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Dez teses sobre a lógica de competição no setor de

serviços

1. Questões de mobilidade e espaço passaram a ser resolvidas de


outra forma. Entre as demandas não atendidas, mal atendidas ou
previamente sujeitas a elevado grau de ineficiência, estão os serviços
ligados direta ou indiretamente ao aspecto da mobilidade. Neste campo,
inicialmente a combinação dos avanços de telecomunicações e
informática abrangeu mais intensamente a disponibilização de bens
virtuais (escritos, mensagens, produção cultural e jornalística, etc.). Parte
das iniciativas teve a ver com a supressão da mobilidade e de meios de
armazenamento que se tornaram dispensáveis (mensagens,
documentação, uso de plataformas no lugar do papel, notícias, música,
filmes, programas televisivos). A ampliação deste movimento teve a
forma de mais complexa mudança na maneira de oferecer os serviços
(educação, entretenimento organizado, jogos de azar). O progresso
nessa área tem sido mais recentemente representado pela busca de
ganhos de eficiência baseados em novas formas de conduzir processos
físicos inescapáveis (entrega de bens físicos, racionalização de processos
de compras, organização logística, etc.). Não são fases estanques de um
processo de evolução, e sim frentes que se desenvolveram em paralelo e
cumulativamente.

2. A lógica competitiva tem a ver com a posição de pioneiro. A


expansão dos negócios voltada para a ocupação de espaços de mercado

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(territoriais ou em sentido abstrato) é uma corrida na qual os agentes
procuram ocupar primeiro um espaço, servir-se da posição de pioneiro,
obstaculizar a entrada e a presença de concorrentes e buscar domínio
crescente evitando imitações.

3. Sob incerteza, aprendizado e experimentação se tornam ainda


mais importantes. Em um primeiro momento anterior à fase de
consolidação de um agente que se revelará dominante, o movimento de
expansão exige experimentação intensa e capacidade de
aproveitamento dos resultados de experimentos, isto é, de orientação
para o aprendizado. Ocasionalmente, enquanto agentes concorrentes
operam em paralelo em frentes variadas, o processo gera também
canibalização ocasional e alguma destruição de capital. A cada agente
cabe tentar otimizar a relação entre o custo do aprendizado e o
aproveitamento das vantagens competitivas que pode gerar, enquanto
acompanha as inovações de seus concorrentes mais próximos.

4. Insuficiência de ações defensivas pode inviabilizar o resto. Além


do custo/benefício do aprendizado, outra dimensão a ser conduzida pelo
agente é a do tackleamento (obstaculização) dos avanços dos
concorrentes, que se torna mais fácil depois de ocupar uma posição
pioneira. A capacidade de barrar entradas de novos concorrentes no
mercado ou investidas de concorrentes já operantes depende em parte
da percepção deles quanto ao grau de avanço do know-how adquirido e
desenvolvido pelo agente principal; quanto ao custo que o agente
dominante consegue imprimir à operação; e quanto ao volume de
investimentos que o concorrente despenderia para se situar em posição
competitiva.

5. Ações de defesa inibem a imitação. Insuficiência de ações de


dissuasão implicaria presença de iniciativas de imitação, pelos
concorrentes, das ações e escolhas do agente principal. As
consequências da imitação são o aumento da sensibilidade do mercado
a preço, causada pela possibilidade que o cliente passa a ter de substituir
um agente ofertante por outro. A competição então se intensifica
enquanto os ganhos individuais de agentes já instalados tendem, na
média, a se reduzir.

6. Aprendizado é variável a ser monitorada em separado. Negócios


marcados por elevada incerteza e pioneirismo (como é o caso de
startups mas não somente delas) têm de encontrar meios para gerir da
melhor forma o custo/benefício do aprendizado, em especial na fase
inicial de um projeto em que recursos são queimados e o saldo líquido
acumulado de fundos do próprio negócio é negativo. Esta melhor forma
possível de gestão tem a ver com o monitoramento dos investimentos e
o emprego de métricas adequadas para medir os resultados dos esforços
voltados para o aprendizado.

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7. Deve ser aproveitada a vantagem dissuasora de chegar
primeiro. A ocupação inicial de um mercado se vincula à formação
pelos clientes de hábitos adequados, à consolidação de uma imagem
diferenciadora e à força do know-how desenvolvido, à prática de custos
difíceis de igualar pelos concorrentes e à manutenção de padrões de
qualidade difíceis de imitar. Respectivamente, tais condições gerariam
no potencial concorrente a impressão de que os volumes de recursos
necessários para emulação seriam muito elevados, que a operação exige
conhecimentos de que ele próprio não dispõe e teria de adquirir sob
algum ônus, e que não conseguiria operar a menor custo ou acima de
um nível aceitável de qualidade.

8. Deve haver uma engenharia avançada de ocupação de novos


espaços, sejam eles físicos ou astratos. Conformada por condições
avançadas de desenvolvimento e absorção de tecnologias, a busca de
posições próximas do monopólio em mercados em que a concorrência
não é impedida por dispositivos regulatórios depende de boa gestão dos
custos de aprendizado e dos custos de consolidação da posição
competitiva do agente. Em termos concretos, o agente deverá gerir
satisfatoriamente coisas como as seguintes: a reputação para que se
diferencie de outros agentes presentes ou potenciais; o processo de
escolha e ocupação física de novos territórios; a velocidade do
aprendizado, seu aproveitamento e custo; os custos de implantação; os
custos de operação e a qualidade dos serviços.

9. A essência da lógica de competição monopolística não se


altera. Estes elementos correspondem ao conjunto de postulados
tradicionalmente associados ao conceito de competição monopolística,
condicionados pelo estado de avanço dos instrumentos de apuração de
dados, promoção técnica de mudanças e aferição de resultados. O
processo competitivo deverá receber efeito intensificador originado da
importância de consolidar uma posição antes dos concorrentes em
mercados que têm uma característica importante: o pioneirismo se
associa a elevado potencial de ganhos, isto é, por ser atrativo torna
cogitáveis grandes somas de investimento.

10. A eficácia da competição depende também dos controles. Tais


elementos apontam para a importância de ter bons controles
(financeirose não-financeiros) das operações de negócios que operam
sob elevada incerteza, especialmente aqueles cujos mercados ainda nem
existem ou estão em fase inicial de construção. A engenharia de controle
deve permear o conceito da operação como um todo, ao invés de vir a
reboque dela. Isto significa ter um projeto no qual números e controles
sejam elementos organicamente concebidos, e não reativos, com
métricas adequadas e real disposição para que ensaios e erros
aconteçam com liberdade porém sem desperdícios.

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José Luís Neves é profissional da área de planejamento e finanças.
Administrador e economista, tem mestrado em Administração pela USP. Possui
mais de 20 anos de experiência como gestor de finanças e controller, conduzindo
processos de controladoria, financeiro e contábil em empresas de serviços. Reside
em São Paulo, SP.

Outros artigos que escrevi podem ser encontrados aqui.

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