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Diego Divino Duenhas

TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO DE INTERFACE


ACESSÍVEL COM FOCO NO USUÁRIO MADURO NÃO-
ALFABETIZADO E/OU DE BAIXO LETRAMENTO

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao


Instituto Federal de São Paulo, como parte dos
requisitos para a obtenção do grau de Tecnólogo
em Sistemas para Internet.

Área de Concentração: Interface Humano-


Computador

Orientadora: Profa. Dra. Rosana Ferrareto


Lourenço Rodrigues
Coorientador: Prof. Ms. Gustavo Aurélio Prieto

São João da Boa Vista


2015
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer
meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que
citada a fonte.

Ficha catalográfica preparada pela Seção de Tratamento


da Informação do Serviço de Biblioteca – IFSP

Duenhas, Diego D.
Técnicas para o desenvolvimento de interface acessível
com foco no usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo
letramento. / Diego Divino Duenhas; orientadora Profa.
Dra. Rosana Ferrareto Lourenço Rodrigues, coorientador
Prof. Ms. Gustavo Aurélio Prieto. São João da Boa Vista,
2015.

Trabalho de Conclusão de Curso, IFSP, 2015.

1. Acessibilidade. 2. Inclusão Digital. 3.


Usabilidade. 4. Interfaces Digitais. 5. Design
centrado no usuário.

I. Técnicas para o desenvolvimento de


interface acessível com foco no usuário
maduro não-alfabetizado e/ou de baixo
letramento
AGRADECIMENTOS

Agradeço às pessoas, em especial, aos amigos e amigas que sempre me


incentivaram a entrar para a academia e ter acesso ao conhecimento a partir
de uma visão mais racionalista de como as coisas são. Agradeço aos colegas
com os quais compartilho as noites tentando entender e se fazer entender
dentro desse universo exato o que é um curso de tecnologia. Agradeço e
presto minha admiração aos funcionários em geral e aos professores do
Instituto Federal de São João da Boa Vista, aos primeiros, pois sempre
estiveram de prontidão para nos ajudar direta ou indiretamente, e, aos outros,
pela presteza e paciência em nos ensinar, ajudar e esclarecer nossas quase
sempre absurdas dúvidas. Obrigado e parabéns pelo carinho no ato de nos
ensinar.
Ao Prof. Ms. Gustavo, que plantou a semente da usabilidade e da IHC em
minha vida e sempre se esforçou para não deixar dúvidas ao exposto em suas
aulas. À Profa. Dra. Rosana, que, para muito além de me orientar nesta
pesquisa, ensinou-me, e ainda ensina, muito mais do que lhe é atribuído às
suas funções.
Aos meus pais, em especial à minha querida mãe, Margarida, que sempre
batalhou para que nos tornássemos, minhas irmãs e eu, pessoas melhores para
o mundo, que me ensinou que primeiro devemos perguntar o que temos para
contribuir e nem sempre esperar por um obrigado.
À mãe de minha esposa, Vanda (como ela gosta de ser chamada), e à sua
família maravilhosa que me acolheu desde o primeiro dia que cheguei em
suas vidas.
E à minha esposa, Ana, que, com certeza, é a maior responsável por tudo que
acontece de bom em minha vida e que, nessas horas de muito trabalho, apoia-
me e não me deixa chegar perto de fraquejar.
RESUMO

DUENHAS, D. D. Técnicas para o desenvolvimento de interface acessível com foco no


usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo letramento. Trabalho de Conclusão de
Curso - Instituto Federal de São Paulo, São João da Boa Vista, 2015.

Apesar dos evidentes esforços em se definir e adotar padrões que atendam às demandas de
acessibilidade, a utilização adequada de técnicas de desenvolvimento a partir das quais se
projetem interfaces para interação com sistemas ainda é um paradigma em processo germinal
na concepção de projetos, conforme documentado pelo CPQD (2010). No intuito de colaborar
para que ocorra uma redução no número de pessoas excluídas digitalmente, esta pesquisa
propõe levantar e organizar técnicas para o desenvolvimento de projetos que garantam a
construção de interfaces interativas acessíveis e que contenham recursos de usabilidade com
foco no usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo letramento. A fim de cumprir esse
objetivo, será apresentado sistemicamente o uso adequado das técnicas e princípios de projetos
centrados no usuário, para atingir um grau satisfatório de eficácia em sua utilização. O modelo
proposto para projetos de desenvolvimento de interface com foco no usuário percorre pelos
referenciais teóricos do Letramento, da Semiótica, da Ergonomia Cognitiva e da Interface
Humano-Computador. Esse referencial teórico oferece segurança ao desenvolvedor para a
tomada de decisões necessárias à concepção e modelagem dos recursos interativos através de
técnicas de criação de personas, modelos mentais, sketching e prototipagem dentro de um
modelo iterativo de projeto para garantir uma acessibilidade adequada ao público específico e
universal. Os resultados obtidos são apresentados como uma compilação de requisitos e práticas
recomendadas que auxiliem o usuário a alcançar de forma eficaz, eficiente e satisfatória os
objetivos específicos propostos no projeto bem como sua validação em usabilidade.

Palavras-chaves: Acessibilidade. Inclusão Digital. Usabilidade. Interfaces Digitais. Design


centrado no usuário.
ABSTRACT

DUENHAS, D. D. Techniques to develop accessible interface focused on mature, non-


literate and/or low literate users. Course Conclusion Project – Instituto Federal de São Paulo,
São João da Boa Vista, 2015.

Despite the apparent efforts to define and adopt standards that meet the accessibility
requirements, the appropriate use of development techniques to project system interfaces with
interaction is still an incipient paradigm in designing project processes, as documented by
CPQD (2010). In order to contribute to the occurrence of a reduction in the number of people
excluded digitally, this research proposes the use and development of techniques to ensure the
construction of affordable interactive interfaces containing usability features focused on mature
non-literate and/or low literate users. To meet this goal we will present systemically proper use
of the techniques and principles of user-centered design to achieve a satisfactory level of
efficiency in their use. The proposed model for interface development projects with focus on
the user runs through by theoretical literature references, Semiotics, Cognitive Ergonomics and
Human-Computer Interface. This theoretical framework provides reliability for the developer
to take the decisions needed for the design and modeling of interactive features through creation
of personas techniques, mental models, sketching and prototyping within an iterative model
project to ensure adequate accessibility to the specific and universal audience. The results are
presented as a compilation of requirements and best practices that help the user to achieve
effectively, efficiently and satisfactorily the specific objectives proposed in the project as well
as its validation.

Keywords: Accessibility. Digital inclusion. Usability. Digital Interfaces. User-centered design.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Percentual de alfabetização por faixa etária em 2011....................... 21


Figura 2: Percentual de alfabetização em níveis em 2012 ............................... 22
Figura 3: Aspectos interdisciplinares da IHC .................................................... 29
Figura 4: UX Honneycomb ............................................................................... 32
Figura 5: Interdependência entre atividades de projeto centrado no ser
humano ............................................................................................................ 45
Figura 6: Exemplo de Sketch ........................................................................... 49
Figura 7: Exemplo de Wireframe ...................................................................... 49
Figura 8: Exemplo de Prototipagem ................................................................. 50
Figura 9: Exemplo de Design ........................................................................... 51
Figura 10: Fases da concepção da interface.................................................... 51
Figura 11: Exemplos da representação de estrutura hierárquica em formato
de árvore invertida e em topologia estrelada.................................................... 52
Figura 12: Estrutura Sequencial ....................................................................... 53
Figura 13: Estruturas de conteúdo ................................................................... 54
Figura 14: Comparativo de premissas e métodos ............................................ 60
Figura 15: Modelo de atividades e resultados do projeto centrado no ser
humano ............................................................................................................ 61
Figura 16: Metodologia para desenvolvimento com foco no usuário ................ 63
LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Indicador de alfabetismo ................................................................... 20


LISTA DE QUADROS

Quadro 1: As 8 regras de ouro de Bem Shneiderman ….……………………….....… 34


Quadro 2: As 10 Heurísticas de Nielsen…………………...…….…………………...…. 34
Quadro 3: Levantamento de usuários e stakeholders …..….….…………………...…. 44
Quadro 4: Métodos de pesquisa .……………………………….…………………......… 47
LISTA DE SIGLAS

AI Arquitetura da Informação

API Application Programming Interface (Interface de Programação de Aplicativos)

CPqD Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações

CSS3 Cascading Style Sheets, ver. 3 (Folhas de Estilo em Cascata, versão 3)

DI Design de Interação

HTML5 Hypertext Markup Language, ver. 5 (Linguagem de Marcação de Hipertexto,

versão 5)

IBM International Business Machines

IHC Interação Humano-Computador

INAF Indicador de Alfabetismo Funcional

ISO International Organization for Standardization

STID Soluções de Telecomunicações para Inclusão Digital

TIC Tecnologias de Informação e Comunicação

UCD User Centred Design (Design Centrado do Usuário)

UFSC Universidade Federal de Santa Catarina

UI User Interface (Interface de Usuário)

UNESCO Organização da Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UX User Experience (Experiência do Usuário)

UxD User Experience Design

WWW World Wide Web (Rede de Alcance Mundial)


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................15

1.1 Motivação ............................................................................................................................. 16

1.2 Objetivos ............................................................................................................................... 17

1.3 Organização deste trabalho ................................................................................................... 18

2 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA ...................................................................................19

2.1 INCLUSÃO SOCIAL ........................................................................................................... 19

2.1.1 Dados sobre alfabetização .................................................................................................. 19

2.1.2 Maturação e a fase adulta ................................................................................................... 21

2.1.3 Inclusão Digital .................................................................................................................. 23

2.2 LETRAMENTO E ALFABETIZAÇÃO .............................................................................. 24

2.2.1 Letramento: Definição e origem ........................................................................................ 24

2.2.2 Letramento Digital ............................................................................................................. 27

2.3 IHC – INTERAÇÃO HUMANO-COMPUTADOR ............................................................ 28

2.3.1 UI - User Interface ............................................................................................................. 29

2.3.2 UCD – User Centred Design .............................................................................................. 30

2.3.3 UX – User Experience ....................................................................................................... 31

2.3.4 Ergonomia Cognitiva ......................................................................................................... 35

2.3.5 Critérios ergonômicos e usabilidade .................................................................................. 36

2.3.6 Critérios Ergonômicos ....................................................................................................... 37

3 METODOLOGIA ........................................................................................................43

3.1 Gestão de Projetos ................................................................................................................ 44

3.2 Pesquisa do Usuário .............................................................................................................. 46

3.3 Arquitetura da Informação .................................................................................................... 48

3.3.1 Sketch ................................................................................................................................. 48

3.3.2 Wireframe .......................................................................................................................... 49


3.3.3 Prototipagem ...................................................................................................................... 50

3.3.4 Design ................................................................................................................................ 51

3.4 Concepção Visual e Interatividade ........................................................................................ 52

3.5 Avaliação de Usabilidade ...................................................................................................... 56

4 RESULTADOS .......................................................................................................... 59

4.1 Princípios normativos respeitados ........................................................................................ 59

4.2 Metodologia simplificada para concepção de projetos de interface com acessibilidade e

usabilidade ao usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo letramento ................................ 62

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 64

REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 67
Capítulo
Capítulo

11
15

1 Introdução

A busca constante pelo acesso à cidadania para todos é o que define se esta é ou não
uma sociedade inclusiva. Pode-se entender que prover acessibilidade às pessoas com
necessidades especiais aos sistemas gerais da sociedade é o que as transformará em cidadãos
com capacidades transformadoras. Em um mundo que está cada vez mais se convertendo em
digital, os problemas de acessibilidade tendem a aumentar caso não haja políticas públicas e
iniciativas privadas para diminuir o hiato social resultado da Exclusão Digital. É a partir dessas
prerrogativas que esta pesquisa pretende identificar aspectos e sugerir técnicas relevantes a
serem adotadas no desenvolvimento de projetos tecnológicos no intuito de promover a Inclusão
Digital.
A proposta da pesquisa é identificar técnicas eficazes para se projetar e/ou analisar um
sistema que necessite da interação de pessoas maduras não-alfabetizadas e/ou de baixo
letramento com a interface digital, de modo que se possa contribuir para um possível aumento
na adesão e compreensão das práticas de usabilidade e suas dependências, que possuem como
fim o benefício social da acessibilidade ao conteúdo eletrônico, desse modo, haverá também
contribuição para a redução da exclusão digital que ainda tem presença considerável na
sociedade, não apenas brasileira, mas também em perspectivas globais. Para isso, é preciso
entender o usuário dentro de uma posição central no cenário do projeto, do início até a sua
homologação final, garantindo usabilidade e acessibilidade.
Quanto aos referenciais teóricos adjacentes à Inclusão Social, será abordado o
Letramento, como subsídio tanto para uma aproximação fiel do público-alvo, por meio de
recursos classificatórios presentes nos diferentes tipos de letramentos, e também possibilita uma
adequada utilização da comunicação a fim de se construir um discurso significativo para o
usuário específico, a partir de técnicas como o letramento sensível, o letramento multimidiático
e a semiótica. A fim de mensurar os aspectos de inteligência da interface, bem como a cognição
do usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo letramento, a pesquisa explicita e aplica
critérios da Ergonomia Cognitiva aplicada ao desenvolvimento de interfaces digitais em
conjunto com premissas da Interação Humano-Computador, no intuito da otimização da
interface para o público-alvo. Para suprir a necessidade de um processo gerencial adequado
16

ao desenvolvimento com foco no usuário, a pesquisa aborda a utilização da norma ISO 9241-
210:2010 (Ergonomics of human-system interaction -- Part 210: Human-centred design for
interactive systems), que fornece requisitos e recomendações para os princípios e as atividades
de design centrada no homem ao longo do ciclo de vida de sistemas interativos baseados em
computador. Destina-se a ser utilizada por aqueles que gerenciam os processos de projeto, e
está preocupada com as formas em que ambos os componentes de sistemas interativos de
hardware e software podem melhorar a interação humano sistema.
A metodologia adotada é a de projetos centrados no usuário conhecida como User
Experience (UX), a qual possibilita uma visão abrangente das premissas para o
desenvolvimento em todas as suas etapas e particularidades, bem como organiza os processos
e subprocessos de cada uma das áreas envolvidas de forma a contemplar a participação do
usuário e/ou suas representações, em cada etapa percorrida e iterada. Os processos da UX são
multidisciplinares. Este trabalho aborda principalmente os aspectos de avaliação de usabilidade,
arquitetura da informação, design de interação, user interface (UI) e acessibilidade, porém não
percorre tão profundamente pelos demais – gestão de projetos, pesquisa do usuário, design
visual, estratégia de conteúdo e web analytics. A fim de manter todos os processos em
conformidade com os requisitos ergonômicos, tecnológicos e de acessibilidade, os processos
são confrontados com os requisitos da norma ISO 9241-210:2010 e posteriormente validados
junto ao World Wide Web Consortium (W3C) e outros softwares para validação de usabilidade
e acessibilidade.
Como resultado, pretende-se obter uma compilação de técnicas e métodos para se
projetar e desenvolver interfaces com foco em acessibilidade para o usuário maduro não-
alfabetizado e/ou de baixo letramento bem como para o público universal.

1.1 Motivação

A motivação para a realização desta pesquisa é o desejo de se contribuir técnica,


tecnológica e cientificamente para que haja uma maior adesão, por parte da comunidade
tecnológica e acadêmica de analistas, desenvolvedores, cientistas e designers de sistemas que
utilizam interfaces digitais interativas em seus projetos, às questões de acessibilidade digital e
à promoção do uso de técnicas inclusivas em seus cotidianos.
17

Segundo Costa (2009), aproximadamente 80% da população brasileira pode ser considerada
excluída digitalmente. O autor ainda pondera que não se reduz exclusão digital apenas
disponibilizando o acesso à internet, e que um dos principais entraves é encontrar soluções que
possam se sobrepor aos efeitos de uma alfabetização ineficiente bem como das barreiras a um
acesso igualitário ao meio. Para agravar este quadro, o Indicador de Alfabetismo Funcional -
INAF Brasil, em seu último relatório sobre alfabetização (2011-2012), aponta que cerca de 6%
da população é considerada não-alfabetizada, um número que revela aproximadamente cerca
de 11 milhões de pessoas já em fase madura da vida, que vivem sem saber ler e escrever. A
urgência em se criar e adotar critérios de acessibilidade é incontestável, visto que o Estado
garante aos seus cidadãos, sem distinção, o acesso aos sistemas gerais da sociedade, os quais
encontram-se em um avançado processo de convergência ao digital. Portanto as iniciativas
governamentais para garantir que qualquer cidadã/ão possa executar tarefas como
agendamentos médicos, consulta aos fundos de pensão, acesso às prestações de contas etc, de
forma transparente e acessível a todas as parcelas e camadas sociais, é fundamental que haja
iniciativa e adesão dos diversos setores públicos e privados da sociedade, especificamente, no
escopo desta pesquisa, os setores acadêmicos de iniciativa pública e/ou privada, analistas e
desenvolvedores de projetos que façam uso de recursos de interatividade através de interfaces
digitais

1.2 Objetivos

Ao assumir que a inclusão digital deve ser tratada com urgência no que se refere à
criação de interfaces acessíveis, uma vez que a sociedade fica cada vez mais conectada e
dependente da tecnologia da informação, este trabalho pretende elencar e sintetizar práticas
eficazes para a construção e avaliação de interfaces com acessibilidade para usuários não-
alfabetizados e/ou de baixo letramento.
O objetivo geral deste trabalho é sugerir que sejam adotadas técnicas adicionais e
específicas aos já tradicionais processos de levantamento de requisitos propostos pela
engenharia de software e arquitetura da informação. Nesse contexto, a metodologia de projetos
com foco no usuário insere o fator usuário humano em um plano central nas decisões de
desenvolvimento, no qual o usuário deixa de ser apenas um coadjuvante junto ao sistema e
passa a ser parte integrante em um papel de protagonista atuante em todo o processo.
18

Para atingir esse objetivo geral, os objetivos específicos consistem em levantar e


organizar essas técnicas para tornar esse processo não só eficiente, mas prático e habitual ao
cotidiano das equipes de projeto e desenvolvimento.

1.3 Organização deste trabalho

Este trabalho encontra-se organizado da seguinte maneira:


No capítulo 1, apresentam-se a introdução da pesquisa, seus objetivos e sua organização.
No capítulo 2, trata-se da fundamentação teórica que embasa este trabalho, e é onde
estão apresentadas as considerações sobre Inclusão Social, bem como esclarecimentos sobre
como a Inclusão Digital pretende incluir pessoas maduras não-alfabetizadas e/ou de baixo ou
letramento. Apresentam-se também dados sobre a alfabetização no Brasil, além de uma
comparação entre os conceitos de alfabetização e letramento e seus diferentes tipos. São feitas
colocações acerca do uso da semiótica e do léxico aliados às técnicas de Interação Humano-
Computador para promover uma comunicação eficaz com o usuário público-alvo. Discorre-se
sobre os conceitos de ergonomia cognitiva para validar e promover a inteligibilidade de uma
interface, bem como sobre os fundamentos do desenvolvimento com foco no usuário, regidos
pela norma ISO 9241-210:2010. Descreve-se finalmente, nesse capítulo, a metodologia de
desenvolvimento com foco na experiência do usuário (UX).
No capítulo 3, encontram-se a concepção e definição dos métodos empregados em um
projeto de interface, definição do problema, pesquisa e definição do público-alvo, criação de
personas com base na semiótica, construção do discurso apropriado e as possíveis técnicas
multimidiáticas.
No capítulo 4, demonstram-se os resultados obtidos, e também técnicas de sketching,
prototipagem criativa e storyboard.
No capítulo 5, encontram-se as considerações finais levantadas no decorrer deste
trabalho e algumas perspectivas futuras.
Capítulo
Capítulo

22
19

2 Pesquisa Bibliográfica

2.1 INCLUSÃO SOCIAL

Uma sociedade que está preparada para atender seus cidadãos com necessidades
especiais pode ser considerada uma sociedade inclusiva. Porém, é preciso salientar que inclusão
é processo e não condição. A construção do termo inclusão social está diretamente ligada a uma
necessidade urgente de transformação social, e refere-se a mudar aspectos problemáticos
estabelecidos ao longo dos tempos, tendo em vista o acesso à cidadania, considerando a
multiplicidade e singularidade das necessidades de cada indivíduo.
A inclusão de pessoas com necessidades especiais nos sistemas gerais da sociedade
provê a elas a possibilidade de assumirem seus papéis de cidadãos, permitindo-lhes que sejam
também agentes transformadores (MOTA, 2007). Uma dessas possibilidades é o acesso à
educação formal, por meio do aprendizado da leitura e da escrita e do desenvolvimento do
letramento digital.
Dentro dessa perspectiva, serão apresentados neste capítulo dados oficiais sobre o nível
de alfabetismo no Brasil, bem como aspectos relevantes sobre a importância da inclusão digital
como prática de inclusão social.

2.1.1 Dados sobre alfabetização


Segundo o relatório INAF Brasil 2011-2012 – Indicador de Analfabetismo Funcional,
os esforços dos governos para erradicar o analfabetismo têm demonstrado resultados positivos,
como mostra a tabela 1. Uma pessoa é considerada analfabeta quando “corresponde à condição
dos que não conseguem realizar tarefas simples que envolvem a leitura de palavras e frases
ainda que uma parcela destes consiga ler números familiares (números de telefone, preços etc.)”
(INAF, 2012). Em 2012, o Brasil ainda possuía cerca de onze milhões e meio de pessoas não-
alfabetizadas, número correspondente a seis por cento da população total estimada residente no
país.
20

Entretanto, esse número cresce ao somar-se com os vinte e um por cento de pessoas com
nível de alfabetização rudimentar, que o relatório descreve como “capacidade de localizar uma
informação explícita em textos curtos e familiares (como, por exemplo, um anúncio ou pequena
carta), ler e escrever números usuais e realizar operações simples, como manusear dinheiro para
o pagamento de pequenas quantias ou fazer medidas de comprimento usando a fita métrica”. A
partir desse critério, totaliza-se a faixa de analfabetismo em vinte e sete por cento, conforme
demonstrado na tabela 1.
Tabela 1: Indicador de alfabetismo

Fonte: INAF BRASIL (2012).


Segundo Soares (2008), aos finais dos anos 1970, a UNESCO (Organização da Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura) propõe que se amplie o conceito de literate para
functionally literate, ou alfabetizado e alfabetizado funcionalmente, respectivamente, e sugere
que as avaliações internacionais sobre as competências de leitura e escrita devam ir além ao
medir as capacidades de ler e escrever dos seus cidadãos. Assim entende-se que a alfabetização
está ligada à educação e compreende em habilitar os indivíduos a identificar sistemas de
códigos; o letramento está relacionado com o conjunto de aspectos sociais que são responsáveis
para a criação de significado e compreensão das coisas pelo indivíduo.
Na subseção 2.2 deste capítulo, serão conceituados letramento x alfabetização no
esforço de se reduzir os possíveis ruídos que possam ocorrer na comunicação entre uma
interface computacional e usuários com diferentes níveis de alfabetização e letramento.
21

Figura 1: Percentual de alfabetização por faixa etária em 2011


Nível de Alfabetismo por Faixa Etária
70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
15 a 24 anos 25 a 34 anos 35 a 49 anos 50 a 64 anos

Analfabeto Rudimentar Básico Pleno

Fonte: INAF BRASIL (2012).

2.1.2 Maturação e a fase adulta


A pesquisa tem como objeto de estudo o indivíduo maduro, que esteja na fase adulta, a
fim de se seguir o mesmo padrão utilizado na pesquisa proferida pelo INAF BRASIL (2012).
O conceito de maturação tem base no estudo da andragogia, que segundo Calvalcante e Gayo
(2005), deve ser entendida como “a filosofia, a ciência e a técnica da educação de adultos”, que
diferenciam as motivações e características do aprendizado de crianças e de adultos, com o
objetivo de estabelecer critérios para o ensino, através dos métodos de aprendizagem
andragógicos que visam “tirar o máximo proveito das características peculiares dos adultos”
(CAVALCANTE; GAYO, 2005). Oliveira (2007) define o adulto maduro como:

[...] aquele indivíduo que ocupa o status definido pela sociedade,


por ser maduro o suficiente para dar continuidade à espécie e,
cognitivamente, autodirigido, que o torna capaz de responder
pelos seus atos diante da sociedade.

Segundo dados do INAF BRASIL (2012), cerca de 21% da população brasileira em fase
madura possui nível de alfabetização rudimentar, e outros 6% são consideradas analfabetas, o
22

que totaliza 27% da população, ou seja, cerca de 38 milhões de pessoas, conforme ilustrado na
figura 2.
Figura 2: Percentual de alfabetização em níveis em 2012

Fonte: INAF BRASIL (2012).


Pessoas que automaticamente são usuários dos serviços públicos do governo e que
precisam utilizar suas ferramentas, serviços e passar pela burocracia em diversas instâncias de
suas vidas, portanto, o governo, mais especificamente, as iniciativas do governo eletrônico,
através das TIC1 (Tecnologias de Informação e Comunicação), promove e desenvolve
ferramentas para os cidadãos gozarem de seus direitos e deveres e, devem atender toda
população. E, a acessibilidade traz não apenas benefícios institucionais relativos ao governo e
suas instâncias, mas vem como estratégia mercadológica para atender essa grande parcela da
população adulta consumidora, uma vez que empresas ofereçam melhores opções de
acessibilidade em suas ferramentas digitais, seus serviços provavelmente serão mais utilizados
que os de seus concorrentes que não ofereçam esses recursos.

1
“As TIC são as tecnologias que associam a informação e a comunicação, necessárias para o processamento de
dados, em particular, através do uso de computadores eletrônicos e softwares, para converter, armazenar, proteger,
processar, transmitir e recuperar informações, de forma ampla e contínua” (IACIT). Disponível em
<http://goo.gl/4h7OoX>. Acesso em: 17 Jun 2014.
23

Este trabalho busca compreender quais são as características gerais e específicas do perfil de
uso de interfaces digitais entre usuários maduros não-alfabetizados e/ou de baixo letramento e
quais técnicas, tecnologias e padrões são adequados para o desenvolvimento de serviços digitais
que ofereçam acessibilidade por meio da interação via interface.

2.1.3 Inclusão Digital


Ao se entender que as pessoas vivem em mundo cada vez mais digital e que essas
mudanças ocorrem rapidamente, a inclusão digital apresenta-se como um dos pilares para as
ações de inclusão social. 80% da população brasileira pode ser considerada como excluída
digitalmente, e as ações governamentais para a erradicação do problema ainda concentram
esforços na oferta de acesso à Internet coletiva ou individualmente (COSTA, 2009).
Uma política de inclusão digital eficiente deve almejar benefícios sociais, econômicos,
tecnológicos e científicos. De acordo com Costa (2009, p.47):

[...] a exclusão digital não é simplesmente eliminada com a


disponibilização de acesso à Internet. É preciso que sejam
desenvolvidas soluções que permitam sobrepujar os efeitos das
deficiências de alfabetização e as barreiras ao acesso equitativo.
Para que estes resultados sejam alcançados, será necessário
avaliar e desenvolver, quando necessário, soluções baseadas em
diversas fronteiras tecnológicas [...]

Diante disso, é necessário investir em acessibilidade, adequar e desenvolver novos


modelos de interação para públicos com limitações distintas e garantir que estes sejam
suportados pelos componentes de infraestrutura adequados e/ou adquiridos. Isso quer dizer que
é preciso introjetar as políticas de inclusão social nas tomadas de decisões dentro de qualquer
projeto que envolva direta ou indiretamente a sociedade.
Diante da urgência de diminuir a exclusão digital no país, e entendendo que há uma
penetração cada vez mais abrangente das TIC dentro das cadeias produtivas, o governo, através
da Fundação CPqD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações),
desenvolveu o projeto STID (Soluções de Telecomunicações para Inclusão Digital), que
objetiva buscar alternativas e orientar a criação e implantação de tecnologias digitais inclusivas.
De acordo com o projeto, os setores mais excluídos da sociedade podem ser divididos em:
analfabetos e analfabetos funcionais; excluídos sociais, digitais e de infraestrutura; pessoas com
necessidades especiais; e economia informal.
24

Segundo o site oficial do CPqD, encontra-se desenvolvido e implantado em dois Telecentros


uma interface com acessibilidade para pessoas com deficiências sensoriais e de alfabetização,
onde essas conseguem obter acesso a alguns serviços do governo que já foram integrados com
a plataforma. O CPqD também publicou e disponibilizou os resultados de suas pesquisas em
formato de cartilha, intitulada ‘Modelo de interação inclusivo para interfaces de governo
eletrônico’, em que se apresentam resultados coletados através do STID, bem como seus
modelos para implementação de interfaces acessíveis a pessoas com deficiências, não-
alfabetizadas e/ou com baixo letramento.

2.2 LETRAMENTO E ALFABETIZAÇÃO

O termo letramento tem significado distinto de alfabetização. Para além da escrita,


letramento compreende um conjunto de aspectos sociais que são responsáveis pela criação do
significado e entendimento das coisas pelo indivíduo, permeando entre as visuais, as sensoriais,
as linguísticas, dentre outras (SOARES, 2008). Entende-se que os ditos “analfabetos
funcionais” são alfabetizados, mas não letrados. Neste trabalho, é essencial entender que
existem diversos conceitos de letramento, ou simplesmente assumir que o termo letramento
metamidiático, que transforma significados e mídias, pode englobar os diversos outros tipos.
Serão apresentados neste capítulo alguns conceitos de letramento essenciais para o
desenvolvimento desta pesquisa, cujo público-alvo são os não-alfabetizados formalmente e/ou
com baixo nível de letramento

2.2.1 Letramento: Definição e origem


Segundo Soares (2008), a origem do termo letramento provém da necessidade de
caracterizar a construção social de um discurso sobre o desletrado. Ao final dos anos 1970, a
UNESCO sugere que as avaliações internacionais sobre as competências de leitura e escrita
devam ir além ao medir as capacidades de ler e escrever e em meados dos anos 1980, começa
a ser difundido em vários países para diferenciar fenômenos distintos da alfabetização e explica:

Nos países desenvolvidos, ou do Primeiro Mundo, as práticas


sociais de leitura e de escrita assumem a natureza de problema
relevante no contexto da constatação de que a população, embora
alfabetizada, não dominava as habilidades de leitura e de escrita
25

necessárias para uma participação efetiva e competente nas


práticas sociais e profissionais que envolvem a língua escrita. [...]

Para além da competência linguística, Lemke (1998) propõe a ampliação da definição


de letramento como sendo “um conjunto de competências culturais para construir significados
sociais reconhecíveis através do uso de tecnologias materiais particulares [...] hoje, no entanto,
nossas tecnologias estão nos movendo da era da ‘escrita’ para a era da ‘autoria multimídiática’"
a partir do que se conclui “que documentos e imagens de notações verbais e textos escritos
propriamente ditos são meros componentes de objetos mais amplos de construção de
significados”.
Lemke (1998) propõe que todo letramento é um letramento multimidiático, pois a
construção de significado não ocorre isoladamente apenas com a língua, é preciso que haja uma
associação vocal ou visual dos signos linguísticos e que, para estes exercerem a função de
signos, precisam conter algum tipo de realidade material.
A utilização das técnicas de letramento sensível pretende relacionar significados
invisíveis, simbólicos, ocultos e analógicos a imagens, indo além da alfabetização visual
adquirida pelo indivíduo, que pressupõe uma decodificação apenas do seu caráter
representacional visível e arbitrário (MEIRA; ROSA, 2010).
Pereira (2011) considera que “letrar é mais que alfabetizar”, pois cumpre a função de
criar senso crítico e autonomia dentro de diferentes contextos sociais. Diferindo da
alfabetização, que cumpre a função de ensinar a decifrar códigos, o letramento serve para
instruir o indivíduo a entender e contextualizar seus significados. A autora explica que
alfabetização é algo individual e está ligada à aspectos da educação formal e escolarização, já
o letramento tem foco em estruturas sociais.
Coelho e Bonilla (2012) explicam que pessoas não-alfabetizadas podem possuir um
certo nível de letramento, resultado da vivência em um meio onde se faz uso recorrente da
leitura e escrita, muitas vezes possibilitando utilizar o computador e outras interfaces digitais.
Muitas outras informações do referencial teórico coletado para esta pesquisa indicam que
pessoas em sua fase madura são capazes de utilizar interfaces digitais mesmo não possuindo
uma alfabetização formal, desde que estas sejam projetadas para atendê-las, considerando suas
limitações e empregando recursos baseados no letramento e na semiótica, encontrados dentro
do contexto social de que participa.

Convencionalmente, tem-se a ideia de que é preciso saber ler e


escrever para utilizar o computador, não só para acessar a
26

internet, mas outros diversos aplicativos disponíveis na máquina.


No entanto, o comportamento não só de crianças como também
de adultos, diante dos computadores, tem suscitado a discussão
acerca do nível de usabilidade dessas tecnologias por pessoas que
ainda não estão completamente alfabetizadas ou, estão em
processo de alfabetização [...] (COELHO e BONILLA, 2012).

Além disso, segundo o STID, é necessário transpor o modelo de interação proposto em


um projeto de desenvolvimento de uma interface, para além da aplicação dos conceitos de
usabilidade e acessibilidade, adotando-se o da inteligibilidade.

[...]garantir a usabilidade e a acessibilidade de uma TIC ainda não


garante a apropriação da tecnologia pelo indivíduo. É necessário
também garantir a inteligibilidade, que é a adequação dos
conteúdos e das interfaces aos perfis culturais e linguísticos,
associada ao nível de letramento de cada usuário (CPQD, 2010).

A Semiótica pode contribuir para a inteligibilidade da interface. Compreende-se


Semiótica como a ciência dos signos e da semiose, a qual estuda fenômenos culturais como os
sistemas sígnicos ou de significação em que o “léxico pode ser entendido como o conjunto de
signos linguísticos pelos quais nos expressamos, nos comunicamos e assimilamos e produzimos
conhecimento” (ADAMES, 2013).
Ferraz Junior. (2011) explica que a metáfora como conceito semiótico origina-se nos
desdobramentos da noção de ícone dentro de uma análise peirciana2 do signo, como aquela que
faz distinção por similaridade (ícones); que resulta de uma conexão direta entre signo e objeto
(índices); e que se fixa por hábito ou convenção (símbolos). Torna-se, assim, possível, dentro
da terminologia semiótica proposta, obter a separação e identificação das unidades significantes
em unidades simples ou em estruturas complexas, o que possibilita a organização da informação
quanto ao seu significado unitário ou composto. Por exemplo, “num texto escrito, chamamos
de signo cada palavra, ou cada frase, ou um conjunto de frases, ou o texto inteiro, quando os
consideramos como unidades significantes” (FERRAZ JUNIOR, 2011). Assim, compreende-
se naturalmente a existência de signos constituídos de dois ou mais signos. É a identificação
dos significantes aplicado ao discurso da interface que conduzirá uma comunicação dinâmica
e uma experiência satisfatória para o usuário.

2
Charles Sanders Peirce, conhecido como um dos fundadores da Semiótica.
27

Ademais, a metáfora é também um dos expedientes da Semiótica. Entende-se por


metáfora lexical uma “construção não literal ou conotativa de expressar significados, havendo
transferências verbais de vários tipos” e, neste caso, a metáfora gramatical é mais um aspecto
da mesma estratégia metafórica geral pela qual recursos semânticos são expandidos para
construir a experiência (ADAMES, 2013). Os conceitos de semiótica e metáfora são aplicados
ao discurso literal, que será escrito e falado, porém, o estudo da semiótica se aplica também em
outros aspectos de significação e ressignificação da comunicação entre interface e usuário,
como por exemplo, um signo pode ser representado como cada cor ou forma presente na tela,
mas também pode ser a tela inteira a unidade significante (FERRAZ JUNIOR, 2011).
Neste sentido, esta pesquisa abordará o estudo do conceito de metáfora
lexicogramatical, a partir do qual se empregam conceitos de metáfora lexical e metáfora
gramatical ao texto não-verbal. A proposta é fazer uso da Semiótica Social para o estudo da
“significação em condições culturais determinadas, mudando o foco do signo para o uso de
recursos semióticos em contextos específicos” (ADAMES, 2013).
Vale ressaltar que a Semiótica e a IHC podem, aliadas, proporcionar um terreno favorável à
comunicação entre pessoas maduras não-alfabetizadas e/ou com baixo letramento, pois a
substituição de textos por signos favorece a comunicação entre a interface e o usuário. Leite
(2010) afirma que um signo é qualquer elemento que substitui alguma coisa para uma pessoa
sob determinados aspectos e pondera que a teoria da engenharia semiótica coloca o processo
comunicativo em primeiro plano, favorecendo o processo de design de interfaces.

2.2.2 Letramento Digital


Segundo Freitas (2010), o termo letramento digital possui duas atribuições de valores
distintas. A primeira compreende o ato de utilizar tecnologia digital, ferramentas de
comunicação em rede, criar e gerenciar informação para uma sociedade baseada no
conhecimento. Uma segunda, elaborada pela Association of College & Research Libraries, é
definida como uma série de habilidades que requer dos indivíduos reconhecer quando a
informação faz-se necessária e ter a habilidade de localizar, avaliar e usar efetivamente a
informação. Porém, Freitas (2010) salienta que esses conceitos foram mudando ao passar dos
anos e hoje a definição mais ampla de letramento digital refere-se aos “contextos social e
cultural para o discurso e comunicação, bem como aos produtos e práticas linguísticas e sociais
de comunicação, e os modos pelos quais os ambientes de comunicação têm se tornado partes
essenciais de nosso entendimento cultural do que significa ser digitalmente letrado”.
28

Xavier (2013) afirma que o aparato eletrônico digital que a sociedade possui hoje leva à criação
de formas sociais e comunicativas inovadoras como resultado de um uso intensivo das novas
tecnologias e, como esses eventos são geralmente mediados e efetivados por gêneros orais,
escritos e, agora digitais, será possível notar a criação de formas de letramentos ainda inéditos.

2.3 IHC – INTERAÇÃO HUMANO-COMPUTADOR

Tendo em vista a criação de um sistema com características essencialmente inclusivas e


compreendendo que as TIC estão exercendo uma presença cada vez mais abrangente na
sociedade, ter o cuidado de elaborar um projeto de IHC competente é um dos fatores chaves
para que se obtenha a aceitação esperada. Experiências malsucedidas afastam os usuários,
principalmente se não possuem um nível de experiência regular.
A IHC é um campo de estudo interdisciplinar que tem como objetivo geral a
compreensão de como e porque o usuário utiliza a tecnologia da informação. O termo vem
sendo adotado desde os anos 1980 em estudos sobre como o uso de tecnologias interativas
computacionais afetam a vida pessoal e profissional do usuário, tendo como foco as principais
limitações na interação do homem com as tecnologias complexas. Fornece aos desenvolvedores
técnicas e tecnologias e formas alternativas de utilização para que haja uma interação coesa e
eficiente entre as partes. Segundo Santos (2012), a IHC estuda o processo de design quando o
objetivo global é promover a mudança do projeto centrado no sistema para projetos centrados
nos usuários. Além disso, busca o entendimento de como o usuário compreende um sistema
computacional através da sua utilização, para que, assim, sistemas possam ser otimizados com
foco em usabilidade, tendo em vista atender às suas necessidades.
São três os requisitos básicos da interação do usuário com o sistema:

 definição do usuário;
 tarefas/necessidades do usuário;
 qual o ambiente/contexto da interação.
A IHC propõe fazer uma análise complexa de caso levando em consideração os aspectos
interdisciplinares ilustrados a seguir, a fim de se obter subsídios para a construção de um projeto
eficiente de usabilidade de interface:
29

Figura 3: Aspectos interdisciplinares da IHC

Fonte: Adaptado de Santos (2012).

2.3.1 UI - User Interface

O desenvolvimento da interface é a consolidação dos aspectos previamente levantados,


especialmente o que foi definido pela arquitetura da informação, bem como os elementos
visuais e de interação. É recomendado que se acompanhe os processos de prototipação e
usabilidade desde suas etapas iniciais, ou que siga as recomendações já documentadas nas fases
preliminares. Algumas boas práticas para se obter um desenvolvimento de interface que garanta
as premissas da usabilidade e acessibilidade devem ser seguidas.
Deve-se manter a interface simples. As melhores interfaces devem ser quase invisíveis
para o usuário. Deve-se evitar elementos desnecessários e ser claro na linguagem adotada para
os itens essenciais, como menu, por exemplo.
Outra questão importante é criar consistência e usar elementos de interface comuns ao
usuário. Ao utilizar elementos comuns na interface, os usuários vão se sentir mais confortáveis
e serão capazes de fazer as coisas mais rapidamente. É importante também, para criar padrões
de linguagem, trabalhar o layout e o design em todo o site para promover a eficiência. Uma vez
30

que um usuário aprende como fazer algo, ele deve ser capaz de transferir essa habilidade para
outras partes do sistema ou site.
Deve ser proposital no layout da página, considerar as relações espaciais entre os itens
na página e estruturar a página com base em importância. Efetuar uma disposição cuidadosa de
itens pode ajudar a chamar a atenção para as partes de informação mais importantes e podem
auxiliar a busca e legibilidade.
Utilizar cores e texturas estrategicamente conduzem a atenção em direção ou a
redireciona para longe de itens usando cor, luz, contraste e textura em prol da comunicação
objetiva da interface.
Deve-se usar tipografia para criar hierarquia e clareza e deve-se considerar
cuidadosamente como utilizar os tipos. Diferentes tamanhos, fontes e organização de texto
ajudam a aumentar a legibilidade, leitura e scannability.
Certificar-se de que o sistema comunicará ocorrências em tempo de execução; sempre
informar ao usuário sua localização, ações, alterações no estado, ou erros; e utilizar-se de vários
elementos da UI para comunicar o status e, se necessário, os próximos passos podem reduzir a
frustração para o seu usuário.
É importante prever padrões, pensar e antecipar os objetivos que levam o usuário até a
interface e criar padrões que reduzam a carga sobre ele, por exemplo, autocompletar
formulários.
Além dos pressupostos da IHC aqui expostos, esta pesquisa utiliza amplamente o
referencial teórico da Ergonomia Cognitiva para conduzir com eficiência os projetos para
concepção e desenvolvimento de interfaces, uma vez que, utilizando como referência os
processos cognitivos de uma determinada população, torna-se possível realizar adequações e
melhorias no aparato tecnológico (SILVINIO; ABRAHÃO, 2003).

2.3.2 UCD – User Centred Design

Para apoiar e garantir projetos com foco no usuário em um ambiente heterogêneo como
o proposto pela IHC, a International Organization for Standardization publicou a ISO 9241-
210:2010 sob o título de Ergonomics of human-system interaction - Part 210: Human-centred
design for interactive systems, em que estão descritos em detalhes os aspectos essenciais a ser
levados em consideração em projetos centrados no usuário. E tem como definição:
Fornecer requisitos e recomendações para os princípios e as
atividades de design centrada no homem ao longo do ciclo de
vida de sistemas interativos baseados em computador. Destina-se
31

a ser utilizada por aqueles que gerenciam os processos de projeto,


e está preocupada com as formas em que ambos os componentes
de sistemas interativos de hardware e software podem melhorar
a interação humano-sistema.

O termo UCD foi definido e largamente utilizado a partir da publicação da norma ISO
13407:1999 - Human centred design processes for interactive systems, que foi, porém,
substituída em 2010 pela ISO 9241-210:2010. Entretanto, o termo UCD ainda é amplamente
aplicado, independente da mudança.
A ISO 92410-210:2010 define os pilares chaves para o desenvolvimento de projetos com
foco no usuário da seguinte forma:
 O projeto deve ser baseado em um entendimento explícito de usuários, tarefas e
ambientes;
 Usuários estão envolvidos em toda a concepção e desenvolvimento;
 O projeto é conduzido e refinado através de avaliações centradas no usuário;
 O processo é iterativo;
 O projeto aborda toda a experiência do usuário;
 A equipe de projeto inclui habilidades e perspectivas multidisciplinares.

Pode-se aferir que essas determinações são a essência da metodologia de desenvolvimento


com foco na experiência do usuário, conhecida como User Experience, ou simplesmente, UX3.

2.3.3 UX – User Experience

A UX concentra-se em obter uma profunda compreensão dos usuários, o que eles


precisam, o que eles valorizam, suas habilidades, e também as suas limitações. Também leva
em conta as metas e objetivos de negócios do grupo de gestão do projeto. Melhores práticas
UX promovem a melhoria da qualidade da interação do usuário bem como uma melhora na
qualidade do produto/serviço que está sendo oferecido. É essencial entender que, apesar de os
principais aspectos no desenvolvimento do projeto já estarem bem consolidados, cada novo
projeto terá suas particularidades exclusivas e deverá ser interpretado de forma holística para
que não seja deixado de fora algum aspecto fundamental para a satisfação do usuário e

3
Também encontra-se na literatura o termo “UxD”, User Experience Design.
32

efetividade de uso do sistema. O designer de experiência, Peter Morville (2004)4, observou que,
para que haja uma experiência de usuário significativa e valiosa, a informação deve ser útil,
utilizável, desejável, encontrável, acessível e crível e, a partir desses argumentos, desenvolveu
o UX Honneycomb, ou favo de mel da experiência do usuário, que representa o processo de
desenvolvimento de projetos com foco em UX. Essa representação está ilustrada na Figura 4.

Figura 4: UX Honneycomb

Fonte: Adaptado de Peter Morville (2004).

 Útil: Seu conteúdo deve ser original e atender a uma necessidade;


 Utilizável: Site deve ser fácil de usar;
 Desejável: Imagem, identidade, marca e outros elementos de design são usados para
evocar a emoção e gratidão;
 Encontrável: Conteúdo precisa ser navegável e localizável no local e externamente;
 Acessível: Conteúdo precisa ser acessível às pessoas com deficiência;
 Críveis: Os usuários devem confiar e acreditar no que está sendo dito a eles.
Dado o avanço no uso de interfaces digitais por suas respectivas populações em um ritmo
avançado, governos e organizações nacionais e internacionais vêm investindo na adoção e
divulgação de padrões para desenvolvimento de projetos centrados no usuário, a fim de cumprir

4
Disponível em <http://semanticstudios.com/user_experience_design/>.
33

suas demandas de inclusão digital. Com base nessas premissas, o U.S. Department of Health &
Human Services (2015) disponibilizou online um sítio web5 para divulgação de padrões de
desenvolvimento com foco no usuário, em que se pontuam alguns aspectos essenciais para o
projeto de interfaces com acessibilidade.
É relevante ainda destacar que a UX é um campo crescente e que muito ainda está sendo
definido e que apesar de já ter a sua metodologia definida, sofre constantes modificações com
o advento de novas formas de interação entre o usuário e interface surgirem a cada dia em maior
quantidade e menor tempo, exemplos como, interação holográfica, smart wearables, realidade
virtual, internet das coisas começam a fazer parte do cotidiano dos projetistas de interfaces com
IHC.
Criar um design centrado no usuário com sucesso engloba os princípios da interação
humano-computador (IHC) e vai além de incluir as seguintes disciplinas:
 Gestão de Projetos: concentra-se no planejamento e organização de um projeto e seus
recursos. Isto inclui a identificação e gestão do ciclo de vida para ser usado, aplicando-
o ao processo de design centrado no usuário, formulação da equipe do projeto de
forma eficiente e orientação da equipe em todas as fases até a conclusão do projeto;
 Pesquisa do usuário: concentra-se em entender o comportamento dos usuários,
necessidades e motivações através de técnicas de observação, análise de tarefas e outras
metodologias de feedback;
 Avaliação de Usabilidade: incide sobre o quão bem os usuários podem aprender e usar
um produto para atingir seus objetivos. Também se refere à forma como os usuários
estão satisfeitos com esse processo. Nessa etapa é importante adotar algum modelo
heurístico para promover avaliações. Por exemplo, as regras de ouro de Ben
Shneiderman6, ou a heurística proposta por Nielsen7, ambas apresentadas nos quadros a
seguir, respectivamente:

5
Disponível em < http://usability.gov>.

6
Ben Shneiderman (Nova Iorque, 21 de agosto de 1947) é um americano cientista da computação e professor de
Ciência da Computação do Laboratório de Interação Humano-Computador na Universidade de Maryland, College
Park. Ele conduziu a investigação fundamental no domínio da interação humano-computador, desenvolvimento
de novas ideias, métodos e ferramentas, tais como a interface de manipulação direta, e seus oito regras de design.
7
Consultor, escritor e orador dinamarquês, Jakob Nielsen nasceu em 1957 na cidade de Copenhague, Dinamarca.
Doutorado em Ciências Informáticas e design de interfaces de usuário pela Universidade Técnica da Dinamarca,
Nielsen trabalhou para várias empresas ligadas ao ramo da Informática como a Bellcore, a IBM, ou mais
recentemente a Sun Microsystems, onde desempenhou as funções de pesquisador sênior. É considerado um dos
maiores especialistas em usabilidade da web.
34

Quadro 1: As 8 regras de ouro de Bem Shneiderman


As 8 regras de ouro de Ben Shneiderman

1. Consistência: Sequência de ações similares para procedimentos similares. Manter um


padrão visual para as cores, layout e fontes. Utilizar a mesma terminologia em menus.
2. Atalhos para utilizadores assíduos: Teclas de atalho, macros e navegação simples
facilitam e agilizam a interação do utilizador mais experientes com a interface.
3. Feedback informativo: Toda e qualquer ação do utilizador requer uma resposta do
sistema, que será mais ou menos explicativa dependendo do tipo de ação a ser executada.
4. Diálogos que indiquem término da ação: As sequências de ações do sistema devem
ser organizadas de tal forma que o usuário consiga entender os passos e saiba quando cada
um deles for executado com sucesso.
5. Prevenção e tratamento de erros: A interface não pode dar vias para o utilizador
cometer erros graves e, caso ocorram erros, deve haver mecanismos que tratem, corrijam na
medida do possível e, caso não seja possível, instrua o usuário para uma possível solução.
6. Reversão de ações: Sempre que possível, as ações devem ser reversíveis, de forma
que tranquilize o utilizador e lhe dê mais coragem para explorar o sistema.
7. Controle: Os utilizadores mais experientes devem ter a sensação de que eles dominam
os processos do sistema e que ele apenas responde às suas ações.
8. Baixa carga de memorização: O sistema deve conter uma interface simples para
memorização. Para isso requer uma boa estrutura e equilíbrio para relacionar elementos e
facilitar a memorização subjetiva das telas, sem exigir esforço.
Fonte: Preece, Rogers, Sharp (2013)

Quadro 2: As 10 Heurísticas de Nielsen


As 10 Heurísticas de Nielsen

1. Visibilidade de status do sistema;


2. Relacionamento entre a interface do sistema e o mundo real;
3. Liberdade e controle do usuário;
4. Consistência;
5. Prevenção de erros;
6. Reconhecimento ao invés de lembrança;
7. Flexibilidade e eficiência de uso;
8. Estética e design minimalista;
9. Ajuda aos usuários para reconhecer, diagnosticar e sanar erros;
10. Ajuda e documentação .
Fonte: Preece, Rogers, Sharp (2013)

 Arquitetura da Informação (AI): concentra-se em como a informação é organizada e


estruturada, e apresentada aos usuários;
35

 User Interface (UI): o projeto UI é centrado em antecipar o que os usuários podem


precisar fazer e garantir que a interface contenha elementos que são de fácil acesso,
entendimento e utilização para facilitar essas ações;
 Design de Interação (IxD): centra-se na criação de sistemas interativos envolventes
com comportamentos bem pensados;
 Design Visual: concentra-se em garantir uma interface esteticamente agradável que
esteja em consonância com os objetivos da marca;
 Estratégia de Conteúdo: concentra-se na escrita e curadoria de conteúdo útil,
planejando a criação, entrega e governança;
 Acessibilidade: concentra-se em como um indivíduo deficiente acessa ou se beneficia
de um site, sistema ou aplicativo;
 Web Analytics: centra-se na coleta, elaboração de relatórios e análise de dados do site.
Embora desenvolver uma interface interativa implique uma abordagem Gestalt8 para o
design, o que significa utilizar um conjunto de elementos para formar um padrão que represente
algo maior que a soma das partes, projetos UX colocam ênfase especial no lado humano da
interação humano-computador, mapeando aspectos sensíveis como emoções e cognição, não
focando apenas na usabilidade, e sim conduzindo sua análise para dentro do campo da
ergonomia. Contudo, esta pesquisa, tem como foco principal os aspectos de acessibilidade e
usabilidade em projetos de interface que utilizam metodologias com foco no usuário, e,
principalmente, com foco em UX.

2.3.4 Ergonomia Cognitiva

A Ergonomia Cognitiva, aplicada ao desenvolvimento de interfaces, tem como função


demonstrar como se comportam os processos cognitivos no intuito de resolver e corrigir
problemas com diferentes graus de complexidade. A ideia geral da Ergonomia Cognitiva é a
apropriação de alguns conceitos determinados de forma particular afim de explicitar um
referencial teórico compatível com as características imperativas cruzadas no estudo de campo.
A partir disso, fundamentam-se duas considerações do ponto de vista da ergonomia sobre a

8
A escola de psicologia gestáltica, fundada em 1912, definiu um conjunto de leis de percepções de padrões visuais,

denominadas leis gestálticas ou comumente chamadas de Gestalt (Barbosa e Silva, 2010).


36

cognição: como entender e expor a informação coletada e associada aos usuários pesquisados;
e como entender o conceito de cognição em ação para poder intervir e gerar resultados para a
reorganização ou reconstrução do projeto. Silvinio e Abrahão (2003) defendem a seguinte
aplicação desse conceito:

[...] O primeiro é como apreender e explicar o tratamento de informações num


dado contexto mediado pelos objetivos e exigências da tarefa, associado às
características das pessoas envolvidas. Logo, trata-se de uma cognição situada.
O segundo é que este processo cognitivo implica na particularização de um
conhecimento mais geral, para responder a uma situação posta com um fim
específico, portanto, com caráter finalístico. Isso implica conceber um conceito
de cognição em ação, ou seja, destinada a um fim específico que propicie uma
intervenção no meio e que gere subsídios para os projetos de novos artefatos.
Sob esta perspectiva é que se incorpora o usuário, não somente nas suas
características demográficas (como sexo e idade), mas, principalmente, na
interação com a interface gráfica. Ao se adotar a atividade como fio condutor da
análise, é possível recuperar as estratégias utilizadas para navegar, compreender
como determinada população estrutura os problemas e como é construída a sua
ação. Estas são características que compõem a competência do usuário em agir.

Essa competência do usuário em agir é posta em prática em um ambiente cuja


inteligibilidade pode favorecer, ou não, a obtenção dos resultados esperados. Nesse sentido, a
navegabilidade é compreendida em função da usabilidade que a interface apresenta, bem como
pelas representações do usuário, suas estratégias de resolução de problemas e de como o
processo decisório é constituído (SILVINIO; ABRAHÃO, 2003).
“A ergonomia, enquanto disciplina científica, objetiva adequar os sistemas e os
ambientes de trabalho ao homem” (BARROS, 2003) e faz uso de um vasto conjunto de ciências
e mecanismos que resultam em técnicas e metodologias para uma melhor adaptação do homem
ao uso de máquinas e equipamentos. Dessa forma, cumpre um papel essencial no
desenvolvimento de interfaces projetadas para atender à interação humano-computador, com
grau de sucesso satisfatório.

2.3.5 Critérios ergonômicos e usabilidade

A usabilidade de uma TIC refere-se às características de utilização e aprendizado de uma


interface de maneira eficiente, eficaz e satisfatória para o usuário, abordando os aspectos
relacionados às suas limitações psicológicas e cognitivas. Já a acessibilidade é a característica
da TIC que se refere ao tratamento dos problemas atinentes às barreiras existentes para o acesso,
relacionadas às questões físicas, motoras e sensoriais de uma pessoa. “A acessibilidade de uma
37

interface assegura o acesso a um sistema, ou seja, garante que todos os usuários sejam capazes
de utilizá-lo com autonomia” (CPQD, 2010).
Para garantir o acesso de um sistema para seus utilizadores, aponta-se como necessário
garantir a sua inteligibilidade, adequando seus conteúdos e interfaces aos perfis culturais e
linguísticos associados ao nível de letramento de cada usuário, utilizando aspectos da
ergonomia cognitiva que correspondam aos modelos mentais e às estratégias de memorização
e abstração relacionadas ao público-alvo que irá utilizar a interface, de forma a adequar o
conteúdo digital disposto na Internet ao seu completo entendimento (CPQD, 2010).
Bastien e Scapin (1997) propuseram a definição de critérios ergonômicos para a criação
e a avaliação de interfaces no intuito de proporcionar uma padronização nos métodos
empregados para a construção de interfaces ergonomicamente eficazes. Com foco em
usabilidade, a utilização dos critérios propostos deve servir como guia tanto para especialistas
em ergonomia como para os desenvolvedores de interfaces.
No esforço de divulgar a metodologia proposta por Bastien & Scapin (1997), um estudo
promovido pelo Laboratório de Utilizabilidade da Informática da Universidade Federal de
Santa Catarina (Labiutil - UFSC) traduziu e publicou os critérios propostos a seguir.

2.3.6 Critérios Ergonômicos

Condução
A condução refere-se aos meios disponíveis para aconselhar, orientar, informar, e
conduzir o usuário na interação com o computador (mensagens, alarmes, rótulos, etc.). Uma
boa condução facilita o aprendizado e a utilização do sistema permitindo que o usuário a
qualquer tempo saiba onde se encontra em uma sequência de interações ou na execução de uma
tarefa e também conheça as ações permitidas bem como suas consequências, bem como o
possibilite obter informações suplementares.
A facilidade de aprendizado e de utilização, que é consequência de uma boa condução,
permite melhorar o desempenho e diminuir o número de erros.
Carga de trabalho
O critério Carga de Trabalho diz respeito a todos elementos da interface que têm um
papel importante na redução da carga cognitiva e perceptiva do usuário, e no aumento da
eficiência do diálogo. Quanto maior for a carga de trabalho, maior será a probabilidade de
cometer erros. E também, quanto menos o usuário for distraído por informação desnecessária,
38

mais ele será capaz de desempenhar suas tarefas eficientemente. Além disso, quanto menos
ações são necessárias, mais rápidas serão as interações.
Controle explícito
O critério Controle Explícito diz respeito tanto ao processamento explícito pelo sistema
das ações do usuário, quanto do controle que os usuários têm sobre o processamento de suas
ações pelo sistema. Quando os usuários definem explicitamente suas entradas, e quando essas
entradas estão sob o controle deles, erros e ambiguidades são limitados. Além disso, o sistema
será melhor aceito pelos usuários se eles tiverem controle sobre o diálogo.
Adaptabilidade
A adaptabilidade de um sistema diz respeito a sua capacidade de reagir conforme o
contexto, e conforme as necessidades e preferências do usuário. Uma interface não pode atender
ao mesmo tempo a todos os seus usuários em potencial. Para que ela não tenha efeitos negativos
sobre o usuário, esta interface deve, conforme o contexto, se adaptar ao usuário. Por outro lado,
quanto mais variadas são as maneiras de realizar uma tarefa, maiores são as chances que o
usuário possui de escolher e dominar uma delas no curso de seu aprendizado. Deve-se portando
fornecer ao usuário procedimentos, opções, comandos diferentes permitindo-lhe alcançar um
mesmo objetivo.
Gestão de erros
A gestão de erros diz respeito a todos os mecanismos que permitem evitar ou reduzir a
ocorrência de erros, e quando eles ocorrem, que favoreçam sua correção. Os erros são aqui
considerados como entrada de dados incorretos, entradas com formatos inadequados, entradas
de comandos com sintaxes incorretas e outros. As interrupções provocadas pelos erros têm
consequências negativas sobre a atividade do usuário. Geralmente, elas prolongam as
transações e perturbam a planificação. Quanto menor é a possibilidade de erros, menos
interrupções ocorrem e melhor é o desempenho.
Coerência ou consistência
O critério homogeneidade/coerência refere-se à forma na qual as escolhas na concepção
da interface (códigos, denominações, formatos, procedimentos etc) são conservadas idênticas
em contextos idênticos, e diferentes para contextos diferentes.
Os procedimentos, rótulos, comandos, e demais elementos, são mais bem reconhecidos,
localizados e utilizados, quando seu formato, localização, ou sintaxe são estáveis de uma tela
para outra, de uma seção para outra. Nestas condições o sistema é mais previsível e a
aprendizagem mais generalizável; os erros são diminuídos. É necessário escolher opções
39

similares de códigos, procedimentos, denominações para contextos idênticos, e utilizar os


mesmos meios para obter os mesmos resultados. É conveniente padronizar tanto quanto
possível todos os objetos quanto ao seu formato e sua denominação, e padronizar a sintaxe dos
procedimentos. A falta de homogeneidade nos menus, por exemplo, pode aumentar
consideravelmente os tempos de procura. A falta de homogeneidade é também uma razão
importante da recusa na utilização.
Alguns exemplos de recomendações são:
 Localização similar dos títulos das janelas;
 formatos de telas semelhantes;
 procedimentos similares de acesso às opções dos menus;
 na condução, sempre utilizar as mesmas pontuações e as mesmas construções de frases;
 apresentar na mesma posição os convites (prompts) para as entradas de dados ou de
comandos;
 os formatos dos campos de entrada de dados devem sempre ser os mesmos;
 comentários.
Homogeneidade/coerência vs. condução
Quando se trata de considerar ou comparar diversas interações, diversos objetos ou
outros elementos incluídos, objetos de condução, apela-se para o critério
homogeneidade/coerência. Por exemplo, apresentar os títulos de janelas em posições idênticas
refere-se ao critério homogeneidade/coerência.
Homogeneidade/coerência vs. compatibilidade
A homogeneidade/coerência se aplica no âmbito de uma determinada interface. Quando
a homogeneidade/coerência se refere aos aspectos externos da aplicação (ex. formulários em
papel) ou se refere a outras aplicações ou ambientes fala-se então da compatibilidade.
Significado dos códigos e denominações
O critério significado dos códigos e denominações diz respeito a adequação entre o
objeto ou a informação apresentada ou pedida, e sua referência. Códigos e denominações
significativas possuem uma forte relação semântica com seu referente. Termos pouco
expressivos para o usuário podem ocasionar problemas de condução onde ele pode ser levado
a selecionar uma opção errada.
Quando a codificação é significativa, a recordação e o reconhecimento são melhores.
Códigos e denominações não significativos para os usuários podem lhes sugerir operações
inadequadas para o contexto, lhes conduzindo a cometer erros.
40

Alguns exemplos de recomendações são:


 O título deve transmitir o que ele representa e ser distinto de outros títulos;
 explicitar as regras de contração ou de abreviação;
 utilizar códigos e denominações significativas e familiares em vez de códigos e
denominações arbitrárias (ex.: utilizar M para masculino e F para feminino em vez de 1
e 2).
Significado dos códigos e denominações vs. Legibilidade
O critério legibilidade não se refere aos aspectos semânticos das informações, sua pertinência
ou sua significação. Estas características estão relacionadas ao critério significado dos códigos
e denominações.
Compatibilidade
O critério compatibilidade refere-se ao acordo que possa existir entre as características
do usuário (memória, percepção, hábitos, competências, idade, expectativas e outras) e das
tarefas, de uma parte, e a organização das saídas, das entradas e do diálogo de uma dada
aplicação, de outra. Ela diz respeito também ao grau de similaridade entre diferentes ambientes
e aplicações. A transferência de informações de um contexto ao outro é tanto mais rápida e
eficaz quanto menor é o volume de informação que deve ser recodificada.
A eficiência é aumentada quando os procedimentos necessários ao cumprimento da
tarefa são compatíveis com as características psicológicas do usuário, os procedimentos e as
tarefas são organizados de maneira a respeitar as expectativas ou costumes do usuário, quando
as traduções, as transposições, as interpretações, ou referências a documentação são
minimizadas. Os desempenhos são melhores quando a informação é apresentada de uma forma
diretamente utilizável (telas compatíveis com o suporte tipográfico, denominações de
comandos compatíveis com o vocabulário do usuário etc).
Alguns exemplos de recomendações são:
 A organização das informações apresentadas deve estar conforme a organização dos
dados a entrar;
 os formatos das telas devem ser compatíveis com os documentos em papel;
 os procedimentos de diálogo devem ser compatíveis com a ordem assim como o usuário
a imagina ou conforme o seu costume;
 o formato da data deve respeitar o formato do país que a aplicação será utilizada (ex.:
na França o formato da data é dia/mês/ano e na Inglaterra é mês/dia/ano;
 os termos empregados devem ser familiares aos usuários, relativos à tarefa a realizar;
41

 as unidades de medida devem ser as que são habitualmente utilizadas;


 a apresentação de texto na tela deve ser conforme as convenções utilizadas para a
apresentação de texto em papel.
Quando há a incorporação conceitual dos critérios apresentados, na concepção ou
avaliação de um projeto de interface entre homem e máquina, e, apoiando-se em dados
característicos da população usuária, é possível identificar, nas telas/páginas de acesso os
símbolos, as lógicas de funcionamento e os elementos familiares, possibilitando aplicar
correções e/ou novas implementações. A importância está em poder se apoiar na lógica do
usuário e não apenas na de quem projeta a interface (SILVINIO; ABRAHÃO, 2003).
Capítulo
Capítulo

33
43

3 Metodologia

Inicialmente, ainda na fase da qualificação, esta pesquisa pretendia não apenas


organizar um levantamento de métodos e técnicas, mas desenvolver uma interface e testá-la.
Porém, a banca de avaliação propôs que o escopo do trabalho fosse dividido em três possíveis
frentes, respectivamente. Optou-se pelo caminho da fundamentação teórica a fim de se
organizar uma metodologia que desse suporte e orientação para o desenvolvimento de projetos
com foco específico no usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo letramento, uma vez
que não foram encontrados trabalhos com esse foco específico.
A norma ISO 9241-210:2010 recomenda que a concepção de interfaces que tenham
foco no ser humano, independente da metodologia de projeto, atribuição de responsabilidades
ou papéis adotados, siga os seguintes princípios:
 o projeto é baseado em um entendimento explícito de usuários, tarefas e ambientes;
 os usuários estão envolvidos em todo o projeto e desenvolvimento;
 o projeto é conduzido e refinado por uma avaliação centrada no usuário;
 o processo é iterativo;
 o projeto aborda a experiência do usuário como um todo;
 a equipe do projeto inclui competências e perspectivas multidisciplinares.
Toda interface computacional está ligada a um sistema que computará informações a
fim de se obter um resultado específico, portanto, deve-se ter claro qual é o problema que
precisa ser resolvido, antes mesmo das fases iniciais de um projeto. A norma não busca
prescrever a adoção de nenhum processo de projeto específico, porém oferece um framework
para que o desenvolvimento centrado no ser humano seja conduzido e refinado pela avaliação
centrada no usuário, de forma a garantir que todos os aspectos de usabilidade e acessibilidade
sejam respeitados.
Exposto isso, com o objetivo de levantar uma metodologia de trabalho que seja prática
e consistente aos princípios aqui apresentados, foi feita uma comparação da metodologia de
projetos baseada na experiência do usuário (UX) junto a ISO 9241-210:2010, a fim de adequar
os passos de desenvolvimento para o público específico, objeto deste trabalho
44

3.1 Gestão de Projetos


O primeiro passo é elencar as características que devem constar no planejamento
inicial de um projeto centrado no usuário. Tanto a ISO 9241-210:2010 quanto as recomendações
do U.S. Department of Health & Human Services (2015) sobre desenvolvimento de projetos
UX sugerem que deve haver um entendimento explícito de usuários, tarefas e ambientes.
Portanto, nesta etapa, deve ser feito o levantamento dos usuários e dos demais grupos de
stakeholders relevantes, bem como suas tarefas, conforme exemplo no quadro a seguir:

Quadro 3: Levantamento de usuários e stakeholders


Usuários e Stakeholders Tarefas
Indivíduo adulto não-alfabetizado e/ou Presente na parte inicial do projeto,
de baixo letramento participante ativo nas iterações das decisões
de requisitos e interceptação de
inconformidades com o objetivo da interface.
Exerce papel fundamental na homologação
final da interface.
Gerente de projeto Responsável por conduzir e garantir a
execução conforme o planejado. Também
coordena os aspectos individuais de cada
etapa e garante que haja um entendimento
correto dos objetivos.
Consultor em linguística Exerce um papel fundamental na etapa de
arquitetura da informação, orientando como
deve ser feita a comunicação para o público
específico.
Designer Atua na adequação do conteúdo e objetivos
para uma comunicação visual, garantindo um
diálogo eficiente entre a interface e o usuário.
Programador front-end Responsável direto pela adequação do
sistema computacional e suas premissas à
interface proposta pelo designer.
Programador back-end Converte os requisitos funcionais levantados
ao longo do projeto em um sistema
computacional
Fonte: Elaborado pelo autor.

O próximo passo é a identificação do ambiente no qual o projeto estará inserido, quais


suas características predominantes e qual o grau de dificuldade de integração, assim
possibilitando extrair estimativas de tempo para cada etapa desenvolvida. Exemplo disso é se o
ambiente é público ou privado, se haverá monitores ou se o uso será remoto, se será para uso
desktop, mobile ou ambos. Cada decisão acertada acerca do ambiente proposto gera um
45

feedback de crucial importância nas estimativas de tempo, de complexidade tecnológica e de


inteligibilidade inserida nos recursos interativos da interface e, obviamente, este aspecto está
intrinsicamente ligado a qual problema essa interface de sistema deverá resolver e, nesta etapa,
o usuário irá auxiliar nas questões de ergonomia que nortearão a sequência de desenvolvimento,
pois ficará claro ONDE, COMO, QUANDO e PORQUE ele fará o uso da interface. Com essas
informações esclarecidas, a equipe poderá sugerir melhorias no contexto de uso com o objetivo
de facilitar as ações do usuário no ambiente, a partir de um ponto estabelecido, ao invés de fazê-
lo apenas a partir de conceitos generalistas e/ou da própria experiência. Quanto mais detalhada
for a descrição do contexto de uso, a fase de levantamento de requisitos será mais precisa e
completa.
Ainda na fase de planejamento do projeto, é importante verificar se todas as fases do
ciclo de vida – concepção, análise, projeto, implementação, teste e manutenção –, estão
adequadas à participação do usuário em cada uma das iterações propostas, para garantir uma
implementação efetiva. Para tal, é necessário revisar passo a passo o planejamento durante o
ciclo, a fim de que, apesar de haver mudanças de requisitos, o projeto continue a atender às
necessidades e objetivos iniciais, como ilustra a figura 5:

Figura 5: Interdependência entre atividades de projeto centrado no ser humano

Fonte: Baseado no diagrama proposto pela ISO 9241-210:2010


46

Dessa forma, assegura-se que o projeto possa ser validado a cada iteração e garante-se
a participação do usuário na fase de desenvolvimento de cada etapa, bem como uma maior
inteligibilidade nas tomadas de decisões, tendo como foco as necessidades reais do usuário,
otimizando todo o processo e reduzindo a margem de erros que possa ocorrer. Na fase de
definição de projeto, é importante a equipe ter clareza que projetar para a experiência do usuário
é um processo de inovação que considera a satisfação em seu uso. Isso inclui proporcionar uma
experiência de utilização da interface que afete positivamente os aspectos emocionais, estéticos,
performáticos e que alcance uma eficiente experiência ao usuário.

3.2 Pesquisa do Usuário

A comunicação do sistema para com o usuário é feita através da interface. De um lado,


a máquina quer os dados para processar e, do outro, o usuário pretende fornecer esses requisitos
a ela para obter o que deseja. Para tanto, essa comunicação ocorre através da interface e,
portanto, precisa ser projetada para realizar uma eficiente comunicação interativa entre o
usuário e o sistema. O STID (CPQD, 2010), aponta que esta comunicação deve ser inequívoca
e direta, conduzir as ações do usuário e agregar à inteligência da interface uma gama de
possíveis ações e reações do usuário durante a interação.
Nessa etapa, para que isso ocorra de forma eficaz, é necessário pesquisar quais as
características cognitivas e qual o grau de letramento predominante do público-alvo, bem como
características culturais peculiares, e qual é o ambiente ou ecossistema principal. Por exemplo,
se a interface a ser desenvolvida for para utilização do público em um sistema de saúde da rede
pública, localizado em um bairro rural de uma cidade interiorana paulista, com cerca de cinco
mil habitantes e que permita aos seus usuários fazer agendamentos de consultas, deverá ser feita
uma análise semiótica de caso específico para se descobrir, por exemplo, como esse usuário
compreenderá melhor a forma de tratamento direcionada a ele, como “você”, “tu”, “ti”, “o/a
senhor/a” etc, ou como, no caso do sistema ficar localizado em um quiosque dentro de uma
unidade de saúde, quais as cores predominantes no ambiente, qual cor melhor contrastará e
quais as iconografias mais eficazes para chamar a atenção, do usuário transeunte que não saiba
ler, à tela da interface, por exemplo. Na prática, da análise desses dados vão surgir os subsídios
necessários para se definir uma comunicação adequada ao usuário.
Para auxiliar na coerência deste levantamento e para obter resultados substanciais ao
planejamento do projeto, deve-se utilizar alguns métodos que se diferenciam entre si conforme
cada necessidade, como os descritos no quadro 4:
47

Quadro 4: Métodos de pesquisa


Método Características principais Classificação
Entrevistas Contextuais  Em geral não se faz perguntas sobre aspectos pontuais  Método
do projeto como tarefas do usuário e cenários de uso; qualitativo
 As perguntas são em torno dos hábitos de uso e a coleta  Pode ser
da informação provém não só das respostas, mas combinado com
também da observação; os testes de
 Observa-se o ambiente de uso e a tecnologia que utiliza usabilidade
habitualmente;
 Se existe um setor de monitoria para auxiliar o usuário
em caso de dúvidas ou problemas;
 Qual o tipo de internet que se tem disponível
 Quanto tempo levam para cumprir tarefas comuns e/ou
específicas
Grupos de foco  Uma discussão moderada, tipicamente entre 5 a 10  Método
participantes, em que o objetivo é aprender as atitudes qualitativo
dos usuários, crenças, desejos e reações a conceitos;
 Em testes de usabilidade, é possível observar as ações
do usuário; um grupo de foco trará à tona experiências
as atitudes do grupo estudado;

Entrevistas individuais  Permite sondar atitudes, crenças, desejos e experiências,  Métodos


bem como obter uma compreensão abrangente dos qualitativo e
usuários que farão uso da interface. quantitativo
 Entrevistados podem avaliar e classificar opções.
Entrevistas individuais são mais flexíveis, podem ser
presenciais, por telefone, videoconferência ou por
sistemas de mensagens eletrônica;
 É importante ter em mente que, na maioria dos casos,
estar face a face com o usuário será sempre a melhor
opção.
Casos de uso  Um caso de uso é uma descrição por escrito de como os  Abstração de uso
usuários irão executar tarefas na interface proposta;
 Descreve, do ponto de vista do usuário, o
comportamento de um sistema e como ele responde a
uma solicitação;
 Cada caso de uso é representado como uma sequência
de passos simples, começando com o objetivo de um
usuário e terminando quando esse objetivo está
cumprido;
 Fornecem uma lista de objetivos e esta lista pode ser
utilizada para determinar o custo e complexidade do
sistema. As equipes de projeto podem então negociar
quais funções tornam-se requisitos que serão
desenvolvidos.
Personas  São representações confiáveis e realistas dos principais  Abstração de
segmentos do público-alvo que servirão como usuários
referência;
 Devem ser baseadas na análise dos resultados obtidos
através das demais técnicas de pesquisa de usuários;
 Devem incluir dados quantitativos e qualitativos
coletados em meios digitais de massa, como a web, ou
base de dados de instituições de pesquisa.
Fonte: Elaboração do autor.
48

Os métodos propostos no quadro 4 podem e devem ser utilizados individualmente não


apenas nas fases iniciais do projeto. Precisam ser revistos e revisados conforme ocorram
mudanças a cada iteração do projeto e, se necessário, reconduzir alguma etapa que se torne
obsoleta e/ou inutilizável. Essas são algumas das características dinâmicas do projeto que
determinam o desenvolvimento com foco no usuário e não apenas em requisitos do sistema.

3.3 Arquitetura da Informação

É nesta fase do desenvolvimento do projeto que deve ser feito um levantamento


minucioso do conteúdo informativo que será transmitido ao usuário através da interface. A
organização, estruturação e rotulagem dos elementos devem proporcionar uma usabilidade
eficaz e estável. Levanta-se quais são as metáforas que melhor se aplicam ao entendimento dos
usuários, e quais modelos mentais são mais apropriados ao objetivo específico da interface,
como, por exemplo, a aplicação de modelos lúdicos ou formais baseando-se nos resultados
previamente coletados nas pesquisas com o usuário. O principal aspecto a ser levado em
consideração aqui é a condução estruturada com base nas tarefas que devem ser completadas
para que o usuário consiga concluir seu objetivo principal. Deve ser feita uma análise geral dos
aspectos funcionais do sistema e dos objetivos que os usuários terão e então propor como dispor
os módulos de informação dentro da interface. O usuário deverá conseguir se localizar, ter
ciência do que está próximo a ele e saber quais resultados esperar em consequência de suas
ações.
Feito isso, delineia-se uma estratégia consistente na escolha do discurso informativo
que deverá ser aplicado em cada uma das etapas que consistam na arquitetura informacional da
interface, bem como subsidia-se a etapa de concepção visual e interatividade que a interface
terá. Para tal, aplicam-se diferentes técnicas de pesquisa interativa com foco no usuário, como:

3.3.1 Sketch

Rascunhos das ideias iniciais e possibilidades a serem seguidas, veja figura 6:


49

Figura 6: Exemplo de Sketch

Fonte: Elaborado pelo autor com base nas recomendações do U.S. Department of Health &
Human Services

3.3.2 Wireframe

É a estruturação do fluxo global que fornece condições para guiar onde serão
colocados os principais elementos de navegação e conteúdo da interface. O objetivo não é
retratar o design visual. Nesta fase, é importante optar pela clareza e simplicidade.

Figura 7: Exemplo de Wireframe

Fonte: Elaborado pelo autor com base nas recomendações do U.S. Department of Health &
Human Services
50

3.3.3 Prototipagem

Definem a estrutura, fluxo e detalhes, sem uma concepção visual final. Protótipos de
baixa fidelidade geralmente feitos em papel e que não permitem muita interatividade do usuário
que, normalmente seguirá uma sequência. Muito útil para validar a usabilidade dos casos de
uso e seus fluxos junto ao usuário, fáceis de fazer e usuários sentem-se mais confortáveis para
sugerir mudanças na estrutura da interface. Já os protótipos de alta fidelidade são feitos no
computador, geralmente utilizando-se de ferramentas UX para esse fim específico. Trazem uma
representação mais realista do que está sendo desenvolvido e podem conter aspectos avaliativos
na sua concepção, como, por exemplo, permitir registrar o tempo que o usuário gastou para
cumprir o objetivo.

Figura 8: Exemplo de Prototipagem

Fonte: Elaborado pelo autor com base nas recomendações do U.S. Department of Health &
Human Services
51

3.3.4 Design

Produto final e completamente desenvolvido.

Figura 9: Exemplo de Design

Fonte: Elaborado pelo autor com base nas recomendações do U.S. Department of Health &
Human Services

O gráfico a seguir demonstra a distribuição e classificação de cada uma das etapas no


decorrer do projeto.
Figura 10: Fases da concepção da interface

Fonte: Baseado no proposto pelo U.S. Department of Health & Human Services (2015)
52

Desenvolver com foco no usuário requer clareza sobre as fases de desenvolvimento e


sobre as mudanças a cada iteração. Nota-se no gráfico apresentado na figura 10, por exemplo,
como o nível de comprometimento com os objetivos do projeto aumentam no decorrer de sua
realização.

3.4 Concepção Visual e Interatividade

Uma vez que, na arquitetura da informação, já se tenha definida qual a carga de


conteúdo e disposição dos elementos para condução das ações, é preciso avaliar qual a estrutura
organizacional que melhor se adequará no relacionamento entre as peças de conteúdo. Essa
etapa, quando feita adequadamente, permite ao usuário prever onde poderá encontrar
determinadas informações através da interface. O U.S. Department of Health & Human
Services (2015), aponta que os modelos mais comuns para a organização dos componentes de
uma interface são:
 Estruturas hierárquicas;
 Estruturas sequenciais;
 Estruturas em matriz ou de hiperlinks;
Segundo o U.S. Department of Health & Human Services (2015), as estruturas
hierárquicas são utilizadas em larga escala na concepção de interfaces, pois representam um
modelo mental amplamente difundido na sociedade através de instituições governamentais,
empresas, religiões, escolas e na família e podem ser representadas em formato de árvore
invertida ou em uma topologia estrelada, como ilustra a figura a seguir:

Figura 11: Exemplos da representação de estrutura hierárquica em formato de árvore invertida


e em topologia estrelada
53

Fonte: Baseado no proposto pelo U.S. Department of Health & Human Services (2015)
Dentre os esquemas organizacionais que foram levantados na análise teórica deste
trabalho, optou-se por utilizar um esquema organizacional misto, entre a topologia hierárquica
e o modelo estrutural informacional sequencial, pois assim se torna eficaz a condução do
usuário não alfabetizado e/ou de baixo letramento para que ele consiga atingir o objetivo através
de conceitos de orientação implantados, facilitando-se a navegação pela interface. A estrutura
sequencial requer que o usuário cumpra tarefas precedentes para que consiga chegar até o
conteúdo específico. Portanto, para que estruturas sequenciais obtenham sucesso em seu uso, é
premissa que a organização do conteúdo esteja devidamente ordenada para tal fim. Apresenta-
se, na figura 12, o esquema de fluxo desta estrutura:

Figura 12: Estrutura Sequencial

Fonte: Baseado no proposto pelo U.S. Department of Health & Human Services (2015)
Após definida esta etapa, é necessário fazer as ligações entre os elementos e
componentes informacionais e a estrutura. Deve-se levar em consideração o balanceamento da
carga informacional, para que o resultado seja inteligível ao usuário. A ISO 9241-210:2010
recomenda que, para garantir uma boa usabilidade, a interface não possua muitos níveis de
54

profundidade. A fim de garantir a usabilidade e inteligibilidade da interface, recomenda-se que


não passe de três níveis, porém, é uma sugestão e não uma regra, pois isso poderá variar
conforme os requisitos e necessidades levantadas, como demonstrado na figura 13.

Figura 13: Estruturas de conteúdo

Fonte: Baseado no proposto pelo U.S. Department of Health & Human Services (2015)

No gráfico da figura 14, é possível observar o grau de complexidade de cada um dos


modelos estruturais. O STID (CPQD, 2010) recomenda que, para projetar com foco em
usabilidade para o usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo letramento, opte-se, sempre
que for possível, por uma estrutura sequencial e com poucas etapas, pois assim garante-se um
aprendizado eficaz na utilização da interface.
A próxima etapa é fazer a escolha dos componentes gráficos que predominarão na
interface. É recomendável, segundo o U.S. Department of Health & Human Services (2015),
sempre que possível, utilizar elementos que já contenham significado para o usuário e que
respeitem o modelo mental definido. É importante conhecer os conceitos, porém não tentar
“reinventar a roda”. No mundo web atual, as maiores empresas digitais que oferecem
massivamente serviços e conteúdos para a população mundial fazem pesquisas e disponibilizam
seus resultados para uso dos desenvolvedores. Como referência, pode-se citar empresas como
Microsoft, Google e Apple. Atualmente, a Google disponibilizou um framework e orientações
de uso da UI intitulada de “Material Design”, onde os elementos simulam comportamentos e
texturas naturais e menos “computacionais”. Outro exemplo é a “Modern UI”, desenvolvida
pela Microsoft, que procura quebrar o paradigma das interfaces com rolagens verticais. Em
55

casos específicos, pode-se optar em criar algo novo para atender às especificações do modelo
mental ou metáfora propostos, como utilizar alguns elementos iconográficos que sejam de um
cotidiano específico. Porém, caso se opte por isso, deverá ser avaliado com mais precisão, a
cada iteração do projeto de desenvolvimento, se realmente foi uma escolha adequada.
Numa interface com acessibilidade, alguns cuidados devem ser tomados como
premissas ao iniciar o projeto de interface do usuário (UI) e do design de interação (DI),
segundo o STID (CPQD, 2010). Ao desenvolver projetos para o governo, deve-se atender, pelo
menos, três públicos que necessitam de interatividade acessível. Por exemplo, se o projeto tem
foco em usuários não alfabetizados e/ou de baixo letramento, também precisa atender ao
público deficiente visual e deficiente auditivo. Seguindo suas recomendações, esta pesquisa
propõe que a interface forneça um mecanismo apropriado de verificação de uso por portadores
de surdez e de deficiência visual. A interação da interface deve ser modificada conforme o perfil
selecionado.
Caso o usuário não selecione acessibilidade, a interface apresentada deverá
compreender o usuário como público universal e específico. Caso o usuário selecione
acessibilidade para deficiência auditiva, a interface automaticamente desabilitará o áudio a fim
de evitar que informações pessoais sejam reproduzidas sem que o usuário perceba, evitando
assim algum tipo de constrangimento ou divulgação de informações confidenciais. Nesse caso,
ainda será necessário atender aos requisitos de usabilidade para público universal e específico.
Caso o usuário seja portador de deficiência visual, a interface desligará os áudios de contexto,
como menus e toolbox, para que não haja incompatibilidade com ferramentas para leitura de
tela, evitando sobrefalas durante a navegação.
A programação algorítmica ou marcadora da interface deverá atender às especificações
de desenvolvimento padrão, normalmente estabelecidas por órgãos como o W3C. É válido
lembrar que a simplicidade é um dos fatores principais quando se desenvolve com foco em
acessibilidade e usabilidade, o que também se aplica ao código que, para ser validado, deve ter
uma boa semântica, o que quer dizer ser compreendido inclusive por uma máquina, como é o
caso dos leitores de tela ou validadores de código. As especificações da W3C são estáveis,
porém, antes de iniciar a codificação da interface, deve-se consultar o que está em vigência para
que não haja problemas na validação eletrônica do material desenvolvido e não acarrete atrasos
no cronograma do projeto.
56

3.5 Avaliação de Usabilidade

Todo desenvolvimento centrado no ser humano deve ser avaliado baseado na


perspectiva do usuário e isso precisa ser feito ao longo das etapas do projeto (U.S. Department
of Health & Human Services, 2015). Em um cenário ideal, essas iterações com a presença do
usuário são recorrentes desde o início até o final do projeto, porém, muitas vezes, essa não é
uma opção. Muitas vezes, em virtude de prazos apertados, outras, por falta de recursos, isso
acaba não ocorrendo dentro do que seria algo ideal. Assim, os stakeholders do projeto devem
estar cientes e aptos a empregar outras técnicas para tal, como, por exemplo, modelagem de
tarefas e simulações, pois são métodos centrados em qual será a experiência do usuário no uso
do sistema, mesmo que ele não esteja participando presencialmente na etapa de iteração.
A fase de avaliação de usabilidade do projeto para o desenvolvimento de interfaces
para usuários maduros não alfabetizados e/ou de baixo-letramento foi dividida em dois
métodos, conforme orienta a norma ISO 9241-201:2010.
O primeiro método são os testes envolvendo os usuários, que podem ser realizados em
qualquer fase do projeto (ISO 9241-210:2010). Em fases iniciais, os usuários poderão ser
apresentados aos rascunhos e modelagens preliminares do projeto, quando podem fazer
avaliações simples quando sugerido que interajam dentro de um contexto real. Nessa fase,
utiliza-se, por exemplo, os modelos de tela ainda em formato sketch, a fim de levantar mudanças
iniciais na navegação do projeto da interface, bem como possíveis alterações no conceito do
sistema. No decorrer do desenvolvimento do projeto, esses modelos iniciais de interação devem
ser aprimorados, inclusive com foco nas mudanças levantadas durante as iterações com o
usuário, e serem reapresentados modelos mais elaborados que, ao serem manipulados,
possibilitem trazer uma carga de informação mais completa para a equipe.
Após os protótipos estáticos serem apresentados e manipulados pelo usuário, convém,
assim que fique pronto um protótipo funcional, testá-lo no âmbito da usabilidade e da satisfação
do usuário. E, por último, executar testes em campo, aplicando a interface desenvolvida em um
ambiente real, e coletando, automática e/ou observacionalmente, as estatísticas de uso, a partir
de métricas como tempo, facilidade, caminhos alternativos, abandono de curso entre outras.
O segundo método é baseado na avaliação através de inspeções (ISO 9241-210:2010).
O usuário não precisa estar sempre presente e seu maior valor é o custo-benefício. A ideia é
utilizá-lo antes das iterações para reduzir problemas de usabilidade e proporcionar um teste com
melhores resultados. O avaliador coloca-se no papel do usuário, tendo em mãos suas
características gerais, específicas, de ambiente e limitações, através de fichas de personas.
57

Quanto mais próximo de um usuário real estiver a ficha de persona, mais verossímil será a
abordagem e o resultado da inspeção. É comum que a avaliação seja apoiada por checklists,
listas de requisitos do usuário, orientações gerais de usabilidade, heurísticas apropriadas,
normas, diretrizes e boas práticas de desenvolvimento. O ponto negativo é que a eficácia do
teste depende intrinsicamente da habilidade, experiência e conhecimentos gerais dos
avaliadores. No entanto, esse tipo de avaliação tende a ser mais rápida e menos complexa do
que testes com usuários reais. Um método complementa o outro, pois a avaliação por inspeção
não traz à tona os mesmos problemas que a avaliação com o usuário. O momento ideal para
aplica-la é quando o projeto já está em execução e não nas fases iniciais, principalmente se a
interface a ser desenvolvida tem características de ineditismo e vai utilizar abordagens de uso
menos tradicionais.
Quando se projeta com foco no usuário, deve-se encaixar os aspectos chaves do projeto
nos testes e heurísticas que serão utilizados e, diferentemente de outras abordagens de projeto,
essas validações são feitas em maior ou menor escala em cada iteração do projeto. Não existe
uma ordem arbitrária de qual métrica usar e em qual ordem. O resultado de cada iteração deve
ser avaliado e aplicado às métricas correspondentes, por exemplo, quando se está avaliando o
uso de um protótipo, a Lei de Hick-Hyman (BARBOSA, 2010), que define o tempo que uma
pessoa demora para tomar uma decisão com base no número de opções disponíveis numa
interface, deverá ser aplicada e o resultado coletado comparado com valores universais e de
médias ponderadas da própria interface, a fim de se construir um ambiente hegemônico e
garantir uma condução adequada a todos os usuários. Outra métrica que deverá ser utilizada
nesse mesmo contexto é a Lei de Fitts (BARBOSA, 2010). Dentro do referencial da ergonomia,
essa lei prediz o tempo que um humano demora para apontar de um ponto inicial a um ponto
destino. Quando esse aspecto é mensurado no uso de uma interface, a partir dos resultados é
possível melhorar o desempenho da interface realocando objetos navegáveis, ou ainda,
influenciar uma condução de aspecto subjetivo.
Segundo a ISO 9241-210:2010, projetos com foco no ser humano são vistos como
práticas sustentáveis, pois promovem uma análise integrada entre os aspectos econômicos,
sociais e ambientais ao se conceber um projeto. Um dos aspectos que torna esse tipo de
desenvolvimento importante é o acompanhamento de longo prazo em relação ao uso da
interface de sistema pelo usuário. Isso ocorre através da coleta periódica de dados para se avaliar
o sucesso do projeto, bem como as cargas intelectuais dos usuários, fatores como adesão,
hábitos de uso e grau de satisfação podem e devem ser medidos a longo do ciclo de vida do
58

sistema e, a partir dos dados coletados, identificar problemas de usabilidade e escopo, promover
melhorias e atualizações e, quando necessário, redesenhar o projeto novamente a fim de atender
às novas necessidades que o usuário tenha. Assim, compreende-se que o projeto de
desenvolvimento só está completamente finalizado após ter sido testado empiricamente por um
tempo determinado, quando a coleta de dados é feita de forma automática pelo sistema e
avaliações sazonais com usuários são feitas até as melhorias estarem devidamente
implementadas.
59
4
59
4 Resultados

Neste capítulo, são apresentados os resultados do trabalho, fruto de uma pesquisa


bibliográfica que auxiliou na construção de um referencial teórico interdisciplinar que abrange
áreas do conhecimento correlatas, porém distintas, que são a Inclusão Social, a Linguística e a
IHC. De maneira sucinta, os resultados obtidos descrevem que os métodos empregados
necessários à concepção de projetos centrados no usuário figuram como uma alternativa ideal
ao modelo tradicional, quando se pretende desenvolver interfaces acessíveis e com usabilidade
para públicos específicos, que, dentro do escopo desta pesquisa, é o usuário maduro não-
alfabetizado e/ou de baixo letramento.
Inicialmente, antes de um aprofundamento maior em cada etapa necessária ao
desenvolvimento do projeto, o trabalho parecia ser “extensamente” inviável, porém, ao se
iniciar o passo a passo metodológico, foi percebido o quão natural é a condução de projetos
com foco no usuário. Torna-se evidente também que, para projetar com foco no usuário,
dificilmente será possível conduzir adequadamente o desenvolvimento com apenas um ou dois
profissionais, pois essa metodologia exige que a equipe de projeto tenha um grande
conhecimento interdisciplinar e outros muito específicos em determinadas áreas, como, por
exemplo, o profissional avaliador, que, caso não seja muito experiente, pode comprometer
significativamente o ciclo de vida do projeto.

4.1 Princípios normativos respeitados


O principal aspecto positivo alcançado foi a validação da metodologia proposta junto
aos princípios da ISO 9241-210:2010, norma que conduz de forma consistente os aspectos
essenciais ao desenvolvimento com foco no usuário a fim de se atingir uma usabilidade
eficiente. Além disso, a abordagem modularizada que a UX propõe foi ao encontro das
premissas normativas, conforme ilustra a figura 14.
60

Figura 14: Comparativo de premissas e métodos

Fonte: Elaborado pelo autor.


61

Esta pesquisa também aponta que a concepção de projetos centrados no usuário tende
a um ciclo de vida coeso, participativo, pontual e com orçamento respeitado. Isso se dá devido
às constantes melhorias em que o projeto é submetido após cada iteração a fim de se concluir
os objetivos estimados em fase inicial, garantindo um produto final menos suscetível a falhas
em seu desenvolvimento, em todos os aspectos do projeto. O modelo de atividades e resultados
proposto pela ISO 9241-210:2010 ilustrado na figura 15 exemplifica o caminho percorrido na
perspectiva do gerenciamento de projeto.

Figura 15: Modelo de atividades e resultados do projeto centrado no ser humano

Fonte: Baseado no exemplo de resultados do projeto centrado no ser humano pela ISO 9241-
210:1010.
62

4.2 Metodologia simplificada para concepção de projetos de interface com


acessibilidade e usabilidade ao usuário maduro não-alfabetizado e/ou de
baixo letramento
Através dos resultados dos métodos empregados, foi possível conceber um modelo
simplificado em formato de fluxograma para o desenvolvimento de projetos de interface com
foco em acessibilidade e usabilidade para o usuário maduro não-alfabetizado e/ou de baixo
letramento. Esse modelo serve como referência para o desenvolvimento de projetos que
pretendam incluir recursos de usabilidade para atender demandas de acessibilidade em suas
interfaces interativas, conforme descrito a seguir e, depois, ilustrado na figura 16.

Planejamento e organização do projeto e seus recursos:


 Identificação e gestão do ciclo de vida do projeto;
 Formulação e acompanhamento da equipe;
 Descrição do contexto de uso;

Pesquisa do usuário:
 Levantamento do ambiente e do contexto de utilização;
 Levantamento comportamental, necessidades e motivações de uso;
 Levantamento do nível de letramento do público específico;
 Definição de personas e categorias de usuários.

Arquitetura da informação:
 Levantamento dos modelos mentais adequados;
 Formulação do discurso com base na semiótica e metáfora ao modelo mental adequado;
 Estruturação e organização da informação dirigida ao usuário.

Concepção visual e interatividade:


 Prototipagem - Storyboard, sketch design, wireframes, card sorting, design the box;
 User Interface (UI) - Especificação da interface com o usuário;
 Design de Interação (DI) - Especificação da interação da interface com o usuário;
 Design Visual - Adequação estético-funcional adequada ao objetivo e a marca.

Avaliação e usabilidade:
 Heurística de Nielsen;
 As regras de Ben Shneiderman;
 As premissas da IHC;
 Cognitive Walkthrough.
Figura 16: Metodologia para desenvolvimento com foco no usuário 63

Fonte: Elaborado pelo autor.


64

5
64

5 Considerações Finais

O presente trabalho foi inspirado em observações e questionamentos sobre o uso cada


vez maior da tecnologia da informação em todos os âmbitos da sociedade atual. Considerando
a parcela de indivíduos com acesso à informação em meio digital e os níveis de letramento
digital predominantes nessas pessoas, obteve-se o alarmante número de cerca de 27% da
população madura brasileira considerada como analfabetos funcionais, entre os quais 6% são
analfabetos em nível rudimentar (INAF BRASIL, 2012).
Partindo do pressuposto de que todas as pessoas têm o mesmo direito de acesso aos
meios e dispositivos sociais, esta pesquisa procurou fazer um levantamento de como se projetar
interfaces com usabilidade e acessibilidade para que esses públicos consigam exercer em sua
completude seus papéis de cidadãos.
Os principais resultados obtidos foram um rico levantamento bibliográfico sobre
aspectos da cognição humana, formas de interação do usuário com interfaces digitais e práticas
mais eficientes para se desenvolver interfaces com usabilidade.
Neste trabalho, foi feita uma comparação entre a norma ISO 9241-210:2010, que se
refere aos aspectos para o desenvolvimento de projetos com foco no ser humano, e a
metodologia de desenvolvimento de projeto baseada na experiência do usuário, do inglês, User
Experience ou simplesmente UX.
Constatou-se a eficiência do modelo de projeto com o foco na experiência do usuário
(UX), contribuindo-se assim para que o resultado final do projeto esteja adequado à norma e
também aos objetivos do documento de levantamento de requisitos.
Os objetivos principais desta pesquisa foram atingidos ao ser possível identificar que
projetar com foco nas necessidades do usuário traz benefícios tanto para o público que utilizará
a interface quanto para a dinâmica e coerência na condução do projeto. Ficou explícito que
produtos desenvolvidos com foco na experiência do usuário têm maior adesão e fidelização em
seu uso, pois proporcionam uma experiência de utilização mais coesa, natural e fluida,
respeitando-se os aspectos cognitivos e possíveis limitações dos usuários. Obteve-se a
65

organização de uma metodologia para o desenvolvimento de interfaces para o usuário maduro


não-alfabetizado e/ou de baixo letramento.
O principal ponto positivo observado nessa abordagem foi encontrar uma paridade
simétrica de conceitos e métodos que ambas sugerem ser a maneira adequada em se desenvolver
com foco no usuário a fim de facilitar, no caso de projetos que necessitem de uma validação
normativa, a conformidade com os requisitos dos órgãos avaliadores.
A escolha para se desenvolver com foco no usuário não foi aleatória. Trabalhos
pesquisados no levantamento bibliográfico apontaram que este seria o caminho natural para
buscar uma solução viável no desenvolvimento de projetos de interface para o usuário maduro
não-alfabetizado e/ou de baixo letramento.
A principal dificuldade foi a falta de consenso sobre a organização dos métodos,
causando desconforto na escolha de algumas abordagens específicas, como exemplo, a
Ergonomia Cognitiva como referencial teórico ou como aspecto complementar da IHC, ou o
mesmo com a IHC como método do modelo de Design de Interação, ou o contrário. Essas
divergências teóricas variam consideravelmente entre autores e pesquisadores, porém, optou-
se sempre pela organização dos métodos mais aproximada das sugestões normativas da ISO
9241-210:2010, assim evitando escolhas com base unicamente na experiência pessoal.
Dentre os aspectos inovadores levantados, pode-se citar o desenvolvimento de projetos
com passos iterativos para se alcançar resultados eficientes de forma eficaz. Trazer resultados
baseados na excelência de uso, neste caso da interface, pode ser considerado como um ponto
de ruptura no desenvolvimento de projetos, uma quebra de paradigma das metodologias
tradicionais.
Alguns autores postulam que todo sistema deve ser projetado com base na usabilidade
e necessidades do usuário e, quando se cria uma sistematização para aplicação de métricas de
conformidade durante o processo de desenvolvimento, os resultados tendem a ser positivos, na
entrega de um produto que atenda aos requisitos iniciais, bem como no cumprimento adequado
dos prazos sem comprometer a qualidade.
Foi feita uma leitura aprofundada sobre os fundamentos teóricos e metodológicos
levantados e, a partir do resultado disso, foi possível promover com propriedade uma
conciliação entre os aspectos relativos ao desenvolvimento com foco na experiência do usuário
com técnicas utilizadas para promover a usabilidade ao usuário maduro não-alfabetizado e/ou
de baixo letramento na concepção de interfaces acessíveis.
66

A considerar os aspectos interdisciplinares deste trabalho, poderiam figurar como


sugestões para trabalhos futuros, o desenvolvimento de um projeto com foco na experiência do
usuário que atenda aos requisitos e necessidades do usuário maduro não-alfabetizado e/ou de
baixo letramento e também um trabalho de avaliação para uma interface acessível que tenha
como objetivo atender o público específico e universal tratados nesta pesquisa.
67

Referências
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