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PORTO
DIABETES MELLITUS
FISIOPATOLOGIA
A diabetes mellitus é uma doença que possui mais de uma causa e, por isso,
costuma ser classificada entre tipo I e tipo II, de acordo com a sua
fisiopatologia.
A diabetes mellitus tipo I é hereditária e está relacionada com a destruição das
células beta pancreáticas. Tais células são responsáveis pela produção da
insulina, hormônio que se ligam aos receptores celulares de insulina e
possibilitam a absorção da glicose por parte das células. Dessa forma, uma vez
ausentes as células beta pancreáticas, a produção de insulina se encontra
deficiente ou inexistente, a absorção celular de glicose é prejudicada e ocorre
aumento nos níveis plasmáticos de glicemia (hiperglicemia).
Em contrapartida, o tipo II é desencadeado, primeiramente, por resistência à
insulina adquirida ao longo da vida, podendo haver pré-disposição genética,
seguida pela deficiência de secreção de insulina. A resistência se deve à
diminuição de receptores de insulina na superfície das células, decorrente de
grande exposição crônica a grandes concentrações de glicose.
QUADRO CLÍNICO
O quadro clínico da diabetes mellitus também varia de acordo com sua
classificação, sendo o principal ponto em comum a hiperglicemia.
Na diabetes mellitus tipo I, é comum a ocorrência em pacientes jovens (em
adultos, se chama diabetes autoimune latente do adulto, ou LADA, na sigla em
inglês), magros, com maior tendência a cetoacidose, de evolução exuberante e
com altos títulos de autoanticorpos contra antígenos das células beta. Além
disso, é notória a ocorrência de poliúria, polifagia, polifagia e perda de peso
(conhecidos como 4 Ps).
A manifestações clínica da DM II são lentas, insidiosa, oligossintomática ou até
assintomática. Estima-se que leva cerca de 8 anos desde o início da
resistência insulínica até o diagnóstico. Inicialmente pode haver, ainda,
hiperinsulinemia como forma compensatória.
FATORES DE RISCO
Genético
Envelhecimento (DM tipo II)
Ingestão calórica
Dieta rica em gorduras
Obesidade
Sedentarismo
Baixo peso ao nascer
DIAGNÓSTICO
Pode-se chegar ao diagnóstico por meio de parâmetros laboratoriais aliados ao
quadro clínico apresentado pelo paciente. Tais parâmetros são apresentados
pela tabela a seguir:
Além disso, o diagnóstico de DM tipo I pode ser sugerido por início abrupto,
hiperglicemia severa, insulinopenia severa e peptídio c de jejum < 0,7 ng/ml
TRATAMENTO
Metas para Hb1ac:
Em torno de 7% na maioria dos adultos
Em torno de 7,5-8,5% em idosos dependendo do estado de saúde
Individualização das metas de hemoglobina glicada:
Idoso fragilizado: 7,5% - 8%
Adulto hígido 6% - 6,5%
< 18 anos: 7% - 7,5%
Metas para glicemia de jejum e pré-prandial:
Metas terapêuticas <100 mg/dL
Níveis toleráveis <130 mg/dL
Metas para glicemia pós-prandial:
Metas terapêuticas <160 mg/dL
Níveis toleráveis <180 mg/dL
MEV
Educação alimentar, perda de peso (5-10%) se sobrepeso ou obesidade. Além
de controlar fatores de risco cardiovascular como hipertensão arterial,
dislipidemia, cessação de tabagismo e redução do consumo de álcool por
alterar os valores glicêmicos e do triglicérides. A prática regular de exercício
físico é de fundamental importância para o controle das taxas glicêmicas com
pelo menos 30 minutos diários por 5 dias.
TRATAMENTO MEDICAMENTOSO:
1. SECRETAGOGOS DE INSULINA
Sulfonilureias:
Ação longa
Potente (reduz 1,5 a 2 pontos de A1c)
Baixo custo
Risco de hipocalemia e ganho de peso
Glibenclamida e clorpropamida
1-2x/dia
30 minutos antes do café e do jantar
Paciente com menos de 5 a 10 anos de DM
Peso normal ou discretamente aumentado
Efeitos adversos: hipoglicemia (mais comum), ganho de peso (2 a 4kg),
dermatite (síndrome de Steve-Johnson), hepatotoxicidade,
trombocitopenia
Contraindicações: DM 1, gravidez, insuficiência hepática e IR
Glinidas:
Ação curta
Custo mais elevado
Usados para controle da glicemia pós-prandial
Repaglinida e nateglinida
1-3x/dia
15 minutos antes das refeições
2. SENSIBILIZADORES DA INSULINA:
Aumentam a ação biológica da insulina nos seus tecidos-alvo
Biguanidas (metformina) e tiazolidinedionas (pioglitazona)
Metfomina:
Primeira opção de antidiabético
Deve ser iniciada em TODOS os DM 2 (se não houver
contraindicação)
NÃO causa hipoglicemia se usada isoladamente
Evitar uso no pré e pós operatório e submetidos a exames de
imagem de contraste
Pode perder 2 a 3kg nos primeiros 6 meses
Reduz níveis de triglicérides (10-15%)
Diminuição significativa de IAM e morte em obesos com DM2
Evita a progressão de intolerância à glicose para DM2
Reduz esteatose hepática não alcoólica
Reduz risco de neoplasias
Liberação simples: 500, 850 e 1000mg. Inicia com meio ou um
comprimido de 500 ou 850mg após o almoço e em 1 a 2 semanas
aumenta para 1 comprimido no almoço e 1 no jantar e, se
necessário, após o café. Dose máxima tolerada é de 3g/dia.
Liberação prolongada (XR): 500, 750 e 1000mg. 1 ou 2
comprimidos, DU diária (no jantar) e, se necessário, aumenta
para 3 ou comprimidos em DU diária (no jantar). Dose máxima
tolerada 2g/dia.
Potência igual a sulfonilureias: reduz GJ em 60 a 70mg/dL, a A1c
em 1,5 a 2%. Eficácia máxima em torno da 2ª dose/dia.
Efeitos adversos: náuseas, vômitos, diarreia, gosto metálico,
flatulência e acidose lática (mais temido pela alta mortalidade).
Pioglitazona:
Ação preferencial no músculo esquelético
Não causa hipoglicemia
DU diária (15, 30, 45mg)
Sem necessidade de associar às refeições
Eficácia: reduz GJ em 50mg/dL e A1c em 0,5 a 1,4%. Reduz
glicemia em 6 a 8 semanas e atinge o máximo de redução em
12 semanas
Aumenta HDL 5-10% e reduz ácidos graxos em 20-30%
Efeitos colaterais: edema, descompensação de ICC, aumenta
risco de fraturas
Contraindicação: DM1, doença hepática em atividade e
gestação
3. INIBIDORES DA ALFAGLICOSIDADE:
Retarda digestão e absorção de carboidratos no intestino delgado
Arcabose (50 ou 100mg)
Antes das refeições
Efeitos colaterais: flautulências, diarreia
4. INCRETINOMIMÉTICOS:
Aumenta a secreção de insulina e reduz a secreção de glucagon
em resposta às refeições (efeito incretina)
Agonistas de GLP-1:
Drogas injetáveis (SC) que melhoram a glicemia pós-
prandial, não causam hipoglicemia e se ajudam a perder
peso. Usadas antes das refeições.
Ligam-se aos receptores endógenos para GLP-1 e
potencializam efeito incretínico, provocando o aumento da
produção de insulina
Exenatida, liraglutida, lixisenatida e dulaglutida (dose
SEMANAL em qualquer horário)
Vantagens: obesos diabéticos (redução do peso 1,6-8kg).
Liraglutida na dose de 3mg/dia foi aprovada para
obesidade
Potência maior que os inibidores de DPP-IV: reduz GJ de
10-25mg/dL, glicemia pós-prandial 60-140mg/dL e A1c 0,8-
1,5%
Efeitos colaterais: náusea, perda de apetite, desconforto
intestinal, pirose e cefaleia
Contraindicações: DM1, cetoacidose diabética,
insuficiência hepática grave, distúrbios gastrointestinal leve
(gastroparesia), insuficiência renal grave (exenatida),
história pessoal ou familiar de carcinoma medular de
tireoide ou neoplasia endócrina múltipla tipo 2
5. INIBIDORES DE SGLT2:
Classe mais recente
Aumenta a excreção urinária de glicose
Dapaglifozina cp 10mg DU, empaglifozina 10 ou 25mg DU e
canaglifozina 100 ou 300mg DU
Vantagens: discreta perda de peso, redução de pressão
arterial e prevenção de mortalidade cardiovascular
Eficácia: reduz GJ 20-30mg/dL e A1c 0,5-1%
Não provoca hipoglicemia
Efeitos colaterais: infecções genitais (candidíase), piora da
TFG nas primeiras semanas devido ao efeito diurético
Contraindicação: IR grave, DM 1, gestação e crianças
6. INSULINA:
Estimula a captação de glicose pelos tecidos e bloqueiam a secreção
de glicose pelo fígado
Insulina humanas: NPH, regular
Análagos de insulina: glargina, detemir, degludeca, lispro, asparte,
glulisina
- Cetoacidose diabética
- Nefropatia diabética
A nefropatia diabética (ND) é uma complicação crônica do diabetes que afeta
20% a 30% das pessoas com diabetes mellitus tipo 1 (DM1) ou DM2 (6), sendo
responsável por aproximadamente metade dos novos casos de insuficiência
renal nos indivíduos em diálise e tendo sido associada a um aumento
significativo da mortalidade, principalmente cardiovascular. A presença de
pequenas quantidades de albumina na urina representa o estágio inicial da
nefropatia diabética (microalbuminúria ou nefropatia incipiente). O
comprometimento glomerular no DM inicia-se, geralmente, cinco a 10 anos
depois da evolução do diabetes, apresentando um aumento de incidência após
15 anos de doença.
Nos anos 80, entretanto, estudos demonstraram que pequenas quantidades de
albumina na urina, geralmente não detectadas pelos métodos convencionais,
eram preditivas de proteinúria no DM1 e DM2.
A partir daí a ND classifica-se em estágios baseados na excreção urinária de
albumina (EUA): microalbuminúria ou fase de nefropatia incipiente com EUA
entre 30-300mg/24h ou 20-200mg/min; microalbuminúria, apesar de ser
considerada um fator de risco para macroalbuminúria, não ocorre em todos os
casos, podendo inclusive regredir para normoalbuminúria.
Alguns indivíduos, apesar do controle glicêmico inadequado, não desenvolvem
nefropatia diabética nos primeiros 10 a 15 anos da doença, estando
aparentemente protegidos dessa complicação. Por isso, acredita-se que haja
um fator genético predisponente, além dos fatores de risco habituais, como
hiperglicemia, hipertensão arterial, dislipidemia e tabagismo, que contribuem
para a ND.
A insuficiência renal crônica, levando à fase renal terminal (end stage renal
disease — ESRD), causada por alterações estruturais em nível renal,
inicialmente evidenciadas por acúmulo gradual e progressivo da matriz
extracelular na membrana basal e mesângio glomerular. Mais tarde, a
formação de nódulos mesangiais representa a lesão característica da
nefropatia de Kimmestiel-Wilson, com extensas lesões adicionais túbulo-
intersticiais.
No entanto, a prevalência de microalbuminúria antes dos cinco anos de
diagnóstico nesse grupo pode chegar a 18%, principalmente em pessoas com
controle glicêmico inadequado, dislipidemia e hipertensão arterial sistêmica.
- Retinopatia diabética
A retinopatia diabética (RD) é a principal causa de novos casos de cegueira
entre 20 e 74 anos. É mais comum no DM1 e sua incidência está fortemente
relacionada à duração do diabetes. Está presente em aproximadamente 25%
dos indivíduos com DM1 após cinco anos do diagnóstico, aumentando para
60%, 80% e 100% após, respectivamente, 10, 15 e 20 anos. Entretanto, as
alterações retinianas são raras antes da puberdade, independentemente do
tempo de duração do diabetes. No DM2 a RD já está presente em 21% dos
indivíduos recém-diagnosticados e pode atingir 60% dos pacientes após 20
anos de doença. O controle glicêmico intensivo pode postergar a RD, tanto
naqueles com DM1 como com DM2. No entanto, é importante salientar que
alguns podem desenvolver RD mesmo com bom controle glicêmico, e outros
com controle glicêmico inadequado estão protegidos dessa complicação. Pode-
se classificar a RD em retinopatia não proliferativa (RDNP) e proliferativa
(RDP).
A retinopatia diabética não proliferativa pode ser classificada em leve,
moderada ou grave e caracteriza-se pela presença de microaneurismas, micro-
hemorragias, exsudatos duros e algodonosos. A progressão da doença causa
diminuição da perfusão capilar, com várias hemorragias intrarretinianas,
alterações no calibre venoso e anormalidades microvasculares intrarretinianas.
O aparecimento de neovasos, induzidos pela isquemia retiniana, identifica a
retinopatia diabética como proliferativa.
O edema macular diabético (EMD), outro evento importante do diabetes, é
mais frequente no DM2 do que no DM1. Nesta fase, a pessoa ainda pode
enxergar bem, mas a visão já está agudamente ameaçada. A detecção
precoce e o tratamento a laser do edema macular clinicamente significativo são
essenciais na prevenção da perda permanente da visão. Devido à prevalência
elevada de DM2, o EMD é a causa mais importante de deficiência da acuidade
visual em diabéticos.
- Neuropatia diabética
A neuropatia diabética (NeD) é a complicação tardia mais frequente do
diabetes e pode ser evidenciada no DM2, muitas vezes no momento do
diagnóstico, enquanto no DM1 geralmente aparece cinco anos ou mais após o
diagnóstico. É rara na infância, porém deve ser considerada em adolescentes
com diabetes de longa duração. Uma definição simples é a presença de
sintomas e/ou sinais de disfunção dos nervos periféricos em diabéticos, após a
exclusão de outras causas. Das complicações crônicas microvasculares, o
comprometimento do sistema nervoso periférico é uma das manifestações
clínicas mais frequentes, afetando entre 40% e 50% dos indivíduos com DM2 e
em menor frequência no DM1.
Estudos mais recentes sugerem que a NeD também ocorre quando há
tolerância diminuída à glicose. A neuropatia diabética abrange um grupo de
alterações relacionadas ao envolvimento estrutural e funcional de fibras
nervosas sensitivas, motoras e autonômicas, que podem ser reversíveis ou
permanentes. Clinicamente, manifestam-se de formas muito variáveis, desde
síndromes dolorosas graves, agudas, secundárias a oscilações glicêmicas, até
formas assintomáticas. A polineuropatia sensitivo-motora difusa simétrica
periférica é a mais comum; pode ser de fibras finas, grossas ou mistas. Os
sinais e sintomas são parestesia, dor (queimação, pontada, choque ou
agulhada) em pernas e pés, hiperestesia (dor ao toque de lençóis e
cobertores), diminuição ou perda da sensibilidade tátil (fibras grossas), térmica
ou dolorosa (fibras finas), perda dos reflexos tendinosos profundos, fraqueza e
perda da motricidade distal, úlceras nos pés. A neuropatia autonômica
caracteriza- -se por função pupilar anormal (diminuição do diâmetro pupilar no
escuro), disfunção sudomotora (anidrose, intolerância ao calor, boca seca,
sudorese gustatória), disfunção geniturinária (bexiga neurogênica, disfunção
erétil, ejaculação retrógrada, disfunção sexual feminina), disfunção
gastrintestinal (atonia de vesícula biliar, dismotilidade esofagiana,
gastroparesia, constipação, diarreia e incontinência fecal), disfunção
cardiovascular (taquicardia em repouso, intolerância a exercícios, hipotensão
ortostática, isquemia miocárdica silenciosa) e disfunção metabólica
(hipoglicemia despercebida).
- Macrovascular
As complicações crônicas macrovasculares do DM, também chamadas de
doenças cardiovasculares, atingem o coração (infarto agudo do miocárdio), o
cérebro (acidente vascular cerebral) e os membros inferiores (doença vascular
periférica), e acometem tanto o paciente com DM2 como aquele com DM1. A
maior causa de óbito nesses casos é a doença cardiovascular. Existem
diversos mecanismos que participam do aumento do risco de doença
macrovascular no diabético. A hiperglicemia é apenas um deles, como também
estão envolvidos a hipertensão arterial, a dislipidemia e o fumo.