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1º Semestre
2019
A partir da proposta de França (2019), esse trabalho aborda os conceitos de
resistência, elaboração e reação terapêutica negativa à partir dos textos “Recordar,
repetir e elaborar” (Freud, 1914/2010), “Além do princípio do prazer” (Freud,
1920/2010), “O Eu e o Id” (Freud, 1923/2011) e “Inibição, Sintoma e Angústia” (Freud,
1926/2014). Para tanto, propomos a divisão da tarefa nos seguintes eixos:
contextualização das ideias centrais de cada texto, focalizando-se os conceitos chave
deste trabalho, e discussão de breve relato de situação clínica que ilustra o conteúdo
abordado.
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Neste momento, referimo-nos a interpretação como conceito da Hermenêutica, e não especificamente ao
conceito psicanalítico chave que abordaremos neste texto. Nos parágrafos seguintes, interpretação deve
ser tomada no sentido psicanalítico. Em momentos em que há possibilidade de confusão quanto ao termo,
será usado “interpretação psicanalítica” para discriminar os campos.
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Deste momento em diante, faremos referência ao texto como “Recordar...”
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E, em certa parte, a Strachey também.
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termo “o estatuto de conceito que lhe é justificadamente atribuído pelos autores
franceses” (p. 174). Destacam ainda que
figura abaixo:
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Figura 1 Breve esquema dos desdobramentos da teoria freudiana, entre os anos de 1895 e
1926
“Recordar...” ainda assim, traz elementos importantes a teoria, e por isso cabe o
adjetivo de um dos textos técnicos mais importantes de Freud. Por esse ângulo, cabe a
complexificação do esquecimento, sobre a qual a amnésia infantil tem sua carga
redimensionada pelas lembranças encobridoras4, nas quais “se conserva não apenas algo
essencial da vida infantil, mas verdadeiramente todo o essencial. Elas representam os
anos esquecidos da infância tão adequadamente quanto o conteúdo manifesto do sonho
representa os pensamentos oníricos” (Freud, 1914/2010). Esta descrição abre espaço
para que Freud apresente um conjunto de vivências que na época da primeira infância
foram vividas sem compreensão, cuja interpretação não desperta lembrança, já que a
compreensão ocorre a posteriori5, isto é, num contexto histórico e subjetivo posterior.
Em acréscimo, o texto destaca que é possível o analisando não recordar o que foi
esquecido e reprimido, mas sim o atuar, isto é, repete sem saber que o faz. Freud cita
por exemplo o analisando que não se recorda de ter sido rebelde diante dos pais, mas o
faz diante do analista. Queixa-se das dificuldades da vida; não se lembra da vergonha de
quaisquer dificuldades sexuais que fossem descobertas, mas tem vergonha do
tratamento psicanalítico. Então acrescenta que ao pedir para o paciente associar
livremente, ele nada diz evidenciando como resistência contra qualquer recordação, de
modo que, em tratamento, “não se livrará desta compulsão de repetição; por fim
compreendemos que este é seu modo de recordar” (pp. 200-201).
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tratamento, escolhe um objeto amoroso, toma para si uma tarefa, começa um
empreendimento. Também a participação da resistência não é difícil de
reconhecer. Quanto maior a resistência, tanto mais o recordar será
substituído pelo atuar (repetir).... Se a terapia começa sob os auspícios de
uma suave e discretamente positiva transferência, ela permite inicialmente,
como na hipnose, um aprofundar da recordação, durante o qual mesmo os
sintomas patológicos silenciam; mas se no decurso posterior a transferência
se torna hostil ou muito intensa, por isso necessitando de repressão,
imediatamente o recordar cede o lugar à atuação. A partir de então as
resistências determinam a sequência do que será repetido. É do arsenal do
passado que o doente retira as armas com que se defende do prosseguimento
da terapia, as quais temos de lhe arrancar peça por peça . (pp. 201-202,
grifos meus)
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Assim como em “Recordar...”, tomaremos o texto como “Além”.
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concepção de haveria no psiquismo uma forte tendência para o princípio do prazer, mas
também outras forças que se opõem a ela, de modo que nem sempre se corresponda à
tendência para o prazer. A primeira limitação ao princípio do prazer é o princípio da
realidade, que influenciado pelas pulsões de conservação do eu que, aliás, indica a
segunda limitação, a repressão das pulsões sexuais. Para além delas, Freud localiza nas
reações psíquicas a algumas formas de perigo externo possibilidades de reconsiderar o
antigo problema da organização referente às pulsões e os conflitos internos (Roudinesco
e Plon, 1998).
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fenômeno a um sentimento de culpa inconsciente inerente a certas estruturas
masoquistas. (p. 424)
Quando utiliza novamente o termo em 1924, em “O problema econômico do
masoquismo”, Freud o descreve como “uma das mais sérias resistências e o maior
perigo para o êxito de nossas intenções médicas ou pedagógicas” (p. 195). Novamente,
apresenta a satisfação desse sentimento de culpa inconsciente, como uma “vantagem da
doença” que não renuncia ao estado doentio o sofrimento que segue a neurose. Este é
justamente o fator que a torna valiosa para a tendência masoquista. Em outra direção, o
fenômeno retorna a ser descrito em “Análise terminável e interminável” (Freud,
1937/2018), não como redutível aos sentimentos de culpa e castigo, inerentes ao papel
do supereu e do masoquismo secundário. A reação terapêutica negativa se torna, neste
ensejo, o caráter radical da pulsão de morte.
Por último, Freud apresentará cinco tipos de resistências que provém das três
instâncias psíquicas, do Eu, do Id e do Super-eu, sendo o Eu fonte das três formas:
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na análise se manifesta de modos diferentes e bem mais nítidos, pois
consegue estabelecer uma relação com a situação analítica ou com a pessoa
do analista, assim revivescendo uma repressão que deveria ser apenas
lembrada. É também resistência do Eu, mas completamente de outra
natureza, aquela que procede do benefício da doença e que se baseia na
assimilação do sintoma ao Eu. Ela corresponde à revolta contra a renúncia a
uma satisfação ou alívio. O quarto tipo de resistência—o do Id—é o que
vimos como responsável pela necessidade da elaboração. A quinta
resistência, a do Super-eu, reconhecida por último, a mais obscura, mas nem
sempre mais fraca, parece originar-se da consciência de culpa ou
necessidade de castigo; ela desafia todo êxito, e, portanto, também a cura
pela análise. (p.101)
Referências
Freud, S. (2010). Além do Princípio do Prazer. In S. Freud, Obras Completas, 14, São
Paulo, SP: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1920);
Freud, S. (2010). Recordar, Repetir e Elaborar. In S. Freud, Obras Completas, 10, São
Paulo, SP: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1914);
Freud, S.(2014). Inibição, Sintoma e Angústia. In S. Freud, Obras Completas, 17, São
Paulo, SP: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em
1926[1925]);
Laplanche, J.; Pontalis, J.-B. (1998). Vocabulário da psicanálise. São Paulo: Martins
Fontes. (Trabalho original publicado em 1963);
Roudinesco, E. & Michel Plon (1998). Dicionário de Psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor;
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