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Aula teórica: 6 26.04.2021


Tema 4: Integrais de superfícies
- Integrais de superfícies da primeira e segunda espécies
- Aplicações de integrais de superfícies
. .

Objectivos
No fim desta aula, os estudantes devem ser capazes de:
• Calcular as integrais de superfícies da primeira e da segunda espécies.
• Aplicar as integrais de superfícies no cálculo de circulação e fluxo de campos vectoriais.
. .

4. Integrais de superfícies

4.1. Integrais de superfícies da primeira espécie

Considere uma superfície regular S e uma função f (x, y, z) continua em D contendo S. Efec-
tuemos uma partição de S em n sub-regiões S1 , S2 , ..., Sn , cujas áreas são ∆S1 , ∆S2 , ..., ∆Sn ,
respectivamente, como se ilustra na figura abaixo.

Figura 1 (Partição da superfície S em n sub-regiões elementares).

Para cada sub-região Si , i = 1, 2, ..., n, escolhemos um ponto arbitrário (xi , yi , zi ) ∈ Si e for-


∑n
memos a soma integral Rn = f (xi , yi , zi )∆Si
i=1

Definição 1 (Integral de superfície da primeira espécie)

Se o limite de Rn existe, quando o número de subregiões n tende para o infinito, e não


depende da partição da superfície S e nem da escolha dos pontos (xi , yi , zi ), então, esse limite,
diz-se integral de superfície da primeira espécie da função f (x, y, z) sobre S e designa-se por

n ∫∫
lim f (xi , yi , zi )∆Si = f (x, y, z)dS (1),
n→0
i=1 S

Onde, dS é a área elementar da superfície S .


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4.1.1. Propriedades de integral de superfície da primeira espécie

Seja S uma superfície regular bilateral tal que S+ e S− representam as faces exterior e interior,
respectivamente. Consideremos ainda que f (x, y, z) e g(x, y, z) são duas funções continuas e
m, k ∈ R. Então, tem lugar as seguintes propriedades:
∫∫ ∫∫
1) f (x, y, z)dS = f (x, y, z)dS
S+ S−
∫∫ ∫∫ ∫∫
2) [mf (x, y, z) ± kg(x, y, z)]dS = m f (x, y, z)dS ± k g(x, y, z)dS
S S S

3) Se S = S1 ∪ S2 , onde S1 ∩ S2 = ∅ (talvez com a excepção dos pontos da fronteira), então:


∫∫ ∫∫ ∫∫
f (x, y, z)dS = f (x, y, z)dS1 + f (x, y, z)dS2
S S1 S2

4.1.2. Cálculo de integrais de superfície da primeira espécie

Teorema 1(Cálculo de integrais de superfície da primeira espécie)

a) Consideremos que S é uma superfície dada pela equação z = g(x, y), e seja Dxy a sua
projecção sobre o plano XOY . Se g(x, y) tiver primeiras derivadas parciais contínuas em Dxy
e f (x, y, z) for contínua em S, então teremos:
√ ( )2 ( )2
∫∫ ∫∫
∂z ∂z
f (x, y, z)dS = f [x, y, g(x, y)] 1 + + dxdy
∂x ∂y
S Dxy

b) Seja S uma superfície representada pela equação y = g(x, z), e seja Dxz a sua projec-
ção sobre o plano XOZ . Se g(x, z) tiver primeiras derivadas parciais contínuas em Dxz e
f (x, y, z) for contínua em S, então teremos:
√ ( )2 ( )2
∫∫ ∫∫
∂y ∂y
f (x, y, z)dS = f [x, g(x, z), z] 1 + + dxdz
∂x ∂z
S Dxz

c) Seja S uma superfície dada por x = g(y, z), e seja Dyz a sua projecção sobre o plano
Y OZ . Se g(y, z) tiver primeiras derivadas parciais contínuas em Dyz e f (x, y, z) for contínua
em S, então teremos:
√ ( )2 ( )2
∫∫ ∫∫
∂x ∂x
f (x, y, z)dS = f [g(y, z), y, z] 1 + + dydz
∂y ∂z
S Dyz
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Suponhamos que S é uma superfície dada por z = g(x, y), Dxy a projecção de S sobre o plano
XOY e f (x, y, z) = 1. Então, tal como foi abordado nas aplicações do integral duplo, a integral
√ ( )2 ( )2 √ ( )2 ( )2
∫∫ ∫∫
∂z ∂z ∂z ∂z
σ= 1+ + dS = 1+ + dxdy
∂x ∂y ∂x ∂y
S Dxy

representa a área da superfície S .

∫∫
Exemplo 1. Calcule o integral de superfície xzdS , onde S é a parte do plano x+y +z = 1
S
situada no primeiro octante, onde x ≥ 0, y ≥ 0 e z ≥ 0.

Resolução √
)2 ( )2 (
∂z √ ∂z
A partir de x + y + z = 1 ⇐⇒ z = 1 − x − y =⇒ 1 + + = 3
∂x ∂x
∫∫ ∫∫ √ √ ∫1 √
√ ∫ ∫1−x
1
3 2 3
xzdS = 3x(1−x−y)dxdy = 3 dx x(1−x−y)dy = x(1−x) dx =
2 24
S Dxy 0 0 0

∫∫
Exemplo 2. Considere a integral x2 zdS , onde S é a porção da superfície definida por
S
z 2 = x2 + y 2 limitada por z = 1 e z = 4.

a) Calcule o valor da integral

b) Calcule a área da porção de S considerada na integral calculada em a).

Resolução

a) A partir de z 2 = x2 + y 2 =⇒ z = x2 + y 2 . Assim, temos:
( )2 ( )2 √ ( )2 ( )2
∂z x2 ∂z y 2
∂z ∂z √
= 2 e = 2 =⇒ 1 + + = 2
∂x x + y2 ∂y x + y2 ∂x ∂y

A projecção da porção considerada sobre o plano XOY é uma coroa definida por:

D = {(x, y) ∈ R2 : 1 ≤ x2 + y 2 ≤ 16}.

Passando às coordenadas polares, obtemos:

∫∫ ∫2π ∫4 √ ∫2π √
√ 1023 2 1023π 2
x2 zdS = 2 dθ ρ4 cos2 θdρ = (1 + cos 2θ) =
10 5
S 0 1 0
4

b) A área de porção considerada é dada por:


√ ( )2 ( )2
∫∫ √ ∫
2π ∫4 √
∂z ∂z
1+ + dS = 2 dθ ρdρ = 15π 2 
∂x ∂y
S 0 1

4.2. Integrais de superficies da segunda espécie



→ −
→ −
→ −

Seja F = P i + Q j + R k um campo vectorial cujas projecções sobre os eixos OX , OY
e OZ , são as funções contínuas P (x, y, z), Q(x, y, z) e R(x, y, z), respectivamente.
Seja S uma superfície regular e bilateral e →

n = {cos α, cos β, cos γ} um vector unitário normal
à S, então a integral de superficie da segunda espécie se expressa por:
∫∫ ∫∫ ∫∫

→ − →
F · n dS = P dydz + Qdzdx + Rdxdy = (P cos α + Q cos β + R cos γ)dS (2)
S S S

Todas as propriedades de integrais duplas são válidas nas integrais de superfícies de segunda
espécie. Ademais, adiciona-se que a integral de superfície da segunda espécie muda o seu sinal
para o sinal contrário ao passar-se de uma face para a outra, isto é,
∫∫ ∫∫

→ − → −
→ −
F · n dS = − F ·→n dS
S+ S−

Consideremos uma superfície S dada por F (x, y, z) = 0, então os cossenos directores da normal


n são determinados pelas fórmulas:
∂F ∂F
∂y
cos α = ± √ (
∂x
)2 ( )2 , cos β = ± √ ( )2 e
( ∂F )2 ∂F ∂F
( ∂F )2 ∂F
( ∂F )2
∂x
+ ∂y
+ ∂y ∂x
+ ∂y
+ ∂z

∂F
cos γ = ± √ (
∂z
)2 .
( ∂F )2 ∂F
( ∂F )2
∂x
+ ∂y
+ ∂z

Notas

1) A escolha do sinal dos cossenos directores deve ser feita de acordo com a face de S con-
siderada e as amplitudes dos ângulos formados pela normal unitária → −
n e os respectivos
eixos, OX, OY e OZ . Sendo que, toma-se o sinal "+", para cada um dos cossenos direc-
tores cos α, cos β e cos γ , quando −

n forma ângulos agudos com os eixos, OX, OY e OZ ,
respectivamente, e considera-se "−" se os referidos ângulos são obtusos.

2) Na integral 2) se impõe a condição de que a superfície S seja bilateral, isto é, tem duas
faces. Ademais, está orientada (ou é orientável) no sentido de que em cada face existe
um vector normal unitário −→n que varia continuamente sobre S sem mudar o sentido. A
relação entre uma orientação positiva de S e −

n obedece a famosa regra da mão direita
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ou de sacarrolhas e pode ser ilustrada considerando-se uma curva C sobre a borda ∂S


da superfície S, como se apresenta nas figuras abaixo.

Figura 2 (Exemplos de superfícies orientáveis).

As restrições impostas sobre S eliminam as superfícies unilaterais e não orientaveis como o


cinto (ou banda) de Mobius1 , apresentada na figura abaixo.

Figura 3 (Exemplo de superfície não orientável (banda de Mobius)).

4.2.1. Cálculo de integral de superfície da segunda espécie

1) Se a superfície S é dada por z = f (x, y), a integral (2) calcula-se projectando S sobre o
plano XOY , sendo que é válida a fórmula:
∫∫ ∫∫

− → − dxdy
F · n dS = (P cos α + Q cos β + R cos γ) ·
| cos γ|
S Dxy

2) Se a superfície S é dada por x = g(y, z), a integral (2) pode representar-se por:
∫∫ ∫∫

− → − dydz
F · n dS = (P cos α + Q cos β + R cos γ) ·
| cos α|
S Dyz

3) Se a superfície S é dada por y = g(x, z), a integral (2) representar-se por:


∫∫ ∫∫

− → − dxdz
F · n dS = (P cos α + Q cos β + R cos γ) ·
| cos β|
S Dxz

4) Se for possível projectar a superficie S sobre os três planos coordenados XOY, Y OZ e


XOZ , simultaneamente, a integral (2) é dada por:
1
August Ferdinand Mobius (1790–1868) — matemático alemão
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∫∫ ∫∫ ∫∫ ∫∫

→→
F ·−
n dS = ± P [x(y, z), y, z]dydz± Q[x, y(x, z), z]dzdx± R[x, y, z(x, y)]dxdy
S Dyz Dzx Dxy

Em cada integral, à direita da equação anterior, a escolha do sinal "+" ou "−" depende
da amplitude dos ângulos formados pela normal − →
n e os eixos, OX, OY e OZ , respectiva-
mente. Por exemplo, na projecção de S sobre o plano Y OZ , tomemos o sinal "+" quando a
normal −

n forma um ângulo agudo com o eixo OX e "−" se o referido ângulo for obtuso.

∫∫

→ → −
→ −
→ −
→ −

Exemplo 3. Calcule a integral F ·−
n dS , onde F = x i + y j + z k e a superfície
√ S+
S é dada por z = 1− x2 − y2 , com 0 ≤ z ≤ 1.

Resolução
A projecção de S sobre o plano XOY oferece um círculo limitado por x2 + y 2 = 1 e

Dxy = {(x, y) ∈ R2 : x2 + y 2 ≤ 1}. A partir de z = 1 − x2 − y 2 =⇒

F (x, y, z) = x2 + y 2 + z 2 − 1 ≡ 0 e, portanto, os cossenos directores são dados por:


2x 2y
cos α = √ = x, cos β = √ =y e
(2x)2 + (2y)2 + (2z)2 (2x)2 + (2y)2 + (2z)2

2z P cos α + Q cos β + R cos γ 1


cos γ = √ = z; =√
(2x) + (2y)2 + (2z)2
2 | cos γ| 1 − x2 − y 2
∫∫ ∫∫ ∫∫

→ −
F ·→
dxdy dxdy
n dS = (P cos α + Q cos β + R cos γ) · = √
| cos γ| 1 − x2 − y 2
S Dxy Dxy

Passando às coordenadas polares, temos:

∫∫ ∫2π ∫1 ∫1

→ −
F ·→
ρ
(1 − ρ2 )− 2 d(1 − ρ2 ) = 2π 
1
n dS = dθ √ dρ = −π
1 − ρ2
S 0 0 0

Teorema 2 (Fórmula de Stokes2 ).



→ −
→ −
→ −

Seja um campo vectorial F = P i + Q j + R k , cujas projecções sobre os eixos OX , OY e
OZ , são as funções P (x, y, z), Q(x, y, z) e R(x, y, z), respectivamente. Suponhamos ainda que
as funções P, Q e R têm derivadas continuas e seja C um contorno fechado e parcialmente
regular simples, que limita uma superficie regular e bilateral S. Então, tem lugar a fórmula de
Stokes

2
George Gabriel Stokes (1819–1903) — matemático irlandês
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I
P (x, y)dx + Q(x, y)dy + R(x, y)dz =
C
∫ ∫ [( ) ( ) ( ) ]
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
− cos α + − cos β + − cos γ dS
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
S

Onde, cos α, cos β e cos γ são os cossenos directores da normal →



n à superfície S, devendo
determinar-se a normal de tal forma que o percurso do contorno C seja efectuado no sentido
contrário ao dos ponteiros do relógio.

Exemplo 4. Aplicando a fórmula de Stokes, calcule a integral


I
(z − y)dx + ln(1 + y 2 )dy + [ln(1 + z 2 ) + y]dz , onde C é a elipse x2 + y 2 = 16, z + x = 4.
C

Resolução

A elipse resulta da intersecção do cilindro x2 + y 2 = 16 com o plano z + x = 4 e a sua


projecção sobre o plano XOY é a região D = {(x, y) ∈ R2 : x2 + y 2 ≤ 16}. Quando se observa
por cima, e de acordo com o sentido escolhido e a regra da mão direita, o vector normal unitário


n aponta para cima, como se ilustra na figura abaixo.

Figura 4 (Elipse resultante da intersecção de x2 + y 2 = 16 e z + x = 4).

A partir de F (x, y, z) = x+z −4 ≡ 0, temos que os cossenos directores de →



n são dados por:
1 1
cos α = √ , cos β = 0 e cos γ = √
2 2
Portanto, aplicando a fórmula de Stokes, temos
I
(z − y)dx + ln(1 + y 2 )dy + [ln(1 + z 2 ) + y]dz =
C
∫∫ [ ] ∫∫
1 1 √
= (1 − 0) · √ + (1 − 0) · 0 + (0 + 1) · √ 2dxdy = 2 dxdy = 2 · π · 42 = 32π 
2 2
D D
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Teorema 3 (Fórmula de Ostrogradski-Gauss).

Consideremos que S é uma superfície regular fechada e que limita um volume finito V. Seja um

→ →
− −
→ →

campo vectorial F = P i + Q j + R k , cujas projecções sobre os eixos OX , OY e OZ , são as
funções P (x, y, z), Q(x, y, z) e R(x, y, z), respectivamente. Suponhamos ainda que P, Q e R
são funcões continuas em V, junto com as suas derivadas parciais de primeira ordem. Então,
tem lugar a fórmula de Ostrogradski-Gauss
∫∫ ∫∫ ∫∫∫ ( )

→ − → ∂P ∂Q ∂R
F · n dS = (P cos α + Q cos β + R cos γ)dS = + + dxdydz
∂x ∂y ∂z
S S V

Onde, cos α, cos β e cos γ são os cossenos directores da normal →



n exterior à superfície S.

Exemplo 5. Aplicando a fórmula de Ostrogradski-Gauss, calcule a integral


∫∫
Φ= x3 dydz + y 3 dzdx + z 3 dxdy , onde S é a face externa da esfera x2 + y 2 + z 2 = a2 .
S

Resolução
Aplicando o teorema de Ostrogradski-Gauss e passando às coordenadas esféricas, obtemos:

∫∫∫ ∫2π ∫π ∫a
12πa5
Φ=3 2 2 2
(x + y + z )dxdydz = 3 dθ dϕ ρ4 sin ϕdρ = 
5
V 0 0 0

4.2.2. Aplicações da integral de superfície da segunda espécie

1) Cálculo de fluxo de um campo vectorial




Considerando que o campo vectorial F pode representar quantidade de calor que atravessa a
superfície S, o gás expandido, a quantidade da carga eléctrica, etc., a integral
∫∫

→ −
F ·→ n dS pode ser usada para determinar, respectivamente:
S

i) O fluxo término estacionário em S.

ii) O fluxo de gás que se expande uniformemente através de S.

iii) O fluxo da corrente eléctrica, etc.

2) Cálculo da massa de um fluído




A massa de um fluído F de densidade δ = δ(x, y, z) que atravessa uma superfície S, é dada por
∫∫

→ →
δ · (F · −
n )dS
S

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