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1 Primeiras noções

O conceito de função é nada mais do que a formalização de um raciocı́nio fre-


quente desde a Antiguidade: a relação entre duas ou mais grandezas variáveis.
Nos dias atuais, as funções são fundamentais para o estudo de diversos fenômenos
nas mais diversas áreas do conhecimento, como na biologia, economia, bioquı́mica,
fı́sica, etc. Podemos partir da situação em que, a partir do preço da unidade
de um produto, estimamos o valor de uma quantidade arbitrária de produtos.
Suponha que o valor unitário de determinado produto seja 6 reais.

Quantidade Valor total


1 6
2 12
3 18
... ...
x 6x

Perceba que, nesse curto contexto, já conseguimos diferenciar o comportamento


das duas grandezas: o preço total varia em função da quantidade de produtos.
Sendo assim, podemos chamá-las, respectivamente, de variável dependente e
variável independente.
Considerando y igual ao valor total e x igual à quantidade de produtos, podemos
formular uma relação entre elas:

y = 6x

A fim de termos relações que podem ser de fato analisadas e incorporadas a


teorias, foi feita uma definição formal de função que usa noções de conjuntos:

Dados dois conjuntos X e Y não nulos, uma relação qualquer entre


os elementos dos conjuntos é chamada de função de X em Y se, e
somente se, qualquer elemento de X se relacione apenas com um
elemento de Y
Em notação matemática, temos:

f função de X em Y,f : X → Y ⇐⇒ (∀x ∈ X, ∃!y ∈ Y |(x, y) ∈ f )

Exemplos
Vamos agora a alguns exemplos:

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Exemplo 1

Figura 1:

Perceba que, mesmo existindo um elemento ”sobrando”no conjunto B, essa


relação está de acordo com a definição. Uma função matemática que representa
a situação é f : A → B, f (x) = x + 1

Exemplo 2

Figura 2:

Observe que o fato do 0, do conjunto A, estar relacionado com 3 elementos


diferentes do conjunto B impede que façamos qualquer relação matemática entre
os conjuntos. Este é um caso tı́pico de relação que não é função.

Exemplo 3

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Figura 3:

Note que os elementos 1 e -1, do conjunto C, se relacionam com o mesmo


elemento do conjunto D. No entanto, isso não impede que encontremos uma
relação matemática: f : C → D, f (x) = x2

2 Domı́nio e imagem
Dada uma função f : A → B, o conjunto A se chama domı́nio(D) ou conjunto
de entrada da função, enquanto o conjunto B se chama contra-domı́nio(CD) ou
conjunto de saı́da da função. Para cada x ∈ A, o elemento y ∈ B com o qual
ele se relaciona é chamado de imagem de f de x, sendo representado por f (x).
Assim, y = f (x).

Figura 4: Representação esquemática

O conjunto de todos os y assim obtidos é chamado conjunto imagem da


função e é indicado por Im(f ). Note que o conjunto Im(f) é um subconjunto do
contra-domı́nio: dessa forma, ele sempre respeita a condição Im(f ) ⊂ B.
Determinar os conjuntos domı́nio e imagem de uma função se resume a analisar
e observar casos que devemos evitar. Abaixo, temos alguns exemplos:

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Exemplo 1
Seja f uma função tal que f : R → R, f (x) = x2 .
Inicialmente, vemos que todos os números reais podem ser elevados ao quadrado
sem problema. Então, podemos concluir que D(f ) = R.
Sabemos que elevar um número real ao quadrado resulta sempre em valores
positivos. Assim, nenhum elemento negativo pertence ao conjunto imagem.
Portanto, temos: Im(f ) = R+

Exemplo 2
Seja f uma função tal que f : R → R, f (x) = x1 .
De inı́cio, percebemos que há um único elemento dos reais que não pertence
ao domı́nio da função: o 0. Isso se deve ao fato da divisão por 0 ser uma
indeterminação, ou seja, é impossı́vel calcular o valor da expressão. Portanto,
concluimos que o domı́nio é o conjuntos dos reais com exceção do 0. Isso pode
ser escrito de duas formas: D(f ) = R∗ ou D(f ) = R − {0}.
Com o domı́nio devidamente determinado, podemos dividir 1 por qualquer real
não-negativo. A função poderá assumir qualquer valor real que não seja o 0,
isto é: Im(f ) = R∗

Exemplo 3
Seja f uma função tal que f : R+ → R, f (x) = x+2
x+1 .
Novamente, devemos nos atentar ao caso em que o denominador seja nulo.
Temos que
x + 1 = 0 ⇐⇒ x = −1,
o que é impossı́vel de ocorrer no domı́nio de f, que só tem os reais positivos.
Assim, concluimos que D(f ) = R+ .
Para a determinação do conjunto imagem, devemos fazer uma breve análise
do comportamento da função. Como o domı́nio da função é o conjunto dos
reais positivos, podemos começar essa análise pelo 0. Quando x = 0, temos
f (0) = 2+0
1+0 = 2. Usando valores arbitrários, podemos ter uma visão mais geral:

x f(x)
0 2
3
1 2 = 1,500
4
2 3 = 1,334
5
3 4 = 1,250
... ...
1002
1000 1001 = 1,00099

Como interpretamos esses valores?


Pelo fato do numerador da função ser sempre maior do que o denominador,
esperamos que ela tenha valores máximo e mı́nimo. Nós descobrimos o primeiro
valor logo de cara: quando x = 0, f(x) vale 2, seu valor máximo. No entanto,

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quando atribuimos valores cada vez maiores a x, percebemos que nunca atin-
gimos exatamente 1, mas sim nos aproximamos a ele o quanto quisermos. Isso
quer dizer que o conjunto imagem é igual ao seguinte intervalo:

Im(f ) = {x ∈ R+ |x ≤ 2 e x > 1}

3 Gráfico de uma função


Dada uma função f : A → B, o seu gráfico é conjunto formado por todos os
pares ordenados (x, f(x)), sendo x ∈ A e f (x) ∈ B. Em uma linguagem mais
formal,
G(f ) = {(x, y)|x ∈ A, y ∈ B e y = f (x)}
O estudo de uma função através do seu gráfico pode torná-lo mais fácil. To-
mando o terceiro exemplo da última parte,

Figura 5:

Percebe-se que o desenho do gráfico nos fornece, quase diretamente, as in-


formações que obtivemos anteriormente.
Uma observação interessante é que, através do gráfico, podemos saber também
se uma relação é ou não uma função. Geometricamente, isso corresponde a dizer
que qualquer reta perpendicular ao eixo das abcissas só intercepta o gráfico uma
única vez (ver figura 6 na página seguinte).
Nas duas imagens acima, podemos dizer que somente a primeira representa
uma função.

Análise gráfica de funções


1) Podemos descobrir onde a função é positiva (f (x) > 0), negativa (f (x) < 0)
ou nula (f (x) = 0). Os pontos em que ela se anula são chamados raı́zes
ou zeros da função.

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Figura 6:

2) Podemos descobrir os intervalos de crescimento ou decrescimento de uma


função. A função é crescente se, em um determinado intervalo, um ele-
mento x1 ser menor que um elemento x2 sempre implicar em f (x1 ) ≤
f (x2 ). Analogamente, uma função é decrescente se, em determinado in-
tervalo, um elemento x3 ser menor que um elemento x4 sempre implicar
em f (x3 ) ≥ f (x4 )

x1 < x2 ⇒ f (x1 ) ≤ f (x2 )(função crescente)


x3 < x4 ⇒ f (x3 ) ≥ f (x4 )(função decrescente)
Veja o exemplo abaixo sobre a análise gráfica da seguinte função f : R → R,
sendo f (x) = 0, 1(x2 + 4x)(x − 2):

Figura 7: Gráfico da função f

1) f (−4) = f (0) = f (2) = 0, sendo assim, -4, 0 e 2 são raı́zes de f


2) Para x < x1 ou x > x2 , temos intervalos em que f é crescente

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3) Para x1 < x < x2 , temos um intervalo em que f é decrescente
4) Para x < −4 ou 0 < x < 2, temos intervalos em que f é negativa
5) Para −4 < x < 0 ou 2 < x, temos intervalos em que f é positiva

4 Função injetora, sobrejetora e bijetora


Função injetora
Uma função f : A → B é injetora quando não há um elemento em B que seja
imagem de mais de um elemento em A. Ou seja,

x1 6= x2 em A ⇒ f (x1 ) 6= f (x2 ) em B

Perceba que, das duas funções representadas, apenas a primeira é injetora.

Figura 8:

Uma observação importante é que podemos determinar se uma função é ou


não injetora apenas olhando para seu gráfico. Imaginando linhas horizontais
cruzando o gráfico em diversos pontos, uma função injetora é aquela cujo gráfico
nunca será cruzado mais de uma vez por uma mesma linha.

Figura 9: Perceba que somente a função b) é injetora

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Função sobrejetora
Uma função f : A → B é sobrejetora quando todo elemento de B é imagem de
algum elemento de A, ou seja, Im(f ) = B. Exemplos:

f : R → R dada porf (x) = x + 2 é sobrejetora, pois todo elemento de R pode


ser obtido pela função f. Assim, Im(f ) = R
f : R → R dada porf (x) =| x | não é sobrejetora, pois a imagem da função
módulo é sempre positiva, portanto Im(f ) 6= R

Função bijetora
Uma função f : A → B é bijetora se, e somente se, for injetora e sobrejetora.
Discutiremos se as seguintes funções são ou não bijetoras:

Figura 10:

a) Por conta de f (1) = f (4), sabemos que f não é injetora. Apesar de ser
sobrejetora (Im(f ) = B), f não é bijetora

b) Sabemos que f é injetora, mas pelo fato do elemento 7 não pertencer a Im(f ),
concluimos que f não é sobrejetora e nem bijetora
c) Notando que f (2) = f (7) = f (9) e que {6, 7} ∈
/ Im(f ) ⇒ Im(f ) 6= B, f não
é nem injetora e nem sobrejetora – muito menos bijetora

d) Pelo fato de f (1) 6= f (4) 6= f (6) e Im(f ) = {2, 5, 9} = B, concluimos que f


é bijetora

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5 Função par e ı́mpar
Uma importante propriedade de uma função é relacionada a sua simetria com
o eixo Oy. Essa propriedade é a paridade da função.

Função par
Seja f : A → B. Uma função é par se, para todo x ∈ A, tivermos:

f (x) = f (−x)

. Como exemplos de funções pares, podemos citar:


ˆ f : R → R, f (x) = xn , sendo n um natural par

ˆ f : R → R, f (x) = |x|

ˆ f : R∗ → R, f (x) = 1
x2

ˆ f : R → R, f (x) = c, sendo c uma constante real qualquer

Função ı́mpar
Seja f : A → B. Uma função é ı́mpar se, para todo x ∈ A, tivermos:

f (x) = −f (−x)

Como exemplos de funções ı́mpares, podemos citar:


ˆ f : R → R, f (x) = xn , sendo n um natural ı́mpar

ˆ f : R∗ → R, f (x) = 1
x

6 Função inversa
Seja f : A → B uma função bijetora(condição necessária). Então, sua função
inversa será aquela que relaciona os elementos da imagem aos elementos do
domı́nio de f .
f : A → B ⇒ f −1 : B → A
(x, y) ∈ f ←→ (y, x) ∈ f −1
Há um método para determinar funções inversas que consiste em trocar as
variáveis de lugar: primeiro, chamamos x de f (x)−1 e f (x) de x; depois, iso-
lamos f (x)−1 para que a expressão fique mais clara (geralmente chamamos
a função inversa, por exemplo, de g(x) ou h(x), para que a notação não fique
muito cansativa). Faremos alguns exemplos para que o método fique mais claro.
Perceba, nos exemplos a seguir, que os gráficos das funções f (x) e f (x)−1 são
perfeitamente simétricos com relação à reta y = x.

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Figura 11: Representação genérica de função inversa

Exemplo 1
Seja f : R → R, f (x) = x + 1.
Como dito antes, devemos primeiramente trocar as variáveis de lugar. Ficaremos
com
f (x) = x + 1 ⇒ x = f −1 (x) + 1
. Consideramos f −1 (x) = g(x) e então a isolamos de x

f −1 (x) = g(x) = x − 1

Verifique que,para cada par (a, b) pertencente a f (x), existe (b, a) pertencente
a f −1 (x)

Figura 12: Gráficos da função e da inversa

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Exemplo 2
Seja f : R → R, f (x) = x2 .
Vemos que, por f não ser injetora (f (x) = f (−x), para todo x ∈ R) e nem
sobrejetora (Im(f ) 6= R), f não admite função inversa.

Exemplo 3
Seja f : R+ → R+ , f (x) = x2 .
Trocando as variáveis de lugar, temos que

f (x) = x2 ⇒ x = (f −1 (x))2

. Consideramos f −1 (x) = h(x), lembrando que a função h é tal que h : R+ →


R+ 1 concluimos que √
f −1 (x) = h(x) = x
.

Figura 13: Gráficos da função e da inversa

Exemplo 4
Sejam os conjuntos A e B tais que A =] −π π
2 , 2 e B =] − inf, inf[ Seja f : A → B,
f (x) = tg(x). Sabemos que a função tangente é bijetora e, portanto, é invertı́vel
(abordaremos mais essa função nas aulas de trigonometria). A função inversa
j, tal que j : B → A é:

f −1 (x) = j(x) = arctg(x)

1 se a função f fosse de R a R, ela não seria bijetora e, portanto, não invertı́vel

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Figura 14: Gráficos da função e da inversa

7 Função composta
Sejam f e g duas funções tais que f : A → B e g : B → C. Uma função com-
posta é aquela que é formada por duas ou mais funções. Uma função composta
contendo f e g, por exemplo, pode ser da ou forma h = g(f (x)) ou h = g ◦ f
(lê-se ”g de f de x”ou simplesmente ”g de f”).

Figura 15: Representação com conjuntos de uma função composta

Veremos alguns exemplos de como se determinar uma função composta:

Exemplo 1
Sejam f e g tais que f : R → R, f (x) = 10x3 + x2 − 9x + 13 e g : R → R,
g(x) = 2x + 7. Determine h(x) = g ◦ f .
Como ponto de partida, é interessante lembrar que g ◦ f = g(f (x)). Com isso,

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podemos dizer que:

h(x) = g(f (x))


= g(10x3 + x2 − 9x + 13)
= 2(10x3 + x2 − 9x + 13) + 7
h(x) = 20x3 + 2x2 − 18x + 33.

Exemplo 2
Sendo as funções f e g tais que f (x) = x2 + 2x + 1 e g(x) = −2x − 1, determine
a lei que define f (g(x)) e g(f (x)).
Começaremos com f (g(x)):

f (g(x)) = f (−2x − 1)
= (−2x − 1)2 + 2(−2x − 1) + 1
= 4x2 + 4x + 1 − 4x − 2 + 1
f (g(x)) = 4x2 .

Agora, vamos para g(f (x)):

g(f (x)) = g(x2 + 2x + 1)


= −2(x2 + 2x + 1) − 1
= −2x2 − 4x − 2 − 1
g(f (x)) = −2x2 − 4x − 3.

Este exemplo serve como exemplo para a seguinte observação: no geral,


f ◦ g 6= g ◦ f .

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