Você está na página 1de 16

(https://www.cartamaior.com.br)

APOIE A CARTA MAIOR


DISPONÍVEL PARA TODOS, FINANCIADA PELOS LEITORES

DOE AGORA  (HTTP://BIT.LY/CMPARCEIROS)

SOU APOIADOR 
(HTTPS://WWW.CARTAMAIOR.COM.BR/LIBERAACESSOENTRAR.CFM)

Economia Política

Sofismas da
composição:
Economia como
sistema
complexo
A análise da economia como sistema
complexo supera a dicotomia micro-
macro. Permite visualizar as redes de
relacionamento entre o todo e as
partes. É a visão holística ou sistêmica,
uma exigência para se enfrentar os
dilemas atuais
Por Fernando Nogueira da Costa

08/04/2019 17:06

Créditos da foto: (Reprodução)

O conhecimento específico dos


economistas é o macro sistêmico.
Os leigos tomam decisões com
base em experiência vivenciada,
aprendida na “escola da vida”, ou
através de tentativa-e-erros. A
Economia Neoclássica considerava
todos os agentes econômicos como
seres racionais. A Economia
Comportamental verifica seus
erros serem repetidos.

Errar é humano. Repetir erro


também. Prova maior: segundo
casamento, a vitória da esperança
sobre a experiência. Ou a vitória
da paixão emocional e narcisista –
se ver belo(a) nos olhos da outra
pessoa – sobre a razão.

A abordagem clássica da Economia


Política dá ênfase às relações
estabelecidas entre os indivíduos
em suas atividades econômicas:
produção, distribuição, compra-e-
venda, financiamento etc. A
abordagem neoclássica busca
teorizar a capacidade humana de
fazer melhores escolhas, em face
de múltiplos fins e de diversos
meios para alcançá-los.

Hobbes, em 1651, encarou a


sociedade como sendo a
organização social resultante das
interações de indivíduos
mecanicamente determinados.
Desde o Renascimento, os
indivíduos tomaram consciência
de si mesmos como um ser
apartado específico, atuando de
modo diferente do
comportamento da coletividade.

Para o individualismo
metodológico, adotado por John
Stuart Mill (1872), avant la lettre,
as leis dos fenômenos sociais
podem ser apenas resultantes das
ações individuais. Porém, as
decisões de cada pessoa só são
compreensíveis por outra pessoa
observadora se ambas estão
conectadas. Cada indivíduo
experimenta, pensa, age e
compreende dentro de uma esfera
comum a muitos.

Para o holismo de Auguste Comte


(1896), uma sociedade não é mais
decomponível em indivíduos do
que a decomposição de uma
superfície em linhas ou de uma
linha em pontos. Durkheim (1893)
acreditava no determinismo social
dos indivíduos, onde todos os
fenômenos supra orgânicos são
entendidos como de origem social,
em contraste com os postulados
do “dogmatismo psicológico”. Em
contraponto, para Max Weber
(1903), o significado subjetivo
atribuído pelos atores humanos às
suas ações, em suas orientações
mútuas, está dentro de um
contexto social-histórico
específico. Ele enfatizou tanto a
generalização causal quanto a
compreensão humana autônoma.
Acreditava o individualismo
metodológico ser o caminho mais
seguro na pesquisa, exorcizando “o
espectro das concepções coletivas”.

A expressão “individualismo
metodológico” foi cunhada por
Joseph A. Schumpeter (1942).
Influenciou, entre outros, Hayek
(1948) e Popper (1966). Para eles, os
fenômenos sociais deveriam ser
vistos como resultantes da ação
humana. “Nunca devemos ser
satisfeitos por uma explicação em
termos de os chamados coletivos”.

O individualismo metodológico é
contrastado pelo holismo ou
organicismo sociológico. Nesta
última visão, os sistemas sociais
constituem “totalidades” no
sentido de alguns dos seus
comportamentos, em grande
escala, serem regidos por leis
macro essencialmente
sociológicas. São sui generis e não
explicadas como meras
regularidades ou tendências
resultantes do comportamento
agregado de ações dos indivíduos.

Pelo contrário, os
comportamentos individuais
deveriam, de acordo com o
holismo, ser explicados pelo
menos em parte em termos de leis
de movimento social. Levaria em
conta, primeiro, os papéis dos
indivíduos nas instituições,
depois, as funções sistêmicas
dessas instituições. São restrições
criadas para dar forma às
interações humanas.

Então, o individualismo
metodológico supõe os seres
humanos como os únicos agentes
no movimento da história. Por sua
vez, o holismo metodológico
observa fatores sobre-humanos
em ação na história. Essas duas
alternativas são exaustivas das
possibilidades?

Se a microeconomia é composta
por teorias das decisões e a
macroeconomia é a resultante
incerta dessas decisões
descentralizadas, descoordenadas
e desinformadas umas das outras,
há uma nítida divisão entre uma –
ações ex-ante – e outra –
resultados ex-post? Uma investiga
as causas apriorísticas e outra
reflete a respeito dos resultados a
posteriori? No mundo real, há
uma nítida linha de separação
entre o atomismo dos agentes
econômicos e o pressuposto
equilíbrio sistêmico?

A ortodoxia supõe a
homogeneidade dos agentes,
porquanto todos detêm a mesma
racionalidade e informações
perfeitas. Torna então possível a
ideia de a macroeconomia ser
mera agregação de ações
individuais. Mas se a heterodoxia
prova serem irrealistas as
premissas de racionalismo, preços
livres em mercados competitivos e
simetria de informações, é
possível deduzir macroeconomia
de comportamentos
heterogêneos?

Hoje, economistas atualizados


enxergam a economia como um
sistema complexo. Nela há
heterogeneidade comportamental,
mas a ação coletiva tem uma
lógica própria. Ela é possível de
ser captada e entendida, quando
se consideram os principais elos
de interconexões das interações
entre agentes heterogêneos com
racionalidade limitada.

A economia é um componente de
um sistema descentralizado, cuja
auto-organização é irregular e
instável. Sua evolução é dinâmica
e não linear, ou seja, varia ao
longo do tempo, quando os
indivíduos vão aprendendo e
adaptando os seus
comportamentos a cada meio
ambiente natural e/ou
institucional.

Há dependência de trajetória face


às condições iniciais em algum
lugar impreciso do passado
desconhecido. Historiadores se
dedicam a fazer previsões de o que
ele de fato foi, mas economistas
não sabem com precisão quando
ocorreram as condições iniciais.
Sabem apenas a trajetória caótica
da economia significar o
afastamento delas.

Acham o sistema complexo ser


historicamente determinado,
porque seu atual estado tem
particularidades resultantes de
acontecimentos específicos
prévios. São causas primárias, mas
elas já podem ter sido
ultrapassadas e o movimento
inercial sistêmico permanecer.
Impossibilita o ataque às causas.
Exige a regulação sistêmica no
presente.

A análise da economia como um


sistema complexo, emergente das
interações entre seus
componentes, supera a dicotomia
micro-macro. Permite visualizar
as redes de relacionamento entre
o todo e as partes. Aristóteles já
estudava os argumentos sofísticos,
“quando se alega aquilo verdadeiro
para a parte ser, por esse motivo,
também verdadeiro para o todo.”

A definição de sofismo mudou


bastante ao longo dos séculos:
atualmente, significa um
pensamento ou retórica indutiva
ao erro. Na Grécia Antiga, o termo
era utilizado no sentido de
“transmitir sabedoria” através de
técnicas de retórica e
argumentação. Etimologicamente,
sofismo vem de sophia, cujo
significado é “sabedoria”.
O Sofisma da Composição, em
Economia, ressalta: o todo não é a
mera soma das partes como
aparenta ser. Os economistas são
obrigados a analisar os efeitos
sociais inesperados de todas as
decisões individuais, porque nem
sempre o que é bom e correto para
os indivíduos é o melhor para a
sociedade.

Se todo mundo ficar em pé para


assistir a um jogo de futebol,
ninguém o verá bem e
confortavelmente. Inúmeros
exemplos análogos podem ser
dados em Economia.

Por exemplo, a remarcação de


preços pode aumentar o lucro de
quem iniciar o processo, mas sua
dinâmica interativa poderá
resultar em inflação. Em um
processo de retroalimentação,
todos agentes econômicos podem
perder poder aquisitivo real.

Cortar empregos pode ser racional


sob o ponto de vista de um
empresário. Mas salário
representa, ao mesmo tempo,
custo trabalhista e demanda
social. Se todos desempregam, a
classe empresarial sentirá falta de
demanda agregada.

Poupança é uma virtude


individual, mas se o corte do
consumo for generalizado
resultará no Paradoxo da
Parcimônia: cairão as vendas,
aumentará a capacidade produtiva
ociosa, desempregará gente,
reverterá decisões de
investimentos, diminuirá a renda
e, em consequência, a poupança
futura.

Os banqueiros pensam ser apenas


intermediários financeiros entre
recursos de terceiros e tomadores
de empréstimos. Desconhecem o
efeito rede bancária capaz de
multiplicar a moeda escritural
captada sob forma de depósitos à
vista. Como classe, criam moeda.

Se o governo corta gastos sociais,


a economia entra em recessão e
com a queda do PIB há, em
consequência, queda da
arrecadação fiscal e elevação do
endividamento público em relação
ao PIB. Pior, os economistas
ortodoxos acham a solução ser
maiores cortes de gastos públicos!

A 4ª Revolução Industrial com a


automação e a digitalização global
eleva a produtividade e maximiza
lucros dos acionistas, mas causa
também desemprego tecnológico.
A solução não é o ludismo:
movimento contrário à
mecanização ou robotização do
processo de trabalho. Visa à
destruição da máquina ao
responsabilizá-la pelo
desemprego. Contra a concepção
de qualquer progresso tecnológico
ser socialmente nocivo, se
contrapõe com a redução da
jornada semanal de trabalho,
mantendo-se os salários e demais
direitos trabalhistas. Repartirá
assim mais igualitariamente a
mais-valia relativa. Para enfrentar
desafios como o atual, serve a
visão holística ou sistêmica.

Fernando Nogueira da Costa é É


professor titular do IE-Unicamp.
Autor de 'Brasil dos Bancos'
(Edusp, 2012), ex-vice-presidente
da Caixa Econômica Federal
(2003-2007). É colunista do Brasil
Debate

*Publicado originalmente no Bra


sil Debate (http://brasildebate.co
m.br/sofismas-da-composicao-e
conomia-como-sistema-complex
o/)

Conteúdo Relacionado
(https://www.cartamaior.com.br/includes/controller.cfm?
Cadê os ministérios da
cm_conteudo_id=49956)
Fazenda e do
Planejamento?

(https://www.cartamaior.com.br/includes/controller.cfm?
''Os bilionários estão
cm_conteudo_id=49931)
por toda parte nas
revistas, é hora de
aparecerem nas
estatísticas fiscais''

(https://www.cartamaior.com.br/includes/controller.cfm?
A PEC 32 é
cm_conteudo_id=49905)
bolsonarista
(https://www.cartamaior.com.br/includes/controller.cfm?
A ''economia socialista
cm_conteudo_id=49886)
de mercado''

(https://www.cartamaior.com.br/includes/controller.cfm?
Economia do Comum,
cm_conteudo_id=49883)
urgência máxima

Carta Maior é o Portal da Esquerda


brasileira e referência de informação de
qualidade na internet. O que veicula é
fruto de uma consciência e visão coletiva
de mundo assumida, o que faculta ao
leitor formar sua própria opinião.

REDES SOCIAIS

 Twitter (http://twitter.com/cartamaior)
 Youtube
(https://www.youtube.com/user/tvcartamaior)

 Facebook
(http://www.facebook.com/pages/Carta-
Maior/194552750585551)

CADASTRE-SE

Receba nosso boletim

Digite seu E-mail 

QUEM SOMOS | CONTATO | EXPEDIENTE

Você também pode gostar