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A erudição contemporânea e as evidências

históricas para a ressurreição de Jesus Cristo


    

SUMMARY

Depois de avaliar a erudição contemporânea acerca da historicidade da ressurreição de Jesus Cristo, o


doutor William Lane Craig afirma que "as aparições da ressurreição, o túmulo vazio e a origem da fé
cristã – todos inevitavelmente apontam para uma conclusão: a ressurreição de Jesus".

"O Homem", escreveu Loren Eisley, "é o Órfão Cósmico". Ele é, no Universo, a única criatura que
pergunta "Por quê?". Os outros animais têm instintos para guiá-los, mas o homem aprendeu a fazer
questionamentos. "Quem sou eu?", ele pergunta. "Por que estou aqui? Para onde vou?"

Desde o Iluminismo, quando o homem moderno livrou-se das algemas da religião, tem-se tentado
responder a essas questões sem fazer referência a Deus. Contudo, as respostas que vieram não foram
animadoras, mas tenebrosas e terríveis. "Você é um subproduto acidental da natureza, o resultado de
matéria mais tempo mais acaso. Não existe qualquer razão para sua existência. Tudo que você
encara é a morte. Sua vida é nada mais do que uma centelha na escuridão infinita, uma faísca que
aparece, brilha por um instante, e morre para sempre".

O homem moderno pensou que, ao despir-se de Deus, iria se libertar de tudo o que o sufocava e o
reprimia. Em vez disso, descobriu que, matando Deus, matara a si mesmo.

Ao contrário desse cenário da mensagem moderna, a tradicional esperança cristã da ressurreição


assume brilho e significado bem maiores. Conta ao homem que, apesar de tudo, ele não é órfão, e
sim a imagem pessoal do Deus Criador do Universo; a sua vida não está fadada à morte, pois através
da ressurreição escatológica ele poderá viver na presença de Deus eternamente.

Esta é uma esperança maravilhosa. Porém, é claro, esperança que não é baseada em fatos não é
esperança, mas mera ilusão. Por que deveria a esperança cristã da ressurreição escatológica soar ao
homem moderno como nada mais do que mera utopia? A resposta está na convicção cristã de que
um homem foi antecipadamente ressurreto, por Deus, de entre os mortos como o precursor e
exemplo da nossa própria ressurreição escatológica. Esse homem foi Jesus de Nazaré, e Sua
ressurreição histórica dentre os mortos constitui o fundamento factual sobre o qual a esperança cristã
é baseada.

Notadamente, durante o último século a teologia liberal fez pouco caso da ressurreição histórica de
Jesus. Uma vez que os teólogos liberais retiveram a pressuposição – que herdaram dos deístas –
contra a possibilidade de milagres, uma ressurreição histórica era, a priori, simplesmente fora de
cogitação. A explicação mitológica de D. F. Strauss capacitou-os a explicar as narrativas da
ressurreição no Novo Testamento como ficções lendárias. A crença na ressurreição histórica foi uma
ressaca vinda da antiguidade, e dela já é tempo de o homem se livrar. Assim, no principal estudo
sobre a historicidade da ressurreição a partir de uma perspectiva liberal, o livro The Historical
Evidence for the Resurrection of Jesus Christ (1907), de Kirsopp Lake, o autor cuidadosamente traça
o desenvolvimento lendário das narrativas da ressurreição, partindo do evento histórico inicial da
visita das mulheres ao túmulo errado. Lake conclui que isso não é o fim, de qualquer maneira: o que
é vital para a teologia cristã é a crença na imortalidade da alma, a crença em que os amigos e
parentes que partiram ainda estão vivos, e que, em um tempo determinado, seremos reunidos a eles.
Assim, o NT foi substituído pelo Fédon*.
A teologia liberal não pôde sobreviver à I Guerra Mundial, mas sua morte não trouxe qualquer
interesse renovado na historicidade da ressurreição de Jesus, pois as duas escolas que a sucederam
estavam unidas em sua desvalorização do que é histórico em relação a Jesus. Dessa forma, a teologia
dialética, proposta por Karl Barth, defendia a doutrina da ressurreição; porém, não teria nada a ver
com a ressurreição considerada como um evento na história. Em seu comentário ao livro de
Romanos (1919), o jovem Barth declarou: "A ressurreição toca a história como uma tangente toca
um círculo – isto é, sem realmente tocá-lo". A teologia existencial, exemplificada por Rudolf
Bultmann, era ainda mais antitética à historicidade da ressurreição de Jesus. Embora Bultmann
reconhecesse que os primeiros discípulos acreditavam na ressurreição literal e que Paulo, em I
Coríntios 15, tenta até mesmo provar a ressurreição, ele apesar de tudo pronuncia tal procedimento
como "fatal". Isso reduz a ressurreição de Cristo a um milagre na natureza análogo à ressurreição de
um defunto. E não se pode racionalmente pedir ao homem moderno que ele acredite em milagre na
natureza antes de se tornar um cristão. Portanto, os elementos miraculosos do Evangelho devem ser
demitologizados, a fim de revelar a verdadeira mensagem cristã: o chamado à existência autêntica,
em face da morte, simbolizado pela cruz. A ressurreição é meramente uma redeclaração simbólica da
mensagem da cruz e, essencialmente, nada acrescenta. Apelar à ressurreição como evidência
histórica, em semelhança ao que Paulo fez, é duplamente errado, pois é da própria natureza da fé
existencial ser um salto sem evidências. Assim, argumentar historicamente em favor da ressurreição
é contrário à fé. Claramente, então, a antipatia da teologia liberal à historicidade da ressurreição de
Jesus não foi substituída nem pela teologia dialética, nem pela existencial.
No entanto, uma mudança notável aconteceu durante a segunda metade do século XX. Os primeiros
vislumbres de mudança começaram a aparecer em 1953. Naquele ano, Ernst Käsemann, um aluno de
Bultmann, arguiu em um Colóquio na Universidade de Marburgo que o ceticismo histórico de
Bultmann com relação a Jesus era injustificado e contraproducente, e sugeriu uma reabertura da
questão de onde o que é histórico acerca de Jesus deveria ser encontrado. Uma nova busca pelo Jesus
histórico se iniciara. Três anos mais tarde, em 1956, o teólogo de Marburgo Hans Grass sujeitou a
própria ressurreição à investigação histórica, concluindo que as aparições da ressurreição não podem
ser dispensadas como meras visões subjetivas da parte dos discípulos, mas foram eventos visionários
objetivos.

Enquanto isso, o historiador eclesiástico Hans Freiherr von Campenhausen, em ensaio daquela
mesma época, defendeu a credibilidade histórica do túmulo vazio de Jesus. Durante os anos
subseqüentes, uma onda de trabalhos sobre a historicidade da ressurreição de Jesus fluiu das
imprensas de língua alemã, francesa e inglesa. Em 1968, o velho ceticismo já era uma força
desgastada e começou a recuar dramaticamente. Durante a segunda metade deste século, tão
completa foi a transformação concernente à ressurreição de Jesus que não é exagero falar de uma
reversão da erudição neste assunto, de tal maneira que aqueles que negam a historicidade da
ressurreição agora parecem ser os que ficam na defensiva. Talvez, um dos desenvolvimentos
teológicos mais significativos nesta área é o sistema teológico de Wolfhart Pannenberg, que baseia
toda sua Cristologia nas evidências históricas em favor do ministério de Jesus e, especialmente, na
ressurreição. Esse é um progresso impensável na teologia alemã anterior a 1950. Igualmente
assustadora é adeclaração de um dos principais teólogos judeus no mundo, Pinchas Lapide, que está
convencido, com base nas evidências, de que Jesus de Nazaré ressurgiu dentre os mortos. Lapide
repreende críticos do Novo Testamento como Bultmann ou Marxsen pelo ceticismo injustificado
deles, e conclui que ele acredita, baseando-se nas evidências, que o Deus de Israel ressuscitou Jesus
dentre os mortos.

Quais são os fatos que subjazem a essa notável reversão de opinião no que concerne à credibilidade
das narrativas neotestamentárias da ressurreição de Jesus? Parece-me que eles podem ser
convenientemente agrupados sob três tópicos: as aparições da ressurreição, o túmulo vazio, e a
origem da fé cristã. Observemos brevemente cada um.

Primeiramente, as aparições da ressurreição. Indubitavelmente, o principal ímpeto para a reavaliação


da tradição da aparição foi a demonstração, por Joachim Jeremias, de que em I Coríntios 15:3-5
Paulo está citando uma antiga fórmula cristã que ele recebeu e, por sua vez, passou adiante aos seus
conversos. De acordo com Gálatas 1:18, três anos após sua conversão Paulo esteve em Jerusalém
numa missão investigadora de fatos, durante a qual ele deliberou com Pedro e Tiago, por um período
de duas semanas; se não antes, ele provavelmente recebeu a fórmula nesse tempo. Visto que Paulo se
converteu em 33 A.D., isso significa que a lista de testemunhas remonta aos primeiros cinco anos
após a morte de Jesus. Assim, não é idôneo dispensar essas aparições como lendárias. Se quisermos,
podemos explicá-las como alucinações, entretanto não podemos negar que aquelas ocorreram. A
informação de Paulo torna certo que, em ocasiões distintas, vários indivíduos e grupos viram Jesus
vivo dentre os mortos. Conforme Norman Perrin, o falecido crítico neotestamentário da
Universidade de Chicago: "Quanto mais estudamos a tradição com respeito às aparições, mais firme
a rocha em cima da qual elas se baseiam começa a aparecer". Esta conclusão é virtualmente
indiscutível.

Contudo, ao mesmo tempo em que a erudição bíblica chegou a uma nova apreciação da credibilidade
histórica da informação paulina, deve-se admitir que persiste o ceticismo relacionado às tradições da
aparição nos Evangelhos. Esse ceticismo subsistente parece-me inteiramente injustificado. É baseado
na pressuposicional antipatia para com o fisicalismo das histórias de aparição no Evangelho. Mas as
tradições subjacentes àquelas aparições podem ser tão confiáveis quanto a de Paulo. Porque, a fim de
que o principal dessas histórias seja lendário, um considerável período de tempo deveria estar
disponível para a evolução e desenvolvimento das tradições até que os elementos históricos fossem
suplantados pelo anistórico. Esse fator é tipicamente negligenciado na erudição do Novo
Testamento, conforme aponta A. N. Sherwin-White em Roman Law and Roman Society in the New
Testament. O doutor Sherwin-White não é teólogo; ele é um eminente historiador dos tempos
romanos e gregos, rudimentarmente contemporâneos ao NT. De acordo com o professor Sherwin-
White, as fontes para a história romana são geralmente tendenciosas e deslocadas pelo menos uma
ou duas gerações, ou mesmo séculos, dos eventos que registram. Apesar disso, diz ele, os
historiadores reconstroem com confiança o que realmente aconteceu. Ele critica os críticos do NT
por não perceberem quão inestimáveis são as fontes que eles têm nos Evangelhos. Os escritos de
Heródoto fornecem um procedimento para avaliar a velocidade de acúmulo lendário, e o exame
mostra que mesmo duas gerações é duração de tempo muito curta para permitir que tendências
lendárias destruam o núcleo de fatos históricos. Quando Sherwin-White volta-se para os Evangelhos,
declara que, a fim de serem lendários, a velocidade de acúmulo lendário teria de ser "inacreditável";
mais gerações são necessárias. Todos os estudiosos de NT concordam que os Evangelhos foram
escritos e circularam na primeira geração, durante a vida das testemunhas oculares. Realmente, um
significativo novo movimento de erudição bíblica argumenta persuasivamente que alguns dos
Evangelhos foram escritos até 50 A.D. Isso os localiza tão cedo quanto a Carta de Paulo aos
Coríntios e, dada sua igual dependência à tradição anterior, deve-se outorgar a eles o mesmo peso de
credibilidade histórica outorgado a Paulo. É instrutivo notar, nessa relação, que nenhum evangelho
apócrifo apareceu durante o primeiro século. Estes somente surgiram após a morte da geração de
testemunhas oculares. São melhores candidatos ao ofício de "ficção lendária" do que os Evangelhos
canônicos. Dessa forma, acho que o atual ceticismo dos críticos ligado às tradições da aparição nos
Evangelhos é injustificado. A nova apreciação do valor histórico da informação paulina precisa ser
acompanhada, também, pela reavaliação das tradições do Evangelho.
Em segundo lugar, o túmulo vazio. Outrora considerado como uma ofensa para a inteligência
moderna e um embaraço à teologia cristã, o túmulo vazio de Jesus veio a assumir seu lugar entre os
fatos geralmente aceitos concernentes ao Jesus histórico. Permita-me passar em revista brevemente
algumas das evidências que envolvem essa questão.

(1) A confiabilidade histórica da história do sepultamento apóia o túmulo vazio. Se a narrativa do


sepultamento é precisa, então o local da cova de Jesus era conhecido por judeus e cristãos,
indistintamente. Neste caso, chega-se muito brevemente à inferência da historicidade do túmulo
vazio. Pois se Jesus não tivesse ressuscitado e o local do sepultamento fosse conhecido:
(a) os discípulos nunca poderiam ter acreditado na ressurreição. Para um judeu do século I, a idéia de
que um homem pudesse ser levantado dentre os mortos enquanto seu corpo permanecesse no túmulo
era, por definição, uma contradição. Nas palavras de E. E. Ellis, "é muito improvável que os cristãos
palestinos primitivos pudessem conceber alguma distinção entre ressurreição e ressurreição física
'esvaziadora de sepultura'. Para eles, uma anastasis sem uma sepultura vazia teria sido quase tão
significativa quanto um círculo quadrado".
(b) Mesmo se os discípulos tivessem crido na ressurreição, é duvidoso que eles teriam gerado
qualquer seguidor. Tão logo o corpo fosse enterrado no túmulo, um movimento cristão fundado na
crença na ressurreição do homem morto teria sido uma tolice impossível.

(c) As autoridades judaicas teriam exposto a trama inteira. A resposta mais rápida e clara à
proclamação da ressurreição de Jesus teria sido simplesmente apontar para Sua sepultura na encosta
da rocha.

Por essas três razões, a exatidão da história do sepultamento apóia a historicidade do túmulo vazio.
Infelizmente àqueles que desejam, contudo, negar o túmulo vazio, a história do sepultamento é uma
das tradições históricas mais certas que temos a respeito de Jesus. Vários fatores envolvem esse
julgamento. Mencionando apenas alguns:

(i) O sepultamento é mencionado na terceira linha da antiga fórmula cristã citada por Paulo em I Co.
15.4.
(ii) É parte da antiga e pré-marcana história da Paixão usada por Marcos como fonte de seu
Evangelho.
(iii) Falta à própria história qualquer traço de desenvolvimento lendário.
(iv) A história adequa-se às evidências arqueológicas que dizem respeito aos tipos e à localização de
túmulos existentes nos dias de Jesus.
(v) Não existem outras tradições de sepultamento concorrentes.
Por essas e outras razões, a maioria dos estudiosos está unida no julgamento de que a história do
sepultamento é fundamentalmente histórica. Mas, se este é o caso, então, como expliquei, a
inferência de que o túmulo foi achado vazio não fica muito longe de ser alcançada.

(2) O testemunho de Paulo apóia o fato do túmulo vazio. Aqui, dois aspectos das evidências de
Paulo podem ser mencionados.
(a) Na fórmula citada por Paulo, a expressão "ressurgiu", seguinte à frase "foi sepultado", implica o
túmulo vazio. Um judeu do século I não poderia pensar o contrário. Como E. L. Bode observa, a
noção da ocorrência de uma ressurreição espiritual enquanto o corpo permaneceu no túmulo é uma
peculiaridade da teologia moderna. Para os judeus, eram os restos do homem no túmulo que
ressuscitavam; portanto, eles cuidadosamente preservavam os ossos dos mortos em ossuários até a
ressurreição escatológica. Não pode haver dúvida de que tanto Paulo quanto a fórmula cristã
primitiva que ele cita pressupõem a existência do túmulo vazio.

(b) A frase "ao terceiro dia" provavelmente aponta para a descoberta do túmulo vazio. Resumindo
muito brevemente, a questão é: uma vez que ninguém realmente testemunhou a ressurreição de
Jesus, como os cristãos vieram a datá-la no "terceiro dia"? A resposta mais provável é que eles assim
fizeram porque esse foi o dia do descobrimento do túmulo vazio pelas seguidoras de Jesus. Portanto,
a própria ressurreição veio a ser datada naquele dia. Assim, na antiga formula cristã citada por Paulo,
temos evidência extremamente primitiva para a existência do túmulo vazio de Jesus.

(3) A história do túmulo vazio é parte da história pré-marcana da Paixão e, portanto, é muito
antiga. A história do túmulo vazio foi provavelmente o fim da fonte da Paixão de Marcos. Como
Marcos é o mais primitivo dos nossos Evangelhos, essa fonte é, pois, por si só bastante velha. Na
verdade, o comentador R. Pesch afirma que é uma fonte incrivelmente primitiva. Ele produz duas
linhas de evidência para essa conclusão:
(a) A narrativa paulina da Última Ceia em I Co. 11.23-25 pressupõe a narrativa marcana. Visto que
as próprias tradições de Paulo são por si só muito antigas, a fonte marcana deve ser mais antiga
ainda.

(b) A história pré-marcana da Paixão nunca se refere por nome ao sumo sacerdote. É como quando
digo que "o Presidente está recepcionando um jantar na Casa Branca", e todos sabem de quem estou
falando, porque é a pessoa atualmente no cargo. Similarmente, a história pré-marcana da Paixão
refere-se ao "sumo sacerdote" como se ele ainda estivesse no poder. Uma vez que Caifás exerceu seu
cargo de 18 a 37 A.D., quer dizer, na última das hipóteses, que a fonte pré-marcana deve advir de
dentro do período de sete anos após a morte de Jesus. Logo, essa fonte remonta aos primeiros poucos
anos da comunidade de Jerusalém e é, assim, uma antiga e confiável fonte de informação histórica.

(4) A história é simples e falta-lhe desenvolvimento lendário. A história do túmulo vazio não é
colorida por motivos teológicos e apologéticos que seriam característicos de narrativas lendárias
tardias. Talvez, o jeito mais vigoroso de apreciar este ponto é compará8 la com as narrativas sobre o
túmulo vazio achadas nos evangelhos apócrifos do século II. Por exemplo, no Evangelho de Pedro,
uma voz ressoa do céu durante a noite, a pedra rola sozinha da porta do túmulo, no qual entram dois
homens que descem do céu. Depois, vêem-se três homens saindo do túmulo, dois apoiando o
terceiro. As cabeças dos dois homens esticam-se até as nuvens, mas a cabeça do terceiro ultrapassa
as nuvens. Então, uma cruz sai do túmulo e uma voz pergunta: "Pregaste aos que dormem?". E a
cruz responde: "Sim". Na Ascensão de Isaías, Jesus sai do túmulo sentado sobre os ombros dos anjos
Miguel e Gabriel. É com isso que as lendas autênticas se parecem: diferentemente dos relatos do
Evangelho, são coloridas por adornos teológicos.
(5) Provavelmente, foram mulheres que descobriram que o túmulo estava vazio. A fim de entender
este ponto, deve-se recordar dois fatos acerca do papel das mulheres na sociedade judaica.
(a) A mulher ocupava um degrau baixo na escada social judaica. Isso é evidente em tais expressões
rabínicas: "Melhor é que as palavras da Lei sejam queimadas do que entregues a mulheres" e "Bem-
aventurado aquele cujos filhos são homens, mas ai daquele cujos filhos são mulheres".

(b) O testemunho de mulheres era considerado tão indigno que não lhes era sequer permitido servir
como testemunhas legais numa corte legal. À luz desses fatos, quão notável parece as mulheres
terem sido as descobridoras do túmulo vazio de Jesus. O fato de que mulheres – cujo testemunho era
sem valor –, em vez de homens, são as principais testemunhas ao túmulo vazio é mais
plausivelmente explicado porque, goste ou não, elas foram as descobridoras do túmulo vazio, e os
Evangelhos registram isso com precisão.

(6) A polêmica judaica inicial pressupõe o túmulo vazio. Em Mateus 28, encontramos a tentativa
cristã de refutar a polêmica judaica inicial contra a ressurreição. Aquela polêmica asseverava que os
discípulos roubaram o corpo. Os cristãos responderam a isso recontando a história dos guardas do
túmulo, e a polêmica, por sua vez, sustentava que os guardas adormeceram. Nessas circunstâncias, a
característica digna de nota em toda essa disputa não é a historicidade dos guardas; porém, em vez
disso, a pressuposição de ambos os partidos segundo a qual o corpo estava desaparecido. A resposta
judaica inicial à proclamação da ressurreição foi uma tentativa de justificar o túmulo vazio. Assim, a
evidência dos adversários dos discípulos providencia evidência em apoio ao túmulo vazio.
Poder-se-ia prosseguir, mas talvez já foi dito o bastante para indicar por que o julgamento da
erudição reverteu-se quanto à historicidade do túmulo vazio. De acordo comJakob Kremer, "de
longe, a maioria dos exegetas apegam-se firmemente à confiabilidade das declarações bíblicas
relacionadas ao túmulo vazio", e fornece uma lista – à qual seu próprio nome pode ser acrescentado
– de vinte e oito estudiosos proeminentes que apóiam o que disse. Posso pensar em pelo menos mais
dezesseis nomes que ele falhou em mencionar. Dessa maneira, hoje se reconhece amplamente que o
túmulo vazio de Jesus é um simples fato histórico. Conforme D. H. van Daalen apontou, "é
extremamente difícil objetar, com bases históricas, ao túmulo vazio; aqueles que o negam, assim o
fazem baseando-se em suposições teológicas ou filosóficas". Mas suposições podem simplesmente
ter de mudar à luz de fatos históricos.

Finalmente, podemos voltar-nos para um terceiro conjunto de evidências em apoio à ressurreição: a


própria origem do Caminho cristão. Mesmo os estudiosos mais céticos admitem que os primeiros
discípulos pelos menos acreditavam que Jesus ressuscitara dentre os mortos. Deveras, eles
depositavam nisso praticamente tudo. Sem a crença na ressurreição de Jesus, o Cristianismo poderia
nunca ter vindo à existência. A crucificação teria permanecido como a tragédia final na
desafortunada vida de Jesus. A origem do Cristianismo depende da crença desses primeiros
discípulos em que Jesus ressuscitara dentre os mortos. Sendo assim, a pergunta inevitavelmente
surge: como se explica a origem dessa crença? Conforme R. H. Fuller insiste, mesmo os críticos
mais céticos postulam algum X misterioso que fez o movimento andar. Permanece a questão: o que
era aquele X?

Se alguém nega que Jesus realmente ressuscitou dentre os mortos, então deve explicar, seja em
termos de influências judaicas ou em termos de influências cristãs, a crença dos discípulos em que
ele ressuscitou de fato. Obviamente, não pode ser o resultado de influências cristãs, pois naquele
tempo ainda não existia Cristianismo algum. Uma vez que a crença na ressurreição de Jesus foi o
fundamento da origem da fé cristã, não pode ser um resultado daquela fé.
No entanto, não se pode também explicar a crença na ressurreição como um resultado de influências
judaicas. No Antigo Testamento, a crença judaica na ressurreição dos mortos no dia do julgamento é
mencionada em três lugares (Ezequiel 37; Isaías 26.19; Daniel 12.2). Durante o tempo entre o
Antigo e o Novo Testamento, a crença na ressurreição floresceu e é freqüentemente mencionada na
literatura judaica daquele período. Nos dias de Jesus, o partido judaico dos fariseus apegava-se à
crença na ressurreição, e Jesus colocou-se ao lado deles nesse aspecto, em oposição ao partido dos
saduceus. Assim, a idéia de ressurreição não era, por si só, nada nova.

A concepção judaica de ressurreição, porém, diferia da ressurreição de Jesus em dois aspectos


importantes e fundamentais. No pensamento judaico, a ressurreição sempre (1) ocorreria após o fim
do mundo, não dentro da história, e (2) diria respeito a todas as pessoas, não apenas um indivíduo,
isoladamente. Em contradistinção a isso, a ressurreição de Jesus foi tanto dentro da história quanto
de uma pessoa individualmente.
No que diz respeito ao primeiro ponto, a crença judaica era sempre que, no fim da história, Deus
ressuscitaria os justos mortos e os receberia em Seu Reino. Para ficar claro, há no Antigo
Testamento exemplos de ressuscitações [resuscitations] dos mortos; mas essas pessoas morreriam
novamente. A ressurreição [resurrection] à vida e glória eterna ocorreria após o fim do mundo.
Encontramos essa visão judaica nos próprios Evangelhos. Dessa forma, quando Jesus assegurou a
Marta que Lázaro, irmão dela, seria levantado de novo, ela respondeu: "Eu sei que ressurgirá na
ressurreição, no último dia" (João 11.24). Ela não fazia idéia de que Jesus estava prestes a trazê-lo de
volta à vida. Similarmente, quando Jesus contou a Seus discípulos que ressurgiria dentre os mortos,
eles pensaram que Ele quis dizer no fim do mundo (Marcos 9.9-13). A idéia de que uma verdadeira
ressurreição poderia ocorrer antes de Deus trazer o Reino do Céu no fim do mundo lhes era
totalmente estranha. O grandemente renomado estudioso alemão Joachim Jeremias escreve:
O Judaísmo antigo não conhecia uma ressurreição antecipada como um evento da história. Em lugar
algum, encontra-se na literatura qualquer coisa comparável à ressurreição de Jesus. Certamente,
ressurreições dos mortos eram conhecidas, mas estas sempre diziam respeito a ressuscitações
[resuscitations], o retorno à vida terrena. Em nenhum lugar, na literatura judaica tardia, isso diz
respeito a uma ressurreição [resurrection] à doxa (glória) como um evento da história.
Os discípulos, portanto, confrontados com a crucificação e morte de Jesus, teriam apenas esperado
ansiosamente pela ressurreição no último dia e provavelmente mantido cuidadosamente o túmulo de
seu mestre como um relicário, onde seus ossos poderiam residir até a ressurreição. Não lhes viria à
tona a idéia de que ele já ressurgira.

Quanto ao segundo ponto, a idéia judaica de ressurreição sempre era de uma ressurreição geral dos
mortos, não de um indivíduo, isoladamente. Era o povo, ou a humanidade como um todo, que Deus
levantaria na ressurreição. Mas na ressurreição de Jesus, Deus levantou um único homem. Além do
mais, não havia qualquer concepção de ressurreição de pessoas de alguma maneira dependente da
ressurreição do Messias. Isso era totalmente desconhecido. Apesar de tudo, diz-se que foi
precisamente o que ocorreu no caso de Jesus. Ulrich Wilckens, outro proeminente crítico do Novo
Testamento, explica:

Pois em lugar algum os textos judaicos falam da ressurreição de um indivíduo já ocorrida antes da
ressurreição dos justos no fim dos tempos e diferenciada e separada desta; em lugar algum a
participação dos justos na salvação ao findar do tempo depende que eles pertençam ao Messias, que
ressurgira adiantadamente como as primícias dos que Deus ressurgirá (I Coríntios 15.20).

É, pois, evidente que não viria à mente dos discípulos, como resultado das influências ou cenário
judaicos, a idéia de que somente Jesus ressurgira dentre os mortos. Eles com ansiedade esperariam
por aquele dia, quando Ele e todos os justos de Israel seriam por Deus ressurretos à glória.

A crença dos discípulos na ressurreição, portanto, não pode ser explanada como o resultado de
influências cristãs ou judaicas. Abandonados a si mesmos, os discípulos jamais pensariam numa
idéia tal qual a ressurreição de Jesus. E lembre-se: eles eram pescadores e cobradores de impostos,
não teólogos. O X misterioso ainda está faltando. De acordo com C. F. D. Moule, da Universidade
de Cambridge, aqui está uma crença que em nada pode ser devida a influências históricas prévias.
Ele aponta que temos uma situação em que um grande número de pessoas apegou-se firmemente a
essa crença, que não pode ser explicada em termos do Antigo Testamento ou dos fariseus, e tais
pessoas sustentaram sua crença até que os judeus finalmente os rejeitaram da sinagoga. Segundo o
professor Moule, a origem dessa crença deve ter sido o fato de que Jesus realmente ressurgiu dentre
os mortos:

Se o surgimento dos nazarenos, um fenômeno inegavelmente atestado pelo Novo Testamento, cria
um grande buraco na história, um buraco do tamanho e forma da Ressurreição, o que o historiador
secular propõe para pôr um fim a isso? ... o nascimento e rápido auge da Igreja Cristã... permanecem
um enigma insolúvel para qualquer historiador que se recusa a tomar seriamente a única
explicação oferecida pela própria igreja.
A ressurreição de Jesus é, assim, a melhor explicação para a origem da fé cristã. Tomados em
conjunto, esses três grandes fatos históricos – as aparições da ressurreição, o túmulo vazio, a origem
da fé cristã – parecem apontar para a ressurreição de Jesus como a explicação mais plausível.

Entretanto, é claro, têm existido outras explanações proferidas para darem conta das aparições da
ressurreição, do túmulo vazio e da origem da fé cristã. No julgamento da erudição moderna,
contudo, elas têm falhado em prover uma exposição dos fatos do caso. Isso se pode ver por uma
rápida análise às principais explicações que se têm oferecido.

A. Os discípulos roubaram o cadáver de Jesus e mentiram sobre as aparições da ressurreição. Esta


explicação caracterizou a polêmica judaica anticristã inicial e foi reavivada na forma da teoria da
conspiração no deísmo do século XVIII. A teoria tem sido universalmente rejeitada por estudiosos
críticos e sobrevive apenas na imprensa popular. Designando duas considerações decisivas contra
isso: (i) é moralmente impossível indiciar os discípulos de Jesus por tal crime. Quaisquer que fossem
as imperfeições deles, eles eram certamente homem e mulheres bons e sérios, não impostores.
Ninguém que sem preconceitos lê o Novo Testamento pode duvidar da sinceridade evidente
daqueles primeiros crentes. (ii) É psicologicamente impossível atribuir aos discípulos o astucioso
[artifício] requisitado para esse ardil. No momento da crucificação, os discípulos estavam confusos,
desorganizados, temerosos, duvidosos e sobrecarregados com pranto – e não mentalmente motivados
ou equipados para engendrar tamanha brincadeira. Portanto, explicar o túmulo vazio e as aparições
da ressurreição através de uma teoria da conspiração parece fora de cogitação.
B. Jesus não morreu na cruz, mas foi dela retirado e colocado vivo no túmulo, onde reviveu e de
onde escapou para convencer os discípulos que Ele ressurgira dentre os mortos. Essa teoria da morte
aparente foi defendida pelos racionalistas alemães dos fins do século XVIII e começo do século
XIX, sendo adotada até mesmo pelo pai da teologia moderna, F. D. E. Schleiermacher. Hoje,
contudo, a teoria foi inteiramente abandonada: (i) seria virtualmente impossível, medicamente, Jesus
sobreviver aos rigores da tortura e crucificação, muito menos não ter morrido exposto no
túmulo. (ii) A teoria é religiosamente inadequada, visto que um Jesus quase morto, precisando
desesperadamente de cuidados médicos, não teria provocado nos discípulos adoração a Ele como o
exaltado Senhor Ressurreto e Conquistador da Morte. Além do mais, uma vez que Jesus, nessa
hipótese, sabia que realmente não triunfara sobre a morte, a teoria o reduz à vida de um charlatão
que trapaceou os discípulos ao fazê-los acreditar que Ele ressurgira – o que é um absurdo. Com
apenas essas razões torna-se indefensável a teoria da morte aparente.
C. Os discípulos projetaram alucinações de Jesus após Sua morte, das quais eles enganosamente
inferiram Sua ressurreição. A teoria da alucinação tornou-se popular durante o século XIX e
prosseguiu até a primeira metade do século XX, também. Novamente, porém, existem bons
fundamentos para rejeitar essa hipótese: (i) é psicologicamente implausível postular tal cadeia de
alucinações. Alucinações são geralmente associadas a doenças mentais ou drogas; mas no caso dos
discípulos, parece faltar a preparação psicobiológica prévia. Os discípulos não anteciparam a visão
de Jesus novamente vivo; tudo que eles poderiam fazer era esperar para serem reunidos com Ele no
Reino de Deus. Não havia fundamentos que os conduzissem a aluciná-lo como vivo dentre os
mortos. Além disso, a freqüência e variedade de circunstâncias desmentem a teoria da alucinação:
Jesus não foi visto uma, mas várias vezes; não por uma pessoa, mas por diversas; não apenas por
crentes, mas por céticos e incrédulos também. A teoria da alucinação não pode plausivelmente ser
estendida a fim de acomodar tal diversidade. (ii) Alucinações não teriam, em caso algum, levado à
crença na ressurreição de Jesus. Como projeções da mente de alguém, alucinações não podem conter
qualquer coisa que não está na mente ainda. Mas vimos que a ressurreição de Jesus diferia da
concepção judaica de duas maneiras fundamentais. Dada sua estrutura judaica de pensamento, os
discípulos, se fossem ficar alucinados, teriam projetado visões de Jesus glorificado no seio de
Abraão, local em que os justos mortos de Israel habitam até a ressurreição escatológica. Assim,
alucinações não teriam causado crença na ressurreição de Jesus, uma idéia que solidamente batia de
frente com o modo judaico de pensamento. (iii) Alucinações também não podem abranger todo o
escopo das evidências. São oferecidas como uma explicação às aparições da ressurreição, mas
deixam inexplicado o túmulo vazio, falhando assim como uma resposta completa e satisfatória.
Portanto, parece que a hipótese da alucinação não é mais bem-sucedida do que seus defuntos
ancestrais em prover uma plausível contraexplicação às informações que cercam a ressurreição de
Cristo.
Logo, nenhuma das contraexplicações anteriores pode dar conta das evidências assim como o faz a
própria ressurreição. Alguém pode perguntar: "Bem, então como os céticos explicam os fatos das
aparições da ressurreição, o túmulo vazio e a origem da fé cristã?". O fato da questão é:
eles não explicam. A erudição moderna não reconhece qualquer alternativa explicativa à
ressurreição. Aqueles que se recusam a aceitar a ressurreição como um fato da história são simples e
conscientemente deixados sem uma explanação.
Estes três fatos – as aparições da ressurreição, o túmulo vazio e a origem da fé cristã – todos
inevitavelmente apontam para uma conclusão: a ressurreição de Jesus. Hoje, o homem racional pode
dificilmente ser censurado se acreditar que naquela manhã da primeira Páscoa um milagre divino
aconteceu.

* Diálogo platônico que trata da imortalidade da alma. (N. do T.)

© William Lane Craig

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