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I. CONSCIÊNCIA E INCONSCIÊNCIA
Partindo deste ponto, Freud apresenta sua descrição do que seria a ideia
latente enquanto aquela que em determinadas condições pode voltar a tornar-se
consciente. O latente aparece, assim, como um estado do elemento psíquico, um
“capaz de tornar-se consciente”. Porém, não sendo consciente propriamente dito
(percepção imediata), mais sim uma “capaz de consciência”, seria, em um sentido
descritivo, também inconsciente.
A instância psíquica Eu, colocada por Freud como uma organização coerente
dos processos psíquicos de um sujeito, a qual a consciência se liga, seria a
responsável por controlar os processos de descarga de excitação no mundo
externo, assim como de todos os seus processos parciais. As repressões também
partiriam da instância Eu, de modo a fazer com que certas tendências psíquicas
fossem excluídas da consciência.
II. O EU E O ID
Neste tópico, o autor aprofunda mais sua investigação acerca do Eu, após ter
indicado uma parte também inconsciente na instância. Partindo da premissa de que
o Ics só pode ser conhecido quando tornado consciente, Freud se debruça sobre o
que seria “tornar algo consciente”. O autor, descreve a consciência como sendo a
superfície (percipiente) do aparelho psíquico, aparecendo como uma função deste
aparelho, um primeiro sistema topográfico/espacial desde o mundo externo. Sua
investigação parte, assim, desta superfície percipiente, colocando a cs como sendo
todas as percepções, advindas tanto de fora (percepções sensoriais) e de dentro
(sensações e sentimentos).
Deste modo, apresenta sua primeira tentativa de distinção entre uma ideia ics
e uma pcs (um pensamento), sem fazê-lo pela via de relação com a consciência.
Supões, assim, que as ideia inconsciente, seriam produzidas a partir de um material
desconhecido, enquanto nos Pcs acrescentar-se-iam ligações com representações
verbais correspondentes. Deste modo, muda-se a questão de “como algo se torna
consciente” para “Como algo se torna pré-consciente”.
Desta forma Freud nos apresenta uma nova descoberta, sendo ela: “(...) que
apenas pode tornar-se consciência aquilo que já foi percepção cs, e que, excluindo
os sentimentos, o que a partir de dentro quer tornar-se consciente deve tentar
converter-se em percepções externas. O que se torna possível mediado a traços
mnêmicos.” (FREUD, p.14 1923). Freud entende que os resíduos de memória
estariam contidos em sistemas adjacentes ao do sistema Pcp-Cs, deste modo os
seus investimentos conseguiriam prosseguir por este sistema (Pcp-Cs) partindo do
interior.
Freud coloca que a lembrança se diferencia da alucinação e da percepção
externa, de modo que, ao vivermos uma lembrança, o investimento é conservado no
sistema mnemônico, no caso da alucinação, esta não se diferenciaria da percepção,
podendo, assim, surgir quando o investimento passa inteiramente para o elemento
Pcp, e não só propaga-se a partir dos traços mnêmicos.
Ao começar a definir o Eu, Freud coloca o sistema Pcp como seu núcleo, e
além de abarcar o Pcs (que se apoia nos resíduos mnêmicos), como já colocado
acima, parte deste Eu também é inconsciente. O Eu, é colocado pelo autor
enquanto uma entidade que parte do sistema Pcp e é inicialmente pcs, e de Id
(parte da psique que se comporta como ics – o termo é usado por Groddeck e
adotado por Freud). Um sujeito é, assim, para Freud, um Id (um algo) psíquico,
inrreconhecido e inconsciente, que teria em sua superfície o Eu, este desenvolvido a
partir de seu núcleo, o sistema Pcp. Imaginando uma representação gráfica para
este aparelho psíquico, ter-se-ia o Eu sem uma separação nítida com o Id, de modo
a confluir com ele na parte interior, do mesmo modo, o reprimido concluiria com o Id,
sendo uma parte dele. O reprimido permanece separado do Eu pelas resistências
da repressão, mas por meio do Id poderia, o Eu, comunicar-se com ele.
Freud já havia tecido hipóteses sobre uma possível instância psíquica que
mais tarde chamaria de Supereu em alguns textos passados, como “Introdução ao
Narcisismo”, de 1914, e “Psicologia das massas e análise do Eu”, de 1921. Neste
capítulo, ele insiste em mencionar que tais hipóteses anteriores ainda são válidas.
Antes de propriamente apresentar o Supereu, ele inicia o texto com uma digressão,
como ele mesmo diz, ao objetivo principal de seu texto.
Essa realocação da libido, dos objetos ao Eu, envolve de certa forma uma
sublimação, pois nesse processo tem-se o abandono das metas sexuais e um
retraimento da libido ao Eu, este que poderá dar-lhe outra meta a partir disso. Isso
caracterizaria o narcisismo secundário descrito por Freud em “Introdução ao
Narcisismo”.
É importante deixar claro que Freud usa muitas vezes os dois termos sem
fazer diferenciação, o que pode causar confusão quando pensamos as funções de
cada um. O Super-eu caracteriza-se pela proibição, pelo limite. Já o Ideal de Eu é
afirmativo, representa o caminho a seguir, uma tentativa em vão de reviver as
primeiras experiências de onipotência infantil. O Eu tenta seguir a caminho do
perdido Eu Ideal, aquele que uma vez fomos enquanto “majestade, o bebê”, embora
não seja possível retornarmos a este estado. Nesse sentido, o Ideal de Eu aponta
como devemos viver, e o Super-eu julga o Eu com base nesse modelo. Algumas
referências que podem ajudar: Definições de Ideal de Eu (página 289) e Supereu
(página 643) no livro “Vocabulário da Psicanálise” de Laplanche e Pontalis.
Freud agora se volta à uma das muitas críticas feitas a psicanálise; a de não
se importar com aquilo que seria além do indivíduo; o supra pessoal, a moral, por
exemplo. Este algo que é “elevado” no ser humano, diz Freud, é justamente o Ideal
de Eu ou Supereu, que seria o representante das relações da criança com seus
pais. O Super-eu satisfaz tudo o que se espera desse algo “elevado” no homem.
Nesse sentido, a semente a partir da qual surgiriam todas as religiões estariam nele.
A comparação do Eu com seu ideal produziria esse sentimento de humildade
presente nas religiões, que se caracterizam por criarem uma figura onipotente e
inalcançável. O sentimento de culpa surge justamente quando esse Eu não é capaz
de corresponder às exigências da consciência.
O fato de haver uma mescla de ambas forças pulsionais, nos faz pensar
também numa disjunção entre elas. É por essa via que Freud irá pensar algumas
patologias como modelo de uma disjunção pulsional, como nos casos de neurose
obsessiva e nas regressões a estados anteriores do desenvolvimento da libido. A
ambivalência amor-ódio também é possível de ser pensada como representante das
pulsões. O ódio é facilmente observável como acompanhante em relações de amor,
até mesmo ele próprio pode se tornar amor, e vice-e-versa.
Voltando ao tema da dualidade pulsional, Freud diz mais uma vez como não
é fácil sustentá-la, dado a “mudez” das pulsões de morte em relação a Eros; este
daria o fragor da vida, enquanto as pulsões de destruição voltadas para o mundo
exterior seriam desviados pelo próprio Eu, por mediação de Eros. Se não fossem as
construções desenvolvidas em “Além do Princípio do Prazer” sobre os casos em
que a “compulsão a repetição” é claramente observável, e do clássico componente
sádico em Eros, teríamos uma dificuldade em manter tal concepção dualista. As
pistas dos impulsos instintuais, portanto, seriam majoritariamente de Eros.
Freud por fim analisa a satisfação do ato sexual humano pela via pulsional; o
estado de plena satisfação que o sexo propõe seria análogo a morte em alguns
animais inferiores, onde de fato a reprodução da espécie é seguida de um
aniquilamento. Nos humanos, após a “exclusão” de Eros nessa satisfação total e
absoluta do ato sexual, a pulsão de morte estaria livre de barreiras para se
manifestar e levar a cabo suas intenções. Curiosamente, há em francês um termo
que se refere ao estado de breve melancolia ou transcendência que se experiencia
após o orgasmo, chamado de la petit mort, que significa “a pequena morte”.
V. As relações de dependência do Eu
O Supereu está mais próximo ao Id, do que o Eu está do Id, dessa forma o
Supereu representa o Id para o Eu, pois o Supereu está mais embrenhado no
inconsciente do que o Eu e assim tem mais acesso ao Id. Freud exemplifica esta
relação do Supereu com o Id retomando casos em que seus pacientes pioram
depois de uma melhora significativa na análise, como se ficassem reféns de sua
própria doença. Pois parar de estar doente significa parar de sofrer, e se o paciente
não sofre o sentimento de culpa não pode encontrar satisfação, culpa esta que
talvez siga sendo o único laço do paciente com suas relações amorosas primordiais
e que tiveram de ser abandonadas.