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TRANSFORMAÇÃO – PARTE 1
Você estaria disposto a deixar sua família para ir defrontar-se com o perigo
absoluto e fulminante numa missão ordenada pelo Senhor?
Naasom A. Sousa
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TRANSFORMAÇÃO
Naasom A. Sousa
PARTE 1
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Agradecimentos especiais:
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“Então Pedro, tomando a palavra, disse: Eis que nós deixamos tudo,
e te seguimos; que receberemos?
E Jesus disse-lhes: Em verdade vos digo que vós, que me seguistes,
quando na regeneração, o Filho do Homem se assentar no trono da Sua
glória, também vós assentareis sobre doze tronos, para julgar as doze
tribos d’Israel.
E todo aquele que tiver deixado casas, ou irmãos, ou irmãs, ou pai,
ou mãe, ou mulher, ou filhos, ou terras, por amor do Meu nome,
receberá cem vezes tanto, e herdará a vida eterna.”
S. Mateus 19: 27-29
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Prólogo
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Parte Um
A MISSÃO
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Capítulo 1
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para o lado para constatar que seu marido ainda dormia, e o que viu foi
um lugar vazio. Alan não estava ali como pensara. — O que aconteceu?
— perguntou-se. — Acordado tão cedo?
Olhou para o relógio que trabalhava em cima do criado mudo e
observou as horas: 5h e 47mim. É costume dele acordar somente às seis e
meia! Pensou ela. Levantou-se da cama, pegou o robe e vestiu por cima
de sua camisola de seda cor-de-vinho. Iniciou uma caminhada pela casa
à procura de Alan.
— Amor, Onde você está?
Melina caminhou pelo corredor, perguntando a si mesma o por quê
de Alan ter levantado da cama àquela hora. Postou-se afrente do quarto
dos garotos, abriu lentamente a porta e varreu o recinto com o olhar.
Jaime e Jair dormiam tranqüilos em sua beliche. Pensou que talvez Alan
poderia ter vindo vê-los, como às vezes fazia, mas desta vez ele não
estava lá. Sorriu ao ver o sono sem interrupções dos seus filhos. Sorte de
vocês não ter uma árvore em frente à janela deste quarto, pensou. Saiu do
quarto na ponta dos pés e fechou a porta silenciosamente. Dirigiu-se ao
quarto de Jéssica, sua filha de seis anos. Abriu a porta e viu apenas a
linda menina com seus castanhos cabelos cacheados mergulhada num
sono profundo, aconchegada debaixo do cobertor, chupando o dedo.
Melina fechou a porta vagarosamente e atravessou a sala de jantar,
observando a mesa de vidro e as seis cadeiras que a rodeavam, assim
como o grande móvel de madeira colonial que guardava a porcelana, os
copos, as taças de cristal e os talheres. Caminhou até a sala e, chegando
lá, a primeira coisa que viu foi Alan dormindo no sofá, tão encolhido
quanto podia. Aproximou-se do sofá, sentou-se no chão e, de mansinho,
beijou seu marido no olho direito.
Alan remexeu o corpo inconscientemente e balbuciou:
— Carlos… Carlos…
Melina arregalou os olhos e num brado protestou:
— Ei, o que significa isso? Quem é Carlos?
Alan despertou e teve que se segurar para não cair do sofá.
— O que está acontecendo Melina? — Perguntou ele. — Por que
todo esse alarme?
— Eu que pergunto o que está acontecendo aqui, amor! Primeiro me
acordo e você não está na cama ao meu lado, aliás, pelo estado que a
encontrei, nem ao menos chegou a dormir nela. Então, encontro você na
sala, dormindo no sofá, podendo o senhor, estar em sua cama,
confortável e aquecido. Por fim, dou-lhe um beijo, e o que acontece?
Você, dormindo, chama por Carlos !
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Houve mais uma pausa, mas não demorou muito para Pablo obter
uma resposta.
— Muito bem, está certo — disse a voz no telefone.
— Ótimo — exclamou Pablo piscando o olho para Caio.
Então sentiu a voz do traficante parecer mais descontraída quando
se colocou a argumentar:
— Olha, vamos fazer o seguinte: Eu estou aqui com um estoque
meio grande e estou querendo me desfazer rápido de alguns quilos.
Sabe como dizem: “se amontoar, é possível que sintam o cheiro”. E já
que eu estou com pressa e pelo seu papo, acho que você também, vamos
fazer o negócio o mais rápido possível, ok?
— Pra mim tudo bem — falou Pablo.
— Certo. Então me encontre na esquina da rua Clintel com a rua
Treze, amanhã, lá pela meia-noite e meia. Leve a sua grana e eu levarei a
minha maleta mais larga e funda cheia de branquinha pra você,
Senhor…
— Silveira — sussurrou Caio para o seu parceiro.
— Pode me chamar de Silveira — disse Pablo ao traficante. — E
você? Como se chama?
— Como me chamo? Me chamo Carlos.
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Capítulo 2
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Ainda era de tarde quando Alan Xavier saiu de casa. Deus lhe falara
que aquele era o dia. O dia da sua missão. Alan falou a Melina o que Deus o
havia dito, e Melina não sabia se ficava alegre ou triste, pois sabia que o
propósito era de Deus. Porém o que estava prestes para acontecer era muito
perigoso, ela bem o sabia.
— Você vai voltar logo pra mim, não vai? — Perguntou Melina
abraçando forte o seu marido.
— Melina, eu… eu realmente… não sei. O senhor me deu essa missão,
me revelou o que eu deveria fazer, me deu o nome de uma pessoa a quem
eu deveria encontrar e instruir-lhe sobre a Palavra de Deus e me disse aonde
irei encontrá-la — Alan fez uma pequena pausa e continuou: — O senhor
também me falou o que irá acontecer com essa pessoa se eu completar
minha missão, mas… Ele não me revelou se eu voltaria… ou não.
Melina olhou diretamente nos olhos de Alan. Lágrimas começaram a
escorrer pelo seu rosto.
— Eu não suportaria perder você, Alan, meu amor… — ela parou para
tomar um pouco de ar. — Mas seja feita a vontade de Deus.
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A hora chegara. Alan dirigiu-se ao local onde tudo iria começar. Ele
ficou encostado num poste na rua treze à uns cem metros da esquina com a
rua Clintel. Estava um tanto escuro e as sombras o camuflavam, para sua
tranquilidade.
Ele viu um carro com dois homens dentro aproximar-se e parar na
esquina. Depois observou outro carro se aproximar do primeiro e de dentro
sair seis homens que se encontraram com os outros dois. Ele ouviu toda a
conversa. Tudo o que eles disseram, Alan guardou na mente. Mas o que
chamou sua atenção na conversa foi quando um dos dois homens
perguntou à um dos seis que estava muito bem trajado:
— Você é Carlos?
O outro respondeu:
— Sim, sou eu mesmo.
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Pablo foi o primeiro a entrar no assunto das drogas. Assim não irão
pensar que estou enrolando, Pensou ele.
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— O que está acontecendo? Isto está saindo fora do nosso controle, não
é? O que vamos fazer agora?
Pablo — que aparentemente parecia mais tranqüilo, mas nem tanto —
não abriu sua boca. Apenas caminhava na direção do carro. Tentava
pensar, bolar algum meio de distrair os traficantes até que os reforços
chegassem, mas não conseguia, estava preocupado de mais para isso. Tudo
estava muito fácil e rápido demais.
Como fui fazer o que fiz? Por que não chamei os reforços imediatamente?
Pensou Pablo. Sempre fui um dos policiais mais vivos e espertos da central, mas
acho que agora… Cometi o maior erro da minha vida.
Pablo olhou rápido para traz e viu Carlos e o outro traficante bem
trajado conversando. Parecia mais uma discussão.
Pablo voltou-se para Caio:
— Parece que estão discutindo. Não sei por quê, mas pelo menos assim
ganhamos um pouco de tempo.
De repente uma luz ofuscante foi acesa e encandeou os olhos dos dois
policiais, deixando-os sem visão.
— O que é isso? — Perguntou Caio.
— Não sei — Pablo olhou outra vez para trás e observou o traficante
bem trajado socar Carlos com força bem no meio da barriga e este cair no
chão. — Meu Deus! O que está acontecendo?
A luz diminuiu de intensidade, e Pablo e Caio perceberam que ela viera
dos faróis de outro carro que se aproximara deles.
— São dos nossos? — indagou Caio.
— Não, Caio. Talvez aliados dos nossos inimigos — replicou Pablo. Ele
tentou olhar para traz mais uma vez, mas subitamente foi acertado por um
potente soco por um dos traficantes que havia se aproximado rapidamente
sem que percebesse.
Caio viu o que acontecera e tentou reagir, mas o traficante com a
correntinha na mão puxou um revólver do bolso do paletó e de onde estava
desferiu um tiro certeiro contra o peito esquerdo de Caio, que caiu
imediatamente se esvaindo em sangue.
Pablo arregalou os olhos repletos de susto e pavor, descrente do que
via diante de seus olhos.
— NNNNÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOOOOOO!!!!
O traficante deu uma grande gargalhada e disse zombeteiro:
— Você acha que eu iria cair na sua, Sr. agente? Você pode não me
conhecer, mas eu lhe conheço a muito tempo, você e esse seu parceirozinho.
Pensei que vocês fossem mais espertos. Vocês vinham destruindo meus
pontos de distribuição de coca e eu sou bem informado, sabia? Leio muitos
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VAI!
A ordem veio. Alan desencostou-se do poste e começou a caminhar na
direção de Pablo, Carlos e dos outros homens.
— Deleito-me em fazer a tua vontade, ó Deus meu; a tua lei está dentro
do meu coração.
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— Ah-ah. Não, não — Lucas abriu a mão e fez Carlos ver na palma a
correntinha de ouro com o anel preso a ela. Carlos se calou. — Você fez uma
coisa muito feia, Carlos. Ficamos muito entristecidos com você.
— Nada disso, Lucas — reclamou Carlos. — Vocês me enganaram. Eu
só queria dar o melhor de mim à quadrilha e vocês não quiseram. Ao invés
disso quiseram me descartar, livrar-se de mim. Foi aí que eu tive que…
— Basta! — interrompeu Lucas. — Tudo vai acabar logo. — Ele
apontou a arma para Pablo e engatilhou-a. — Quero lhe dizer, caro agente,
que Vip não sentirá a sua falta, ou melhor, nenhum de nós sentiremos.
— Ei, não faça isso! — ecoou uma voz ao longe, fantasmagórica.
Todos olharam para onde vinha a voz. Era apenas um homem. Um
mendigo, talvez. Mas estava com roupas novas e limpas, então concluíram
que isso estava fora de questão.
Carlos aproveitou o momento em que todos estavam distraídos
olhando para o homem. Soltou-se das mãos dos traficantes e saltou sobre
Lucas. Seu estado era de extrema ira e parecia querer fazer de tudo para
Lucas não concretizar o que estava planejando fazer. Carlos segurou-o
firmemente. Com uma mão imobilizou o braço o qual empulhava a arma e
com a outra segurou o pescoço de Lucas. Os dois caíram e rolaram no chão
de um lado para o outro. Carlos soltou o pescoço de Lucas e meteu a mão
rapidamente num dos bolsos do terno de seu oponente. Então puxou uma
fita k-7 e colocou no bolso do seu paletó.
Lucas viu todos estupefatos, apenas olhando eles brigarem, a raiva
corroeu-lhe o íntimo. Seus subordinados estavam impressionados com a
briga e não faziam nada para protegê-lo. Ele deu um berro:
— Não fiquem aí parados olhando, seus imbecis, tire esse imundo de
cima de mim e peguem aquele homem — apontou para Alan.
No mesmo instante fez-se ouvir o barulho de sirenes. Os reforços estão
chegando, pensou Pablo. Todos se imobilizaram outra vez, sabendo que o
tempo se esgotava. A cavalaria estava se aproximando.
— Droga! — exclamou Lucas. — Vamos, tire ele de cima de mim!
Os bandidos tiraram Carlos de cima de Lucas com um sopapo. Carlos
caiu de lado, desnorteado. Lucas se levantou se debatendo para tirar a
poeira do terno, dirigiu-se até o traidor.
— Sempre você tem que ser assim, não é Carlos? Sempre o valentão,
mas sempre fazendo as coisas erradas? Vip não…
Carlos o interrompeu dizendo:
— Que Vip que nada, seu…
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— O que foi que aconteceu? Parece que vocês viram uma assombração!
Bino e Tito se entreolharam e balançaram a cabeça afirmativamente.
— O quê? — Perguntou Lucas.
— Aquele cara que apareceu de repente, sabe… nós demos três tiros
nele — disse Tito, um tanto nervoso.
— Isso mesmo — concordou Bino.
— Eu sei, eu ouvi os tiros. Todos nós ouvimos os tiros — falou Lucas,
confuso.
Tito parecia histérico quando falou:
— Pois é, nós atiramos três vezes nele, Lucas, mas… mas… — ele
hesitou —, mas ele não caiu. As balas não o furaram nem o machucaram.
Parecia até que estávamos usando balas de festim!
— Lucas, e o mais assombroso é que ele estava com uma tranqüilidade
que nem parecia que ia morrer — completou Bino. — Ele até cantava! A
canção falava desse tal Jesus que tantos malucos falam.
Lucas estudou os semblantes assustados dos seus dois subordinados.
Nunca os vira tão nervosos e amedrontados em todo o tempo em que
estavam juntos. Ele pensou antes de decretar:
— Vocês precisam é de umas férias.
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Tudo era trevas, tudo era dores. Carlos continuava caído no chão
desmaiado. Ele sangrava por causa dos golpes sofridos. Lucas e seus amigos
sabiam bem como fazer alguém sangrar. O próprio Carlos já os vira fazer
isso algumas vezes, mas agora a vítima havia sido ele.
Carlos… Carlos… Acorde. Uma voz penetrava seu subconsciente. Jesus te
ama e quer que você o ame também… Ele quer te ajudar…
A consciência de Carlos foi voltando aos poucos. No momento ele já
podia ouvir o vento soprando em seus ouvidos, o barulho das sirenes e
também sentir as dores percorrer-lhe o corpo.
— Vamos, Carlos, acorde. A hora é chegada! — Fez-se ouvir a mesma
voz outra vez.
Carlos entreabriu os olhos e então os escancarou de uma vez. Não
acreditava no que via.
Será que estou morto? Pensou ele. Sim, porque estou vendo um defunto!
Alan postava-se abaixado ao lado de Carlos, sem ferimento algum, sem
marcas de balas e nem sangue espalhado pelo corpo.
— Que-quem é você? — Gaguejou Carlos, confuso e principalmente
incrédulo do que via. — Como sabe o meu nome? Onde estou?
Alan foi lacônico:
— Você saberá. Você saberá de muitas coisas.
Três carros-patrulha aproximaram-se deles a toda, travaram os pneus
com o freio e pararam em cima dos dois. Saltaram um par de policiais de
cada carro, todos eles sacaram suas armas e apontaram para os homens no
chão.
— Parados, não se movam! — Gritou um dos policiais.
Outro tira a paisana, de cor negra, olhou e viu Pablo ensangüentado no
chão.
— Oh, Meu Deus. Tavares! Chamem a ambulância, rápido! —
exclamou ele, correndo até o corpo do amigo para examiná-lo. Observou as
manchas vermelhas e os orifícios no peito esquerdo e na fronte. Concluiu
que não restava muito o que fazer.
— Eu chamo — disse um policial com o nome Selton escrito em seu
distintivo.
O agente negro voltou-se para o lado e viu perto do corpo estirado uma
arma e uma garrafa com um líquido amarelado. — Olhem, tem uma arma e
alguma outra coisa ali! — disse apontando.
Carlos olhou junto com todos os policiais e estremeceu perante a visão
da arma e do líquido contido na garrafa.
— Oh, droga! — sussurrou ele. — Lucas tramou direitinho!
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Capítulo 3
T udo havia saído de acordo com os planos de Vip. Ele havia acertado
dois ursos com um só tiro. Um tiro consciente. Um tiro certeiro.
Carlos ainda encontrava-se no chão com Alan junto a ele. Estava
enraivado e frustrado ao mesmo tempo. Nunca tinha sido pego pela policia
antes. Já praticara assaltos, roubos de automóveis, homicídio algumas vezes,
mas nunca se deixara ser capturado pelos tiras. Conturbava-o saber que
havia de ser preso por causa de uma pessoa a quem queria se aliar.
Um policial apanhara a arma do chão com uma luva e a colocara em
um saco plástico transparente. Caminhou até os outros policiais, falou
alguma coisa com eles, voltou-se para Carlos e Alan e foi até onde estavam.
— Levantem-se! — ordenou ele.
Alan obedeceu prontamente e ergueu-se rápido, mas Carlos nem se
moveu. Estava quebrado de mais para isso.
— Eu disse levante-se! — gritou o policial.
— Não dá! — respondeu Carlos em voz alta.
— Ah, não?
O policial agachou-se somente o bastante para agarrar Carlos pela gola
do paletó e faze-lo levantar de uma vez, contribuindo para que o silêncio da
noite fosse quebrado por um grito de dor.
— Não faça isso… — Alan olhou o nome do policial no uniforme. —
Sr. Oliver, ele está muito machucado!
Oliver fitou Alan com uma expressão ameaçadora e disse:
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— Ele está machucado, não é? Vou lhe falar uma coisa: eu não estou
nem aí pra vocês. — apontou para Pablo estendido imóvel no chão. — Veja,
meu amigo ali não está machucado, ele está morto!
— Mas não fomos nós! — disse Alan.
— É isso o que vamos saber fazendo o exame da balística; descobrindo,
quem sabe, possíveis impressões digitais… — respondeu Oliver. — Mas
enquanto isso, vocês vêm conosco. — ele tirou uma algema do cinto e
prendeu o braço de Carlos ao de Alan.
— Espere! — exclamou Alan. — Não é uma algema para cada um de
nós, pelo menos?
— Caras como vocês merecem coisa pior que isto — resmungou Oliver.
Um dos policiais vasculhou toda a área com os olhos e indagou aos
outros um tanto alarmado:
— Ei, vocês viram o Caio? Não estou vendo-o ou… o corpo dele em
parte alguma…
— Droga! O que aconteceu por aqui? — quis saber o policial negro,
Axel.
— Devem tê-lo levado. Não sei por quê, mas acho que o levaram.
Talvez para fazerem o que fizeram com todos os outros: torturar e queimar.
— disse Oliver. Ele virou na direção de Selton e berrou: — E essa
ambulância que não chega, hein?
— A comunicação estava ruim e só pude chamar a ambulância agora
— Explicou o parceiro de Oliver, Selton.
— Bem, então nesse caso, você e eu vamos levar esses dois aqui, e o
resto espera a ambulância —Oliver se dirigiu aos companheiros. — E caso
algo mais aconteça por aqui, vocês nos chamem, ok?
Os outros quatro policiais balançaram afirmativamente as cabeças.
Oliver era um policial veterano. Com um bigode sempre bem aparado
e sobrancelhas grossas, estava na casa dos quarenta anos, mas parecia mais
velho por causa da sua enorme barriga. Mesmo assim todos o respeitava
muito, pois era durão, autoritário e já havia prendido vários assassinos,
traficantes e ladrões de várias espécies. Colecionava, além disso,
condecorações por seu bom trabalho como policial.
Oliver e Selton encaminharam os dois presos até o carro-patrulha, e
chegando lá empurram-nos para dentro com um tapa nas costas.
— Vamos, seus cães — berrou o policial gordo —, depressa para o
canil!
— Vou acabar com esse cara. Pode apostar que vou — disse Carlos,
baixinho.
Ainda se acomodando no banco da viatura, Alan disse:
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— Para que fazer justiça com as próprias mãos, quando se tem alguém
que faz isso por você?
— O quê?
— Calem-se os dois, ou vou meter bala na boca de vocês! — Gritou
Selton. Seu parceiro apenas riu. — Vamos embora — disse ele.
Selton deu a partida no carro, ligou as sirenes e saiu fritando os pneus,
tirando seu parceiro e os dois suspeitos do local do crime. Em poucos
segundos o carro sumiu da vista dos quatro policiais que ficaram com o
corpo de Pablo sob custódia.
Os quatro se entreolharam e o agente policial negro chamado Axel
quebrou o silêncio:
— Eu sabia que isso ia acontecer. De alguma forma eu sabia.
— Do que você está falando? — perguntou outro policial, curioso.
— Sabe… essa quadrilha que Pablo e Caio tanto perseguiam, a
conhecida Quadrilha Vip… Assim que eu soube que eles não perdiam
tempo nem viagem em seus negócios, quero dizer, que eles não se
intimidavam diante de ninguém, algo negativo; algo de ruim e forte
começou a martelar na minha cabeça. Alguma coisa como uma intuição, de
que iria acontecer alguma coisa ruim com os dois.
Os outros três trocaram olhares e um deles falou:
— É. E pelo jeito essa intuição não falhou, hein?
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A pista da rua Nizo Arruda estava úmida por causa do chuvisco que
havia caído ali, mesmo assim, Selton conduzia o carro-patrulha a mais de
noventa quilômetros por hora, enquanto Alan e Carlos, no banco traseiro,
observavam a rua completamente deserta pelo vidro da janela.
Oliver e seu parceiro encontravam-se calados no momento, assim como
o rádio-comunicador. Antes eles haviam feito brincadeiras de mau-gosto
com seus prisioneiros e contado piadas um para o outro. Alan achava
estranho o comportamento dos dois policiais, pois para quem havia perdido
um companheiro da mesma profissão — principalmente sendo policial —
estavam muito alegres e descontraídos.
Carlos apenas vagueava os olhos pela rua. Ele conhecia toda a cidade
de Melmar palmo a palmo, esquina a esquina. Tinha quase certeza de ter
passado por todos os buracos da cidade: boates, pontos de drogas, cassinos
ilegais, becos marginalizados, tudo. Agora conhecia, pela primeira vez, um
carro-patrulha por dentro. Isso o enraivecia. Nunca pensou passar por isso
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um dia, pois se denominava incapturável. Mas desta vez não teve jeito nem
escolha nem chances.
Alan olhou para Carlos e observou cada detalhe do seu semblante e do
seu comportamento. Estudou-o durante um bom tempo, fechou os olhos e
sorriu. Louvado seja o senhor, exclamou ele em pensamento.
Carlos girou a cabeça e fitou Alan um minuto em silêncio, depois olhou
novamente para a rua. Ele observou pela janela um beco escuro passar por
eles e lembrou-se de já haver visitado aquele lugar. O beco era chamado de
“O beco da escuridão”, porque ali era feita muitas coisas que a lei não
permitia fazer. Carlos virou-se para Alan outra vez e depois para os policiais
que agora pareciam mais sérios. Já estamos perto da central… pensou ele, pois
sabia que daquele beco até a central de polícia era a distância de quinze
quilômetros e, na velocidade que Selton conduzia o carro, logo ele e aquele
estranho ao seu lado estariam atrás das grades. Diante dos seus
pensamentos, Carlos tornou a olhar para Alan.
Quem será esse cara? Ele apareceu do nada e se meteu nessa confusão… e que
confusão! A que custo? Mas ele parece tão aquém da situação… tão calmo… parece
tão diferente de todas as pessoas que conheço…
—Vire aí à esquerda — falou Oliver ao seu parceiro, apontando para
uma outra rua, interrompendo assim os pensamentos de Carlos.
— Ei, o que está havendo? A central não é por aí!
— Fique calmo, rapaz — disse Selton. — O Oliver vai explicar tudo.
Carlos fitou Oliver e repetiu a pergunta:
— Quer me falar que droga está acontecendo aqui? Por que desviamos
do caminho que levava à central?
— Não é nada. É apenas um desvio, Carlos. — explicou o veterano
policial.
Carlos hesitou e então, com os olhos arregalados, especulou:
— Ei, espere um pouco! Como sabe o meu nome? Eu não me lembro de
ter lhe falado o meu nome?
— Oh! Oh! — disse Selton com visível desapontamento.
— Droga! — exclamou Oliver.
— Essa não! Mais um deles! Olha, me diz uma coisa, quantos mais de
vocês se venderam?
— Do que você está falando? — perguntou Alan, confuso.
— Calem a boca! — gritou Oliver, agora irritado consigo mesmo. —
Droga! Eu não queria falar nada até chegarmos lá, mas é isso mesmo. Nós
trabalhamos para o Vip. Ele nos comunicou o que iria acontecer hoje e disse
que se livraria dos dois policiais que tanto o perseguia: Pablo e Caio.
— Mas o Vip é…
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havia feito. Uma perna e o braço, depois deslizou o corpo e por fim a outra
perna.
— E agora? — perguntou Alan.
Carlos olhou para as algemas e depois para os policiais dentro do
carro-patrulha, falou então:
— A primeira coisa que temos que fazer é tirar essas algemas — ele foi
até a porta do lado do motorista, onde se encontrava Selton e tentou abri-la,
mas também estava travada. — Vamos quebrar este vidro também.
— Mas agora está bem ao lado deles, o barulho será capaz de talvez
acordá-los — alertou Alan.
— Vamos ter que correr esse risco — disse Carlos. — Não quero ficar
preso a ninguém. — pegou uma pedra grande que estava no chão ali por
perto e então se preparou, erguendo a pedra ao alto com os dois braços,
fazendo levantar também o braço de Alan. De repente, Oliver moveu-se um
pouco, e então outra vez. Os dois algemados viram aquilo. Carlos abaixou a
pedra e jogou-a para o lado.
— Vamos sair daqui!
— Agora mesmo — concordou Alan.
Então eles saíram correndo, algemados e cambaleantes para longe dos
dois policiais.
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Capítulo 4
M elmar era uma cidade grande. E como em toda cidade grande, muitas
pessoas saíam à noite para se divertir, e um dos pontos preferidos e
assiduamente freqüentados são os restaurantes. O mais conhecido era o
Quaid’s. Talvez por sua famosa cozinha chinesa, por seu espaço amplo e
requintado, por sua boa música sacra, por sua localidade — bem no centro
da cidade — e por ser um lugar discreto e reservado, de certo que todos os
seu clientes e convidados faziam reserva antes de visitá-lo.
O Quaid’s, apesar de não ser um slogan nada parecido com um nome
chinês, tinha uma cultura bem oriental. Sua decoração era bem definida e de
tudo parecia com os legítimos restaurantes chineses. Havia quadros de
gueixas e dragões espalhados pelos quatro cantos do aposento, todos
pintados por famosos pintores da China, e abajures coloridos davam o
acabamento à iluminação fazendo-a assim bem típica. Sem dúvida alguma,
o Quaid’s era um dos mais badalados em se tratando de restaurantes
internacionais. Seus letreiros davam todo o realce e brilho para que
agradasse os mais exigentes gostos.
Sua estrutura, que eram elogios à parte, toda ela era moderna e
autêntica. Seus três andares o faziam parecer um requintado prédio de
apartamentos, mas em cada andar servia-se comidas de diferentes regiões
da China. Havia também um quarto andar, mas este era todo reservado
para o proprietário do Quaid’s. Ali existiam restrições e somente entravam
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O quarto andar do Quaid’s parecia um apartamento de um dos mais
luxuosos edifícios da cidade, que ocupava todo o andar de ponta a ponta.
Nele havia uma sala enorme toda encarpetada e mobiliada da forma mais
fabulosa possível, um salão com uma grande mesa para refeições, vários
quartos e suítes e tudo o que um apartamento de primeira classe poderia
conter em seu interior. Mas havia uma coisa naquele andar que certamente
não havia em outro apartamento de um edifício cinco estrelas: Uma grande
sala de reuniões; uma mesa retangular com muitas cadeiras em sua volta e
que, no momento, algumas delas estavam sendo ocupadas por alguns
homens.
— Saiu tudo como você planejou — disse Lucas. — Caio e Pablo estão
mortos e Carlos levou a culpa pelo assassinato.
— Agora podemos trabalhar em paz. — ironizou o homem que estava
sentado à cabeceira da mesa.
Lucas sorriu e depois falou sério:
— Mas… há uma coisa que aconteceu e que não estava em nossos
planos…
— Aquele homem estranho! — Bino interrompeu.
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— Bino falou que Tito e ele deram três tiros à queima-roupa no cara —
Lucas retomou as atenções —, mas falou também que as balas pareciam não
fazer o menor efeito nele.
— Como assim, não faziam o menor efeito nele? Que história é essa? —
indagou o homem na cabeceira da mesa.
Tito respondeu freneticamente:
— Fui eu que atirei primeiro. Eu juro que daquela distância, senhor,
nem um garoto poderia errar. Depois Bino atirou e então atirei outra vez,
mas… não sei, acho que as balas sumiam antes de atingi-lo…
— Como é que é? — perguntou outra vez o homem, fazendo uma cara
confusa e incrédula.
— Olha, senhor, eu sei que parece loucura, ou besteira, ou até as duas
coisas juntas, eu sei, mas é verdade. Depois do meu primeiro tiro percebi
que a bala não tinha aberto nem um buraco nele, então dei o segundo tiro e
nada aconteceu outra vez. De repente subiu um calafrio na minha espinha…
Bino que estava como em transe escutando o companheiro e
relembrando do que acontecera, deu um pulo e falou quase gritando:
— Eu também senti! Eu também senti! Era uma coisa esquisita … ela
foi subindo pela espinha e me tomou por completo.
Tito balançava a cabeça afirmativamente quando falou:
— Aconteceu da mesma forma comigo. Então eu lembrei de como ele
apareceu do nada na hora da transação e liguei ao que estava acontecendo
naquela hora e… não sei o que me deu, senhor, mas eu senti medo. Um
medo que nunca senti antes.
— Pensam que era um fantasma — completou Lucas.
— Jamais acreditei nisso, chefe, mas diante daquilo, tenho que admitir
que sim — finalizou Tito.
O homem que sentava à ponta da mesa fitou Bino e Tito. Como alguém
pode acreditar em… fantasmas? Afinal de contas, o que esses homens são? Ratos?
Ele se viu pensativo naquele instante e ponderou: Mas esses caras já fizeram
coisas para mim que homens comuns jamais fariam, e além disso… eles são leais.
Por fim o Homem disse:
— Tudo bem. Não sei ao certo o que aconteceu com vocês. Não
acredito em fantasmas…
Tito o interrompeu.
— Senhor, nós também não, mas…
— Não me interrompa! — gritou o homem dando um soco na mesa.
Tito tomou um susto e calou-se. Seus olhos estavam arregalados de
terror, com medo da reação do homem. Lucas baixou a cabeça e balançou-a
em desaprovação à atitude de seu subordinado.
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Aquela noite não parecia ter fim, muito menos aquela trilha no meio do
mato por onde eles estavam caminhando desde a hora em que escaparam
dos tiras do Vip e da morte. Assim pensava Carlos.
Nas últimas três horas os dois só viam mata e as trevas da noite escura.
O silêncio predominava desde o começo da fuga; não diziam uma palavra
sequer. Eles não se conheciam e pretendiam continuar assim — Carlos
pensava deste jeito, mas Alan não.
O véu verde cercava a trilha de um lado e de outro, e às vezes se
estreitava fazendo com que Alan e Carlos se esgueirassem por ele, custando-
lhes, uma vez por outra, arranhões por conta de algumas plantas
espinhentas, deixando-os ainda mais exaustos.
As trevas eram densas, pois não havia lua para iluminar naquela noite,
fazendo deste jeito a visibilidade ficar quase impossível. A trilha, por sua
vez, era de pedriscos — por que não dizer de pedras? — que os faziam
tropeçar cambaleantes e com extremo esforço equilibrarem-se para não cair.
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Oliver não respondeu nada. Fechou os olhos e pensou no que iria falar.
— Oliver? — disse Vip, ordenando-lhe a dar uma resposta.
— Vip, eu… eu… — não deu para segurar o nervosismo e Oliver
começou a gaguejar. — …Eu não s-sei o que dizer, Vip. Aconteceu uma
coisa, e… saiu tudo errado…
— Como assim, saiu tudo errado?! — explodiu o poderoso chefão. — O
que aconteceu?
— Ele… fugiu — disse Oliver receoso.
— Fugiu?! Seu grandissíssimo idiota, como deixou ele escapar? Como
deixou isso acontecer?
Oliver pensou em como responder. Em meio à milhares de
pensamentos ele ouviu um berro pelo telefone.
— Responda!!!
Oliver engoliu algo inexistente que atrapalhava sua respiração para
responder:
— Houve… houve um acidente, batemos a viatura num poste aqui na
rodovia Três, é onde estou no momento. Selton está mal. Com o impacto da
batida, batemos nossas cabeças no painel do carro e isso nos custou
ferimentos. Ainda estou dentro da viatura, pois não posso me mexer muito.
Creio que eles fugiram enquanto eu estava desmaiado, e…
— Espere aí, você disse: “eles fugiram?” O que significa eles, se mandei
você pegar apenas o Carlos? Está trabalhando por fora é, imbecil?!! — gritou
Vip.
— Não, não, claro que não! O cara estava com Carlos, ele era estranho,
pensei que era pra apagar ele também!
— Mas como aconteceu isso? O que se passou para que vocês batessem
nesse poste? — perguntou Vip irritado.
— Bem… — Oliver pensou seriamente em sua resposta e no contraste
que existia entre ela e o que realmente acontecera para causar o acidente
resultando na fuga de Carlos e do outro homem. — Primeiramente nós
achamos os dois onde o corpo de Pablo estava e os prendemos em uma
única algema, e… — pausou um pouco. — acho que um deles tinha algum
arame e estava tentando se soltar, então Selton viu isso pelo espelho e virou-
se para enxergar melhor e me avisar, porque eu me encontrava de olho na
rodovia que estava escura e irregular, auxiliando-o. Quando Selton viu que
realmente um deles estava se soltando, gritou avisando-me. Foi nessa hora
que ele perdeu o controle do carro e batemos num poste. E como eu disse, é
onde estou agora.
— Quer saber — disse Vip —, vocês dois são dois absolutos
incompetentes!
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— Vip, eu…
— Não quero ouvir mais nada! E escute aqui, eu quero Carlos morto,
está ouvindo? Dê um jeito para pegá-lo antes da polícia e mate-o, caso
contrário você vai ter que matá-lo dentro da prisão ou na frente da maioria
dos policiais da cidade. Acabe com ele de qualquer forma, eu o quero morto,
entendeu?!
— C-certo, Vip — respondeu Oliver nervoso, que começou a ouvir o
som da sirene da ambulância ao longe. — M-mais… uma coisa… quanto ao
outro homem, o que faço com ele?
— Procure-o e mate-o também, idiota! Não quero nenhuma
testemunha.
Vip ia desligar quando se lembrou rapidamente do relato de Tito e
Bino.
— Oliver? — chamou.
— Sim?
— Uma última coisa: como era esse tal homem que estava com Carlos
quando vocês chegaram?
— Ele era de meia estatura, de mais ou menos trinta e cinco anos,
cabelos castanhos lisos, pele clara e de olhos também castanhos. — Oliver
fez questão de descrever os olhos de Alan, pois havia fixado o olhar neles
por um longo tempo e se impressionado com a expressão que deles foram
transmitido.
Vip não disse mais nenhuma palavra e desligou o telefone.
Oliver ouviu Vip desligar, foi quando a ambulância e mais três viaturas
estacionaram ao lado de seu carro. Mais um pouco e ele mesmo teria
desligado, pensou. O que faria ele dar mais tarde uma nova explicação ao
Vip.
As portas dos quatro carros foram abertas e seus ocupantes saíram
rápido ao encontro de Oliver e Selton, para prestar socorro e fazer algumas
perguntas sobre tudo aquilo.
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Vip, logo que desligou o telefone, mandou chamar Tito e Bino, que
prontamente atenderam ao chamado e agora estavam em sua presença, na
sala de reuniões do Quaid’s.
— Recebi um telefonema a poucos instantes que me despertou uma
curiosidade…
Tito e Bino se entreolharam como se perguntassem um ao outro do que
se tratava.
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Vip perguntou:
— Quais eram as características do cara que vocês dizem não terem
conseguido matar?
Os dois se olharam novamente e Bino respondeu:
— Humm… ele tinha o cabelo castanho, na casa dos trinta, branco e
acho que… — ele ergueu o braço à sua frente e elevou-o com a palma da
mão voltada para baixo até certa altura.
Vip observou a elevação da mão de Bino.
— Meia estatura — disse.
— Isso mesmo — falou Tito.
— Então temos mais um problema. O fantasma de vocês existe e está
do lado de Carlos…
Os dois capangas cruzaram o olhar mais uma vez.
— Mas parece que além de estar fazendo o papel fantasma,
assombrando meus planos, está fazendo também papel de anjo da guarda
de Carlos.
— O que o senhor quer que a gente faça quanto a isso? — perguntou
Tito.
— Procurem os dois. Vocês, Oliver e os policiais que ele irá lhes
apresentar e com certeza vão encontrá-los mais rápido. Quando encontrá-
los matem Carlos e tragam o outro pra mim. Quero conhecê-lo e mostrar a
vocês como exterminar fantasmas.
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Capítulo 5
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— Farei isso.
— Certo.
O médico deu as costas para Axel e correu juntando-se aos
enfermeiros.
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Por quanto tempo teremos que andar para, enfim, chegarmos em
algum lugar? Perguntava-se Carlos, pensativo. Ele e Alan, agora
andavam lado a lado, pois a trilha àlguns minutos atrás se havia
alargado e isso os deixavam mais aliviados, menos exaustos. Mesmo
assim, o cansaço os castigava bastante e as dores no corpo eram
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constante. Carlos era quem mais sentia isso na pele. O suor do seu corpo
tomava conta do seu terno, que agora estava encharcado. Ele começou a
tirá-lo, mas quando se lembrou da algema, chamou um palavrão e pôs o
terno de volta sobre ombros.
Além de alargar mais, a trilha se tornava mais visível, fazendo com
que os dois não tropeçassem a esmo. Uma escassa claridade ajudava-os a
enxergar as pedras no meio do caminho e desviarem delas. Alan olhou
para cima e se perguntou de onde vinha a claridade que pouco a pouco
aumentava. Talvez fosse alguma estrela que se encontrasse mais perto
do nosso planeta ou algum outro fenômeno da natureza, pensava. Pelo
menos ajudava-os a não tropeçar e andar mais tranqüilo.
— Não sei de onde vem essa claridade. É um pouco estranho —
disse Carlos, também olhando para cima.
— Era o que eu estava reparando — Alan olhou ao redor e estudou
tudo o que estava à sua volta. Ele apontou para frente, um pouco acima
do extenso manto verde. — Olhe aquilo. — Falou a Carlos, e este, sem
muito hesitar, acompanhou o olhar do seu companheiro de algema e
observou o que havia prendido sua atenção.
— Estou vendo. Parece que a claridade vem de alguma coisa além
daquelas árvores.
Alan confirmou com um meneio de cabeça.
Uma luz clareava por detrás do matagal e fazia com que aparecesse
por cima das árvores, algo como uma áurea reluzente. O que se levava a
pensar é que, após transpor a vasta parede verde, ali se encontraria
alguma coisa a brilhar. Carlos pensou na melhor possibilidade possível,
na coisa que mais almejava ver naquele momento.
— Vamos! — disse Carlos começando a andar mais rápido. —
Talvez seja o que estou pensando.
Alan o acompanhou em sua caminhada frenética, e percebia que a
cada trinta metros, mais ou menos, a claridade se tornava mais forte, até
que uma luz começou a ofuscar por entre a mata. Carlos não segurou a
ansiedade e penetrou a espessa área verde, não se importando em
ganhar mais alguns arranhões ou cortes, puxou Alan pela algema e
abriu caminho dentre os galhos e folhas. Carlos se esgueirava, quebrava,
chutava tentando livrar-se de inimigos naturais que o impediam de
continuar em frente, jogando-os de um lado para outro a fim de poder
caminhar por entre eles. Sentiu a luz mais próxima e abriu com as duas
mãos mais uma porção de galhos, então a claridade o tomou por
completo, fazendo seus olhos brilharem.
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Carlos viu uma estrada à sua frente e após ela uma grande casa — a
origem da luz que os conduziram. Saiu da mata seguido por Alan, que
removia algumas folhas que haviam colado em sua roupa. Os dois
caminharam até a estrada e observaram que se estendia nas duas
direções.
— Talvez ela nos leve de volta à cidade — comentou Carlos. — E ali
está o nosso transporte. — Ele apontou, Alan seguiu com o olhar e pôde
ver uma caminhonete azul ao lado da casa.
— Você irá rouba-la?
— Não, nós vamos. Você pode querer ir a pé até a cidade, mas eu
não.
Carlos seguiu até a casa, que era de madeira bem trabalhada e
envernizada, de dois pisos. Uma pequenina escada de quatro degraus
levava a um alpendre que protegia a frente da casa de raios solares e de
chuvas inoportunas, e uma lâmpada fluorescente iluminava-o
fortemente. Os dois subiram ao alpendre e ficaram a escutar. O silêncio
era absoluto no interior da casa. Carlos segurou a maçaneta e começou a
girá-la lentamente. Tentou empurrar a porta, mas estava trancada —
Claro. Suspirou e voltou-se para Alan.
— Você usa grampos de cabelo? — Ele sorriu e baixou a vista,
começando a varrer com o olhar toda a área do alpendre.
— O que está procurando?
— Um pedaço de arame.
Alan sabia o que iria acontecer logo em seguida, pois notava nos
olhos de Carlos a necessidade de entrar na casa. Ele pôs-se a procurar
também. Foi até a bancada do alpendre e olhou para baixo. Carlos
juntou-se a ele e também vasculhou cada centímetro à procura do arame,
até que seus olhos enxergaram, perto da caminhonete um pequeno
pedaço do objeto mais valioso para ele naquele instante. Carlos desceu
correndo a escada do alpendre. Puxando Alan, parou ao lado da
caminhonete, abaixou-se pegou o pequeno arame e voltou na mesma
velocidade. Ele torceu o arame até quebrá-lo em dois pedaços e
silenciosamente introduziu-os na fechadura da porta com a habilidade e
conhecimento de anos na profissão proibida. Carlos manuseou os
pedaços de arame, destravando sem muito sacrifício a tranca da
fechadura da porta.
— Bingo! — Sussurrou.
Segurou novamente a maçaneta da porta e girou-a silenciosa e
vagarosamente. A porta abriu e Carlos empurrou-a lentamente, para não
fazer qualquer ruído. Estava escuro dentro do aposento e os dois
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— Quem trará desta vez? Tomara que não seja outro irresponsável
igual ao Amaro. Aquele bastardo tinha é que ser eliminado. Ele não
tinha nada que parar e se enrolar com prostituta nenhuma, muito menos
dar um pacote a ela. Desgraçado! Quase fez besteira na calça quando
descobriu que ela era tira.
— Não se preocupe. Nossos amigos na central cuidarão dele —
tranqüilizou Vip. — Quem está encarregado é o Duarte. Leve alguns
homens para ajudar, também a Bino e Tito e faça-os trabalhar.
Ocupados, não pensarão muito no que aconteceu.
Rodolfo entrou e chamou todas as atenções para si. Ele carregava
um telefone sem fio e caminhou até Vip, se curvou e sussurrou ao
ouvido do chefe.
— Senhor, um telefonema. Parece importante…
Vip afastou o rosto de Rodolfo e fitou-o nos olhos.
— Estou numa reunião importante, e você sabe como odeio ser
interrompido nessas horas, não é? Seu idiota! — Ao acabar de falar, Vip
já estava aos berros. — Diga a quem quer que seja, que saí e que não
sabe a que horas chego, ouviu?
Rodolfo apenas meneou a cabeça para dizer que havia entendido.
— Saia daqui!! — Ordenou Vip.
Rodolfo voltou-se para caminhar à porta e sair do aposento e então
ouviu Lucas comentar:
— Vip, acho que não podemos arriscar com ele a solto e creio que
seja melhor reforçarmos a segurança e vigilância aqui do Quaid’s. O
pouco tempo que conheço Carlos, já tenho uma idéia bem lúcida e
concreta das loucuras que ele é capaz de fazer para conseguir o que
quer.
Vip balançou a cabeça em aprovação.
— Tudo bem, faça isso. Aquele pato está me dando muito trabalho e
farei qualquer coisa para atrapalhar qualquer plano que esteja se
passando em sua mente sórdida.
Rodolfo estancou e virou-se para Vip.
— Senhor…
Vip percebeu que seu mordomo não havia se retirado da sala como
ordenara.
— Rodolfo! Eu já lhe disse que não estou para nada nem para
ninguém?!
Rodolfo estremeceu, mas não poderia sair, pois já se conscientizara
de que se tratava de um telefonema da maior importância.
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— Me diga uma coisa. Apenas uma coisa. Por que você fez aquilo
comigo? Quero dizer, eu era leal a você, fazia e faria tudo para lhe
agradar, dava tudo de mim para a organização, e em troca a isso, você
quis me despachar. Por quê?
Carlos pôde ouvir a forte respiração de Vip, antes que este falasse:
— Ora, meu amigo, aprenda uma coisa: “Você era dispensável”! —
Vip deu uma gargalhada que fez Carlos sentir o sangue ferver. — Como
muitos são. Para ser mais claro você era um pato. Pegamo-lo, acolhemo-
lo, demos ração e enchemos bem sua barriga. Então, depois o
sacrificamos para interesse próprio. Não é uma coisa muito digna de se
fazer, mesmo não me importando com isso, mas tem que ser feito. —
Deu um longo suspiro, recuperando o fôlego para continuar a
declaração, que o fazia ficar um tanto excitado. Continuou: — Você me
servia, Carlos, mas não para muita coisa. Por isso fiz-o-que-fiz. Aliás,
queria que você soubesse, sabe, só para deixá-lo mais sossegado, que
você não foi o primeiro e nem será o último, porém, foi o pato mais
valioso, pois com você, consegui derrubar dois enormes gaviões.
Esplêndido, não?
— Você é deprimente, mas devo admitir que esse é belo discurso —
disse Carlos, fitando Alan como estivesse encarando o próprio Vip —,
mas quero dizer uma coisa: Esse pato, que derrubou dois gaviões, vai
derrubar mais alguém. Um enorme abutre carniceiro que gosta de
arrancar as vísceras das pessoas…
— Carlos, você não me assusta. E quer saber? Você está muito
abusado para alguém que está em desvantagem neste jogo!
— Solte-a, Vip. Ela nada tem a ver com isso tudo. Deixe-a ir; deixe-
nos ir e esqueço tudo. Fazemos de conta que isso nunca aconteceu; que
nunca nos encontramos.
Carlos falava sério, como nunca falara antes em sua vida. Era uma
tentativa desesperada.
Vip olhou para Lucas ao seu lado na mesa de conferências e
balançou a cabeça de um lado para o outro, numa expressão de total
desprezo.
— Oh, Carlos, sinto muito, muito mesmo, mas não posso fazer isso
e você sabe que não. Ela é minha apólice de seguros para você se manter
longe de mim. Não posso jogar fora uma apólice de seguros deste
gabarito assim de uma hora para outra, não é mesmo?
— Ora, seu… !!! — esbravejou Carlos, mais alto do que deveria.
— Psiu! — Alan tapou rapidamente a boca de Carlos, alertando-o
do barulho que havia feito, quase inconscientemente.
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— Edson, ouça… Quero que fique calmo, está bem? — Ele, ainda
confuso, tornou a menear o cenho. — Acho que tem alguém lá em
baixo…
— Ladrões? — Interrompeu.
— Não sei ao certo, mas ouvi sussurros; duas vozes que vieram da
sala. Tem alguém lá com certeza.
Edson saltou da cama e caminhou suavemente até o armário de
onde tirou uma caixa e um objeto comprido que, no escuro, Júlia não
conseguiu distinguir. Edson caminhou até ela, e o objeto comprido
tomou forma. Era uma espingarda de cano duplo. Ele abriu a caixa e
tirou duas balas que ocuparam seus espaços reservados nos canos da
arma, depois tirou mais seis e colocou no bolso da calça do pijama que
vestia.
— Edson, o que você vai fazer com isso? Pode ser perigoso…
— Ninguém vai roubar minhas coisas que com tanto sacrifício
comprei. Se alguém quiser isso, vai ter que passar por cima de mim! —
Disse, engatilhando a espingarda.
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Capítulo 6
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— Ele tem sim, mas agora eu tenho que ir — disse. — Me diga uma
coisa… essa operação demora?
— Depende de onde a bala se encontra. Se estiver em alguma área de
risco, pode demorar mais por ser de maior delicadeza, e como esse é o caso
do Sr. Tavares…
Axel olhou outra vez para o relógio.
— Sendo assim, acho que tenho um pouco de tempo. Até mais. — Ele
andou rápido até o fim do corredor e sumiu da vista da enfermeira quando
fechou a porta da saída atrás de si.
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Não me preocupar? Não é você que está metido em toda essa confusão com o rei
das drogas da cidade! Não é sua cabeça que está em jogo! Pensou Oliver, olhando
fixamente para o jovem agente à sua frente.
Uma mão tocou o ombro de Axel, que olhou para trás e viu quem o
tocava. O médico piscou para ele.
— Desculpe-me, senhor policial, mas temos que removê-los para
dentro agora. Com licença.
— Tudo bem — disse Axel cordialmente, afastando-se e dando espaço
para os para-médicos cuidarem de Oliver novamente. — Fique bem, Oliver.
— Observou as macas serem empurradas para dentro do hospital. Selton,
recebendo mais atenção por parte dos médicos do que seu parceiro. Axel
permaneceu parado, fixo no mesmo lugar por um minuto, absorvendo todo
o relato do veterano tira. Toda a história era um tanto confusa. Voltou a si e
meneou a cabeça, olhou para Caroline, que ainda permanecia esperando-o
no meio da rua. Com esta notícia, com certeza ela irá ficar louca da vida, pensou
ele. Mas ela vai ter que agüentar. Afinal, é uma repórter.
Axel caminhou até Caroline e tornaram a dar os braços. Puseram-se a
andar rua abaixo, na direção do trailer Serve Bem.
— Há algo errado? — Perguntou Caroline.
— Não… Ah… não, não há nada de errado.
Caroline baixou a cabeça.
Essa não! Ela percebeu!
— Axel… eu conheço você. Não muito bem, mas conheço. O que há de
errado? Sua expressão mudou desde que falou com o policial lá atrás. O que
foi? Alguma notícia ruim?
Agora foi a vez de Axel baixar a fronte.
— Sim, mas… por favor, não me faça contar nada agora, Sta. repórter.
Quero tomar uma xícara de café antes, tá legal?
— Como quiser, Sr. agente.
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— Você não poderia ter deixado que aquela fita permanecesse nas
mãos daquele cretino! Você não vê o risco que estamos correndo agora? —
O poderoso homem levou a mão ao queixo e então alisou os cabelos,
tentando afastar os pensamentos pessimistas. — Droga! Agora estamos nas
mãos dele — voltou-se para Lucas, seu olhar era como uma metralhadora a
disparar furiosamente —, e não pense que ele é inofensivo e desprezível só
porque não tem poder, porque no momento ele é mais poderoso que nós.
Vamos nos submeter a ele, e tudo por sua culpa!
Lucas não reagiu ao desabafo. Tentou permanecer sereno e ocultou seu
impulso assassino.
— Vamos pegá-lo, Vip, é só uma questão de…
Outro violento soco na mesa que fez Lucas se calar.
— Me diga: como vamos pegá-lo, se no momento não sabemos onde se
encontra?
— Não sabemos agora, mas logo irei descobrir, e estaremos com ele na
nossa mira.
Vip suspirou de ódio, apontou o dedo indicador no rosto de Lucas e
sentenciou:
— Pois é bom que faça isso mesmo e logo, porque senão você nem irá
saber o que lhe atingiu quando estiver dando o último suspiro, à beira da
morte. — dito isto, virou-se e deixou o recinto, batendo fortemente a porta
atrás de si e deixando Lucas olhando para as paredes à procura de uma
solução para todos os seus problemas.
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O trailer Serve Bem era modesto, mas que agradava quem gostava de
um bom lugar para comer um sanduíche com batatas fritas ou
simplesmente tomar um cafezinho ao ar livre. Ao chegar no
estabelecimento, podia-se ver dez mesas de acrílico com o logotipo da
lanchonete, espalhadas ao redor do trailer e algumas pessoas sentadas a elas,
todas sorrindo e conversando coisas que somente interessavam a elas
mesmas.
O proprietário era George, um senhor de meia idade e barriga
avantajada. Axel o conhecia há algum tempo, pois sempre que tinha alguma
folga acompanhada de fome, dirigia-se ao trailer de George e experimentava
seus deliciosos sanduíches especiais.
Caroline e Axel chegaram ao trailer e sentaram a uma mesa desocupada
à dois metros da lanchonete sobre rodas.
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Capítulo 7
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com uma leve cabeçada no vidro da porta. Vip, o estranho ao seu lado
ligado a ele por uma algema, Lucas, o policial morto, toda a polícia de
Melmar, Nicole… Só esses problemas já bastavam no momento para manter
os neurônios fervendo.
Alan desgrudou os olhos da estrada e fitou Carlos, observando seu
estado de hipnose. Era como se ele pensasse em alguma coisa ou… em
alguém.
Alguém. Alan lembrou-se de Melina e seus filhos. Como estavam se
saindo com sua ausência? Sem o seu sorriso que os alegrava nas horas de
tristeza, sem seu ombro amigo? Mas Melina é forte, pensou, às vezes é mais do
que eu. Deus queira que estejam bem. Mesmo com os olhos abertos e voltados
novamente para a estrada, ele se ligou com o céu.
Senhor, orou, cuide de minha família, proteja-os de todo mal e não os deixe
sentirem-se amargurados ou angustiados. Mostra-lhes que teus planos nunca são
frustrados e que o teu amor é maior e mais forte que tudo. Console a cada um deles,
pai, e dá-me forças para continuar nesta caminhada. Completa a tua vontade em
minha vida. Em nome do Senhor Jesus eu te peço e desde já te agradeço, amém.
Enxugou uma lágrima que lhe correu o rosto e tornou a voltar o olhar para
Carlos, que continuava vagueando em pensamentos.
— Você está bem? — especulou Alan.
Sem virar o rosto, Carlos respondeu:
— Se você se sente bem com tudo o que aconteceu até agora…
— Desculpe-me — Alan desviou de um buraco. — Posso fazer uma
pergunta?
Desta vez, Carlos voltou-se e fitou Alan nos olhos por um momento,
então, sem nada a declarar, virou o rosto novamente para a janela,
retornando a observar a escuridão.
Alan não soube o que aquele olhar significou, ou não quis saber.
Continuou:
— Você tem família? Alguém próximo… Alguém que goste?
Silêncio.
Alan desviou de outro buraco que já se encontrava em cima da
caminhonete. Não disse mais nada, mesmo curioso.
— Mais ou menos — falou Carlos, ainda de olho para além da janela.
— Como assim?
— Por que você está me perguntando isso, hein? Por acaso você é
homossexual e está interessado em mim?
Alan sorriu ao ouvir aquilo.
— Não, não sou homossexual, e sim, de certa forma estou interessado
em você.
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O beco era escuro e muito sujo e isso significava que alguém já havia
estado ali antes em algum momento. O chão estava encharcado, as paredes
pichadas, o odor era quase insuportável. Tudo isso levava a pensar que
quem ficasse por ali certamente, assim como os ratos, não teria mais outro
lugar para aonde ir ou… se esconder.
Uma luz se acendeu no canto do beco. Alan adentrou a claridade e
sentou-se bem abaixo da luz, exatamente no centro dela. Seu aspecto era de
exaustão, angústia, medo, desespero, solidão. Parecia estar a chorar sob a
luz que o iluminava. Parecia sussurrar algo inaudível. Num momento, Alan
cochilou e sua cabeça tombou para frente, as lágrimas ainda visíveis no
rosto cansado. O sono parecia reparador.
De repente, pôde-se ouvir um bater estridente de asas. O que quer que
fosse, parecia estar por todos os lados do beco. Um pequeno vulto cortou a
luz rapidamente de um lado para outro, depois dois vultos fizeram o
mesmo, depois três, quatro, cinco… Agora eram dezenas deles. Morcegos.
Grandes morcegos sedentos por sangue. Todos eles, inconvenientemente,
fizeram um vôo rasante, acertando Alan com suas asas. O homem de Deus
despertou do sono num salto. Um morcego, destacado por seu enorme
tamanho, voou por debaixo do queixo de Alan e o arranhou no pescoço.
Alan jogava os braços para o ar, protegia os olhos, debatia-se. Tudo era em
vão. Os morcegos insistiam em querer sugá-lo e davam a impressão de que
nunca iriam se dar por vencidos.
Por um momento, Alan observou alguém se aproximar. Uma sombra
que aparentava-lhe ser familiar. Um morcego, aproveitando o descuido do
seu oponente, mordeu-o rapidamente no ombro. Alan gritou de dor e
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Capítulo 8
A avenida Amaredo era uma das principais avenidas que davam acesso à
cidade de Melmar. Com alguns dos maiores bancos e lojas de grifes
famosas espalhadas ao longo dela, também era sempre uma das mais
movimentadas em horário comercial. Mas agora, o relógio digital no
anúncio do Diário de Melmar mostrava 4h e 13mim. A Amaredo não se
encontrava mais repleta de investidores ou pessoas pagando suas dívidas,
ou muito menos gente comprando roupas de marcas caras. Agora, a
avenida estava servindo de abrigo para alguns mendigos, prostitutas,
meninos de rua e casais nada românticos. Podia-se dizer assim: nem mesmo
àquela hora da madrugada, a Amaredo parava. Era inconfundível que as
pessoas espalhadas ao longo da avenida naquele horário não eram nada
comuns, e isso era propício para que Carlos e Alan pudessem vaguear sem
grandes preocupações pela grande avenida.
Os dois caminhavam lado a lado, próximos um do outro, ocultando a
algema que insistia em cintilar. Alan não podia deixar de olhar para cada
mendigo, prostituta e menor abandonado por quem passava. Eram
considerados a escória da comunidade, quando na verdade, não eram nada
mais nada menos do que as mais desprezadas dela. Não tinham ninguém e
com quem contar no mundo a não ser com eles mesmos. Não dependiam de
alguém que fosse, se não de seus chapéus, armas e corpos. Era degradante
para Alan observar tudo aquilo, mas não conseguia deixar que nada lhe
passasse despercebido. Carlos notou isso.
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— Não olhe muito para eles — alertou —, a não ser que queira se meter
em encrencas, isto é, mais ainda do que já está metido.
Alan entendeu e tentou desviar o olhar de cada pobre homem e
mulher, assim como também de cada criança suja e mal tratada que se
encontrava jogada nas calçadas sem ter para aonde ir.
Uma lúgubre voz se fez ouvir em meio ao silêncio da noite.
— Por favor, ajudem-me, senhores. Dê-me algum trocado para que eu
possa comprar algo para comer e matar minha fome!
Alan olhou para o lado e enxergou uma velha maltrapilha sentada
sobre um pedaço de papelão no chão. Ela havia erguido a mão para que
pudesse pegar aquilo que Alan e Carlos viessem a dar. O servo do Senhor
fitou-a nos olhos e pôde ver algo diferente, algo que não se encontrava nos
demais para quem olhara antes.
— Espere — disse ele, fazendo Carlos parar.
— Não pare. Vamos…
— Espere só um momento — pediu Alan, olhando diretamente nos
olhos de Carlos, que se expressou com impaciência e balançou a cabeça de
um lado para o outro.
Alan meteu a mão no bolso e tirou uma nota. Abaixou-se e colocou-a
na mão da velha mendiga sorrindo.
— Como é o seu nome? — Indagou Alan.
— Bete.
— Está tudo bem? Você tem alguma família ou alguém assim?
— Tenho, mas já estou muito velha e todos acham que sou um atraso
em suas vidas; uma pedra de tropeço; uma velha que só lhes dá trabalho.
Viviam reclamando, e eu fugi de casa. Não agüentava mais ouvir as
reclamações de todos em minha volta. Pelo menos aqui não tenho que
agüentar nenhum murmúrio, mas às vezes me sinto sozinha e passo fome…
Vendo a impaciência de Carlos, Alan achou melhor encurtar a conversa
antes que ele explodisse de alguma forma. Disse em voz baixa:
— Aí está algum dinheiro para o alimento, mas ele não vai durar para
sempre. Faça o seguinte: vá até a rua Nivaldo Sampaio e irá encontrar um
templo evangélico. Procure o pastor Nilton Cross e diga-lhe que eu a
mandei e disse para cuidar de você. Diga-lhe também que estou bem e…
pergunte se Melina está lá, e se estiver, diga que eu a amo e também a Jair,
Jaime e Jéssica, está bem?
A velha coçou a cabeça e respondeu:
— Está.
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— Certo. Ele vai cuidar de você — falou Alan, por fim, mostrando mais
uma vez um sorriso. Ergueu-se, acenou para Bete e pôs-se a andar
novamente.
Carlos seguiu pensativo. Olhou para Alan e notou que este não olhava
mais para ninguém. Baixou o olhar antes de interrogar:
— Encontrou sua vítima?
— O quê?
— Isso mesmo o que você ouviu.
— Por que diz isso?
— Já conheci pessoas como você. Elas vêm, dizem e fazem coisas
maravilhosas, dão-nos pleno apoio, mas só depois de algum tempo é que a
gente percebe que fazem tudo para interesse próprio, assim como você.
Alan continuou a ouvir; Carlos prosseguiu a falar:
— Dinheiro, apoio, favores, ofertas de todas as formas e valores. É disto
que vocês estão procurando — Carlos fitou Alan, com um sorriso sarcástico
no rosto. — Você não vai ter isto de mim, amigo, pastor ou seja lá o que você
for. Não vai ter mesmo.
Alan sorriu meneando a cabeça.
— Carlos, olhei para todas aquelas pessoas lá atrás e você também
olhou, mesmo me dizendo para não olhar. Você notou o olhar daquelas
pessoas?
— São todos iguais.
— Isso mesmo. São todos iguais. Mas você notou o olhar daquela
senhora a quem ajudei?
— Igual a todos os outros.
— Não, Carlos. Havia algo diferente. Ela estava precisando de ajuda —
Alan fez uma pequena pausa para que suas palavras penetrassem o
consciente de Carlos. — Mas há uma coisa: todos os outros também estão
precisando de ajuda urgentemente, mas, “perceba”, ela reconheceu isso.
Reconheceu que precisava de ajuda e eu a ajudei. Não posso e ninguém
pode socorrer alguém que não peça por socorro, mas se alguém reconhecer
que necessita de socorro, sempre haverá alguém para socorrê-lo.
Carlos parou e Alan fez o mesmo, esperando mais alguma acusação ou
algo parecido, pronto a absorver e retribuir com algo que fizesse aquele
equivocado homem refletir.
— Não pedi ajuda para você, então por que veio me ajudar?
Depois do absorvimento, a retribuição foi instantânea:
— Seja sincero, Carlos. Você implorou para quem quer que fosse ajudá-
lo quando tudo isso começou. Só que nunca irá admitir isso não é mesmo?
Carlos tornou a andar.
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Alan olhou para trás. Não viu ninguém. Mas os passos ainda podiam
ser ouvidos.
— Pode não estar vendo nada, mas eles são espertos e rápidos e podem
estar mais próximos do que imagina.
Os dois fugitivos correram e correram. Era como fugir de um inimigo
invisível que no momento não podia se ver, mas num piscar de olhos
poderia aparecer, e então o pior poderia acontecer. Após um bom tempo de
corrida, não ouviram mais os passos. Carlos avistou um beco escuro à frente
e apontou.
— Vamos dobrar ali.
Fizeram a curva rapidamente e encontraram-se de uma hora para outra
em total escuridão.
— Há horas que não descansamos, nem pregamos os olhos. Se aqui for
seguro será um bom lugar para descansarmos. — comentou Alan.
— Apesar desse cheiro…
— Acho que isso não irá me incomodar muito. Com o sono que estou e
juntando o cansaço…
O local era úmido, frio e mal cheiroso, além de totalmente escuro.
Carlos e Alan adentraram ainda mais o beco. Com passos cuidadosos,
caminhavam sempre tateando aqui e ali para não tombarem em alguma
coisa. Carlos andava sempre atento, em posição de combate para alguma
eventual luta. Caminharam até chegarem ao final do beco, e só souberam
disso quando Alan, mesmo a tatear, quase quebrou o nariz no muro. Os
dois sentaram em meio a negrura, e Carlos, sem enxergar um palmo à frente
do rosto, disse a Alan:
— Ei, ô… bom samaritano, dizem que pastores fazem milagres. Então
que tal fazer um e acender uma luz aqui?
De repente Carlos viu um fogo se acender um pouco acima dos dedos
de Alan e ficou de boca aberta.
— Não se assuste — acalmou-lhe Alan. — Achei uma caixa de fósforos
quando sentei aqui.
Carlos suspirou e baixou a cabeça.
— Vamos fazer uma pequena fogueira com os pedaços de papel que
tem por aqui — falou Alan, acendendo outro fósforo e começando a
recolher algumas folhas de papel do chão. Amontoou o material e ateou
fogo, fazendo clarear e aquecer um pouco o lugar. — Assim está bem
melhor.
— Será que dá pra fazer alguma coisa também para isso aqui cheirar
melhor? — resmungou Carlos.
— Acho que isso já seria pedir de mais, não acha?
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— Era — disse Carlos. — Era minha mãe. Eu não tive pai, um cara
engravidou Vera quando ela ainda morava com os pais dela e depois se
mandou. Quando Vera soube da gravidez, contou aos velhos, na esperança
de que mostrassem compreensão e lhe dessem apoio. Mas ao invés disso,
enxotaram-na para fora de casa.
“Vera viu-se desesperada, sem saber para onde ir nem como iria viver,
ainda mais naquele momento com uma criança em seu ventre. Ela andou
um bocado. Um bocado mesmo, até ficar tarde. Então ela chegou perto do
metrô, observou e achou que ali seria um bom lugar para passar a noite, já
que não tinha mais nenhum lugar onde poderia ficar. — Carlos parou o
relato por um breve momento, vasculhando em sua mente as lembranças
que tinha de Vera. Então continuou: — Vera se enganou quando pensou
que ficaria ali uma noite, pois, na verdade, ficou dois meses. Sim. Dois
meses inteiros antes de Aldemar aparecer. Segundo ela, Aldemar se
apresentou como Wilson. Ele prometeu ajudá-la se ela o seguisse e ficasse ao
seu lado. Vera disse que estava grávida e ele disse: “Tudo bem, eu não me
importo.” Ela ficou maravilhada, surpresa e assustada com as palavras
daquele homem que nunca tinha visto antes. Todas suas promessas fizeram-
na acompanhá-lo. Tudo pareceu maravilhoso desde então. Wilson dava a
ela quase tudo, mas era o suficiente: Comida, bebida, roupas e aconchego
em seus braços. Vera perguntou-o por que fazia aquilo e ele respondeu que
um certo dia a viu no metrô, sentada na escadaria, e simplesmente um
cupido atirou uma flecha que acertou seu coração. Disse também que ainda
passou dois dias pensando nela antes de procurá-la.
Carlos observou o olhar curioso de Alan antes de confessar:
— Mas o sonho de Vera durou apenas até eu nascer e completar um
ano. Daí ela foi descobrir quem era Wilson. Sabe, pastor, Vera me contou
que quase ficou louca quando soube quem verdadeiramente era o homem
que a havia tirado do metrô. Wilson na verdade era Aldemar, um cafetão
muito esperto. Ele acolhia mulheres abandonadas na rua, trazia todas elas
para sua casa, onde dava todo conforto e também um amor irreal para
enganá-las. Depois oferecia drogas a elas, prometendo que se sentiriam
maravilhosas. Aldemar tomava as drogas primeiro para mostrar que não
era nada de mais, que não fazia mal algum. Depois passava para elas. Todas
as mulheres experimentavam por amor a ele. Algum tempo mais tarde
todas se tornavam viciadas. Então, Aldemar já não precisava pedir para que
elas tomassem as drogas. Elas é que passavam a implorar
desesperadamente para tê-las.
— Até que um dia, Vera pediu a droga a ele, e o descarado disse que
não tinha. Ela estava desesperada, tanto, que tremia pela falta de tóxico,
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posso dizer com certeza, pastor: ela não foi minha mãe. Nenhuma mãe faria
o que ela fez comigo.
Houve um longo silêncio. Um penoso e angustiante silêncio. Até que
Carlos voltou a contar mais uma parte da sua triste vida:
— Aquele dia em que Vera me jogou fora de casa e da sua vida, foi o
pior dia da minha vida. Apesar de naquele tempo eu já tinha conhecido
algumas pessoas e lugares naquele bairro, me senti como se só eu existisse
no mundo. Ninguém mais me importava, nada importaria mais daquele dia
em diante, e prometi a mim mesmo que não precisaria de mais ninguém
para sobreviver. Caminhei muito naquele dia, assim como Vera caminhou
no dia que seus pais também colocaram-na para fora de sua casa. Às vezes
fico refletindo se ela não pensou no sofrimento que havia passado quando
isso aconteceu. Será que não pensou no mesmo sofrimento que eu haveria
de passar?
Estancou as palavras, respirou fundo para continuar.
— Depois de ter caminhado bastante, fui parar num banco de uma
praça. Lembro-me que tinha umas garotas bonitas sentadas em um banco
atrás de onde eu havia sentado. Eu me dobrei para poder vê-las melhor. De
repente senti alguém me cutucar nas costas. Olhei e notei cinco rapazes mais
altos e mais fortes que eu atrás de mim. Um deles me perguntou: “O que
você tá fazendo aqui, hein? Não sabe que aqui é o território dos Dracus?” Eu
fiquei com medo, pois já tinha ouvido falar sobre os Dracus, uma gangue só
de rapazes e moças “barra pesada”. Então, outro garoto tirou um canivete
da jaqueta e falou gritando: “E aí, moleque, tá preparado pra sangrar?”
Pastor, eu não sei o que deu em mim… Eu acho que foi o que aquele garoto
disse… Eu pensei: “Puxa, eu não fiz nada! Por que esse cara quer me
cortar?” Sabe, naquele instante eu tremi todo. Mas não era mais de medo e
sim de raiva e ódio. Eu pulei em cima dele e uma forma tão rápida que até
hoje não consigo imaginar como fiz aquilo. O impacto do meu corpo contra
o dele o fez cair de costas e bater a cabeça no chão. Com a batida, um corte
bem grande se abriu na cabeça dele e com isso ele desmaiou. Eu ainda
estava encima dele quando sua mão se abriu, soltando o canivete. Daí, sem
pensar, peguei o canivete e me levantei apontando a arma na direção dos
outros garotos. “Venham aqui provar do seu próprio remédio! Venham!!”
gritei. Rapidamente fui em direção a um dos garotos e o feri no braço
esquerdo. Ele gritou e saiu correndo, sendo seguido pelo resto dos garotos
que estavam com ele.
“Quando os quatro rapazes sumiram de vista, eu voltei o olhar para o
garoto no chão desmaiado ou talvez morto, eu não o sabia. Uma poça de
sangue já estava se formando em volta da cabeça dele. Foi quando me voltei
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porrada!” Aquela foi a palavra mágica que virou a minha cabeça: Ou então a
gente vai te expulsar daqui… Não. Eu não queria ser expulso. Mais uma vez
não. Eu não suportaria. Virei bicho. Parti para cima da garota com socos e
pontapés. Estava fora de mim. Tiveram que me tirar de cima dela, senão eu
a estrangularia. Anderson me adorou. “Cara, você é doido!” disse ele. Entrei
na gangue e enquanto fiquei lá fiz tudo o que me mandaram. Tudo para não
ser abandonado outra vez. Você nem imagina o que fazíamos.
— Posso ter uma leve impressão.
— Eu acho que não.
— Você não sabe o que eu já vi.
Carlos voltou-se para Alan.
— E você não sabe o que eu já fiz. Mas chegou o tempo que completei
dezenove anos e me dei conta de que não valia mais a pena fazer tudo o que
fazia por motivos banais…
— Você ficou na gangue por sete anos?
Carlos confirmou com cenho.
— Então achei que estava na hora de fazer algo para beneficiamento
próprio. Passei a guardar algum dinheiro dos furtos que fazíamos. Um
pouco daqui, um pouco dali e consegui uma quantia razoável. Um tempo
depois, decidi sair da gangue. Mas não era permitido sair, por isso eu fugi
escondido para bem longe. Com o dinheiro que tinha aluguei um cortiço e
lá conheci um cara chamado Sérgio. Ele roubava carros e ganhava uma boa
grana. Entrei nessa e assim me sustentei até aos vinte e três anos. Acho que
nessa época que roubava carros, consegui roubar um número incontável
deles. Os caras com quem trabalhava me achavam o melhor. Foi nesse
tempo também que comecei a trabalhar na minha educação, pois tinha
certeza de uma coisa: sendo semi-analfabeto, eu não seria ninguém. Em
quatro anos aprendi muita coisa com a professora que paguei. Passei a
entender melhor as coisas e aprendi a me comunicar razoavelmente bem
com as pessoas. Usufruindo disto, conheci Cléber, um cara que conhecia
Lucas. Aquele filho da mãe com quem briguei lá na rua treze com a Clintel.
— Eu me lembro.
— Pois é. E foi assim que eu entrei para a Quadrilha Vip, meu caro. Foi
aí que eu cavei a minha cova.
— Por que eles querem dar um fim em você como diz? Fez alguma
coisa errada?
— Para eles eu fiz uma coisa sem perdão, mas isso é uma outra estória
que se você quiser ouvir é mil paus vivinhos aqui na mão.
— Pode ser fiado?
— Não mesmo.
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Capítulo 9
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mundo, que não vise apenas as verbas públicas para o seu bolso, mas que
respeite a população em geral e faça o melhor para ela?” Eu posso responder a
essa pergunta, e digo: “Existe, sim.” Então você pode me perguntar: “Então me
diga onde está!” e eu lhe respondo: “Bem… existir eu sei que existe, mas
responder onde está, isso é trabalho para Deus e não para um simples âncora de
noticiário.”
— Você tem toda a razão — concordou Melina, enquanto colocava o
macarrão dentro da panela.
Silvio Trindade olhou para outra câmera e o quadro atrás de si, que
antes era a foto do político corrupto que, momento atrás estava em
questão, mudou para uma bandeja recheada de todo tipo de drogas com
a palavra logo abaixo: NARCOTRÁFICO.
Silvio voltou a falar:
— E nessa madrugada, mais um pesadelo para a polícia de Melmar.
Membros de uma quadrilha de traficantes agiram assassinando um agente de
polícia e seqüestrando outro. Essa é mais uma ação terrorista, completando três
só neste mês. A repórter Caroline Lima esteve na madrugada de hoje no hospital
de casos especiais e emergências Norton Ramos, de onde fez esta reportagem.
A foto de Caroline apareceu atrás de Silvio e depois avançou até
ocupar totalmente a tela. A foto começou a se movimentar e sua voz
pôde ser ouvida:
— Bem, Silvio, estou aqui no hospital Norton Ramos, onde foi dada a
entrada do agente Pablo Tavares, que foi ferido gravemente numa missão com
dois tiros: um próximo ao coração e outro na cabeça. Segundo um dos médicos, o
agente Tavares chegou ao hospital em estado grave e estava desacordado, como
está até esse momento. Também há informações de que o agente estava
sangrando bastante e quase sem respiração. Faltam agora exatamente quinze
para as cinco, e o que sabemos no momento é que o agente Tavares está na sala
de operações, numa delicada cirurgia.
Melina ouvia atentamente a reportagem enquanto cortava a
verdura para decorar a macarronada. Achava horrível o que acontecia
no mundo do crime e o que essas pessoas faziam para ganhar a vida:
matando outros seres humanos.
— Segundo oficiais da polícia local — continuou Caroline —, tudo isso
começou com um plano do agente Tavares e de seu parceiro, o agente Caio
Vieira. Eles entraram em contato com um membro de uma quadrilha
denominada de Quadrilha Vip, e assim marcaram um local para uma suposta
transação, e foi nessa intenção, de acabar com o domínio dessa quadrilha que o
agente Tavares recebeu as duas balas, e seu parceiro, o agente Vieira, foi
seqüestrado pela própria quadrilha.
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“Está aqui comigo, o agente Axel Brendel, que está acompanhando este
caso e irá esclarecer algumas questões. — o zoom da câmera foi minimizado
até Axel aparecer na tela ao lado de Caroline. A repórter voltou-se para
o amigo. — Agente Brendel, como o senhor pode explicar o desaparecimento do
agente Vieira? Podemos considerar isso um seqüestro?
Axel olhou diretamente para a câmera.
— A explicação que temos a dar sobre o desaparecimento do agente Caio
Vieira é de que ele deve estar na posse da Quadrilha Vip. Estamos fazendo o
possível para encontrá-lo antes de acabar como os outros agentes, que foram
assassinados da mesma forma: carbonizados. Mas… infelizmente, calculamos
que o agente já esteja sem vida, pois encontramos marcas de sangue próximo de
onde estava o agente Tavares e achamos que essas marcas sejam do agente
Vieira. E as marcas se estendiam até um certo ponto, o que nos faz pensar que o
arrastaram para um carro e o levaram do local.
— Mas por que levar o agente Vieira em um carro, agente Brendel? Por
que não deixar junto a Pablo Tavares?
— Bem, a Quadrilha Vip tem um tipo de marca registrada desde que
começou a operar aqui em Melmar. E essa marca é meio que, podemos dizer…
macabra.
— E o que seria essa marca registrada?
— Para provar que é a melhor, a quadrilha tenta amedrontar até a polícia.
Há algum tempo, agentes têm sido designados para acabar com o domínio dessa
quadrilha, e esses agentes têm sido exterminados; assassinados; mortos. E o jeito
com que vêm sendo mortos tem sido essa marca registrada de que falei. E como
seria? Eles queimam os corpos dos agentes designados. Carbonizam. Os agentes
desaparecem e depois de algum tempo aparecem totalmente carbonizados. Todos
foram mortos desta maneira.
— Agente Brendel — disse Caroline e Axel fitou-a —, há alguma pista
nesse caso? O senhor pode falar algo sobre isso?
— Na verdade há, sim. Quando chegamos no local onde encontramos o
agente Pablo Tavares, havia dois homens perto dele, e junto a eles estava uma
arma que acreditamos ser de onde saiu os disparos contra o agente Tavares e
também uma garrafa de querosene que, logicamente, para nós, serviria para
carbonizar o agente que ali estava.
— E quanto a esses dois homens… onde estão? O que se sabe sobre eles?
— Esses dois homens foram capturados e pegos em flagrante,
encaminhados então para a central de polícia…
— Que crueldade esta quadrilha está fazendo com todo mundo, meu Deus!
Tomara que prendam todos eles e dêem um fim logo a essa carnificina — falou
Melina, agora colocando as verduras dentro de uma tigela de porcelana.
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Melina deixou cair a tigela repleta de verduras no chão. Junto com a
surpresa, sentiu um profundo aperto no coração.
— Meu Deus, é Alan! É Alan!
Melina ainda se lembrava nitidamente da vestimenta do marido
quando este partira.
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— Senhor, ele está metido com esta quadrilha! Então não foi
realmente um sonho e sim uma revelação! Ele está mesmo precisando de
ajuda, Jesus; minha, de toda igreja e principalmente da Tua ajuda, meu
Senhor!
Pôs-se rapidamente de joelhos e ali mesmo na cozinha, ligou-se com
o céu em uma fervorosa oração, clamando, pedindo, suplicando a ajuda
divina.
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— Não.
— Então venha para cá. Precisamos conversar.
— Certo.
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Bete para dizer-nos que está bem. Seja como for, Pai, que o Senhor esteja com ele
em sua caminhada.
Nilton levantou-se da cadeira estofada e saiu do escritório, bateu a
porta atrás de si e seguiu rumo à casa dos Xavier.
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— E… ?
— Ele não me questionou muito sobre isso, e eu não contei por que
desviamos da central…
— Oliver! — interrompeu Vip. — Se lhe perguntarem por que
desviaram da central, quero que diga que foi Selton quem o fez,
entendeu? Diga que você ficou confuso, perguntou-lhe por que havia
dobrado na rodovia 113 em vez de seguir para a central, mas que ele não
respondeu e… por um erro no volante arrebentou o carro no poste, ok?
Diga que foi culpa do Selton.
A voz de Oliver soou cheia de indignação.
— Mas Vip, assim irei sujar a barra do Selton. Acabarão
suspeitando que ele faz parte da quadrilha, que é corrupto e quando ele
acordar irão fazer milhares de perguntas e ele vai acabar deixando
alguma coisa escapar…
— Ele não irá acordar.
Os lábios de Oliver se encontraram subitamente tremendo de
choque.
— O que você disse?
— Ele não irá mais acordar, Oliver, e você cuidará para que isso
aconteça.
Imediatamente um surto nervoso tomou conta do experiente
policial.
— Mas e-ele é m-meu parceiro e amigo… e… você está pe-pedindo
que e-eu…
— Você já entendeu tudo — disse Vip com voz áspera. — Não
podemos arriscar o futuro da quadrilha, já que o futuro de todos nós
está incluso nela. Você bobeou, Oliver, fracassou, e por causa disso abriu
uma fresta por entre a parede e agora, mais cedo ou mais tarde nossas
ações poderão ser visualizadas, a menos que você faça com que essa
fresta seja fechada, e isso só acontecerá se você fizer o que tem que ser
feito. Então faça e o mais rápido possível, não importa como.
A ligação foi finalizada e Oliver ouviu quando Vip bateu o telefone
na sua cara, não dando mais tempo para seus protestos. Oliver apertou o
botão de finalizar a ligação e repousou o telefone em cima do seu
próprio corpo. Fechou os olhos e ficou a pensar em todas as palavras
ditas durante a conversa, que parecia mais com uma das horrorosas
reuniões no Quaid.
Não podemos arriscar o futuro da quadrilha, já que o futuro de todos nós
está incluso nela…
…Então faça e o mais rápido possível, não importa como.
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Capítulo 11
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Quando ouviu que Axel desligara, Tina olhou por alguns segundos
para o fone e depois o devolveu ao console. Foi até a mesa e retirou os
ingredientes para a lasanha de cima dela, levou-os até a dispensa e
guardou-os lá.
Leonardo, o filho de oito anos do casal, observou os movimentos e a
expressão de angustia no rosto da mãe.
— Não vamos mais ter lasanha no jantar, mamãe?
Tina aproximou-se dele e tocou-lhe delicadamente o rosto.
— Não, querido, mas vamos comer uma deliciosa pizza. O que
acha?
— Papai irá gostar mais da lasanha.
— Iria gostar, querido. Ele não virá à noite.
Leonardo fechou os olhos e balançou a cabeça de um lado para o
outro.
— Outra vez? — sentenciou ele com uma pergunta que fez Tina
estremecer.
Ela puxou o pequeno filho contra o corpo e acochou-o num caloroso
abraço. Foi tudo o que pôde fazer, e isso tomou o lugar de suas palavras.
Depois disto, deixou Leonardo com seus brinquedos e distanciou-se do
mundo quando se trancou em seu quarto, fazendo das quatro paredes
suas fronteiras. Tina debruçou-se sobre a cama e então escorregou por
ela até encontrar-se de joelhos.
Gotas de lágrimas rolaram por seu rosto, e então o choro foi liberto.
Seus lábios tremiam em uma súplica sussurrada, incompreensível para
os homens, mas não para o Senhor.
Tina entregou-se inteiramente à oração naquela manhã. Nalgum
dia, tinha certeza, o Senhor cumpriria com suas palavras em Lucas 18:7.
Ela rogou em voz alta:
— Oh, Senhor! Traga-o de volta para mim! depois de pertencer a ti,
ele pertence a mim, Senhor! Por favor, traga-o para mim! — e então, as
lágrimas sufocaram-na novamente.
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poderia ser muito perigoso, pastor. Desta vez mais ainda do que foi da
primeira vez.
O pastor Cross arregalou os olhos de horror.
— Mais ainda? Jesus Cristo!
Melina balançou a cabeça confirmando suas próprias palavras.
— Sabe, pastor Cross, não quero ser prepotente nem descrente do
poder de Deus, mas… — Melina conteve com grande esforço o choro
que teimava explodir garganta afora. Continuou. — …estou com medo.
Tento não expor meu lado carnal, tento não pensar no que ele possa
estar passando de mal. De hora em hora dobro meus joelhos em oração e
suplico ao Senhor que multiplique minha pequenina fé e que me ajude a
confiar no seu poder, graça e sabedoria. Mas sempre minha carne entra
em conflito com meu espírito e então surge em mim o egoísmo, e vejo-
me a discutir com Deus e… dizer-Lhe que Alan também me pertence
assim como pertence a Ele, e… — Melina não pôde mais continuar. O
choro tomou-lhe a fala.
— Oh, Deus — chorou ela —, por favor, perdoe-me! Ajude-me a
confiar e esperar plenamente em ti, Senhor!
O pastor Cross certificou-se que a sua hora era chegada.
— Senhor Deus — orou ele —, Te adoramos, pois tu és Santo,
Tremendo e Soberano sobre a terra, céu e mar, que reinas sobre as
nações e como Tu não há outro. Olha, Senhor, para a tua filha neste
momento e contemple sua aflição, suas dúvidas, seus anseios e tudo
aquilo que a impede de confiar cegamente em Ti. Remove todas as
barreiras do seu coração e dê tranqüilidade e ela, Pai. Mostra-lhe que a
Tua palavra é perfeita quando fala que todas as coisas acontecem para o
bem dos que Te temem…
O pastor Nilton Cross orou fervorosamente a Deus naquela manhã.
Apresentou-se ao senhor, assim também como à Melina, Alan e os três
pequeninos do fiel casal. Pediu que os guardasse e que os ajudasse a
suportar todas as aflições, pois a vitória era certa.
Ao término da oração, Melina sentiu-se veementemente melhor. O
peso exaustivo do seu coração havia se transformado em um leve e
suave sentimento de calma. Ela agora respirava fundo, serenamente.
Enxugou as lágrimas do rosto e sorriu ternamente.
— Obrigada por ter vindo, pastor. Estava precisando mesmo desta
oração.
Nilton também abriu o largo sorriso.
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Capítulo 12
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— Acho que teve mesmo — concluiu Alan. — Quer falar sobre isso?
Nem um músculo foi movido. Alan suspirou em desapontamento.
Agora voltou a ser como era antes, pensou. E os dois permaneceram em
silêncio. Carlos deixou escapar um grunhido e Alan especulou:
— O que foi? Está sentindo algo? Alguma dor? Do jeito que você
ficou depois que aqueles caras te pegaram, não me admiraria se você
ficasse arriado, ainda mais com todo o caminho puxado que
enfrentamos…
Carlos voltou-se para o homem ao seu lado.
— Não precisa se preocupar. Já suportei muitas coisas e isso não
chega nem perto do que já passei.
Alan sabia disso.
— Sei disso, Carlos. Talvez não possa parecer, mas também já passei
por muita coisa na vida, assim como você. Acho que não pelas mesmas
experiências, mas já vivi várias situações, por isso, acho que sei pelo que
está passando; o que está sentindo.
Carlos sorriu zombeteiro.
— É mesmo? Pois tá, pastor, fale. Diga pra eu ouvir. O que estou
sentindo?
Realmente queria ouvir o que aquele homem iria falar? Carlos viu-
se curioso. Agora ele vai se dar mal, pensou. Mas de alguma forma sentiu-
se em dúvida e temeroso, pois suas palavras poderiam ser verdadeiras,
falar exatamente de sua vida. Aquele estranho homem ao seu lado sabia
como cativar seu interesse, e assim, como das vezes anteriores, mais uma
vez ele conseguiu fisgar sua atenção.
Alan suspirou vagarosamente, olhou para o céu azul lá em cima.
— Na bíblia — começou ele — encontra-se uma parábola de Jesus…
Lá vem ele para contar coisas sem interesse. Não falou que achava que
sabia o que eu estava sentindo? Por que está mudando de assunto?
Pensou Carlos, mas não interrompeu Alan. Queria saber aonde iria dar
sua “conversa”.
Alan continuava:
— …em que Ele conta a estória de um homem de riquezas. Ele tinha
dois filhos. Um dia, o mais moço disse ao pai: “Dá-me a parte dos meus
bens que me pertence”. E o pai repartiu os bens entre os dois. Poucos
dias depois, o filho mais moço, ajuntando tudo, partiu para uma terra
distante, e ali desperdiçou os seus bens, vivendo dissolutamente. Tendo
ele gastado tudo, houve naquela cidade uma grande fome, e ele
começou a passar necessidade. Então, um dia, chegou-se a um dos
cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos para
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— Exatamente. Que bom que se lembrou. Isso quer dizer que está
ouvindo tudo o que digo.
Droga! Fui pego nessa. Entreguei a mim mesmo.
— Numa passagem bíblica, está escrito: Se Deus é por nós, quem será
contra nós? Se estamos com o Senhor do nosso lado, Carlos, não temos o
que temer, pois “Ele quebra a flecha e corta a lança, queima os carros no
fogo, porque Ele é o Senhor dos exércitos”. Nem homens, nem
quadrilhas, nem exércitos podem derrotá-lo, porque Ele é Deus
Onisciente: sabe todas as coisas, tudo o que pensamos, planejamos e
ocultamos; Onipresente: está em todos os lugares, não podemos nos
esconder de sua presença. Você poderia se esconder no mais profundo
dos abismos, ou no mais profundo dos mares, ou mais do que nenhum
homem poderia chegar e lá estaria Deus; e Onipotente: pode todas as
coisas no mundo. O impossível para nós é possível para Ele. Não há
barreiras que não possa transpor, não há correntes que não possa
quebrar. — Alan apontou mansamente o dedo para Carlos. — Agora
imagine Ele lutando ao seu lado. Você não precisa fazer força nem
esforço de forma alguma. Bastaria apenas ligar-se a Ele.
Carlos respirou profundamente sem dizer uma palavra, esfregou os
olhos e começou a levantar-se vagarosamente. Alan acompanhou-o e
reservou-se a observá-lo em silêncio, pois concluiu que o movimento
encerrara a conversa.
— Vamos — disse Carlos, pondo-se a caminhar para a saída do
beco.
— Para onde?
— Telefonar novamente e pôr um fim nisso tudo de uma vez por
todas.
— E você fará isso com um simples telefonema?
Carlos estancou e virou-se para fitar Alan, mas antes que pudesse
falar alguma coisa, foi advertido: — Foi só uma pergunta! Apenas uma
pergunta!
— É, farei, sim — voltou a dirigir-se para a saída do beco —, ou pelo
menos irei tentar.
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741-3792 # TP
BIAL SEVERO / DORA CARVALHO
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pela TV, Vip estivera eufórico, mas queria algo concreto, não apenas
uma imagem numa tela de vidro.
O carro em que Lucas estivera já se encontrara distante quando os
policiais entraram em suas viaturas e aceleraram atrás dele. A imagem
fôra cortada e a exibida em seguida fôra as ruas passando velozmente
pela janela do carro de reportagem. Após alguns minutos, depois que o
repórter repetira todos os acontecimentos até ali pela décima vez, a
câmera mostrara uma dezena de carros-patrulha paradas adiante. O
carro de reportagem — uma van Chevrolet — parara e o repórter junto
com câmera-man saltaram novamente para a rua e seguiram os policiais
numa corrida frenética, que fôra cessar no final de um beco de luz
aparentemente escassa — mesmo estando o sol a iluminar àquele dia. O
carro vermelho metálico estava lá; a jovem mulher também, apesar de
imensamente conturbada. A câmera varrera toda a área com sua lente,
mas nem ela nem os policiais encontraram Lucas. Ele escapara sem
deixar quaisquer pistas.
Vip achara-o o máximo.
Alguns dias depois, Vip falara com seus contatos e não demorara
muito para que encontrassem Lucas. Sua conversa havia sido “curta e
grossa”, convencendo-o imediatamente a entrar para a quadrilha.
À medida que os anos se passaram, Lucas se mostrou prestativo e
extremamente confiável, e isso influenciou muito em seu “crescimento”
prematuro dentro da quadrilha — chegando, por fim, ao cargo de
subchefe em todas as atividades que a quadrilha exercia, e isso incluía
nas decisões.
Vip teve que sorrir por um momento breve. Agora Lucas o conhecia
como ninguém, assim como nenhum outro conhecia Lucas melhor do
que Vip. Eram como irmãos. Vip, o irmão mais velho, que às vezes tinha
que repreender o mais moço. Mas agora não havia necessidade para
repreensão e sim de uma declaração de admiração. Mas o ego de Vip
não lhe permitia fazer tal coisa.
— E então — tornou a inquirir Lucas —, irá fazer ou o quê?
Vip fitou-o nos olhos e sorriu.
— Você me conhece melhor do que imaginei, Lucas — disse,
meneando a cabeça. — Certíssimo. Numa situação comum, em que não
estivesse em jogo a mim e a organização, e sim outra coisa, por exemplo:
uma mercadoria; eu não pensaria duas vezes. Mataria quem quer que
fosse num estalar de dedos. — Vip respirou, fazendo um zunido quando
o ar saiu pelas suas narinas. — Mas esse jogo que Carlos está fazendo é
algo muito delicado, algo perigoso para mim, você e toda organização.
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Aí sim, temos que ter um cuidado todo especial com esta situação. —
desta vez olhou para todos à mesa. — Porém, digo-lhes que, nem esta
delicada situação salvará Carlos de uma morte dolorosa. Ninguém
banca o espertinho comigo e sai ileso. Ele sabe de mais a nosso respeito.
Não que eu não pense que ele não cumprirá sua parte no acordo: sumir
de vista para sempre e não abrir a boca pra ninguém, pois me pareceu
bem convincente ao me prometer.
Lucas interrompeu-o cautelosamente:
— Mesmo assim, não acho de todo seguro deixá-lo ir, pois mesmo
que ele nunca mais apareça, digamos que até mesmo saia da cidade, será
que conseguirá se esconder da polícia? Ele é esperto, e pelo pouco que o
conheço, diria que o nosso amigo é, nada mais nada menos, que um
autêntico vingador. Então…
Lucas deixou que o então surtisse o efeito desejado na mente de Vip
e o clima que surgiu mecanicamente foi de total apreensão em todo o
recinto. Até que Vip concluiu:
— Você tem razão. Se os tiras pegarem-no, ele não se calará. Falará
e fará tudo para acabar conosco, já que para ele não restará, se isso
acontecer, mais nenhuma esperança, senão a cela de uma prisão para
passar o resto da sua vida inútil. — Vip petrificou o olhar, numa
expressão intrigante e sentenciou: — É por essa e outras que Carlos não
estará mais vivo amanhã de manhã.
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Capítulo 13
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Não sabia porquê — ou melhor, sabia sim — mais um policial havia sido
assassinado, queimado talvez vivo por traficantes frios e calculistas que
não faziam outras coisas senão matar e destruir as esperanças da
população mundial.
Caio não era muito conhecido por Axel. Desde que chegara à
divisão policial de Melmar, Caio passara mais tempo com Pablo (este
muito bem conhecido por Axel) do que com toda e qualquer pessoa na
Central de Polícia. Pelo que já ouvira falar, Caio viera da divisão de
entorpecentes da cidade de São Paulo, sendo algumas vezes
condecorado por lá. Fizera muitas apreensões de carregamentos de
tóxicos na capital paulista e dera continuidade ao seu trabalho ao chegar
em Melmar, juntando-se quase que imediatamente com Pablo no
combate à Quadrilha do Vip — que já estava se tornando, na época, uma
potência do narcotráfico na cidade. Pelo que Axel sabia, Caio não tinha
parentes. Seus pais tinham morrido num acidente automobilístico há
cinco anos atrás e ele era filho único. Um solitário no mundo, pensou
Axel, pois não havia sequer uma namorada que pudesse ser avisada de
sua morte e chorar por ele.
Axel achou melhor afastar esse pensamento.
Concentrou-se num homem vestido dentro de um uniforme
esbranquiçado ao lado do furgão onde colocaram o saco preto com o
corpo de Caio. Axel o reconheceu. Era o legista. Estava conversando com
um policial negro e de porte extremamente atlético, chamado Antônio
Gonzaga — também da divisão de narcóticos, que, por acaso, seu irmão
que também fora policial, José Nogueira, havia sido, assim como Caio,
assassinado pela Quadrilha do Vip. Axel permaneceu a observá-los por
alguns minutos pensando como Gonzaga estaria se sentindo, até que
este apontou em sua direção. O legista acompanhou o movimento do
homem e olhou para Axel.
O legista caminhou até ele e estendeu a mão.
— Sou o legista encarregado, Ângelo Tellez.
Axel já o conhecia. Pegou-lhe a mão e apertou-a num cumprimento,
logo após se identificou:
— Agente Axel Brendel.
O Dr. Tellez assentiu numa cortesia. Ele não o conhecia e não fazia
qualquer questão em conhecê-lo.
— Gonzaga me informou que você está sendo o encarregado deste
caso.
— Acho que ele não mentiu.
— Conhecia a vítima, o agente Dreammy?
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— Não muito…
— Preciso fazer a autópsia, fazer o reconhecimento pela arcada
dentária. Tem algum parente que possa dar permissão para que eu
possa fazer isso?
Axel suspirou em desapontamento em relação àquela pergunta,
como se ele fosse o próprio Caio.
— Não. Ele não tinha nenhum parente. Acho que a única pessoa
que ele tinha era Pablo. Mas este não poderá fazer coisa alguma… para
sempre — Axel forçou-se a pensar que isso era mentira.
Ângelo Tellez estava assentindo com a cabeça novamente.
— É, eu vi no noticiário. Todos sentiremos falta dele.
Axel perguntou-se o quanto Pablo era conhecido na polícia de
Melmar. Um ótimo policial; um ótimo amigo.
Os dois ficaram sem palavras, como se tivesse sido estabelecido um
minuto de silêncio.
— Preciso de uma autorização para fazer a autópsia — disse o Dr.
Tellez, por fim.
— Eu consigo uma para você — tranqüilizou Axel, tirando o olhar
de cima do legista calvo e de aparência cansada e observou a rua cada
vez mais empestada de curiosos. — Pode fazer o que achar necessário.
— Certo — Ângelo Tellez tornou a estender a mão, despedindo-se,
e Axel tomou-a na sua, sacudindo-a firmemente. Foi uma conversa e
fria, mas que teria de acontecer, pensaram os dois.
Alguns segundos depois, o legista estava dentro do furgão,
dirigindo-se para o necrotério, emitindo a estridente sirene. Axel
observou os fotógrafos aglomerados na rua, correndo ao lado do
veículo, tentando a sorte numa foto nua e crua do corpo carbonizado de
Caio, que com certeza teria seu lugar reservado na primeira página do
jornal para quem trabalhavam. Então seus olhos se depararam com a
figura ligeiramente polida e visivelmente abatida que, encostada numa
van de reportagem, parecia isolada em seu mundo particular. Até que
reconheceu que era Caroline. Caminhou até ela e pôs-se ao seu lado. A
repórter somente se deu conta da presença de Axel quando por este foi
tocada no ombro. Despertou com um susto.
— Oh, Axel… Desculpe-me, eu…
— Não tem nada com o que se preocupar — sorriu ele,
singelamente. — Como você está?
Ela receou em responder.
— Humm… estou bem… eu acho.
— Veio do NR?
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ter o poder de tirar Pablo do coma e entregá-lo a Caroline, mas isso lhe
era impossível. Assim, a frustração tomou conta de Axel.
Pelo menos alguma coisa do passado ainda vive em mim: bondade e
compaixão, pensou o agente negro.
— Tenho que ir agora — despediu-se.
— Certo — concordou ela, como se fosse a única coisa a se dizer.
Axel virou-se e caminhou na direção de Fernando Vern, mas de
repente voltou-se para a repórter outra vez.
— Carol,… acho que depois daqui irei ter um tempo livre. Então,
estou pensando… se não seria boa idéia eu ir à redação também, ajudar
você, a outra repórter e, quem sabe, a mim mesmo.
Caroline sorriu.
— Claro! Vai ser bom termos você lá.
Ele meneou a cabeça, contente.
— Então esperem por mim — virou-se e se juntou ao detetive Vern.
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seu paletó Boss cinza, que agora parecia mais um marrom e sentiu o
odor forte da transpiração.
Voltou-se para os nervosos olhos azuis que ainda se mostravam na
escotilha e fitou-os com uma expressão diferente da que apresentara
minutos atrás, uma expressão que mostrava sua impaciência e fúria.
— Olhe aqui, seu idiota de olhos azuis, veja o meu paletó! Estou
com essa droga de paletó à mais ou menos doze horas! Estou cansado,
ferido, suei da cabeça aos pés e agora estou fedendo… — Carlos notou
que os olhos continuavam inexpressivos. — Abra logo a droga desse
portão!! — Bradou.
Alan olhou assustado para os lados, receando que o descontrole de
Carlos chamasse a atenção de terceiros ou até mesmo da polícia, mas
felizmente constatou que as pessoas que andavam pela rua não deram
crédito para seu histerismo.
O par de olhos recolheram-se outra vez sem dizer uma palavra.
Carlos praguejou e socou o portão de chapas de ferro. Virou-se para
Alan.
— Droga! — passou a mão pelo cabelo desordenado. — Quer saber?
Você está sendo um maldito pé frio! É isso o que você está sendo desde
que se meteu na minha vida! — disse, apontando o dedo indicador para
o rosto de Alan. Este, não fez qualquer movimento ou ao menos mostrou
algum resquício de indignação.
De repente, pôde-se ouvir um estalo por detrás de Carlos, que se
virou rapidamente, seguido pelos olhos de Alan. O portão começou a ser
aberto, até que escancarado, por fim. Uma figura humana apareceu
saindo das sombras do recinto e Carlos reconheceu-o imediatamente.
Nick parecia estar com a cara mais enrugada — o que não era novidade,
pois aparentava que, a cada mês, uma ruga teimava em se apoderar de
uma parte do rosto dele. Nick sempre usava rabo-de-cavalo e agora se
podia ver que não perdera o costume, assim como não perdera o fascínio
pelos ornamentos banhados a ouro pendurados no pescoço e presos ao
pulso.
Foi Nick quem falou primeiro.
— Ei, Carlos, é você mesmo! Cara, quando o Dário falou que você
estava aqui fora, pensei que era brincadeira, mas aí pensei: “Mas Dário
não conhece o Carlos”, então…
— Até que enfim aquele miserável se mexeu.
Nick sorriu. Caminhou até Carlos e apertou-lhe a mão.
— É, vejo que você conheceu Dário intimamente. Mas, cara, há
quanto tempo, hein? Dois anos?
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na oficina de desmanche. Nick não era alto nem atlético, mas sua fama
de vingativo e impiedoso o fazia uma ameaça e Carlos conhecera esse
lado de Nick ao longo de sua carreira como ladrão de Carros.
Na oficina de Nick Gradinno existiam regras obrigatórias que
deveriam ser cumpridas ao pé da letra pelos funcionários, que em troca,
recebiam ótimos salários para viverem, se divertirem ou fazerem o que
bem entendessem. Um dia, Célio Saral, um dos funcionários — ladrão
de automóveis — foi desmascarado por Nick. Saral estava trabalhando
também para Aloízio Moratti — um concorrente de Nick, e isso era
contra as regras.
Nunca trabalhe para mi e para outra pessoa ao mesmo tempo. Eu não o
perdoarei se fizer isso, entendeu? Isso é uma das regras básicas — alertara
Nick no primeiro dia de Carlos como funcionário.
Algumas semanas depois da descoberta, Célio Saral não apareceu
mais na oficina e nunca mais se ouviu falar nele. Este fôra apenas um
dos casos com que Carlos convivera durante o período em que
trabalhara na oficina.
— Estou economizando o máximo para me erguer de novo — Nick
deu uma nova tragada em seu cigarro. — Como você está vendo, não
estamos no auge dos negócios, mas pelo menos estamos em
funcionamento. Você acredita que estou agora apenas com dois
pescadores?
Pescadores eram os ladrões de Carros que os traziam à oficina, para
o desmanche. Carlos ficou espantado. Em sua época, sete pescadores
travavam uma batalha acirrada para ver quem roubava mais
automóveis. Faziam um jogo onde um carro comum valia um ponto, e
um carro do ano três pontos. Aquele que acumulasse o maior número de
pontos, no final de cada semana, passava o final de semana onde
quisesse por conta dos perdedores. Carlos perdera a conta de quantos
fins de semana passara em grandes e luxuosos hotéis à beira mar ou em
cruzeiros particulares em pleno oceano ao lado de…
— Mas estou certo de que vou me erguer e voltar a ser o que era
antes — Nick tirou o cigarro da boca, e com o dedo, fez com que as
cinzas caíssem no chão. — Ei! Diga-me, Carlos, a que devo essa aparição
assim… de repente?
— Nick, eu…
As mãos de Nick fizeram gestos apressados para que Carlos não
falasse, e então o interrompeu:
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— Não é por nada, Nick, mas será que dá para você tirar essa droga
de algema de mim? — ele esticou-a para Nick. — Não agüento mais ficar
com isso preso ao meu braço.
— Claro — Nick afastou-se até uma escrivaninha e voltou com uma
chave que nenhum dos dois homens algemados tinham visto na vida.
Ele introduziu-a na pequena fechadura da algema que prendia o pulso
de Carlos e, ao girar, a trava se abriu. Em seguida, foi a vez de Alan, e,
em um minuto, os dois estavam livres um do outro. — Enfim, liberdade!
— exclamou Nick.
— Por enquanto — corrigiu Carlos, massageando o pulso e atraindo
os olhares de todos que estavam no recinto.
Alan, por fim, falou:
— Do que você está falando? — sabia que o que mais irritava Carlos
era sua presença e suas palavras. O que ele dissera, pegou-o de surpresa.
— O que é isso, pastor! — a expressão de Carlos era de
incredulidade. — Não é isso que você quer? Ficar junto a mim para me
dar sermões, dizer o que devo fazer e como devo fazer…
Nick interveio:
— Ei! Então você não estava brincando mesmo quando falou que
ele era seu pastor!
— Não — disse Carlos —, ele é mesmo pastor, só que não é meu.
Nick queria mais esclarecimentos.
— Mas…
— Nick, por favor, conversaremos depois, tá legal? Você não está
sentindo esse cheiro horrível? Ele é meu. Estou fedendo! Tudo o que
quero agora é tirar essa maldita roupa, tomar um banho e colocar uma
vestimenta decente — Carlos aproximou-se de Nick e tocou-lhe o
ombro. — Por favor. Depois conversamos e te conto tudo o que você
quiser saber.
Nick hesitou.
— Humm… tudo bem. Pela tua aparência, é disso que você está
precisando mesmo — olhou para um dos funcionários, um mecânico, e
fez um sinal com a cabeça. — Tico, leva ele ao banheiro. — Voltou-se
para Carlos. — No quarto tem uma cômoda, você pode pegar uma
toalha e roupas limpas. Sirva-se.
— Obrigado — agradeceu Carlos, e então fitou Alan, observando
seu aspecto. Nada bom, da mesma forma que ele. Sabia que ele não
tentava demostrar — o que às vezes conseguia — o quanto sentia o
estresse que toda essa situação impusera-lhe. — Pastor, depois
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Capítulo 14
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perguntas que assolaram-na por todas as horas que passara ali até
àquele momento:
— Quem é você? Onde está Carlos?
Sem nada falar, Lucas sentou-se sobre a cama. Nicole estava com os
nervos à flor da pele, e isso a deixou ainda mais nervosa.
— Responda, seu filho…
— Ei! — interrompeu ele. — Você é muito bonita para falar essas
coisas feias!
A jovem moça levou as mãos à cabeça e sentiu vontade de arrancar
todos os fios de cabelo que nela estavam plantados.
— Por favor… — suplicou ela —, diga-me o que quero saber! Estou
à beira da loucura. Este lugar é pior que um hospício, e… Por favor, me
diga onde ele está!
Lucas cruzou as pernas. Com ar de gentileza disse:
— Para ser franco com você, não tenho a menor idéia de onde
Carlos possa estar agora — viu no rosto de Nicole a dúvida. — Estou
falando a mais pura verdade. Agora, não me pergunte como ele está,
porque creio que você não gostará da resposta.
Isso Nicole já imaginava. Era óbvio que Carlos não estava nada
bem, mas queria saber o quanto. Resolveu não perguntar mais nada a
esse respeito.
— O que você quer comigo?
Lucas riu.
— Oh! Eu queria muitas coisas, mas… — ele olhou-a de cima a
baixo — eu sou do tipo que não ultrapassa o sinal, entende? Só vim aqui
lhe informar que isso não vai durar por muito tempo. Logo você irá sair
daqui.
— Que garantia você me dá?
— Minha palavra não basta?
— E desde quando palavra de criminosos como você tem garantia?
— A de Carlos não tinha?
Nicole silenciou. Ele a tinha pegado.
— Foi muito injusto da parte dele, na minha opinião, ter escondido
que era um infrator da lei de você, sua noiva— continuou Lucas. — Me
diga, você nunca desconfiou de nada?
Nenhuma palavra saiu da boca de Nicole. Mas a verdade era que
não, ela nunca desconfiara de coisa alguma que ligasse Carlos ao crime.
Ele jamais lhe dera motivos para que desconfiasse. Talvez, pensou ela,
porque Carlos, de jeito algum, agira ou falara como uma pessoa que
fosse envolvida com o tráfico por saber que ela nunca teria continuado
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com o namoro se lhe dissesse algo, muito menos com o noivado. Nicole
abominava qualquer tipo de falsidade e desonestidade e Carlos sabia
disso melhor do que ninguém.
— Sei que ele fez o que fez para me proteger — disse então.
— Acho que o mais correto seria dizer que ele queria proteger a si
mesmo. Tinha certeza que, se você soubesse, deixaria-o no ato. Eu,
pessoalmente, não me reocuparia muito com isso. Se você realmente
gostasse de mim, se fosse o caso, teria que me querer do jeito que sou.
— Tudo tem um limite, e aí está o meu. Eu não seria capaz de
transpô-lo, mesmo pelo amor.
— Amor? — Lucas pareceu admirado. — Você realmente o ama?
Os lábios de Nicole tornaram a se fechar por um instante.
— Amar… depois disso não sei mais se o amo — ela o fitou nos
olhos. — Nem sei por que estou falando isso para você, já que creio que
não se importa.
Lucas levantou-se e caminhou ao frigobar no canto do quarto, tirou
de dentro uma lata cerveja e abriu-a.
— Me importar? Não, na verdade não me importo, mas me
interesso em certos assuntos, principalmente os amorosos, e… Sabe o
que eu acho? Acho que Carlos ama você, de verdade. Se não fosse assim,
ele não se preocuparia em esconder o que é de você.
— O que você é? Conselheiro matrimonial?
Lucas levou a lata com o conteúdo dourado à boca e aproximou-se
de Nicole.
— Você quer saber quem realmente eu sou? — com um movimento
rápido, a mão livre do traficante voou de um lado e voltou chocando-se
com o rosto alvo da jovem refém, jogando-a no chão com o impacto do
tapa e fazendo a área golpeada imediatamente ficar avermelhada. — Sou
o homem mau. Alguém com quem não se brinca. Seu noivinho fez isso
comigo e vai se arrepender. Aliás, ele já se arrependeu, tenho certeza.
Com as mãos no rosto machucado, Nicole sentiu a face inchar.
— Por que vocês fazem isso? Como conseguem viver assim? —
perguntou, esperando outra investida.
Lucas não se moveu, mas liberou uma sinistra gargalhada.
— Viver assim como? Sendo alguém poderoso, com status? Alguém
temido e respeitado? Estou certo de que todos no mundo daria tudo
para viver do jeito que vivo.
— Você está errado — murmurou Nicole.
— Errado? Veja o seu Carlos, por exemplo! Ele não pensou duas
vezes quando essa oportunidade bateu à sua porta. Veio correndo.
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Capítulo 15
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— Depois que a matéria da Carol foi ao ar, o Sr. Edson Kruller nos
telefonou. Disse que a descrição que vocês deram dos dois suspeitos
eram idênticas a dos homens que invadiram sua casa. Pediu para que
uma equipe de reportagem lhe visitasse, pois ficara muito comovido
com o apelo feito por Silvio hoje de manhã.
— O filho da mãe sabe mesmo como fazer o povo se sentir
responsável pelo que acontece de ruim na cidade — comentou Caroline.
— É por isso que ele ganha mais do que nós três juntos —
murmurou Helena.
Axel protestou em meio ao barulho do recinto:
— Qualquer ser vivente que trabalhe, ganha três vezes mais do que
eu, meninas!
Os três riram. Helena continuou:
— Quando chegamos à residência dos Kruller, o Sr. Edson já estava
à nossa espera na varanda de sua casa muito bonita por sinal e bastante
tranqüila por encontrar-se distante da cidade.
Axel puxou um bloco de anotações e uma caneta esferográfica do
bolso do seu casaco de couro preto.
— Qual é exatamente a localização da residência dos Kruller?
— À leste de Melmar. A rodovia Zero-Meia-Cinco passa bem
próximo a ela. Foi nessa rodovia que encontraram a caminhonete do Sr.
Kruller.
Caroline permanecia em silêncio, enquanto observava o policial
rabiscando rapidamente letras quase incompreensíveis em seu
bloquinho. Ele parou e fitou o nada, em seguida, num devaneio,
perguntou:
— A rodovia Zero-Meia-Cinco não fica a onze quilômetros da
rodovia Três?
— Mais ou menos isso — pronunciou-se Caroline e Axel voltou a
rabiscar rapidamente. Ainda indagou:
— Falou que os suspeitos invadiram a casa dos Kruller e roubaram
sua caminhonete nesta madrugada?
— Foi isso mesmo o que aconteceu, segundo o Sr. Kruller.
— Conte-me como foi.
Helena Corel consultou seus papéis novamente.
— O Sr. Edson Kruller disse que foi sua esposa quem ouviu o
barulho que os dois homens estavam fazendo na sala de sua casa e
acordou-o. O Sr. Kruller pegou sua espingarda e dirigiu-se aonde os dois
suspeitos estavam.
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— Por que ele acha que eram os suspeitos em sua casa? Não
poderiam ser ladrões noturnos um pouco parecidos com os suspeitos ou
coisa parecida?
Helena negou com a cabeça.
— Não. Porque o Sr. Kruller chegou na sala e pegou-os de surpresa.
Não estavam furtando coisa alguma e sim, vejam só, dando um
telefonema.
Axel e Caroline se entreolharam curiosos.
— Telefonema? — indagou o policial. Helena confirmou.
— Estranho. Por que alguém invadiria uma casa no meio da
madrugada apenas para dar um simples telefonema? — questionou
Caroline.
Alguém deu um berro do outro lado da redação, chamando a
atenção dos três, principalmente a de Axel, que falou em seguida:
— Analisando os fatos, não acho que este tenha sido um simples
telefonema, mas sim “o telefonema”.
— Como assim? Do que você está falando? — indagou Helena
Corel.
— Se esses caras forem realmente os dois suspeitos, esse telefonema
certamente estará relacionado ao caso, e poderá responder muitas de
nossas perguntas.
— Que droga! Se pelo menos tivéssemos alguma certeza para
entrarmos em ação… — lamentou a repórter de cútis clara.
— Não será preciso termos certeza para fazermos alguma coisa —
disse Axel. — Tenho um amigo na MELMARTEL. Pedirei para que
verifique todos os números que foram discados do telefone da casa dos
Kruller hoje, assim poderemos saber os destinos dessas ligações, ou
melhor ainda, da nossa ligação.
— Que coisa fantástica! — exclamou Helena.
— Faro fino — elogiou Caroline.
Axel sorriu enrubescido.
— O que mais o Sr. Kruller lhe contou? — perguntou.
— Bem… disse que imobilizou os dois homens, pondo-os em sua
mira, mas numa fração de segundos, enquanto olhou para sua esposa, o
Sr. Kruller foi acertado por um deles e assim não pôde impedir que os
suspeitos roubassem sua caminhonete e fugissem. Contou que ainda
atirou contra eles já dentro de seu veículo, mas não chegou a atingir
nenhum dos dois, apenas sua própria caminhonete, que foi encontrada
sem combustível por dois policiais que se encaminhavam à casa dos
Kruller atendendo ao seu chamado. O veículo estava a um quilômetro e
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Sr. Salazar não se abalava com a reação de repulsa da filha. Com certeza,
o Senhor já o adiantava o que aconteceria naquela noite.
O culto começou. Houveram louvores, testemunhos, orações,
algumas palavras de entusiasmo dos fiéis. No final, a mensagem foi
pregada fluentemente pelo pastor da igreja. Por fim, o apelo foi feito.
Alan, não suportando mais a chama que ardia em seu peito, correu ao
encontro do pastor e disse querer aceitar a Jesus como seu salvador e
deixar toda a sua vida de promiscuidades para trás.
O pastor orou por Alan e por algumas outras pessoas que também
tomaram a decisão de seguir a Cristo. Ao termino da oração, Alan foi
surpreendido por Leandra que correu até ele e o abraçou. Não
acreditando no que acontecia ele chorou, mas seu choro não era de
tristeza. A alegria se multiplicou quando a pequena menina disse entre
lágrimas:
— Eu não tenho mais medo de você, porque você aceitou a Jesus e
Ele te transformou.
Aquela foi uma transformação que Alan jamais esqueceu e jamais
esquecerá.
Os braços pequeninos de Leandra ainda estavam ao redor de Alan
quando os demais membros da família de aproximaram e o abraçaram
com o mesmo entusiasmo e emoção. O sorriso nos lábios do novo
homem não se fechava e isso era-lhe algo que não conseguiria explicar.
Quando enfim Ancelmo afrouxou o abraço e o largou,
surpreendentemente uma jovem de rosto fino, olhos penetrantes e
cabelos lisos e castanhos se aproximou, pegou-lhe pela mão e de igual
modo envolveu-o num abraço apertado.
— A paz do Senhor — disse ela em tom suave. — Que Jesus o
abençoe e te faça um pescador de almas.
As lágrimas correram novamente dos olhos de Alan e aquelas
palavras ficaram gravadas no seu coração. Ao chegar em seu quarto, ao
dormir, constatou que a imagem da jovem da mesma forma ficou
marcada dentro de seu peito.
Alguns meses de visíveis mudanças se passaram e Alan enfim foi
batizado; primeiro nas águas, depois no Espírito Santo. O seu ministério
como pregador crescia a cada dia, desde então, assim como também o
seu amor pela jovem. Ele bem já sabia o seu nome e a conhecia das vezes
que ia à igreja. Melina Dários era a jovem por quem seu coração batia
mais forte.
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que aguardasse mais um instante. — Isso tem alguma coisa a ver com o
seu caso?
Axel hesitou.
— Humm… mais ou menos.
A tela do monitor mudou e Alberto observou outro relatório.
— Muito bem — Linhares passou o dedo pela tela, esquadrinhando
todas as letras e números, absorvendo as informações. Axel pôde
observar que havia horários a um canto da tela e alguns números ao
lado. Ele arriscou:
— Pode verificar para mim o telefonema dado mais ou menos das
três às quatro horas de hoje? É exatamente este que estou procurando.
Alberto Linhares regulou seus óculos no rosto e averiguou o
relatório do computador. Voltou-se para o policial com ar cético.
— Você tem certeza que esse é o horário certo?
— Tenho. A fonte que me informou isso é da maior confiança —
confirmou Axel. — Por quê?
Linhares apontou para o monitor ao declarar:
— Porque, segundo o computador, não foi dado nenhum
telefonema nesse horário. Houve um telefonema sim. O primeiro dado
hoje foi exatamente às quatro horas e quinze minutos.
Axel encontrou-se concentrado.
— Pode verificar o número?
— Claro — alguns dígitos rápidos. — 2581-1410. Mas este não é…
— É sim — interrompeu Axel com o olhar distante —, é o telefone
da central. Foi o horário em que o casal chamou a polícia.
Neste momento, um vulto apareceu atrás de Alberto e Axel. Era um
homem robusto, de feição gentil e olhos salientes.
— Já estou indo, Linhares — informou ele.
Alberto voltou-se para ele, olhando para o relógio de pulso.
— Humm… é, já está na hora — olhou para Axel. — Mas acho que
ficarei mais um pouco com o Sr. policial aqui, Hector. O compromisso
vai ter que ser adiado. Sinto muito.
Hector fez uma expressão de desapontamento.
— Está tudo bem, eu torno a marcar com elas um outro dia.
— Faça isso e eu irei da próxima vez. Agora não dá. É importante
para eu ajudar este homem aqui. — disse Alberto, apontando para Axel.
— Tudo bem, cara. Então, até mais — Hector afastou-se, deixando-
os novamente a sós.
Os dois homens voltaram-se outra vez para o computador.
— Quem é ele?
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— Hector Góes?
— Sim, quem fala?
— Meu nome não importa no momento, Sr. Góes. O que importa é
que tenho para você a oportunidade de sua vida.
Isso soara como música aos ouvidos de Hector, mas ele hesitara.
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Durante seis meses não se importava em trair Tina. Podia dar amor
às duas, pensava. Quando estava ao lado de Tina, não pensava em
Sandra, e quando se encontrava com Sandra, Tina não existia. Amor
duplo! Costumava dizer a si mesmo. Mas agora, deitado ali, estas
palavras não faziam o menor sentido. Por quê? Durante seis meses
inteiros, essa fôra sua frase predileta, e agora… nada.
Passou a mão na testa e percebeu que estava suando. Sandra
mexeu-se subitamente e ele alisou suas costas para acalmá-la — talvez
de algum sonho ruim. Ela tornou ao seu estado imóvel; ele a fitar o teto.
Respirou profundamente com um pensamento: Melhor dormir. Amanhã
nem irei mais lembrar disso. O sentimento de culpa provavelmente iria
sumir pela manhã, pensou.
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A oficina estava deserta — a não ser por estarem ali Nick Gradinno,
Carlos e Alan. Todas as atividades estavam suspensas, pelo menos
temporariamente. As máquinas de soldar não soltavam as constantes
faíscas e os martelos estavam calados, não desamassando assim, as
carrocerias avariadas. Alan achou estranho tudo aquilo, mas não ligou
muito. Não tinha mesmo nenhuma idéia de como aquele negócio
funcionava. Talvez estivesse na hora da folga, pensou. Mas então: Desde
quando o crime entra de folga?
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— Você está brincando? Quando foi que Nick Gradinno borrou nas
calças em situações como essa, meu camarada? Eu lhe digo: Nunca, meu
chapa!
— Só não quero que esta seja a primeira vez — explicou Carlos.
Caminhou até uma mesinha onde abriu uma gaveta e retirou de dentro
a algema. Prendeu-a ao seu pulso esquerdo, olhou para Alan e andou
até se postar à sua frente. Fitou seus olhos e perguntou-se no que ele
estaria pensando… ou planejando. Apontou um banco para Alan se
sentar e este compreendeu.
Carlos respirou fundo e coçou a barba por fazer.
— Muito bem — disse, sem desviar o olhar —, talvez você não
esteja entendendo o que está acontecendo, mas creio que já deve ter
pegado alguma coisa no ar. O que está prestes a acontecer talvez seja a
coisa mais perigosa que você irá presenciar. Eu digo irá, porque, como
eu já lhe disse antes, você está nisso, queira ou não e…
Alan o interrompeu:
— Eu nunca refutei isso, Carlos.
Carlos pensou por um instante.
— Está certo. A verdade é que preciso de você. A vida de uma
pessoa depende de mim e… agora de você também — houve uma pausa
e Carlos observou Alan, balançando a cabeça em compreensão.
Continuou: — Dei suas roupas de volta para que vestisse e agora você
está vendo a algema no meu pulso e deve estar se perguntando: para
quê isso? Bem, eu lhe digo. O cara com quem… iremos nos encontrar,
Vip, é um cara dos mais espertos, e se desconfiar que fomos a algum
lugar ou que falamos com alguém suspeito, ele matará… — era doloroso
pensar que isso pudesse acontecer. — … ele matará Nicole, sem pensar,
assim como mataram aquele maldito policial. Droga, isso não pode
acontecer! — levou as mãos à cabeça.
— Tenha calma, cara, vai dar tudo certo. Eu garanto — disse Nick.
— Desculpe-me, Nick, sem querer ofender, mas nem você pode me
garantir isso.
Carlos fechou os olhos e então pôde ouvir a voz de Alan:
— Não sei se lembra, Carlos, mas na caminhonete que… que
pegamos emprestado, falei, quando você me perguntou o que eu estava
fazendo lá no meio da transação, que queria ajudá-lo. Não sei se acredita
em mim, mas é isso que vou continuar fazendo: ajudando você.
Pairou um momento de silêncio. Carlos olhou para Nick, que não
teve palavras para se pronunciar. Então, com uma respiração que os dois
outros puderam ouvir, disse:
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“Do Deserto ao Oásis” é uma novela que foi inspirada nas tantas
dificuldades e tribulações que enfrentamos no dia-a-dia e que muitas
vezes pensamos que vamos perecer. Porém, por mais que pensemos que
estamos desamparados pelo Criador, Ele sempre tem um jeito de
provar-nos o contrário.
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