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Resumo de textos referente à disciplina Ideologia e Cultura.

Aluno: Vinícius Oliveira Santos


Professor: Adalberto Paranhos
Ciências Sociais – Universidade Federal de Uberlândia

Texto 1: THOMPSON, E.P. Senhores & Caçadores: a origem da lei negra. Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1987.

Neste texto, E.P. Thompson, de maneira muito sofisticada e com uma visão dialética
que falta a muitos autores marxistas, se coloca contra uma visão instrumentalista da lei e do
Estado. Deste modo, ele se coloca contra o marxismo estruturalista que apreende a lei como
um elemento de superestrutura que se adapta ante as determinações da infra-estrutura. A
decorrência deste tipo de análise que está senda criticada por Thompson é que a lei seria um
instrumento da classe dominante que se adequaria inexoravelmente aos seus manuseios
segundo seus interesses. Em ultima análise, sob esta perspectiva esquemática, a lei seria uma
máscara do domínio de uma classe, da classe dominante.
Segundo o autor, a análise do século XVIII “questiona a validade de se separar a lei
como um todo e colocá-la em alguma superestrutura tipológica” (p.350). A lei possui vínculos
para além das instituições assimiladas à classe dominante.
Na análise de contextos históricos específicos, tal como a análise da Lei Negra na
ascensão da oligarquia Whig, percebe-se a alteração da lei com o objetivo de legitimar o tipo
de propriedade e status. Este fato faria brilhar os olhos dos marxistas estruturalistas. Porém,
aquele fato não consiste em afirmar que os dominantes tinham necessidade da lei para oprimir
os dominados, e os dominados também não tinham necessidade de lei, pois, nota-se que os
dominados poderiam ter alguma causa ganha perante mecanismos legais. Em certas situações,
a lei era a efetivação da prática rural que era, por sua vez, seguida desde tempos
imemoriáveis. Ou seja, a lei estava imbricada nas próprias relações de produção e configuram
um espaço de conflito e não de consenso. A dicotomia entre a lei e as relações sociais de
produção proposta pelos estruturalistas cai por terra, e junto com ela, a lei como
procedimentos institucionalizados da classe dominante. Desfalece ainda, a visão liberal da
sociedade do consenso. A lei nas suas formulações e aplicações expressa o conflito, e no
século XVIII, ela existia por direito próprio, enquanto ideologia. Contudo, dizer que a lei
mediava as relações de classe, não consiste em afirmar que a mesma seria uma tradução desta
relação sob a forma mitigadora da realidade.
Thompson prossegue na análise afirmando que “é inerente ao caráter específico da
lei, como corpo de regras e procedimentos, que aplique critérios lógicos referidos a padrões
de universalidade e igualdade” (p.353). Em outros termos, a lei deve corporificar certo teor de
universalidade e igualdade, ela não deve ser apenas discurso. É claro que esta universalidade e
igualdade têm certas limitações. Porém, se a lei se manifesta de forma evidentemente parcial e
injusta, ela “não vai mascarar nada, legitimar nada, contribuir em nada para a hegemonia de
classe alguma.” (p.354). A condição para que seja eficaz na sua função ideológica é se
mostrar independente de interesses individuais de certos indivíduos, ou seja, se mostrar justa.
Contudo, ela só pode assim parecer se preservar critérios de igualdade na sua própria lógica.
O direito não pode ser, portanto, uma retórica vazia. Os dominantes se tornam submetidos ao
domínio da lei, como bem aponta o autor, pois, se fugirem dela, o jogo do poder (segundo
regras que se adequaram a eles) viria abaixo.
A conclusão que o autor chega não é dada por uma fórmula quase que matemática
“lei = poder de classe”, mas sim a “uma conclusão complexa e contraditória” (p.356): por um
lado, a lei mediava as relações de classe tornando-se, com o decorrer do tempo, um elemento
para proveito ainda maior; por outro, a mediação de classes feita por ela mediante formas
legais, impunham limites à ação da classe dominante. Logo, são muito mais do que
imposições: a lei assume uma característica contraditória de modificar o comportamento dos
dominantes e mistificar os destituídos de poder, “mas ao mesmo tempo podem refrear esse
poder e conter seus excessos” (p. 356). Ainda, Thompson também afirma que em situações de
extremas desigualdades de classe, a lei também pode ter uma parcela de imposição. O que
Thompson está confirmando, é o fato de que poder arbitrário e o domínio da lei são coisas
diferentes, e suas inter-relações não são unilaterais ou determinantes.
O autor também profere que o domínio da lei é um bem humano incondicional, no
sentido que levantou limitações ao arbítrio absoluto dos dominantes. Negar isto consiste em
negar a luta histórica pela lei. A dissolução de todas as formas de leis colocaria “homens e
mulheres num perigo imediato” (p. 358). Thompson não nega que houve momentos históricos
em que a lei cristaliza mascaramentos de injustiças de classe, mediando as relações de classe
existentes. Contudo, o teor desta mediação pelas formas da lei é completamente diferente sem
as mesmas.
A lei, portanto, não é imposta de cima para baixo, mas ela é um campo do conflito de
classes e não um instrumento para a classe dominante armar-se para esta luta. Se assumirmos
a posição de que todo direito é um instrumento mistificador onde se excuta as determinações
de classe, os estudos sobre o direito seriam desnecessários, pois, todos seriam semelhantes, as
leis em diferentes épocas seriam similares. Porém, o que Thompson mostra genialmente neste
texto é o fato de que as leis estão imbricadas na base das relações de produção, daí sua
importância, uma vez que é um reflexo das relações sociais de produção e das forças
produtivas.

Texto 2: POULANTZAS, N. Poder Político e Classes Sociais, 2 vols., Porto,


Portucalense, 1971, 2º vol. (p. 7-15)

De início o autor se propõe apresentar algumas características fundamentais do


Estado capitalista. Para tanto, ele expõe algumas pressuposições. Primeiramente, o autor
afirma que as características daquele tipo de Estado estão implicadas no seu próprio conceito
a partir de uma análise que tome o modo de produção capitalista “puro”, que segundo ele foi
feito por Marx em O Capital. Ele se propõe se referir às obras de políticas de Marx, Engels,
Gramsci e Lênin, onde se encontra um duplo estatuto do estudo do Estado capitalista: o
Estado capitalista historicamente situado; e a teoria do tipo capitalista de Estado.
Em segundo lugar, o Estado comporta funções ideológicas, política, econômica que
estão sobredeterminadas pela e condensadas na sua função propriamente política (função
relativa ao campo da luta política de classes, função que permeará as análises seguintes.
Em terceiro lugar, Poulantzas afirma que o Estado fixa os limites que circunscrevem
a relação do campo da luta política de classes às suas estruturas regionais, regulando uma
série de variações. Percebe-se que ele pensa política sob a égide do Estado.
Segundo o autor, o Estado capitalista tem a peculiaridade de não ter a dominação
política presente nas suas instituições, ao contrário, tais instituições se apresentam isentas de
luta de classe. Isto decorre devido ao fato do Estado capitalista se apresentar como uma
unidade política de interesses econômicos divergentes, que seriam interesses de sujeitos e não
de classes. Este tipo de Estado pratica então, um isolamento das relações sociais econômicas a
respeito das classes dominantes ou dominadas: a respeito das classes dominadas, a função do
Estado é impedir sua organização política através do isolamento econômico (não há classes,
mas sim indivíduos); e a respeito das classes dominantes o Estado capitalista executa sua
organização política anulando o isolamento econômico.
A respeito da questão do Estado capitalista e os interesses das classes dominadas, tal
tipo de Estado (e eventualmente a respectiva direção hegemônica de classe) representa não de
forma direta os interesses econômicos das classes dominantes, mas sim seus interesses
políticos. (Deste ponto de vista, o Estado é o centro do poder político das classes dominantes
na medida em que é o fator de organização da sua luta política). E também pela sua própria
estrutura, o Estado capitalista permite a garantia de certos interesses econômicos de certas
classes dominadas, mesmo que seja contrária aos interesses de certas classes dominadas, e
eventualmente contrárias aos interesses em curto prazo de certas classes dominantes. Isto só
acontece pelo fato dos interesses políticos serem compatíveis com a dominação hegemônica.
Logo, o Estado não pode ser concebido como limitação do poder político das classes
dominantes. Ele não é um instrumento ou um utensílio das classes dominantes. Mas ele é o
Estado de uma sociedade dividida em classes. Existe a possibilidade de o Estado garantir
alguns interesses econômicos das classes dominadas. Essa garantia visa a desorganização das
classes dominadas e é um meio necessário e indispensável para a hegemonia das classes
dominantes. Há uma característica particular do Estado capitalista: uma certa autonomia
específica da superestrutura política e da instância econômica. É por isso que a garantia de
algumas reivindicações econômicas não põe em risco o poder político. Isto não acontecia nas
formações precedentes às formações capitalistas. Devido às características citadas acima, o
poder político baseia-se neste Estado em um equilíbrio instável de compromisso.
Compromisso pelo fato de poder dar conta de certos interesses das classes dominadas; e
equilíbrio criado por estes sacrifícios que não põem em cheque o poder político.
Poulantzas ainda comenta sobre a dupla característica do Estado Capitalista: a sua
autonomia relativa ao econômico implica a possibilidade de “sacrifícios econômicos em
proveito de certas classes dominadas”. São as chamadas políticas sociais; e esta própria
autonomia de poder político institucionalizado “que permite cercear por vezes o poder
econômico das classes dominantes, sem jamais ameaçar o seu poder político”. A tal “política
social” não põe em risco as estruturas do Estado do tipo capitalista.

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