho, não há rendimentos acrescidos. Isto é, se forem
acrescentadas horas de trabalho, o empregador não paga mais ao trabalhador por isso.
Simplesmente, este tempo a mais tem de ser recuperado em tempos de descanso, o
trabalhador poderá trabalhar posteriormente apenas 6 horas, por exemplo, ou ter uma folga. A
esta variação não corresponde despesa salarial acrescida para o empregador, nem supõe perda
de retribuição normal. Além disso, a adaptabilidade tem também repercussões em matéria de
conciliar a vida profissional com a vida familiar e pessoal.
Daí a que o instituto da adaptabilidade grupal, previsto no artigo 206º, seja
problemático: permite que o empregador aplique este regime a um trabalhador que não o
queira, não o aceita e que não está abrangido pelo Instrumento de regulação coletiva que o
instituiu.

9.1.2.2. Banco de horas


O banco de horas é igualmente um mecanismo de flexibilização da organização do
tempo de trabalho, o qual confere ao empregador poder de alargar o período normal de trabalho
diário e semanal até certo limite: até quatro horas diárias, podendo atingir as 60 horas semanais,
tendo este acréscimo por limite as 200 horas por ano, de acordo com as conveniências da
empresa. (Artigo 208º, nº2).
O banco de horas é um instrumento ainda mais flexível do que o da adaptabilidade.
Neste último, a compensação do trabalho prestado apenas pode ser feita por redução
equivalente do tempo de trabalho em momento posterior. Todavia, no banco de horas, a

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compensação do trabalho prestado em acréscimo pode ser feita de várias formas, não só a
redução equivalente do tempo de trabalho em momento posterior, mas também através do
pagamento em dinheiro por essas horas, ou até através do aumento do período de férias do
trabalhador. Admite-se ainda que possa ser o trabalhador a escolher a compensação por via da
redução do tempo de trabalho (artigo 208º, nº4, c) CT). Na falta de escolha do trabalhador da
forma como quer ser compensado, quem escolhe é o empregador, sendo que apenas decide em
última instância.
Verifica-se que, nas palavras do Professor Leal Amado, a adaptabilidade, permite,
sobretudo, redistribuir o tempo de trabalho contratado, o banco de horas vai ainda mais longe,
permitindo aumentar o número de horas de trabalho normal por ano.
Banco de horas grupal (artigo 208º-B CT): a lei dispensa o próprio acordo do
trabalhador caso se verifiquem determinados requisitos, os requisitos do artigo 206º CT.
Outra hipótese é, através de um referendo, o empregador fazer uma proposta para o banco de
horas grupal e do resultado desse referendo e na sequência do mesmo, se aprovado por, pelo
menos, 65% dos trabalhadores abrangidos, o regime do referido banco de horas pode ser
aplicado (artigo 208º-A, nº 5 CT).
Posteriormente, havendo alterações na composição do de trabalhadores, o regime do
banco de horas continuará a ser aplicado enquanto permanecerem pelo menos 65% do número
total dos trabalhadores abrangidos pela proposta do referendo.

9.1.2.3. Horário concentrado


Possibilidade de aplicar os períodos normais de trabalho num menor número de dias,
sem que haja aumento do tempo semanal de trabalho, podendo, no entanto, haver um aumento
das horas diárias de trabalho até 4 horas.
Por exemplo: por acordo entre o empregador e o trabalhador, será estabelecido um
horário de trabalho que concentre as 40 horas semanais, ou qualquer que seja o período normal
de trabalho, num máximo de 4 dais de trabalho (artigo 209º, nº1, al. a) CT). Ou, por instrumento
de regulamentação coletiva, vai-se estabelecer um horário de trabalho que contenha, pelo
menos três dias de trabalho consecutivos, seguidos por, no mínimo, dois dias de descanso,
devendo a duração do período normal de trabalho semanal ser respeitado, em média, num
período de referência de 45 dias (artigo 209º, nº1, al. b) CT).

9.1.2.4. Norma tampão


No meio desta variabilidade há uma norma tampão, que é a norma do artigo 211º CT.
Esta norma não é uma exceção ao artigo 203º CT (que fixa os limites máximos diários e
semanais), nem ao artigo 210º. Em todas as formas flexíveis do tempo de trabalho os limites
legais têm de ser cumpridos. Sem prejuízo desses limites, o tempo pode aumentar e o principal
instrumento que permitia adaptar tempos de trabalho com o aumento de trabalho, até ao Código
de 2003, era o trabalho suplementar, que permitia, no mesmo dia, responder a uma procura da

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empresa não normal. Agora já há estas outras modalidades nomeadamente o banco de horas e
a adaptabilidade.

Seja no caso da adaptabilidade, ou no caso do banco de horas, quando o periodo m mo


de trabalho estabelecido por lei ultrapassado, surge a necessidade de estabelecer limites gerais
m d o . Nesse sentido, a norma do artigo 211º CT m ortante pois cria um limite máximo
m d o do tempo de trabalho.

9.2. Isenção do horário de trabalho


Os trabalhadores podem ficar isentos de horário de trabalho, não tendo hora de entrada,
nem de saída e não tendo período de descanso pré-determinado.

O regime da isenção de contrato de trabalho só pode ser admitido por acordo escrito e
nas situações previstas no artigo 218º, nº1 CT, apesar de o instrumento de regulamentação
coletiva de trabalho poder prever outras situações de admissibilidade.
Este regime tem de especial 3 modalidades de isenção, previstas no artigo 219º CT:

 Isenção total de horário (não sujeição aos limites máximos de período normal de
trabalho);

 Possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou


por semana;

 Isenção dentro dos limites normais de trabalho (dentro do período normal de


trabalho acordado).
O trabalhador isento de horário não ganha, antes perde autodisponibilidade. Isto porque
o horário de trabalho é o instrumento que baliza a situação de disponibilidade do trabalhador,
que sabe que, fora desse horário, não terá de se sujeitar ao poder diretivo do empregador e
prestar-lhe a correspondente atividade laboral. Daí que a lei só admita a isenção num círculo
relativamente limitado de situações, prevendo o direito a uma retribuição especifica para o
trabalhador isento de horário, para compensar a disponibilidade acrescida que lhe é exigida
(artigo 265º CT).
Note-se que a isenção do horário de trabalho é uma situação reversível. Os termos desta
reversão de condições dependerão daquilo que as partes tenham estabelecido a esse propósito:
se o acordo estiver sujeito a um termo resolutivo, não será possível a cessação antecipada do
mesmo por decisão unilateral de qualquer dos sujeitos; não existindo qualquer termo, qualquer
uma das partes poderá fazer cessar a todo o tempo, contando que o comunique à outra parte
com a antecedência exigida pelo princípio da boa fé.

AULA DE 31/10/2019
9.3. Trabalho por turnos

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O trabalho por turnos tem lugar sempre o período de funcionamento for superior ao
período normal de trabalho, devendo, portanto, ser organizados turnos de pessoal diferente
(artigo 220º e 221º CT.)
Há duas modalidades de trabalho por turnos (apesar da lei apenas se referir de uma
forma geral a essas modalidades):
a) Turnos fixos: tendo uma empresa duas ou mais equipas, os turnos serão fixos
sempre o trabalhador estiver em atividade sempre às mesmas horas, isto é, quando
o trabalhador tiver um horário de trabalho normal. O trabalho por turnos fixos não
tem especificidade em si mesmo, não levanta qualquer problema em relação ao
trabalho normal.

b) Turnos rotativos: o trabalho por turnos rotativos já levanta algumas


particularidades. O trabalhador irá prestar a sua atividade em diferentes períodos do
dia (ora de manhã, ora à tarde, etc.). O trabalhador vai mudando de período de
trabalho, ou seja, uma semana trabalha de manhã e depois na semana seguinte
trabalha à noite, por exemplo. Este facto de numa semana trabalhar na manhã na
seguinte trabalhar à noite, obriga a que o seu mecanismo fisiológico se tenha que
adaptar, adaptar os padrões de sono, de trabalho e de alimentação. É um ritmo de
trabalho especialmente desgastante porque, precisamente, o organismo tem de
readaptar constantemente os seus ciclos de funcionamento. Daí que este instituto
seja objeto de alguma atenção (se calhar nem tanta quanto deveria).

Do ponto de vista de condições de trabalho, a estes trabalhadores aplica-se o regime


geral relativamente aos limites normais de tempo de trabalho. No entanto, de forma
a ter em conta o seu especial desgaste, o que a lei impõe é que estes trabalhadores só
possam mudar de turno após o dia de descanso semanal (artigo 221º, nº4 CT). Ou
seja, se trabalharem num turno noturno durante x dias, só depois de um dia de
descanso é que poderão passar a trabalhar no turno da parte da manhã.

Uma rotação de turno longa anda à volta de uma semana e uma rotação curta está
entre os 3 e 4 dias. Ou seja, em certas empresas, os trabalhadores mudam de turno
de 3 em 3 dias, ou de uma em uma semana, aproximadamente. Curiosamente, os
turnos de curta duração desgastam menos do que os de longa. E porquê? Por causa
do trabalho noturno, que é aquele turno em que o organismo tem de suportar um
maior sacrifício de adaptação.

A nossa lei, além da regra já vista (de que a mudança de turno tem de ser precedida
pelo dia de descanso semanal), também estabelece algumas medidas de proteção da
saúde no artigo 222º CT, ordenando ao empregador a organização de atividades de
saúde e segurança no trabalho (exames médicos mais frequentes, etc.). No entanto
não reconhece alei qualquer retribuição especial ou subsídio a estes trabalhadores,
salvo se tal estiver previsto em instrumento de regulação coletiva de trabalho.

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Depois há uma nova questão (que o professor não vai falar, é uma curiosidade): quando
é que deve ocorrer o descanso semanal? Parece que agora se deve entender que a contratação
coletiva pode fixar turnos de 7 a 9 dias, o que significa que a cada período de 7 dias a 9 dias, o
trabalhador goza de um novo descanso. Ou seja, num período de 14 dias, se for o turno fixo de
7, tem de gozar de 2 dias de descanso.

9.4. Trabalho noturno


A definição do período de trabalho noturno deverá estar definida em instrumentos de
regulação coletiva de trabalho. Todavia, na falta desta, aplicar-se-á a definição legal (artigo
223º, nº2 CT).
Nos termos da lei, o período que define o trabalho noturno é o período que decorre entre
as 22h de um dia e as 7h do dia seguinte. Esta definição apenas se aplica, como já vimos,
subsidiariamente à designação em convenção coletiva.
Nos instrumentos de regulação coletiva a lei admite uma maior flexibilidade nesta
definição, havendo apenas duas particularidades: o período de trabalho noturno tem uma
duração mínima de 7 horas e uma duração máxima de 11 horas, tendo sempre de compreender
o período entre a meia noite e as cinco da manhã (artigo 223º, nº1 CT). Se a convenção adotar
o critério das 7horas (duração mínima), sabendo que o período da 00h00 até às 5h tem que estar
incluído, podem considerar que o trabalho começa às 10h e acaba às 5h ou que começa á 00h00
e acaba às 7h, por exemplo.
O trabalho noturno é compensado com um acréscimo remuneratório, de forma a
compensar este maior esforço (artigo 266º CT).
Nos termos do artigo 224º, nº1, considera-se trabalhador noturno aquele que presta,
pelo menos, três horas de trabalho normal noturno em cada dia, ou que efetua, durante o período
noturno, parte do seu tempo de trabalho anual correspondente a três horas por dia. Esta é a
norma legal, mas está sujeita a disposição em contrário em instrumento de regulamentação
coletiva de trabalho.

Durante o período noturno, há algumas restrições relativamente uso do regime da


adaptabilidade, de forma a preservar a saúde e a segurança dos trabalhadores, que são seus
direitos fundamentais. Neste caso, quando vigora o regime da adaptabilidade, o período normal
de trabalho diário de um trabalhador noturno não deve ser superior a oito horas diárias, em
média semanal (artigo 224º, nº2 CT).
De modo a salvaguardar a saúde e a segurança do trabalhador noturno, deve o
empregador assegurar exames médicos gratuitos, bem como outras medidas de proteção que
constam do artigo 225º CT.

9.5. Trabalho suplementar


O trabalho suplementar, como o termo diz, é um trabalho que vai para além do trabalho
normal, suplementando-o. É o trabalho prestado fora do período normal trabalho, podendo ser

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prestando antes, depois ou no meio (se houver intervalo de descanso). Todo o trabalho que está
fora do período normal de trabalho e que está fora daqueles regimes de flexibilidade que vimos
(que está além da duração destes), é trabalho suplementar. É ainda trabalho prestado nos dias
de descanso, nos feriados e nas férias.
O artigo 226º, nº3 prevê alguns tipos de trabalho prestado que não se compreendem na
definição de trabalho suplementar (vamos apenas ver algumas):
 Trabalho prestado em isenção de horários: é uma modalidade, a mais comum,
em que não há limites de tempo de trabalho. Originalmente, era única que a lei
previa como trabalho não suplementar. Nesses casos, o trabalho além dos máximos
legais não é considerado trabalho suplementar. Se o critério para considerar o
trabalho suplementar é o trabalho extra-horário de trabalho, compreende-se que, se
não houver horário, então não há trabalho suplementar;

 As pontes de trabalho: quando há feriado à quinta, por exemplo, muitas vezes não
se trabalha à sexta, apenas à segunda. Essa sexta feria, sendo período normal de
trabalho, poderá ser compensada noutros dias, pelo que a lei admite que seja
compensada como trabalho normal, apesar de ser prestada fora do período normal
de trabalho, não sendo trabalho suplementar;

 As tolerâncias: o trabalho prestado até 15 minutos depois do período normal de


trabalho, quando for necessário, não é considerado trabalho suplementar. É aquele
trabalho exigido ao trabalhador para completar qualquer tarefa do dia.

Como é claro, o trabalho suplementar tem carácter excecional, daí que a sua
fundamentação tenha que ser objetiva, tem que radicar em interesses relacionados com a
produtividade da empresa. Há então duas causas que o justificam (artigo 227º CT):
 Causa de necessidade: será necessário recorrer ao trabalho suplementar quando há
um aumento de procura dos serviços empresa. Quando esse aumento é
temporário/excecional, este é o meio mais clássico/antigo que a lei prevê para que
as empresas possam responder a essas necessidades (embora haja outros agora:
tempo parcial, banco de horas, contrato a termo, etc., no entanto, este era o principal
há alguns anos, porque não havia muito desemprego e havia pouca mão de obra).
Em suma, a lei faculta o recurso ao trabalho suplementares quando é para satisfazer
uma necessidade excecional;

 Causa de indispensabilidade: em caso de força maior, por um acidente na empresa


(incendido, inundação, explosão), ou por um motivo não previsto, também se
compreende que a empresa recorra ao trabalho suplementar de modo recuperar a
sua atividade normal e com isso manter os postos de trabalho.

Estas causa estão ainda relacionadas com um determinado regime. Relativamente à


causa de indispensabilidade, não há limite quando à respetiva duração. Por outro lado, no que

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toca ao trabalho suplementar por causa de necessidade, a lei estabelece limites diários e anuais,
nos termos do artigo 228º CT. Esses limites dependem da direção da empresa e do tipo de
contrato (a tempo parcial ou a tempo completo), ou se o trabalho é prestado em dia normal ou
em dia de descanso. Admite-se também que estes limites legais, só o são, se as partes não
convencionarem outros, mais curtos ou mais alargados. Os limites legais são supletivos, podem
ser afastados por acordo individual ou por convenção coletiva em contrário.
Quer tudo isto dizer que não basta um simples acordo do trabalhador para legitimar o
recurso a este tipo de trabalho, sendo necessário que se verifique uma destas causas objetivas.
Entre nós, o trabalho suplementar é obrigatório (artigo 227º, nº3). Isto não deixa de ser
um bocadinho anómalo, mas é a regra entre nós. Quer dizer, o empregador determina, e o
trabalhador cumpre. O empregador determina porque, note-se, é este quem determina as
necessidades da empresa. Há uma exceção da obrigatoriedade deste trabalho, que consta do
artigo 227º, nº3: o trabalhador não estará obrigado a prestar o trabalho suplementar, quando,
havendo motivos atendíveis, este expressamente solicitar a sua dispensa. Contudo, o
empregador terá de concordar com a atendibilidade do motivo que o trabalhador expressa. Se
o empregador não o aceitar, o trabalhador não está dispensado. No entanto, “motivo atendível”
é um conceito indeterminado. Sendo assim, e sendo uma faculdade atribuída ao empregador,
esta regra não servirá de muito, pelo que se exerce aqui apenas um poder no âmbito do poder
de direção do empregador. Daí que o professor discorde com a letra da norma. Todavia, a
mesma tem sido aceite pela doutrina maioritária.

Efeitos do trabalho suplementar: o trabalho suplementar terá efeitos a nível de


descanso compensatório e a nível da remuneração do trabalhador.
Em primeiro lugar, só há descanso compensatório remunerado quando o trabalho
suplementar interferir com o descanso diário (artigo 229º, nº3 CT), ou com o dia de descanso
semanal obrigatório do trabalhador (artigo 229º, nº4 CT), ou ainda no caso do nº1 do artigo
230º CT. Neste artigo temos uma outra situação em que verdadeiramente é a lei que impõe o
trabalho suplementar, dai se tratar de um regime especial do trabalho suplementar: é uma
norma aplicada ao regime de turnos. Por norma, o que acontece é que, vencendo-se o período
de trabalho daquele do turno daquele trabalhador, A, sai este e deveria entrar B ao trabalho.
Vamos supor, para o caso previsto nesta norma, que o turno de trabalho de A cessa às 18h e
que, no dia seguinte, A vai gozar do dia de descanso semanal obrigatório. Se B, o colega que o
devia substituir, se atrasar duas horas, por falta imprevista, A deve continuar a trabalhar.
Temos uma obrigação de continuidade por força maior: A trabalhará aqui em regime de
trabalho suplementar, tendo, por isso, um direito a descanso complementar obrigatório
equivalente às horas de descanso em falta. A lei não diz o que fazer se B se atrasar mais do que
duas horas. Para o que é que servem estas duas horas? Para o empregador substituir o faltoso.
Se passarem as duas horas sem que B tenha chegado ao lugar de trabalho, deve A sair ou
continuar a trabalhar? A lei limita o dever de continuidade a duas horas. Será que o
empregador pode dar ordem no sentido de A continuar a trabalhar? A lei não diz, mas o
professor crê que não, porque A já ultrapassou os limites diários de trabalho. Portanto, ficando
as duas horas por força da lei,

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não devia poder estar mais. Pode-se remeter aqui a questão para o direito administrativo. Há
aqui esta relativa indefinição.
Outra regra entre nós consagrada neste âmbito é o registo do trabalho suplementar
(artigo 231º CT). Isto justifica-se pelas implicações que este tipo de trabalho tem a nível do
descanso do trabalhador, a nível do cumprimento dos limites de duração de trabalho e até a
nível tributário. Presume-se, claro, que o registo corresponderá à verdade.

9.6. O descanso semanal


Nos termos do artigo 232º, o descanso semanal pode ser:

 Obrigatório: a lei impõe, no nº1 deste artigo, que o trabalhador tenha


obrigatoriamente direito a um dia de descanso semanal. No entanto, a lei admite que
o trabalhador tem direito a pelo menos um dia de descanso semanal, ou seja, por via
de outro instrumento, como o contrato de trabalho, pode ser estabelecido outro dia
de descanso obrigatório, mas isto não é comum.

 Complementar: por convenção coletiva ou por contrato de trabalho pode ainda ser
instituído um período de descanso semanal complementar, como consta no número
3 deste artigo. Geralmente, este dia é o Sábado.

O trabalho semanal deve ser interrompido durante, pelo menos, 24h, às quais se
somam as normais 11h de descanso diário (artigo 214º, nº1 CT). A lei, pela conjugação destes
dois direitos, acaba por garantir um descanso semanal obrigatório de 35 horas.

Nota: não obstante falarmos de um resultado de 35 horas (24h+11h), o Professor, no


decorrer da aula, falou de um cúmulo de 36horas. Porém, acreditamos ter sido um lapso.

Q ando a le ala de m d a de de an o are e e e de e entender o “d a” omo o


período das 0h às 24h. Significa isto que o descanso não pode começar às 22h e acabar às 22h
do outro dia.

Nos termos do artigo 232º, nº2, a regra entre nós é que o descanso semanal obrigatório
seja ao domingo. Todavia, o mesmo artigo enumera um conjunto de atividades nas quais o dia
de descanso semanal obrigatório pode não ser o domingo: por exemplo, no caso de trabalho
por turnos. Se o descanso semanal obrigatório não for ao domingo, há duas implicações: a ideia
de regularidade perde-se (se o descanso é ao domingo, sabe-se que, de 7 em 7 dias, há um
período de descanso, a regra é 6+1, ou seja, 6 dias de trabalho consecutivos, no qual estão
incluídos os feriados, e depois um de descaso); o trabalho ao domingo é prestado como trabalho
normal, não é suplementar e, como tal, não implica uma remuneração acrescida.

Como já vimos, a lei impõe a cumulação do descanso semanal com o descanso diário
(as tais 11horas), contudo, esta regra não é aplicada nos casos do nº3 do artigo 233º. O que é
que significa isto? Que os trabalhadores que ocupam cargos de administração, como consta da
alínea a) deste número, não têm direito a descansar? Entende-se que estes trabalhadores
47
indicados no nº3 do artigo 233º efetivamente não tem direito às 35horas, mas parece ao
professor que estes tenham, pelo menos, direito às 24h.

9.7. Feriados
Os feriados estão enumerados no artigo 234º e seguintes. Os feriados estão associados
a acontecimentos marcantes, sejam sociais, religiosos ou nacionais. Estes feriados consagrados
na lei são-no a título imperativo, pelo que fontes inferiores não os podem remover, nem
estabelecer feriados diferentes. Podemos ter dois tipos de feriados:
 Feriados obrigatórios: há 13 feriados obrigatórios, os quais tratam de um
acontecimento que interessa a toda a sociedade em geral (acontecimento global).
Este dia comemorativo (note-se que não é um dia de descanso) abrange,
naturalmente, empregadores e trabalhadores. Há um direito de os trabalhadores não
comparecerem ao trabalho e de os empregadores a fecharem o
estabelecimento/empresa. O feriado tem estas duas vertentes: é oponível tanto ao
trabalhador como ao empregador. Claro que estamos fartos de ver que as empresas
continuam a trabalhar nos feriados, mas estas têm, nesses casos, de solicitar uma
autorização.

Depois há casos em que a lei admite, dependendo da localidade, que a 6ª feira Santa
possa não ser gozada na sexta feira mesmo, mas noutro dia. Tal como o dia de natal,
dependendo da zona, pode não ser comemorado no dia 25 como no dia 26 (porque
antigamente muitos dos pais de família, que trabalhavam no porto, demoravam um
dia a chegar a casa, sendo que no dia 24 se trabalhava, só chegavam no dia 26).

 Feirados facultativos: estes têm de ser previstos. A terça feira de carnaval, por
exemplo, é facultativo, mas tem de ser sempre previsto, ou por convenção ou por
contrato individual. É uma faculdade. Também há um feriado municipal, por
exemplo (comemoração do município), o qual também tem de ser previsto.

Quanto à remuneração dos feriados, consta do nº1 do artigo 269º CT, que o trabalhador
tem direito à retribuição correspondente ao feriado, sem que o empregador possa compensar
com trabalho suplementar.

9.8. Férias
As férias são um direito muito mais recente (séc. XX) do que o direito semanal (séc.
IV). Quando falamos em férias, falamos num período de descanso anual previsto,

48
inclusivamente, na nossa Constituição no seu artigo 59º, nº1, al. d). Enquadra-se também em
motivos de saúde e de proteção do trabalhador. No nosso ordenamento jurídico, entende-se que
é necessária uma rotura prolongada do trabalho por uma questão de recuperação da capacidade
de trabalho. É este o papel que cabe às férias.
O direito a férias é um direito fundamental e um direito irrenunciável, o que quer dizer
que não pode ser substituído nem com o acordo as partes, nem por trabalho remunerado, nem
por qualquer outra coisa (artigo 237º, nº3 CT).
A lei proíbe que se trabalhe, isto é, que se exerça uma atividade remunerada, durante
as férias. Isto porque, se as férias são efetivamente para o trabalhador recuperar, tal objetivo
não seria alcançado se o este aproveitasse as férias para continuar a trabalhar (ainda que fosse
num outro emprego).
Quando falamos em férias temos de falar de 4 momentos:
a) Nascimento/constituição do direito (com o contrato);
b) Formação do direito (com o decorrer do contrato/prestação do trabalho);
c) Vencimento do direito (no início de cada ano civil);
d) Gozo das férias (no ano civil em que estas se vencem).

O direito às férias nasce/constitui-se com o contrato de trabalho. Compreende-se que


este direito se vá formando ao longo do ano civil, sendo um direito de descanso anual, vai-se
formando à medida que o contrato vai sendo cumprido, que o trabalho vai sendo prestado. O
direito a férias vence no dia 1 de janeiro do ano seguinte, esgota-se aí. Se as férias se vencem
no dia 1 de janeiro, quer dizer que elas existem relativamente ao trabalho prestado no ano
anterior, sendo gozadas no ano seguinte, que é o ano de vencimento (artigo 237º, nº1 e 2 CT).
eja “ r me ro trabalha-se, depois descansa- e”.
Por regra, as férias têm de ser gozadas no ano de vencimento. Ou seja, por exemplo, as
férias que o trabalhador gozar em Agosto de 2020, reportar-se-ão ao trabalho prestado ao longo
de 2019, tendo-se vencido esse direito em Janeiro de 2020. No entanto, são admitidas algumas
exceções a esta regra, as quais constam do artigo 240º, nº2 e nº3 CT.
A duração mínima legal do período anual de férias é de 22 dias úteis (nº1 do artigo
238º). Por dias úteis entende-se, neste âmbito, os dias da semana, de segunda a sexta,
excluindo-se os feriados, como consta dos 2 do artigo 238º CT. A lei criou esta uniformidade
em relação à matéria de conflito entre férias e feriados.
Apesar da lei estabelecer a duração mínima de 22 dias, esta também admite, no artigo
238º, nº5, que o trabalhador possa renunciar a dois dias dos 22. Quer isto dizer que, na verdade,
o trabalhador apenas tem de gozar 20 dias úteis.

9.8.1. Casos especiais de duração do período de férias


No ano de admissão, em termos de férias, há um regime especial, visto que o
trabalhador tanto pode ser contratado a 1 de janeiro como a 3 de novembro e, se se aplicassem
as regras normais, o trabalhador não teria direito a férias.

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A re ra on ta do art o 39º nº1 CT “no ano de admissão, o trabalhador tem direito
a dois dias úteis de férias por cada mês de duração do contrato, até 20 dias, cujo gozo ter
lugar após seis meses completos de execução do contrato”.
Note-se que este direito especial não afasta a regra geral. No ano de celebração do
contrato o trabalhador terá um duplo direito a férias: no dia 1 de janeiro, vence o direito especial
a férias e o direito normal a férias. Portanto, tendo o trabalhador direito a dois dias úteis de
férias por cada mês que trabalhe, tal significa que, no ano seguinte, se por acaso as férias
relativas ao primeiro ano de contrato ainda forem gozadas no ano seguinte (nº2 do artigo 239º),
o trabalhador teria direito a 22 dias decorrentes do direito normal de férias, mais os dias
decorrentes do direito especial a férias que a lei prevê relativamente ao primeiro ano do
contrato. Claro que, sendo o trabalhador contratado no final do ano, terá menos dias de férias
para descontar do direito especial.
Por exemplo: vamos supor que o trabalhador é contratado no dia 1 de Agosto. Por força
do direito especial a férias do nº1 do artigo 239º, terá direito a 10 dias úteis de férias. No
entanto, como o gozo destes dias só pode ter após lugar seis meses completos de execução do
contrato, o trabalhador só os poderá usufruir após Fevereiro do próximo ano. Sucede que,
entretanto, se vence outro direito a férias, pelo que o trabalhador, nesse ano, poderia desfrutar
de um período demasiado generoso de férias, neste caso, 22 dias mais 10, ou seja 32 dias. Para
evitar estas situações, o nº3 do mesmo artigo estabelece que não poderá resultar o gozo, no
mesmo ano civil, de mais de 30 dias úteis de férias.
A norma do artigo 239º, nº4 é a que se aplica, em princípio, ao contrato a termo no que
toca ao direito às férias. Se o contrato tiver duração inferior a 6 meses, esse direito a férias
será 2 dias por cada mês. E relativamente a um contrato de 8 meses ou 1 ano e meio? Continua
a ser um problema, a lei não dá resposta.
Depois há aqui uma questão cuja legalidade suscita algumas dúvidas, que é a norma do
239º, nº6. Se o trabalhador começa a trabalhar hoje, tem um direito a férias especial (2 dias por
cada mês). A partir do dia 1 de janeiro, tem direito a mais 22 dias. Isto não suscita duvidas.
Vamos supor agora que o trabalhador já o é há 5 anos e adoece no dia 31 de outubro, só
regressando ao trabalho no dia 4 de janeiro. A lei diz que, relativamente a este trabalhador,
vítima de um impedimento de saúde prolongado, em matéria de férias, tudo se passa como se
este começasse a trabalhar no dia de regresso. Resta saber o que é um “impedimento
prolongando”. Serão 15 dias, será 1 mês? Vamos supor que o trabalhador adoece no dia 30 de
dezembro e só regressa em março: aplica-se este regime, há um impedimento prolongado.
Agora vamos supor trabalhador adoece em agosto e regressa em setembro: já não se vai
aplicar este regime. Como a lei não determina o que é um impedimento prolongado, vamos
considerar que, para se aplicar este regime, tem o trabalhador de parar de trabalhar num ano e
apenas no outro recomeçar. Claro que há dúvidas da legalidade deste regime. Nós vamos
admitir que este se aplica de um ano para o outro, pelo que se foi formando um direito a férias,
mas tal não se venceu no dia 1 de janeiro, porque o trabalhador não estava ao serviço.

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AULA DE 7/11/2019
9.8.2. Marcação das férias
O princípio geral, previsto no nº1 do artigo 241º CT, é que o período de férias será
definido por acordo entre o empregador e o trabalhador. Não havendo acordo, este é um
dever do empregador, após audição da estrutura representativa dos trabalhadores.
Porém, o trabalhador não tem aqui total liberdade, pelo que a lei estabelece algumas
restrições:
 O empregador só pode marcar férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que
se admita o contrário em convenção coletiva ou em parecer dos representantes dos
trabalhadores;

 Na marcação das férias, os períodos mais pretendidos (junho a agosto), devem ser
repartidos, sempre que possível, de modo a beneficiar alternadamente os
trabalhadores em função dos períodos gozados nos dois anos anteriores. Ou seja, se
há um trabalhador que nos dois últimos anos teve férias em agosto e outro que teve
sempre férias em outubro, estes terão de trocar, por exemplo;

 Devem ter os cônjuges (ou pessoas que vivam em regime semelhante) que
trabalhem na mesma empresa, direito a gozar de férias simultaneamente;

 Regime especial para empresas ligadas ao turismo: nº4 do artigo 241º;


Admite-se também, no artigo 242º CT, que o empregador possa encerrar a empresa para
efeitos de férias, ou seja, o período de encerramento coincidirá com o período de férias dos
trabalhadores. Isso compreende-se pelas idiossincrasias da empresa: se for uma empresa
sazonal, por exemplo, e tiver menos atividade em determinado período, entende-se que feche.

O gozo do período de férias pode ser ainda interpolado (artigo 241º, nº8), mas têm
sempre de ser gozados, pelo menos, 10 dias úteis consecutivos.

O período de férias poderá ser alterado, seja por motivos relacionados com a empresa,
como consta no artigo 243º CT (como diz a lei, por exigências imperiosas de serviço), seja por
motivos relacionados com o trabalhador, como consta no artigo 244º CT (designadamente, por
razões de saúde). Essa alteração irá interferir com expectativas de ambas as partes, mas, por
razões substantivas e objetivas no sentido económico, o período de férias poderá, de facto, ser
alterado. Se for o empregador a alterar o período de férias, ou a interromper as férias já
iniciadas, este terá de indemnizar o trabalhador pelos prejuízos sofridos por deixar de gozar as
férias no período marcado. Se a alteração for do lado do trabalhador, este terá de o comunicar
ao empregador a razão de tal alteração (doença, ou outro facto que não lhe seja imputável).

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9.8.3. Violação do direito a férias
Um outro aspeto que também a lei acautela de uma forma um tanto quanto duvidosa
tem que ver com a violação do direito a férias (artigo 246º CT): caso o empregador obste
culposamente ao gozo das férias, a lei confere ao trabalhador uma compensação no valor triplo
da retribuição correspondente ao período em falta.
A questão duvidosa não está na retribuição atribuída ao trabalhador. A questão está no
advérbio culposamente. O que é que isto quer dizer? É não marcar as férias? É proibir que o
trabalhador se ausente? Veremos.
As férias, legalmente, têm que ser marcadas por acordo. Pode é o trabalhador, à
margem da lei, marcar as férias unilateralmente, ou até nem marcar férias nenhumas. Nesses
casos, é claro que há culpa. Como tal, os casos problemáticos não são estes.
O problema está naqueles casos em que o trabalhador não goza férias por sua
iniciativa. Ou, pelo menos, presume-se que é por sua iniciativa. Portanto, chegamos a 31 de
Dezembro e o trabalhador não gozou férias. Haverá aqui uma violação do direito a férias? A
doutrina e a jurisprudência têm tendência a dizer que não, que, se não houve nenhum
impedimento por parte do empregador, não há direito a indeminização.

Por outras palavras: o empregador tem o dever de garantir que o trabalhador goze férias,
o que significa, em última instância, que o proíba de vir trabalhar. Se é o direito a férias um
direito indisponível, em rigor, o empregador tem o dever de reservar um período para férias do
trabalhador, no qual não poderá receber a atividade do mesmo. No entanto, se o empregador
não impedir o trabalhador de gozar férias, mas aceitar que este trabalhe durante esse período,
não parece, atendendo à letra da lei, haver culpa. Todavia, em termos do sentido do direito,
deveria esta situação ser equiparável a um impedimento por parte do empregador. Diz o
professor que deveríamos interpretar esta norma além da letra da lei.

9.8.4. Remuneração do período de férias


Nos termos do artigo 264º, nº1 CT, as férias são remuneradas no correspondente à
retribuição que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efetivo normal. Ou seja, o
período de inatividade produtiva que corresponde às férias não deverá ter qualquer impacto
negativo sobre a retribuição a pagar ao trabalhador. Ainda mais, a lei, prevendo um possível
aumento de gastos (o trabalhador terá um acréscimo de despesas inevitável com o corte à
rotina), determina um subsídio de férias (nº2 do mesmo artigo).
Proibição do artigo 247º CT: salvo consentimento do empregador, durante o período de
férias, o trabalhador não pode auferir qualquer rendimento em consequência de trabalho
prestado, seja em regime autónomo, seja em regime de trabalho independente. Pode, claro,
ganhar o euro milhões, esse rendimento não é uma retribuição. Quer isto dizer que o
trabalhador não pode aproveitar o período de inatividade, no qual continua a auferir uma
retribuição e um subsídio de férias do seu trabalho, para prestar trabalhado remunerado a
outro sítio.

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9.8.5. Cessação do contrato
Um outro aspeto ainda relacionado com as férias e no qual a nossa lei é contrária ao
direito comunitário tem que ver com a cessação do contrato.
Nós já vimos a estrutura do direito a férias: este é um direito que se vai formando ao
longo da vida do contrato e que se vence no primeiro dia do ano subsequente, a partir do qual
se começa a forma um novo direito a férias. Isto significa que as férias são um direito de
formação constante, de formação continua, visto que cada dia de trabalho vai contribuir para o
gozo de dias de férias no ano subsequente. Daí que, quando um contrato cessa, já há um
período de trabalho prestado que iria ter repercussões no direito a férias, não fosse o contrato
cessado.
É destas situações que trata o artigo 245º CT. Sendo cessado o contrato hoje, das duas
uma: ou o trabalhador já gozou as férias relativas ao trabalho do ano anterior, ou ainda não as
gozou e, tendo cessado o contrato hoje, já não poderá gozá-las mais. Logo, tem apenas o direito
a ser recompensado.

Nos casos em que o contrato de trabalho cessa, verifica-se que o trabalhador ainda terá
direito a esta retribuição e ao respetivo subsídio correspondentes às férias vencidas e não
gozadas e proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação (artigo 245º, nº1
CT).
Ou seja, supondo que o contrato de trabalho de um trabalhador se extinguiu em abril de
2019, isso implicará que este aufira a retribuição e o subsídio correspondentes às férias
vencidas em 1 de janeiro de 2019, férias que o trabalhador não chegou a gozar, bem como o
montante proporcional ao tempo de serviço prestado em 2019, visto que a 1 de janeiro se
começou a formar um novo direito a férias, que se venceria plenamente a 1 de Janeiro de 2020,
mas que se vence antecipada e parcialmente aquando da extinção do vínculo, em abril de 2019.

Há um regime especial relativamente aos contratos que têm início num ano e que
cessam no ano seguinte, não perfazendo 12 meses de trabalho prestado. Por exemplo: o
trabalhador começa a prestar trabalho em 2018 e cessa o contrato em 2019. Qual é o critério
aqui? O critério consta do nº3 do artigo 245º CT. Se esta norma não existisse, quem começasse
a trabalhar em dezembro de 2018 e acabasse em 2019, tinha direito na mesma aos 22 dias úteis
de férias. Consta, então, deste número 3º que, quando o contrato começar e acabar em menos
de 12 meses, compreende-se que se calculem as férias em termos proporcionais e não
relativamente há regra geral.
Depois ainda temos de ter atenção ao nº4 do mesmo 245º CT, o qual prevê que:
cessando o contrato após impedimento prolongado do trabalhador, este tem direito à
retribuição e ao subsídio de férias correspondentes ao tempo de serviço prestado no início da
suspensão. Iremos depois estudar o instituo da suspensão do contrato (quando os principais
efeitos do contrato estão suspensos). O regime desta norma tem de ser distinguido daquilo que
vimos a propósito do artigo 239º, nº6 CT. Este último diz que, se o trabalhador,
independentemente de há quanto tempo presta trabalho, adoecer num ano e só regressar ao

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trabalho no ano subsequente, como há ali um período prolongado de inatividade (que a lei não
define totalmente), a lei irá equiparar esse trabalhador, para efeitos de férias, a um trabalhador
contratado no ano de regresso ao trabalho. A hipótese do artigo 245º é diferente. Neste, o
trabalhador adoece num ano e está o ano subsequente todo impedido de trabalhar. Por exemplo:
o sujeito adoece em 2019, no ano de 2020 fica em recuperação e só regressa em 2021. Embora
a lei não o diga expressamente, ou da norma não resulte diretamente isso, na medida em que
temos o artigo 239º, é para estes casos que o artigo 245º serve. A hipótese aqui é que, dois anos
depois de o trabalhador ficar impedido, no ano em que ele pretende voltar, pode o contrato
cessar. O legislador diz que, se o contrato se suspendeu em 2019, ficando suspenso por todo o
2020, só regressando o trabalhador em 2021, cessando também em 2021 o contrato, o
trabalhador terá direito aos proporcionais de férias e ao de subsídio relativos ao ano em que o
contrato se suspendeu, ou seja, os proporcionais correspondentes ao tempo de trabalho de 2019.
A lei congela o ano de trabalho de 2020 e 2021 (anula as férias).

9.9. Regime Jurídico das Faltas


(páginas 251 a 253 do livro do professor Leal Amado)
Tivemos aqui três alterações com a lei nº 90/19.
Como consta do artigo 128º, nº1, al. b) CT, comparecer ao serviço com assiduidade e
pontualidade é um dever do trabalhador. Caso o trabalhador não se apresente ao serviço, no
local e tempo acordados, então estará a faltar ao trabalho.
O nosso legislador enuncia a noção de falta, de forma técnica, no artigo 248º, nº1 CT:
considera-se falta a ausência do trabalhador do local de trabalho em que devia desempenhar a
atividade durante o período normal de trabalho diário.
Quanto à ausência do local de trabalho: o local de trabalho pode ser físico, digital ou
móvel (condutores da Uber, por exemplo). Se o local de trabalho é fixo, não há grandes dúvidas
quanto ao conceito de ausência. Se o local de trabalho é móvel, a falta será a ausência do local
onde o trabalhador deveria estar no momento da prestação de trabalho. O local de trabalho é o
espaço físico onde o trabalhador deve estar a prestar a sua atividade.

Segundo a letra da lei, só há falta se essa ausência se verificar dentro do período normal
diário de trabalho. As faltas são diárias, falta-se ao dia em horas. Não há faltas semanais. Para
efeitos de faltas, o dia é divisível. Obviamente que se pode faltar um dia inteiro, mas pode-se
apenas faltar também a uma parte do dia. Agora, se a prestação de trabalho nesse dia for só de
uma hora e se faltar a essa hora, falta-se ao dia. O nº2 do artigo 248º CT é um dos exemplos da
divisibilidade do período diário
Como vimos, o período normal de trabalho é o período contratualizado: o trabalhador
compromete-se a trabalhar x horas por dia e y horas por semana, sendo este o trabalho prestado
pelo mesmo normalmente. Parece que a lei reduz o conceito de falta à ausência do trabalhador
do local de trabalho apenas durante esse período. No entanto, não é isso que acontece. O
período normal de trabalho pode ser alargado: pode o trabalhador prestar serviço em regime de
adaptabilidade, há questão dos turnos, pode haver trabalho suplementar, etc. Quer em regime

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de flexibilidade, quer em regime do trabalho suplementar, o tempo diário de trabalho
ultrapassará o período normal de trabalho. E, como é óbvio, também há o dever de prestar o
trabalho nessas horas prolongadas. A ausência no trabalhador do local de trabalho durante essas
horas, se forem obrigatórias, é também uma falta, embora não seja isso que diz a letra da lei.
Temos de fazer uma interpretação mais ampla. O que parece ao professor que a letra da lei
pretendia aqui excluir eram as faltas em dias de descanso semanal, ou em feriados.
Outro aspeto relevante é a imperatividade do regime das faltas e a sua duração,
prevista no artigo 250º CT: as faltas não podem ser afastadas por instrumento da regulação
coletiva de trabalho, salvo as exceções previstas na lei, nem por contrato de trabalho. Se o
forem, será essa cláusula nula.

9.9.1. Faltas justificadas e injustificadas


O artigo 249º CT procura criar um equilíbrio no que toca às razões de política
económica, relacionadas com a produtividade da empresa, e as razões de política social,
relacionadas com a pessoa do trabalhador. Com efeito, o legislador tentou alcançar esse ponto
de equilíbrio através da distinção entre faltas justificadas e injustificadas.
Relativamente às justificadas, em alguns casos, a lei estabelece ainda a duração desse
período.
Sendo o regime de faltas um regime imperativo, quer quanto aos motivos, quer quanto
duração, o legislador pretendeu criar uma uniformidade nesta matéria muito sensível,
nomeadamente a nível de gestão do trabalho. A imperatividade que a lei consagra tem
precisamente que ver com a importância funcional da assiduidade. Claro que esta é sempre
uma questão individual do ponto de vista jurídico. Mas, de um ponto de vista produtivo, é uma
questão que as empresas terão de gerir para não perderem lucros. Daí que se compreende este
regime uniforme, que, por um lado, significa uma igualdade de tratamento dos trabalhadores
e, do lado dos empregadores, um limite disciplinar, bem como uma forma de prevenir possíveis
ausências de prestação de trabalho.
A lei utiliza um critério de exclusão: determina imperativamente quais são as faltas
justificadas (artigo 249º, nº2 CT), sendo que, não cabendo a falta nesse tipo justificativo, será
injustificada (artigo 249º, nº3 CT).
Nos artigos 251º, 252º, 252º-A, a lei fixa o período de duração desses motivos
justificativos. Isto porque, como já vimos, a imperatividade do regime de fatas não tem apenas
que ver só com os motivos, mas também com a sua duração.
Existe, pois, um catálogo taxativo de motivos da ausência do trabalhador, mas a leitura
das alíneas do nº2 do artigo 249º CT logo nos revela que o sistema é mais aberto do que parece
er. A do tr na o t ma al d r a e te ro ó to a m tema de “ta at dade a arente” o
“t dade aberta”.

Vejamos:

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 Alínea k): são faltas justificadas as que por lei sejam qualificadas como tal.
Ou seja, os motivos do CT não esgotam o leque das faltas justificadas. Pode haver
mais motivos justificativos noutros diplomas.

 Alínea j): são faltas justificadas as autorizadas ou aprovadas pelo empregador.


Os efeitos da ausência afetam a produtividade da empresa do empregador. Ora, se
o empregador consente na falta, aceitando uma desvantagem para si, a lei também
não obsta a isto.

No entanto, é claro que isto cria um problema: alguns empregadores podem


autorizar certas faltas e outros podem ser mais severos, não autorizando nada. Esta
alínea acaba por criar um critério discricionário. Todavia, este deve ser aplicado
uniformemente pelo mesmo empregador. Se o empregador X autoriza o trabalhador
A a faltar ao trabalho para ir ver um jogo de futebol, tem de autorizar o trabalhador
B para fazer o mesmo. Esta lei, ao conferir discricionariedade ao empregador,
também cria padrões vinculativos ao mesmo. Claro que, independente disto, esta
norma dará sempre azo a uma certa discricionariedade.

Note-se, contudo, que esta norma está ainda prevista para aqueles casos de atrasos
não culposos (por exemplo: quando há um acidente na estrada, quando o comboio
não passa, etc.). O empregador razoável poderá desculpar estas situações que, de
certa forma, não são queridas pelo trabalhador, são acidentes da sociedade.

Note-se também que a lei, no artigo 248º, nº1, apenas fala apenas de uma ausência
pura e simples, não fala de uma ausência culposa. Daí que depois dê ao empregador,
nesta alínea, a faculdade de ser razoável e não contabilizar a falta não culposa do
trabalhador. Agora, não deveriam caber aqui aquelas situações em que a falta é
culposa. Por exemplo: nos casos em que há uma greve dos comboios (previamente
avisada) e o trabalhador não aparece, aí compreende-se que este deveria ter
arranjado um meio de transporte alternativo.
Posto tudo isto, compreende-se que, se a comparência do trabalhador significa
assiduidade, a sua ausência não equivale, necessariamente, a uma violação deste dever.
A falta só será justificada se a ausência, quando previsível, for comunicada ao
empregador, acompanhada por indiciação do motivo justificativo, com antecedência (artigo
253º CT). Por exemplo: se trabalhador sabia que ia faltar, porque tem uma consulta, ou tem de
ir a tribunal, etc. este teria de comunicar esse motivo ao empregador. A prova do motivo
invocado não é exigida sempre, apenas o é quando o empregador a exigir (artigo 254º CT).
Há ainda situações em que a lei confere ao trabalhador um direito a faltar ao trabalho,
previstas nos artigos 251º, 252º, 252º A. Por exemplo: direito de prestar assistência a um
familiar; luto de um cônjuge ou equiparável; luto de um parente; acompanhamento de uma
grávida, etc. A lei faz prevalecer, nestas situações excecionais, os interesses pessoais do
trabalhador em detrimento dos interesses de produtividade e económicos da empresa.

56
9.9.2. Efeitos da falta
Em regra, a falta justificada não afeta qualquer direito do trabalhador, incluindo o
direito à retribuição. No entanto, ainda neste âmbito, pode o trabalhador perder o direito à
retribuição nos casos enumerados no artigo 255º, nº2 CT: por motivo de doença, se o
trabalhador for beneficiário de proteção da segurança social; por motivo de acidente do
trabalho, se o trabalhador tiver direito a um subsídio ou seguro; etc.
De facto, recai sobre o empregador uma obrigação de legal de, quando celebra o
contrato de trabalho, inscrever o trabalhador na segurança social para efeitos de doença. É
também obrigatório fazer um seguro para acidentes de trabalho em benefício do seu
trabalhador. Isto significa que, se o empregador não cumprir com estes dois deveres, é
responsável pela retribuição dos trabalhadores nestes casos (doença ou acidente no trabalho).

No que toca à falta injustificada, nos termos do artigo 256º, nº1 CT, temos dois efeitos
automáticos: perda de retribuição e descontinuidade na contagem da antiguidade. O problema
é saber como é que se faz esse desconto.
No limite, poderão as faltas injustificadas levar ao despedimento por justa causa, por
via do artigo 351º, nº2, al. g) CT. Aqui importa falar da culpa, exigida nos casos de
despedimento por justa causa (artigo 351º, nº1 CT). Quando é que é a falta não é imputável ao
trabalhador? Quando a causa que levou à falta não foi provocada diretamente pelo
trabalhador. Vamos supor que o trabalhador teve um acidente de viação por própria culpa
(porque adormeceu, porque ia em excesso de velocidade, etc.) e partiu uma perna, ficando
impossibilitado de trabalhar. O impedimento seria-lhe imputável. Pode também dar-se o caso
de o trabalhador adoecer porque se expôs a um certo perigo, por exemplo. O facto também lhe
seria imputável. Em ambos casos há culpa. Contudo, temos de obedecer a uma interpretação
a nda ma re tr ta de te “comportamento culposo” temo de ter em onta e o mot o er
aqui imputável, para efeitos de falta culposa, se tiver sido provocado pelo trabalhador
dolosamente, isto é, se foi provocado com vista a não cumprir a obrigação de prestação de
trabalho. Só nestes casos, com esta interpretação muito restritiva, é que a ausência é imputável.
Nos casos que vimos há culpa, mas não há dolo. O trabalhador não pretendia furtar-se ao
trabalho.

Outos artigos relevantes a considerar relativamente aos efeitos da falta:


Artigo 256º, nº2: a falta injustificada a um ou meio período de normal diário,
imediatamente anterior ou posterior a dia ou meio dia de descanso ou feriado, constitui infração
grave. Esta norma é especialmente dirigida ao combate ao absentismo laboral. Porquê? Porque
prolonga o tempo da ausência para além do efetivamente verificado. Por exemplo: numa
semana normal em que o trabalhador descansa ao sábado e domingo, se faltar na segunda, a
lei considera que faltou durante três dias: sábado, domingo e segunda. Se faltar na sexta e não
a uma segunda, também se considera que faltou três dias. A lei trata assim o prolongamento
do

57
fim de semana. Esta é uma situação excecional, pois a falta é considerada além do período
normal de trabalho diário que determina o conceito de falta.
Artigo 256º, nº4 (quanto à pontualidade): aqui também temos um prolongamento da
falta. Se o trabalhador chegar atrasado por tempo superior a uma hora, o empregador pode não
aceitar a prestação do resto do período normal de trabalho, o resto do dia. É uma forma de punir
a falta da assiduidade. Sendo superior a 30minutos, o empregador pode não aceitar a prestação
relativamente ao resto do período (manhã, tarde ou noite). Claro que, nestas situações, os
trabalhadores não recebem retribuição. A aplicação destas normas vincula o comportamento e
as decisões do empregador relativamente as estas situações, não pode haver uma
discricionariedade total.
Artigo 257º: admite-se que o trabalhador possa compensar a perda de retribuição nos
casos previstos neste artigo, substituindo a perda de retribuição por outra consequência. Depois
acautela-se um aspeto: se o trabalhador substitui perda de retribuição por perda de dias de férias
(alínea a) deste artigo), perde a retribuição desses dias de férias. Isto é, se o trabalhador
substituir dois dias de perda de retribuição por dois dias de perda de férias, a retribuição que
receberá pelo período de férias, como é obvio, apenas corresponderá aos 20 dias e não aos 22
dias úteis de a que tem direito.

Aula de 8/11/2019
10. RETRIBUÇÃO
(páginas 255 a 289 do livro do professor Leal Amado)
A retribuição rege-se por um princípio de igualdade (artigo 59º, nº1, a) CRP): trabalho
igual, retribuição igual. Admite-se apenas a diferenciação salarial com base num critério de
qualidade, que tem que ver com a pessoa do trabalhador, com a sua aptidão pessoal/subjetiva,
ou natureza, que tem que ver com o meio/a forma como a atividade é exercida (se é exercida
de dia ou de noite, etc.).

Há quem acrescente outro critério, a produtividade: seria melhor compensado o


trabalhador que atingisse os melhores resultados (que se mede depois pelo número de peças
que se faz, pelo número de contratos celebrado, etc.). O certo é que será duvidoso se por esta
via se poderá fazer distinção.

O conceito de retribuição está definido no artigo 258º, nº1 CT como uma prestação a
que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em
contrapartida do seu trabalho. A retribuição é a obrigação capital e nuclear da entidade
empregadora. Qualquer prestação só tem natureza retributiva se for obrigatória. Tem que haver
um vínculo/dever de uma parte à qual corresponde o direito da outra parte. Tudo no contrato
de trabalho é sinalagmático.
Do nº2 do mesmo artigo constam vários aspetos:

a) A retribuição compreende a:

58
o Retribuição base: não há nenhum critério legal, mas tem sido entendido que
a retribuição de base é o salário que corresponde à categoria profissional do
trabalhador, isto é, às funções que o trabalhador exerce, em condições de
normalidade. A atividade normal é aquela que é prestada em período normal
de trabalho, considerando-se normal aquele trabalho que não é noturno, que
não é de risco, que não é de turno rotativos, em isolamento, etc.;

o Retribuição complementar ou acessória: retribuição atribuída ao


trabalhador que presta trabalho em condições não normais. Exemplos:
diuturnidades (para quem presta trabalho noturno); subsídios de risco (para
quem presta trabalho de risco), de alojamento, de transporte, de alimentação,
de turno, de férias, de Natal, etc.

b) A retribuição pode ser uma obrigação que provem direta ou indiretamente da


atividade de trabalho. O contrato de trabalho pode não ser a causa imediata da
prestação, mas deve ser o fundamento, ou a causa mediata;

c) Critério da regularidade e da periodicidade: é um critério sucedâneo à norma


do nº1 do mesmo artigo, tendo em conta que, por vezes, apenas com base na
leitura deste nº1, se levantam dificuldades para saber se determinada prestação
é uma retribuição para efeitos do código de trabalho. Considera-se, então,
retribuição, as prestações regulares e periódicas. Não temos aqui critérios
temporais pré-determinados, ou fixos, isto é, a retribuição não tem
necessariamente de ser mensal ou anual. A retribuição, para o ser, tem é de
preencher cumulativamente estas duas características, tem de ser periódica e
regular. A prestação será regular e periódica quando criar nas partes uma ideia
de obrigatoriedade. O trabalhador terá uma expectativa jurídica. Por exemplo,
se ao fim de 20 anos de contrato de trabalho se verificou que a entidade
empregadora dá um prémio aos seus trabalhadores, isto não contará como
retribuição, porque não é regular. Mas se o fizer regularmente de 5 em 5 anos,
já poderá valer como tal.

d) Qualquer retribuição tem de ter natureza patrimonial, seja uma prestação


avaliada em dinheiro ou em espécie. A prestação não pode ser paga em louvores
ou em medalhas.

No final disto tudo ainda poderá haver dúvidas. Como tal, temos ainda um outro critério
para classificar uma prestação como retribuição, o qual está previsto no nº3 do artigo 258º CT.
É um critério que assenta numa presunção: presume-se constituir retribuição qualquer
prestação do empregador ao trabalhador. Sendo o contrato de trabalho uma “relação detro a”
o elemento de doação está afastado, em princípio. Tudo tem uma causa, não há benefícios
gratuitos. Logo, presume-se que é uma retribuição tudo o que o empregador prestar ao

59
trabalhador. É, no entanto, uma presunção relativa. Deve ser o empregador, querendo, afastar
a presunção.
NOTA: no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança
Social há uma norma em que elenca umas 10 ou 20 prestações que são consideradas apenas
para efeitos da segurança social e que podem não ser retribuições no código de trabalho. Isto
porque esse código trata apenas de garantias do património da segurança social. É importante
ter em consideração esta diferença de tratamentos e valorizações das diferentes prestações.
Determinada prestação pode não ser, para efeitos do código de trabalho, uma retribuição, e,
não obstante, pode sê-lo para efeitos da segurança social. São esferas de direito diferentes, logo,
compreende-se esta diferenciação.
Quando é que um bem, tratando-se de uma prestação em espécie (retribuição não
pecuniária), é considerado uma retribuição? A lei estabelece um critério para definir quando é
que o pagamento em espécie é considerado retribuição no artigo 259º, nº1 CT: a prestação
retributiva não pecuniária deve destinar-se à satisfação de necessidades pessoais do trabalhador
ou da sua família e não lhe pode ser atribuído valor superior ao corrente na região. Se o
empregador, por exemplo, fornecer casa ao trabalhador, a mesma atividade prestada em
Bragança e no Porto, terá valores em espécie muito diferentes.

Como se vê, a lei procura aqui restringir que a parte não pecuniária da retribuição
assuma proporções demasiado altas, criando limitações à mesma. E do número dois consta
ainda outra limitação: a retribuição não pecuniária não pode exceder o da parte em dinheiro.
Esta limitação surge porque só o pagamento em dinheiro preserva a liberdade de escolha de
consumos por parte do trabalhador e é essa função que deve ter um salário, isto é, a função de
garantir liberdade económica ao trabalhador. Por exemplo: se o empregador tem um salário de
1000€ não pode o valor da renda da casa fornecida em espécie e eder e e 1000€
independentemente do valor de mercado da região. A lei quer, no nº2, ainda garantir ao
trabalhador uma reserva em dinheiro para as suas necessidades.

10.1. Prestações excluídas do conceito de retribuição


O artigo 260º CT parece que estar a contrariar ou a restringir os critérios anteriores,
nomeadamente a presunção relativa do nº3 do artigo 258º CT, que prevê que qualquer prestação
do empregador ao trabalhador se considera uma retribuição. Isto porque, tal como prevê o
artigo 260º CT, ao contrário dessa presunção relativa, há certas prestações devidas pelo
empregador ao trabalhador que não têm diretamente que ver com a prestação de trabalho, mas
apenas indiretamente, daí não serem qualificadas como retribuição. No entanto, é facto que o
artigo 258º, nº2 também faz nota às prestações indiretas. Contudo, no artigo 260º falamos de
situações especiais.
Por exemplo: na alínea a) do número 1), falamos das despesas de transportes, hotéis,
etc. Obviamente, estas prestações não têm em contrapartida diretamente a atividade de
trabalho, embora sejam despesas relacionadas com essa atividade. Se o trabalhador vai
trabalhar para o Lisboa durante uma semana, não é esperado que compre lá uma casa. Nestas

60
situações, cabe à entidade empregadora comprar a viagem, reservar o hotel, entre outras
despesas. Estas despesas são comummente designadas como despesas de produção. São
despesas relacionadas com as a organização que vai permitir aos trabalhadores exercerem a sua
atividade. Como diz o Professor Leal Amado, “ ão aquelas importâncias que são pagas ao
trabalhador para o trabalho e não pelo trabalho”. endo de e a de rod ção e tão
diretamente relacionadas com proporcionar ao trabalhador as condições de trabalho, não estão,
portanto, diretamente relacionadas com a atividade laboral. Compreende-se que sejam
excluídas da classificação de retribuição.
No artigo 260º, nº1, al. a) in fine CT, diz-se que as despesas de produção podem fazer
já parte da retribuição do trabalhador quando:
o As deslocações ou despesas sejam frequentes;
o As importâncias sejam excessivas olhando aos montantes normais de deslocação;
o As importâncias sejam consideradas, pelos usos, ou contratualmente, como
retribuição.
As alíneas b) e c) do mesmo preceito são mais difíceis de compreender, porque estas
são atribuições que surgem em contrapartida do trabalho. Aqui poderíamos dizer que estamos
perante uma relação indireta. Mas porque é que não são consideradas retribuição? Porque
falta o carácter de obrigatoriedade. Uma gratificação extraordinária como recompensa não é
obrigatória. Claro que depois esta gratificação poderia tornar-se periódica, mas ainda não
seria obrigatória.
Quanto à alínea d): a participação nos lucros tanto pode ter carácter obrigatório como
não ter. Se o tiver, já haverá carácter retributivo. No entanto, a lei parte aqui do pressuposto de
que não terá carácter obrigatório e por esse motivo é que não considera estas prestações uma
retribuição. Além disso, também parte de uma relação indireta com a atividade laboral, não é
uma relação direta.
O nº2 do artigo 260º CT equipara às despesas de produção os abonos para falhas e os
subsídios de refeição. Estes são complementos que a empresa suporta para proporcionar
condições de trabalho e não propriamente para pagar a prestação de trabalho. Têm direito a um
suplemento remuneratório designado "abono para falhas" os trabalhadores que manuseiem ou
tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, títulos ou documentos,
sendo por eles responsáveis. O abono por falhas não se destina a premiar o trabalhador, mas a
criar condições de trabalho de tal modo que pequeninos erros ou pequenas falhas, que se
consideram normais dada a atividade laboral, sejam compensados.
NOTA: quaisquer gratificações concedidas ao trabalhador por terceiros (as gorjetas),
ainda que configurem um substancial rendimento deste, não integram a sua retribuição pelo
trabalho prestado.

AULA DE 14/11/2019
10.2. Modalidades da retribuição

61
O critério distintivo das várias modalidades de retribuição é a unidade de cálculo ou de
medida. Com efeito, podemos ter 3 modalidades:

 Retribuição certa: quando é calculada em função do tempo.

Além de ser a modalidade mais simples e a mais difundida, é também aquela que
mais segurança confere ao trabalhador, visto que torna a sua posição menos
dependente do seu (in)êxito na empresa e das flutuações do mercado, atenuando, de
certa forma, o poder patronal.

 Retribuição variável: quando é calculada em função de critérios diversos do


temporal, que normalmente têm como máxima o rendimento do trabalhador
individualmente considerado ou de um determinado grupo de trabalhadores (por
exemplo: salário à peça, salário à tarefa, etc.). O resultado da atividade desenvolvida
pelo trabalhador assume extrema importância em sede desta modalidade, não tanto
para apurar se o trabalhador cumpriu ou não as suas obrigações, mas sim para
determinar o montante da contrapartida patrimonial devida pela entidade
empregadora. Aqui o trabalhador não deixa de cumprir o contrato caso não atinga
os resultados pretendidos, mas o seu inêxito caba por se repercutir negativamente
em sede remuneratória.

Esta será a modalidade que exige maior ritmo de trabalho e o que pode conflituar
com os valores de segurança no trabalho. Ainda mais, estimula a competição entre
os trabalhadores, afetando a solidariedade dos mesmos e pode até pôr em causa a
própria dignidade do trabalhador enquanto pessoa, intensificando a exploração do
trabalho alheio.

 Retribuição mista: resulta do conjunto das duas modalidades enunciadas.

Traduz um compromisso aceitável entre a necessidade de contribuir para a elevação


dos níveis de produtividade e a tutela de uma certa segurança para o trabalhador. É
vista com melhores olhos do que a retribuição variável.

10.3. Prestações complementares ou acessórias


Nós já falamos nas prestações complementares, previstas no nº2 do artigo 258º CT. No
nº1 do artigo 262º, que é norma supletiva, consagra-se que, salvo em disposição diferente, seja
no âmbito do contrato, seja no âmbito de outra fonte (como convenção coletiva), para o cálculo
das prestações complementares deve-se ter em conta a retribuição base e as diuturnidades.
Depois o artigo define, na alínea b) do nº2, o que é que se entende por diuturnidade:
“prestação retributiva a que o trabalhador tem direito com fundamento na antiguidade”.
seja, é uma prestação que tem que ver com a duração do contrato, pode estar prevista ou não.

62
Esta norma vale como chave interpretativa de várias disposições do Código de Trabalho
que, a propósito do cálculo de determinadas prestações, se referem, sem mais, à retribuição ou
a uma percentagem desta (por exemplo no artigo 263º quanto ao subsídio de Natal).
Nota: de seguida iremos ver que a lei fixa mínimos retributivos. Isto significa que é
deixada às partes uma grande liberdade para estipular valores superiores a esses mínimos
retributivos. Dentro dessa imperatividade mínima, há uma área em que as partes gozam de
liberdade, muito embora não nos possamos esquecer do princípio base do contrato retributivo:
além destes mínimos legais, o espaço de liberdade deixado às partes tem de ser exercido com
base no princípio da igualdade.
Entre os artigos 263º e 269º, a lei tratou de enumerar as prestações complementares
relativas a determinadas situações laborais que nós já vimos atrás e que têm de ser completadas
com estas normas.

10.3.1. Subsídio de natal (artigo 263º CT)


É uma prestação complementar com previsão legal, apesar de originalmente surgir por
via da convenção coletiva (eventualmente a lei integrou-a).

Consiste numa prestação pecuniária paga ao trabalhador durante a quadra natalícia,


visando assegurar a este último uma disponibilidade financeira que lhe permita enfrentar o
acréscimo de despesas tradicionalmente associadas a esta época do ano.
Há uma semelhança entre a retribuição por férias e este subsídio, na medida em que
este também é uma prestação formação progressiva ao longo do ano civil. Por outro lado,
também aqui a lei fixa um termo de vencimento anual: o subsídio de natal deve ser pago até
dia 15 de dezembro (vence até esse dia), sendo proporcional ao tempo de serviço prestado no
ano civil.

Da articulação deste preceito com o artigo 262º CT, parece que a base de cálculo deste
subsídio será, em princípio, e não havendo disposição convencional ou contratual em contrário,
apenas a retribuição base e as diuturnidades mensalmente devidas ao trabalhador.

10.3.2. Retribuição do período de férias e subsídio (artigo 264º CT)


O trabalhador, relativamente ao período de férias, tem direito a uma retribuição idêntica
à que receberia se estivesse a prestar trabalho, ou seja, o trabalhador, nesses dias, tem direito a
auferir uma retribuição idêntica à que normalmente aufere.

Entre nós, quando se fala de férias, a lei contempla uma dupla retribuição:
 A retribuição de férias propriamente dita: é uma retribuição idêntica àquela que
o trabalhador receberia se estivesse em funções, o que significa que, se este estivesse
a receber prestações complementares regular e periodicamente, no período de férias
teria este também direito a auferir essas;

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 O subsídio de férias: este é diferente do subsídio de natal, na medida em que o
critério de base de cálculo é diferente. A lei admite que o subsídio possa ser afastado
pelas partes e/ou que este seja pago antes do início das férias.

10.3.3. Retribuição por isenção de horário (artigo 265º CT)


A lei prevê uma retribuição mínima para o regime de isenção de horário, tendo em conta
que este exige uma disponibilidade muito maior por parte do trabalhador que o trabalho normal.
A lei admite que as partes possam fixar uma compensação especifica pelo trabalho
isento de horário de trabalho por via individual, ou por via coletiva. No entanto, a lei estabelece
um limite mínimo, isto é, um valor compensatório mínimo que, naturalmente, as partes não
podem reduzir. Supletivamente, então, a lei estabelece que o trabalhador isento de horário de
trabalho tem direito, no mínimo, a uma compensação equivalente a uma hora de trabalho
suplementar por dia, ou a duas horas de trabalho suplementar por semana, quando se trate de
regime de isenção de horário com observância do período normal de trabalho (nº1, alíneas a) e
b) do artigo 265º CT).
Depois, o nº2 do artigo 265º contempla o único caso de renuncia à retribuição
previsto na lei. Isto porque, sendo a retribuição um direito fundamental, é um direito
indisponível e irrenunciável (artigo 59º, nº1, al. a) CRP). Mas o certo é que, nos termos da lei,
os trabalhadores que exerçam cargos de administração ou de direção em regime de isenção de
horário podem renunciar a esta prestação complementar. Porquê? Porque estes auferem
normalmente retribuições muito acima da média. Esta é uma norma tradicional entre nós, daí
nunca ter sido questionada. Todavia, esta é, note-se, uma faculdade, não é uma norma
imperativa.

10.3.4. Pagamento de trabalho noturno (artigo 266º CT)


O trabalho noturno, como vimos, confere direito a um suplemento remuneratório. A
regra é que o trabalhador noturno tenha direito a um acréscimo de 25% de remuneração
relativamente ao trabalho equivalente prestado durante o dia.
A lei admite, em regra, no que toca àqueles trabalhadores que permanentemente, ou que
com muita frequência, prestam trabalho noturno, que a forma de pagamento não seja sempre
diretamente em dinheiro. Isto é, o nº2 do artigo 266º CT prevê que esse acréscimo de 25% pode
ser substituído, mediante instrumento de regulação coletiva de trabalho, por duas outras formas
de compensação:

a) Um dos meios de pagamento, previsto na alínea a) deste número, é através da


redução equivalente do período normal de trabalho. Ou seja, terá o trabalhador uma
redução do período normal de trabalho equivalente ao trabalho noturno prestado.
Ganhará o mesmo por menos trabalho, digamos assim, mas isto justifica-se, pois
destina-se este benefício a compensar um regime mais duro de trabalho, que é o
trabalho noturno.

64
b) Ou, então, outra forma de compensação alternativa, prevista agora na alínea b), pode
ser ter um aumento da retribuição base. Esse acréscimo, no entanto, e segundo a
lei, não pode importar um tratamento menos favorável para o trabalhador. Isto quer
dizer que, entre o aumento decorrente da majoração da retribuição base e o valor
que o trabalhador iria auferir por cada hora de trabalho noturno, não pode haver uma
grande discrepância. O que é que isto tem que ver com um tratamento menos
favorável, como diz a lei? Ora, se há um aumento da retribuição base, ela é para o
futuro. E o futuro é relativamente imprevisível: o trabalhador pode prestar mais
horas de trabalho noturno, ou menos. Daí que, quanto ao professor, o que a lei quer
com esta disposição é impedir que haja uma grande discrepância entre os valores já
referidos, ou impedir ainda que o aumento da retribuição base seja uma forma
camuflada de retribuir menos do que o trabalhador em média iria auferir pela
compensação do trabalho noturno. O professor não crê que seja uma norma rigorosa
e técnica, mas de aproximação. Procura-se uma linha média de equivalência de
retribuição ao longo dos anos, ou seja, de pouca discrepância.
A lei isenta dessa majoração retributiva, nos termos do nº3 do artigo 266º, aquelas
atividades que são exclusivas ou predominantemente exercidas em período noturno. De certa
forma, a lei desvaloriza o ónus/o sacrifício que trabalhar à noite implica. Portanto, para aquelas
pessoas que são trabalhadores profissionais noturnos (aqueles que prestam sempre trabalho à
noite), a lei não contempla nenhuma majoração ou redução do tempo de trabalho, mas admite
que esteja esta prevista em contrato de trabalho ou convenção coletiva.

10.3.5. Retribuição por exercício de funções afins ou funcionalmente ligadas (artigo


267ºCT)
No artigo 267º a lei remete para o artigo 118º, que tem que ver com as funções
desempenhadas pelo trabalhador e a lei. Relativamente ao disposto no nº2 deste artigo,
relativamente às atividades afins, prevê a lei, no artigo 267º, que, quando o trabalhador exerça
as tais funções afins que lhe conferem o direito a uma retribuição mais elevada, ele tem direito
a essa tal retribuição maior.

10.3.6. Pagamento de trabalho suplementar (artigo 268º CT)


No âmbito do trabalho suplementar, já vimos que há várias modalidades: trabalho
prestado em dia normal, em dia de feriado, em dia de descanso semanal, etc. Dentro dessas
modalidades, a correspondente majoração da retribuição é diversa.

Quando se trata de trabalho prestado em dia útil, a majoração é 25% pela primeira hora
ou fração desta e de 37,5% por hora ou fração subsequente. Diferentemente, quando se trate de
dia de descanso, obrigatório ou complementar, ou feriados, a majoração é maior: será de 50%
por cada hora ou fração.

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De certa forma, a lei não se pronuncia em largos termos sobre o trabalho suplementar
prestado em dia útil, com exceção do descanso semanal, que é a própria lei, no artigo 232º
CT, que estabelece um critério (a garantia dada ao trabalho prestado nas horas de descanso
semanal que antecede ou que sucede ao descanso semanal: esse talvez seja tratado com
trabalho complementar em descanso semanal). Nos restantes dias, parece que o trabalho
prestado durante o período de descanso diário será enquadrado no trabalho prestado em dia
útil.
Uma norma que tem levantado certos problemas é a norma do nº2 do artigo 268º CT.
Esta norma aplicada à letra tem consequências que não são nem adequadas nem proporcionais
à tutela da retribuição do trabalho prestado. A justificação global dada para esta norma é esta:
a lei pretende aqui evitar que os trabalhadores prolonguem o período normal de trabalho por
sua iniciativa e que, portanto, sejam eles a decidir se há trabalho suplementar ou não. A lei, de
modo a evitar estas situações, parece prever que o trabalho suplementar seja sempre decidido
pelo empregador. Claro que há um juízo de desvalor da posição/trabalho prestado pelo
trabalhador. Segundo o professor, simplesmente não devíamos ser tanto ao mar, nem tanto à
terra.

A jurisprudência já tem vindo a corrigir a rigidez formal da norma do nº2 deste artigo.

Sobre a primeira parte da norma, que diz que o trabalho suplementar só deve ser
pago quando for previa e expressamente decido pelo trabalhador “era melhor que assim não
o e” d z o ro e or. r-se-á, portanto, que o trabalho suplementar que não seja
expressamente determinado pelo empregador, não confere retribuição. Há, logo aqui,
dificuldade em perceber quando é que ele é expressamente determinado pelo empregador, pois
poderá haver dificuldades de prova. É necessária uma declaração? Um documento escrito?
Uma declaração tácita? Não está definido.
e o temo o tra e tão anto ao o do ad rb o “previamente”. A re tação de
trabalho suplementar, para ser alvo de retribuição, tem de ser ainda previamente determinada,
não basta ser expressa.
Vejamos: quem tem de provar a existência do trabalho suplementar de modo a obter a
justa retribuição é o trabalhador. Claro que o registo do mesmo servirá como elemento de prova
(o registo deve ser fiscalizado pela entidade empregadora, portanto, se houver erros, estes terão
de ser objetivamente imputáveis ao trabalhador). Se este direito à retribuição do trabalho
suplementar está dependente da prova que o trabalhador faça, e se este tem de provar também
que se tenha verificado a conjugação de uma ordem expressa e prévia por parte do empregador,
sem determinar a lei exatamente quais o que significa isto, convínhamos que está o trabalhador
um pouco condicionado.
A consequência disto é que, muitas vezes, o trabalho suplementar não será pago, visto
que o trabalhador não consegue fazer prova de que prestou trabalho ao abrigo desse regime. A
jurisprudência tem entendido que, não havendo ordem expressa e prévia, se, durante ou após a
realização do trabalho suplementar, o empregador nada diz, isto é, se não se opõe ou contesta,
tem-se preenchida a base jurídica que confere direito à retribuição trabalho suplementar.
Entende-se que o empregador aceitou esta prestação tacitamente através da sua não oposição,
o que é equivalente à sua declaração expressa e prévia.

66
Por outras palavras, que garantias tem o trabalhador quando é ele que toma a iniciativa
de realizar o trabalho suplementar? Em qualquer das outras situações em que não haja uma
ordem expressa e prévia do empregador, a iniciativa é sempre do trabalhador. A questão que
se coloca é a seguinte: quando o trabalhador, perante determinada exigência ou necessidade da
empresa, ficar a trabalhar por período suplementar, quando é que tem direito a prestação
correspondente por esse período? Entende-se que terá direito à prestação quando o
empregador a aceita o trabalho realizado. Haverá uma complementaridade de interesses que
conferem direito à retribuição.
A segunda parte da norma diz o seguinte: é exigível o pagamento de trabalho
suplementar quando este foi realizado de modo a não ser previsível a oposição do empregador.
A segunda parte é uma forma de atenuar a rigidez da primeira. Esta segunda parte tutela os
casos em que o trabalhador decide trabalhar por período suplementar, convencido que aquela
prestação corresponderia aos interesses objetivos do empregador, de modo que não seria
previsível a oposição deste. O trabalhador é colocado perante este juízo de avaliação: será que
o trabalho após o meu horário normal de trabalho será aceite pelo meu empregador, será que
ele quererá que eu continue a trabalhar? Que garantias é que a lei confere aqui ao trabalhador
em termos retributivos? A lei remete para a prática empresarial, isto é, temos de atender à
prática que se realiza habitualmente na empresa.

Por exemplo: vamos supor que um trabalhador, todos os sábados (dia de descanso
completar na empresa), durante vários anos, ia atestar os depósitos das viaturas da empresa.
Quando o seu contrato terminou, o trabalhador reclamou a retribuição do trabalho suplementar
durante esse período de tantos sábados a trabalhar, a qual nunca chegou a auferir. O tribunal
não teve dúvidas de que o trabalho prestado era uma prática da empresa e não hesitou em dizer
que não seria previsível a respetiva oposição ao mesmo por parte do empregador. Este é um
caso muito claro daquilo que deve ser considerado trabalho suplementar em termos da prática
da empresa. No entanto, aqui estamos a falar de uma prática que se arrastou durante anos,
porque se fosse apenas durante meses, ou até durante apenas algumas semanas, seria mais
difícil de a classificar como tal.
Portanto, terá o trabalhador, de modo a auferir retribuição, de fazer prova do facto e da
não previsibilidade de oposição do empregador. Esta classificação como trabalho suplementar
pelo tribunal vai sempre depender da situação em causa e dos meios de prova que o trabalhador
consiga obter, visto que as garantias legais não são seguras.
Depois há ainda outro aspeto, que são aqueles casos em que o trabalho suplementar
acaba por ser uma obrigação decorrente da boa fé contratual: pode haver situações em que o
trabalhador, findo o horário de trabalho, se confronte com atividade suplementar e que essa
possa, inclusivamente, ser uma obrigação decorrente da boa fé.

Por exemplo: o trabalhador A foi prestar atividade a um local diferente do habitual.


Vamos supor que A que trabalha no Porto foi a Vila Real vender uma máquina. Depois de
vender a máquina, surge em Vila Real um novo cliente, mas este surge já depois do horário
normal de trabalho de A. Terá A uma obrigação de o atender no período posterior ao seu
período normal de trabalho? E, se o fizer, será compensado por isso? Se estivéssemos a falar
de prestação de trabalho no local de trabalho não haveria dúvidas, aí horário é fixo, não há uma

67
obrigação de trabalhar, o estabelecimento fecha e voltaria o cliente no dia seguinte, se lhe
provesse. Mas, estando deslocado, o professor crê que decorre da boa fé contratual que o
trabalhador continue em funções. Poderemos falar de um princípio de obrigatoriedade
decorrente da boa fé contratual que envolve o período de trabalho prestado em período
posterior ao normal.
Em suma, o nº2 do artigo 268º tem de ser interpretado no sentido de não conduzir, na
maioria das situações problemáticas ou duvidosas, a um princípio de não retribuição do
trabalho suplementar. No entanto, recaindo o ónus de prova de todos estes elementos na esfera
do trabalhador, é muito frequente ver os nossos tribunais a concluir pela não retribuição, pois
a norma não é uma garantia suficiente, neste caso.

10.3.7. Prestações relativas a feriado (artigo 269º CT)


Os feriados não são, tecnicamente e do ponto de vista jurídico, dias de descanso, apesar
de se traduzirem em períodos de não trabalho. No entanto, havendo esse direito de não
trabalhar, o trabalho prestado nesse dia é trabalho suplementar. Também já vimos, no artigo
anterior, que a lei estipula um acréscimo de 50% da retribuição para estes dias.

Mas há aqui uma especificidade: o nº1 do artigo 269º tem efeitos garantísticos. O
problema surge no nº2, que tem que ver com o facto de que há empresas que estão isentas de
encerrar um dia por semana e que, como tal, estão isentas de encerrar nos feriados. O feriado é
um dia de trabalho, mas não é um dia de período normal de trabalho. Quando estas empresas
não encerram, continuam em funcionamento, os seus trabalhadores, logicamente, têm de estar
presentes no local de trabalho, não sendo gozados os feriados. O nº2 prevê que o trabalhador
que presta trabalho normal em empresa não obrigada a suspender o funcionamento em dia de
feriado tem direito a descanso compensatório com a duração de metade do número de horas
prestadas ou a acréscimo de 50% da retribuição correspondente, cabendo a escolha ao
trabalhador. Portanto, nas empresas que trabalham os 365 dias por ano, a forma de retribuir o
trabalho prestado em dia de feriado é com descanso compensatório, ou com o pagamento em
dinheiro.
O que é que há aqui de diferente? Nós já vimos, a propósito do trabalho suplementar,
que este tem de ter um fundamento objetivo, isto é, tem de ser fundamentado numa necessidade
extraordinária e temporária de trabalho, a qual não justifique a contratação de um novo
trabalhador do ponto de vista da produtividade empresarial. De certa forma, a lei quer reduzir
os custos nestas empresas em que o trabalho prestado em dia de feriado se insere na atividade
normal da empresa, porque estas, como têm sempre os trabalhadores em funções, têm muitas
despesas. Portanto, confere a lei uma alternativa: a possibilidade de compensar com tempo
descanso.

Por exemplo: compensa-se as 8 horas prestadas no 25 de Abril noutro dia. Mas pode
não ser um descanso consecutivo, pode descansar uma hora por dia, por exemplo. O descanso
compensatório não tem de ser idêntico ao trabalho prestado. Aliás, a lei só garante

68
um descanso correspondente a metade das horas de trabalho prestado, logo, o pagamento é em
singelo. Temos aqui então um regime especial e privilegiado para a empresa: podem, em
primeiro lugar, recorrer ao trabalho suplementar sem necessidade objetiva; depois tem esta
faculdade da compensação em descanso.
Relativamente ao trabalho suplementar prestado em dia útil/dia normal, a lei confere
25% de acréscimo à primeira hora de trabalho. Mas quanto é que o trabalhador aufere nessa
hora para sabermos como fazer o cálculo do acréscimo de 25%? O artigo 271º prevê a fórmula
de calcular o valor da retribuição horária. Esta é uma norma de aplicação geral e tem de ser
usada sempre que se pretende saber qual é a retribuição auferida numa determinada hora de
trabalho (em casos de período noturno, trabalho suplementar, etc.) Claro que a lei aqui se refere
ao trabalho prestado em termos médios nos casos de adaptabilidade, que acaba por ser superior
à retribuição do trabalho em período normal.

10.4. Retribuição mínima mensal garantida (salário mínimo)


Um outro aspeto que tem que ver com a retribuição é o salário mínimo (retribuição
mínima mensal garantida). Entre nós o salário mínimo foi instituído em 1974. Nessa altura,
Portugal foi pioneiro, pelo que ainda eram poucos os países na Europa que previam esta
garantia, apesar de todos os países europeus terem salários superiores, em média, aos dos
portugueses. Agora podemos dizer que, salvo poucos países, a grande maioria já fixou um
salário mínimo, seja por via legal, seja por via contratual. Por exemplo, na Suécia, o salário
mínimo é fixado ao nível de convenção coletiva.
O fundamento desta retribuição mínima está diretamente relacionado com a tutela da
dignidade humana. Está ainda previsto constitucionalmente no artigo 59º, nº2, alínea a).
Entende-se que recai sobre as empresas e o sobre Estado em geral um dever de garantir aos
trabalhadores um mínimo de dignidade humana, um mínimo de sobrevivência digna. Pretende-
se que as pessoas consigam auferir rendimentos para viver minimamente.
O artigo 273º CT refere-se ao modo de fixação desta retribuição mínima. Este tem de
ser fixado tendo em conta o custo de vida dos países em causa.
Uma vez instituído, quais são as garantias que a lei prevê para o salário mínimo? Aqui
releva o disposto no artigo 274º e seguintes.

Em primeiro lugar, qualquer que seja a modalidade de retribuição praticada (certa,


variável ou mista), o trabalhador não poderá, em cada mês de trabalho, receber um montante
inferior ao da retribuição mínima garantida aplicável.
Depois temos de questionar: a erão o alore a er n l do no 600€ re to
como retribuição mínima? As retribuições suplementares podem estar incluídas neste valor? O
nº1 do artigo 274º enumera quais são estes valores incluídos da retribuição mínima. Entre eles,
logo na alínea a), a lei refere-se ao valor de prestação em espécie. O nº2 do mesmo artigo
prevê consequentemente o cálculo do valor dessa prestação em espécie, de modo a estabelecer
garantias que permitam que o trabalhador que aufere o salário mínima ainda disponha de algum

69
montante líquido que possa usar com autonomia (isto não deixa de ter por base a dignidade
humana). A lei estabelece tetos de valoração das prestações em espécie. No entanto, se o salário
or 610€ or e em lo já entramos no regime normal, isto é, já se valoram as prestações em
espécie de acordo com o regime normal.
Admitem-se, no artigo 275º CT, situações de redução do valor da retribuição
mínima no caso dos aprendizes, praticantes, estagiários ou formandos em situação de formação
certificada e no caso dos trabalhadores com capacidade de trabalho reduzida.
Quanto às retribuições completares: trabalho noturno, trabalho suplementar, etc. Podem
estas ser, ou não, incluídas no salário mínimo? Não. O salário mínimo constitui a retribuição
pelo trabalho prestado em período normal de trabalho e em condições de normalidade (define-
se trabalho normal por exclusão: aquele que não é prestado em dias de feriados; que não é
prestado de noite, etc.). Ou seja, as prestações acessórias ou complementares não podem ser
incluídas na retribuição mínima garantida. Estas prestações terão de acrescer à retribuição
mínima.
Nos termos do nº2 do artigo 266º CT, relativamente à retribuição do trabalho noturno,
permite a lei que a compensação possa ser feita por aumento da retribuição de base quando os
trabalhadores trabalham à noite permanentemente ou com muita frequência. Está em causa
compensar o sacrífico do trabalho noturno. É importante notar que este acréscimo do trabalho
noturno tem de acrescer ao salário mínimo (que é aqui a retribuição base, daí o conflito).
Admitindo que a prestação normal de trabalho é definida pelas 8h/40h, qualquer prestação
completar imputada à retribuição de base, que neste caso é a retribuição mínima, terá sempre
lhe acrescer, ou então deixaria esta retribuição de caber no instituto da retribuição mínima,
perdendo os benefícios que este garante.
Apesar do valor mínimo ser fixo (qualquer cláusula que estabeleça um salário inferior
é nula), nada impede as fontes inferiores, como a convenção coletiva de trabalho, e os contratos
de trabalho individuais de fixarem salários mais elevados.

10.5. Cumprimento de obrigação de retribuição


Sobre o pagamento da retribuição temos o artigo 276º CR: a retribuição é sempre feita
em dinheiro ou em espécie. Quer isto dizer que a retribuição tem sempre carácter patrimonial,
mas poderá não ter necessariamente caracter pecuniário. Todavia, não sendo as prestações em
espécie de caracter pecuniário, não deixam estas de assumir um carácter patrimonial, sendo
inclusivamente redutíveis a um equivalente pecuniário.

Um aspeto típico do contrato de trabalho tem que ver com o documento de previsto no
nº3 do artigo 276º. Normalmente, quando fazemos uma compra e recebemos um recibo, esse
recibo é uma prova de que pagamos x pela coisa. É isso também que se passa, no seio do
contrato de trabalho, relativamente à retribuição.

70
Por exemplo: quando alguém nos empresta dinheiro, se nos for exigido, passamos um
papelinho (um recibo) a dizer quando é que este nos emprestou. Isto é, acaba por ser o devedor
a passar esse recibo que, no fundo, é um documento de verificação da dívida. No âmbito da
retribuição as coisas passam-se ao contrário. No ato de pagamento, o trabalhador recebe a
retribuição, mas, ao contrário do regime normal, é o empregador que tem de entregar ou colocar
à disposição do trabalhador o documento comprovativo da retribuição e das diferentes parcelas
que a compõem.
A le obr a om e e to a a em de m “re bo” m boletim de pagamento),
aquando do pagamento da retribuição. É um dever do devedor (que é o empregador, pois é o
que deve a prestação) fazer prova do respetivo cumprimento da obrigação. Todavia, a norma
do artigo 276º, prevista no interesse do trabalhador (o credor da relação), não prevê uma
quitação, não facilitando a prova do cumprimento a ser feita pelo empregador. Não obstante,
pode o empregador, pagando o salário, exigir a quitação do trabalhador (documento em que o
credor, que aqui é o trabalhador, reconhece ter recebido o pagamento de seu débito e exonera
o devedor da obrigação), nos termos do artigo 787º, nº1 do Código Civil. Esta quitação
normalmente será dada mediante a assinatura, pelo trabalhador, do duplicado do documento
previsto no nº3 do artigo 276º.

A retribuição deve ser paga no local de trabalho, ou noutro local, se for assim
convencionado pelas partes, pelo que vigora o princípio da autonomia privada. Se for
convencionado outro local, conta-se como tempo de trabalho o tempo que o trabalhador gastar
para receber a retribuição (artigo 277º).
O tempo não é apenas a unidade de calculo da retribuição, é ainda a sua unidade de
vencimento. A retribuição vence-se por períodos certos e iguais: semana, quinzena, mês, de
acordo com o estipulado pelas partes. Nos termos do nº4 do artigo 278º CT, o montante da
retribuição deve estar à disposição do trabalhador na data do vencimento ou em dia útil anterior,
pelo que o empregador ficará constituído em mora se o trabalhador, por facto que não lhe seja
imputável (ao trabalhador), não puder dispor do montante na data do vencimento (Nº5 do
mesmo artigo). Entre nós vence-se a cada mês, mas em Inglaterra, por exemplo, vence-se a
cada semana. Aqui a lei não prevê o vencimento anual da retribuição, nem parece que esteja
previsto em qualquer outro país. O importante destacar aqui é o carácter certo e periódico da
retribuição.
Nota: o salário é pago posteriormente à prestação de trabalho, não antecipadamente.
Isto não deixa de ser uma prestação de privilégio para a entidade empregadora.

Por fim, o CT consagra ainda uma garantia de irredutibilidade da retribuição no


artigo 129º, nº1, alínea d), nos termos da qual é proibido ao empregador diminuir a retribuição,
salvo disposição em contrário no CT ou IRCT. Ou seja, há uma proibição de regressão salarial
por decisão unilateral do empregador ou por acordo interpares, ainda que se trate de uma
baixa de categoria (a redução terá de atender ao artigo 119º CT).

71
AULA DE 15/11/2019

10.6. A especial tutela da retribuição


10.6.1. Compensações e descontos
Nas palavras de Antunes Varela, a compensação é uma forma de extinção das
obrigações em que, no lugar do cumprimento, o devedor opõe o crédito que tem sobre o credor.
Ao mesmo tempo que o devedor se exonera da sua divida, o compensado realiza o seu crédito,
por uma espécie de ação direta. O Código Civil regula este instituto entre os artigos 847º e
848º. No entanto, estes artigos só regulam a compensação legal, isto é, a compensação
unilateral, imposta por uma das partes à outra, sem ou contra a sua vontade. Estas disposições
não vigoram já no que toca à compensação voluntária ou convencional.
Em sede de compensação de obrigação retributiva, de acordo com Heck “a l beração
oferecida ao credor com a compensação não equivale plenamente à realização da prestação
devida. Recebendo a prestação, o redor ode dar-lhe al er a l ação e de eje ao a o
e om a om en ação o e r d to a l ado l bertação de ma d da”. ra a nção
alimentar do salário (que vamos ver de seguida), bem como a correspondente necessidade de
assegurar o seu pagamento, conduziram a uma limitação da compensação.

De acordo com a primeira parte do nº1 do artigo 279º, há uma incompensabilidade


absoluta do crédito salarial, não obstante as exceções previstas no nº2 do mesmo artigo. No
entanto, este artigo apenas proíbe que a entidade patronal atue como compensante, não podendo
compensar a sua divida retributiva com créditos que tenha sobre o credor na pendência do
contrato de trabalho (esta norma não proíbe que o faça após a extinção do contrato). Nada
impede ainda, somente pela leitura desta norma, a utilização do crédito salarial pelo
trabalhador, com o objetivo de saldar as dívidas que tenha com o empregador. Contudo,
impede-o o artigo 853º, nº1, al. b) do Código Civil, que diz que os créditos impenhoráveis não
podem ser extinguidos por compensação, e o artigo 738º do Código de Processo Civil, que diz
que o salário é parcialmente impenhorável. Como tal, o salário será insuscetível de se extinguir
por compensação em todas as situações, ainda que assente na vontade do trabalhador ou após
a cessação do vínculo contratual.

Depois temos a questão dos descontos que o empregador pode (ou está proibido) de
fazer (artigo 279º, nº1 segunda parte): o empregador não pode fazer deduções ao salário que
tenham origem em créditos que tiver com o trabalhador, tal como na questão da
compensação. Aqui a lei também distingue claramente o crédito laboral com outros créditos
que as partes possam ter devido a outras circunstâncias. Estes créditos não laborais não podem
ser deduzidos do montante da retribuição, apenas poderão ser deduzidos créditos de terceiros
sobre o trabalhador (como o Estado, a segurança social ou outra entidade), os quais a entidade
patronal retém (deduzindo-o do salário) e com este satisfaz o terceiro credor. Nas alíneas
seguintes do artigo 279º a lei prevê um conjunto de deduções que o empregador pode fazer:
descontos para terceiros, como já vimos; os adiantamentos (muitas vezes pode acontecer de o
empregador adiantar o pagamento de prestações futuras e aí entende-se que as possa de deduzir,
mas estas provém diretamente do contrato de trabalho, logo, não se confundem com as
hipóteses do nº1), etc.

72
A lei, neste artigo, procura excluir situações de dependência laboral baseadas em
situações que não têm nada que ver com o contrato de trabalho.

10.6.2. Cessão de crédito retributivo


Relativamente à cessão de crédito retributivo (artigo 280º CT), diz a lei que o
trabalhador só pode ceder crédito a retribuição, a título gratuito (doação ou dação em
cumprimento) ou oneroso (venda), na medida em que o mesmo seja penhorável. Ou seja, temos
uma parcial insusceptibilidade de cessão do crédito salarial, quer na pendência do contrato de
trabalho, quer mesmo após a extinção do vínculo juslaboral.

Compreende-se que, se a maioria das pessoas que trabalha aufere rendimento/salário,


qualquer transação patrimonial que efetuar terá que envolver, mais cedo ou mais tarde, essa
retribuição auferida. Neste âmbito, um aspeto que tem sido salientado pela jurisprudência é que
é o salário não é um mero crédito equiparável a qualquer outro crédito, é uma retribuição com
caráter especial, que tem que ver com a dependência do trabalhador (e possivelmente da
respetiva família) desse mesmo salário. Ou seja, o salário é uma “fonte de alimentação”. te
tem carácter alimentar pelo facto de depender dele a existência ou sobrevivência da pessoa que
o aufere. Isto justifica que o legislador preveja normas de tutela do salário que são muito mais
rígidas relativamente às normas de tutela de outros créditos (com exceção, talvez, às normas
de tutela dos créditos do estado).

Uma das manifestações dessa tutela tem precisamente que ver com esta norma prevista
no artigo 280º CT. Esta prevê que o trabalhador possa, de facto, ceder o crédito retributivo. É
claro que se entende que, no âmbito da autonomia pessoal, o trabalhador possa ceder não
apenas créditos já existentes, como ainda créditos futuros, nomeadamente relativos a salários
a receber por trabalho ainda não prestado. Por exemplo: eu posso hoje vincular-me a ceder
parte do salário que receber em janeiro (apesar do futuro ser imprevisível). Acontece que,
quanto mais temporalmente longínquos se apresentarem os créditos, mais facilmente o
trabalhador será tentado a cedê-los. Com efeito, de modo a prevenir e a garantir a existência de
um mínimo de retribuição que assegure a sobrevivência do trabalhador e da respetiva família,
a lei limita essa cedência do salário nesta norma: a cedência tem de ser penhorável.
O artigo 738º, nº1 e 3º CPC preveem o que pode e o que não pode ser penhorado. Diz
o nº1 deste artigo que são impenhoráveis 2/3 do salário, o que significa que o trabalhador só
pode ceder até 1/3 do salário líquido. Por outro lado, há ainda limites máximos e mínimos para
essa impenhorabilidade, previstos no nº3 deste artigo. O limite máximo da impenhorabilidade
é o montante equivalente a 3 salários mínimos nacionais, portanto, é preciso conjugar aqueles
2/3 impenhoráveis com o máximo que pode ser penhorado. Há uma exceção a este limite
máximo, no que toca a quem não tenha outros rendimentos que não o salário. Nestes casos, o
limite máximo é apenas o montante equivalente a 1 salário mínimo. Ou seja, o trabalhador que
não tenha mais rendimentos não pode penhorar/não pode ceder mais do que aquilo que exceda
o montante salário mínimo, tendo ainda em conta que não pode ceder mais do que dois terços
da sua retribuição.

73
O interesse da aplicação desta norma do CPC nem sequer tem tanto que ver com a
cessão, mas pode-se fazer esta interpretação extensiva.

A cedência, tal como prevista no artigo 280º, pode ter como contraparte terceiros, ou o
empregador. Quando o legislador fala em cessão, terá em vista a cessão perante terceiros.
Relativamente ao empregador já não se deverá falar tecnicamente numa cessão, mas numa
renúncia (resultante da sua relação imediata com o trabalhador). A questão é que, nas relações
entre trabalhador e empregador, por maioria de razão, também devemos aplicar estas
percentagens que decorrem dos limites à impenhorabilidade previstos no CPC. A renúncia é
uma renúncia a um crédito, portanto, é também uma forma de ceder. Ou seja, as duas figuras
acabam por ter um fundo comum: o trabalhador que dispõe dos seus salários futuros (são
futuros porque são créditos).
Naturalmente, quanto maior a disponibilidade de cessão, maiores constrangimentos à
sobrevivência do trabalhador, criando condições de dependência social.

10.6.3. Mecanismos de garantia do salário


O carácter alimentar do salário justifica um conjunto de mecanismos que defendam o
trabalhador do não cumprimento desta obrigação por parte do empregador, além de ser esta
garantia especial uma previsão constitucional (artigo 59º, nº3 CRP). Esses mecanismos estão
previstos nos artigos 333º e seguintes do Código de Trabalho.

No artigo 333º CT a lei consagra alguns privilégios creditórios aos créditos do


trabalhador emergentes do CT (direitos reais de garantia). No código civil esta matéria está
regulada entre os artigos 733º a 735º. Nos termos do artigo 733º CC, um privilégio creditório
é uma faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores (como os
trabalhadores), de serem pagos com preferência a outros.
Dentro dos privilégios creditórios podemos distinguir duas espécies:
 Privilégios mobiliários: versão sobre coisas móveis. Podem ser:

o Privilégios mobiliários especiais: abrangem apenas o valor de certos e


determinados bens;

o Privilégios mobiliários gerais: compreendem o valor de todos os bens


móveis existentes no património do devedor.

 Privilégios imobiliários (são sempre especiais): versão sobre coisas imoveis.

Os créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, ou da sua violação ou


cessação gozam dos seguintes privilégios creditórios (artigo 333º, nº1 CT):

a) Privilégio mobiliário geral do empregador;

74
b) Privilégio imobiliário especial sobre bem imóvel do empregador no qual o
trabalhador presta a sua atividade.

A garantia de pagamento do salário, ou o direito dessa garantia, pode, portanto, incidir


sobre o conjunto dos bens móveis do empregador ou da empresa, dependendo se se trata de um
empregador em nome individual (onde incidirá sobre bens pessoais) ou se de uma empresa
(onde incidirá sobre capital da mesma).
Nota sobre a alínea b) do nº1 do artigo 333º CT: em primeiro lugar, todos os privilégios
imobiliários são especiais, logo a letra da lei é desnecessária quando a esta expressão. Depois
note-se que, se o empregador for um mero arrendatário do local de trabalho onde o trabalhador
presta a sua atividade, já não existirá este privilégio.

Havendo diferentes créditos que tem por garantia o mesmo bem, quais são os que são pagos
em primeiro lugar?
A lei prevê regras próprias para estes casos no nº2 do artigo 333º CT, no qual estabelece
a graduação dos créditos, isto é, a sua ordem de pagamento (pagamento sucessivo). Os
créditos que são colocados em primeiro lugar, gozam de mais garantias efetivas do que aqueles
que estão em segundo lugar. Os créditos laborais pertencentes ao trabalhador (possuam eles
carácter retributivo ou não) gozam de privilégio mobiliário geral, sendo graduados antes de
todos os créditos referidos no artigo 747º, nº1 CC, conforme do artigo 333º, nº2, alínea a) do
CT. Ou seja, os créditos laborais do trabalhador prevalecerão, não só sobre os demais créditos
com privilégio mobiliário geral, mas também sobre os créditos com privilégio mobiliário
especial elencados naquela disposição do Código Civil.
Os dois artigos seguintes essencialmente reforçam a garantia do trabalhador de receber
o salário. De que maneira? Compreende-se que quem responde pelas dívidas da empresa (e os
salários são dívidas da empresa) é o património da empresa. No entanto, como forma de
garantia extra, a lei responsabiliza também os sócios da empresa (artigo 334º e 335º). Estes
artigos alargam a responsabilidade em matéria salarial aos sócios. Isto remeter-nos-ia para o
Código das Sociedades. Como tal, não a vamos estudar a questão muito a fundo, vamos apenas
manter esta ideia.
Uma outra garantia (que é aquela que acaba por suportar com alguma efetividade o
pagamento dos salários) é o fundo salarial, previsto no artigo 336º CT e regulado pelo DL
59/15 de 2015. O fundo de garantia salarial foi criado inicialmente pelo direito comunitário.
Agora é um fundo para o qual os empregadores descontam, o qual servirá de garantia no caso
de incumprimento de pagamento dos salários. É obrigatório descontar para este fundo e daí que
ele se destine, dentro de alguns limites (que não vamos ver agora), a garantir a retribuição dos
trabalhadores.

Em suma, os trabalhadores, além de beneficiarem de cobrança privilegiada face a outros


credores sobre o património do devedor (privilégios creditórios), são ainda assegurados através
do pagamento por um terceiro (o Fundo de Garantia Salarial) se o devedor/empregador não os
satisfazer por motivo de insolvência ou de situação económica difícil.

75
10.6.4. Prescrição e prova de crédito
O artigo 337º CT regula a prescrição. A prescrição é a extinção do crédito ou do débito
com o decorrer do tempo (artigos 300º e seguintes CC). Nos termos do artigo 303º, esta
necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem
aproveita, neste caso, o empregador.
A prescrição também se aplica às relações laborais na medida em que o salário, se não
for reclamado pelo trabalhador durante um certo período de tempo, desobriga o empregador ao
seu pagamento. No entanto, se o devedor vier a pagar a retribuição depois de completado o
prazo prescricional, mas antes de invocar a prescrição, a sua prestação corresponde ao
cumprimento de uma obrigação civil, pelo que não há nenhum direito de regresso previsto, não
pode o empregador reclamar essa prestação. Isto porque, se o empregador não invocar a
prescrição, o vínculo não se extingue, continua a haver uma obrigação civil, apenas passa a ter
a sua juridicidade reduzida.

O nº1 do artigo 337º CT prevê que o crédito de empregador ou de trabalhador emergente


de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia
seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. Parece estranho este prazo ser tão curto
para o trabalhador (apenas um ano). Claro que podemos argumentar que a lei, por razões de
racionalidade empresarial (da contabilidade e dos custos), entende que este prazo é suficiente.
Podemos aceitar isto, mas não podemos fazer disto um dogma, até porque já falamos de muitos
aspetos que podem não ser do conhecimento exato do trabalhador (por exemplo: certos regimes
especiais que dão direito a compensação). O trabalhador poderá não estar em condições de
saber se todas as prestações a que tem direito foram pagas ou não. Contudo, o facto é que está
o empregador obrigado a informar mensalmente o trabalhador de quanto é que ele deve
receber e por que razões (artigo 276º, nº3 CT). Mas esse documento apenas prova aquilo que
o empregador pagou e aquilo que o trabalhador recebeu, não prova mais nada, isto é, não
prova que o trabalhador não tenha direito a receber mais pelo trabalho prestado. Se o
empregador tem registos dos créditos dos trabalhadores, o inverso não é verdade: o
trabalhador, normalmente, não tem mecanismos que o permitam saber o que é que lhe é
devido e, segundo este prazo, apenas tem um ano para o apurar. Um ano, em muitos casos,
pode não ser suficiente, daí que esta norma seja criticável. O Código Civil, por exemplo,
prevê prazos de prescrição maiores para créditos que não têm natureza alimentar como este. O
que se pode dizer é que, muito embora as críticas, é um prazo tradicional e clássico, pois
sempre foi o prazo estabelecido na nossa lei.

Por outro lado, diz ainda o legislador diz que o crédito prescreve apenas depois da
cessação do contrato, o que significa que, durante a sua vigência, não prescreverá a obrigação
de retribuição.
no nº do art o 337º e re na a on ão. te d z o e nte “o crédito
correspondente a compensação por violação do direito a férias, indemnização por aplicação
de sanção abusiva ou pagamento de trabalho suplementar, vencido há mais de cinco anos, só
pode ser provado por documento idóneo”.

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O que é que é considerado um documento idóneo? O conceito não está definido em
qualquer disposição da nossa lei, nem no CT, nem no CC. Por maioria de razão terá de ser
algo escrito, mas o professor não sabe, além disto, muito mais sobre o que significará este
documento idóneo. Entende-se que será um documento que não seja falso e que não ofereça
dúvidas de interpretação, isto é, que seja compreensível para um sujeito jurídico, pois só
assim poderá ser um meio de prova (deve ser idóneo à sua compreensão por um jurista, que é
um tanto quanto leigo em relação a matéria de contabilidade, tendo de compreender este
documento).

11. VICISSITUDES CONTRATUAIS


As vicissitudes contratuais são mecanismos ou acontecimentos que interferem com o
pacto laboral inicialmente celebrado pelas partes e que provocam alterações substanciais ou
relevantes no mesmo. Estão previstas nos artigos 285º e seguintes do CT.
Nota: a alteração do lugar de trabalho, por exemplo, também não deixa de ser uma
vicissitude, mas como acontece com mais frequência está legislada fora desta parte.
O contrato de trabalho pode sofrer modificações de diversa índole:

 Subjetivas (por exemplo: a transmissão do da empresa ou estabelecimento, com


a inerente sub-rogação legal do transmissário na posição contratual do
transmitente);

 Objetivas (por exemplo: o caso da mobilidade geográfica, com a inerente


transferência do trabalhador para outro local);

 Híbridas (por exemplo: a cedência ocasional de trabalhador, através do qual


este vai prestar trabalho a entidade distinta da empregadora, mas mantendo o
vínculo contratual com esta).
Esta matéria mereceria um desenvolvimento de várias aulas, nomeadamente, a
transmissão do estabelecimento laboral/comercial, prevista no artigo 285º CT.

AULA DE 21/11/2019
11.1. Transmissão dos estabelecimentos (artigos 285º e seguintes CT)
O nosso direito, com a alteração do artigo 285º e seguintes pela Lei 14/2018,
acrescentou, de certa forma, disposições de dois tipos: a maioria da “no a ” norma a ão
a transposição da diretiva sobre a transmissão de empresa (Diretiva 2001/23), e, em segundo
lugar, acrescentou ainda normas que foram implementadas por razõe “ art lare ” a Lei
14/2018 surgiu face a um movimento sindical). Seja como for, e de uma forma global, o nosso
ordenamento é semelhante ao ordenamento comunitário e à Diretiva 2001/23, que foi objeto
de inúmeros acórdãos do Tribunal de Justiça. Com efeito, na medida em que o nosso código
incorpora essas normas, não pode divergir a jurisprudência do tribunal comunitário.

77
Se olharmos para as normas dos artigos 285º e seguintes CT, vemos que há três aspetos
que merecem algum destaque:

a) A caracterização da transmissão (quando é que há transmissão);


b) Como é que se procede à transmissão (quais são as regras a que obedece);
c) E, por fim, que efeitos é que decorrem da transmissão.

11.1.1. Caracterização da transmissão


Diz o nº1 do art o 85º CT “em caso de transmissão, por qualquer título, da
titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento
que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do
empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores, bem como a
responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contraordenação
laboral”.
Ou seja, temos uma transmissão de empresa ou estabelecimento quando a entidade
empregadora aliena a um terceiro, isto é, um adquirente, a empresa (ou parte da empresa), o
estabelecimento, ou ainda um estabelecimento que corresponda a uma unidade económica.
Dando-se a transmissão, sendo que, em princípio, qualquer forma de transmissão (gratuita,
onerosa, definitiva, temporária, legal ou contratual) é admissível, o adquirente assume a
posição de empregador e transferem-se para a sua esfera os contratos laborais com os
trabalhadores que estavam ao encargo do alienante.
Em princípio, quando uma pessoa celebra um contrato com outra, essa relação
contratual decorre da vontade de ambas, o que significa que a mudança de empregador não
deixa de der uma alteração substancial do contrato. Porém, essa alteração da entidade
empregadora, que acontece na sequência da transmissão do estabelecimento, não implica a
perda de direitos ou garantias do trabalhador.

Quando o empregador originário aliena a empresa a um adquirente, das duas uma: ou o


trabalhador acompanha a empresa, ou não, e, com efeito, extingue-se a relação laboral.
Compreende-se, por isso, que a lei numa primeira fase pretenda que a transmissão não seja uma
causa de extinção do contrato: o trabalhador tem direito a continuar a sua relação laboral com
adquirente do negócio, que assume a posição de empregador, tendo este a obrigação de manter
a relação laboral e as condições laborais dos trabalhadores transferidos.
Portanto, o principal efeito da transmissão é a manutenção dos contratos de trabalhos
nos moldes que existiam (mas, claro, com um novo empregador).

O que é um estabelecimento/empresa/unidade económica?


Porque é que esta definição é problemática? Porque, se não se verificar efetivamente a
transmissão de um estabelecimento, de uma empresa (ou parte dela), ou da unidade económica,
não se preencherá o tipo legal da norma do artigo 285º, nº1 CT, pelo que, como tal, a lei não
exigirá que os contratos de trabalho com os trabalhadores seja mantidos e poderíamos até falar

78
de um despedimento coletivo por ordem do novo empregador, ao invés da manutenção do
contrato. Como é óbvio, quando a transmissão é total, não há problemas. O problema tem lugar
nos casos em que a transmissão é parcial, pois é necessário saber se se transmitiu, de facto,
uma unidade económica ou uma parte da empresa.
Transmitida a empresa ou uma unidade económica, nos termos do nº3 do artigo 285º
CT, mantêm-se não só as condições individuais de trabalho como também as condições
coletivas (fixadas por convenção coletiva de trabalho que abrangesse os trabalhadores
transferidos). Isto é, os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos
contratuais e adquiridos, nomeadamente a retribuição, a antiguidade, a categoria profissional,
os benefícios sociais adquiridos, etc. Quanto às condições coletivas, há um regime especial
relativamente à caducidade coletiva, mas está regulado mais à frente e não damos essa matéria.
Ainda mais, a lei, como forma de proteger os direitos patrimoniais dos trabalhadores
transferidos, estabelece no nº6 do mesmo artigo uma responsabilidade solidária: o adquirente
é solidariamente responsável pelas dívidas salariais em atraso. Porquê? Porque estas dividas
fazem parte do património contratual que é adquirido pelo comprador da empresa. Claro que
essa responsabilidade é temporária (prazo de 2 anos após a transmissão) porque não foi este
quem deu origem a esse incumprimento.

11.1.2. Regras da transmissão


Envolvendo a transmissão da empresa interesses coletivos (dos trabalhadores
transferidos e ainda dos trabalhadores que já prestavam serviço no local para onde os primeiros
foram transferidos em consequência da transmissão), a lei estabelece um procedimento de
informação e consulta, nos termos do artigo 286º CT.
O transmitente e o adquirente têm um dever de informação dos representantes dos
respetivos trabalhadores ou, caso estes não existam, dos próprios trabalhadores. Devem estes
ser informados sobre a data, motivos, consequências e medidas projetadas em relação aos
mesmos face à transmissão. Não obstante a existência de representantes, o transmitente tem o
dever de informar os trabalhadores abrangidos pela transmissão dos mesmos factos (nº2 do
artigo 286º CT). Estas informações devem ser prestadas pelo menos 10 dias úteis antes da
transmissão.
Porquê? Porque compreende-se que na empresa poderão acontecer algumas alterações
internas, visto que o adquirente, que possivelmente já terá uma empresa com trabalhadores
ativos, receberá, como efeito da transmissão, muitos mais trabalhadores que poderão até
exercer as mesmas funções que trabalhadores já existentes exercem naquela empresa.

Com a transmissão, diz a lei que o adquirente receberá os trabalhadores abrangidos pela
transmissão e ainda os direitos adquiridos por esses. E aqui surge um problema. Durante quanto
tempo é que há esta garantia de segurança no emprego? Na medida em que é possível que o
adquirente possa proceder a uma reorganização interna da empresa, pode acontecer que
determinados trabalhadores fiquem sem vaga de trabalho para a função que prestavam
previamente (sejam estes trabalhadores transferidos, ou aqueles que já trabalhavam na empresa

79
do adquirente). O facto é que o novo empregador tem o direito, no âmbito da iniciativa privada,
de reorganizar a sua empresa se assim entender necessário. Compreende-se também que este
direito à iniciativa privada não possa ser excluído totalmente com a transmissão.

Como conciliar o direito à segurança e às condições do trabalho dos trabalhadores e o direito


à iniciativa privada do adquirente?
No direito à segurança dos trabalhadores estão abrangidos não só os trabalhadores
transferidos, mas também aos trabalhadores que já prestavam trabalho na empresa adquirente,
os quais podem até ter funções semelhantes e por causa disso mesmo é que poderá haver
necessidade de reorganização. A nossa lei, que adota uma diretiva comunitária não estabelece
nenhum critério face a esta situação, diz apenas que a transmissão não pode ser causa direta de
extinção do contrato de trabalho. O certo é que há aqui dois interesses que se contrapõe e, quer
a diretiva, quer a nossa lei, remetem indiretamente a questão para as causas de extinção do
contrato de trabalho. Não pode a extinção ser invocada diretamente como consequência da
transmissão, mas pode sê-lo indiretamente. Estamos numa zona em que a garantia de segurança
dada aos trabalhadores acaba por, quer queiramos, quer não, ser influenciada ou até
determinada pela transmissão.
Uma outra questão, sendo nova no nosso código, mas não nova na jurisprudência
comunitária, é o direito de oposição do trabalhador à transferência (artigo 286º-A CT). O
efeito legal da transmissão é a manutenção do contrato e a sua transferência, salvaguardadas
todas as condições do contrato laboral. Todavia, o trabalhador celebrou inicialmente o contrato
de trabalho com A e pode não estar disposto para trabalhar para B, o novo empregador. Como
tal, há muito tempo que, como forma de tutela da autonomia da vontade, a jurisprudência
comunitária tem previsto este direito de oposição. Isto não causa grandes problemas quando a
transmissão for parcial, pois nesses casos o trabalhador que se opõe poderá continuar a prestar
trabalho na parte da empresa não adquirida.

No entanto, se a transmissão for total, o que é que acontece ao trabalhador que se opõe?
Se ele se opõe, naturalmente não haverá lugar para ele na nova empresa. A Diretiva
comunitária em questão não regula as consequências da oposição, deixando esta matéria para
o direito interno de cada Estado Membro. A nossa jurisprudência diz que o trabalhador, nestes
casos, é responsável pelas eventuais consequências da sua recursa.
Durante muito tempo entre nós não se admitia ou reconhecia este direito de oposição,
na medida em que, se a lei estabelecia a transmissão dos contratos e respetivas condições
laborais dos trabalhadores ex vi legis (não precisando de haver consenso entre o trabalhador e
o novo empregador), parecia haver aqui uma incompatibilidade entre o direito à oposição e o
seguimento e continuidade garantido ao contrato com a transmissão. O certo é que agora a lei,
além de consagrar esse direito, também estabelece um regime especial de extinção de
contrato de trabalho como consequência desta oposição. Quando estudarmos a extinção do
contrato iremos ver este regime (é uma forma de caducidade que confere um direito a
indemnização: caso o trabalhador entenda, pode, portanto, desencadear a extinção do contrato
e terá direito a uma compensação).

80
11.2. Cedência ocasional de trabalhador (artigo 288º e seguintes CT)

Enquanto que, na transmissão, o contrato se transmite efetivamente de uma entidade


empregadora para outra, aqui há meramente uma repartição das entidades empregadoras.

Art o 88º CT “a cedência ocasional consiste na disponibilização temporária de


trabalhador, pelo empregador, para prestar trabalho a outra entidade, a cujo poder de direção
aquele fica sujeito, mantendo-se o vínculo contratual inicial”.

Os artigos seguintes fixam as condições para que esta cedência se possa verificar, bem
como as respetivas consequências para ambas as partes.

Nestes casos temos um trabalhador, A, que trabalha para um empregador, B, sendo que
ambos celebram um acordo com outra entidade empresarial, C, com o objetivo de colocar o
trabalhador A ao serviço de C.

Face à cedência, o poder de direção passa a pertencer ao cessionário. No entanto, o


contrato de trabalho mantém-se com o empregador original. Há aqui uma divisão do
conteúdo do contrato de trabalho na medida em que o poder de direção passa a pertencer a
alguém que não é parte desse contrato de trabalho.

Condições cumulativas de admissibilidade da cedência ocasional (artigo 289º CT):

a) O trabalhador cedido ou a ceder tem de estar vinculado por um contrato sem termo;

b) Entre o cedente e o cessionário tem de haver uma ligação económica, ou financeira;

c) O trabalhador tem de concordar com a cedência;

d) A duração da cedência não pode ultrapassar a duração de um ano, sendo que é


renovável por iguais períodos até ao máximo de cinco anos;

e) De acordo com o artigo 290º, nº1 CT, tem também de haver um acordo escrito entre
cedente e cessionário.

Nos termos do artigo 291º, um dos efeitos da cedência é o trabalhador cedido passa a
estar sujeito às condições/regime da empresa cessionária, nomeadamente quanto ao modo,
local, duração de trabalho, suspensão de contrato de trabalho, segurança e saúde no trabalho, e
acesso a equipamentos sociais.

Em matéria retributiva, a lei garante que o trabalhador cedido não terá nenhum prejuízo.
Se na nova empresa a retribuição for inferior, o trabalhador manterá a sua retribuição original;
se, pelo contrário, for mais favorável, vai auferir essa retribuição superior.

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A lei, de certa forma, pretende acautelar que a cedência seja utilizada fora deste espírito
de colaboração, uma vez que é um requisito de admissibilidade que esta só tenha lugar entre
empresas com uma certa ligação económica ou financeira, dependendo sempre a cedência de
acordo entre cedente e cessionário (artigo 290º, nº1). E é por isso que a lei estabelece uma
sanção severa sempre que se verifique o recurso ilícito à cedência ou irregularidades do acordo
entre as partes no artigo 292º CT. A violação das regras estabelecidas nos artigos anteriores
confere ao trabalhador cedido o direito de optar pela permanência ao serviço do cessionário em
regime de contrato de trabalho sem termo. O contrato com o cedente cessa por decisão
unilateral do trabalhador: forma especial de cessão do contrato. Aqui nem tem de haver pré-
aviso pelo trabalhador.

11.3. Redução ou suspensão do contrato de trabalho (artigo 294º e seguintes CT)


(páginas 291 a 304 do livro do professor Leal Amado)

Uma das vicissitudes do contrato de trabalho é que este pode ficar transitoriamente
suspenso. Quer isto dizer que o contrato pode não se extinguir, não terminar, mas manter-se
como que em estado latente. Pode, igualmente, ser reduzido em termos de prestação de trabalho
e respetiva retribuição.

Nas palavras de Jorge Leite, a suspensão consiste na coexistência temporária da


subsistência do vínculo contratual com a paralisação de algum ou alguns dos principais direitos
e deveres dele emergentes. Podemos dizer que esta figura está entre a extinção do contrato e a
manutenção efetiva do contrato, pois o contrato mantém-se, mas os seus principais efeitos estão
suspensos. Trata-se aqui de uma manifestação do direito à estabilidade no emprego e, em certos
casos, num mecanismo de proteção do devedor transitoriamente impossibilitado de cumprir.

Além da suspensão, a lei também admite a redução da atividade, que é um mal menor
relativamente à suspensão, na medida em que há uma redução do tempo de trabalho e,
naturalmente, uma redução correspondente da retribuição.
O artigo 294º prevê os factos determinantes da redução e/ou da suspensão do contrato.
e modo eral “a redução temporária de período normal de trabalho ou a suspensão de
contrato de trabalho pode fundamentar-se na impossibilidade temporária, respetivamente
parcial ou total, de prestação de trabalho por facto relativo ao trabalhador ou ao
empregador”.

11.3.1. Os efeitos da redução ou da suspensão (artigo 295º CT)


Diz o nº1 do artigo 295º que, durante a redução ou suspensão, mantêm-se os direitos,
deveres e garantias das partes que não pressuponham a efetiva prestação de trabalho. Assim,
deveres como os de assiduidade, obediência ou diligência ficam paralisados durante a
suspensão contratual. Pelo contrário, deveres como o de lealdade, nas suas diferentes
manifestações (não concorrência, sigilo, etc.) mantém-se. Do lado do empregador, se o poder

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de direção patronal fica suspenso, já o poder disciplinar permanece intocado, isto é, ao dispor
do empregador. Terminando o período de suspensão, são restabelecidos os direitos, deveres e
garantias das partes decorrentes da efetiva prestação de trabalho (nº4 do mesmo artigo).
nº3 do art o 95º ma norma e a a m ta on ão. z e te “a redução ou
suspensão não tem efeitos no decurso de prazo de caducidade, nem obsta a que qualquer das
partes faça cessar o contrato nos termos gerais”.
A segunda parte desta norma não causa grandes dúvidas, qualquer uma das partes pode,
a qualquer momento, desde que fundamentada a decisão, extinguir o contrato a través do
despedimento, revogação, demissão, etc. A primeira parte da norma, todavia, poderá
eventualmente não ser compreensível à primeira vista, ou pelo menos do ponto de vista não
jurídico. Vamos supor que alguém tem um contrato a termo celebrado por 1 ano. Ao fim de um
ano, naturalmente, a empresa desencadeia a caducidade do contrato. O que este nº3 diz é que a
suspensão do contrato não suspende a contagem do prazo de caducidade. Portanto, se no
momento de suspensão faltavam 6 meses para o contrato cessar, o prazo continua a contar
apesar da suspensão. No final dos 12 meses, se se mantiver a suspensão, a entidade
empregadora pode desencadear a caducidade do contrato. O tempo de redução ou suspensão
também conta para efeitos de antiguidade (nº2 do mesmo artigo). Isto justifica-se porque o
contrato permanece vivo, o relógio não para. Nos contratos a termo, nomeadamente, é requisito
de admissibilidade que exista uma necessidade temporária a executar, e essa necessidade, não
obstante a suspensão do contrato do trabalhador, não vai simplesmente parar no tempo. Como
o carácter temporário da necessidade que justificou o contrato a termo não se suspende,
compreende-se que a caducidade e o decurso do prazo também não se suspendam.
Importa agora distinguir as várias modalidades da suspensão que decorrem do nº1 do
artigo 294º. Estão previstas três situações com regimes diferentes:
 Redução ou suspensão individual: redução ou suspensão do contrato por facto
verificado na esfera do trabalhador;

 Redução ou suspensão coletiva: a redução ou suspensão por facto verificado na


esfera do empregador;

 Redução ou suspensão consensual: redução ou suspensão por acordo entre as


partes.

11.3.2. Suspensão ou redução por facto respeitante ao trabalhador


“Determina a suspensão do contrato de trabalho o impedimento temporário por facto
respeitante ao trabalhador que não lhe seja imputável e se prolongue por mais de um mês,
nomeadamente doença, acidente ou facto decorrente da aplicação da lei do serviço militar”.

A suspensão do trabalhador requer, segundo este nº1 do artigo 296º CT, alguns
pressupostos:

a) Um impedimento transitório para trabalhar que motive a suspensão;

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b) Que esse impedimento tenha uma duração mínima de 30 dias:

o Se o impedimento durar menos do que 30 dias, terá aplicação o regime


de faltas ao trabalho (artigo 249º, nº2, al. d) CT);

o Se for desde logo previsível que o impedimento se prolongue por mais


de 30 dias, então pode recorrer-se à suspensão do contrato antes de correr
o prazo dos 30 dias (artigo 296º, nº3 CT);

c) Esse impedimento tem de resultar de um facto que não seja imputável ao


trabalhador.
Este último requisito leva a alguns pontos de discórdia na doutrina que são relevantes.
É claro que um acidente de automóvel, por exemplo, pode ser imputado a um
trabalhador: vinha este distraído, bateu e ficou ferido e impossibilitado de trabalhar. Mas será
que nestes casos não se deve mesmo afastar o regime da suspensão?

Outro exemplo: se um sujeito é preso, então é porque cometeu um ato que lhe é
imputável, ou não estaria preso. Mas, de novo, o contrato pode-se suspender, ou deve-se
destruir o vínculo contratual?

Quanto ao caso do acidente: quando a lei no artigo 296º, nº1 se refere à não
imputabilidade, esta não pode ser entendida em sentido amplo. Para o efeito desta norma, é o
entendimento maioritário que o facto impeditivo só é imputável ao trabalhador quando este o
provocar com o objetivo de se furtar à prestação de trabalho. Ou seja, quando houver dolo.
Não havendo dolo, o contrato ainda assim se suspenderá. Claro que o impedimento resulta de
uma conduta censurável e negligente do trabalhador, mas o impedimento de prestar trabalho
surge como uma consequência não desejada, não querida por este. Temos de fazer aqui uma
leitura da não imputabilidade como equivalente da não voluntariedade.
Em termos gerais, o contrato suspender-se-á, portanto, se o impedimento for
temporário (não definitivo); prolongado (superior a 30 dias); e involuntário (contrário à
vontade do trabalhador).
A questão da prisão é que já levanta mais dúvidas. Quando uma pessoa pratica um
facto ilícito deverá ser detida em consequência. A prisão é aqui o impedimento. Será que o
trabalhador cometeu um crime para não ir trabalhar? Logicamente, pensamos que não. Mas por
praticar um crime, não deveria o trabalhador prever a hipótese de ser preso e não poder
trabalhar? De facto, tem se levando a questão se o impedimento decorrente de uma pena de
prisão será um facto imputável ao trabalhador ou não, para efeito da norma do artigo 296º, nº1
CT. Se aplicarmos um raciocínio idêntico àquele fizemos no caso do acidente, vamos dizer que
não será um facto imputável, pois não houve vontade em furtar-se ao trabalho.
Mas a verdade é que, estando o trabalhador preso durante x anos, o empregador terá de
contratar alguém para prestar o seu trabalho, não sendo do interesse deste manter o contrato.

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Temos ainda de fazer aqui outra distinção: o trabalhador pode ser preso
preventivamente ou por sentença final de julgamento. Em qualquer um dos casos, não pode
prestar trabalho. Não obstante, tratando-se de uma prisão preventiva temos que ter em conta o
princípio da presunção da inocência, que é um princípio, entre nós, com tutela constitucional.
Enquanto não for o trabalhador sentenciado, o facto não lhe é imputável, pois goza de
presunção de inocência, muito embora se verifique um impedimento. O contrato suspende-se
como consequência deste princípio.
E após a leitura da sentença? No caso de cumprimento de pena de prisão, a doutrina
divide-se. Há quem entenda que o contrato se suspenderá, ainda assim. Por outro lado, há
quem entenda que, neste caso, havendo já uma sentença transitada em julgado a afirmar um
juízo de censura sobre a conduta do trabalhador, então o impedimento resultante de tal prisão
será imputável ao trabalhador, pelo que o contrato não se suspenderá.

Há aqui uma questão que gera ainda mais confusão, e que tem que ver com o Estatuto
da Função Pública. Para os trabalhadores do Estado, o contrato suspende-se sempre que o
impedimento para trabalhar decorra de uma obrigação legal e a prisão não deixa de ser uma
obrigação legal. Daí que haja diferentes opiniões no que diz respeito aos efeitos da prisão (que
se prolongue por mais de um mês). Há quem entenda que, tendo em vista esta norma em relação
à Função Pública, tal como se o trabalhador tem um acidente por culpa e o objetivo não era
furtar-se ao trabalho, também se pode dizer que, quando alguém é detido, não tem o objetivo
de se furtar ao trabalho e, como tal, o contrato deve ser suspenso.
Mas, sendo o trabalhador condenado a longos anos de prisão, temos de ter em conta os
interesses do empregador: se a prisão é por pouco tempo, então aí, dado que a pena tem o
objetivo de reeducação e reinserção, a suspensão do contrato por uns meses enquadrar-se-ia no
fundamento penal e da medida da pena. Mas, se a prisão se a prisão se prolonga por vários
anos, há quem entenda que deva ser considerado o interesse do trabalhador e que seja
desencadeado o despedimento por faltas injustificadas. Claro que isto não deixa de ser tudo
algo indefinido e não previsto na lei.

A posição do Professor Leal Amado é de que o cumprimento da pena de prisão se


traduz num impedimento involuntário de prestar trabalho (o trabalhador pode ter cometido
um crime dolosamente, voluntariamente, mas decerto não o praticou em ordem a criar uma
situação de impossibilidade de prestar trabalho), pelo que, desde que se encontrem
preenchidos os demais requisitos do artigo 296º, nº1 CT, a prisão determinará a suspensão do
vínculo jurídico-laboral. Naturalmente que o que vem a ser dito não obsta a que o trabalhador
possa ser despedido por justa causa, nos termos gerais, caso a conduta criminosa se analise
numa infração disciplinar por si praticada.
Quanto à questão do serviço militar: tem que ver com a natureza do serviço militar e
com os interesses relacionados com essa prestação. No entanto, para que o contrato se suspenda
ao abrigo do nº1 do artigo 296º, é necessário que o impedimento do trabalhador seja
involuntário. Este requisito estava preenchido quando o serviço militar era obrigatório. No
entanto, hoje já não faz sentido existir esta disposição porque o serviço militar é voluntário.

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O nº2 do 296º prevê determinadas situações em que o trabalhador pode suspender de
imediato o contrato de trabalho. Por outro lado, o nº5 do mesmo artigo prevê situações em que
a suspensão do contrato é obrigatória, nomeadamente em virtude de um impedimento
voluntário do trabalhador, através da qual se visa proteger outros direitos fundamentais cujo
exercício se mostra incompatível com a normal execução da prestação de trabalho.
Regresso do trabalhador art o 97º) “no dia imediato à cessação do impedimento,
o trabalhador deve apresentar-se ao empregador para retomar a atividade”.
Esta norma é um pouco criticada, apesar de ser uma norma clássica e por isso é que se
mantém. Em suma, ou o trabalhador justifica a sua ausência, ou terá de aparecer no dia seguinte.
Mas se for um caso de doença, por exemplo, em que o trabalhador passe vários dias no hospital,
não é razoável que lhe seja exigido que se apresente ao trabalho no dia em que sair do hospital
ou no dia imediatamente a seguir.

11.3.3. Suspensão ou redução por facto respeitante ao empregador


O contrato de trabalho também pode suspender-se por facto respeitante ao empregador,
seja por se verificar uma temporária impossibilidade do empregador de receber a prestação de
trabalho, seja porque se mostre necessário para assegurar a viabilidade da empresa e a
manutenção de postos de trabalho, em situação de crise empresarial.

11.3.3.1. Situações de crise empresarial (artigo 298º CT)


Se a atividade normal da empresa permite que 100 trabalhadores laborem normalmente,
havendo uma crise na empresa, é normal que alguns contratos possam ser suspensos, ou que
haja uma redução. Portanto, de certa forma, estamos aqui perante razões objetivas ou razões
de mercado que justificam esta vicissitude contratual.
Nos termos do nº1 do artigo 298º CT: “o empregador pode reduzir temporariamente os
períodos normais de trabalho ou suspender os contratos de trabalho, por motivos de mercado,
estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras ocorrências que tenham afetado gravemente
a atividade normal da empresa, desde que tal medida seja indispensável para assegurar a
viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de trabalho”.
A nossa lei não trata desta questão, mas seria interessante analisar até que ponto é esta
situação de crise imputável ao empregador. Por exemplo: no caso das insolvências
fraudulentas, o empregador, intencionalmente, isto é, para se furtar a um conjunto de
obrigações fiscais, dá origem a uma crise empresarial e, portanto, seria interessante saber,
nestes casos, qual seria o regime aplicável. Acontece que a lei não distingue estas situações. A
lei trata apenas do confronto do trabalhador em relação à crise empresarial. Aliás, nos casos de
crise empresarial é de presumir a não culpabilidade do empregador.

Nestes casos, o recurso à redução, à suspensão ou ao despedimento é da iniciativa ou


da apreciação discricionária do empregador, pelo que lei não estabelece regras de cálculo, ou
seja, não obriga o empregador a recorrer à suspensão, por exemplo, ao invés do despedimento
coletivo.
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A última parte do nº1 do art o 98º mere e al ma atenção “desde que tal medida
seja indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de
trabalho”). Ha endo ma r e em re ar al o em re ador tem do me o de ação em relação
aos vínculos laborais: ou pode despedir, ou pode suspender. Havendo despedimento, assume-
se que está em causa a recuperação da empresa, porque, naturalmente, menos trabalhadores,
menos encargos. Ora, dando-se a suspensão por crise empresarial, haverá consequências a nível
salarial para os trabalhadores. Com efeito, a lei só admite estes sacrifícios dos trabalhadores se
tal for para beneficiar a empresa e, a longo prazo, os próprios trabalhadores. Quando a lei fala
na “man tenção do o to de trabalho”, fala na manutenção dos postos de trabalho daqueles
cujo contrato foi reduzido/suspenso e daqueles que continuam a prestar funções. A lei admite
que o sacrifício de uns deve ter como objetivo a recuperação da empresa, de modo a manterem-
se todos os postos de trabalho.
Depois no nº2 do mesmo artigo enuncia as modalidades desta suspensão/redução.
Outro aspeto importante consta no nº4 do mesmo artigo: para a empresa em crise
empresarial poder recorrer à suspensão ou à redução, esta deve ter a sua situação contributiva
regularizada, seja perante a administração fiscal, seja em relação às dividas à segurança
social.
O recurso a esta via por crise empresarial pode ser utilizado fora dos objetivos legais,
daí que a lei tenha algum cuidado a controlar o recurso destes meios, e por isso é que foi criada
a norma do artigo 298º-A, que impõe um intervalo entre dois procedimentos sucessivos de
redução ou suspensão da atividade, de modo a evitar o uso abusivo deste mecanismo. Com
efeito, o empregador só poderá recorrer novamente à aplicação da medida de suspensão depois
de decorrido um período de tempo equivalente a metade do período anteriormente utilizado,
salvo se houver acordo entre o empregador ou trabalhadores abrangidos ou as suas estruturas
representativas.

Procedimento da suspensão ou redução em casos de crise empresarial


O procedimento em questão está regulado no artigo 299º CT.
Numa primeira fase, o empregador tem de comunicar a sua intenção de suspender a
prestação de trabalho (e a medida adotar) aos respetivos representantes dos trabalhadores, ou
não havendo representantes, aos próprios trabalhadores.
A lei não estabelece propriamente critérios legais que obriguem o empregador a
decidir entre a redução e a suspensão, há uma certa discricionariedade do empregador, mas, na
verdade, são regimes equivalentes – o empregador deve optar pela menos danosa para o
trabalhador e a que melhor satisfaz os seus próprios interesses empresariais.
Numa segunda fase, descrita no artigo 300º CT, consagra-se um procedimento de
consulta: o empregador deve consultar os representantes dos trabalhadores, isto é, deve indicar
e discutir as consequências que a redução ou a suspensão (nomeadamente a coletiva) trará para
os contratos laborais dos trabalhadores.

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A lei consagra aqui um princípio de transparência: o empregador deve fornecer todas
as informações e os elementos que comprovem a crise empresarial (mostrar os relatórios de
contas, por exemplo) e ainda quais as suas consequências.
Por vezes, quando o nosso ordenamento jurídico se refere a uma “consulta” não
consuma bem esse direito. É preciso garantir que os representantes dos trabalhadores sejam
consultados, ouvidos e possibilitados de fazer contrapropostas. Claro que, ao falar-se de
consulta, não se fala necessariamente num acordo, mas é ponto assente que tem de ser a
pessoa afeta ouvida. No geral, a nossa lei não garante bem este direito à consulta. Parece que o
trata como um direito de mera informação e não como um direito de negociação, como
deveria. Todavia, não acontece isso no artigo 300º, pois na parte final o legislador indica que a
consulta e a negociação devem existir “com vista a um acordo sobre a modalidade, âmbito e
duração das medidas a adotar”.
Consta do nº3 do artigo 300º CT que, celebrado este acordo entre o empregador e a
estrutura representante dos trabalhadores, após a comunicação da intenção de reduzir ou
suspender a prestação do trabalho, nos termos do nº1 ou do nº4 do artigo 299º, ou do nº3 do
mesmo, deve comunicar por escrito também a cada trabalhador a medida que decidiu aplicar,
com menção expressa do fundamento e das datas de início e termo da medida.

Além de um acordo sobre a modalidade e o âmbito, têm a consulta e a negociação como


finalidade estabelecer também um acordo sobre duração das medidas a adotar, a qual, nos
termos do artigo 301º CT, não pode ser superior a seis meses, a não ser em caso de catástrofe
ou outra ocorrência que tenha afetado gravemente a atividade normal da empresa, podendo,
nestes casos, ir até 1 ano. Nos termos no nº3 do mesmo artigo, podem estes prazos, seja o de 6
meses, seja o de 1 ano, ser prorrogados por um período máximo de seis meses.

Um aspeto que a nossa lei realça (e bem), no artigo 302º CT, tem que ver com o
aproveitamento do período de suspensão e redução para efeitos da formação profissional do
trabalhador. Isto é, pode o trabalhador aproveitar esse período de tempo de suspensão ou
redução para melhorar as suas aptidões profissionais. Daí que refira a lei, no nº3 do artigo
301º, que a duração poder ser prorrogada quando, em primeiro lugar, o empregador prove a
necessidade dessa prorrogação, mas também em caso de formação profissional. A lei até apoia
financeiramente a formação profissional do trabalhador.

Deveres do empregador em período de suspensão ou redução (artigo 303º CT)


Durante o período de suspensão ou redução, o empregador tem de suportar custos.

Em primeiro lugar, o empregador tem de pagar uma compensação retributiva. Não se


trata a compensação propriamente de um salário, mas de uma retribuição mista: não
corresponde a trabalho, mas está ligada ao contrato de trabalho, daí ter natureza retributiva,
mas é uma situação especial, visto que o trabalhador não está a prestar serviço e, como tal, a
lei chama-lhe compensação. Esta compensação não é paga integralmente pelo empregador
(vamos ver mais à frente).

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Além dessa compensação, tem o empregador de continuar a fazer descontos para a
segurança social sobre a retribuição auferida pelos trabalhadores.

Depois tem este regime ainda implicações para a gestão financeira da empresa: o
empregador não pode distribuir lucros; não pode aumentar a retribuição ou outra prestação
patrimonial atribuída aos corpos sociais; não pode recrutar novos trabalhadores se as funções
a serem exercidas por esses poderem ser exercidas trabalhadores em contrato suspenso ou
reduzido.
Também há um limite à extinção do contrato (no nº2 do artigo 303º): “durante o período
de redução ou suspensão, bem como nos 30 ou 60 dias seguintes à aplicação das medidas,
consoante a duração da respetiva aplicação não exceda ou seja superior a seis meses, o
empregador não pode fazer cessar o contrato de trabalho de trabalhador abrangido por
aquelas medidas”. Não obstante esta norma, o empregador poderá cessar o contrato por
caducidade ou por justa causa, a lei só impede por o despedimento por motivos objetivos
porque esta medida de suspensão é uma alternativa que o empregador escolheu ao invés do
despedimento.
Nos termos do nº1 do artigo 307º CT, o empregador tem de informar trimestralmente
as estruturas representativas dos trabalhadores ou a comissão representativa dos mesmos, ou,
na falta destes, informar os próprios trabalhadores da evolução das razões que justificam o
continuo recurso à redução ou suspensão da prestação de trabalho. Isto justifica-se porque, não
baste que ocorra uma crise grave na empresa para justificar a redução ou a suspensão, é preciso
que estas medidas seja o instrumento mais adequado e, como tal, entende-se que esta decisão
do empregador, que não depende de qualquer autorização administrativa, seja acompanhada e
fiscalizada, não só pela estrutura representante dos trabalhadores, como consta do nº1 deste
artigo, mas também pelo serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela
área laboral, nos termos do nº2.

Deveres do trabalhador no período de redução ou suspensão (artigo 304º CT)


Como o trabalhador aufere uma retribuição, também lhe cabem obrigações.

Em primeiro lugar, tem de pagar as contribuições para a segurança social com base
na retribuição auferida e na compensação retributiva (que depois são retidas pelo empregador).
Como a suspensão só dá lugar a uma compensação, o trabalhador, se não tiver outros
rendimentos, apenas paga as contribuições para a segurança social com base nesta.
Durante a aplicação deste regime, compreende-se, contudo, que o trabalhador possa
exercer atividade remunerada fora da empresa, desde que comunique o facto ao empregador.
A lei não estabelece limites a esse trabalho (pode ser por conta própria ou alheia). No entanto,
diz a alínea b) do nº1 do artigo 304º que, caso exerça atividade remunerada fora da empresa, o
trabalhador tem de comunicar o facto ao empregador, no prazo de cinco dias a contar do início
da mesma, para efeitos de eventual redução da compensação retributiva (há aqui um dever de
transparência, neste caso, do trabalhador). Ou seja, os rendimentos que aufira nestes trabalhos
são depois reduzidos na compensação retributiva a que terá direito.

89
Na alínea, f) do nº1 do art o 1 8º “ e ere do Trabalhador) e t re to m de er
geral de não concorrência: o trabalhador não pode exercer uma outra atividade que possa
concorrer com a atividade do empregador. No entanto, no artigo 304º a lei não estabelece
limites ao trabalho que o trabalhador em regime de suspensão ou redução pode prestar, e, como
tal, este dever deverá ser afastado.
Como já vimos, se estiverem reunidas as condições, o trabalhador tem ainda o dever de
frequentar, neste tempo de suspensão ou redução, formações profissionais previstas num
plano de formação elaborado pelo empregador (nº1, al. c) do artigo 304º e artigo 128º, nº1, al.
d) CT).
Se o trabalhador não cumprir estes deveres, perde o direito à compensação retributiva
(nº2 do artigo 304º).

Direitos do trabalhador no período de redução ou suspensão (artigo 305º CT)


Em primeiro lugar, tem o trabalhador direito a auferir uma compensação retributiva,
nos termos da al. a) do nº1 do artigo 303º e da al. a) do nº1 do artigo 305º. Retribuição essa que
é igual a 2/3 da retribuição normal ilíquida do trabalhador, ou ao valor do salário mínimo
nacional, consoante o que for mais elevado.
Contudo, para efeitos de compensação há ainda uma limitação ao máximo que o
trabalhador pode auferir: a compensação não pode ultrapassar 3 salários mínimos. Temos de
compatibilizar dois limites: os 3 salários mínimos o os 2/3 da retribuição normal ilíquida do
trabalhador. Se os 2/3 forem superiores a 3 salários mínimos, a compensação tem como limite
máximo esses 3 salários mínimos (nº3 do artigo 305º).
Como dissemos anteriormente, o empregador não paga o total dessa compensação: o
empregador paga apenas 30%, pelo que a segurança social paga os restantes 70% (nº4 do artigo
305º).

Há aqui um benefício nos casos em o trabalhador frequente cursos de formação


profissional. Porquê? Porque aí a segurança social (serviço público competente na área do
em re o e ormação ro onal) a menta o a o o o al om ba e no “ nde ante de a o o
o a ” IA ). Portanto h a m a o o ara e a ormação ro onal ela e rança
social no montante de 30% do IAS, de forma a incentivar a formação profissional. Este apoio
vai acrescentar à compensação retributiva (nº5 do artigo 305º).

Tem ainda o trabalhador direito a exercer outra atividade remunerada, que também
já analisamos.
No que toca aos efeitos da redução ou suspensão em Férias ou Natal, tal como previsto
no artigo 306º CT, o tempo de redução ou suspensão não afeta o vencimento e a duração do
período de férias. Além disso, os trabalhadores têm direito ao subsídio de natal por inteiro, que
é pago pela segurança social no valor corresponde a metade da compensação retributiva e pelo
empregador no restante.

90
11.3.3.2. Encerramento ou diminuição da atividade por motivo imputável ao
empregador (artigos 309º e seguintes)
Fora do círculo de grave crise empresarial, a suspensão do contrato de trabalho pode
resultar do encerramento temporário da empresa ou do estabelecimento.

Nota: quando se fala aqui em encerramento há que ter em conta que este regime apenas
se aplica quando não há um procedimento de despedimento por motivos objetivos, nem quando
o encerramento é por motivo de férias.
A lei distingue, no nº1 do artigo 309º, dois tipos de casos que levam ao encerramento
ou à diminuição da atividade:

a) Encerramento ou diminuição da atividade por caso fortuito ou de força maior


ou inevitável.

Por exemplo: quando o encerramento é consequência direta da destruição das


instalações ou equipamentos, motivada por um terramoto ou por um incêndio;
falta de combustível; falta de matérias primas; etc.;

b) Encerramento ou diminuição da atividade devido a facto imputável ao


empregador ou por motivo de interesse deste.

Quando falamos em crise empresarial, a lei não presumia o dolo do empregador,


nem sua qualquer culpa (não havia o elemento de voluntariedade). No entanto,
isso já não acontece nos casos que vamos ver agora. Aqui já há uma decisão do
empregador no sentido de diminuir a atividade ou encerrar a empresa, pelo que
esta vicissitude lhe é imputável.

Por exemplo: encerramento para obras de remodelação, para substituição ou


reparação de equipamentos, por delitos contra a saúde pública ou por violação
de normas sobre segurança no trabalho, etc.

Ao falar de imputabilidade, pretende a lei prevenir decisões arbitrarias do


empregador. Embora aqui a lei não diga, entende-se que esta imputabilidade
está relacionada com um conflito laboral. Não falamos em conflitos coletivos
ou latentes, mas conflitos formais/declarados.
Neste caso da suspensão contratual, o trabalhador conserva direitos em matéria
retributiva: terá direito a receber 75% da retribuição, se o encerramento temporário se ficar a
dever a caso fortuito ou de força maior; e terá direito a receber 100% da retribuição, se o
encerramento se ficar a dever a facto imputável ao empregador ou a motivo de interesse deste.
De qualquer modo, o nº2 do artigo 309º CT obriga deduzir ao valor da retribuição o que o
trabalhador receba no período em causa por outra atividade que tenha passado a exercer por
efeito do encerramento.

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Quando o empregador recorre a esta medida há um conjunto de atos que não pode
praticar, pelo que são atos proibidos (artigo 313º CT). Uma das proibições é a proibição de
alienar património quando isso possa pôr em causa a solvabilidade financeira da empresa, pois
pode ser uma forma de esquivar ao pagamento de eventuais créditos. E essa proibição do ato
de disposição aplica-se quer o ato seja gratuito ou oneroso, até porque neste último pode haver
simulação de preços, etc.
Depois, no artigo 316º, a lei consagra a responsabilidade penal do empregador de
forma a impedir atos arbitrários do mesmo. Esta moldura penal aplica-se apenas à suspensão
ou redução fora do âmbito da crise empresarial.
Nota: Lock out é diferente de um encerramento ou diminuição da atividade imputável.
O Lock Out também lhe é imputável, mas o regime é diferente.

11.3.4. Suspensão ou redução por acordo das partes


11.3.4.1. Licença sem retribuição (artigo 317º CT)

Este pedido de licença sem retribuição é, normalmente, da iniciativa do trabalhador. É


claro que, quando é da iniciativa do trabalhador, como é a regra, a lei prevê alguns casos em
que o empregador possa recusar.
Verdadeiramente, a lei só concede direito à licença para efeitos de formação
profissional (nº2 do artigo 317º), sendo este o único caso em que a lei obriga à licença. Fora
destes casos, está nas mãos da disponibilidade das partes e, nomeadamente, da aceitação do
empregador (é uma faculdade discricionária das partes). Se as partes chegarem a um acordo,
que não tem de ser fundamentado, o contrato suspende-se.

11.3.4.2. Pré-reforma (318º CT)


Como o nome indica, a pré-reforma é uma antecipação da reforma.
Tem origem na situação de redução ou suspensão da prestação de trabalho, constituída
por acordo entre empregador e trabalhador com idade igual ou superior a 55 anos, durante a
qual este tem direito a receber do empregador uma prestação pecuniária mensal, a pré-reforma.
O acordo está sujeito a forma escrita, devendo conter, entre outras indicações, o montante da
prestação de pré-reforma (artigo 319º CT), que não poderá ser inferior a 25% da retribuição do
trabalhador na data de acordo (artigo 320º CT).
Se o empregador não pagar pontualmente a prestação de pré-reforma, o trabalhador terá
o direito de retomar o pleno exercício de funções ou, em alternativa, de resolver o contrato com
direito a uma indeminização (artigo 321º CT).
55 anos hoje já está um pouco longe da idade normal (ou sem penalização) da reforma,
mas, mediante acordo, as empresas podem recorrer à pré-reforma adiantando assim um período
de não trabalho retribuído, antecedendo um período de despedimento.

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11.3.5. Suspensão por decisão do trabalhador (o professor não abordou nas aulas
teóricas)
A falta de pagamento pontual da retribuição confere ao trabalhador a faculdade de
suspender o contrato de trabalho (artigo 323º, nº3 CT). Esta suspensão por iniciativa do
trabalhador consiste numa modalidade atípica de suspensão contratual, ou um regime especial
de exceção de não cumprimento do contrato.
A vontade do trabalhador terminar a suspensão do contrato, tanto poderá culminar no
seu regresso ao trabalho como, pelo contrário, traduzir-se na dissolução do vínculo mediante
resolução, ao abrigo do disposto no artigo 394º CT. Aliás, nada impede o trabalhador de utilizar
sucessivamente estes dois meios reativos, modulando a resposta em função da
gravidade/duração da mora patronal. Assim, o trabalhador poderá, primeiro, limitar-se a
adormecer o contrato e, mais tarde, mantendo-se a falta do pagamento (mora do empregador),
ele poderá extinguir o vínculo laboral, resolvendo o contrato com justa causa.

AULA DE 28/11/2019
12. Cessação do contrato (a partir da página 305 livro do professor Leal Amado)
O regime da cessação é algo de extrema importância em matéria de Direito de Trabalho.
É importante não só do ponto de vista económico, como também do ponto de vista social. A
extinção do contrato significa, para o trabalhador, perder o emprego, e as consequências dessa
perda, a nível social e humano, podem ser devastadoras, sobretudo quando se trate de
trabalhadores pouco qualificados e já não muito jovens.
O primeiro aspeto revelador da importância do regime da cessação é a sua
imperatividade: o artigo 339º CT tem carácter imperativo, admitindo apenas a regulação de
aspetos secundários pelos parceiros sociais ou pelo contrato de trabalho.
Podemos dizer que esta imperatividade é um corolário do princípio da segurança do
emprego. A segurança no emprego seria, de certa forma, privada de garantias efetivas se as
condições de perda de emprego não fossem objeto de um tratamento legal imperativo. Aliás, a
maior preocupação dos ordenamentos quando regulam a questão da cessação do contrato de
trabalho, é precisamente a definição do âmbito de poderes a atribuir à entidade empregadora:
se a cessação é um ato que é inconveniente para o trabalhador (por regra), compreende-se que
a cautela do legislador seja maior, nomeadamente no que concerne a atribuição de maior ou
menor discricionariedade ao empregador no sentido de pôr fim ao contrato. Temos de encarar
esta questão da cessação do contrato de trabalho como uma área de limitação da liberdade de
iniciativa económica do empregador.

Podemos dizer que, no regime jurídico da cessação de negócios duradouros, como é o


do contrato de trabalho, se verifica uma tensão permanente entre dois princípios antinómicos:

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o princípio da liberdade de desvinculação contratual e o princípio da estabilidade do vínculo
laboral, que não deixa de ser um corolário do princípio da segurança no emprego.

A segurança no emprego não significa, não obstante, impossibilidade de desemprego.


Aliás, há fatores que se verificam na esfera do trabalhador e que também levam ao desemprego.
O desemprego também pode ter origem quando a rentabilidade da empresa é posta em causa,
ou a racionalidade económica, o que leva à desnecessidade de manter um determinado nível de
emprego (exceções ao princípio da segurança).
O nosso ordenamento não permite que que o ato extintivo do contrato de trabalho seja
um ato arbitrário do empregador, pelo que este está condicionado à verificação de
determinados motivos que a lei considera justificativos da cessação da relação de trabalho.
São várias as causas previstas na lei que podem levar à cessação, pelo que não têm estas
necessariamente que ter origem na vontade do empregador: podem ter origem na vontade de
ambas as partes (acordo de revogação), na vontade do trabalhador, na vontade do empregador
(despedimento), ou na verificação de certo evento superveniente a que a lei atribui esse efeito
(caducidade).
Quando a lei no art o 340º re al a “o tra modal dade le almente re ta ”
remete-nos para outras modalidades previstas na lei (no Código de Trabalho ou em diploma
legal). Há uma imperatividade absoluta desta matéria.

Em qualquer uma destas modalidades de cessação do contrato há três aspetos comuns,


que estão previstos nos artigos 341º e 342º CT:
 Cessado o contrato, o empregador deve entregar ao trabalhador um certificado de
trabalho, indicando as datas de admissão e de cessação da prestação de trabalho,
bem como o cargo ou cargos desempenhados pelo trabalhador. Justifica-se este
certificado porque, os trabalhadores, posteriormente, quando se candidatarem a um
outro trabalho, terão de apresentar currículo. Daí que a lei, face a esta realidade,
obrigue o empregador, quando contrato cessa por qualquer motivo (justa causa,
caducidade, etc.), a entregar ao trabalhador este certificado. O empregador não
pode, por sua iniciativa, acrescentar ao certificado outros elementos (que não os
previstos na lei), a não ser que seja tal solicitado pelo trabalhador.

 Além deste certificado de trabalho, será também necessário entregar na segurança


social, para receber o subsídio de desemprego ou outro apoio social, um documento
oficial que confirme o fim da relação de trabalho. O empregador deve emitir este
documento mediante solicitação do trabalhador.

 Por outro lado, finda a relação, compreende a lei que cabe ao trabalhador entregar
ao empregador imediatamente quaisquer equipamentos de trabalho, bem como
quaisquer outros objetos pertencentes a este, sob pena de incorrer em
responsabilidade civil pelos danos causados (artigo 342º CT). Há aqui uma
obrigação de adotar uma postura de integridade moral, face a uma presumível falta
da mesma.

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12.1. Extinção por caducidade
(páginas 311 a 318 do livro do professor Leal Amado)

A caducidade, entendida em sentido estrito e de um ponto de vista técnico, está


associada ao decurso do tempo. Como o decurso do tempo é um acontecimento certo, entende-
se que o efeito extintivo da caducidade é automático, visto que ambas as partes conhecem o
desenrolar do tempo e estão conscientes da data prevista pelas mesmas para a verificação da
caducidade do contrato de trabalho. Com efeito, o efeito extintivo não carece de qualquer
declaração.
Porém, a caducidade não é só determinada pela vontade das partes, pelo que também
pode operar por efeito legal: a lei pode associar a um determinado evento não previsto pelas
partes um efeito extintivo.
Nos termos do artigo 343º CT, além da verificação do termo do contrato, a caducidade
pode ter origem por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o trabalhador
prestar o seu trabalho ou de o empregador o receber; ou pode ter origem na reforma do
trabalhador, por velhice ou invalidez.

12.1.1. Regime da caducidade nos contratos a termo certo (artigo 344º CT)
No respeitante ao contrato a termo incerto, o prazo de caducidade foi reduzido para 4 anos.
Nos termos do artigo 344º CT, em matéria de contrato a termo, há alguma diferença no
respeitante ao regime da caducidade. Não falamos, pois, de uma caducidade em termos gerais:
muito embora o prazo seja conhecido de ambas as partes, dado que há sempre uma expectativa
de continuação de emprego pelo trabalhador, compreende-se que o legislador admita, na
medida dessa expectativa de emprego, que as partes possam ter interesse em dar continuidade
àquela relação laboral. Com efeito, a lei prevê que, nos casos de contrato a termo, a caducidade
só opera quando for denunciada, ou seja, quando houver uma declaração de qualquer das partes
no sentido de a desencadear. O contrato a termo apenas caducará mediante comunicação por
escrito, do trabalhador ou empregador à outra parte, 8 ou 15 dias, respetivamente, antes de o
prazo expirar.

Decorre do nº2 do artigo 344º (que sofreu uma alteração com a nova lei) que, se a
caducidade for desencadeada pelo trabalhador, essa perda de emprego não será ressarcida,
porque corresponde aos seus interesses. Como tal, não deve ter direito a qualquer compensação.
Diversamente, se a denúncia for feita pelo empregador, poderá haver expectativas de
continuação de emprego pelo trabalhador, ou, ainda que não as haja, há sempre uma perda de
emprego. Portanto, a lei estabeleça que o empregador deve compensar o trabalhador por essa
perda de emprego.

95
Neste âmbito, havia uma questão que suscitava algumas dúvidas na doutrina, que era a
de saber se o trabalhador teria direito a compensação nos casos em que a extinção do contrato
está prevista no próprio contrato. Se é no próprio contrato que se estabelece que este não será
renovado, é porque ambas as partes o admitem. O contrato extingue-se por uma declaração
antecipada, uma declaração de ambas as partes, que decorre da sua liberdade e vontade.
Aqui temos uma situação intermédia. Não é o empregador a causar a caducidade, são ambas as
partes, logo, havia quem entendesse que não haveria direito a compensação. Por outro lado,
outra parte da doutrina argumentava que, não obstante ser uma de declaração de ambas as
partes, era ainda uma declaração do trabalhador.
A nova redação do nº2, do art o 344º e lare e e ta d da “em caso de caducidade
de contrato de trabalho a termo certo por verificação do seu termo, o trabalhador tem direito
a compensação correspondente a 18 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano
completo de antiguidade, calculada nos termos do artigo 366.º, salvo se a caducidade decorrer
de declaração do trabalhador nos termos do número anterior”. n mero anter or remete
para quando essa declaração é exclusiva do trabalhador: só quando há uma declaração
exclusiva do trabalhador é que não há direito a compensação. Portanto, quando a caducidade
decorre do contrato de trabalho, o trabalhador vai auferir na mesma de compensação. Desta
forma, a lei incorpora no plano jurídico a supremacia pré-contratual do empregador sobre o
trabalhador (desigualdade pré-contratual).

12.1.2. Regime de caducidade nos contratos a termo incerto (artigo 345º CT)
Nestes casos, sabe-se que há um termo, mas não se sabe quanto é que este se verificará.
A lei estabelece prazos de pré-aviso maiores, que têm que ver com a duração relativamente
indeterminada do contrato e com o reforço das expetativas que se vão criando no trabalhador.
Na falta dessa comunicação, a caducidade continua a ter efeitos, mas o trabalhador tem
direito a ser compensado (no contrato a termo certo, o regime é diferente, pelo que a
caducidade, na falta de comunicação, não tem efeitos). O cálculo de todas as indemnizações
está previsto no artigo 366º CT.

12.1.3. Impossibilidade de o trabalhador prestar o seu trabalho


Além da caducidade pela verificação do termo, a caducidade pode ter origem numa
impossibilidade de o trabalhador prestar o seu trabalho. Para que tal se concretize, essa
impossibilidade tem de obedecer aos três critérios previstos no artigo 343º, alínea b) CT. A
impossibilidade de prestar trabalho tem de ser:
 Superveniente: a impossibilidade tem de se verificar após a celebração do contrato.
Se a impossibilidade for originária, o contrato será nulo nos termos do arrigo 401º
CC;

96
 Definitiva: quando há uma impossibilidade de trabalhar, sendo longa, temos
previsto o mecanismo da suspensão, onde se prevê que o impedimento é temporário.
Aqui já não se trata de um impedimento temporário, mas de um impedimento
definitivo. Ou seja, o contrato de trabalho e a relação laboral findam porque o
trabalhador deixa de estar em condições de exercer a sua atividade, fica incapacitado
de prestar o seu normal trabalho. Esta impossibilidade pode ser total (morte, por
exemplo), mas normalmente é funcional (impossibilidade para aquela função,
relativamente ao objeto daquele contrato). Por exemplo: professor que perdeu a voz;
motorista que perdeu uma perna, etc.

 Absoluta: ao contrário de outras ordens jurídicas, o nosso ordenamento jurídico não


admitiu a teoria do limite do sacrifico. Esta teoria determina que, quando uma das
partes não puder cumprir as obrigações jurídicas decorrentes do contrato de
trabalho, se o sacrifício se tornar demasiado oneroso para a outra parte (a parte que
cumpre), esta pode por fim ao contrato. Naturalmente, é muito complicado definir
esse limite. Com efeito, a nossa lei rejeitou esta teoria, rejeitou que as relações
jurídicas pudessem terminar pelo princípio do sacrifico. Isto foi discutido no âmbito
do Código Civil e foi assumidamente afastado. Se o nosso ordenamento civilista
não admitiu esta regra, o código de trabalho também não a consagrou. Ao invés,
consagrou esta ideia de absoluto. O absolutismo aqui refere-se ao facto de que, para
se determinar a impossibilidade de o trabalhador prestar trabalho, é necessário que
seja completamente impossível a recuperação do mesmo, declarada por uma certeza
médica ou científica, ou pela segurança social. Sendo assim, será, na teoria, legítimo
que o empregador fique vários anos há espera da recuperação um trabalhador.
Porém, naturalmente, isto implica muitas despesas.

12.1.4. Impossibilidade de o empregador receber o trabalho


É certo que a morte do trabalhador determina a caducidade do contrato. Todavia, já não
é certo que a morte do empregador tenha o mesmo efeito. Assim, se o empregador em nome
individual falecer, mas os seus sucessores continuarem a atividade para que o trabalhador se
encontra contratado, ou caso se verifique a transmissão da empresa ou estabelecimento, o
contrato manter-se-á em vigor, registando-se apenas uma mudança subjetiva do mesmo.
Não obstante, associado a um empregador há, normalmente, uma empresa, que tem uma
vida económica para além da vida do seu dono/fundador (o empregador). Nestes casos, quando
a impossibilidade se verifica na esfera do empregador, o relevante é saber se a empresa continua
ou não ativa, isto é, se a base económica que sustenta aquela relação laboral continua, ou não,
ativa face a certas vicissitudes (a morte do empregador, a alienação da empresa a terceiro, a
declaração de insolvência, etc.)
Estas vicissitudes só atingem a relação laboral quando a extinção da pessoa coletiva ou
a morte física do empregador implicam o encerramento total e definitivo da atividade da
empresa (artigos 446º e 447º CT). Ou seja, face às vicissitudes que exemplificamos, a
caducidade do contrato não é automática, é necessário que se dê o encerramento da empresa.

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Caso não se dê o encerramento total e definitivo da empresa, uma vez que verificada
uma das vicissitudes já vistas (a declaração de insolvência (artigo 347º), a morte do
empregador, a extinção da pessoa jurídica, etc.), na medida em que a atividade continua,
qualquer extinção das relações de trabalho que se concretize já não está no âmbito da
caducidade, porque não há uma impossibilidade definitiva e absoluta. Isto é, e a em re a e
mant er at a a “ orte” da ele ontrato j a de ender do n onamento da em re a.
Nestes casos, a extinção dos contratos de trabalho caberá nos despedimentos por motivos
económicos ou coletivos, não na figura da caducidade.
Em suma, só se a empresa cessar funções/se extinguir imediatamente é que caímos no
âmbito da caducidade. Havendo um encerramento total e definitivo da empresa, a lei estabelece
que o contrato de trabalho caducará, mas exige ainda a observância do procedimento previsto
em sede de despedimento coletivo.

NOTA: a declaração judicial de insolvência.


Quanto aos efeitos da declaração judicial de insolvência do empregador, rege o artigo
347º do CT, do qual decorre que, só por si, como já vimos, a declaração de insolvência não faz
cessar o contrato de trabalho. Com efeito, não existe qualquer efeito extintivo automático da
declaração de insolvência sobre o contrato de trabalho. Em larga medida, após declaração
judicial de insolvência do empregador, o destino dos contratos de trabalho e t je to às
vicissitudes da empresa, dependendo das opções que vierem a ser tomadas no âmbito do
processo de insolvência:

 Recuperação/manutenção na pessoa do devedor:


Poderá implicar a cessação dos contratos de trabalho de alguns dos trabalhadores
da empresa, considerados dispensáveis, por decisão do administrador de insolvência
(artigo 347º, nº2).
 Encerramento/Liquidação definitivo:

eterm nar a ad dade do ontrato de trabalho de endo e r-se o


procedimento previsto para o despedimento coletivo, com as necessárias
adaptações, nos termos do artigo 347º, nº3 CT;
 Recuperação/transmissão para terceiro:

Caso em que a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho transita


para o adquirente da empresa insolvente, nos termos do artigo 285º CT.

12.1.5. Caducidade por reforma (artigo 348º CT)


A reforma é uma declaração da entidade competente, que no nosso caso é a Segurança
Social, e poderá ter origem na invalidez, ou na idade do trabalhador. Numa perspetiva médica,
é natural que os trabalhadores, após 40 anos de trabalho, comecem a acusar um certo cansaço

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e uma menor produtividade. Não obstante, a idade do trabalhador não é sempre determinante
da qualidade da prestação de trabalho. Portanto, com a declaração de reforma, por um lado,
procura-se acautelar um interesse de produtividade e, por outro, pretende-se proteger o
trabalhador cansado.
Há ainda um outro fator que tem justificado a extinção do contrato pela reforma, que é
a necessidade de renovação do mercado. Esta necessidade decorre de várias factualidades: por
um lado, as novas gerações têm uma formação superior às gerações que lhes precederam; por
outro lado, há necessidade das novas gerações começarem a viver autonomamente e a auferir
rendimentos.
Procura-se compatibilizar estes dois interesses: não discriminar as gerações mais
velhas, mas, ao mesmo tempo, garantir o direito do trabalho aos mais jovens.
A evolução legislativa tem corrido em desfavor dos jovens, visto que a idade de reforma
tem vindo a aumentar.

AULA DE 29/11/2019
Nos termos da alínea c) do artigo 343º, o contrato de trabalho caduca com a reforma do
trabalhador, por motivos de invalidez ou velhice. Porém, quanto à velhice, nossa lei estabelece
uma diferença entre o regime a aplicar aos trabalhadores que se reformam por velhice e aquele
a aplicar aos trabalhadores que fazem 70 anos e não se reformam. Claro que não falamos aqui
dos trabalhadores da função pública.
Vamos abordar, em primeiro lugar, o regime aplicável aos trabalhadores reformados.

Poderá o trabalhador, reformado, mas não incapacitado, continuar a desempenhar a sua


atividade, permanecendo ao serviço mesmo após o conhecimento da respetiva reforma?
A o nº1 do art o 348º e tabele e m tema de t o om rom o “considera-se a
termo o contrato de trabalho de trabalhador que permaneça ao serviço decorridos 30 dias
sobre o conhecimento, por ambas as partes, da sua reforma por velhice”.
Por um lado, a lei autoriza que o trabalhador reformado por velhice permaneça ao
serviço (dependendo da vontade do empregador); por outro lado, converte o respetivo contrato
num contrato a termo, tornando precária a relação laboral e facilitando a desvinculação ao
empregador, quando entender que a presença do trabalhador reformado no seu serviço já não
lhe é útil.

Porque é que a reforma não produz efeitos automáticos se não for invocada?
Sendo uma causa de caducidade, a reforma tem de ser invocada pelo trabalhador ou
pelo empregador. Ou seja, a reforma não obriga a que o trabalhador abandone simplesmente o
emprego.

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Proferida a decisão de reforma, a lei estabelece um prazo relativamente curto para o
trabalhador abandonar a atividade (para acabar o seu trabalho, passar o testemunho, etc.). Logo,
compreende-se que haja uma certa tolerância no que toca a manter o contrato de trabalho.
De facto, como já vimos, o nº1 do artigo 348º estabelece um prazo durante o qual, após
o conhecimento de uma das partes da reforma, ou de ambas, a parte interessada pode fazer
caducar o contrato por reforma, sendo que este apenas caducará se alguma das partes invocar
a caducidade. Se o trabalhador nada invocar após ter conhecimento da reforma, e se a condição
de trabalho se mantiver, significa que a relação de trabalho se mantém. A lei estabelece uma
conversão do contrato sem termo: considera-se o contrato a termo se o trabalhador permanecer
mais de 30 dias ao serviço do empregador após o conhecimento de ambas as partes. Mas,
durante esses 30 dias ou depois desses 30 dias, as partes podem celebrar qualquer tipo de
contrato. Podem invocar a caducidade e, na sequência disso, celebrarem um outro contrato, não
tem de haver uma conversão para o trabalhador continuar a prestar trabalho. Portanto, a
liberdade contratual mantém-se.
A conversão tem um regime especial, previsto no nº2 do artigo 348º CT.
Nomeadamente, a conversão apenas garante que o contrato se mantenha por 6 meses, ainda
que possa ser renovado.
A caducidade não confere ao trabalhador direito a qualquer indeminização. Isto porque
o trabalhador já estará reformado e, portanto, já auferirá da reforma. Se a finalidade da
indeminização é garantir alguma autonomia ao trabalhador enquanto procura outro emprego,
não se justifica esta aqui.

Vamos abordar agora uma situação diferente, que é aquela que se refere aos
trabalhadores que envelhecem, mas não desencadeiam a reforma.

O que acontece se o trabalhador envelhecer sem desencadear o seu processo de reforma?


A lei estabelece uma idade mínima para se ser titular de um contrato de trabalho. No
entanto, não haverá uma idade máxima. O que acontece é que, completando um trabalhador 70
anos, o seu contrato, tal como o contrato dos trabalhadores que se reformam sem invocarem a
caducidade, também se converterá num contrato a termo, estando garantido legalmente por 6
meses (nada obsta a que as partes celebrem outro contrato).
O facto de o trabalhador perfazer 70 anos não implica, por isso, a caducidade do seu
contrato de trabalho.
Enquanto o reformado tem uma base de sustentação além da retribuição que aufere da
prestação de trabalho, o trabalhador que faça 70 anos e não se reforme não tem direito à pensão
de reforma. A grande diferença para o regime anterior é, portanto, que este trabalhador não
aufere uma pensão de reforma, podendo ficar sem meios de sobrevivência. O professor entende
que se trata aqui de uma discriminação em questão de idade, pois não há qualquer motivo para
transformar este contrato sem termo num contrato a termo, não há reforma, não há invalidez,
etc. ele converte-se meramente em função da idade, o que é puramente discriminatório.

100
Portanto, não obstante o regime ser idêntico, a apreciação da norma do nº1 e do nº3
pauta-se por critérios muito distintos. Renovar o mercado de trabalho e afastar os mais velhos
do mercado de trabalho poderá ser uma razão objetiva para o regime do nº3, mas o professor
considera que esta não é a forma correta de concretizar estes interesses económicos.
Em síntese: nas hipóteses de reforma, o contrato de trabalho não caducará, antes
converter-se-á num contrato a termo, mas só se o trabalhador permanecer ao serviço decorridos
30 dias sobre o conhecimento, por ambas partes, da sua reforma; caso contrário, o contrato
caducará com a reforma ao abrigo do artigo 343º CT. A circunstância de o trabalhador
completar os 70 anos de idade também não implica a caducidade. O que acontece, nesse dia, é
que o trabalhador, continuando ao serviço, passa a ser titular de um contrato a termo, com a
duração de 6 meses, cuja caducidade poderá, decerto, ser acionada pela entidade empregadora,
mas apenas no final desse período de 6 meses.
NOTA: A reforma de invalidez não cabe na norma do artigo 348, nº1.

12.2. Revogação por mútuo acordo (artigo 349º CT)


(páginas 318 a 325 do livro do professor Leal Amado)
Esta via de caducidade prevê um acordo de vontades que põe fim ao contrato de
trabalho, o qual não tem de ser fundamentado. Justifica-se porque não faria qualquer sentido
pretender manter em vigor um contrato de trabalho contra a vontade das partes.
O acordo, desde logo, tem de ser reduzido a escrito. A lei obriga à forma escrita para
prevenir precipitações do trabalhador, bem como decisões não pensadas, que muitas vezes
podem ser desencadeadas por algum conflito. A intenção legal com a exigência da forma escrita
é assegurar que a vontade do trabalhador se forma de modo livre, esclarecido e ponderado.
Nesse acordo, além dos seus efeitos característicos, podem ser previstos outros efeitos.
Por exemplo: as partes podem estabelecer uma compensação pecuniária ao trabalhador pelo
fim do contrato e/ou perda de emprego.
Os efeitos extintivos do acordo revogatório poderão ser imediatos, isto é, coincidir com
a data de celebração do mesmo, mas também poderão ser diferidos para momento ulterior, caso
em que ao acordo revogatório será aposto um termo suspensivo.

12.2.1. Cessação do acordo de revogação


O artigo 350º concede ao trabalhador o direito potestativo de fazer cessar
unilateralmente os efeitos do a ordo de re o ação “o trabalhador pode fazer cessar o acordo
de revogação do contrato de trabalho mediante comunicação escrita dirigida ao empregador,
até ao sétimo dia seguinte à data da respetiva celebração”.

101
A lei procurou facilitar a posição do trabalhador e garantir que este não se precipite,
isto é, que pondere devidamente, ao longo desses 7 dias, sobre as consequências do acordo
revogatório.
Todavia, o professor critica a presunção do legislador ao assumir que o dia em que se
celebra o acordo será o dia em que se extingue o contrato, pois, na prática, não será sempre
assim. Na verdade, o acordo pode ser celebrado hoje para apenas ter efeitos apenas daqui a 3
ou 4 meses, e, não obstante, o trabalhador só poderá fazer cessar o mesmo nos 7 dias posteriores
à sua celebração. O problema é que pode o trabalhador apenas se perceber durante esses 3 ou
4 meses que tomou uma má decisão ao celebrar o dito acordo. Ou pode até acontecer de só
depois do trabalhador deixar de trabalhar (em consequência daquele acordo) é que se aperceba
do erro que cometeu ao fazer extinguir a relação contratual. A lei não tutela estas situações.
Se o acordo for celebrado perante uma autoridade notarial (for assinado
presencialmente perante essa entidade), já nem sequer se põe ao dispor do trabalhador a
faculdade de cessar o acordo revogatório (nº4)

12.2.2. A compensação pecuniária global


Nos termos do nº5 do artigo 349º: “se, no acordo ou conjuntamente com este, as partes
estabelecerem uma compensação pecuniária global para o trabalhador, presume-se que esta
inclui os créditos vencidos à data da cessação do contrato ou exigíveis em virtude desta”.
Nos termos gerais da cessação, com o fim do contrato, vencem-se todos os créditos
pendentes do trabalhador, isto é, podem ser exigidos pelo trabalhador todos os seus créditos
pendentes a partir da data da cessação.
Todavia, em situações de acordo de revogação nas quais tenha sido prevista uma
compensação, prevê a lei uma particularidade: presume-se que a compensação pecuniária
global inclui os créditos vencidos à data de cessação do contrato.
Por exemplo: se as partes celebrarem um acordo de revogação que determine que o
trabalhador re ebe 5000€ pela cessação do ontrato onde e tarão n l do todo o r d to
exigíveis naquela data, das duas uma: ou esta declaração é verdadeira, ou os créditos pendentes
podem ser muito er ore a 5000€ e o em re ador ro ra e ar-se ao seu pagamento.
Diz a lei que se presume que no montante global se incluem todos os créditos. Isto quer
dizer que, à partida, se o trabalhador aceitar esse montante, não poderá reclamar mais nenhum
crédito que descobrir ter. Tendo em conta que o trabalhador não é obrigado a ser versado em
subtilizas jurídicas, não será incomum que caia nesta situação de surpresa. Esta presunção legal
opera, sem dúvida, em benefício do empregador.

A questão aqui é saber se estamos perante uma presunção relativa ou absoluta. Sendo
uma presunção relativa, já o poderá o trabalhador reclamar, em momento posterior, outros
créditos. Sendo absoluta, estamos perante um afastamento à garantia constitucional do direito
à retribuição. De acordo com o Código Civil, uma presunção legal só não é relativa nos casos
expressamente previstos pelo legislador. Neste caso, não qualificando o legislador a presunção,

102
entende-se, de acordo com o Código Civil, que esta é relativa. Não obstante, uma grande parte
da doutrina considera que temos uma presunção absoluta.

Independentemente de ser absoluta ou relativa, a presunção legal existe e beneficia o


empregador/devedor e, mesmo quando seja considerada uma presunção relativa, as
dificuldades probatórias experimentadas pelo trabalhador revelar-se-ão, em boa parte dos
casos, insuperáveis. Ainda assim, por outro lado, o trabalhador apanhado de surpresa pela
presunção legal poderá lançar mão do direito potestativo previsto no artigo 350º CT (cessação
do acordo de revogação), desfazendo o negócio jurídico extintivo do contrato, nos 7 dias
seguintes à sua celebração.

AULA DE 02/12/2019 (aula de reposição)


12.3. Despedimento com justa causa
(páginas 322 a 339 do livro do professor Leal Amado)
L ro a on elhado “ Pro ed mento l nar Laboral” de Pedro Ferre ra de o a.
De forma geral, no respeitante à cessação das relações laborais, especialmente por
despedimento, sempre existiu uma certa dificuldade em fiscalizar a discricionariedade das
decisões do empregador.
Naturalmente, estas formas de cessação do contrato admitem apreciação judicial, o
Tribunal tem a possibilidade de controlar a aplicação da lei pelo empregador. Todavia,
especialmente nas pequenas e médias empresas, que constituem mais de 80% do nosso tecido
empresarial, as relações entre empregador e trabalhador são muito variadas, sendo,
normalmente, relações de maior proximidade, o que significa que a infração de regras terá a
componente de ilicitude, mas terá também uma repercussão nas relações interpessoais. E esse
elemento pessoal, que não deixa de interferir e influenciar a decisão do empregador, dificulta
a apreciação da mesma pelo Tribunal. Daí que, desde 1995, o legislador tem tentado construir
um regime estabilizado e uniforme quanto ao despedimento, que foi sendo seguido pela
jurisprudência.

Lê- e no art o 338º CT “é proibido o despedimento sem justa causa ou por motivos
políticos ou ideológicos”.
O primeiro aspeto deste regime a ter em conta é precisamente a noção de justa causa.
Em termos simples, o despedimento com justa causa traduz-se na sanção disciplinar máxima
suscetível de ser aplicada ao trabalhador.
“Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que,
pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência
da relação de trabalhado” art o 351º nº1 CT)
O comportamento do trabalhador, para ser considerado uma justa causa de
despedimento, tem de ser enquadrado nestes critérios cumulativos:

103
 Culpa: o trabalhador tem de ser responsável pelo ato. A justa causa tem de se
traduzir num comportamento censurável do trabalhador, seja uma ação ou omissão,
que lhe seja imputável a título de culpa (não se exige o dolo, ainda que a negligência
deva ser grosseira). A censurabilidade é essencial, pois é necessário que o
trabalhador pudesse ter atuado de modo diferente;

 Gravidade: a justa causa de despedimento assume um carácter de incumprimento


contratual particularmente grave, de tal modo que determine de imediato uma
perturbação relacional insuperável, isto é, insuscetível de ser sanada com recurso a
medidas disciplinares não extintivas. Ou seja, a conduta do trabalhador tem de ser
considerada grave não só por si, mas também pelos seus efeitos, seja porque acarreta
consequências graves para ambiente de trabalho, seja pelas consequências negativas
que origina na relação que se estabelece entre empregador e trabalhador. Somos
remetidos para o critério do “em re ador razo el” a a aliação do om ortamento
do trabalhador tem de er e ta em on deração erto “ r t r o era e norma ”
de apreciação de uma atitude. É inegável, no entanto, que a sensibilidade do
empregador, ou a falta dela, será aqui um fator de relevo.

O nº 2 do artigo 351º enumera, a título exemplificativo, um conjunto de condutas que


concretização a justa causa de despedimento. Porém, apesar do nº2 verdadeiramente esgotar a
grande maioria das infrações, a verificação de alguma dessas condutas não é condição
necessária (dado que se trata de uma enumeração exemplificativa), nem uma condição
suficiente, pois quaisquer uma destas alíneas tem de ser avaliado de acordo com os critérios
que referimos anteriormente. O nº 2 não consagra causas autónomas de despedimento, este
a ena re om ortamento e oderão on t t r a j ta a a no a o de a arem elo
r o do r t r o do nº 1. Podemo d zer e e te ont m “ ro o çõe n om leta ” na
medida em que necessariamente tem de ser complementado pelo nº1.

A maioria das condutas previstas no nº2 como suscetíveis de constituir justa causa de
despedimento são violações graves de deveres que impendem sobre o trabalhador, os quais se
encontram previstos neste código no artigo 128º. Nomeadamente:
 Dever de obediência: artigo 128º, nº1, al. e) e artigo 351º, nº2, al. a) CT;

 Dever de diligência: artigo 128º, nº1, al. c) e artigo 351º, nº2, al. d) CT

Tem que ver com o modo de cumprimento da prestação principal, na medida em


que deve o trabalhador realizar a prestação com a atenção, o esforço, o empenho, o
cuidado e a vontade exigíveis a um trabalhador normal, colocado na sua situação;

 Dever de assiduidade e pontualidade: artigo 128º, nº1, al. b) ´e artigo 351º, nº2,
al. f) e g) CT.
Trata-se de deveres relacionados com a situação de heterodisponibilidade do
trabalhador, sendo certo que a mera ausência do mesmo não significará, por si só, a

104
violação do dever de assiduidade. Não obstante, as faltas injustificadas, bem como
as falsas declarações relativas à justificação de faltas, poderão constituir justa causa
de despedimento;

 Dever de lealdade: artigo 128º, nº1, al. f) e artigo 351º, nº2, al. e) CT.

Na ala ra do ro e or Leal Amado m de er “ba tante amb o”. Hoje


manifesta-se num dever de não concorrência e de sigilo profissional, sendo
maioritariamente uma expressão da boa fé contratual. Quer isto dizer que o
trabalhador não deverá aproveitar-se da posição funcional que ocupa na empresa
em detrimento do empregador. Todavia, o dever de não concorrência não representa
qualquer obstáculo ao pluriemprego do trabalhador, salvo acordo das partes em
contrário;

 Dever de respeito, urbanidade e probidade: artigo 128º, nº1, al. a) e artigo 351º,
nº2 (várias alíneas) CT;

 Dever de custódia: artigo 128º, nº1, al. g) CT

Obrigação de velar pela guarda, conservação e boa utilização dos instrumentos de


trabalho (ou outros bens relacionados) que lhe foram fornecidos ou confiados pelo
empregador;

 “Dever de produtividade”: artigo 128º, nº1, al. H) e artigo 351º, nº2, al. m) CT.

As reduções de produtividade só poderão ser alvo de censura se provierem de uma


conduta culposa do trabalhador. Por exemplo, uma baixa de produtividade que se
fique a dever a uma perda de capacidade física ou técnico-profissional derivada ao
avanço da idade, naturalmente não será suscetível de qualquer punição disciplinar.

Se a baixa de produtividade tiver origem na falta de instrução do trabalhador,


atendendo, por exemplo, às rápidas transformações da estrutura produtiva e ao
elevado ritmo das inovações tecnológicas, cabe ao empregador proporcionar à
contraparte as devidas ações de formação profissional, e cabe ao trabalhador
participar de modo diligente nas mesmas.

O nº3 deste artigo vem depois enunciar outros critérios complementares aos previstos
no nº1. São critérios de apreciação dirigidos maioritariamente ao Tribunal: na apreciação de
justa causa deve atender-se, no quadro de gestão de empresa, ao grau de lesão dentro dos
interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os
seus companheiros (uma relação de proximidade, naturalmente, difere de uma relação de
maior formalidade). Ainda de acordo com este nº3, a apreciação da justa causa é sempre
casuística, guiada por uma ideia de proporcionalidade, racionalidade e justiça
individualizante. A questão

105
do despedimento com justa causa tem esta componente substantiva, enquanto que as normas
que constam do Código de Trabalho têm natureza maioritariamente procedimental.

12.3.1. As condutas extralaborais do trabalhador


Esta dimensão disciplinar difere consoante o ato tenha sido praticado fora ou dentro da
empresa. Por exemplo: uma agressão de um colega de trabalho que ocorra dentro empresa e
durante o horário de trabalho, é muito diferente de uma agressão que ocorra fora destas
situações.
Há duas posições doutrinais quanto a esta matéria: uma assenta na separação radical
entre a vida profissional e a vida pessoal do trabalhador; por outro lado, a outra não aceita
este dogma, defendendo a absorção integral da esfera pessoal do trabalhador pela sua esfera
profissional. Nesta última perspetiva, o trabalhador surge como um ser humano absolutamente
laborizado e a autoridade patronal acaba por se confundir com uma autoridade paternal.

A conclusão do Professor Leal Amado é que não há uma fórmula simples que resolva
todos os problemas que esta matéria procura colmatar, pois, por um lado, o trabalhador não
deixa de ser pessoa-cidadão no espaço-tempo laboral e, por outro lado, a pessoa-cidadão
também não deixa de ser trabalhador fora do espaço-tempo laboral. Em qualquer dos casos,
deve-se sempre rejeitar posições extremas e, ao invés, adotar ideia de equilíbrio, razoabilidade
e de proporcionalidade. Temos de compatibilizar as características próprias da relação laboral
com a necessária salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias do trabalhador enquanto
pessoa e cidadão. Com efeito, o princípio básico não pode deixar de ser o da não ingerência do
empregador na vida extraprofissional do trabalhador, sem prejuízo, porém, de certas limitações
à liberdade pessoal deste que resultem dos compromissos contratuais por si assumidos.

O Professor Liberal concorda com esta conclusão, dizendo que uma conduta que ocorra
fora do espaço-tempo laboral não deve ser sancionada, mas tal dependerá sempre de uma
avaliação casuística, como dita a lei.

12.3.2. Procedimento disciplinar


Relativamente ao procedimento disciplinar do despedimento, o legislador, dada a
sensibilidade da situação, regula a situação com grande cuidado, embora não acrescente nada
a nível dos direitos de defesa do trabalhador em relação ao procedimento normal. No plano
procedimental, trata-se maioritariamente aqui de dar expressão adequada ao princípio do
contraditório. Como se lê no nº6 do artigo 329º CT, “A sanção disciplinar não pode ser a l ada
em a d n a r a do trabalhador” e erto e o de ed mento or j ta a a al m de
uma forma de extinção do contrato laboral, é a sanção disciplinar máxima que pode ser aplicada
ao trabalhador. Com efeito, deve este princípio ser bem salvaguardado neste âmbito.

Vamos, então, ver as fases do procedimento:


1) Acusação:

106
O empregador desencadeia o procedimento disciplinar ao entregar ao trabalhador
ma “nota de culpa” art o 353º CT). A nota de culpa é um documento escrito no
qual deverá constar a descrição circunstanciada dos factos imputados ao
trabalhador, e à qual deve ser anexada uma comunicação escrita da intenção do
empregador de despedir o trabalhador no final do procedimento, se for o caso.

Na mesma data, o empregador deve remeter cópias da comunicação e da nota de


culpa à comissão de trabalhadores e, caso o trabalhador seja representante sindical,
à associação sindical respetiva.

A descrição dos factos imputados não pode conter descrições genéricas, pelo que
deve ser o mais concreta possível e incluir, como meios de prova, as condições de
modo, tempo e lugar em que o facto terá acontecido.

Quanto à comunicação da intenção de despedir: a lei pretende evitar que o


trabalhador venha a ser surpreendido no final do processo por uma decisão patronal
extintiva com a qual não contava. Além disso, se os trabalhadores com aquela nota
de culpa são avisados que o emprego está em risco, darão mais importância a essa
acusação, preparando uma melhor defesa, do que se souberem que esta não vai ter
efeitos a nível de segurança de emprego. Naturalmente, se o empregador manifestar
essa intenção extintiva na nota de culpa, não fica por isso obrigado a despedir o
trabalhador no termo do processo. Porém, o inverso já não é verdade, pois a falta de
comunicação da sua intenção de despedimento na nota de culpa torna ilícito do
despedimento que venha a ser proferido, por invalidade do respetivo procedimento
disciplinar (artigo 382º, nº2, al. b) CT). Este ónus do trabalhador tem precisamente
que ver com o a reação e as possível expectativas que o trabalhador poderá ter. Daí
que se entende que, se o empregador não comunicar esta intenção, já não pode
despedir, e tal não tem nada que ver com os factos, mas com as expetativas e a
confiança criadas na esfera do trabalhador.

A nota de culpa, ou seja, o início do procedimento, tem um prazo, sob pena de


prescrever a possibilidade de o desencadear. De acordo com a regra geral prevista
nos nºs 1 e 2 do artigo 329º CT, a nota de culpa deve ser entregue ao trabalhador
dentro do ano subsequente à prática da infração disciplinar e nos 60 dias
subsequentes à tomada de conhecimento de tal infração.

2) Defesa

Tendo sido acusado o trabalhador, é-lhe reconhecida a faculdade de se defender,


nos termos do artigo 355º CT. O trabalhador tem 10 dias para consultar o processo
e responder à nota de culpa, deduzindo por escrito os elementos que considera
relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos (princípio do

107
contraditório). Se o trabalhador não responder, têm-se como provados os factos
constantes da nota de culpa.

Nas situações em que o risco de despedimento não está em causa (por falta de
comunicação dessa intenção pelo empregador), o trabalhador defende-se sem
necessidade de recorrer a terceiros (advogados, peritos, etc.) e, como é lógico, sem
ter de suportar essas despesas.

Em sede disciplinar, o direito de o trabalhador responder à nota de culpa


consubstancia o exercício do direito de audiência, previsto constitucionalmente no
nº10 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa.

3) Instrução

É uma fase eventual, pelo que só é obrigatória se houver uma resposta à nota de
culpa e se nesta o trabalhador requerer outros meios de prova a produzir. Ou seja, o
empregador é obrigado a proceder às diligências probatórias requeridas pelo
trabalhador na resposta à nota de culpa, só assim não será se as considerar dilatórias
ou impertinentes, devendo, nesse caso, alegá-lo fundamentalmente por escrito, tal
como previsto no artigo 356º, nº1 CT.

4) Parecer da estrutura representativa dos trabalhadores

Nos termos do nº5 do artigo 356º, após a conclusão das diligências probatórias em
instrução, o empregador deve apresentar uma cópia integral do processo à comissão
dos trabalhadores, que pode, no prazo de cinco dias úteis, fazer juntar ao processo
o seu parecer fundamentado. Contudo, este não é obrigatório nem vincula a decisão
final do empregador.

5) Decisão do empregador

Recebido o parecer da estrutura representativa, o empregador dispõe de 30 dias para


proferir a decisão de despedimento, sob pena de caducidade do direito de aplicar a
sanção.

A decisão do empregador deve constar de documento escrito (artigo 357º, nº5) e


tem de ser fundamentada, nela devendo ser ponderadas as circunstâncias concretas
do caso em questão, a adequação do despedimento à culpabilidade do trabalhador e
o parecer dos representantes dos trabalhadores. Além disso, o empregador só pode
levar em linha de conta os factos invocados no processo. Factos que não foram
levados ao processo não podem ser indicados na decisão do empregador, não
obstante terem ocorrido na realidade. Com efeito, podemos concluir que a nota de
culpa fixa o objeto do procedimento disciplinar, que é mais uma manifestação do
princípio do contraditório (o qual seria violado se o trabalhador, tendo sido acusado

108
dos factos x e y, defendendo-se destes, fosse despedido com base nos factos z ou w,
pois não teve a oportunidade de se defender destes). Todavia, o despedimento pode-
se fundar em mais factos do que os constantes da nota de culpa.

A decisão determina a cessação do contrato logo que chega ao poder do trabalhador


ou é dele conhecida ou, ainda, quando só por culpa do trabalhador não foi por ele
oportunamente recebida (artigo 357º, nº7 CT e 224º CC).
Quando o empregador tenha suspeita de comportamentos irregulares, a lei prevê
ainda, no artigo 352º CT, uma possível necessidade de procedimento prévio de inquérito em
vias de fundamentar a nota de culpa a ser entregue ao trabalhador. Este inquérito prévio
interrompe ou suspende os prazos da contagem (um ano após a prática da infração e 60 dias
após conhecimento da mesma), desde que ocorra nos 30 dias seguintes à suspeita de
comportamento irregular e a nota de culpa seja notificada até 30 dias da conclusão do mesmo.
Note-se que suspeita e conhecimento são conceitos juridicamente diferentes.
Se o empregador tiver conhecimento da infração há mais de 60 dias, ainda que tenha
ocorrido o inquérito prévio, não entregando este a nota de culpa e a comunicação ao
trabalhador, já não poderá despedir o mesmo, dado que a lei atribui à nota de culpa o início do
processo.

AULA DE 05/12/2019
Há, neste âmbito, uma questão suscetível de levantar alguns problemas (apesar de nunca
o ter feito), que é a questão do artigo do 354º CT. Este artigo prevê a faculdade de o empregador
suspender preventivamente o trabalhador.
Esta faculdade pode ocorrer em duas situações:
 Com notificação de nota de culpa, o empregador pode suspender
preventivamente o trabalhador se a sua presença for inconveniente para a
empresa (nº1 do artigo 354º CT);

 Suspensão do trabalhador prévia à notificação de nota de culpa (30 dias


anteriores), desde que o trabalhador justifique e fundamente, por escrito que,
tendo em conta os indícios de factos imputáveis ao trabalhador, a sua presença
na empresa é inconveniente, nomeadamente para a averiguação de tais factos, e
que ainda não foi possível elaborar a respetiva nota de culpa (nº2 do artigo 354º
CT).
Relativamente ao disposto no nº2, o legislador, nessa previsão, teve em conta o
princípio da presunção da inocência, a tutela dos interesses globais da organização da empresa
e o direito do trabalhador à liberdade de trabalho. Com efeito, quando o empregador pretende
suspender o trabalhador, tem de ter indícios de que houve uma conduta suscetível de
despedimento, e tem de provar que a presença desse trabalhador se mostra inconveniente para
a averiguação dos factos. Quanto se trata de uma suspensão prévia, o legislador tem de
apresentar uma fundamentação (averiguação dos factos) que justifique a restrição àqueles

109
princípios. Compreende-se por fim que, se a presença do trabalhador for considerada pelo
empregador inconveniente, dentro de um juízo de razoabilidade, este o possa suspender.
Quanto ao nº1, a lei refere-se apenas à demonstração da inconveniência, não à sua
fundamentação. Mas inconveniência para quem ou para quê? Para os trabalhadores? Para os
colegas? Para o empregador? No nº2, trata-se de uma inconveniência para averiguação dos
factos que lhe serão imputados, aqui, por sua vez, o legislador não discrimina. Segundo o
Professor, não podemos dizer que esta norma se enquadra no procedimento disciplinar. A
suspensão tem de estar intimamente ligada à averiguação do ilício, e não é o que acontece aqui.
Aparentemente, o empregador nem tem, nos termos deste artigo, de fundamentar a sua decisão.
A questão que se coloca é se, neste nº1, devemos fazer uma interpretação restritiva à luz do
número dois, ou se o nº2 é uma situação especifica que não admite interpretação analógica. Ou
seja, se a suspensão prevista no nº1 também apenas será possível se a presença do trabalhador
se mostrar inconveniente para a averiguação dos factos (que aqui já lhe foram imputados, visto
que é uma suspensão posterior à nota de culpa), ou se, por outro lado, será sempre possível,
não tendo o empregador de fundamentar a suspensão.
Quanto às microempresas: a lei prevê, no artigo 358º, um conhecimento especial.
Regra geral, no despedimento com justa causa, a lei requer a intervenção das entidades
representativas do trabalhador visado e é por isso que a lei obriga que o sindicato ou comissão
de trabalhadores sejam notificados do processo para se pronunciarem sobre o mesmo. Dado os
possíveis efeitos que este processo possa causar, entende-se que a participação das entidades
coletivas possa dar algum conforto à defesa do trabalhador. Porém, nas microempresas, a lei
dispensa a intervenção destas entidades, dada a proximidade entre o trabalhador e empregador.
De resto, em termos de garantias substanciais, não há qualquer diferença.
Em conclusão, é o empregador que dirige o processo: é ele que acusa, é ele que gere a
instrução, e é ele que decide. Todos os poderes estão concentrados na mesma pessoa, o
empregador, que, ainda mais, é uma pessoa interessada no desfecho. O empregador não será
um acusador imparcial e não será um juiz totalmente imparcial. Por isso é que se admite o
recurso judicial e esse sim irá avaliar os factos e os elementos de direito em causa.

12.4. Despedimento por razões objetivas


(páginas 339 a 352 do livro do professor Leal Amado)
A par do despedimento com justa causa (causa subjetiva, baseada em facos imputáveis
ao trabalhador), a lei admite e regula várias modalidades de despedimentos por causas
objetivais, isto é, por motivos da esfera da empresa, motivos de fundo económico
(nomeadamente necessidades de racionalidade económica, ou seja, necessidades que levam o
empregador a ajustar o número de trabalhadores à realidade objetiva e económica da empresa).
Estes motivos objetivos de racionalidade económica podem ter duas origens:
 Razões estritamente ligadas ao mercado (a procura dos bens produzidos pela
empresa diminuiu, pelo que diminui a produção);

 ma ra onal dade e onóm a “ ol nt r a”. Por e em lo o em re ador


adquire novos meios tecnológicos que conduzem ao excesso de mão de obra.

110
Quando estes fenómenos se verificam, por norma, afetam vários trabalhadores, daí estar
re to “de ed mento olet o”. Por o tro lado tratando-se de situações pontuais de
despedimento, em certa medida, um despedimento individualizado, falamos de despedimento
por extinção de posto de trabalho.

12.4.1. Despedimento coletivo (artigo 359º)


Art o 359º nº1 “considera-se despedimento coletivo a cessação de contratos de
trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de
três meses, abrangendo, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate,
respetivamente, de microempresa ou de pequena empresa, por um lado, ou de média ou grande
empresa, por outro, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou
várias secções ou estrutura equivalente ou redução do número de trabalhadores determinada
por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos”.
Esta noção contém vários elementos que constituem o despedimento coletivo:
 Um elemento temporal: cessação de contratos operada simultaneamente ou
sucessivamente no período de 3 meses;

 Um número mínimo de trabalhadores (elemento numérico mínimo,


dependente da dimensão das empresas): o despedimento tem de abranger, pelo
menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respetivamente, de
microempresa/pequena empresa, ou de média/grande empresa;

 Uma causa/fundamento de natureza de mercado, estrutural ou tecnológica;


Estes critérios dão forma à figura do despedimento coletivo, pelo que tem de haver uma
cumulação destes três elementos para se desencadear e manter um processo de despedimento
coletivo.
O nº2 do mesmo artigo define quais são motivos de mercado, estruturais ou
tecnológicos considerados no nº1:
 Motivos de mercado: no nº2, a), a lei prevê essencialmente motivos que podem
estar na origem da queda de vendas. Nomeadamente, uma redução da procura
(originada pela concorrência do mercado); ou uma redução com origem em
causa legal (por exemplo: se um determinado país proibir a importação de certos
bens de outro país; se uma determinada empresa é proibida, por decisão judicial,
de produzir determinado produto, etc.);

 Motivos estruturais: nos termos da lei, trata-se de um desequilibro económico


ou financeiro; mudança de atividade; substituição de produtos dominantes.
Outros exemplos: a empresa decide fechar uma linha de produção, que é um
motivo interno, e isso leva a um excesso de mão de obra; a empresa não
consegue um financiamento para produzir determinado produto, etc.

111
Nota: se a origem da alteração estrutural é um fator do mercado ou não, não está
aqui em causa. Pode sê-lo e continuar na mesma a caber nesta alínea.

 Motivos tecnológicos: alterações técnicas ou processos de fabrico;


automatização de instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação
de cargas, bem como de informatização de serviços ou de meios de
comunicação.
Em síntese, são essencialmente situações motivadas por uma crise empresarial que
impliquem a reestruturação estratégica da empresa no mercado. O despedimento coletivo
surge, pois, como um mecanismo de resposta a estas situações, em ordem a assegurar a
viabilidade da empresa, ou como um mecanismo destinado a prevenir a crise empresarial, de
modo a que a empresa permaneça saudável. E isto que distingue o despedimento coletivo do
despedimento com justa causa. A distinção não reside no aspeto quantitativo, mas sim nos
motivos subjacentes a cada um deles: motivos disciplinares no caso de despedimento com justa
causa, e motivos económicos aqui.
O procedimento a observar também é, por isso mesmo, muito distinto. O despedimento
coletivo deve ser precedido de um procedimento de informação e consulta (artigos 360º e
361º CT). Assim, o empregador que pretenda promover um despedimento coletivo deve
comunicar essa intenção à estrutura representativa dos trabalhadores, ou, na sua falta, a cada
um dos trabalhadores que possam ser abrangidos, nos termos do nº1 e nº3 do artigo 360º CT.
A esta comunicação segue-se uma fase de informação e negociação com vista a um acordo. O
que se pretende com estas reuniões/com este dever de informação e consulta, é limitar o
âmbito quantitativo do despedimento, isto é, o número de trabalhadores que inicialmente são
abrangidos por essa intenção de despedir, ou, principalmente, para organizar os meios que
permitam a esses trabalhadores manterem-se ocupados, nomeadamente através de formação
profissional. Pretende-se atenuar os efeitos/números do despedimento, mas, não sendo isso
possível, pretende-se que estes fiquem com uma ocupação produtiva, sendo a melhor opção a
formação profissional.
Do procedimento de informação e consulta poderá surgir, ou não, um acordo. Se
surgir um acordo, pode neste estar contemplado quais os trabalhadores que irão ser despedidos
e ainda quais serão as medidas que o empregador se incumbirá de tomar para fomentar a
formação profissional dos trabalhadores.
Como já vimos, há medidas sucedâneas e menos danosas em comparação com o
despedimento coletivo, que são meios alternativos a este (por exemplo: a suspensão do contrato
de trabalho, a redução do tempo de trabalho, a pré-reforma do trabalhador, etc.). Nesse
procedimento de informação e consulta discute-se também se uma destas figuras não poderá
ser uma alternativa ao despedimento coletivo. Claro que tudo irá depender não só da vontade
do empregador, mas também da situação da empresa que levou à ponderação do despedimento
coletivo em primeiro lugar.
Este procedimento é obrigatório e, não sendo este realizado por culpa da entidade
empregadora, origina a invalidade do despedimento.

112
Decorre do artigo 363º que, celebrado ou não um acordo, caso o despedimento se
consume, o empregador profere um pré-aviso de despedimento a cada trabalhador abrangido.
Quer isto dizer que esta decisão não tem efeitos imediatos na medida em que há um pré-aviso
que o empregador deve cumprir. Caso o empregador não observe o prazo mínimo de aviso
prévio, o contrato só cessará uma vez decorrido o período de aviso prévio em falta, devendo o
empregador pagar a retribuição correspondente a esse período (nº4 do artigo 363º CT).
O artigo 364º confere teoricamente aos trabalhadores um direito no sentido de permitir
uma maior disponibilidade para procurar trabalho. Nos termos deste artigo, durante o prazo de
aviso prévio, o trabalhador tem direito a um crédito de horas, que corresponde a determinado
número de horas pagas nas quais o trabalhador tem direito a não ir trabalhar (dois dias por
semana). Trata-se de um tempo dedicado à busca de um novo emprego. Esse crédito pode ser
dividido por alguns ou por todos os dias. Este aspeto é importante na medida em que, se o pré-
aviso for de 75 dias (para os trabalhadores com 10 anos ou mais de empregabilidade), já
falamos aqui de um número significativo de crédito de horas, durante as quais o trabalhador
não comparece ao trabalho e, não obstante, aufere retribuição.
Dada a iminência do desemprego, ultrapassada a fase do acordo, da adoção de medidas,
etc., a lei confere ao trabalhador a faculdade de denunciar o contrato durante esse período de
pré-aviso: quando é certo que o despedimento se irá realizar, e em que termos, a lei garante
ao trabalhador o direito de antecipar a sua saída, mantendo o direito à retribuição, desde que
mediante declaração com uma antecedência mínima de três dias úteis.
Há um outro efeito deste pré-aviso, nomeadamente sobre a marcação do período de
férias.
Art o 41º nº5 “em caso de cessação do contrato de trabalho sujeita a aviso prévio,
o empregador pode determinar que o gozo das férias tenha lugar imediatamente antes da
cessação”.
Vamos supor que há um procedimento de despedimento coletivo e o empregador
profere este aviso prévio. Vem aqui a lei permitir que, se eventualmente o período de férias já
estiver marcado (se não estiver marcado, não há expectativas, a vida do trabalhador ainda não
está orientada com base nesse período de lazer), o empregador pode modificar esse período,
determinando que ele tenha lugar antes da cessação. Isto é, confere a lei a possibilidade ao
empregador de, na pendência de pré-aviso, antecipar o gozo das férias, se estas já estiverem
marcadas.
O despedimento coletivo também confere o direito, nos termos do artigo 366º, a uma
compensação pela perda do emprego. O artigo 366º é a norma de referência para determinar
todas as compensações a que o trabalhador tenha direito na sequência de extinção da relação
laboral (vamos tratar desta norma nas aulas práticas, pois este artigo pode gerar grande
confusão).

12.4.2. Despedimento por extinção do posto de trabalho (artigo 367º)


O despedimento por extinção do posto de trabalho trata-se, em certa medida, de uma
espécie de variante individual do despedimento coletivo, a qual se utilizará quando o número

113
de trabalhadores a despedir não atinja o limiar fixado para este. Trata-se aqui de
despedimentos individuais, ainda que sejam em simultâneo.
Também se trata, portanto, de uma cessação de contratos de trabalho promovida pelo
empregador e devida a motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa
(remissão para o artigo 359, nº2).
Requisitos do despedimento por extinção do posto de trabalho (artigo 368º, nº1):
 Que os motivos indicados não sejam devidos a conduta culposa de qualquer
das partes (se houver culpa do trabalhador, isso legitimará, possivelmente, um
despedimento com justa causa; se houver culpa do empregador, isso
impossibilitá-lo-á de desencadear uma extinção do posto de trabalho);

 Que seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho (nos


termos do nº4 do mesmo artigo, será impossível a sua subsistência quando o
empregador não disponha de outro posto de trabalho compatível com a categoria
profissional do trabalhador);

 Não existam, na empresa, contratos de termos para tarefas correspondentes às


do posto de trabalho extinto;

 Que não seja aplicável o despedimento coletivo;

Sendo os despedimentos individualizados (podem abranger mais do que um


trabalhador, mas são individualizados), poderá haver na secção ou estrutura uma pluralidade
de postos de trabalho de conteúdo funcionalmente idêntico. Como é que o empregador
escolhe qual o trabalhador a despedir? O legislador tentou limitar o arbítrio do empregador no
nº2 do artigo 368º, ao estabelecer uma ordem de prioridades a observar pelo mesmo. O
legislador diz que, primeiro, nestas situações de pluralidade, deverão ser despedidos aqueles
que têm pior desempenho, admitindo, desde logo, alguns critérios discriminatórios com o
objetivo de possibilitar a empresa de manter os trabalhadores mais habilitados; em segundo
lugar, os que têm menores habilitações académicas e profissionais; depois admite que escolha
passe por critérios de onerosidade, ou seja, serão despedidos os trabalhadores que auferem
mais, o que não deixa de contrariar, de certa forma, o que diz anteriormente. O legislador
tentou introduzir aqui alguns critérios, alguma objetividade, mas o professor crê que são um
o o ontrad tór o m trabalhador e anha 5000€ ode não er descartável, ou pode até
ter maior habilitação, do que um trabalhador que ganhe 3000€.
Quanto ao procedimento de despedimento, o procedimento aqui consagrado é muito
semelhante ao do despedimento coletivo. O empregador, de acordo com os critérios do artigo
368º, nº2, define quais os trabalhadores a despedir, sendo que depois será igualmente
necessário existir um procedimento de informação e consulta (artigos 369º, 370º CT).
Compreende-se que, apesar do número de pessoas abrangidas ser menore, há interesses
semelhantes àqueles que se verificam no despedimento coletivo.
A decisão aqui (artigo 370º) também acaba por ser semelhante ao regime estabelecido
para o despedimento coletivo (artigo 363º), pelo que também esta carece de aviso prévio (nº3

114
do artigo 371º) e há também uma compensação pecuniária calculada em função da respetiva
retribuição e antiguidade (artigo 372º).

12.4.3. Despedimento por inadaptação


Lê- e no art o 373º “considera-se despedimento por inadaptação a cessação de
contrato de trabalho promovida pelo empregador e fundamentada em inadaptação
superveniente do trabalhador ao posto de trabalho”.
Também se trata de um despedimento por razões objetivas, apesar de ser um
despedimento que tem que ver com as qualidades do trabalhador. Porque é que lhe chamamos
um motivo objetivo, se o que vai determinar o despedimento é a capacidade do trabalhador se
melhor ou pior adaptar a determinadas condições de mudança da qualidade atividade?
O artigo 374º prevê 3 critérios de aferição desta inadaptação, nomeadamente:
 Redução continuada de produtividade ou de qualidade;

 Avarias repetidas nos meios afetos ao posto de trabalho;

 Riscos para a segurança e saúde do trabalhador, de outros trabalhadores ou de


terceiros.
Como vamos ver, esta inadaptação deve ser aferida face a uma alteração da atividade
ou da qualidade da atividade do trabalhador posterior à celebração e execução do contrato.
Tudo isto tem que ver, eventualmente, com a redução da capacidade do trabalhador. O
trabalhador foi contrato para uma determinada atividade, para a qual tem uma capacidade, e,
por um determinado motivo, começa a render menos, ou origina um risco no emprego.
Quando alguma destas situações for determinada pelo modo de exercício das funções
do trabalhador e torne praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, verificar-
se-á a inadaptação do trabalhador.
O nº2 do artigo 374º faz referência aos trabalhadores que desempenham cargos de
complexidade técnica ou de direção, pelo que há um regime especial para estes. Quando estes
não cumprem um objetivo previamente acordado num determinado prazo, a lei diz que, fixado,
se esse objetivo não tiver sido cumprido pelo trabalhador em consequência do modo de
exercício de suas funções, é impossível a subsistência da relação de trabalho. A lei não procura
aqui saber da razoabilidade desse objetivo: se o trabalhador aceitou por escrito o objetivo
proposto, a lei aceita também, confiando na racionalidade das partes.
O artigo 375º prevê os requisitos gerais para se verificar o despedimento por
inadaptação. De acordo com o Professor Leal Amado, é necessário distinguir, neste artigo, duas
situações:
a) Despedimento por inadaptação proprio sensu (artigo 375º, nº1)

Nos termos deste nº1, para haver um despedimento por inadaptação é necessário
que tenham sido introduzidas modificações no posto de trabalho, pois é na
sequência destas alterações que o trabalhador se adaptará, ou não. A dimensão

115
objetiva está precisamente neste facto. A sua inadaptação é provocada por
condições diversas (e não previstas) daquelas para o qual este foi contratado, que
não lhe são, pelo menos num primeiro momento (antes da formação profissional e
do período de adaptação posterior), imputáveis.

Claro que temos aqui elementos mistos: o trabalhador não revelar capacidade de
adaptação é um elemento de natureza subjetiva, mas o elemento que a lei destaca é
a alteração do posto de trabalho, que é uma alteração objetiva.

A lei confere um período de 6 meses para a aferição dos tais elementos de


adaptação.

Na medida em que a inadaptação é causada pelo empregador, a lei estabelece uma


obrigação de o empregador garantir ao trabalhador formação profissional adequada
para as novas aptidões de trabalho. Depois há ainda um período de prova que
permite ao empregador aferir se a formação profissional se revelou útil, ou não. Só
depois deste período de prova é que o trabalhador pode ser despedido, caso não se
verifique a sua adaptação. Com efeito, é um processo um tanto demoroso e,
enquanto não há despedimento, o trabalhador, tem direito a retribuição.

b) Despedimento por “inadaptação” (artigo 375º, nº2)

É aqui que surge o grande problema, pois, segundo o professor Leal Amado, esta
hipótese consiste na criação de uma nova causa lícita de despedimento por decisão
do empregador. O legislador trata esta figura como se ela fosse mais uma simples
variante do despedimento por inadaptação, no entanto, não surge aqui nada de
novo na sua vida laboral, pois este número está previsto para situações em que não
tenha havido modificações no posto de trabalho. Como tal, o trabalhador não se
adaptou a quê? É logicamente impossível qualquer inadaptação do trabalhador,
pois não há nada de novo a que se tenha de adaptar e a que, portanto, possa vir a
revelar-se inadaptado. Nas palavras do professor Leal Amado, aquilo que se trata
aqui é da transição de um verdadeiro despedimento por inadaptação, baseado em
causas objetivas, para um despedimento por inadaptação profissional
(incompetência, desempenho insuficiente ou insatisfatório, baixa produtividade,
etc.), baseado em causas subjetivas.

O professor Liberal, porém, não abordou esta questão nas aulas teóricas.
Do ponto de vista procedimental, também não se afasta muito do procedimento do
despedimento coletivo. Há ainda um dever de comunicação, um dever de informação e
consulta, uma decisão e um pré-aviso da mesma. Naturalmente, o trabalhador tem também um
direito a compensação (artigo 366º CT).
No artigo 379º, nº2 CT, o legislador concede ainda ao trabalhador a faculdade de
denunciar o contrato, mantendo o direito à compensação durante o prazo de aviso-prévio, mal
receba a comunicação prevista na alínea b), nº2 do artigo 375º CT.

116
Aula de 12/12/2019

12.5. A ilicitude do despedimento


(páginas 356 e seguintes do livro do Professor Leal Amado)

Até agora estivemos a ver as várias modalidades de despedimento. Além destas


modalidades, prevê também a lei, nos artigos 381º e seguintes, a sua ilicitude.
A lei uniformiza o termo ilicitude, usando-o para descrever uma panóplia de situações.
Com efeito, não o devemos entender em sentido estrito, pois pode este remeter para várias
situações nas quais, quer do ponto de vista material, quer do ponto de vista procedimental, não
é observado regime legal para o despedimento do trabalhador (cessação por iniciativa do
empregador).

12.5.1. Causas gerais de ilicitude o despedimento

Qualquer despedimento, baseie-se ele em causas subjetivas ou objetivas, será ilícito nos
casos previstos no artigo 381º CT (casos gerais de ilicitude):

a) Se tiver origem discriminatória:

A alínea a) do artigo 381º refere-se apenas aos despedimentos por motivos políticos,
ideológicos, étnicos ou religiosos, mas temos de interpretar esta norma conforme
todos os critérios de discriminação previstos no artigo 13º da Constituição da
República Portuguesa e no artigo 24º, nº1 CT.

A ena e e onalmente anto a trabalhadore da “em re a deoló a o de


tend n a” art do ol t o a o açõe nd a n t t çõe rel o a et .) o
despedimento poderá basear-se num destes fatores. Contudo, saldo estas situações,
são raros os momentos em que o empregador, na prática, irá justificar um
despedimento por estes motivos. O que acontece é que, não obstante despedir o
trabalhador por motivos discriminatórios, invoca outro motivo como justificação.
Isto obriga o juiz a fazer uma investigação de modo a apurar se a causa invocada
será mesmo a causa real.

b) Se o motivo justificativo invocado for declarado improcedente:

Quando se trata de casos de despedimento em que não há uma justa causa, ou não
há razões legitimadores de um despedimento por extinção do posto de trabalho ou
por inadaptação. O mesmo vale em relação ao despedimento coletivo.

117
A liberdade económica e a propriedade privada, sendo valores constitucionalmente
consagrados, têm de ser restringidos face a outros direitos fundamentais, como a
garantia da segurança do emprego. Se o objetivo das empresas é gerar lucros,
entende-se que é excessivo sustentar a legitimidade do recurso a um despedimento
coletivo por parte da empresa, por exemplo, sendo esta prospera e lucrativa. A tutela
constitucional da segurança no emprego impõe outro tipo de ponderação, daí ser
necessário restringir os direitos à liberdade económica e propriedade privada do
empregador.

c) Se for declarada a improcedência do procedimento, ou a sua inexistência;

d) Se não for solicitado o parecer prévio da entidade competente:

A alínea d) do artigo 381º refere-se em especial à trabalhadora grávida, ou


trabalhador em situação equivalente, ou em gozo de licença paternal. Porquê é que
há esta previsão tão especifica? Esta é uma cláusula que responde às exigências da
realidade. Devemos fazer aqui uma remissão para o artigo 63º CT.

12.5.2. Causas específicas da ilicitude

I. Ilicitude de despedimento por facto imputável ao trabalhador (despedimento por justa


causa): artigo 382º CT

Nos casos de despedimento com alegação de justa causa, a respetiva a ilicitude poderá
resultar da circunstância de:

 Já terem decorrido os prazos para o procedimento disciplinar, estabelecidos no


artigo 329º CT. Qualquer procedimento realizado posteriormente à prescrição
desses prazos será inválido;

 O procedimento disciplinar ser inválido em si. As falhas procedimentais que


determinam a ilicitude do despedimento (vícios invalidantes) são as contempladas
nas alíneas do nº2 do artigo 382º CT. Nomeadamente:

o A falta de nota de culpa escrita: a nota de culpa tem de ser apresentada, sob
pena de nulidade;

o A falta de descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador na


nota de culpa, pois tal falta limitará de forma não proporcionada a formade
defesa do trabalhador;

o A falta de comunicação ao trabalhador da intenção do despedimento


juntamente à nota de culpa;

118
o Desrespeito pelos direitos de defesa do trabalhador: a lei também procura
salvaguardar o direito do trabalhador ao contraditório, pelo que, se não for
respeitado o direito do trabalhador a consultar o processo ou a responder à
nota de culpa, o procedimento é também inválido;

o Uma decisão de despedimento fundamentada em factos não constantes na


nota de culpa, isto é, em factos que foram trazidos ao processo.

Muito embora o legislador nem sempre o referia expressamente, o despedimento é ainda


ilícito se não se justificar o motivo explicitado pelo empregador.

II. Ilicitude de despedimento coletivo: artigo 383º CT

Nota sobre a alínea c) deste artigo: a cessação do contrato, qualquer que seja a causa,
tem como consequência imediata o vencimento de todos os créditos (como o subsídio de férias,
o subsídio alimentar, o subsídio de Natal, etc.). Contudo, os acréscimos de retribuição
relativamente ao trabalho noturno ou suplementar já se formaram e já se venceram, porque são
prestações imediata, logo, não deverão caber na “ om en ação de da” a e e re ere e ta
alínea, por regra.

III. Ilicitude de despedimento por extinção de posto de trabalho: artigo 384º CT


IV. Ilicitude de despedimento por inadaptação: artigo 385º CT

12.6. Meios de reação/defesa do trabalhador face ao despedimento


(páginas 253 a 356 do livro do professor Leal Amado)

Se um trabalhador que tenha sido despedido entender (com ou sem razão) que foi
despedido ilegalmente (sem justa causa, sem motivos objetivos, com preterição de regras
procedimentais, etc.), ele poderá impugnar a decisão do despedimento. Esta impugnação do
despedimento só pode ser feita por via judicial (artigo 387º, nº1), pelo que está em causa um
direito fundamental (direito à segurança no emprego). A questão deve ser remetida para o
Código de Processo de Trabalho (CPT).

Há dois meios judiciais que podem ser usados pelo trabalhador, embora sejam
complementares (artigos 386º e 387º CT): a suspensão preventiva de despedimento e a ação
judicial/impugnação judicial do despedimento.

O trabalhador pode, desde logo, requerer a suspensão preventiva de despedimento


(artigo 386º CT e 33º-A até ao 40º-A CPT), no prazo de cinco dias úteis desde a data da receção
da comunicação de despedimento, mediante uma providência cautelar para o efeito. O

119
legislador admite que o trabalhador possa solicitar a suspensão do efeito de despedimento e
que, bem assim, mantenha o direito à retribuição e continue a trabalhar.

Esta providência cautelar é um mecanismo que o trabalhador pode utilizar, quer para
combater um despedimento com justa causa, quer para quando seja confrontado com um
despedimento coletivo, seja por extinção do posto de trabalho, ou por inadaptação (artigo 33º-
A CPT).

A providência visa proteger a aparência do direito invocado, no caso o direito à


segurança do emprego e à perceção regular dos rendimentos do trabalho (fumus boni iuris);
tem como razão determinante evitar, ao menos provisoriamente, os efeitos da mudança operada
com o despedimento, fim que a ação principal não é adequada a preservar por ser de resolução
mais lenta (periculum in mora). Além disso, é instrumental ou dependente da ação principal,
que, neste caso, é a ação de impugnação de despedimento, de que a providência, isto é, a
suspensão, constitui uma espécie de antecipação previsional.

Nos termos do artigo 39º CPT, o juiz vai-se pronunciar perante os elementos que lhe
foram trazidos pelas partes, pelo que a suspensão será decretada se este concluir pela
probabilidade/aparência séria da ilicitude do despedimento (fumos boni iuris). Na ação de
impugnação, porém, não serve o mesmo critério. Nessa, o juiz tem de decidir de acordo com a
sua convicção segura, não sendo já uma questão de probabilidade.

Se for decreta a providência, há um efeito imediato e provisório de suspensão do


despedimento.

Quanto ao prazo para requerer a suspensão (5 dias a contar desde a data de receção
da comunicação de despedimento): como vimos, se em sede de despedimento disciplinar (com
justa causa) a decisão extintiva do empregador produz efeitos logo que chega ao poder do
trabalhador ou é dele conhecida (artigo 357º, nº7), na hipótese de despedimento baseado em
causa objetivas, por outro lado, tal decisão não produz efeitos imediatos, estando sujeita a um
prazo mínimo de aviso prévio de duração variável, entre 15 e 75 dias (artigos 363º, nº1, 371º,
nº3 e 378º, nº2 CT). Significa isto que, em relação aos despedimentos baseados em causas
objetivas, o respeito pelo prazo estabelecido no artigo 386º (prazo de cinco dias úteis desde a
data da receção da comunicação de despedimento) implicará que o trabalhador tenha de
requerer a suspensão preventiva do despedimento antes do despedimento produzir os respetivos
efeitos extintivos. Nestes casos, o trabalhador ainda não perdeu o emprego, pois estará a
decorrer o prazo de aviso prévio concedido pelo empregador. Porém, a decisão patronal
extintiva já foi tomada e já lhe foi comunicada, pelo que se compreende, até em função da
celeridade própria deste procedimento cautelar, que a lei obrigue o trabalhador a agir
rapidamente.

Contudo ainda, os cinco dias podem não se afigurar o prazo mais justo em algumas
situações, até porque há circunstâncias que poderão determinar a ilicitude do despedimento
ainda desconhecidas do trabalhador na data em que lhe é comunicada a decisão extintiva. Por

120
exemplo, a compensação da antiguidade e os demais r d to labora jo a amento no
termo le a oder er e et ado “at ao termo do aviso r o” art o 383º alínea c), 384º,
alínea d) e 385º, alínea c) CT). Naturalmente, cinco dias após a receção da comunicação de
despedimento, o trabalhador ainda não sabe se o empregador irá ou não proceder a tais
pagamentos.

Tenha ou não utilizado a via da providência cautelar, o trabalhador que pretenda


combater um despedimento que considere ilícito terá de intentar a correspondente ação judicial
(artigos 387º, nº1 e 388º, nº1 CT e 98º até ao 98º-P CPT). Nesta ação ficará definitivamente
decidido se o despedimento é válido ou não. Para esse efeito, o trabalhador dispõe do prazo
de 60 dias (nº2 do artigo 387º CT), salvo se se tratar de um despedimento coletivo, no qual o
prazo para intentar a ação é de 6 meses (nº2 do artigo 388º CT).

Trata-se esta de uma ação declarativa de condenação com processo especial e de


natureza urgente.

Para que o trabalhador possa intentar esta ação, exige-se que tenha havido uma decisão
patronal de despedimento inequívoca e formalizada. Se, por exemplo, se tratar de um
despedimento verbal, ou se a cessação da relação contratual entre os sujeitos teve origem noutra
via que não o despedimento, o trabalhador terá de recorrer a uma ação com processo comum,
dispondo de um ano para intentar a correspondente ação (prazo geral de arguição das
anulabilidades).

Na ação judicial do despedimento (artigo 387º), bem como na ação de impugnação do


despedimento coletivo (artigo 388º), o empregador apenas poderá invocar factos e
fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador (nº3 de ambos
artigos). Além disso, em casos de despedimento com alegação de justa causa, o tribunal deverá
sempre pronunciar-se sobre a verificação e procedência dos fundamentos invocados para o
despedimento (artigo 387º, nº4 CT).

Portanto, seja para despedimentos com justa causa, seja por motivos objetivos, são estes
os dois meios de defesa do trabalhador: a suspensão e a ação judicial. Naturalmente, os efeitos
da suspensão caducarão se o trabalhador não propuser a ação de impugnação do despedimento
individual ou coletivo da qual a providência depende dentro de 30 dias, contados da data em
que lhe tiver sido notificado o trânsito em julgado da decisão que a haja ordenado (artigo 40º-
A CPT). Isto significa que, na prática, se providência for decretada, o trabalhador tem apenas
terá 30 dias para impugnar o despedimento, pelo que o prazo de 60 dias, previsto de forma
geral no nº2 do artigo 387º CT, apenas se verificará se não houver suspensão.

12.7. Efeitos da ilicitude do despedimento


(páginas 359 e seguintes do livro do professor Leal Amado)

121
Se o tribunal considerar ilícito o despedimento, há uma série de consequências que se
verificarão na esfera do empregador (artigos 389º até 393º CT).

Em primeiro lugar, o despedimento será nulo. Posto isto, o artigo 389º indica os efeitos
imediatos e automáticos da declaração judicial de ilicitude do despedimento e,
consequentemente, da sua nulidade.

a) Se o despedimento for considerado nulo, haverá uma retroação dos efeitos do


contrato ao momento do despedimento, o que significa que tudo se passará como se
o contrato estivesse em vigor desde o momento de despedimento, isto é, o
empregador terá de indemnizar o trabalhador por todos os danos patrimoniais
e não patrimoniais.

Temos danos não patrimoniais quando, por exemplo, se invoca contra o trabalhador
(como causa justa de despedimento) um furto ou outro tipo de ilicitude relacionado
com a dignidade do mesmo (danos patrimoniais indiretos), ou ainda danos de
natureza pessoal que decorrem do simples despedimento. Estes devem ser
indemnizados ainda com base no artigo 496º, nº1 CC.

b) Outra consequência imediata é a reintegração do trabalhador no mesmo


estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. Ao
declarar o despedimento ilícito, o tribunal priva este último do seu efeito extintivo
da relação laboral pelo que, tendencialmente, tudo se vai passar como se o
despedimento jamais tivesse sido proferido pela entidade empregadora, visto que o
contrato de trabalho não foi dissolvido pelo despedimento.

A tutela de tipo reintegratória está ainda relacionada com a garantia constitucional


da segurança no emprego, consagrada no artigo 53º CRP, pois a monetarização do
despedimento como alternativa à reintegração permitiria ainda à entidade
empregadora aquilo que a CRP quer proibir, que é o despedimento sem causa
legítima.

A reintegração não é, todavia, obrigatória, como vermos mais adiante.

O nº2 do artigo 389º CT introduz depois um regime específico que o professor crê que
poderá ser discriminatório, porque não se verifica noutros setores de Direito. Diz o legislador
que, se a ilicitude do despedimento se basear numa mera irregularidade fundada em deficiência
de procedimento por omissão das diligências probatórias requeridas pelo trabalhador na nota
de culpa, ou por omissão de audiência de testemunhas, se, ainda assim, os motivos justificativos
invocados declarados forem declarados procedentes, então o trabalhador terá apenas direito à
indemnização, mas já não a ser reintegrado na empresa.

O professor discorda do conteúdo desta norma pelo facto de que as regras


procedimentais são essenciais para o exercício dos direitos fundamentais. Está aqui em causa

122
o direito ao contraditório do trabalhador. A prova testemunhal omitida pelo empregador no
procedimento até poderia ser decisiva para afastar o motivo justificativo do despedimento, mas,
não sendo produzida, nunca o saberemos. O que sabemos é que, por omissão, se o empregador
se recusar a ouvir as testemunhas arroladas, mas se se provar a justa causa (o que não deixa de
poder ser contraditório, porque se calhar com prova testemunhal não havia justa causa), o
trabalhador já não pode ser reintegrado na empresa e ainda não recebe o total do valor
indemnizatório. Não cabe, contudo, ao tribunal suprir a falta de prova testemunhal. O tribunal
pode perfeitamente concluir que, não obstante o procedimento ser inválido, há justa causa. Na
opinião do professor, isto não deveria acontecer assim, porque podia o tribunal chegar à
conclusão de que não houve justa causa se tivesse o empregador ouvido as testemunhas. Nega-
se essa possibilidade e admite-se a existência de justa causa (não admitindo, no entanto, a prova
que poderia excluir a justa causa). Daí que isto seja contraditório. Em via de regra, processo
disciplinar segue muito os princípios do processo penal, mas não é isto que se passa no processo
penal. Diferentemente, no processo penal, violando-se uma regra processual, pode-se admitir
a absolvição do arguido. Aqui parece que temos uma discriminação da qualidade do
trabalhador em razão de ser.

12.7.1. Salários intercalares (artigo 390º CT)

Além do dever de indemnizar o trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não


patrimoniais, causados pelo despedimento ilícito, o empregador deverá ainda compensar o
trabalhador pagando-lhe os chamados “ al r o nter alare ” visto que a declaração judicial de
ilicitude/invalidade do despedimento produz efeitos retroativos. Os pagamentos destes salários
intercalares pelo empregador reconduzem-se à realização da prestação retributiva a que este
estava obrigado por efeito do contrato de trabalho e que, indevidamente, não cumpriu durante
o espaço de tempo que decorreu entre a rutura ilícita desse contrato e a sentença que, decretando
a invalidade dessa rutura, reafirmou a continuidade do vínculo contratual.

Nas situações padrão, os salários intercalares serão devidos desde a data do


despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do
despedimento (artigo 390º, nº1, in fine) e não apenas até à data da sentença da primeira
instância (como era até 2003). Contudo, nada impede que o contrato de trabalho se extinga
antes da decisão judicial, em virtude de outros fatores extintivos dos mesmos (por exemplo:
falecimento ou reforma do trabalhador despedido). Nesses casos, os salários intercalares serão
devidos, naturalmente, não até à data da decisão judicial, mas sim até à data em que o contrato
se extinguiu (por caducidade, por exemplo).

Estes salários são devidos quer o trabalhador tenha optado pela reintegração ou não.

Todavia, há deduções a fazer ao montante dos salários intercalares. Nomeadamente:

123
 “As importâncias que o trabalhador aufira com o despedimento (condição
suficiente) e que não receberia não fosse a cessação do contrato ond ção
ne e r a)”

Segundo o professor João Leal Amado, os rendimentos oriundos de um novo


contrato de trabalho entretanto celebrado pelo trabalhador despedido não
integram esta norma, pois, neste caso, o despedimento será condição necessária
para a obtenção daqueles rendimentos, mas não condição suficiente dos
mesmos, pois o trabalhador não os aufere como consequência do despedimento.
Ou seja, esta disposição aplica-se apenas nos casos em que existe um forte nexo
causal, uma conexão intrínseca entre o despedimento e as importâncias
recebidas pelo trabalhador (por exemplo: montante recebido em virtude de
qualquer seguro que o trabalhador tenha efetuado para cobrir o risco de perda
involuntária do emprego).

 “A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias


antes da propositura da ação, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes
ao despedimento”

O professor considera esta norma desajustada, de certa forma.

Sobre o trabalhador despedido impende o ónus jurídico de propor a ação de


impugnação do despedimento, em ordem a fazer valer o seu direito à segurança
no emprego e a não ser despedido sem causa juridicamente bastante. Até 2003,
o trabalhador tinha um ano para impugnar o despedimento. Aí compreendia-se
que, se o trabalhador não fosse rápido a impugnar, poderia ou deveria sofrer
essa sanção. Hoje, no entanto, como resulta do artigo 387º, nº2, o prazo para
impugnar é reduzido a 60 dias (exceto nos casos de despedimento coletivo, em
que é de 6 meses). O que esta norma provoca é que, além do ónus de impugnar
o despedimento já num prazo muito limitado (60 dias), sobre o trabalhador recai
ainda o ónus suplementar de propor a ação no prazo de apenas 30 dias, sob pena
de ficar sujeito a esta dedução no montante dos salários complementares.

Com efeito, é preciso grande celeridade do trabalhador.

 “O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período entre o


despedimento até ao transito em julgado da decisão do tribunal que declare a
ilicitude do despedimento, devendo o empregador entregar essa quantia à
segurança social”

Em sequência do despedimento, se o trabalhador tiver recebido um subsídio de


desemprego, este também terá de ser deduzido e devolvido à segurança social
(e não ao empregador, pois não foi ele que suportou esses custos).

124
12.7.2. Reintegração (artigos 391º e 392º CT)

Na ação de apreciação judicial do despedimento, o trabalhador poderá optar pela


reintegração na empresa ou pela “ ndemn zação de ant dade”.

De facto, a reintegração é a solução regra, pelo que, sendo o despedimento declarado


ilícito, o empregador será condenado a reintegrar o trabalhador no estabelecimento da empresa,
sem prejuízo da sua categoria e antiguidade.

Todavia, quando o trabalhador é despedido alegadamente por justa causa, a relação


entre as partes poderá sofrer um grande abalo. Não obstante a lei obrigar à reintegração, na
realidade, os conflitos podem surgir. Declarada a ilicitude, o trabalhador tem o direito a ser
reintegrado, mas pode optar por não o ser. Nesse casso, o contrato cessa por sua iniciativa e
tem o trabalhador direito a uma indemnização.

A opção do trabalhador pode ser feita até ao termo da discussão em audiência final de
julgamento, como indica o nº1 do artigo 391º. Porém, essa opção, uma vez exercida, será
irrevogável. Se, por outro lado, o trabalhador nada escolher, o tribunal condenará o empregador
na reintegração, pelo que é essa a solução legal.

e o trabalhador o tar ela ndem n zação de a- e ao tr b nal o j zo de al lar o


e ent al dano e t er onhe mento ara tal) e al o ra de l a do em re ador ne ta
mat r a. z o art o 391º e o tr b nal de e determ nar o montante da ndem n zação “entre
15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de
antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação
e tabele da no art o 381º”.

Entre o mínimo e o máximo anuais, como deverá o tribunal graduar a indemnização?

Por um lado, deverá ter em consideração o valor da retribuição do trabalhador; por outro
lado, deverá avaliar o grau de ilicitude do despedimento. Assim, se a remuneração normal do
trabalhador for muito alta, o juiz, entre os 15 e os 45 dias, deverá optar por um escalão inferior.
O valor da retribuição pode funcionar como um critério de aferição do número de dias da
retribuição que serão arbitrados ao trabalhador por cada dia de antiguidade. Depois, consoante
a participação dolosa ou culposa do empregador, o tribunal poderá aumentar o cálculo dessa
indemnização. O trabalhador tem culpa, por exemplo, quando ilicitude decorrer de falsas
declarações do empregador, ou se a nota de culpa não for fundamentada, etc.

Embora o tribunal disponha de uma margem de manobra apreciável nesta sede, tem
sempre de ser tido em conta o limite do nº3 do artigo 391º: independentemente da antiguidade
do trabalhador, a indeminização a que ele terá direito não poderá ser inferior a três meses de
retribuição base e diuturnidades.

125
Depois há outro aspeto a ter em consideração: vamos supor que um trabalhador falece
após o despedimento, mas antes de ser proferida a decisão judicial que o declara ilícito. Sendo
a reintegração impossível, deverá o empregador ser condenado a pagar ao trabalhador esta
indemnização? Segundo o professor João Leal Amado, não, porque esta indeminização é uma
opção, uma alternativa à reintegração. Ora, com a morte do trabalhador, o contrato de trabalho
caduca. Este caducado, a declaração de ilicitude do despedimento que mais tarde venha a ser
proferida pelo tribunal implicará, tão-só, a reposição do vínculo contratual até à morte do
empregador. Assim, deixa de fazer sentido falar na reintegração do trabalhador como
consequência da anulação do respetivo despedimento e, por isso, deixa igualmente de fazer
sentido falar numa opção pela indemnização.

No artigo seguinte (artigo 392º), a lei estabelece um regime especial para as


microempresas e para os trabalhadores que ocupem cargos de confiança, no qual o
empregador, com fundamento em facos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador
gravemente prejudicial e perturbador ao funcionamento da empresa, se pode opor à
reintegração dos trabalhadores.

 Nas microempresas (aquelas que empregam menos de 10 trabalhadores, de acordo


com o artigo 100º CT), a relação das partes é de uma proximidade maior, pelo que
se compreende que a relação entre as mesmas seja muito abalada face a um
despedimento ilícito, dado a dimensão da empresa. Como tal, no caso de o
trabalhador pretender ser reintegrado, o empregador pode opor-se a essa
reintegração, requerendo ao tribunal que a exclua.

 Também se pode opor o empregador, seja a empresa das dimensões que for,
relativamente à integração requerida pelos trabalhadores que exercem cargos de
administração (embora o CT não especifique o que se deva entender por estes
cargos). Aqui estará em causa uma questão de confiança técnica.

A lei remete-nos para um critério objetivo (funcionamento da empresa). O professor


crê que o legislador procurou encontrar motivos objetivos para a possível oposição do
empregador à reintegração do trabalhador, quando, na verdade, a verdadeira causa prende-se
com motivos pessoais. Pretendeu o legislador limitar que o empregador atuasse de forma
discriminatória e arbitrária.

O nº2 do artigo 392º vem de certa forma explicitar aquilo que está implícito no nº1. Esta
posição à reintegração não se aplica sempre que a ilicitude se formar em motivo político,
religioso, entre outras questões discriminatórias; ou quando o empregador alegar
injustificadamente motivos funcionais para se opor.

Caso o tribunal atenda ao requerido pelo empregador e exclua a possibilidade de


reintegração do trabalhador, nos termos do nº3 deste artigo, o montante da indemnização do
trabalhador será superior à auferida pelo mesmo quando este opta pela não reintegração, pelo

126
que a mesma é aqui calculada com base num período entre 30 e 60 dias por cada ano de
antiguidade, e não 15 a 45.

Nas restantes hipóteses que não se insiram neste artigo, a faculdade de oposição
patronal encontra-se, ab initio, excluída. Naqueles casos, porém, em que seriam mais estreitos
os laços pessoais entre as partes e em entre as quais haveria uma relação de confiança, o
empregador poderá retorquir à opção reintegratória tomada pelo trabalhador, manifestando a
sua oposição à mesma e requerendo ao tribunal que a exclua.

12.8. Despedimento por iniciativa do empregador em caso de contrato a termo


(páginas 385 a 386 do livro do professor Leal Amado)

No artigo 393º CT está previsto um regime especial para o despedimento por iniciativa
do empregador no contrato a termo.

onto a ente e o ontrato a termo “na e ara ad ar”. Cont do nada obsta a
que operem outras formas de caducidade do contrato de trabalho antes do termo do mesmo,
como o despedimento.

As regras gerais da cessação do contrato também se aplicam aqui. Quer isto dizer que
um empregador que despeça ilicitamente um trabalhador contratado a prazo também deverá
ser condenado a proceder à respetiva integração na empresa, bem como a uma indeminização
por danos patrimoniais e não patrimoniais. Não obstante, o nº2 deste artigo introduz algumas
alterações, daí se tratar de um regime especial.

Por força da alínea a) deste artigo decorre que, em caso de despedimento ilícito, o
empregador, no pagamento de indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais, deve
ter como limite mínimo as retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde o
despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato, ou até ao trânsito em julgado da decisão
judicial, consoante o que ocorra primeiro. Ou seja, os salários intercalares correspondentes ao
período que medeia entre estas duas datas representam o montante mínimo a pagar.

Na alínea b) resulta que, sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é


condenado, caso o termo do contrato ocorra depois do trânsito em julgado da decisão judicial,
na reintegração do trabalhador, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. Nada obsta
também a que o trabalhador opte, em substituição da reintegração, pela indemnização da
antiguidade.

Mas e se o termo do contrato ocorrer antes da decisão do tribunal? Neste caso, não
haverá lugar à reintegração do trabalhador despedido.

127
12.9. A presunção do artigo 366º, nº4
(páginas 343 a 345 do livro do professor Leal Amado)

Há uma questão que o professor não falou na altura, mas que crê que, do ponto de ta
do m t o “ba tante e anto a” e a e tão do art o 366º nº4 “presume-se que o
trabalhador aceita o despedimento quando recebe do empregador a totalidade da
compensação prevista neste artigo”.

Certamente, trata-se de uma presunção relativa. Contudo, como é que o trabalhador a


afasta? Parece que terá de devolver a totalidade da compensação ao empregador e, além disso,
arranjar forma de persuadir o tribunal que, ao recebê-la, não aceitou o respetivo despedimento
(prova esta que será muito difícil de fazer, salvo se o trabalhador, ao receber a prestação, logo
declarar expressamente, de forma também não especificada, que não a aceita).

E qual o sentido útil de atribui esta presunção à aceitação do despedimento? No


entender do professor João Leal Amado, seria o de impedir o trabalhador de impugnar o
despedimento porque, se o trabalhador receber a compensação isso significa que, segundo o
CT, ele aceita o despedimento. E, se ele aceita o despedimento, então não poderá, mais tarde,
impugná-lo em tribunal (proibição de venire contra factum proprium).

O que está norma permite é que possa haver um despedimento coletivo não
fundamentado e manifestamente ilícito, mas, na eventualidade de o trabalhador aceitar a
compensação a que tem direito, re me- e e e te a e to o de ed mento. trabalhador
ode nem aber e o de ed mento n l do or e o er de a er ar elo tr b na
ma e a e tar a om en ação o de ed mento er ara todo o e e to “ l do”.

Naturalmente, há muitos motivos para o trabalhador aceitar a compensação sem grandes


questões. Não pode ser o facto de o trabalhador receber uma retribuição a validar uma ilicitude,
isto é, a sobrepor-se a uma decisão judicial de invalidade. No fundo, esta norma permite que a
ilegalidade seja compensada com dinheiro.

AULA DE 13/12/2019

12.10. Cessação do contrato por iniciativa do trabalhador


(páginas 387 a 406 do livro do professor Leal Amado)

NOTA: utiliza-se muito e e re ão “o trabalhador de ed - e” ma tal e t errado.


Em linguagem jurídica, isso significa que o trabalhador resolveu ou denunciou o contrato, como
vamos ver agora.

Há uma diferença de tratamento entre a liberdade conferida ao trabalhador e a conferida


ao empregador. Enquanto o empregador tem uma liberdade condicionada na matéria de
cessação do contrato, o trabalhador goza de uma liberdade absoluta. No entanto, esta liberdade

128
absoluta não significa que a decisão de pôr fim ao contrato não possa causar danos à esfera do
trabalhador, os quais a lei deve dar cobertura.

A lei divide a liberdade de extinção de contrato pelo trabalhador emdois grandes grupos
de situações (artigos 394º e seguintes e 400º e seguintes):

 Situações que reconhece ao trabalhador justa causa para resolver o contrato:


situações de resolução de contrato (artigo 394º e seguintes);

 Situações em que não reconhece ao trabalhador essa justa causa, mas reconhece,
não obstante, uma liberdade para resolver o contrato: situações de denúncia do
contrato (artigo 400º e seguintes).

De qualquer das formas, essa liberdade, presente nos dois grupos de situações, radica
na liberdade fundamental de não trabalhar.

12.10.1. Resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador

e ndo o nº1 do art o 394º CT “ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer
cessar imediatamente o contrato”.

A justa causa traduz-se, portanto, não meramente numa condição da licitude da rutura
do vínculo contratual, mas sim numa condição de rutura imediata do mesmo. A ocorrência de
justa causa exonera o trabalhador do dever de respeitar o prazo do aviso prévio previsto no
artigo 400º CT, podendo ainda conceder-lhe uma indeminização pelos danos sofridos, nos
termos do artigo 396º CT.

A noção de justa causa neste âmbito não será propriamente a mesma que a que
analisamos em relação aos despedimentos por vontade do empregador. Se a justa causa de
despedimento (artigo 351º CT) se circunscreve ao domínio disciplinar, a justa causa de
demissão abrange um espectro de situações bastante mais diversificado, incluído até razões de
todo alheias ao empregador. Elenca novamente a lei, nos números 2 e 3 do artigo 394º, um
conjunto situações exemplificativas que considera justa causa de resolução do contrato. Neste
âmbito, a lei distingue dois casos:

 Situações de justa causa subjetiva de demissão (nº2): referem-se a


comportamentos ilícitos e culposos do empregador, suscetíveis de serem apreciados
negativamente;

 Situações de justa causa objetiva de demissão (nº3): poderão consistir na prática


de um ato ilícito não culposo pelo empregador, ou até mesmo em circunstâncias
alheias ao empregador e relacionas com o proprio trabalhador.

129
Neste nº3 do artigo 294º há um grupo de justas causas em que, verdadeiramente,
não há uma ação culposa ou ilícita do empregador. Quer isto dizer que também
poderá haver justa causa em casos em que o empregador aja de acordo com a lei,
pelo que os poderes que a lei lhe confere podem ser lesivos do conjunto de interesses
do trabalhador e ao tecido contratual. Estas situações também são imputáveis ao
empregador, simplesmente não são censuráveis.

A falta de pagamento pontual da retribuição poderá perfilar-se, quer como justa causa
subjetiva (nº2, alínea a)), quer como justa causa objetiva de demissão (nº3, alínea c)), consoante
exista ou não culpa do empregador no incumprimento.

A culpa do empregador presume-se ao abrigo do artigo 799º, nº1 CC, nos termos do
al “incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou cumprimento defeituoso da
obrigação não procede de culpa sua”.

Segundo o nº4 do artigo 394º CT, a justa causa de resolução do contrato por iniciativa
do trabalhador é apreciada nos termos do nº3 do artigo 351º CT (noção de justa causa de
despedimento), devendo atender-se, para efeitos de determinar a existência de causa, ao grau
de lesão dos interesses do trabalhador, ao carácter da relação das partes, etc.

Todos estes fundamentos que são justa causa da cessação contrato têm de ser alvo de
um procedimento para a resolução do contrato, tanto por uma questão de segurança jurídica,
como em vias de acautelar eventuais precipitações do trabalhador. Este procedimento está
previsto no artigo 395º CT.

Diz o nº1 do artigo 395º que, verificando-se justa causa de resolução do contrato de
trabalho “o trabalhador deve comunicar, por escrito, a sua intenção ao empregador, com a
indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos
factos”. ta d o ção ont m r o a eto a anal ar.

Em primeiro lugar, a resolução só é válida se for manifestada por escrito (é condição


de validade). Além disso, basta uma indicação sucinta dos factos, não sendo necessário
proceder aqui a uma descrição circunstanciada dos mesmos.

Quanto ao prazo da comunicação da resolução: o trabalhador deve comunicar ao


empregador a sua intenção nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos, sob pena de
caducidade. Desta previsão surgem várias dificuldades.

Por exemplo: vamos supor que se verifica hoje uma justa causa de resolução do contrato
e, consequentemente, o trabalhador deixa de comparecer ao trabalho. Se este só enviar o
documento daqui a 30 dias, só aí é que a resolução é válida. Terá declaração tem efeitos
retroativos? Ou acumula o trabalhador faltas? O professor crê que os efeitos da resolução do
contrato devem retroagir ao dia do conhecimento dos factos. Todavia, não comparecendo o

130
trabalhador ao trabalho desde o dia em que se verifica a justa causa, se não apresentar essa
declaração nos 30 dias subsequentes ao ocorrido, o trabalhador incorrerá em faltas
injustificadas, pelo que poderá ser despedido com justa causa.

Outra dificuldade está relacionada com a determinação do momento exato a partir do


qual tal prazo começará a correr. Por exemplo, nos casos de violações contratuais continuadas,
quando é que começam a contar os 30 dias? Neste tipo de casos, segundo o professor João Leal
Amado, enquanto se mantiver o incumprimento patronal, não poderá correr o prazo de
caducidade.

Quando a justa causa contratual não tiver fundamento num qualquer comportamento do
empregador, mas sim numa circunstância atinente à esfera do próprio trabalhador, a lei
determina, no nº3 do artigo 395º, que este deverá notificar o empregador logo que possível.

O desrespeito por qualquer uma das exigências procedimentais previstas no artigo 395º
determinará a ilicitude/irregularidade (que não a invalidade/ineficácia) da rutura contratual
promovida pelo trabalhador. Porém, o trabalhador poderá ainda suprir essas lacunas ao abrigo
do disposto no nº4 do artigo 398º CT.

Quais as consequências/efeitos de uma resolução válida do contrato?

Muito embora o trabalhador possa, por vontade unilateral, pôr fim ao contrato, isso
pode causar-lhe danos que poderão dar origem a uma indeminização (artigo 396º CT)

Da verificação dos factos previstos no nº2 do artigo 394º (justa causa subjetiva), isto é,
da verificação de comportamentos ilícitos e culposos do empregador, surge o direito a uma
indemnização. Esta indeminização já não existe nos casos previstos no nº3, salvo no que
respeita à transmissão do estabelecimento (nº3, alínea d)), aí a lei confere uma compensação,
nos termos do nº5 do artigo 396º.

Aqui a lei também consagra uma moldura indemnizatória, devendo o tribunal, na


fixação da indemnização, atender ao valor da retribuição do trabalhador e ao grau da ilicitude
do comportamento do empregador. O quantum indemnizatório é balizado pela lei, visto que o
montante deverá ser fixado entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano
completo de antiguidade. O valor da indeminização poderá, porém, ser superior ao que
resultaria destes critérios, sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais
de montante mais elevado (nº3 do artigo 396º CT). Quanto à indeminização no caso de contrato
a termo, a lei estabelece um limite mínimo, pelo que a indeminização não poderá ser inferior
ao valor das retribuições vincendas (nº4).

Não obstante a exigência de forma escrita, a lei admite a revogação da resolução pelo
trabalhador (artigo 397º CT). A razão de ser desta possibilidade é a prevenção de eventuais
fraudes por parte do empregador (como o mecanismo da folha em branco assinada, que vermos
mais à frente).

131
É claro que, se há uma obrigação de indemnizar por parte do empregador, compreende-
se que este tenha um direito de defesa e é isso que se consubstancia nos artigos 398º e 399º CT.
O meio de defesa do empregador, nestes casos, é a ação judicial/ impugnação da resolução
do contrato pelo trabalhador. O empregador tem um ano para intentar esta ação. Não se
provando justa causa de resolução invocada pelo trabalhador, o empregador terá direito a ser
indemnizado (por danos ao direito à honra, por exemplo). Caberá nesta ação ao trabalhador
fazer prova dos factos constitutivos da justa causa de resolução do contrato, em conformidade
com o disposto no artigo 342º CC.

12.10.2. Denúncia do contrato pelo trabalhador

De acordo com o nº1 do art o 400º CT “o trabalhador pode denunciar o contrato


independentemente de justa causa, mediante comunicação ao empregador, por escrito, com a
antecedência mínima de 30 ou 60 dias, conforme tenha, respetivamente, até dois anos ou mais
de dois anos de antiguidade”.

Consagra esta norma o princípio da livre demissão: num ordenamento jurídico em que
a liberdade de trabalho e profissão é constitucionalmente reconhecida, o direito de o
trabalhador se demitir constitui a antítese da escravatura, garantindo a sua dignidade como
pessoa e a sua liberdade profissional. Naturalmente, este princípio vigora quer em relação aos
contratos de trabalho de duração indeterminada, quer em relação aos contratos a termo.

A denúncia tem de ser feita por escrito, mas não tem de ser fundamentada, pode ser
exercida arbitrariamente. Trata-se de uma liberdade negativa. Contudo, apesar de poder ser
exercida arbitrariamente, a lei confere alguma tutela aos interesses do empregador. Nesse
sentido, a lei obriga o trabalhador a anunciar a denúncia do contrato com uma certa
antecedência, isto é, procura garantir algum tempo de sobrevivência ao contrato de trabalho
para acautelar a necessidade e os legítimos interesses da entidade empregadora, evitando que
esta seja surpreendida e prejudicada por uma rutura contratual súbita. Para tal efeito, a lei obriga
o trabalhador a emitir um pré-aviso. Ao apresentar um pré-aviso, o trabalhador que pretenda
abandonar determinada empresa permite ao empregador que reorganize a equipa ou o posto de
trabalho onde esse exercia a sua atividade até então. Dessa forma, o empregador não sofrerá
danos de maior com a denúncia.

O pré-aviso funciona, portanto, como um termo suspensivo aposto à denúncia do


contrato, pelo que, enquanto decorrer o respetivo prazo, a relação laboral mantém-se em vigor,
continuando o trabalhador obrigado a prestar o trabalho e o empregador vinculado a pagar a
retribuição correspondente, salvo estipulação das partes em contrário (o empregador pode
dispensar a presença do trabalhador e continuar a pagar-lhe; ou podem acordar no sentido em
não submeter a denúncia a este termo suspensivo, caso em que o contrato terá um fim imediato).

132
A duração do pré-aviso oscilará consoante determinados fatores, previstos nos números
do artigo 400º CT.

Tratando-se a denúncia de uma liberdade negativa, o trabalhador pode exercer a mesma


sem qualquer aviso-prévio, deixando o posto de trabalho de imediato (artigo 401º). Nestes
casos, está o trabalhador obrigado a indemnizar o empregador, apesar de a denúncia ser na
mesma válida e eficaz (é apenas irregular).

A obrigação mencionada, que decorre da primeira parte do artigo 401º, não obsta que o
trabalhador responda ainda civilmente pelos danos causados em virtude da inobservância do
prazo de aviso prévio, isto é, pelos danos que não se teriam verificado se o trabalhador tivesse
emitido o aviso prévio legalmente previsto (artigo 401º, in fine). Por exemplo: se o trabalhador
estava a trabalhar num contrato que envolvia muito dinheiro e, com a sua saída, o deixa a meio,
a empresa tem um prejuízo (lucro cessante). Com efeito, a nossa lei abre hipótese que possa
haver essa obrigação de indeminização por esses danos, que pode ir muito além da questão
salarial.

Referência ao pacto de permanência: artigo 137º CT.

Também aqui a lei admite a revogação da denúncia pelo trabalhador (revogação


unilateral da sua declaração demissória). Visa-se garantir que o trabalhador pondere
devidamente sobre as consequências da sua declaração, possibilitando-lhe o exercício do
“direito ao arrependimento” a o on l a at ao t mo d a e nte data em ue a
denúncia chegar ao poder do empregador, que aquela foi uma declaração precipitada e não
ajustada aos seus reais interesses, mediante comunicação escrita a esse (artigo 402º, nº1 CT).

Por outro lado, visa- e dar re o ta ao enómeno do “despedimento dissimulado” era


frequente que o empregador, aquando da celebração do contrato, condicionasse a admissão do
trabalhador à assinatura, por este, de uma declaração demissória sem data, assim ficando o
empregador com possibilidade de, mais tarde (quando quisesse), determinar livremente o
momento da cessação do contrato, datando o documento em branco em conformidade.

Estes motivos também valem para a revogação da resolução. Porém, se a resolução faz
cessar imediatamente o contrato (artigo 394º, nº1), já a denúncia encontra-se sujeita a um aviso
prévio, o qual funciona como um termo suspensivo. Com efeito, isto será de certa forma
contraditório com os esforços para combater o fenómeno do despedimento dissimulado. Por
exemplo: o empregador produz no dia 20 de outubro uma declaração escrita, assinada pelo
trabalhador, e supostamente emitida a 30 de setembro, nos termos da qual o contrato cessará a
31 de outubro, por vontade do trabalhador. A 31 de outubro, o trabalhador já não poderia
revogar tal declaração, pois o prazo de 7 dias sobre a data em que a declaração havia chegado
ao poder do empregador já teria expirado. Ou seja, o empregador continua a ficar com o
caminho livre para extorquir ao trabalhador uma declaração demissória sem data.

133
Tanto no caso da denúncia, como no caso da resolução, a faculdade de revogação
unilateral da declaração extintiva do trabalhador não existirá, em princípio, na hipótese de a
assinatura do trabalhador ser objeto de reconhecimento notarial presencial (artigo 397º e 402º,
nº1 CT). Nos seus artigos 400º, nº5 e 395º, nº4, o CT vem, todavia, atribuir ao empregador o
poder de exigir que a assinatura do trabalhador, constante do documento que formaliza a
declaração demissória, seja objeto desse reconhecimento notarial presencial. Daqui decorrem
dois efeitos: em primeiro lugar, a declaração torna-se irreversível; por outro lado, um tal
reconhecimento notarial também protege o trabalhador do despedimento dissimulado. Casos
há, contudo, nos quais, mesmo que a assinatura do trabalhador seja realizada na presença do
notário, nem por isso a faculdade de revogação desaparecerá. São as situações do nº4 do artigo
395º. Nestas situações, a eventual exigência patronal de reconhecimento notarial da assinatura
do trabalhador não terá efeito.

12.10.2.1. Abandono do trabalho (artigo 403º)

O abandono surge como uma hipótese de rutura irregular do contrato por iniciativa do
trabalhador. Consiste numa rescisão contratual tácita pelo trabalhador, o qual promove a
dissolução do vínculo contratual sem invocar qualquer justa causa para o efeito e sem respeitar
o competente aviso prévio.

Está figura, tal como prevista no artigo 403º CT, comporta dois elementos constitutivos:
a ausência do trabalhador ao serviço; a existência de factos reveladores da intenção de não o
retomar.

Ou seja, nem toda a ausência do trabalhador (elemento objetivo), mesmo se


injustificada, equivale a um abandono do trabalho. É necessário haver um animus extintivo,
um elemento subjetivo por parte do trabalhador que indique a sua vontade de abandono. Este
elemento extrair-se-á de factos concludentes (aqueles que, com toda a probabilidade, revelem
a vontade de o trabalhador dissolver o contrato de trabalho). Por exemplo: se o trabalhador
deixar de comparecer ao serviço, tendo, entretanto, celebrado e começado a executar contrato
de trabalho com outra entidade empregadora; ou se o trabalhador se ausentar para o estrangeiro,
após obter a licencia de residência e trabalho necessária nesse país. Em suma, não se trata de
uma simples situação em que o trabalhador deixa de comparecer, mas simde uma situação em
que este deixa de comparecer e há factos que, de acordo com critérios de razoabilidade, levam
a uma forte probabilidade de que este não volte ao serviço.

O abandono não é uma figura autónoma, é uma modalidade da denúncia, o que significa
que o abandono do trabalho é imputável ao trabalhador.

O legislador estabelece no nº ma re nção de abandono “presume-se o abandono


do trabalho em caso de ausência de trabalhador do serviço durante, pelo menos, 10 dias úteis
seguidos, sem que o empregador seja informado do motivo da ausência”.

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Esse motivo de que a lei fala não tem de ser fundamentado, basta que exista uma
comunicação, fundamentada ou não, para que o empregador não possa recorrer a esta figura.

Esta presunção significa que o empregador não tem de intentar nenhum procedimento
disciplinar, pelo que, ao fim de 10 dias, poderá cessar o contrato de trabalho e invocar o
abandono. O abandono vale como denúncia do contrato por iniciativa do trabalhador (como já
se disse), mas só o empregador poderá invocar tal abandono após comunicação ao trabalhador
dos factos constitutivos do abandono ou da presunção do mesmo, por carta registada com aviso
de receção para a última morada conhecida deste (nº2 do 403º). Esta comunicação não se traduz
numa declaração de vontade extintiva proferida pelo empregador, mas numa condição de
eficácia de extinção do vínculo imputável ao trabalhador.

Em caso de abandono, compreende-se que deva o trabalhador indemnizar o empregador


pelos prejuízos causados (artigo 403º, nº5), porque este teve, pelo menos, 30 dias para avisar o
empregador da sua decisão (se houve justa causa para a resolução), ou poderia apresentar o seu
pré-aviso quando lhe conviesse (denúncia).

A presunção de abandono do nº2 pode ser afastada nos termos do nº4 do 403º, isto é,
mediante alegação e prova de que, no caso concreto, agiu com a diligência própria de uma
pessoa normal, medianamente prudente, e que só por razões que lhe não foram imputáveis se
viu impedido de cumprir o seu dever de comunicar a ausência, como a ocorrência de um
motivo de força maior. Não se trata aqui propriamente de tentar justificar a ausência ao
serviço (invocando, por exemplo, um motivo de doença), mas sim de provar que a
comunicação da ausência só não foi expedida, ou só não foi conhecida do empregador,
porque um qualquer acontecimento natural e/ou uma qualquer ação alheia o impedira (por
exemplo, se o trabalhador for raptado).

Se o trabalhador regressar ao serviço, ou comunicar a ausência antes do envio da


comunicação pelo empregador, então o contrato deixará de poder cessar por via do abandono
do trabalho. Todavia, nada impede o empregador de reagir disciplinadamente contra as faltas
injustificadas dadas pelo trabalhador e, eventualmente, promover o despedimento com justa
causa (artigo 351º, nº2, alínea g) CT).

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