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ARTE E REALIDADE ENTRELAÇADAS DENTRO DE UMA NARRATIVA

CURTA DE EXCLUSÃO SOCIAL: O CONTO ANA DAVENGA DA AUTORA


CONCEIÇÃO EVARISTO (2015)

Gelza Santos Nascimento1


Jucilene Valadão Santos2
Sara Rogéria Santos Barbosa3

EIXO 4 – Interlocuções entre conhecimento e saber no campo das ciências humanas

Palavras-chave: Literatura brasileira. Gênero Conto. Narrativa trágica. Exclusão Social

1 INTRODUÇÃO
Este resumo expandido objetiva apresentar uma análise crítica dentro da perspectiva
do conto, usando como base para tal pesquisa, a Arte Poética de Aristóteles (COSTA, 1992).
Para esta busca, faremos a explanação da narrativa Ana Davenga, pertencente à obra Olhos
D’ água da autora Conceição Evaristo (2015), verificando com precisão a representação ou
reprodução (mímese) e a cartase (elemento, que por sua vez, se manifesta no leitor e não no
texto).

Sabemos que a literatura não tem compromisso com a realidade, mas a representa de
uma maneira fantástica, levando-nos a uma poderosa reflexão, pois nos possibilita uma
abertura de mente sobre assuntos de fundamental importância dentro de nossa sociedade.
Assim, o conto Ana Davenga reproduz dentro de uma obra literária o cotidiano de muitas
mulheres pobres e negras da sociedade em que vivemos, explorando a vivência e as aflições
da personagem Ana, uma mulher negra da periferia, e de outros personagens que fazem parte
do mesmo universo em que ela vive expostas, carregada de denúncias como isolamento,
violência contra a mulher, submissão, vida em periferia, exclusão social, preconceito racial e
feminicídio.

1
Graduanda em Letras Português e suas respectivas literaturas pela Faculdade São Luís de França. E-mail:
gelza.santos@sousaoluis.com.br
2
Graduanda em Letras Português e suas respectivas literaturas pela Faculdade São Luís de França. E-mail:
jucilene.valadao@sousaoluis.com.br
3
Doutoranda em Literatura e cultura pela Universidade Federal da Bahia, Mestre em Educação com ênfase na
História do Ensino de Língua pela Universidade Federal de Sergipe, Especialista em Didática e Metodologia do
Ensino Superior pela Faculdade São Luís de França e Licenciada em Letras Vernáculas pela Universidade
Federal de Sergipe. Endereço eletrônico: sararogeria@gmail.com
2- A MÍMESE DA REALIDADE REPRODUZIDA ATRAVÉS DA TRÁGÉDIA
COMTEMPORÂNEA: O CONTO

O gênero conto é a arte de contar um episódio possibilitando a análise de um


determinado aspecto e faz referência a uma narrativa breve (GOTLIB, 2004), que se
assemelha de forma relevante à tragédia, já que alguns aspectos são facilmente encontrados
dentro desse desfecho. Com base nesses critérios, iremos analisar o conto Ana Davenga, da
autora Conceição Evaristo (2015) a fim de fazer as devidas considerações. O conto narra a
história de Ana, uma mulher pobre, negra, discriminada pela sociedade e que dança para
sobreviver. A autora busca essas pessoas comuns, subalternizadas e vistas de forma
inferiorizada como protagonistas de suas obras, ao contrário da tragédia clássica que faz uso
de homens superiores para compor seu enredo (COSTA, 1992), mostrando que as tragédias
modernas não cumprem mais a estrutura da tragédia Aristotélica.

Segundo Aristóteles (apud COSTA, 1992, p.19), “[...] A tragédia, não sendo uma
composição épica, não pode apresentar, como a epopeia, vários mitos”. Ao associar com o
conto, verificamos que assim como a tragédia, ele se preocupa com um único enredo a ser
mostrado, concentrando-se apenas em uma única história. Para Aristóteles, a mímese não é a
duplicação do real, mas uma representação dele, correspondente a um processo de construção.
É notória essa constatação no texto quando Ana reproduz em Davenga um homem-menino
que a ama e a protege, ao oposto do que ele de fato representa, pois ele era conhecido como o
chefe do tráfico, um homem possessivo que outrora havia mandado matar uma mulher que se
recusou morar com ele (EVARISTO, 2016).

Com Ana, Davenga se mostra diferente. Ele reproduz nela uma figura de heroína
protetora. Assim como na tragédia, o conto de Ana Davenga segue uma ordem lógica de
fatos, podendo ser levados para fora do espaço literário e facilmente visualizado na vida real.
Nos momentos íntimos do casal, quando ele tinha o gozo-pranto, uma mistura de prazer,
satisfação, que mostra a dualidade de sentimento, fazendo Ana se sentir culpada por aquele
ato consumado, deixando claro que aliado ao prazer a personagem sentia uma dor imensa,
violenta, visceral, mas que Davenga suportava e, junto com o gozo, jorrava de seu corpo
entregue, possuído por Ana (EVARISTO, 2016). O conto assim como a tragédia tem como
objetivo causar em quem aprecia a obra literária um sentimento de pena ou temor pelo que
acontece com os personagens. A morte trágica de Ana e Davenga representa, justamente, esse
momento de catarse, o momento em que temor e terror se misturam e sentimos pesar pelas
personagens ao mesmo tempo em que não gostaríamos de estar em seu lugar. Os tiros da
polícia atravessaram aqueles corpos no dia em que Ana recebia de presente a sua primeira
festa de aniversário.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dessa forma, percebemos que Evaristo consegue dentro de uma narrativa objetiva e
curta, em que se encaixa o gênero conto, representar uma estrutura um pouco diferenciada da
tragédia, mas que seguem alguns aspectos relevantes da sociedade brasileira: a vivência de
pessoas sofridas, que enfrentam inúmeras dificuldades para sobreviver.
Por fim, salientamos que a obra literária, mesmo sem ligação com o real, representa
acontecimentos passíveis fora da ficção. Tudo isso foi percebido com a análise do conto
citado acima que segue uma sequência racional e a realidade de muitas mulheres brasileiras
que enfrentam inúmeras dificuldades para sobreviver e que são constantemente estereotipadas
e enquadradas de acordo com modelos e padrões de uma sociedade injusta e desumana, que
julga a pessoa de acordo com classe, gênero e etnia, ressaltando de forma surpreendente o
sofrimento gritante das mulheres pobres do nosso país.

REFERÊNCIAS

COSTA. Ligia Militz da. A poética de Aristóteles mimese e verossimilhança, editora África
S.A. 1992.
GOTLIB. Nadia Battela. Teoria do Conto. Coletivo Sabotagem, 2004.
EAGLETON, Terry. Teoria da Literatura: Uma introdução.
EVARISTO, Conceição. Olhos d’água. Rio de Janeiro: Pallas, 2016.

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