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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DESENHO INDUSTRIAL


CURSO DE TECNOLOGIA EM DESIGN GRÁFICO
CURSO DE BACHARELADO EM DESIGN

YAGO RODRIGUES BALLARINI


STEPHANIE DA SILVA FARIA

DESENVOLVIMENTO DE PRÉ-PRODUÇÃO E PITCH


BIBLE PARA UMA SÉRIE ANIMADA

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

CURITIBA
2017
YAGO RODRIGUES BALLARINI
STEPHANIE DA SILVA FARIA

DESENVOLVIMENTO DE PRÉ-PRODUÇÃO E PITCH


BIBLE PARA UMA SÉRIE ANIMADA

Trabalho de Conclusão de Curso de


Graduação, apresentado como requisito
parcial para a obtenção do título de
Tecnólogo em Design Gráfico e Bacharel
em Design, do Departamento Acadêmico
de Desenho Industrial, da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná.
Orientador: Prof. Esp. Marcos Varassin
Arantes

CURITIBA
2017
Ministério da Educação

PR
UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ
Universidade Tecnológica Federal do Paraná
Câmpus Curitiba
Diretoria de Graduação e Educação Profissional
Departamento Acadêmico de Desenho Industrial

TERMO DE APROVAÇÃO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO 051

DESENVOLVIMENTO DE PRÉ-PRODUÇAO E PITCH BIBLE PARA UMA SÉRIE


ANIMADA

por

Yago Rodrigues Ballarini – 1612689


Stephanie da Silva Faria – 1362305

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no dia 30 de novembro de 2017 como


requisito parcial para a obtenção do título de TECNÓLOGO EM DESIGN GRÁFICO E
BACHAREL EM DESIGN, do Curso Superior de Tecnologia em Design Gráfico e do
Curso Superior de Bacharelado em Design, do Departamento Acadêmico de Desenho
Industrial, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Os alunos foram arguidos
pela Banca Examinadora composta pelos professores abaixo, que após deliberação,
consideraram o trabalho aprovado.

Banca Examinadora: Prof. Rodrigo André da Costa Graça (MSc.)


Avaliador
DADIN – UTFPR

Prof. Luciano Henrique Ferreira da Silva (Dr.)


Convidado
DADIN – UTFPR

Prof. Marcos Varassin Arantes (Esp.)


Orientador
DADIN – UTFPR

Prof. André Lucca (Dr.) e Profa. Adriana Ferreira (Esp.)


Responsáveis pelo TCC
DADIN – UTFPR

“A Folha de Aprovação assinada encontra-se na Coordenação do Curso”.


RESUMO

BALLARINI, Yago Rodrigues; FARIA, Stephanie da Silva. Desenvolvimento de pré-


produção e pitch bible para uma série animada. 2017. 75 f. Trabalho de
Conclusão de Curso (Curso de Tecnologia em Design Gráfico e Curso de Bacharelado
em Design), Departamento Acadêmico de Desenho Industrial, Universidade Tecnoló-
gica Federal do Paraná. Curitiba, 2017.

Este documento descreve o processo de desenvolvimento da pré-produção para


uma série animada 2D direcionada a um público-alvo jovem adulto e a criação de
um instrumento de apresentação desta para investidores chamado pitch-bible.
Inicialmente, são apresentados conceitos importantes para o desenvolvimento de
uma bíblia de produção e sua apresentação. A partir desses conceitos e baseando-
se na estrutura apresentada por Sérgio Nesteryuk no capítulo 3 do livro Dramaturgia
Para uma Série Animada (2011), o projeto se desenvolveu. Aqui encontra-se o
manual descritivo e resultados alcançados pelos autores.

Palavras chave: Design. Animação. Série animada. Pré-produção. Pitch Bible.


ABSTRACT

BALLARINI, Yago Rodrigues; FARIA, Stephanie da Silva. Desenvolvimento de pré-


produção e pitch bible para uma série animada. 2017. 75 f. Trabalho de
Conclusão de Curso (Curso de Tecnologia em Design Gráfico e Curso de Bacharelado
em Design), Departamento Acadêmico de Desenho Industrial, Universidade Tecnoló-
gica Federal do Paraná. Curitiba, 2017.

This document describes the development process of an young-adult animated


series' pre-production and the creation of this animated series presentation aimed at
investors, called pitch-bible. Initially are featured important concepts for the
development of said bible and its presentation. This project was developed through
this concepts and following the structure written by Sérgio Nesteryuk on the third
chapter of his book "Dramaturgia Para uma Série Animada (2011"). Here lays the
descriptive manual and the results reached by its authors.

Keywords: Design. Animação. Animated Series. Pre-production. Pitch Bible.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 – IMAGEM DE DIVULGAÇÃO DE OSWALDO..................................................................... 9
FIGURA 2 –HISTORIETAS ASSOMBRADAS PARA CRIANÇAS MALCRIADAS ............................... 10
FIGURA 3 – IMAGEM DE DIVULGAÇÃO IRMÃO DO JOREL ............................................................ 11
FIGURA 4 - IMAGEM DE DIVULGAÇÃO OVER THE GARDEN WALL ............................................ 18
FIGURA 5 – IMAGEM DE DIVULGAÇÃO SAMURAI JACK ................................................................ 18
FIGURA 6 – IMAGEM DE DIVULGAÇÃO KAIBA ................................................................................ 19
FIGURA 7 – IMAGEM DE DIVULGAÇÃO PING PONG THE ANIMATION .......................................... 19
FIGURA 8 - MODEL SHEET DE PERSONAGEM DE PING-PONG THE ANIMATION ...................... 23
FIGURA 9 – MODEL SHEET DE PERSONAGEM DE SAMURAI JACK ............................................. 24
FIGURA 10 – ADVENTURE TIME PITCH BIBLE 1 ............................................................................. 29
FIGURA 11 – ADVENTURE TIME PITCH BIBLE 2 ............................................................................. 30
FIGURA 12 – ADVENTURE TIME PITCH BIBLE 3 ............................................................................ 30
FIGURA 13 – ADVENTURE TIME PITCH BIBLE 4 ............................................................................. 31
FIGURA 14 – FLIPERAMA EM KAWASAKI......................................................................................... 39
FIGURA 15 – FOTO DE FERRO VELHO ......................................................................................... 40
FIGURA 16 – ARTE CONCEITUAL DE FERRO VELHO. .................................................................... 40
FIGURA 17 – ESBOÇO DE COMPOSIÇÃO GERAL. .......................................................................... 41
FIGURA 18 – ELEMENTOS DEFINIDOS POR BLOCOS. ................................................................. 41
FIGURA 19 – BLOCOS DETALHADOS. FONTE: ARQUIVO PESSOAL DOS AUTORES................ 42
FIGURA 20 – BLOCOS DETALHADOS COM LINHAS REFINADAS. . ............................................. 42
FIGURA 21 – COMPOSIÇÃO COM AS PERSONAGENS................................................................. 43
FIGURA 22 – MODIFICAÇÃO DA PAISAGEM E APLICAÇÃO DE COR. .......................................... 44
FIGURA 23 – FINALIZAÇÃO COM APLICAÇÃO DE FOCOS DE LUZ E SOMBRAS ADICIONAIS.. 44
FIGURA 24 – CENÁRIO 1 FINALIZADO. ........................................................................................... 45
FIGURA 25 – PRIMEIROS RASCUNHOS DA PERSONAGEM PRINCIPAL ...................................... 48
FIGURA 26 – RASCUNHO 1 . ............................................................................................................. 49
FIGURA 27 – ESBOÇOS DE SILHUETAS .......................................................................................... 49
FIGURA 28 – ESBOÇOS DE SILHUETAS 2. ...................................................................................... 50
FIGURA 29 – ESBOÇOS DE SILHUETAS 3 ....................................................................................... 50
FIGURA 30 - ESBOÇOS DE SILHUETAS 4. ...................................................................................... 51
FIGURA 31 – ESBOÇOS DE SILHUETAS 5. ..................................................................................... 51
FIGURA 32 – ESBOÇOS DE SILHUETAS 6. ..................................................................................... 52
FIGURA 33 – RASCUNHO 2 .............................................................................................................. 52
FIGURA 34 – ESBOÇOS DE FACE ..................................................................................................... 53
FIGURA 35 – ESBOÇOS DE FACE 2. ................................................................................................. 53
FIGURA 36 – ESBOÇOS DE FACE 3. ................................................................................................. 54
FIGURA 37 – ESBOÇOS DE FACE 4. ................................................................................................. 54
FIGURA 38 – ESBOÇOS DE FIGURINO. ............................................................................................ 55
FIGURA 39 – ESBOÇOS DE FIGURINO 2. ......................................................................................... 55
FIGURA 40 – RASCUNHO 4 .............................................................................................................. 56
FIGURA 41 – ESBOÇOS DE FIGURINO. ............................................................................................ 56
FIGURA 42 – FINALIZAÇÃO, PASSO 1. ............................................................................................. 57
FIGURA 43 – FINALIZAÇÃO, PASSO 2. ............................................................................................. 57
FIGURA 44 – FINALIZAÇÃO, PASSO 3. ............................................................................................. 58
FIGURA 45 – FINALIZAÇÃO, PASSO 4. ............................................................................................. 58
FIGURA 46 – FINALIZAÇÃO, PASSO 5. ............................................................................................. 59
FIGURA 47 – MODEL SHEET DA PERSONAGEM PRINCIPAL.. ....................................................... 59
FIGURA 48 – MODEL SHEET DUM. ................................................................................................... 60
FIGURA 49 – MODEL SHEET OLI. ..................................................................................................... 60
FIGURA 50 – MODEL SHEET PILOTO. .............................................................................................. 61
FIGURA 51 – MODEL SHEET ICE ...................................................................................................... 61
FIGURA 52 – MODEL SHEET RUFS. ................................................................................................. 62
FIGURA 53 – RELAÇÃO DE TAMANHO ENTRE AS PERSONAGENS. ............................................ 62
FIGURA 54 – RELAÇÃO DE TAMANHO ENTRE AS PERSONAGENS 2. ......................................... 63
FIGURA 55 - SINOPSE COMERCIAL..................................................................................................65
FIGURA 56 - EXPLICAÇÃO DA METÁFORA......................................................................................65
FIGURA 57 - K......................................................................................................................................66
FIGURA 58 - ICE..................................................................................................................................66
FIGURA 59 - OLI..................................................................................................................................66
FIGURA 60 - DUM............................................................................................................................... 67
FIGURA 61 - RUF.................................................................................................................................67
FIGURA 62 - PILOT..............................................................................................................................67
FIGURA 63 - ARCO GERAL 1.............................................................................................................71
FIGURA 64 - ARCO GERAL 2.............................................................................................................71
FIGURA 65 - FLESH PINBALL EP......................................................................................................72
FIGURA 66 - GRAND THEFT GLIDER...............................................................................................72
FIGURA 67 - PINBALL TO THE DEATH.............................................................................................72
FIGURA 68 - EMPLOYEE OF THE MONTH.......................................................................................73
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 7
1.1 Objetivo Geral .......................................................................................... 7
1.2 Objetivos Específicos ............................................................................... 7
1.3 Justificativa............................................................................................... 8
1.4 Procedimentos Metodológicos ................................................................ 11
2 METODOLOGIA DO DESIGN APLICADA À CRIAÇÃO DE ANIMAÇÃO........ 12
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ........................................................................ 14
3.1 Criação de Mundo Fictício ...................................................................... 14
3.2 Desenvolvimento Visual e Design de Produção ..................................... 17
3.3 Criação de Personagens ........................................................................ 20
3.4 Roteiro para Série Animada ................................................................... 25
3.5 O Pitch Bible de Animação ..................................................................... 28

4 DESENVOLVIMENTO DA PRODUÇÃO DA SÉRIE DE ANIMAÇÃO ............. 32


4.1 Conceito Geral da Série ......................................................................... 32
4.2 Apresentação (Overview) ....................................................................... 33
4.3 Criação, Desenvolvimento e Apresentação do Universo ........................ 36
4.4 Criação, Desenvolvimento e Apresentação de CenárioS ....................... 38
4.4.1.1 Processo de Criação dos Cenários ........................................................ 38
4.4.1.2 Resultados Finais................................................................................... 45
4.5 Criação e Desenvolvimento das Personagens ....................................... 46
4.5.1.1 Processo de Criação das personagens .................................................. 46
4.5.1.2 Resultados Finais................................................................................... 60
4.6 Sinopse .................................................................................................. 63
4.6.1 Sinopse Técnica ..................................................................................... 64
4.6.2 Sinopse Comercial ................................................................................. 66
4.7 Roteiro do episódio piloto ....................................................................... 67

5 DESENVOLVIMENTO DO PITCH BIBLE......................................................... 68


6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 75

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 77
GLOSSÁRIO ........................................................................................................... 80
7

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo descrever a proposta definida para o


desenvolvimento do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), dos cursos de
Bacharelado em Design e Tecnologia em Design Gráfico da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). A intenção deste trabalho é exemplificar
os diferentes papéis que um formando de design poderia ocupar em uma série
animada sem a necessidade da formação complementar de animador. Propõe-se o
desenvolvimento da pré-produção de uma série animada original e também o pitch
bible, ferramenta utilizada para apresentar ideias à possíveis investidores de forma
clara, sucinta e interessante, seguindo padrões exigidos por feiras e concursos onde
esse tipo de produção busca investimento de terceiros. A pré-produção de uma série
animada possibilita a designers o exercício de sua criatividade e a aplicação de
conceitos apreendidos durante sua formação acadêmica por ser uma narrativa visual
com amplas possibilidades e gêneros. Isso envolve a criação de parâmetros visuais,
elaboração de estrutura da história e roteiro.

1.1 OBJETIVO GERAL

Desenvolver a pré-produção e pitch bible de uma série animada original.

1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Criar, desenvolver e apresentar o argumento para a animação


• Criar e desenvolver personagens (Character Design)
• Criar, desenvolver e apresentar cenários, objetos de cena e mise-en-
scene
• Elaborar roteiro do episódio piloto
8

• Criar e desenvolver o pitch bible impresso e digital (seguindo os


parâmetros estabelecidos através de pesquisa)
• Pesquisar possíveis formas de financiamento para o projeto

1.3 JUSTIFICATIVA

Animação foi o campo escolhido pois permite colocar em prática diferentes


habilidades que terão uso para um designer formado e à procura de se firmar no
mercado de trabalho. Da concepção da mitologia ao desenvolvimento do roteiro, a
gama de estudos e práticas em design é executada de forma completa. Utiliza-se
conhecimentos de teoria da cor, composição, semiótica, ilustração, perspectiva,
representação técnica, manejo de softwares de edição e etc. em uma mistura de
práticas que, além de tudo, devem produzir resultados harmoniosos entre si.
Animação é também uma área de grande relevância para designers com interesse
na indústria de entretenimento, produções de qualidade tem o poder de enriquecer
o portfólio dos profissionais envolvidos e ser um bom diferencial na busca de novas
oportunidades profissionais.
Os cursos de Bacharelado em Design e Tecnologia em Design Gráfico da
UTFPR possuem em seu currículo uma disciplina dedicada à animação, com
duração de um semestre, o que permite aos alunos experimentar algumas técnicas
da narrativa. O processo de animação em sua totalidade é abordado em cursos
superiores dedicados à esse tipo de narrativa, por isso foi decidido pela equipe
desse projeto focar no que os conhecimentos de um designer recém formado e sem
cursos adicionais na área consegue realizar de forma plena e profissional, a pré-
produção de uma série animada, englobando a criação de mundo, argumento,
roteiro, design de personagens, objetos, e cenários, além de definir o uso dos
mesmos dentro da eventual série animada. É nesta parte que o projeto encontra sua
identidade e todas as características necessárias para que a série seja então
animada.
Segundo Mumford (1986), a capacidade de representação simbólica é o que
nos tornou, caracteristicamente humanos. Com a ajuda dos símbolos da arte
podemos manifestar impulsos e valores significantes que, de outra maneira, não
9

teriam como ser comunicados (a emoção, o carinho, o desejo, a simpatia, o amor…)


e nos diferenciam dos outros animais. Desta forma, os autores do projeto acreditam
que a criação desta série de animação e seu pitch bible não irá contribuir
somente com as habilidades profissionais dos envolvidos mas também com as
habilidades sociais e humanas por estimular-los a entender interações físicas e
psicológicas a fim de poderem reproduzi-las e expressá-las através da arte.

Figura 1 – Imagem de divulgação de Oswaldo


Fonte: Birdo Studio em parceria com o Cartoon Network Brasil e a
TV Cultura

Em Outubro de 2017 foi lançado o desenho Oswaldo (Figura 1) no canal


fechado Cartoon Network Brasil, produção em parceria a Birdo Studio e a TV
Cultura. Em entrevista ao portal Garotas Geeks o criador da série Pedro Eboli
compartilha sobre sua jornada de uma década dentro de produções animadas e
afirma que hoje em dia produzir uma série animada no Brasil está muito mais facil.

A ideia do Oswaldo começou 6 anos atrás. A gente apresentou Oswaldo


para o mundo há 5 anos em feiras e levamos para os canais. Então, a
produção independente começou realmente há 5 anos, e a gente começou
a desenvolver com o Cartoon e com a TV Cultura há alguns anos também.
A série mudou bastante nesse caminho. Foram 5 anos, mas não foram 5
anos que a gente se arrepende, porque nesse tempo a série amadureceu,
se transformou em algo maior do que a gente. E, sobre os desafios de se
fazer uma série de animação no Brasil, são os desafios de se fazer muita
coisa no Brasil. A indústria é pequena. É uma indústria que tá começando
ainda. Mas estou nesse meio há 10 anos, e há 10 anos a indústria era
completamente diferente, ela praticamente não existia. Hoje em dia, você
tem um monte de desenho. Você tem o Irmão do Jorel , o Historietas, a
Birdo mesmo está trabalhando em três séries. É muito legal ver como a
indústria se transformou nesse tempo. Então, se você quer fazer uma série
animada no Brasil já não é quase impossível. Ainda é muito difícil, mas não
é impossível. (EBOLI, 2017)
10

As séries citadas por Eboli, ”Historietas Assombradas (para Crianças


Malcriadas)” (Figura 02) de Victor-Hugo Borges e “O Irmão de Jorel” (Figura 03) de
Juliano Enrico foram compradas pelo Cartoon Network e tiveram grande aceitação
do público. Em Maio de 2017 o portal Tela Viva divulgou que,

Com a estreia dos novos episódios da temporada de 2017, a série de TV


animada "Irmão do Jorel", exibida pelo Cartoon Network e coproduzida pelo
canal e o Copa Studio, foi o programa mais assistido por crianças de 4 a 11
anos na TV paga em fevereiro. Historicamente, a série fica entre cinco
primeiros programas dentro da faixa etária, com picos de liderança. O
sucesso consolida o Copa Studio como um dos maiores estúdios de
animação da América Latina. Entre os conteúdos originais se destacam
ainda "Tromba Trem" e "Historietas Assombradas (para Crianças
Malcriadas). (TELA VIVA, 2017)

Ter produções brasileiras em grandes canais de entretenimento, antes


dominados quase que em sua totalidade por produtos e conteúdos feitos nos antigos
pólos culturais mundiais, gera uma identificação e empatia com o público,
incentivando e chamando atenção do mesmo para sua própria capacidade e
possibilidade de sucesso no país e no exterior.
A série “O irmão do Jorel” exemplifica perfeitamente o objetivo dos autores,
Segundo D’Angelo (2016) a produção foi escolhida para ser financiada através de
um concurso de argumento e pitch bible realizado pela Time Warner, detentora do
Cartoon Network.

Figura 2 – Imagem de divulgação Historietas Assombradas para Crianças Malcriadas


Fonte: Glaz Entretenimento e Copa Studio, 2016
11

Figura 3 – Imagem de divulgação Irmão do Jorel


Fonte: Copa Studio e Cartoon Network Brasil, 2016

1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para atingir o objetivo proposto, foi realizada uma pesquisa sobre os


processos e fundamentos que o projeto de criação de uma série de animação
envolvem, a partir dos resultados obtidos os autores analisaram quais processos
poderiam ser aplicados ou adaptados para suas necessidades específicas como
tempo, orçamento e ferramentas disponíveis.
Os dados obtidos através da pesquisa serviram como base para que o
processo de criação de mundo e mitologia da animação fosse entendido. No
primeiro momento desenvolveu-se em forma textual e mais tarde visualmente,
juntamente com personagens, cenários, objetos de cena e etc, ditando assim a
identidade visual do projeto. Em paralelo à construção visual, foi definido o
argumento da história e o roteiro do episódio piloto.
A culminância do projeto inteiro se deu na criação do pitch bible, que
condensa os aspectos mais importantes e objetivos do trabalho no formato pré-
12

estabelecido durante a fase de pesquisas para a fundamentação teórica. A


identidade visual do mesmo levou em conta tudo o que foi definido nas etapas
anteriores: ser condizente com o universo criado e possuir aspectos fundamentais
de uma boa linguagem gráfica.

2 METODOLOGIA DO DESIGN APLICADA À CRIAÇÃO DE SÉRIE ANIMADA

A proposta do projeto é contar uma história utilizando a técnica de animação,


e este se configura como o problema a ser solucionado utilizando-se de uma
metodologia de design escolhida. Löbach (2011,p.141) afirma que "todo processo de
design é tanto um processo criativo como um processo de solução de problemas".
Vianna et al. (2013,p.14), por sua vez, diz que "não se pode solucionar problemas
com o mesmo pensamento que os criou", e do diálogo entre esses dois, infere-se
que a inovação provém da interrupção de padrões vigentes.
Essa maneira pouco usual e diferenciada que um designer assume durante
um processo de solução de problemas permite ao designer remodelar conjecturas e
utilizá-las como oportunidades para a inovação. O mesmo Vianna et al (2013, p.14)
corrobora esta inflexão ao concluir que "Desvencilhar-se do pensamento lógico
cartesiano é uma habilidade essencial para o designer".
Muitas vezes, pode-se ignorar a metodologia do design por julgá-la rígida e
linear, e por isso não apta a desempenhar um papel importante em um processo
criativo e abstrato como a criação de uma série animada. Existem vertentes do
design que apresentam metodologias que se baseiam na maleabilidade e uma
maneira de se moldar de acordo com cada projeto e suas fases, como o design
thinking.
Esta maleabilidade pode-se ser exemplificada ao se analisar dois métodos
distintos de processo de design. Vianna et al. (2013) entende o processo de design
como dividido em quatro fases, começando pela imersão e aproximação do
problema, a sua análise e síntese, a ideação (geração de alternativas) e finalizando
com a prototipação e solução do problema. A metodologia de design thinking
proposta por Lobach (2011) também é dividida em quatro etapas, sendo elas a
13

identificação e análise do problema (o ponto motivador do processo), a geração de


alternativas, avaliação dos resultados gerados e a culminação do processo sendo a
solução.
Apesar de apresentarem fortes semelhanças, um ponto conflitante a se
notar é a linearidade em que são propostas. Lobach (2011, p.155) entende que "o
último passo do processo de design é a materialização da alternativa escolhida", já
Vianna et al. (2013, p. 121) mantém que "apesar de ser apresentada como uma das
últimas fases do processo de Design Thinking, pode ocorrer ao longo do projeto em
paralelo com a Imersão e a Ideação".
Devido a característica abstrata e mutável da criação de uma série animada,
usou-se da metodologia de design de ambos os autores, aplicando neste processo
de forma a estruturar-lo construindo um fluxo de trabalho constante e organizado,
porém com espaço para uma maleabilidade de etapas.
Como afirmado por Bürdek (2006, p. 358), “teoria e metodologia do design
são reflexos objetivos de seus esforços que se destinam a otimizar métodos, regras
e critérios”. Neste projeto os designers foram incumbidos de julgar e adaptar as
metodologias prévias aos seus próprios métodos e necessidades.
14

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Este capítulo do presente trabalho acadêmico abordará conceitos teóricos


para a elaboração da pré-produção de série de animação, desde a ideia inicial até
seu desenvolvimento e pitch bible. Dessa maneira, serão vistos nesse capítulo
temas relacionados ao conceito geral de uma série animada, como criação do
universo narrativo, desenvolvimento visual, personagens, construção de uma
narrativa e aspectos pertinentes a serem considerados na elaboração do projeto.

3.1 CRIAÇÃO DE MUNDO FICTÍCIO

Ao contrário dos filmes live action e documentários, onde a ambientação e os


personagens apresentados aos espectadores são normalmente escolhidos por
diretores, na animação tudo isso é criado. Seja desenhado (2D) ou modelado (3D),
os personagens e a ambientação de uma animação são desenhados em um papel,
computador ou em um estúdio, especialmente para este fim. Ambientação visível e
audível são formadas por animadores desde sua gênese até sua completude.

O universo de uma série de animação pode ser entendido não apenas como
o local onde as ações acontecem, mas como um conjunto integrado, no
qual as realidades criadas existem e se relacionam. Está sujeito, portanto,
ao domínio de certas regras, princípios ou convenções responsáveis pela
integração de suas partes constituintes em um todo articulado e coerente
em si mesmo. (Nesteryuk, 2011, p.169)

Na animação, tudo que pode ser visto ou notado em uma cena está presente
de forma consciente e intencional pelo diretor. Portanto, qualquer elemento deve ter
uma razão e sentido para ter sido criado e apresentado aos espectadores.
O mundo fictício de uma animação surge através de sua ambientação visual,
dramaturgia de seus personagens e o design de som. Música por si só não
consegue passar a sugestão de espaço, que é mais dependente de efeitos sonoros,
pode-se exemplificar isto com o efeito de eco, que com sua simples inserção pode
15

sugerir tamanho e profundidade de cenário de uma cena em especial. Também


segundo Nesteriuk (2001) a música é, portanto, um componente fundamental e pode
se manifestar de forma diegética (como se estivesse sendo escutada “dentro” da
cena) ou extra-diegética (inserida posteriormente “fora” da cena, não audível para as
personagens).
A idéia da criação de um mundo fictício para uma produção cultural é a
discussão de um mundo que existe e permeia determinada obra. É um mundo criado
para uma obra em específico, obra esta que possui começo e fim específicos. Este
mundo que se encontra contido dentro da tela, ao contrário do mundo real, sofre
uma análise descritiva e, por ter sido criado por um ou mais autores, deve também
demonstrar porque foi mostrado daquela forma.

Nenhum de nós, olhando uma pedra ou um pinheiro numa paisagem natural


nos perguntaríamos 'O que isso significa, o que estão tentando me dizer?'
[...] Mas assim que uma paisagem é retratada em uma pintura, esta
pergunta não se torna apenas possível, mas completamente natural
(LOTMAN, 1976 p.14, tradução livre dos autores)1

Este pensamento vai de encontro ao argumento exposto pelo teórico do


cinema Béla Balázs que escreveu em seu livro de 1924, Der sichtbare Mensch, oder,
Die Kultur des Films que “em cinema, qualquer símbolo é portador de significado,
tudo se torna simbólico ao aparecer em uma tela de cinema” (tradução livre dos
autores).2
Além de dar vida à animação, o mundo também possui uma importante
função na apresentação da narrativa. "Oradores da Grécia Antiga aplicavam a
técnica de memorizar um discurso criado mentalmente ao localizar diversas partes
deste em diferentes salas de um complexo de prédios, e se movimentar por estes
prédios enquanto declamavam as falas." (Pikkov 2010, p.135, tradução livre dos
autores).3 O mundo de uma animação tem uma função similar a destes prédios,
ajudando os espectadores a seguir a narração da obra.
Levando em conta que acontecimentos de qualquer narrativa sempre se
encontram no presente (pois mesmo se tratando de um 'passado' na narrativa, estão

1
LOTMAN, 1976, p. 14 No one of us, looking at a stone or a pine tree in a natural landscape, would
ask: “What does it mean, what did they intend to say?” [...] But as soon as such a landscape is
portrayed in a painting this question becomes not only possible, but entirely natural
2
BALÁZS, 1924 In film ist jedes zeichen ein träger Von Bedeutung, alles wird symbolisch im Film
3
PIKKOV, 2010, p.35 Spokesmen in ancient Greece applied the technique of memorizing a speech
which entailed mentally locating the parts of the speech in different rooms of a building complex, and
moving around in this building while giving the speech.
16

sendo apresentados imediatamente ao espectador), o ambiente e cenário pode


fornecer ao espectador informações sobre o passado e presente. Por exemplo, a
imagem de uma terra craquelada e seca passa a informação de que ali ocorreu uma
seca, enquanto a citação de um determinado personagem de que existe um vulcão
desativado sugere uma ameaça iminente.

O design de personagens não possui características especiais por si só,


apesar de ser possível se tirar conclusões gerais a partir do espaço em que
determinado personagem supostamente habitaria: por exemplo,
personagens com pernas similares às humanas provavelmente ocuparia um
ambiente onde as leis da gravidade se aplicaria, e as usaria para andar por
aí. Deve-se levar em conta que essas conclusões são puramente
especulativas e baseadas em nossas experiências passadas, e não
descrevem necessariamente a natureza real do ambiente de um
filme(PIKKOV, 2010, p.128, tradução livre dos autores)4

Campbell (1990, p.23) expande o conceito de mitologia para algo além do


expositivo ao afirmar que a mitologia “[...] é a maneira como seguramos um garfo e a
faca, a maneira como lidamos com pessoas e assim por diante. Nem tudo está
escrito em livros.”
Deve-se levar em conta que, a animação, por se basear na interpretação de
imagens ilustrativas, depende também de diferentes visuais pessoais do espectador,
como alertado por Pikkov (2010) em:

Além disso, nossa mente atribui experiências prórprias à ideias


apresentadas em animação . Assim, experiências de mundo diferentes
podem resultar em diferentes interpretações para um filme; por exemplo,
adultos e crianças podem chegar a doferentes conclusões sobre um mesmo
filme pois suas experiências de vida são diferentes.(PIKKOV, 2010, p.130,
tradução livre dos autores)5

Pode-se inferir que a criação de um mundo fictício bem feita introduz


preceitos que nortearão todas as outras escolhas de criação em uma animação,
partindo da criação de personagens que deverá condizer com as condições
existentes neste mundo, passando por escolhas narrativas que devem parecer

4
PIKKOV, 2010, p.128 The design of characters does not have apparent spatial features either; yet
very broad conclusions can be drawn from the design about the space the characters are supposed to
inhabit: for instance,characters with legs similar to those of people are likely to occupy an environment
where the law of gravity applies and legs are used for walking around. Nonetheless, this is just
speculation based on our prior experience, and does not necessarily describe the actual nature of the
film’s space.
5
PIKKOV, 2010, p. 130 Moreover, our mind attaches experiences to the ideas presented in animation.
Thus, different experiences of the world can result in different interpretations of a film; for example,
adults and children can arrive at contrasting readings of the same film since their experiences of the
world are dissimilar.
17

críveis ao adaptadas para determinada realidade e até no aspecto sonoro da


produção.

3.2 DESENVOLVIMENTO VISUAL E DESIGN DE PRODUÇÃO

Os curta-metragens feitos por artistas não filiados à nenhuma produtora


tradicional podem ou não exibir visuais incomuns pois a maioria destes estão
experimentando coisas novas e, de algum modo, toda essa produção são obras
pessoais, visto que cada artista possui seu estilo original. Porém, no que tange à
produções maiores (com um maior número de funcionários envolvidos), a animação
não é o objeto de expressão de um único artista e sim o esforço coletivo de vários
outros. Em um artigo sobre a inserção dos países em desenvolvimento no mercado
global de animação, Gama (2014) afima que,

O desenho animado deriva de um processo produtivo de desenho


quadro a quadro que facilita a divisão do trabalho em etapas,
sistematizando os estágios de produção em conceituação, pré-produção,
produção e pós-produção [Winder e Dowlatabadi (2001)]. Cada etapa da
produção de animação envolve uma divisão do trabalho única para as
indústrias culturais, o que facilita a terceirização de certas etapas da
produção para outra empresa, inclusive estrangeira, na tentativa de
redução de custos. (GAMA, 2014, Revista do BNDES)

Desta forma, no intuito de evitar uma mistura confusa de várias visões


artísticas conflitantes, os grandes estúdios optam por dividir o processo de criação
em etapas bem definidas e os parâmetros determinados no período de pré-produção
devem ser seguidos pela equipe (ou equipes) responsável pela produção e pós-
produção rigorosamente. Apesar deste projeto estar sendo desenvolvido por apenas
dois autores, o intuito do mesmo é desenvolver a primeira etapa e apresentar os
resultados a produtoras afim de alcançar recursos para as próximas etapas
seguindo os parâmetros de grandes produções. Portanto, abordou-se neste tópico
conceitos baseados em produções de escala industrial.
O desenvolvimento visual está intrinsecamente conectado à criação do
mundo fictício, pois o próprio conceito visual pode já delimitar e ser uma
característica inerente do mundo representado. Isso pode ser exemplificado ao se
observar como os diferentes tipos de conceito visual exprimem a linguagem
18

proposta por séries como Over The Garden Wall (Figura 4) , Samurai Jack (Figura
5) do Cartoon Network, Ping Pong The Animation (Figura 6) da Tatsunoko
Production Company e Kaiba (Figur 7) da Madhouse Animation.

Figura 4 - Imagem de divulgação Over The Garden Wall


Fonte: Cartoon Network 2013

Figura 5 – Imagem de divulgação Samurai Jack


Fonte: Cartoon Network 2001
19

Figura 6 – Imagem de Divulgação Ping Pong The Animation


Fonte: Tatsunoko Production Company 2014

Figura 7 – Imagem de Divulgação Kaiba


Fonte: Madhouse Animation 2008
20

Nesteriuk (2011) defende que:

Tanto no processo de elaboração do concept art quanto da finalização dos


cenários da animação é recomendável que o artista possua um amplo
domínio da gramática e da sintaxe visual. Referimonos aos termos
“gramática” e “sintaxe”, pois de maneira análoga à escrita, a visualidade
também possui toda uma gama de elementos capaz de estabelecer uma
linguagem expressiva própria. Da mesma forma que um escritor domina os
códigos da escrita, a partir dos quais desenvolve seu próprio estilo para
escrever textos dos mais diversos gêneros e formatos, artistas, designers e
desenhistas dominam os elementos técnicos, artísticos e criativos da
linguagem visual, como pontos, linhas, perspectiva, profundidade, contraste,
luz, sombra, escala, textura e cor.

Este argumento vai de encontro ao proporsto por Bacher (2007), que explica
o papel do Designer de Produção como o profissional que desenvolve o estilo visual
para o filme de acordo com história, público alvo e orçamento, fazendo assim uma
tradução dos conceitos e narrativas do plano das idéias para o plano visual. Ou seja,
pode-se concluir que o designer de produção cria o direcionamento estético a ser
seguido ao longo do processo.

A pesquisa em diferentes áreas como arquitetura, história ambiental,


paisagem, figurino e objetos de cena começam ao mesmo tempo. O design
conceitual engloba todos os gêneros e estilos, sejam eles realistas ou
estilizados, drama ou romance, produções de época ou futuristas,
infantilizado ou adulto. (BACHER, 2017 p.44, tradução livre dos autores)6

Desenvolvimento visual é o estágio inicial da produção onde todas as


diferentes maneiras de se traduzir visualmente a ideia de uma história estão sendo
exploradas. Isso inclui a busca por um estilo que se encaixe na narrativa, em todas
as áreas: cenários, personagens, cores, composição e montagem. Também inclusos
estão a pesquisa e o design conceitual baseado em direções estilísticas variadas.

3.3 CRIAÇÃO DE PERSONAGENS

Um personagem é um ser de ficção que pode ser considerado uma obra de


arte, uma metáfora para a nossa existência. Nós nos relacionamos a personagens

6
BACHER, 2017, p. 44 Research into areas such as architecture, historical environment, landscape,
costume and props starts simultaneously. Concept-design covers all different genres and
styles,naturalistic or stylized, drama or romance, time-period movie, children or adult concepts.
21

considerando-os reais, mas eles estão em um plano diferente da realidade. Seus


aspectos e características foram feitos para serem claros e identificáveis. Um
personagem é eterno e imutável.

A criação de personagem começa com a conversão de dois aspectos: a


caracterização e o personagem real. A Caracterização é a soma de todas
suas características visíveis, o que faz do personagem um ser único:
aparência física aliada a maneirismos físicos, estilo de fala e gesticulação,
sexualidade, idade, QI, profissão, atitudes, valores pessoais, onde vive e
como vive. O personagem real é o que existe por detrás da máscara:
apesar da caracterização, quem é essa pessoa? Leal ou desleal? Honesto
ou mentiroso? Amável ou cruel? Corajoso ou covarde? Generoso ou
egoísta? (McKee, 1997 p.375, tradução livre dos autores)7

Apesar de não existir um conjunto específico de regras formais para a


criação de personagens, Nesteriuk (2011) apresenta alguns aspectos que auxiliam
na formação dos mesmos. Mesmo que o personagem não seja representado
visualmente como uma figura humana, deve ser considerado como tal, ou seja, um
ser que pensa, sente, se comporta, vive e se relaciona com o universo narrativo da
série.O primeiro passo apresentado pelo autor é pensar na sua história pregressa.
Sua ascendência, seus pais, circunstâncias de nascimento, sua educação, suas
amizades, sua infância, sua juventude, quais são suas lembranças e traumas. O
passado é uma parte essencial na elaboração da ficha biográfica de qualquer
personagem, pois permite conhecermos melhor sua constituição e pensarmos em
suas demais características.Tendo sua história pregressa definida, pode-se inferir
características primordiais como seu nome, que, por exemplo, pode ser escolhido
por seu significado, sonoridade, alusão a outros personagens ou pessoas e o perfil
psicológico da personagem, que são suas qualidades distintivas: idade,
autoimagem, autoestima, temperamento, humor, virtudes, defeitos, maneirismos,
habilidades, medos, orgulho, pontos de vista, ocupação principal, relacionamentos
com outras personagens, sonhos, interesses, necessidades, superstições,
transtornos, enfim como ela pensa, sente e (re)age nas diversas situações e
condições presentes no universo da série.

7
McKee, 1997, p. 375 Character design begins with an arrangement of the two primary aspects:
Characterization and True Character. Characterization is the sum of all the observable qualities, a
combination that makes the character unique: physical appearance coupled with mannerisms, style of
speech and gesture, sexuality, age, IQ, occupation, personality, attitude, values, where he lives, how
he lives. True Character waits behind that mask. Despite this characterization, at heart who is this
person? Loyal or disloyal? Honest or liar? Loving or cruel? Courageous or cowardly? Willful or weak?
22

Ainda citando mesmo autor, este defende que neste estágio, é importante
escrever o máximo possível sobre a personagem, tornando-a mais complexa e rica.
Quanto mais informações e características houver, mais a personagem caminha em
direção à chamada ‘vida própria’. E que em um curta ou longa-metragem, a
personagem pode se submeter mais à ação, mas em uma série o desenvolvimento
da mesma é imperativo. Mesmo que este desenvolvimento narrativo não apareça
completamente para o público, a sua existência permite uma maior identificação com
o público, que sente que o personagem realmente existe e possui autonomia dentro
do universo fictício, além de abrir possibilidades para a própria história, como por
exemplo, a volta de figuras ou traumas do passado. Para que a dinâmica interior do
personagem seja assimilada pelo espectador, é necessário que ela seja
externalizada. Em uma animação, a dinâmica visual da personagem é a principal
maneira de se expressar sua dimensão interna, e a criação das características
visuais geralmente se inicia com uma pesquisa de referências criativas. Não é
imperativo que essas referências sejam pertencentes apenas ao mundo da
animação, podendo ser recolhidas e pesquisadas no cinema, quadrinhos, artes
plásticas, reino animal, músicas e até mesmo no próprio cotidiano do artista.
Partindo das referências, começa-se a fase de esboçar e testar diferentes
versões do personagem, para que ao fim deste processo seja escolhido uma versão
rudimentar que já possua biótipo característico, com determinada altura, peso e
aparência geral.
O passo seguinte consiste em lapidar sua personalidade por meio visual,
traduzindo traços e características abstratos em estilo e traços típicos. É neste
momento que deve-se atentar para o fato do personagem ser projetado para uma
animação, como expresso por Nesteriuk (2011):

[..] o artista deve sempre levar em conta, diferentemente do que acontece


em um livro ou em uma história em quadrinhos, que a personagem
efetivamente se movimentará. Isso implica, principalmente, a definição de
uma anatomia coerente, que costuma ser mais bem explorada no campo do
desenho dinâmico. Além disso, a própria técnica da animação também deve
ser considerada em suas especificidades, uma vez que possui diferentes
parâmetros e modos de produção. (Nesteriuk, 2011, p.183)

Apesar de possuir uma liberdade criativa, e, por isso, poder ser


completamente ignorada quando se pretende representar figuras de uma realidade
fantástica, a constituição física de um personagem usualmente é pensada a partir de
23

três aspectos: a divisão corporal em cabeça, tronco e membros; a cefalização


(concentração dos órgãos sensoriais na cabeça, próximos ao cérebro) e a simetria
bilateral, na qual a metade de um lado do corpo é equivalente a do outro.
O próximo passo a se considerar é o desenvolvimento de elementos
relacionados ao personagem, como objetos, adereços, figurino e etc., que atribuam
maior individualidade e ajudem a traduzir suas características internas.
Depois de ser devidamente construído como um ser participante do universo
da série, a personagem costuma ser apresentada com uma união de diversas
ilustrações que, além de mostrar diferentes ângulos de sua anatomia e diferentes
dinâmicas de movimento, também apresentem informações textuais que explorem a
dimensão internalizada da personagem, porém de modo conciso e direto. Este
conjunto de ilustração e texto é chamado de model sheet, exemplificadas aqui pelas
figuras 8 e 9. Acompanham ainda o model sheet alguns desenhos de corpo inteiro,
nos quais a personagem é representada em poses dinâmicas (action poses) e
expressivas, características de suas ações na série.

Figura 4 - Model Sheet de personagem de Ping-Pong The Animation


Fonte: YUASA, MASAAKI, Ping Pong Complete Art Works, 2014, pág. 45
24

Figura 5 – Model Sheet de personagem de Samurai Jack


Fonte: Imagem pertencente a Cartoon Network, 2002

Busca-se a ideia de que a criação viva independentemente da observação


do espectador e participe ativamente do universo apresentado, como expresso em:

Personagens são seres que vivem dentro do universo narrativo da série e,


como tal, pensam, sentem e (re)agem com este universo e com seus outros
seres. Suas dinâmicas internas (psicológicas) e externas (visuais) devem
ser pensadas de forma complexa e integrada, fazendo com que as
personagens ganhem vida própria. A partir desse momento, quando
abandonadas em si mesmas, as personagens começam a tecer suas
próprias tramas e a preencher os espaços vazios que surgem na série.
(Nesteriuk, 2011, p.185)

Quando desenvolvidas com sucesso, as personagens garantem maior


identificação com o público, podendo transcender a série em que foi criada. Não é
por mero acaso que personagens marcantes sejam lembrados de maneira mais
intensa em comparação com suas respectivas séries ou episódios.
25

3.4 ROTEIRO PARA SÉRIE ANIMADA

A narrativa e o jeito que esta é contada é provavelmente o único aspecto da


produção em que empresas de diferentes condições estruturais e financeiras
competem de igual para igual; em todos os outros quesitos, os gigantes
conglomerados de produção possuem a vantagem de poder criar efeitos visuais
mais espetaculares, usar técnicas de animação mais sofisticadas, músicas mais
populares e, através da publicidade, atingir um público maior do que as pequenas
empresas.
O ato de contar histórias tem sido parte importante das atividades humanas
por milhares de anos. Histórias podem aparecer em diversas formas: como contos
de fada, lendas, canções, desenhos, rezas e etc. A raça humana inclui seus maiores
conhecimentos e experiências dentro de histórias. Campbell (1990, p.17) afirma que
seres humanos sempre estão em busca de "uma experiência de estar vivos, de
modo que nossas experiências de vida [...] tenham ressonância no interior de nosso
ser e de nossa realidade".
Mckee (1997, p.3) afirma que

Criar uma narrativa diz respeito a seguir princípios, e não regras . Enquanto
uma regra dita uma obrigatoriedade a ser seguida, o princípio é apenas uma
forma de lembrar o que já foi executado e funciona com frequência. Uma
narrativa não deve ser modelada baseando-se em uma outra narrativa de
sucesso, e sim ser eficientemente montada dentro dos princípios que
moldam a arte. “Criadores inexperientes e ansiosos seguem regras.
Criadores rebeldes e sem educação formal quebram regras. Artistas
remodelam a forma(Mckee, 1997, p.3).

Arlindo Machado, em seu livro “A Televisão Levada a Sério” (2009),


estabelece que existem três tipos principais de narrativas seriadas na televisão, e as
separa com relação à maneira como a fragmentação é oferecida ao espectador e
estruturada na própria série. O primeiro tipo, chamado de séries em capítulos, há
uma ou diversas narrativas principais que se apresentam de forma linear
e contínua. Isto faz com que seja necessário assistir aos episódios em uma ordem
cronológica pré-estabelecida, tornando um episódio dependente de conhecimentos
de fatos acontecidos no episódio anterior. Nos episódios ditos seriados, que
constituem o segundo tipo definido por Machado (2009), cada episódio se constitui
como uma história completa e independente, com a repetição de elementos
26

narrativos centrais na série. A partir de um padrão básico, recorrente, elementos


variáveis são apresentados possibilitando variações em torno desta fórmula prévia.
Não é imperativo, portanto, que o espectador assista a episódios prévios em
determinada ordem para que se entenda o episódio atual, da mesma forma que os
acontecimentos deste não influenciam diretamente em próximos episódios. O
terceiro tipo, episódios unitários, traz séries em que cada episódio é independente
narrativamente, e traz elementos variados entre si, podendo apresentar
personagens e situações completamente diferentes a cada edição.
Como o objetivo do projeto é criar uma série de animação auto-contida e
linear, infere-se que a narrativa contada será do tipo série em capítulos.
Um dos princípios mais tradicionais de estruturar a narração é o “Arco de 8
Pontos”. Como já dito anteriormente, um princípio não é algo que deva a ser
seguido, mas sim um norteamento possível para o projeto, como citado por Watts
(1996, p.17) da seguinte maneira:

Eu acho o arco de oito pontos mais útil como uma lista de controle para
medir meu trabalho que está em progresso. Se eu sinto que a narrativa está
caminhando de maneira errada, eu checo se involuntariamente pulei alguma
etapa do arco de oito pontos. Ele pode não te garantir a escrita de uma
narrativa brilhante, mas te ajudará a evitar algumas ciladas de uma idéia
brilhante que está indo em direções erradas. (Watts, 1996 p..17, tradução
livre dos autores)8

O primeiro ponto desta estrutura é a inércia, o pedaço da narrativa dedicado


a exemplificar o cotidiano do mundo fictício onde a história se passa. Normalmente
segue o protagonista em um retrato contido de sua existência. O próximo passo é
chamado de gatilho, e acontece quando algo que não está no controle dos
protagonistas é o “gatilho” que faz a história começar. Um robô alienígena é
encontrado, um estranho rapta uma princesa famosa e etc.
Este gatilho resulta em uma jornada, tendo esta como objetivo um retorno
ao status anterior (a mãe do protagonista é raptada, um urso engole todo o dinheiro

8
WATTS, 1996, p.17 I find [the eight-point arc] most useful as a checklist against which to measure a
work in progress. If I sense a story is going wrong, I see if I’ve unwittingly missed out a stage of the
eight-point arc. It may not guarantee you write a brilliant story, but it will help you avoid some of the
pitfalls of a brilliant idea gone wrong.
27

da cidade e etc.) ou uma jornada de melhora de status (por exemplo o protagonista


descobre-se herdeiro de duzentos potes de dinheiro).
O próximo estágio é chamado de surpresa. Este estágio é composto de
diversos elementos e ocupa a maior parte do meio da história. Muitas vezes
representa conflitos, obstáculos, complicações e problemas para os personagens.
As surpresas não devem ser muito aleatórias nem muito previsíveis, devem ser
inesperadas, mas plausíveis.
Escolha crítica é o quinto passo, e define-se por uma decisão crucial que
deve ser feita pelo protagonista. Geralmente é neste ponto em que descobre-se
quem o personagem realmente é, pois as verdadeiras personalidades são reveladas
em momentos de muita pressão. Watts (1996 p.18) afirma que essa decisão deve
envolver o protagonista escolhendo alguma direção de ação, não podendo ser algo
que aconteça aleatoriamente. Na maioria das histórias clássicas, a “escolha crítica”
envolve a decisão entre um caminho bom porém difícil, e um caminho dito mau,
porém com menos percalços. Nas tragédias famosas, o final infeliz se dá por
consequências atreladas à decisões erradas tomadas neste ponto.
A escolha crítica tomada pelos personagens precisam resultar em um
clímax, o ponto alto de tensão de toda sua narrativa. Uma discussão entre marido e
mulher, o início de uma grande batalha ou até uma explosão, o clímax o ponto
culminante de todos os esforços da narrativa.
As consequências da escolha crítica e do clímax deve ser a reversão, e
deve mudar o status dos personagens, principalmente o protagonista.

A reversão da história deve ser inevitável e provável. Nada deve acontecer


sem razão, mudanças de condição não devem cair do céu. A história deve
transcorrer-se assim como a vida se transcorre: implacavelmente e de
maneira plausível. (Watts, 1996 p.18, tradução livre dos autores) 9

A resolução, o último estágio, é o começo de um novo status. É o ponto em


que os personagens passaram por transformações e se encontram mudados, e com
os devidos arcos narrativos fechados. Estes passos são apenas uma estrutura
básica e clássica, podendo ser utilizados até na criação de mini-arcos narrativos

9
WATTS, 1996 p.18 Your story reversals should be inevitable and probable. Nothing should happen
for no reason, changes in status should not fall out of the sky. The story should unfold as life unfolds:
relentlessly, implacably, and plausibly.
28

dentro de cada passo, desenvolvendo assim uma produção maior, porém bem
estruturada.

3.5 O PITCH BIBLE DE ANIMAÇÃO

O pitch bible de animação, bíblia para apresentação em tradução literal, é


um documento que compila informações básicas e características visuais de um
projeto para uma futura animação, servindo como um guia para comunicar idéias e
conceitos assim como familiarizar eventuais produtores ou investidores com seus
personagens e arcos narrativos.

Um pitch bible deve ser divertido por si só. Lembre-se, isso não é uma tese
acadêmica ou um artigo para o jornal local. A ideia é trazer uma animação à
vida diante dos olhos de executivos ou engravatados, portanto não pode-se
apenas colocar imagens engraçadas também. As palavras devem ser
descritivas, comunicativas e sucintas. Você tem que fisgar a atenção do
seu espectador desde a primeira frase para forçá-los a querer saber do
resto. O ‘pitch’ deve capturar a essência do seu projeto. Se ele não for uma
leitura interessante, seu projeto não será interessante. (LEVY, 2009, p.28,
tradução livre dos autores)10

Não há regras específicas, acadêmicas ou formais no que tange ao formato


do pitch bible, porém há elementos que são esperados em sua formação, como uma
sinopse breve da animação; o formato e técnicas que pretende-se empregar na
produção; regras e mitologia do mundo em que se passa a história; personagens
principais e secundários assim como uma breve descrição de suas características e
designs; descrição do arco principal da história e artes conceituais mostrando cenas
e cenários planejados. Um rápido sumário de episódios individuais também é
importante, pois passa a sensação de como a história se desenvolverá, ao invés de
só descrevê-la. Nesteriuk (2011) complementa que

A bíblia serve, ainda, como documento de referência para a breve


apresentação presencial (normalmente com duração entre cinco a dez
minutos) realizada in loco. Essa apresentação, essencialmente oral, é
conhecida como pitch. E esse é um momento importante para convencer
alguém interessado em seu projeto que ele realmente vale a pena. O uso de

10
LEVY, 2009 A Pitch book should be entertaining in and of itself. Remember, this is not a thesis
paper or an article for the local news. You are attempting to bring a show to life befora an executive's
eyes and it can't all be funny pictures. The words should be descriptive, conversational and succint.
You've got to hook your reader in the first few sentences to get them to hunker down and explore the
rest. The pitch book must capture the spirit of the show.
29

recursos extras, como pequenos trechos animados ou um teste de


animação, música tema, abertura da série e bonecos das personagens
podem ser utilizados, mas, diante do projeto em si, acabam tendo papel
secundário. (Nesteriuk, 2011p.226 e 227)

Seguindo os conselhos de Levy (2009), é aconselhado que o autor do


projeto seja claro e consistente ao falar sobre o mundo que está apresentando e
certifique-se de que tudo no seu pitch bible está de acordo com as regras
apresentadas.
Para exemplificar a eficiência que um bom pitch bible tem na indústria de
animação será reproduzido a seguir o pitch que resultou na produção comercial da
série “ Adventure Time” por nove temporadas. A série da Cartoon Network foi
aprovada para produção após a leitura de seu pitch bible (McDonnell, 2014).
Na figura 10 temos a capa e a primeira página do pitch que contém o
overview da série se focando na interação entre os personagens principais, Fiin e
Jake.

Figura 6 – Adventure Time pitch bible


Fonte: MCDOWELL, Chris. 2014, pg. 24.
30

Já a figura 11 descreve os personagens mais profundamente aliando texto e


imagens para que o leitor do pitch possa captar a dinâmica visual e o perfil
psicológico das personagens.

Figura 7 – Adventure Time pitch bible


Fonte: MCDOWELL, Chris. 2014, pg. 25 e 26.

As personagens secundariass e suas dinâmicas são apresentadas nas


figuras 12 e 13, na última figura também observamos uma breve descrição do
mundo em que estes personagens estão inseridos e a apresentação de um
personagem que poderá ser uma ameaça aos protagonistas.

Figura 8 – Adventure Time pitch bible


Fonte: MCDOWELL, Chris. 2014, pg. 27 e 28.
31

Figura 9 – Adventure Time pitch bible


Fonte : MCDOWELL, Chris. 2014, pg. 29.

O projeto editorial do exemplo acima segue uma formatação básica, com


fundo branco e textos enxutos, demonstrando que o mais importante ao construir um
pitch é ser capaz de sintetizar o extenso trabalho produzido durante a pré-produção
de forma clara e interessante.
32

4 DESENVOLVIMENTO DA PRODUÇÃO DA SÉRIE DE ANIMAÇÃO

O desenvolvimento deste projeto será baseado na estrutura apresentada por


Sérgio Nesteryuk no capítulo 3 do livro Dramaturgia Para uma Série Animada
(2011).
Segundo o mesmo autor, apesar de não existir uma fórmula ou regra
absoluta referente à dinâmica de criação de um projeto de série de animação, é
importante observar que sua apresentação, entretanto, possui certas formas e
estruturas mais consolidadas. O capítulo em questão apresenta um modelo de
projeto completo de série de animação, conhecido como “bíblia de produção”
(production bible).
Foi escolhido este modelo de projeto por apresentar uma metodologia que
contempla todos os objetivos deste trabalho, compreendendo desde a ideia inicial
até o desenvolvimento final e pitch de uma série animada. Serão abordados nos
próximos capítulos os seguintes temas relacionados a produção: o conceito geral da
série; sua apresentação (overview); criação do universo narrativo; cenários;
personagens; sinopse técnica (springboards); sinopse comercial; e roteiro do
episódio piloto.
É também neste momento que os autores aliarão os aspectos teóricos aos
práticos registrando suas experiências ao longo de cada etapa do projeto.

4.1 CONCEITO GERAL DA SÉRIE

Para a criação do conceito geral da serie baseou-se nas seguintes ideias


apresentadas por Nesteryuk, 2011:

O primeiro item apresentado no programa é o conceito geral da


série. Aqui, é necessário um poder de síntese capaz de apresentar,
em linhas gerais, o projeto em um único parágrafo, priorizando o
tema, o enredo central e o tom da série. Para isso, o primeiro passo
33

pode ser pensar naquilo que denominamos story line, uma sentença
conceitual, isto é, não narrativa, que apresente a ideia central da
narrativa em uma única frase, tornando-a, portanto, mais universal.
[...] O story line pode ser definido em linhas gerais como uma
espécie de “frase-conceito”, que explicita em seus aspectos
subjetivos uma narrativa qualquer. (Nesteryuk, 2011 p.157 e 158)

A história criada prentende ser uma metáfora para mentes fechadas e os


obstáculos enfrentados para “pensar fora da caixa”, trazendo seres vivos
literalmente cercados por barreiras físicas. A jornada das personagens representa
por analogia as mudanças comportamentais que um indivíduo sofre ao ser
deslocado de sua zona de conforto para territórios desconhecidos. A trajetória se
concluirá quando as personagens sairem do monstro colossal e perceberem que
existem outros monstros colossais na companhia deste, deduzindo que as barreiras
físicas são infinitas, assim como os modos de viver e lidar com estas. Desta forma,
os autores sintetizam estas ideias com a seguinte frase: “Suas condições de vida
não delimitam sua existência.”

4.2 APRESENTAÇÃO (OVERVIEW)

Inicialmente, planeja-se que a produção seja uma minissérie animada de


aventura e mistério utilizando-se da técnica de animação 2D. Estima-se que dure por
10 episódios, de 11 minutos de duração cada um. O público alvo é de jovens
adultos, e a série possui um tom levemente cômico, porém com quantidades
moderadas de violência.
O enredo apresenta seres colossais que vagam pelo universo atrás do
“cheiro de desgraça” e agem como uma espécie de defesa natural do cosmo. Um
deles é atraído para a Terra porque provavelmente iria acontecer uma catástrofe
que impactaria o resto da galáxia. Ele chega e come um pedaço da Terra do
tamanho de um estado. Quando ele está indo embora, é capturado por uma raça de
alienígenas (porque este ser só fica vulnerável imediatamente após comer) que
“congela” suas funções corporais (inclusive o processo de digestão) e o transporta
para um laboratório. Eles ficam monitorando sua atividade e a atividade do seu
interior. Mais tarde é revelado que o objetivo dessa raça é tentar controlar esse ser
colossal e usar para seus próprios fins.
34

Como o processo de digestão do animal foi interrompido, ao engolir um


terreno do tamanho de um estado, prédios, coisas e pessoas inteiras conseguiram
sobreviver. A série se passa alguns séculos depois, aproximadamente 400 anos
terráqueos depois do evento inicial. A sociedade sobreviveu dentro do corpo do
bicho, se dividindo em áreas diferentes dentro do organismo. Parece um futuro pós-
apocaliptico com mutantes e personagens de formas não necessariamente
humanas, pois o contato com diferentes substâncias, seres e etc. mutou por
completo a fisiologia humana comum. Não existe uma quantidade muito grande de
vida. Os seres vivem em habitações improvisadas, algumas feitas de partes de
edificações e materiais da antiga Terra e de maneira isolada, no sentido de ser uma
divisão em ‘tribos” separadas, cada uma em uma parte do corpo, e sem muita
interação. Mais ou menos como se cada parte do corpo fosse uma cidade diferente
com costumes, fisiologia, caracteristicas e ambientação singulares, porque é muito
perigoso sair do “órgão” que você está instalado por condições insalubres de
diferentes partes do corpo e da disputa por alimentos e etc. A preocupação dessa
civilização é sobreviver.
A narrativa começa mostrando o personagem principal (um garoto/mutante
chamado K) e uma amiga (um robô humanizado chamado Ice) caçando uma
espécie de animal estranho em um ambiente que pareça ser um deserto, mas com
textura orgânica, um deserto de carne. Acompanhando o garoto está seu fiel
escudeiro, um “cachorro” (uma forma que se assemelha a uma célula) com aspecto
estranho.
As crianças estão caçando os animais para se alimentarem quando são
surpreendidos por uma personagem misteriosa, que está caçando também. Ela é
muito mais eficiente na caça e aparenta ter uma experiência bem maior, por isso
começa a abater todos os animais que eles estão atrás. Eles meio que entram em
pânico, e vemos a mira da personagem misteriosa travar no “cachorro”. O
“cachorro”, como se percebesse isso, olha diretamente pra personagem que está
com a arma e seus olhos mudam de cor, demonstrando um estado de transe. Nesse
momento o ambiente inteiro do deserto começa a tremer. Os alienígenas, que
estavam monitorando as atividades do lado de fora deste “Mundo” percebem que
algo está errado. As crianças e a personagem misteriosa saem correndo para
direções diferentes, assim como o “cachorro”, e o terremoto para de acontecer.
35

As crianças voltam pra sua “cidade” com algumas carcaças de animais e


tagarelam animadamente etc. Falam sobre como já já baterão seus próprios
recordes e etc. Chegam em uma fortificação misteriosa. Batem na porta e falam que
vieram pra jogar. Um “mutante” claramente lacaio abre a porta e pergunta se eles
trouxeram as “fichas”. As crianças mostram os bichos mortos que eles trouxeram e o
porteiro os deixa entrar. Lá é revelado para que as crianças estão caçando.
Eles estavam caçando os animais para dois fins. Um é servir de alimento e
outro é o excesso de alimento ser trocado por uma “ficha” de pinball numa fortaleza
pós-apocaliptica não tão longe dali, onde uma espécie de “chefe da máfia” possui
um pinball sobrevivente da terra, que ainda funciona por ser analógico. Essa é uma
das únicas formas de distração deste mundo inteiro, e o “Chefe da máfia” utiliza
disso para estocar comida e fazer com que as crianças o sustentem. Ele é chefe de
uma “quadrilha” de funcionários e é temido e respeitado como o “maioral” do
pedaço. Depois de jogar uma partida cada um e etc, eles saem de lá (levando o
resto dos animais, para consumo próprio) e vão para suas “casas”.
Ao chegar em casa, o protagonista fala com seu tutor, um velho de aspecto
xamânico e aparentemente meio louco, falando umas coisas desconexas e
preocupado com o terremoto que ele sentiu. O garoto o acalma e demonstra não
acreditar nas coisas que o “avô” fala. (em diálogos anteriores entre as crianças,
mostra-se que o avô do menino fala coisas como “estamos vivendo em um animal
gigante”, “eu sou muito mais velho do que aparento”, “um dia eles virão nos pegar”).
Outro dia, as crianças saem para caçar novamente. No meio da caçada, os
alienígenas citados anteriormente aparecem e estão “pilotando” maquinas voadoras.
Apõs uma breve perseguição, eles conseguem levar o cachorro embora, deixando o
menino e sua amiga para trás.
A personagem misteriosa estava observando tudo à distancia e consegue
ver o cachorro “usando” poderes, e segue a crianças por motivos ainda não
revelados. (descobrimos depois que ela segue as crianças porque os pais dela
morreram em um tremor do tipo causado pelo cachorro tempos atrás).
As crianças levam um planador avariado conseguido na perseguição para
aldeia e o avô encosta no planador (Ets possuem planadores ativados pelo toque
deles e revela-se que o avô era um ET que caiu lá há muito muito tempo). A
máquina é ativada, e o velho xamã chora de alegria ao entender que nao era louco.
36

O grupo parte em uma aventura pra recuperar o cachorro e saber mais


sobre o passado do avô que nao possui todas as memorias.
Mais pra frente descobrimos que o “cachorro” é um “tumor” do animal
colossal, e que possui conexão neural com o mesmo. Este é o motivo do rapto.
A série se desenvolve como um filme de estrada, isto é, uma narrativa que se passa
toda em uma viagem, da aldeia inicial até as “extremidades” do monstro, passando
por todo seu corpo.

4.3 CRIAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E APRESENTAÇÃO DO UNIVERSO

A criação de mundo e mitologia própria para o mesmo, no caso deste


trabalho desenvolvido, foi totalmente norteada pela pergunta "Como se
desenvolveria uma sociedade de seres inteligentes dentro de um ser colossal?".
A partir deste questionamento, foram inferidas possibilidades e escolhidas
as que, ao modo de ver dos autores, responderiam de uma maneira mais satisfatória
à pergunta, além de gerar possibilidades interessantes de elementos e práticas
utilizáveis em arcos narrativos. Por exemplo, ao se criar uma sociedade de
subsistência, com tons pós-apocalípticos óbvios, e extremamente fragmentada, é
possível aliar à idéia de "arco de travessia", onde um personagem principal passaria
a história em uma jornada por diferentes lugares, onde tudo seria uma novidade
para ele e, por consequência, para os espectadores, que acompanham o desenrolar
do mundo pelos olhos do protagonista.
Nesteryuk (2011) compara a criação de um universo a criação de um jogo e
argumenta que o universo narrativo de uma série deve prever quais serão suas
peças, espaços, regras, estratégias, resultados possíveis e as maneiras pelas quais
esse jogo poderá ser jogado.
As peças deste mundo, as personagens, deveriam refletir as
particularidades dos ambientes em que estão inseridas. Uma sociedade que vive
dentro de um ser colossal provavelmente sofreria mutações ao longo dos anos,
transformando-se em seres com características visuais distintas dos humanos na
sua atual configuração. O ambiente não influenciaria apenas nas características
37

fisiológicas das personagens, mas também no figurino e nos adereços que poderiam
carregar consigo.
Afim de criar contraste entre os personagens que vivem fora e dentro do ser
colossal, buscou-se por opostos visuais e comportamentais. Dentro do animal, a
civilização está preocupada em sobreviver, não existe um sistema hierárquico
complexo e composto por leis. Em contrapartida, os personagens de fora, os
antagonistas, deveriam demonstrar organização e hierarquia no visual e psicológico.
Pensando nestes aspectos, aplicaram-se nos últimos, características empresariais.
Não existem indivíduos distintos, e sim o coletivo que almeja um objetivo em
comum. Além de um sistema empresarial se opor à falta de organização hierarquica
dentro da civilização vivendo dentro do ser, este também pode representar
caricatamente aspectos da sociedade em que vivemos atualmente, prendendo o
espectador pela familiaridade.
Apesar da constante busca por identificação do espectador com os
personagens e situações na série desenvolvida, foi preciso ter em mente que trata-
se de um universo fantástico. Definido por Nesteryuk como:

Os universos narrativos pertencem à categoria da representação, mas


podem se apresentar de duas maneiras distintas em relação à sua diegese:
enquanto simulações de nosso universo “real” ou como naturezas próprias.
No primeiro caso, o autor busca em seu referencial imediato elementos e
relações factuais pertencentes ao seu próprio universo e os transporta para
um novo universo. (...) Já no segundo caso, o autor criar um novo universo
a partir de elementos e relações autóctones, isto é, nativas de um dado
universo e que não necessariamente guardam semelhanças com a
realidade externa à série – caso bastante recorrente em universos
fantásticos, por exemplo. (Nesteriuk, 2011, p.171)

Desta forma, situações que poderiam ser consideradas bizarras em outros


contextos, podem ser completamente normais dentro do universo da série, como
viver dentro de um ser gigante.
Para que a história e o desenvolvimento dos arcos das personagens
acontecessem de maneira orgânica, e não imposta, buscou-se criar coerência
interna para que as regras deste mundo fossem subentendidas através de ações e
falas das personagens, eliminando o risco de se tornar didático e, por isso, maçante.
38

4.4 CRIAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E APRESENTAÇÃO DE CENÁRIOS

Neste capítulo será exemplificada a criação de cenários através de um olhar


detalhado sobre a produção.
Partindo da afirmação de Nesteriuk (2014):

[...]mais importante do que pensar em ambientes internos ou externos, é


pensar o cenário em termos daquilo que os narratologistas chamam de
‘ambiência’, isto é, o ‘clima’ ou a ‘atmosfera’ que ele irá criar em cada cena.
Esse clima proporcionado pelo cenário irá afetar, de forma mais ou menos
explícita ou importante para a história, as ações que ali irão se desenrolar,
além do próprio comportamento das personagens. (Nesteriuk, 2014, pag.
174)

Os autores do projeto decidiram por se concentrar, na fase de pré-produção, na


produção de cenários que representassem da melhor forma a ambientação e clima
do roteiro previamente escrito, de maneira que alguém avaliando o mesmo dentro do
pitch bible conseguisse captar a essência do mundo fictício, mesmo observando
através de um pequeno recorte.

4.4.1.1 PROCESSO DE CRIAÇÃO DOS CENÁRIOS

Escolhida a cena do roteiro a ser retratada por completo, a produção do


cenário efetivamente começa. Neste caso, a cena escolhida para exemplificar o
processo envolve as personagens “K” e “ICE” jogando em uma máquina de pinball
no meio de um cenário que assemelha-se a um ferro-velho pós-apocalíptico.
O primeiro passo da criação foi a procura por referências. Maurice Noble,
production designer e criador de cenários das clássicas animações da Warner nos
anos 40, escreve em seu livro The Noble Approach que

Você não consegue desenhar bem uma floresta a não ser que você já tenha
estado em uma… É quase impossivel se você nunca esteve em uma. Se
você conseguir capturar a ambientação de um lugar, isso dará a seu
trabalho uma qualidade única. (Maurice Noble, 1940, pg. 17, tradução livre
dos autores)11

11
NOBLE, 1940 pg17 You can’t draw a forest really well unless you have been in one.... That’s almost
impossible to do if you have never been in one. If you can capture the feeling of a place, this will give
your work a very unique quality.
39

Mesmo que um fliperama no meio de um ferro-velho pós-apocalíptico dentro


de um animal colossal seja um cenário fictício, parte-se de referências que dariam
uma ambientação similar para o local. Fotografias de lixões, fliperamas antigos e
abandonados e desertos inexplorados foram exemplos de referências visuais, como
pode ser observado na Figura 14, que mostra um fliperama temático em Tokyo que

Figura 10 – Fliperama em Kawasaki, Japão projetado para se parecer com Kowloon em Hong
Kong.
Fonte: Said Karlsson, 2016

possui ambientação similar à planejada pelos autores, decadente e cheia de objetos.


Outros exemplos de referência é ilustrado na Figuras 15 e 16, a primeira
uma foto e a segunda uma arte conceitual, retratando ferros-velho como ambientes
caóticos porém estranhamente similares em forma e composição à desertos.
40

Figura 11 – Foto de Ferro Velho


Fonte: Steven Giffard, 2012

Figura 12 – Arte conceitual de ferro velho


Fonte: Michel Donze, Ubisoft, 2014.

Passado o período de pesquisa de referências visuais e conceituais,


passou-se a esboçar a composição do cenário pretendido.
41

Primeiro, uma idea geral de composição através de esboços:

Figura 13 – Esboço de composição geral


Fonte: Os autores, 2017.

Em seguida, os elementos são dividos em blocos definidos afim de facilitar a


visualização em perspectiva.

Figura 14 – Elementos definidos por blocos.


Fonte: Os autores, 2017.
42

Mike Yamada (2015) atenta para o fato de que, ao se retratar ambientes que
queiram passar a sensação de organicidade e naturalismo, deve-se evitar as linhas
perpendiculares entre objetos e cenário, e isso foi diretamente utilizado no processo,
como pode ser observado nas linhas mais detalhadas, porém produzindo ângulos
menos exatos dos próximos passos, como exemplificado nas Figuras 19 e 20.

Figura 15 – Blocos detalhados.


Fonte: Os autores, 2017 .

Figura 16 – Blocos detalhados com linhas refinadas.


Fonte: Os autores, 2017.
43

Com as linhas do cenário refinadas esboçou-se a composição da cena


aplicando as personagens.

Figura 17 – Composição com as personagens.


Fonte: Os autores, 2017.

Como a perspectiva, ambientação e estilo visual foram satisfatórios, o


próximo passo foi o da colorização. Demonstrando mais uma vez durante o projeto o
caráter mútavel e não-linear do processo criativo, notou-se que, talvez fosse mais
interessante para a ambientação e clima do cenário se alguns detalhes do mesmo
fossem modificados dos detalhes citados no roteiro. Ao invés da ideia prévia de que
o depósito de lixo se encontrasse dentro de uma armação de metal, os autores
acharam visual e narrativamente melhor a opção do depósito de lixo se encontrar
dentro da carcaça de um animal que, se enorme comparado aos personagens, ainda
seria apenas um “prédio” dentro do mundo construído. Esta ideia já pode ser
observada aliada à colorização na figura 22.
44

Figura 18 – Modificação da paisagem e aplicação de cor.


Fonte: Os autores, 2017.

Com as cores já definidas, definem-se as sombras e focos de luz, que


diretamente influenciam na atsmosfera do cenário, delimitando espaços que não
podemos ver no enquadramento e uma ideia geral do período do dia em que a cena
se passa, exemplificados aqui pela Figura 23.

Figura 19 – Finalização com aplicação de focos de luz e sombras adicionais.


Fonte: Os autores, 2017.
45

4.4.1.2 RESULTADOS FINAIS

Com o cenário já finalizado, e as personagens tendo sido refinadas e


coloridas, encaixa-se os dois desenhos produzidos separadamente, de forma a
testar se as perspectivas e profundidades se encaixam, e se o nível de detalhes de
um não influenciam na clareza do outro. No caso apresentado aqui, o encaixe ocorre
de maneira satisfatória.

Figura 20 – Cenário 1 finalizado


Fonte: Os autores, 2017.
46

4.5 CRIAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS PERSONAGENS

Na fundamentação teórica sobre este mesmo tema foram identificadas


formas de execução mais indicadas para a criação de personagens para este tipo de
narrativa.
O processo pode ser dividido em etapas que são:

• definição da história pregressa;


• escolha de nome;
• traçar perfil psicológico;
• criação da dinâmica visual da personagem;
• lapidar a personalidade;
• escolha de elementos relacionados e
• desenvolvimento do model sheet.

Estas etapas foram o principal guia dos autores para a criação das personagens.
Neste capítulo serão apresentadas as personagens com mais relevância para a
trama e a metodologia aplicada para conceber as versões definitivas destas.

4.5.1.1 PROCESSO DE CRIAÇÃO DAS PERSONAGENS

Neste memorial descritivo será retratado o processo de definição e


finalização da personagem principal, pois o mesmo se tornou o protótipo do modelo
de produção utilizado pelos autores para a criação do restante dos personagens.
O desenvolvimento, como ocorre frequentemente em processos criativos, se
deu de forma não-linear, com elementos da história pregressa de alguns
personagens sendo modificados durante a criação da dinâmica visual, e vice-versa.
As primeiras versões da história pregressa e do perfil psicológico existentes
desde a ideia inicial da série animada foram discutidas e lapidadas para o início da
produção. Nesteriuk (2011) define que personagens lineares são aquelas com
características genéricas e estereótipadas, já as esféricas possuem maior
complexidade e profundidade psicológica. Desta forma, procurou-se criar
47

personagens eféricas e evitar as lineares para que suas personalidades pudessem


se desenvolver ao longo dos capítulos gerando afinidade com o público. Outro
objetivo desta fase foi assumir a responsabilidade de não aplicar às personagens
estereótipos negativos de gênero ou raça, como por exemplo só criar personagens
femininas frágeis e personagens masculinas fortes e aventureiros, pois mesmo
dentro de um universo fantástico, a identificação dos espectadores com as
personagens poderiam ser prejudicadas.
Depois da definição de uma ficha biográfica contendo traços de
personalidade, história pregressa, gostos pessoais e curiosidades, deu-se por início
a etapa mais complexa da criação das personagens neste projeto: a dinâmica visual.
Além de externalizar a personalidade da personagem através de ilustrações, é
necessário assumir a função de designer de produção e especificar o estilo visual de
acordo com a história, o público alvo e o processo escolhido para a produção dos
episódios, traduzindo os conceitos e narrativas do plano das idéias para o plano
visual.
As artes criadas deveriam seguir o estilo visual apontado de forma coerente,
obrigando os artistas envolvidos a abrir mão de traços e preferências pessoais afim
de evitar distinção da autoria das ilustrações. Para que ambos os autores pudessem
visualizar e alinhar suas expectativas quanto ao estilo visual foram recolhidas
diversas referências.
Estabelecido um conceito visual que pudesse exprimir a linguagem desejada
para a série e que deveria ser seguido na dinâmica visual de todas as personagens,
foi dado início a execução dos primeiros rascunhos da personagem principal.
Nas primeiras tentativas (Figura 26), identificaram-se problemas claros na
composição e construção de personagens, que logo mostraram-se provenientes da
aplicação erronea dos conceitos de prévios de ilustração que os autores possuíam.
Por ser um processo completamente diferente, o método de criação de personagens
em uma animação segue uma lógica particular, explorada por Nesteriuk em:

Nesse processo de criação, o artista deve sempre levar em conta,


diferentemente do que acontece em um livro ou em uma história em
quadrinhos, que a personagem efetivamente se movimentará. Isso
implica, principalmente, a definição de uma anatomia coerente, que
costuma ser mais bem explorada no campo do desenho dinâmico.
Além disso, a própria técnica da animação também deve ser
considerada em suas especificidades, uma vez que possui diferentes
parâmetros e modos de produção. (Nesteryuk, 2011 p.183)
48

Figura 21 – Primeiros Rascunhos da personagem principal


Fonte: Os autores, 2017.
Além de ter uma anatomia coerente, Andra (2013) defende que o ideal é que
seu personagem possa ser reconhecido apenas pela sua silhueta. (...) Ou seja, se
você não consegue transmitir a forma geral de seu personagem e roupas em dez
traços ou menos, então você não está pensando o bastante na forma do seu
personagem. 12 As silhuetas dos primeiros rascunhos foram identificadas como
ineficientes por serem compostas por formas abstratas se tornando pouco legíveis e
impossibilitando a ilusão de volume e movimento que caracteriza a animação, além
de dificultar sua repetição e memorização. Porém, haviam dentre os esboços
elementos que agradavam ambos os autores e que poderiam ser melhores
explorados na busca de um contorno conciso para a personagem.

12
ANDRA, 2013 Ideally, you should be able to recognize your character when presented with nothing
more than their silhouette. Learn to draw different body types. (...) That is to say, if you can’t convey
the overall shape of your character and clothes in ten strokes or less, then you’re not thinking simple
enough.
49

Figura 26 – Rascunho 1
Fonte: Os autores, 2017.

A partir de alguns elementos do Rascunho 1 (Figura 26), foram exploradas silhuetas


constituídas apenas por formas geométricas, tornando a interação entre as mesmas
dinâmica e visualmente estimulante, priorizando formas contrastantes e de fácil
entendimento (Figuras de 27 a 32).

Figura 27 – Esboços de silhuetas


Fonte : Os autores, 2017
50

Figura 22 – Esboços de silhuetas


Fonte Os autores, 2017.

Figura 23 – Esboços de silhuetas


Fonte : Os autores, 2017.
51

Figura 30 - Esboços de silhuetas


Fonte : Os autores, 2017.

Figura 31 – Esboços de silhuetas


Fonte : Os autores, 2017.
52

Figura 32 – Rascunho 2
Fonte : Os autores, 2017.

Figura 33 – Esboços de silhuetas


Fonte : Os autores, 2017.
53

Estabelecida a estrutura que melhor representava visualmente a


personagem criada (Figuras 32 e 33) partiu-se para os estudos da face da
personagem (Figuras de 34 a 37).

Figura 24 – Esboços de face


Fonte : Acervo pessoal dos autores.

Figura 25 – Esboços de face


Fonte : Acervo pessoal dos autores.
54

Figura 34 – Esboços de face


Fonte : Acervo pessoal dos autores.

Figura 35 – Esboços de face


Fonte : Acervo pessoal dos autores.
55

Após definição da silhueta e face (Figura 37), partiu-se para estudos de figurino
(Figuras de 38 a 40).

Figura 36 – Esboços de figurino


Fonte : Acervo pessoal dos autores.

Figura 37 – Esboços de figurino


Fonte : Acervo pessoal dos autores.
56

Figura 40 – Esboços de figurino


Fonte : Acervo pessoal dos autores.

Além de exprimir as características psicológicas e traços de personalidade de cada


personagem, os autores do projeto estabeleceram que o figurino deveria também
retratar as condições hostis e os poucos recursos do meio em que as personagens
vivem, principalmente ao se retratar um cenário pós apocalíptico, aonde o poder de
escolha é drasticamente reduzido. Pensou-se mais no uso de cada objeto do que na
sua função estética, compondo assim um quadro levemente caótico de
sobreposições e utilização de objetos em funções diferentes das suas habituais.
Uma tampa de lata, por exemplo, poderia servir de caneleira, ou um capacete de
baseball serviria de mochila. Estabelecido o figurino (Figura 41), deu-se início ao
processo de finalização digital da personagem.

Figura 38 – Rascunho 4
Fonte : Acervo pessoal dos autores.
57

A cada passo da finalização foram geradas alternativas e discutiu-se qual


seria mais adequada a personagem. As ferramentas usadas foram o software Adobe
Photoshop e a mesa digitalizadora Wacom Cintiq.
O primeiro passo para a finalização foi construir a silhueta da personagem a
partir de figuras geométricas (Figura 42) afim de estabelecer uma estrutura bem
construída para os próximos passos.

Figura 26 – Finalização, passo 1: silhueta em formas geométricas


Fonte : Os autores, 2017

Sobre a estrutura construída foram feitos esboços da dinâmica visual da


personagem (Figura 43).

Figura 27 – Finalização, passo 2: rascunho sobre a silhueta


Fonte Os autores, 2017.
58

Os esboços foram então refinados e finalizados (Figura 44).

Figura 28 – Finalização, passo 3: finalização do traço


Fonte Os autores, 2017.

Com os traços refinados partiu-se para a aplicação de cores (Figura 45) e ajustes
finos.

Figura 29 – Finalização, passo 4: apicação de cores.


Fonte : Os autores, 2017.
59

Só após a aplicação de cores que foi possivel visualizar a dinâmica visual em


sua completude. Nesta fase foi possível observar que certas características pré
estabelecidas na fase de esboço apresentaram-se insatisfatórias, por isso os
autores julgaram necessárias modificações na orelha e no casaco da personagem
(Figura 46). O próximo e último passo foi construir o model sheet da personagem
(Figura 47) para que a dinâmica visual deste ficasse bastante clara, além de servir
como guia de anatomia própria a ser seguido no resto da produção.

Figura 30 – Finalização, ajustes finos


Fonte : Os autores, 2017.

Figura 31 – Model sheet da personagem principal.


Fonte: Os autores, 2017.
60

4.5.1.2 RESULTADOS FINAIS

Seguindo o processo exemplificado nos intens anteriores, a seguir são


demonstradas as personagens em sua versão final, após passarem por todas as
etapas de desenvolvimento de personagens.

Figura 33 – Model sheet Dum


Fonte: Os autores, 2017.

Figura 32 – Model sheet Oli


Fonte: Os autores, 2017.
61

Figura 50 – Model sheet Ice


Fonte: Os autores, 2017.

Figura 51 – Model sheet piloto


Fonte: Os autores, 2017.
62

Figura 34 – Model sheet Ruf


Fonte: Acervo pessoal dos autores.

Figura 35 – Relação de tamanho entre as personagens


Fonte: Acervo pessoal dos autores.
63

Figura 36 – Relação de tamanho entre as personagens


Fonte: Acervo pessoal dos autores.

4.6 SINOPSE

Para apresentar uma idéia é preciso reduzir todos os pensamentos e


conclusões relacionados a esta de forma inclusiva e que possa gerar interesse em
pessoas não familiarizadas com a proposta.
Na produção de uma série é necessário apresentar a ideia de forma atrativa
para investidores, afim de que a produção seja viabilizada, e nos futuros
expectadores. Para isto são criadas diferentes sinopses: sinopse tecnica e sinopse
comercial. Nesteryuk (2011) define ambas em seu livro Dramaturgia de Série de
Animação:

Antes de seguirmos adiante, é importante definirmos o termo


“sinopse” e diferenciar os seus dois tipos principais. Por sinopse
entendemos um resumo da história, no máximo, com dez linhas, que
64

apresente os elementos principais de uma determinada história.


Normalmente, é conhecida pelo grande público em seu tipo
comercial, presente nas embalagens, sites, jornais, revistas,
materiais gráficos e promocionais. A sinopse comercial é, portanto,
um tipo de sinopse voltada para o público final, e não para
avaliadores de projetos ou para a equipe de produção. Por isso
mesmo, seu texto costuma ser escrito por pessoas especializadas
em publicidade e possui estilo persuasivo: mostra algumas coisas,
ao mesmo em que desperta a curiosidade do leitor para saber outras
– o que, obviamente, só conseguirá assistindo à obra ou comprando
um produto. Além do estilo persuasivo, o texto de uma sinopse
comercial normalmente apresenta o uso de adjetivos, buscando
reforçar alguns elementos, características, críticas positivas e
eventuais premiações recebidas. [...] Já a sinopse técnica, ao
contrário, costuma ser feita ainda na pré-produção, sendo, muitas
vezes, o primeiro passo para o desenvolvimento de um episódio.
Diferentemente da sinopse comercial, esta é destinada, portanto,
para avaliadores do projeto ou para a equipe de produção, não para
o público final da série. A diferença não reside em seu tamanho, mas
nas informações apresentadas e no estilo de texto. (Nesteryuk, 2011
p.188)

Baseando-se nestes conceitos os autores desenvolveram textos explorando o


enredo da série.

4.6.1 Sinopse Técnica

Foram desenvolvidas as sinopses técnicas para quatro episódios afim de


ajudar o possível investidor a conhecer melhor a série em seu desenvolvimento
narrativo.

Episódio Piloto

Nós conhecemos nossos heróis, K, Ice e Dodo enquanto eles estão caçando
"patos". Eles são surpreendidos pela chegada repentina de uma atiradora
misteriosa, que mata os animais e trava sua mira em Dodod. O cachorro sente a
mira sobre si e reage aparentemente usando poderes psíquicos que Ice e K nunca
souberam que ele possuía. As crianças conseguem escapar e levam um dos "patos"
mortos até Dum, o tuto de K, que afirma estar sentindo "algo ruim se aproximando".
Depois de deixar algumas partes do animal com DUM, eles vão até a Lata de
Sardinha, um ferro-velho comandado pela "figura paterna abusiva" de Ice, Ruf, com
65

o intuito de jogar pinball. Ice fica extremamente irritada com o jogo e é expulsa do
local por Ruf, que aparentemente não aguenta mais os ataques de raiva da robô.
Enquanto eles andam sem direção pelo deserto, são interceptados por 3 misteriosos
seres pilotando planadores que sequestram Dodo.

Episodio 2 - Grand Theft Glider

Depois do choque inicial causado pelo encontro com os alienígenas, Ice


consegue convencer K a ir atrás de Dodo. Ela bola um plano que envolve roubar um
planador similar, guardado por Ruf dentro da Lata de Sardinha. O plano das crianças
é um sucesso e, ao passar ela casa de K para dizer adeus à Dum, eles descobrem
que este planador na verdade pertencia ao próprio Dum, que recupera parte de sua
memória apenas com o toque no antigo objeto. Revela-se que o Dum é parte da
raça alienígena misteriosa, e o velho junta-se às crianças na missão de recuperar o
resto de suas memórias e proteger K. Ao mesmo tempo, RUF descobre que foi
roubado e vai atrás do grupo com seus capangas.

Episódio 4 - Pinbal Até A Morte

O grupo, agora com o reforço de Oli, a atiradora do primeiro episódio, chega


em uma cidade onde são capturados e colocados em uma arena de gladiadores.
Eles são obrigados a participar num torneio de Pinball apresentado por Toko, o herói
que é o tema principal da máquina de pinball de Ruf. Ice e K, que não possuem o
conceito de fantasia, ficam maravilhados com a presença do "herói" e, após vencer
partidas contra diferentes times rivais, ganham o privilégio de conhecer seu ídolo.
Eles descobrem que, na verdade, Toko é um ser patético que achou sem querer
uma fantasia puída do verdadeiro Toko, e usa esse "personagem" para enganar
pessoas e agir como apresentador de diferentes tipos de eventos. Ele fica
sensibilizado com a história contada pelas crianças e decide acompanhá-los na sua
jornada, tentando se redimir e agir como um verdadeiro herói.
66

Episódio 6 - Funcionário Do Mês

Este é um episódio de flashbacks. Acompanhamos um alienígena jovem,


numa ambientação típica de escritório. Ele é parte de uma raça de conquistadores
que quer dominar o universo, e para conseguir este objetivo precisam controlar um
tipo de entidade colossal que se alimenta de mundos inteiros. Ele descobre que
acabaram de capturar uma dessas criaturas, e que ela recentemente engoliu uma
porção de um planeta chamado Terra. Tentando ser notado pelos seus superiores,
ele se voluntaria a viajar para dentro do corpo da entidade e, ao fazer isso, sofre um
acidente que o deixa com amnésia vagando sem direção pro dentro desse "mundo".
Ele é Dum.

4.6.2 Sinopse Comercial

"Flesh Pinball" é uma divertida e aventuresca série animada feita para


humanos com um gosto por coisas estranhas. Nós acompanhamos as aventuras de
K, Ice, Oli e Dum, personagens que passam por uma jornada para resgatar um,
digamos, cachorro chamado Dodo... Eles vivem em um estranho tipo de mundo
pósapocalíptico, cheio de perigos fatais a cada esquina, uma paisagem desértica
com a vibe de um “Mad Max” misturado com “Adventure Time”. Nossa turma viaja
por este mundo de carne descobrindo vilas esquisitas, personagens misteriosos e
enfrentando muitos desafios tentando salvar Dodo, enquanto resolvem mistérios
sobre as circunstâncias do mundo em que se encontram, sem esquecer de compor
seu próprio rap.
FLESH PINBALL (Pinbal de Carne) não é só um título legal. Quer dizer,
obviamente é um título bem legal, mas existe um propósito por trás. A figura do
pinball aparece muito na série. Além de ser a obsessão das duas crianças (bem,
pelo menos da ICE) e a única coisa remotamente divertida a se fazer num raio de
quilômetros, o pinball também é uma metáfora para as personagens em si. Nós
descobrimos ao longo da série que as personagens e o mundo em que eles habitam
está dentro de um monstro espacial colossal que comeu um pedaço da Terra há
muitos séculos atrás. Sabe o "chão" do deserto? Na verdade é o intestino de alguma
67

coisa. As "vilas que ficam muito longe"? Órgãos estranhos. Os túneis tão grandes
que as luzes são sugadas pra dentro? Veias. Isso porque ainda nem chegamos nas
verdadeiras origens de Dodo, o cachorro de K, que é sequestrado e dá início a toda
aventura... Explicando melhor, eles estão em um ambiente fechado, andando sem
direção e sendo impedidos por paredes e manipulados por seres de "fora" do
gabinete: Eles são a bola de Pinball.

4.7 ROTEIRO DO EPISÓDIO PILOTO

A série desenvolvida neste projeto está dentro da classificação criada por


Arlindo Machado, nomeada como séries em capítulos. Neste tipo de narrativa
seriada, os episódios não possuem histórias independente, dependendo de uma
ordem específica de consumo para um entendimento completo da narrativa. Apesar
disso, o episódio piloto foi pensado como uma vitrine para o resto da série, afim de
gerar interesse na busca por investidores e, num segundo momento, curiosidade
nos espectadores, gerando uma vontade destes de acompanhar os próximos
episódios. Ainda refletindo sobre a possibilidade de venda da série, foi estipulado o
tempo de duração de 11 minutos para cada episódio, intervalo de tempo mais
comum nas séries animadas desenvolvidas e distribuidas atualmente por grandes
estúdios.
Os personagens, mitologia e tramas devem ser introduzidos neste intervalo
de tempo de forma natural, sem abundância de diálogos extremamente expositivos.
Para isto, foram delineados arcos individuais para cada personagem que, aliados
aos aspectos psicológicos e visuais de cada um, facilitaram a geração de possíveis
resultados para cada conflito e as maneiras pelas quais estes chegariam ao final de
seus arcos.
Para que as possibilidades de busca de investimento fossem maiores, o
roteiro foi criado na língua inglesa. Assim, os autores não estariam restritos a
investimentos para produção apenas no cenário nacional. Posteriormente o roteiro
fora adaptado para a língua portuguesa. Neste momento uma simples tradução não
seria adequada, pois em qualquer outra adaptação de narrativa, é preciso adequar
68

as falas para o contexto de cada língua usando-se da linguagem informal e coloquial


afim de soar natural aos ouvidos de um espectador nativo.
O roteiro foi escrito no software CELTX, afim de se manter no padrão da
indústria do entretenimento.

5 DESENVOLVIMENTO DO PITCH BIBLE

Seguindo os preceitos apresentados no capítulo 3.5 deste documento,


compilou-se o trabalho desenvolvido de forma a apresentar a idéia geral da série
animada de uma forma acessível e de fácil entedimento. Produziram-se textos com
o espírito descontraído equivalente ao da narrativa e ilustrações que, além de
chamarem a atenção visualmente, ainda exprimiam características dos personagens
e situaçõeschaves do enredo, de forma a transmitir um panorama geral do projeto. O
resultado foi um projeto gráfico que possui 32 páginas, no formato de 14,8cm x
21cm. Este formato foi escolhido pois, além de ser de fácil visualização no ambiente
digital com dimensões confortáveis para uma tela, são de fácil transporte e tamanho
acessível para manuseio quando impressos. Além disso, ainda valoriza as
ilustrações pelo tamanho parecido com um formato de produção de conteúdo
audiovisual atualmente, o widescreen.

Figura 54 – Capa
Fonte: Os autores, 2017
69

O pitch inicia-se com uma breve descrição da série como um todo,


assemelhando-se à Sinopse Comercial (fig. 55).

Figura 55 - Sinopse Comercial


Fonte: Os autores, 2017

Em seguida, a analogia do título é explicada (fig. 56).

Figura 56 – Analogia Explicada


Fonte: Os autores, 2017

Passadas as introduções, apresenta-se os personagens, unindo breves


descrições dos mesmos com ilustrações pré-produzidas. (Fig. 57 a 62)
70

Figura 57 – K
Fonte: Os autores, 2017

Figura 58 – Ice
Fonte: Os autores, 2017

Figura 59 – Oli
Fonte: OS autores, 2017
71

Figura 60 – Dum
Fonte: Os autores, 2017

Figura 61 – Ruf
Fonte: Os autores, 2017

Figura 62 – Pilot
Fonte: Os autores, 2017
72

Depois de apresentadas as personagens, parte-se para a descrição do arco


geral da temporada, com começo meio e fim da história completa. (fig. 63 e 64)

Figura 63 – Arco geral 1


Fonte: Os autores, 2017

Figura 64 – Arco Geral 2


Fonte: Os autores, 2017

Na última parte do pitch bible, detalha-se por completo 4 episódios, com sua sinopse
e uma imagem ilustrativa para cada. (fig. 65 a 69)
73

Figura 65 – Flesh Pinball EP


Fonte: Os autores, 2017

Figura 66 – Grand Theft Glider EP


Fonte: Os autores, 2017

Figura 67 – Pinbal To The Death EP


Fonte: Os autores, 2017
74

Figura 68 – Emplyee of The Month EP


Fonte: Os autores, 2017
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É difícil afirmar quando algo está concluído, ainda mais quando se trata de
projetos desenvolvidos a partir de um processo criativo que culmina em uma criação
artística. Os resultados deste projeto em particular são subjetivos por estarem no
limiar de uma criação artística e uma produção mercadológica. Um dos desafios foi
englobar o processo inteiro com começo, meio e fim de criação de um pitch em um
tempo pré definido por fatores externos, no caso, a duração do trabalho de
conclusão de curso da universidade.
Apesar dessa dificuldade, os autores foram capazes de atingir os objetivos
propostos no início deste projeto a partir dos conhecimentos e habilidades
adquiridas durante a graduação. Diversos conceitos abordados pela grade curricular
dos cursos Bacharelado em Design e Tecnologia em Design Gráfico foram
revisitados e utilizados na prática da criação da série animada. Habilidades como
construir composições visualmente agradáveis e a melhor forma de comunicação de
uma ideia, sendo esta em forma de narrativa ou não, uso de cores e perspectiva
foram lapidadas ao longo deste um ano e meio.
Entretanto, na opinião dos autores, apesar da graduação ter fornecido uma
base para que esses pudessem se construir como profissionais em design, a grade
curricular é ultrapassada e pouco se enquadra nas exigências do mercado atual.
Outro fruto deste trabalho foi a consolidação da ideia pré-concebida pelos autores de
que a criação de um projeto audiovisual não é uma tarefa individual. São exigidas
diferentes habilidades e visões singulares em cada etapa e a associação com
diferentes profissionais se faz necessária para que o resultado seja satisfatório.
Apesar da equipe e dos recursos para este projeto serem limitados, os autores
consideram satisfatórios os resultados pois todas as etapas do processo e do
produto final foram feitas de acordo com os preceitos e exigências da indústria em
que esse está inserido. Apesar de se apoiar em padrões estilísticos e
mercadológicos já testados e consagrados o trabalho final continua sendo
completamente autoral, apenas pode ser apresentado para uma gama maior de
público.
O objetivo de um trabalho de conclusão de curso é demonstrar na prática
que os formandos estão aptos a desempenhar o papel de designer em uma
76

condição de trabalho real concatenando os conhecimentos e prática aprendidos


durante os anos de graduação e o fato do produto final resultante desse trabalho, o
pitch bible, estar em padrões profissionais desta indústria demonstra que o objetivo
da tarefa foi concluído.
77

REFERÊNCIAS

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Screenwriting. Edição 1. Estados Unidos: Harper Collins, 1997.

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80

GLOSSÁRIO

PITCH BIBLE – uma espécie de apresentação comercial em que se buscam


parceiros para a coprodução de séries.

PRODUCTION BIBLE – modelo utilizado pela indústria de animação para padronizar


a forma de compilar e apresentar a metodologia de projeto de uma série de
animação.

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