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Observatório de Direitos Humanos para o Oeste Paulista | ODHOP

Relatório Semestral
de Atividades Desenvolvidas

ref. agosto 2020


a dezembro 2020
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RELATÓRIO N. 1/21: SITUAÇÃO DOS DIREITOS


HUMANOS NO OESTE DO ESTADO DE SÃO PAULO

Dezembro 2020
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Relatório Semestral
de Atividades Desenvolvidas

Pesquisadores
Israel Coelho
Letícia Rodrigues Biassoti
Frederico di Palma
Ana Letícia Abrascio
Amanda Yamaguchi
Kayque Cordeiro
André Silva

Coordenação
João Pedro Martins Nascimento
Isabela Monteiro

Direção-Geral
Guilherme Fontana Sanchez

Supervisão Acadêmica
Me. Daniela Fachiano Nakano

Observatório de Direitos Humanos para o Oeste Paulista


e-mail | odhopinterior@gmail.com
instagram | @observatoriodhinterior
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OBSERVATÓRIO DE DIREITOS HUMANOS PARA O OESTE PAULISTA

QUEM SOMOS?
O Observatório de Direitos Humanos para o Oeste Paulista (ODHOP)
consiste em um grupo de pesquisadores de várias partes do Brasil cuja atuação se
dá com base na produção de pesquisa relacionada a temática dos Direitos
Humanos, com especial atenção a determinados grupos e questões sensíveis
atinentes a toda a sociedade.
O grupo possui experiência com pesquisa, tendo em seu corpo de
pesquisadores vários artigos e estudos na área do Direito Internacional dos Direitos
Humanos publicados, além de também ter Mestre e mestrando em seu time.
Ademais, o grupo também possui experiência com simulações e
representações acadêmicas nacionais e internacionais, além de não se restringir a
estudantes do curso de Direito.
A área de atuação do projeto se dá única e exclusivamente na região
conhecida por Oeste Paulista (ou Centro Oeste Paulista), ou melhor, na região a
Oeste do interior do Estado de São Paulo, mais especificamente no entorno das
cidades de Presidente Prudente, Presidente Bernardes, Adamantina e Marília. Esta
região é, infelizmente, marcada negativamente pela presença maciça de centros de
detenção e presídios (famosos por abrigarem presos de altíssima relevância), por
sérias questões ambientais, de violência de gênero e por ser rota conhecida de
migrantes e refugiados que rumam em direção a grandes cidades.
Daí, portanto, surge a necessidade do projeto: dada a ausência de pesquisa
(que, por sua vez, se concentra em grandes centros urbanos do país) e a carência
de relevantes atores regionais que produzam e exijam a mudança dos entes
públicos, o Observatório busca suprir esta lacuna, de modo a colaborar, ademais,
com a promoção dos ideais dos Direitos Humanos nessa região do Brasil.

QUAIS OS OBJETIVOS?
Os objetivos do Observatório consistem em informar e relatar a situação dos
Direitos Humanos na área de atuação do grupo, de modo a fornecer um panorama
sobre isto aos órgãos pertencentes a Administração Pública das cidades da região,
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além de trabalhar continuamente ao longo dos próximos anos elaborando e


cobrando o cumprimento de uma série de medidas e recomendações.

ESTRUTURA
A estrutura do Observatório é composta por 7 (sete) pesquisadores, por 2
(dois) coordenadores, por 1 (um) diretor-geral e por 1 (uma) supervisora
acadêmica, conforme descrito na página anterior. As reuniões se dão em ambiente
online e a atuação de todos os membros é de natureza estritamente voluntária.
Os coordenadores, diretor e supervisor são responsáveis cada um pela
coordenação e planejamento de cada Eixo de Atuação do Observatório, que são
eles:

a. Eixo Meio Ambiente


Coordenadora: Daniela Fachiano Nakano
Pesquisadores: Israel Coelho e Letícia Rodrigues Biassoti

b. Eixo LGBTQIAP+ e Gênero


Coordenadora: Isabela Monteiro
Pesquisadores: André Silva e Kayque Cordeiro

c. Eixo Populações Privadas de Liberdade


Coordenador: João Pedro Martins Nascimento
Pesquisadores: Amanda Yamaguchi e Ana Letícia Abrascio

d. Eixo Migrantes e Refugiados


Coordenador: Guilherme Fontana Sanchez
Pesquisador: Frederico di Palma

PROJETOS DESENVOLVIDOS
Pesquisa, relatório e mapeamento do panorama situacional dos Direitos
Humanos sobre os grupos pesquisados, além da elaboração de uma série de
recomendações ao Poder Público e acompanhamento da adoção de tais medidas,
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sempre em consonância com o que preconiza, por excelência, o Direito


Internacional e seus pilares fundamentais.

PARCERIAS
O projeto, embora seja apenas um grupo de pesquisadores, possui interesse
a curto e médio prazo de se formalizar legalmente e constituir Organização do
Terceiro Setor. Por enquanto, buscam-se parcerias para integrar grupos na região
com interesses semelhantes ou em comum. Ressalta-se, aqui, conversas com
grupos como o PET-RI – UNESP (Marília) e o Núcleo Atena, de estudos feministas,
com sede na Toledo Prudente.
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EIXO MEIO AMBIENTE | ODHOP

INTRODUÇÃO

Os impactos causados pela degradação do meio ambiente podem ser


paulatinos, divididos em várias prestações. São representados pela dificuldade em
respirar num dia muito seco, leves aumentos na temperatura e até a variação de
preços dos alimentos no mercado. Outros podem ser súbitos, as chamadas
tragédias naturais representadas pelos deslizamentos, enchentes, tempestades de
raios e nuvens de gafanhotos.
Em marcha lenta ou acelerada, os impactos ambientais mais comuns no
Brasil podem ser mitigados por meio da ação humana. O ser humano tem o dever
de preservar o meio ambiente às gerações futuras e abrandar os efeitos presentes,
tendo em vista seus reflexos no exercício de todos os outros direitos. A falta de um
meio ambiente saudável, por exemplo, pode gear impactos até mesmo na taxa de
alfabetização de um país.
Os direitos humanos e ambientais estão mais interligados do que se imagina,
por vezes se confundindo. A Constituição Brasileira garante ao indivíduo um meio
ambiente equilibrado, impondo deveres tanto ao poder público, como para a
coletividade. Como o portador do direito é o ser humano, a grande maioria das
causas ambientais andam em conjunto com demandas de direitos humanos. Isto
quando não representam, por si, um direito fundamental.
Este relatório tem como objetivo oferecer um panorama geral sobre os
direitos e preocupações socioambientais e meio ambiente, no contexto do Oeste
Paulista. A partir deste documento, em projetos futuros, serão buscadas diretrizes
para oferecer um monitoramento periódico de direitos humanos, identificando em
teoria as principais demandas locais para promoção da justiça ambiental.
A pesquisa e textos desenvolvidos neste relatório foram feitas por meio de
consulta bibliográfica, bem como pela elaboração de deduções. O primeiro tópico
se destina a apontar preocupações ambientais em nível Brasil, seguido de um
tópico espelho para as inquietações locais. Por fim, uma recolecção do papel das
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principais políticas públicas existentes, de forma a delimitar a responsabilidade do


poder público na proteção do meio ambiente.

1. PREOCUPAÇÕES AMBIENTAIS NO BRASIL

Neste tópico são apresentadas e discutidas as preocupações a nível nacional


em matéria de meio ambiente, com foco no desmatamento e suas implicações. Isso
é importante para que se compreenda a posição que a região do Oeste Paulista
ocupa em relação ao Brasil como um todo. Dessa forma, é possível não só
compreender a situação na região aqui debatida, como também ter um panorama
geral do país.
Para cumprir com seu objetivo, a seção se divide em quatro pontos. O
primeiro deles visa discutir a questão das mudanças climáticas e fenômenos
meteorológicos extremos, demarcando as causas e os efeitos para a população e
o território afetados. O segundo apresenta a problemática da transição energética,
energias renováveis e estresse hídrico, demarcando a situação a nível nacional. Em
seguida é feita uma breve síntese acerca da proteção da biodiversidade, as
ameaças existentes e iniciativas para proteção. Por último, a seção termina
debatendo o desenvolvimento urbano, a poluição e a saúde pública.
É importante ressaltar que a divisão feita aqui cumpre apenas fins de facilitar
o entendimento, uma vez que todas problemáticas são relacionadas e afetadas por
inúmeras outras variáveis que aqui não são exploradas com a devida profundidade.
Assim, serão expostas tais relações ao longo do texto com o intuito de reforçar a
conexão entre as temáticas. Da mesma maneira, as temáticas de meio ambiente
não podem ser tratadas individualmente, sendo necessária uma visão sobre o todo
para pensar os problemas e possíveis soluções, o que também é reforçado ao
longo da seção.
Por último, é preciso reconhecer as limitações da análise aqui desenvolvida.
A primeira delas, já apresentada, é a ausência de determinadas variáveis que aqui
não são discutidas. Isso se dá pela extensão territorial brasileira, diversidade de
biomas, ocupação heterogênea do território, desigualdade entre regiões do país,
entre outros fatores. Além disso, existem limitações de recursos e tempo, que
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impedem a realização de uma pesquisa mais aprofundada e extensa. Por último,


existem limitações inerentes da pesquisa científica no que diz respeito ao foco aqui
selecionado e interpretação dos pesquisadores. A partir disso, é possível iniciar a
discussão aqui proposta.

1.1. Mudanças climáticas e fenômenos meteorológicos extremos

Como já mencionado, no primeiro tópico será feita uma discussão acerca


das mudanças climáticas e fenômenos meteorológicos extremos. Inicialmente, são
feitos esclarecimentos iniciais fundamentais para a compreensão dos problemas
apresentados. Em seguida é feito um panorama sobre as emissões de gases de
efeito estufa no mundo e no Brasil. Por último, são expostas as consequências
dessas mudanças nos fenômenos meteorológicos.
De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das
Nações Unidas (IPCC), o fenômeno das mudanças climáticas está associado à
emissão de gases resultantes do processo produtivo, massificado com a
industrialização iniciada em séculos passados e ainda crescente1. Tais gases são
denominados gases de efeito estufa (GEE), uma vez que se acumulam na atmosfera
e retém o calor do sol por mais tempo na Terra, elevando a temperatura do planeta.

Figura 1: representação gráfica do efeito estufa2

1
IPCC, 2018.
2
MINHOTO, 2018.
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O gás carbônico (CO₂), o gás metano (CH₄) e o óxido nitroso (N₂O) são três
dos GEE mais emitidos no Brasil3. De acordo com pesquisa desenvolvida na
Universidade de São Paulo em 2009, o gás carbônico concentra 74% das emissões
de GEE em território nacional4, corroborando com a tendência global apontada
pelo IPCC em 2018. O gás carbônico, também conhecido como dióxido de
carbono, além de ser emitido pela respiração humana é produto da combustão de
combustíveis fósseis, como madeira, carvão, produtos derivados do petróleo e
outros hidrocarbonetos utilizados como fonte de energia5.
Por conta de ser resultado de inúmeras atividades produtivas, o dióxido de
carbono é emitido em volume muito maior que os demais GEE, sendo fundamental
a análise de suas emissões para compreender o fenômeno das mudanças
climáticas. De acordo com a base de dados da Agência Internacional de Energia,
os cinco países com maior emissão de gás carbônico no ano de 2018
(respectivamente China, Estados Unidos, Índia, Rússia e Japão) somam 19,4 mil
toneladas, mais da metade do que foi emitido em 19806. O gráfico abaixo revela o
crescimento acelerado das emissões de dióxido de carbono nos últimos 40 anos
ao somar as emissões dos cinco países mais poluentes.

Gráfico 1: Emissões de CO₂ por queima de combustível dos cinco países mais poluentes
a partir de 19807

3
CERRI et al, 2009.
4
CERRI et al, 2009.
5
BRITTANICA, 2020.
6
IEA, 2020.
7
Elaborado pelos autores com dados de IEA, 2020.
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Em termos relativos, quando comparado com outros países que são grandes
emissores de GEE, o Brasil não se enquadra como um país muito poluente. Em
2018, 0,4 mil toneladas foram emitidas, colocando o país na 14ª posição no
mundo8. No entanto, em termos absolutos, a emissão de CO₂ do Brasil é
preocupante. Isso se deve principalmente pela natureza de tal emissão.
De acordo com o Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito
Estufa (SEEG), de realização do Observatório do Clima, 62% das emissões
brasileiras são resultantes da mudança de uso da terra e florestas9. Isso significa que
a maior parte do CO₂ produzido no Brasil é produto do desmatamento, queimadas
e agropecuária de grande extensão. Esse tipo de atividade não só é extremamente
poluente como ainda se baseia na alteração de biomas e da biodiversidade local,
impedindo uma recuperação célere do meio ambiente.

Figura 2: Emissões de dióxido de carbono por atividade econômica10

8
IEA, 2020.
9
SEEG, 2020.
10
SEEG, 2020.
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Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), somente em


2020 foram registrados mais de 90 mil focos de incêndio até 29 de outubro na
Amazônia, sendo o bioma mais afetado do país11. No total, foram cerca de 200 mil
incêndios no ano de 2020, com concentração nos biomas da Amazônia, Cerrado e
Pantanal12. Na figura abaixo encontra-se a divisão do Brasil entre biomas de acordo
com o Sistema Nacional de Informações Florestais (SNIF) e, em seguida, um gráfico
com o número total de focos de incêndio encontrados por ano em cada bioma
brasileiro a partir de 1998.

Figura 3: Divisão do Brasil em biomas13

11
INPE, 2020.
12
INPE, 2020.
13
SNIF, 2020.
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Gráfico 2: total de focos ativos detectados anualmente pelo INPE em cada bioma
brasileiro (1998-2020)14

O bioma mais afetado por queimadas no Brasil, a Amazônia, é uma das


maiores florestas do mundo. De acordo com relatório da Organização das Nações
Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) divulgado em 2020, o Brasil é o
segundo país com maior volume de florestas no mundo, concentrando 12% de
todas as florestas do planeta15. No relatório "The state of world's forests" (O estado
das florestas do mundo, tradução nossa), a FAO também aponta que a riqueza de
biodiversidade da floresta brasileira é singular em todo o mundo, abrigando
espécies vegetais e animais ainda não catalogadas. Dessa forma, as queimadas na
Amazônia não representam apenas um risco para as mudanças climáticas, como
também para toda a biodiversidade do planeta.

14
INPE, 2020.
15
FAO, 2020.
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Gráfico 3: concentração das florestas do mundo16

Além das perdas imensuráveis para o meio ambiente, as queimadas no Brasil


representam um grande risco para os povos indígenas brasileiros. Muitos deles se
encontram em áreas profundamente afetadas pelas queimadas e desmatamento.
O Instituto Socioambiental (ISA) aponta que existem hoje 724 terras indígenas no
Brasil, em diferentes etapas do processo de demarcação17. Grande parte dessas
terras se concentra no território da Amazônia Legal, que é constantemente alvo de
queimadas, como já apontado pelos dados do INPE.
A figura abaixo demonstra a dispersão de terras indígenas no Brasil, em que
cada ponto representa um território indígena em uma determinada etapa de
demarcação. Além disso, estão também representados os biomas brasileiros em
diferentes cores. Dessa forma, fica visível a concentração de povos indígenas na
Amazônia, constantemente ameaçados pelo avanço das queimadas no bioma.

16
Adaptado de FAO, 2020.
17
ISA, 2020.
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Figura 4: terras indígenas no Brasil18

Além das queimadas, o desmatamento é também uma das atividades mais


prejudiciais para o meio ambiente brasileiro. O Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais indica que o desmatamento é uma operação que visa substituir a
cobertura florestal de um determinado território por outra cobertura e destino,
como agropecuária, urbano, hidroelétricas e outros19. A cobertura no Brasil é feita
por meio do uso de satélites e com realização de diferentes programas em vários
biomas brasileiros.
De acordo com relatório divulgado pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) em
2019 o desmatamento em todos os biomas brasileiros diminuiu entre os anos de
2002 e 2019. No entanto, essa área desmatada não foi recuperada, de forma que o
desmatamento de anos anteriores reflete no meio ambiente hoje. As
consequências disso, como será visto, são eventos climáticos extremos, perda de

18
ISA, 2020.
19
INPE, 2013 apud SFB, 2019.
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biodiversidade e problemas para saúde pública. As imagens abaixo apresentam o


desmatamento nos biomas brasileiros mais afetados.

Figura 5: desmatamento na Amazônia entre 1988 e 201820

Figura 6: desmatamento na Cerrado entre 2000 e 201821

20
SFB, 2019.
21
SFB, 2019.
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Figura 7: desmatamento no Pantanal entre 2002 e 201622

Os eventos climáticos extremos estão relacionados ao aumento de


temperatura e anomalias na precipitação. O Instituto Nacional de Meteorologia
(INMET) registra os eventos extremos no país e mostra como os efeitos das
mudanças climáticas já são sentidos no Brasil. Nas imagens abaixo são mostradas
as anomalias de precipitação no ano de 1980, 2000 e 2020, em que os pontos mais
azulados representam excesso de umidade e os pontos vermelhos representam
clima excessivamente seco.

Figuras 8, 9 e 10: índice de precipitação padronizada em 1980, 2000 e 202023

22
SFB, 2019.
23
INMET, 2020.
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É notável como o Brasil se tornou um país mais seco em 2020 em relação às


décadas anteriores. São perceptíveis como as práticas que contribuem para as
mudanças climáticas afetam a precipitação, transformando o país em um território
mais seco. A seguir são mostradas as anomalias de temperatura no ano de 2020
tomando como referência o período entre 1981-2010. As manchas azuis
representam uma temperatura abaixo da média percebida entre 1981 e 2010, já as
manchas vermelhas representam uma temperatura acima da média.

Figura 11: anomalias de temperatura em 202024

Nos mapas ficam visíveis como as mudanças no clima são sentidas em um


período curto. No que diz respeito às anomalias de precipitação, é visível que a
ocorrência de índices extremamente úmidos e extremamente secos aumentou com
o tempo. Além disso, as anomalias de temperatura mostram que o Brasil se tornou
um país mais quente em 2020 quando comparado com o período de 1981-2010,
especialmente em áreas mais afetadas por desmatamento e queimadas.

24
INMET, 2020.
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Dessa forma, as mudanças climáticas ficam visíveis no território brasileiro. Tal


entendimento é importante para que se compreenda os problemas apontados nos
próximos tópicos. As mudanças climáticas, produto no Brasil principalmente dos
desmatamentos e das queimadas, é a base para que se entenda a questão do meio
ambiente em território nacional. No próximo tópico será apresentada a questão da
transição energética, energias renováveis e estresse hídrico, elementos que têm
impacto direto nas mudanças climáticas.

1.2. Transição energética, energias renováveis e estresse hídrico

Os modos como um país produz a energia que consome é ponto importante


para compreender os impactos ambientais realizados em larga escala em seu
território. Uma vez que o acesso à energia é massificado em um país que possui
grande parte da população em centros urbanos, como é o caso do Brasil, seus
impactos no meio ambiente também são sentidos na mesma proporção. Dessa
forma, faz-se necessária uma análise acerca da produção e consumo de energia no
Brasil.
Da mesma maneira, estudar a forma como um país consome água é
igualmente importante para entender os problemas relativos ao meio ambiente
que são enfrentados. Em uma economia que depende em grande parte da
exportação de produtos que consomem muita água (como grãos e carnes), é
urgente o desenvolvimento de políticas para garantir um uso sustentável desse
recurso. Assim, entendendo a pesquisa como etapa inicial para a construção de
políticas, é aqui realizada também uma análise sobre o tema.

1.2.1. Transição energética e energias renováveis

De acordo com o Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito


Estufa (SEEG), 21% do dióxido de carbono emitido no Brasil é resultante do uso de
energias não renováveis (ver Figura X)25. Essa emissão é realizada, em maior parte,
pelos meios de transporte que dependem de compostos derivados do petróleo,

25
SEEG, 2020.
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como caminhões de carga e transporte de passageiros. Além disso, a produção de


combustíveis por meio da indústria do petróleo e a geração de energia também
são apresentadas como grandes emissoras de gás carbônico pelo SEEG.
O Balanço Energético Nacional (BEN) do ano de 2018, elaborado pela
Empresa de Pesquisa Energética (EPE) aponta para a natureza poluente da matriz
energética brasileira. Essa matriz representa o somatório das fontes de energia
utilizadas para transporte, uso doméstico, gerar eletricidade e tantos outros usos26.
No gráfico abaixo, desenvolvido com os dados do BEN, fica visível como o país
ainda é dependente do petróleo e seus derivados. No entanto, essa é uma
tendência global, como será visto posteriormente.

Gráfico 4: Matriz Energética Brasileira em 201727

Como apontado no gráfico, 34,9% da matriz energética brasileira é


renovável, somando a energia hidráulica, os derivados da cana e outras fontes de
energia de menor porcentagem. De acordo com a Agência Internacional de
Energia (IEA), o retrato da média global se mostra menos sustentável que o cenário
brasileiro. O gráfico abaixo aponta que menos de 12% da matriz energética global

26
EPE, 2020.
27
Adaptado de EPE, 2020.
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deriva de fontes renováveis, como a biomassa, a energia hidráulica e outras fontes


renováveis de menor porcentagem.

Gráfico 5: Matriz Energética Mundial em 201828

De acordo com a base de dados Our World in Data, o Brasil é o país sul-
americano com maior porcentagem de energia primária renovável. No entanto,
isso inclui a energia hidráulica, que, apesar de ser renovável, não é uma fonte de
energia limpa. Isso porque a construção de uma usina hidrelétrica depende de
transformações no meio ambiente que podem afetar negativamente o território.
Para realizar tal construção são frequentes ações de desmatamento de áreas para
alagamento, alteração do volume de água em rios e outras iniciativas que geram
consequências negativas para comunidades ribeirinhas e indígenas.
Na matriz elétrica brasileira, que representa todo o conjunto de fontes de
energia utilizadas para gerar eletricidade, 65,2% depende das hidrelétricas29.
Dessa forma, mais da metade da energia elétrica brasileira depende de
transformações no meio ambiente que são irreversíveis no curto e médio prazo.
Dessa matriz, apenas 15% derivam de energias renováveis e limpas, como solar,

28
Elaborado pelos autores com dados de IEA, 2020.
29
EPE, 2020.
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eólica e biomassa. O gráfico abaixo apresenta a matriz elétrica brasileira em 2017,


de acordo com o Balanço Energético Nacional do ano de 2018.

Gráfico 6: Matriz elétrica brasileira em 201730

Dessa forma, percebe-se que o Brasil apresenta um cenário melhor que a


média global no que diz respeito à utilização de energias renováveis. No entanto,
nem toda energia renovável é uma energia limpa, isto é, existem fontes renováveis
que, para serem implementadas, dependem de alterações negativas no meio
ambiente. Este é o caso da energia hidráulica, que é fundamental para a matriz
elétrica brasileira.
Assim, faz-se urgente a elaboração de políticas que busquem ampliar a
utilização de fontes de energia renováveis e limpas, como solar, eólica e biomassa.
Essa mudança deve ser promovida a nível local, nacional e também internacional,
buscando alterar não só a matriz brasileira como buscar mudanças na matriz
energética global.

30
Elaborado pelos autores com dados de EPE, 2020.
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1.2.2. Estresse hídrico

O estresse hídrico está relacionado à falta de água em um determinado


território para qualquer tipo de utilização. Como visto no primeiro tópico desta
seção, tal fenômeno está relacionado às mudanças climáticas e fenômenos
meteorológicos extremos, que têm transformado o Brasil em um país
gradativamente mais seco. No entanto, o estresse hídrico é agravado por má
gestão da água, como será visto neste tópico.
A Agência Nacional de Águas (ANA), por meio do Manual de Usos
Consuntivos da Água no Brasil, apresenta as demandas de uso da água no Brasil
por setor. Os usos consuntivos são aqueles em que ocorre o consumo da água,
excluindo aqueles que usufruem da água sem consumi-la, como a pesca e a
navegação. Segundo os dados da ANA, o setor agrícola é responsável por 60% da
retirada de água no Brasil, mais que o dobro do que é utilizado em todo o
abastecimento urbano e rural do país31. O gráfico abaixo foi desenvolvido com base
nos dados da ANA.

Gráfico 7: demandas de uso consuntivo da água no Brasil por setor em 201932

31
ANA, 2019
32
ANA, 2019
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A partir da retirada é feito o consumo da água e posteriormente o retorno


para o ambiente daquilo que não foi consumido. A partir disso, é possível calcular
a eficiência de um setor, quando a diferença entre a retirada e o consumo é mínima.
A tabela abaixo, elaborada a partir do relatório da ANA, calcula a eficiência de cada
setor a partir de suas taxas de retirada, consumo e retorno.

Tabela 1: cálculo de eficiência dos usos consuntivos por setor no Brasil em 201933

Setor Retirada Consumo Retorno Eficiência


(m³/s) (m³/s) (m³/s) (retirada/consumo)

Irrigação 1083,6 792,1 291,5 1,36

Abast. Urbano 496,2 99,2 397 5,00

Indústria 189,2 101,7 87,5 1,86

Abast. Rural 34,5 27,6 6,9 1,25

Mineração 32,9 9,6 23,3 3,42

Termelétrica 79,5 2,5 77,0 31,8

Uso animal 166,8 125,1 41,7 1,33

De acordo com o cálculo realizado, quanto mais próximo de 0, mais eficiente


é o setor. Dessa forma, percebe-se que, embora o setor agrícola concentre a maior
retirada de água no Brasil, o uso da água por termelétricas e o abastecimento
urbano são os menos eficientes. Ainda, por ter a segunda maior retirada e a
segunda pior eficiência, o abastecimento urbano é crucial para a gestão dos
recursos hídricos no país.
Quanto ao abastecimento urbano, a Agência Nacional de Águas divulgou o
Atlas Esgotos, tendo elaborado um estudo sobre a trajetória da água em centros
urbanos. De acordo com a ANA, 45% da população brasileira não possui

33
Elaborado pelos autores com dados de ANA, 2019.
P á g i n a | 25

tratamento de esgotos, o que significa que depositam dejetos sem tratamento em


corpos hídricos, como rios, córregos e mares34. Isso é fundamental para a
compreensão do estresse hídrico, uma vez que a recuperação destes corpos é um
longo e custoso processo, que impede a água seja consumida.
O problema da poluição da água também se faz presente na agricultura, uma
vez que o uso de agrotóxicos nas plantações afeta o lençol freático, prejudicando
um corpo hídrico que não é retirado para consumo pelo setor. De acordo com
relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO),
o Brasil é o segundo país que mais consome pesticidas no mundo, com um
consumo anual de 396 mil toneladas, atrás apenas de Estados Unidos e China35.
Dessa maneira, ficam visíveis alguns caminhos para aliviar o estresse hídrico
no Brasil. O primeiro deles é o combate às mudanças climáticas, que transformam
o país em um lugar mais seco e prejudica o acesso à água. Outros estão ligados à
gestão da água, especialmente no que diz respeito ao abastecimento urbano e na
agricultura. É necessário que se pense sobre formas de ampliar o saneamento
básico no Brasil, a fim de reduzir a poluição de corpos hídricos nos centros urbanos.
Da mesma maneira, faz-se urgente uma reforma na agricultura, para reduzir o
consumo de agrotóxicos e trabalhar em métodos que resultem em menor consumo
de água.
Todas as temáticas abordadas até o momento são importantes para o tópico
que se segue. A proteção à biodiversidade passa pelo desmatamento e
queimadas, pela poluição por consumo de combustíveis fósseis, pela dependência
das hidrelétricas e pelo estresse hídrico. Como apontado inicialmente, o meio
ambiente deve ser entendido em seu todo, um organismo vivo que precisa de um
bom funcionamento em todos os âmbitos. Assim, é necessário ter em mente tudo
aquilo que já foi discutido para que se compreenda a situação da biodiversidade
brasileira.

34
ANA, 2020.
35
FAO, 2018.
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1.3. Proteção da biodiversidade

Como já mencionado, a proteção à biodiversidade é parte central da defesa


ao meio ambiente e objeto de frequentes ataques no Brasil. Em um país que conta
com rica biodiversidade, tanto em fauna quanto em flora, sua proteção é um dever
de toda a humanidade. Neste tópico serão apontados os principais problemas em
relação a este compromisso.
Os problemas relativos às mudanças climáticas, gestão da energia e dos
recursos hídricos são variáveis que impactam diretamente na proteção à
biodiversidade. Por essa razão, várias menções aos tópicos anteriores desta seção
serão aqui realizadas. Para uma boa compreensão do tópico é necessária uma
leitura atenta das discussões anteriores.
A biodiversidade deve ser entendida em suas duas dimensões: a fauna e a
flora. A fauna representa os animais que vivem na natureza, enquanto a flora diz
respeito aos seres do reino vegetal. Ambas estão intimamente relacionadas e
devem ser sempre pensadas em conjunto. O Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio) aponta que existem 46 mil espécies de
plantas e 117 mil espécies de animais no território brasileiro36.
Além disso, a biodiversidade brasileira deve ser entendida a partir de sua
pluralidade. A fauna e a flora, tanto terrestre quanto marinha, variam de acordo com
os biomas encontrados no território do país. Logo, toda política pública que visa
proteger a biodiversidade do Brasil deve recusar a homogeneidade, norteando-se
pela diversidade dos seres que compõem o meio ambiente do país.

"Esta diversidade coloca o Brasil na posição de país com maior número de


espécies de anfíbios e primatas em todo o mundo, o 2º em mamíferos e o
3º em aves e répteis. O Brasil também é o sexto país em endemismos de
vertebrados, sendo as taxas mais altas para os anfíbios, com 57%, e os
répteis, com 37%". (ICMBIO, 2018, p. 43)

A partir disso, é possível explorar os principais problemas enfrentados. O


primeiro desafio à proteção da biodiversidade brasileira se deve à extensão
territorial e a consequente biodiversidade de biomas, ecossistemas e espécies que

36
ICMBIO, 2018.
P á g i n a | 27

devem ser protegidas. Os institutos responsáveis por prestar esse serviço, como o
ICMBio e o IBAMA, não conseguem empreender os esforços necessários para
manter total controle sobre a biodiversidade do Brasil. Isso não se deve a falta de
recursos, de profissionais e de financiamento, por mais que estes sejam problemas
recorrentes apontados por especialistas, mas principalmente pelas dificuldades
naturais impostas pelo território brasileiro.
As queimadas nos biomas brasileiros, que também apresentam desafios
para catalogação e controle (ver tópico 3.1), representam ameaças para as duas
dimensões da biodiversidade, fauna e flora. A perda de vegetação (flora) faz com
que a fauna perca fonte de alimentação, abrigo e causa mortes por carbonização.
No mesmo sentido, o desmatamento, que também foi explorado anteriormente,
apresenta efeitos semelhantes.
Dessa forma, a mudança de uso da terra é uma das grandes ameaças à
biodiversidade. Essa mudança também é prejudicial quando o novo uso da terra
se consolida. A transformação de uma área de floresta em área agricultável ou
centro urbano representa uma perda considerável de flora e, consequentemente,
de fauna. Assim, toda iniciativa de proteção à biodiversidade passa pela
preservação do uso natural da terra.
Além disso, deve-se considerar também a biodiversidade dos corpos
hídricos, que são afetados pela poluição da água e estresse hídrico, tema do tópico
3.2.2. O Atlas Esgotos, elaborado pela Agência Nacional de Águas, alerta que 83
mil quilômetros de rios brasileiros já tiveram sua biodiversidade afetada para níveis
alarmantes37. Isso porque esses corpos hídricos contam com uma concentração de
matéria orgânica resultante de poluição que impede a sobrevivência de seres vivos.
Essa matéria é despejada não só por conta dos esgotos dos centros urbanos, mas
também por agrotóxicos utilizados no campo.
Ainda, o uso de fontes de energia derivadas de combustíveis fósseis
representa parte considerável das emissões de dióxido de carbono na atmosfera
brasileira, como visto no tópico 3.2.1. Essas emissões prejudicam a qualidade do ar
e afetam a fauna, além de acumularem na atmosfera e serem responsáveis por

37
ANA, 2020.
P á g i n a | 28

chuvas ácidas que destroem a flora. Na mesma linha, o uso de energias renováveis
não limpas, como as hidrelétricas, destrói habitats inteiros no período de
construção, afetando a biodiversidade de maneiras irreversíveis.
O já mencionado ICMBio, em um esforço inédito, registrou com o apoio da
comunidade científica 1173 espécies de animais ameaçadas de extinção. A lista,
encontrada no "Livro Vermelho da fauna brasileira ameaçada de extinção", é
resultado de um estudo com todos os vertebrados existentes no país e apenas uma
parcela dos animais invertebrados. Isso esclarece os riscos à biodiversidade
brasileira e a dificuldade de manter controle sobre a mesma.
Dessa forma, é visível como os problemas já apontados prejudicam também
a proteção à biodiversidade, que naturalmente também apresenta obstáculos
particulares, sendo mencionados aqui apenas alguns. As dificuldades intrínsecas
ao processo de salvaguarda da fauna e flora no Brasil não devem ser impeditivas
para o fortalecimento dos institutos que desempenham esse papel. Pelo contrário,
devem ser ainda mais incentivados e financiados, para que consigam prestar um
serviço ainda melhor no futuro.
Por último, o enfrentamento dos desafios postos nos pontos anteriores
desencadeia efeitos positivos para a biodiversidade. Isso será percebido no
próximo tópico, em que será tratado exclusivamente da saúde pública e fatores que
acabam por agravá-la. Mais uma vez vale ressaltar a conexão existente entre todos
os temas aqui tratados e a indissociabilidade das temáticas de meio ambiente.

1.4. Desenvolvimento urbano, poluição e saúde pública

O último tópico da presente seção visa apresentar uma breve discussão


acerca do desenvolvimento urbano, poluição nas cidades e saúde pública. Assim
como já apontado, essa temática é profundamente afetada por todas as outras já
mencionadas, além de apresentar desafios e problemas particulares. Com 86% da
população vivendo no espaço urbano38, é fundamental trazer informações sobre os
efeitos das alterações ambientais para a saúde das pessoas que vivem nas cidades.

38
RITCHIE & ROSER, 2019.
P á g i n a | 29

As anomalias climáticas, também chamadas de eventos meteorológicos


extremos, foram abordadas no tópico 3.1 e trazem implicações sérias para a saúde
pública e desenvolvimento urbano. Em períodos de seca prolongada, o estresse
hídrico se agrava (ver tópico 3.2.2) e parte da população tem o acesso à água
prejudicado, podendo ficar sem água durante tempo considerável. No entanto, a
simples volta do período chuvoso não soluciona todos os problemas, já que outros
obstáculos surgem quando a chuva cai de maneira excessiva.
As chuvas afetam primeiramente o espaço urbano e posteriormente a saúde
pública. As enchentes e os deslizamentos prejudicam principalmente as áreas de
aglomerados subnormais, que é a nomenclatura utilizada pelo IBGE para se referir
a favelas, invasões, loteamentos irregulares e outras ocupações de caráter
semelhante39. O Censo de 2010 contabilizou mais de 5 milhões de domicílios nessa
situação40, valor que ainda não foi atualizado para 2020 em razão da pandemia da
Covid-19.
Esses aglomerados, em grande número, se encontram em localidades de
padrão urbanístico irregular, o que faz com que as chuvas tenham um poder ainda
mais destrutivo. Além disso, é frequente o transbordamento de rios, que trazem
consequências graves para os 45% dos brasileiros que vivem sem saneamento
básico41, uma vez que essas enchentes podem colocar a população exposta a uma
água contaminada. Nesse sentido, as mudanças climáticas, provocadoras dos
eventos meteorológicos extremos, têm impacto direto no desenvolvimento urbano
e na saúde pública.
No entanto, as mudanças climáticas e o estresse hídrico não são os únicos
fatores que afetam a vida nas cidades. A poluição do ar, causada nas cidades
principalmente pela queima de combustíveis fósseis em meios de transporte, afeta
a qualidade do ar e provoca grandes problemas de saúde pública. De acordo com
dados publicados na plataforma Our World in Data, 71% da população brasileira
está exposta a um ar com concentração de poluição superior às diretrizes da
Organização Mundial da Saúde42. Apesar de ser o melhor resultado da América do

39
IBGE, 2020.
40
IBGE, 2019.
41
ANA, 2020.
42
RITCHIE & ROSER, 2019.
P á g i n a | 30

Sul, a situação é alarmante no país, com a maior parte dos brasileiros correndo
riscos de contrair doenças respiratórias em função da poluição do ar.
Essa mesma poluição, associada ao desmatamento para estabelecimento
dos centros urbanos, cria as chamadas ilhas de calor. Grande parte das cidades
brasileiras não se desenvolveram de maneira planejada, não buscaram a
manutenção da vegetação local e, em razão disso, apresentam hoje variações
consideráveis de temperatura. A figura abaixo traz uma representação do processo.

Figura 12: ilhas de calor43

Uma diferença de temperatura entre 1ºC e 3ºC entre área central e rural é
natural e não representa uma grande preocupação. No entanto, em São Paulo,
cidade mais populosa do país, estudos de 1985 apontam para uma variação de
temperatura superior a 10ºC em alguns bairros paulistanos em comparação à área
rural do estado44. Essa elevação de temperatura também pode trazer problemas
para a saúde pública, agravando fenômenos meteorológicos extremos.

43
AZEVEDO et al, 2012.
44
LOMBARDO, 1985 apud AZEVEDO et al, 2012.
P á g i n a | 31

Assim, fica clara a urgência de se tratar os problemas aqui apresentados pelo


bem da saúde da população. As preocupações que foram relatadas nesta seção
são apenas uma representação mínima de tudo que deve ser levado em
consideração ao se tratar de meio ambiente em escala nacional. No entanto, o
entendimento acerca da parcela mínima de preocupações exploradas aqui é
fundamental para que se compreenda as próximas seções, que tratam,
respectivamente, das preocupações do Oeste Paulista em matéria de meio
ambiente e sobre políticas públicas para a região.

2. PREOCUPAÇÕES AMBIENTAIS NO OESTE PAULISTA

As preocupações ambientais para o Oeste Paulista foram mapeadas por


meio do monitoramento de notícias, agregado à análise de dados disponíveis para
a região. Tendo como parâmetro o tópico anterior, as inquietações regionais são
levantadas em comparação ao cenário nacional.
A realidade interiorana é o agronegócio. Diferentemente das grandes
cidades, é preciso olhar de forma especial para as violações ambientais que
ocorrem no campo.45 Infelizmente, existem muitas violações de direitos humanos
que ocorrem no campo (principalmente, a morte de defensores de direitos
humanos e trabalho em condição análoga à escravidão).
É importante compreender a existência destas violações e sua ligação a
atividades que são prejudiciais ao meio ambiente. Uma carvoaria em Pirajuí46, outra
em Bastos47, uma fazenda de café em Garça48, uma fazenda de cana-de-açúcar em
Marília49 e uma usina hidrelétrica em Flórida Paulista50 estiveram envolvidas com
trabalho escravo ou condições análogas à escravidão.

45
Isto não significa dizer que nossas cidades sejam verdes. As cidades do interior paulista enfrentam
inúmeros problemas em suas áreas urbanas, como por exemplo o descarte de resíduos sólidos. Isto
será discutido com maior profundidade no subtópico 2.4.
46
MPF, 2017.
47
G1, 2014.
48
Eco Debate, 2016.
49
G1, 2014.
50
G1, 2016.
P á g i n a | 32

Primeiro no tópico sobre Mudanças Climáticas e Fenômenos


Meteorológicos Extremos analisaremos diretrizes específicas do estado de São
Paulo sobre a emissão de gases efeito estufa. Após, passamos a entender questões
de Transição Energética, Energias Renováveis e Estresse Hídrico, que tem por foco
a produção sucroalcooleira no interior paulista. Por fim, porém não menos
importante analisaremos a questão do desenvolvimento urbano nas cidades do
Oeste Paulista, que enfrentam múltiplos problemas relacionados à gestão de
resíduos sólidos.

2.1. Mudanças Climáticas e Fenômenos Meteorológicos Extremos

Mudanças climáticas e fenômenos meteorológicos extremos são resultado


da produção desenfreada de gases efeito estufa, conforme denotado nos tópicos
anteriores. Dentre estes gases, o metano é o mais destrutivo.51 Em pesquisas
recentes, estudos patrocinados pela NASA apontaram aumentos dramáticos em
um pequeno espaço de tempo52.
No ano de 2019, a bovinocultura atingiu o número de 10,33 milhões de
cabeças de gado53, colocando-se como a segunda principal atividade agropecuária
do estado de São Paulo. Dentre as principais regiões produtoras do Estado estão
Presidente Prudente, São José do Rios Preto, Araçatuba e Bauru.54 A produção
brasileira representa mais de 15% do total mundial, de acordo com o
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos e a Organização das Nações
Unidas para a Agricultura e a Alimentação.
Segundo os últimos dados fornecidos pela CETESB, o setor agropecuário
paulista produziu 678Gg de metano (678 mil toneladas, em nossa conversão).55
Para o estado de São Paulo, não foram encontrados dados mais recentes sobre a
produção de metano, porém dados nacionais apontam um crescimento
significativo proveniente da produção agropecuária.

51
CETESB, 2017.
52
Wolf, Ghassem & West, 2017.
53
IEA, 2018.
54
Investe SP, 2018.
55
CETESB, 2014.
P á g i n a | 33

As principais emissões do setor devem-se à produção de metano por


fermentação entérica do gado bovino (processo digestivo) e à aplicação de adubos
(manejo de dejetos) e fertilizantes sintéticos com intensa emissão de óxido
nitroso.56

Figura 13: Tabela com estimativa de emissões em CO2eq, para os subsetores do


setor agropecuário no Brasil

56
Estimativas anuais de emissões de gases efeito estufa no Brasil, 2019.
P á g i n a | 34

Em novembro de 2009, com a Lei nº 13.798/2009 foi instituída a Política


Estadual de Mudanças Climáticas, com relação à emissão de gases estufa. Nesta lei,
prometeu-se realizar relatórios a cada cinco anos acerca “Agropecuária”, composto
pelos setores “Fermentação entérica”, “Tratamento de dejetos”, “Cultivo de arroz”,
“Solos agrícolas”, “Queimadas proibidas”, “Queima de resíduos agrícolas” e
“Outros”.57
Em termos de fenômenos meteorológicos extremos, além da produção de
gases, pode-se perceber que a intervenção humana por meio de construções pode
potencializar desastres. Em Rosana,58 chuvas levaram o rio Paranapanema em 97%
(noventa e sete por cento) de sua capacidade, 12 metros acima do nível. O ocorrido
assustou motoristas, alagou áreas de várzea e prejudicou famílias ribeirinhas. A
polícia ambiental foi designada para o acompanhamento dos problemas.
A construção de barragens para geração de energia rompe com a dinâmica
natural dos rios, causando problemas às áreas de reservatório e faixas de
inundação.59 Além disso, conforme a ser explorado, a construção da Hidrelétrica
Porto Primavera60 também gerou controvérsias acerca de sua viabilidade em frente
aos impactos ambientais (biodiversidade) e humanos que causaria.

2.2. Transição Energética e Energias Renováveis e Estresse Hídrico

A produção de energia por meio de hidrelétricas, bem como o uso da cana-


de-açúcar na produção do etanol são tidas como fontes “limpas” de energia.
Ocorre que apesar da fonte dos produtos terem mudado, a cadeia de produção
continua sendo operada com a mesma logística desenfreada.
O estado de São Paulo concentra 55% (cinquenta e cinco por cento) da área
total de cana de açúcar plantada no país, sendo atualmente o maior produtor
mundial de etanol de cana de açúcar. Em 2016-17, a região de Presidente

57
Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, 2009.
58
G1, 2016.
59
Travassos Panisset, 2001.
60
CESP, 2020.
P á g i n a | 35

Prudente/SP produziu 39.1 milhões de toneladas de cana de açúcar, o equivalente


a 518 mil hectares plantados61.
Entre as cidades do Oeste Paulista, destacamos Paraguaçu Paulista (quinto
lugar), Guararapes (sétimo lugar) e Pederneiras (oitavo lugar) no ranking dos
maiores produtores de etanol da região. Em Mirante do Paranapanema, o Grupo
Odebrecht Agroindustrial afirmo que das 395 mil toneladas de açúcar produzidas,
100% serviu para exportação por meio de contratos firmados com empresas que
repassam o produto para refino em grandes centros consumidores do mundo
inteiro.62
Muito embora a cana tenha sido apresentada como solução ao uso
indiscriminado de combustíveis fósseis, a monocultura de latifúndio necessita de
grande quantidade de água para sua produção. Além disso, levanta questões como
a possibilidade de escassez de alimentos, gerando ambiente de insegurança
alimentar. Também gera grandes problemas na fertilidade da terra.
Apesar dos ditos processos se dizerem como sustentáveis pela reutilização
de recursos (bagaço da cana para bovinos ou produção de outros materiais, por
exemplo), diversas organizações levantaram preocupações quanto a processos
que resultam na infertilidade permanente causada pelas queimadas.
No que tange as usinas hidrelétricas, a região concentra grandes projetos. A
Usina Hidrelétrica Engenheiro Sérgio Motta (UHE Porto Primavera), situada no Rio
do Peixe, por exemplo, é a segunda maior hidrelétrica do estado de São Paulo. A
usina está dentre as obras “faraônicas” realizadas no período da ditadura militar e
gerou inúmeros impactos socioambientais.
Inicialmente, foram realocadas mais de 6.000 (seis mil) pessoas, incluindo
membros da comunidade indígena Xavante. Além disso, o projeto alterou a fauna63
e a flora da região, eliminando importantes áreas de várzea – considerada área de
preservação permanente quando ciliar. Além disso, até mesmo se levantou a
possibilidade da geração de um surto de malária, levando em consideração que as
instalações criariam ambiente propício para proliferação de mosquitos.64

61
O Imparcial, 2017.
62
Investe SP, 2020.
63
Travassos Panisset, 2001.
64
Bitencourt et. al. (1999) apud Travassos Panisset, 2001.
P á g i n a | 36

2.3. Proteção da Biodiversidade

Apesar da maior parte da Mata Atlântica se encontre desmatada, a região


ainda possui áreas que merecem atenção pela riqueza de espécies. O
desmatamento é fruto de todas as atividades até então debatidas pelos tópicos
anteriores, que causam degradação da biodiversidade de forma direta
(hidrelétricas, cana-de-açúcar, bovinos etc.).
O município de Rosana guarda grande área de várzea (flora), ao passo que
Teodoro Sampaio guarda uma das últimas áreas de floresta de planalto do país,
com 34.000 hectares de Mata Atlântica em seu interior: o parque estadual Morro
do Diabo.65 Dentro do Parque Estadual, por exemplo, moram onças e outros
animais selvagens que sofrem constantemente com o perigo de serem atropelados
pelas rodovias que os cercam.66
A proteção dessas áreas conta com atuações do Ministério Público Federal67
e o Ministérios Público Estadual, por meio do Grupo de Atuação Especial em
Defesa do Meio Ambiente (GAEMA). O papel destes órgãos é debatido nos tópicos
que seguem, acerca das políticas públicas relevantes.

2.4. Desenvolvimento Urbano, Poluição e Saúde Pública

Apesar de preocupações diferentes dos centros urbanos, o Oeste Paulista


enfrenta problemas para lidar com a gestão de resíduos sólidos e saneamento
básico. Além disso, é preciso se atentar ao impacto da tecnologia nos principais
setores agrícolas, que deslocam muitos trabalhadores do campo68 para as cidades.
Destacamos aqui projeto recente do Consórcio Intermunicipal de Resíduos
Sólidos do Oeste Paulista (CIRSOP), elaborado pela UNESP 69, que visa soluções
efetivas para a gestão e o gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos da região.

65
Site do Morro do Diabo.
66
G1, 2014.
67
O Imparcial, 2018.
68
USP, 2018.
69
Governo de São Paulo, 2020.
P á g i n a | 37

3. POLÍTICAS PÚBLICAS

O terceiro capítulo apresentará de forma breve o conceito de políticas


públicas para que seja possível identificar a sua importância para solução dos
problemas ambientais, bem como, identificará seu desenrolar nos municípios do
Oeste Paulista. Por fim, mostrará a educação ambiental como forma de propiciar
aos cidadãos consciência sobre a necessidade e o direito de acompanhar a tomada
de decisões do Poder Público para a preservação do Meio Ambiente.

3.1. Considerações iniciais

A discussão acerca da relevância do Direito Ambiental decorreu sobretudo


da Revolução Industrial e do processo de urbanização, em que as condições de
vida e o estabelecimento das relações sociais modificaram-se repentinamente.70
Nessa conjuntura, surgiu uma nova divisão do Direito: os direitos difusos.
Para além da clássica concepção público versus privado, esta categoria protege
objetos indivisíveis de titulares indetermináveis, isto é, se preocupam com questões
da coletividade. Logo, o que se tutela, torna-se pertencente e indispensável a
todos.71
Desta feita, o meio ambiente é um direito difuso, e deve ser tutelado pelo
Poder Público por meio de ações positivas, a fim defende-lo e preserva-lo para as
presentes e futuras gerações72. A defesa do meio ambiente ocorre por meio da
prestação de serviços, realizados com o auxílio de atores, pessoas, organizações e
instituições, cujo encargo é de estabelecer programas e ações para que haja
concretização do ordenado, essas medidas são denominadas de políticas
públicas.73
Dessa forma, política públicas são ações, planos ou programas realizados
pelo Estado para o cumprimento de suas atribuições perante a sociedade. Por ser
um sistema de decisões públicas, podem ser dirigidas à manutenção ou
modificação de determinada realidade, com a estipulação de procedimentos,

70
MENDES; CARNEIRO, 2016.
71
MENDES; CARNEIRO, 2016.
72
BRASIL, 1988, não paginado.
73
LIBERATI, 2013.
P á g i n a | 38

estratégias de atuação e reserva dos cursos necessários para atingir os objetivos


definidos.74
O processo de formulação e inserção das políticas públicas envolvem fases,
que ao final repetem-se de forma constante, criando assim um ciclo:

Figura 14: Procedimento de formulação e implementação de políticas


públicas75

Há de se ressaltar que os objetivos deste ciclo devem estar bem


apresentados para a sociedade, podendo verificar se as políticas públicas estão ou
não concretizadas, uma vez que o exercício ininterrupto do setor público somente
ocorre por meio de contribuições da própria comunidade, por meio dos impostos,
taxas, tarifas e afins. Para isso, o monitoramento (última fase) deve ser realizado
pelos próprios cidadãos de maneira permanente.76

74
ASSEMBLEIA DE MINAS, 2020, não paginado.
75
ASSEMBLEIA DE MINAS, 2020, não paginado.
76
SILVA; SOUZA-LIMA, 2010.
P á g i n a | 39

O planejamento e a atuação do Poder Público devem estar vinculados às


necessidades e condições da população local, ainda que tais compreensões sejam
difíceis de constatar, são necessárias, já que condutas organizadas poupam
recursos e apresentam soluções resolutivas.77 Deste modo, para que o Estado
cumpra seu papel perante a sociedade, as políticas públicas devem ser
implementadas “para a concretude dos direitos das pessoas na comunidade onde
vivem.”78
No Estado Democrático de Direito, a atividade estatal sujeita-se ao comando
da lei. A lei emana do legislador, que atendendo aos princípios constitucionais
relacionados à efetividade da Administração Pública, regulamenta a competência
para a fixação das políticas públicas.79 Assim, competência é a responsabilidade e
o encargo atribuído a cada ente federativo (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios) para realização de sua plena gestão.80
Considerando o objetivo do presente tópico, as discussões sobre
competência concentram-se apenas nos municípios: A Constituição Federal de
1988 trouxe a descentralização das medidas protetivas do patrimônio ambiental,
antes concentradas nas mãos do governo federal.81
Atualmente observa-se a ampla autonomia que estes possuem para definir
suas políticas e aplicar seus recursos, conforme permissivos encontrados no Art. 30
da CF, bem como, a competência comum com a União e o Estado quanto aos
cuidados com o meio ambiente, que deve ser protegido por meio da cooperação
dessas esferas de poder, pela transferência de recursos, ou pela cooperação
técnica.82
Além das previsões constitucionais, os municípios podem operar
fundamentados em outras regulamentações, representado por Barros83 como
“Arcabouço para a Gestão Ambiental Local”, consoante a figura abaixo:

77
SILVA; SOUZA-LIMA, 2010.
78
LIBERATI, 2013, p. 83.
79
LIBERATI, 2013, p. 83.
80
TEIXEIRA, 2002.
81
MENDES; CARNEIRO, 2016.
82
TEIXEIRA, 2002.
83
BARROS, 2009, p. 84.
P á g i n a | 40

Figura 15: Arcabouço legal para a atuação municipal84

Destarte, constata-se que os municípios dispõem de um magnificente


conjunto normativo para firmar suas ações, que devem estar destinadas para
alcançar o bem estar social e a melhora na qualidade do meio ambiente. À vista
disso, encerrada a breve exposição acerca do conceito de políticas públicas, passa-
se agora a análise destas no Oeste Paulista.

3.2. Políticas públicas no Oeste Paulista

Num contexto de descentralização da gestão estatal e importância da


existência de agentes públicos municipais que conhecem a realidade local,
apresentam-se agora, exemplos de ações tomadas pelos gestores das cidades-

84
BARROS, 2009, p. 84.
P á g i n a | 41

polo do Oeste Paulista, (Presidente Prudente, Bauru, etc.) capazes de refletir na


realidade geral da população que as compõe.

3.2.1 Programa Município Verde Azul

Conforme noticiado85, pela primeira vez, em 05 de março de 2020,


Presidente Prudente recebeu da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente, o
Selo do Programa Município Verde Azul (PMVA), considerado como o maior
reconhecimento do Estado de São Paulo àqueles que se destacam em ações de
sustentabilidade promovidas em suas gestões; e também o “Prêmio Governador
André Franco Montoro”, por ter se destacado na Unidade de Gerenciamento de
Recursos Hídricos Pontal do Paranapanema, a UGRHI22.86
Desde 2007, data de lançamento do Programa Município Verde Azul pelo
Governo do Estado de São Paulo, o município de Presidente Prudente adere ao
Programa, e de acordo com a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA),
o PMVA tem por principal objetivo estimular e auxiliar as prefeituras paulistas na
elaboração e na execução de suas políticas públicas, medindo e apoiando a gestão
ambiental com a descentralização e valorização da agenda regional. Para o alcance
do propósito, é oferecida capacitação técnica aos interlocutores indicados pela
municipalidade.87
Entre as atuações realizadas por Prudente mencionam-se: manutenção de
uma nascente modelo; gestão sustentável do Centro Cultural Matarazzo; a política
de conservação de estradas rurais e manutenção da frota; destinação consciente e
reutilização de cartuchos das impressoras das secretarias e departamentos
municipais; aquisição de produtos para Merenda Escolar da agricultura familiar;
início da instalação do espaço árvore, em que nas calçadas o espaço permeável é
expandido, recebendo gramas e/ou pedriscos e identificação referenciada; entre
outros.88

85
PRESIDENTE PRUDENTE, 2020.
86
PRESIDENTE PRUDENTE, 2020, não paginado.
87
DEINC - Departamento de Informação ao Cidadão, 2020.
88
BUOSI, 2020, não paginado.
P á g i n a | 42

Dentre 600 municípios, a capital do Oeste Paulista ocupou o 17º lugar na


classificação, somando 91,26 pontos; além disso, a certificação também estendeu-
se para mais oito cidades da região de Presidente Prudente, quais sejam:
Adamantina com 83,62 pontos, Inúbia Paulista com 80,84 pontos, Junqueirópolis –
com 87,31 pontos, Monte Castelocom 84,22 pontos, Sagres com 86,74 pontos,
Santa Mercedes com 80,91 pontos e Tupi Paulista com 84,79 pontos.
Para melhor compreensão acerca do Programa Verde Azul, os
pesquisadores solicitaram informações básicas à Secretaria de Infraestrutura e Meio
Ambiente, por meio do “Portal Prudente Transparente”89, perguntamos em que
consiste o Programa; se este fornece subsídios para elaboração de políticas
públicas; e existem diretrizes para proteção contra o desmatamento.
Assim, passa-se a apresentar sucintamente os dados fornecidos.
Presentemente, o Programa é conduzido pela Resolução nº 033/2018, a qual
estabelece 10 diretivas norteadoras para a constituição da agenda ambiental local
com a indicação de temas estratégicos, sendo eles: Município Sustentável,
Estrutura e Educação Ambiental, Conselho Ambiental, Biodiversidade, Gestão das
Águas, Qualidade do Ar, Uso do Solo, Arborização Urbana, Esgoto Tratado e
Resíduos Sólidos. Para cada uma das diretivas são apontadas tarefas específicas,
classificadas em atitude, gestão e resultado, utilizadas a depender do tema
escolhido.
Ao final de cada ciclo anual, o município encaminha aos técnicos do PMVA
suas 85 tarefas, baseadas em ações ligadas às diretivas do Programa. “A
qualificação é considerada pelos executivos como um ‘simulado’”90, pois ao final da
análise, publica-se o “Ranking Ambiental dos municípios paulistas”, resultado das
avaliações das informações fornecidas pelos municípios participantes, medindo-se
a eficácia das ações executadas.
A partir deste, é publicado o Indicador de Avaliação Ambiental (IAA) para
que o poder público e a população possam utilizá-lo como norteador na
formulação e aprimoramento de políticas públicas. Além disso, O Ranking
possibilita a outorga das premiações:

89
PRESIDENTE PRUDENTE, 2020.
90
SÃO PAULO, 2019, não paginado.
P á g i n a | 43

Certificado/Selo Município VerdeAzul que reconhece por meio do sistema


de pontuação (superior a 80 até 100) uma boa gestão municipal; e o Prêmio
Governador André Franco Montoro (nomenclatura em homenagem ao criador do
Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA e defensor da descentralização
governamental e fortalecimento dos municípios), concedido àqueles que atingem
melhor colocação em cada uma das Unidades de Gerenciamento de Recursos
Hídricos – UGRHI’S. Ambas conquistadas por Presidente Prudente conforme
histórico abaixo:

Figura 16: Histórico das notas de Presidente Prudente91

Figura 17: Pontuação obtida por Presidente Prudente no ano de 201992

91
SECRETARIA MUNICIPAL DO MEIO AMBIENTE DE PRESIDENTE PRUDENTE, 2020.
92
SECRETARIA MUNICIPAL DO MEIO AMBIENTE DE PRESIDENTE PRUDENTE, 2020.
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A SEMEA93 asseverou que as condecorações ocorreram em virtude da


“relevância dada às questões ambientais no município e pelo esforço em executar
as ações propostas, tendo em vista a articulação entre os diferentes setores da
administração pública municipal.”
Por fim, o PMVA pode ser fonte de estímulo econômico, pois conforme
esclarecido por Marcos Penido, secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente, surge
a possibilidade de agregar valor aos produtos gerados pelos municípios: as
cidades contempladas ganham o direito de utilizar a logomarca da certificação para
incorporar preço às transações comerciais as mercadorias regionais. “É um símbolo
que gera recurso [...]. O mundo sustentável abre uma nova oportunidade e vamos
buscar a certificação para que essa seja a consciência do nosso Estado.”94
Contudo, nem todos os questionamentos foram respondidos. “Quanto às
informações sobre desmatamento necessário procurar a Polícia Ambiental.
Acredito que as informações serão mais concretas.”95
O memorando enviado como resposta evidencia adversidade nacional,
explícita em âmbito regional: a desarticulação entre os órgãos ambientais. 96

3.2.2 Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos (FID)

Outra notícia divulgada em 31 de outubro de 2018 que merece destaque


(https://www.al.sp.gov.br/noticia/?31/10/2018/projetos_de_meio_ambiente_em_
municipios_do_oeste_paulista) enuncia: “municípios do Oeste Paulista estão sendo
beneficiados com recursos por meio do Fundo Estadual de Defesa dos Interesses
Difusos (FID), órgão da Secretaria Estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania, do
governo de São Paulo, conforme publicação no Diário Oficial desta quarta-feira
(31/10).”97

93
SEMEA, Secretaria Municipal Meio Ambiente, 2020, não paginado.
94
SÃO PAULO, 2019, não paginado.
95
SEMEA, Secretaria Municipal Meio Ambiente, 2020, não paginado.
96
A desarticulação entre os órgãos ao longo dos anos se tornou motivo de destaque nos veículos
de comunicação. Em 2015, o jornal Hoje em Dia noticiou que a falta de conexão favorece o
comércio ilegal de animais; por sua vez, em 2016 o jornal ND Mais divulgou que a falta de
integração entre órgãos de fiscalização. abre caminho para crimes ambientais; por fim, em 2019,
O Globo publicou que documentos relatam ‘desarticulação’ entre Exército e Ibama na Amazônia e
que essa falta de sintonia tem gerado problemas.
97
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2018, não paginado.
P á g i n a | 45

Mais uma vez os pesquisadores por meio do Sistema Fale Conosco,


solicitaram à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo informações acerca da
distribuição desses recursos, se a destinação dada abrangeu o Meio Ambiente e se
existiram políticas públicas visando o combate ao desmatamento na região do
Oeste Paulista. O retorno seu deu por e-mail no dia 13 de outubro de 2020 em um
documento word, sob protocolo de nº 12549, posteriormente convertido em PDF
vide anexo.
Preliminarmente à apresentação da resposta, oportuno esclarecer os
objetivos do Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos (FID). Segundo a
Secretaria da Justiça e Cidadania98, o propósito é realizar o financiamento de
projetos destinados ao ressarcimento - despesas relacionadas à prevenção,
preservação e reparação - dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor,
a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, ao
contribuinte, às pessoas com deficiência, ao idoso, à saúde pública, à habitação e
urbanismo e à cidadania, bem como a qualquer outro interesse difuso ou coletivo
do Estado de São Paulo (art. 2º da Lei Estadual nº 6.536/89).99
A obtenção dos recursos está prevista no art. 3º da Lei nº 6.536/89 e advém:
do pagamento de indenizações em condenações por danos causados aos bens
juridicamente tutelados (acima mencionados) e multas decorrentes do
descumprimento das condenações; do rendimento de depósitos bancários e
aplicações financeiras; das contribuições e doações de pessoas físicas e jurídicas,
nacionais ou estrangeiras; e do produto de incentivos fiscais estipulados a favor dos
bens mencionados no art. 2º.100
Os municípios interessados podem submeter seus projetos à análise do
Conselho Gestor do FID quando existirem editais convocatórios. De 2010 a 2018,
130 foram selecionados, perfazendo um investimento de quase R$200 milhões. O
último Edital de Chamamento Público ocorreu em novembro de 2017, a pré-
seleção foi divulgada em fevereiro de 2018, oportunidade em que 238 foram
aprovados para a segunda etapa, inclusive da região do Oeste Paulista.101

98
SECRETARIA DA JUSTIÇA E CIDADANIA, 2020, não paginado.
99
SÃO PAULO, 1989, não paginado.
100
SÃO PAULO, 1989, não paginado.
101
SECRETARIA DA JUSTIÇA E CIDADANIA, 2020.
P á g i n a | 46

Realizado os apontamentos com intuito de facilitar o entendimento acerca


do que vem a ser o FID, doravante expõe-se o conteúdo do retorno da Assembleia.
Em síntese, o correspondente se limitou a indicar links para consulta sobre
os acontecimentos questionados. Apontou o website da lista de aprovados na
segunda etapa do edital; o website portal do FID; e por fim o website do portal da
ALESP para acesso do Balanço Geral do Exercício de 2018 onde estariam os dados
sobre a destinação dos recursos (um arquivo de 1.062 páginas de complexa
inteligência).
Apesar disso, foi possível constatar a aprovação de dois projetos
apresentados por municípios do Oeste Paulista: Bauru - Reestruturação e
Acessibilidade do Museu Histórico Municipal; Presidente Prudente - Revitalização
do Parque Ecológico da Zona Leste; e a reprovação de outros três, Araçatuba -
Execução de obras e serviços de reconstituição, estabilização, proteção e
recuperação ambiental da margens do [...]; Bauru - Parque Lagoa da Quinta E "De
Galho em Galho" - Compostar para Transformar; Presidente Prudente -
Modernização Digital do Museu e Arquivo Histórico Prefeito Antônio Sandoval
Netto.
Conforme nota-se, independentemente de aceitação ou não, dos 5 projetos
propostos, 3 tratavam de matérias de cunho ambiental, fato este indicativo de
preocupação por parte do Poder Público no que tange a um meio ambiente
ecologicamente equilibrado.
Porém, em 12 de fevereiro de 2020, o Conselho Gestor do FID deliberou na
49ª Reunião Ordinária o arquivamento dos processos aprovados a partir da
classificação 150ª a 242ª (Presidente Prudente havia se classificado em 236ª
posição) considerando a necessidade de atualizações de natureza técnica e
orçamentária, que poderão serem feitas pelos interessados, quando da publicação
de um novo edital de chamamento público. O comunicado foi publicado em 21 de
março de 2020 no Diário Oficial do Estado de São Paulo.102
Isto significa que, apesar dos esforços municipais, desta vez os recursos do
FID não serão destinados à revitalização do parque ecológico, oportunidade

102
DIÁRIO OFICIAL DE SÃO DE PAULO, 2020.
P á g i n a | 47

postergada para outro momento oportuno, cabendo ao órgão do município


atentar-se aos editais, bem como participar de novas políticas públicas e programas
oferecidos pela integração dos entes governamentais.

3.2.3 Grupo de Atuação Especial em defesa do Meio Ambiente –


GAEMA

Além das informações obtidas por meio dos sistemas de atendimento


eletrônico, os pesquisadores em busca do aprofundamento na temática,
solicitaram uma reunião com o Dr. Gabriel Lino de Paula Pires - Promotor de Justiça
do Estado de São Paulo, Secretário Regional do GAEMA - Pontal do Paranapanema.
A qual foi concedida e realizada em 27/10/2020 sob protocolo nº 594/20 pelo
aplicativo Microsoft Teams devido a pandemia provocada pelo novo coronavírus,
vide anexo (printscreen).
De modo a elucidar, os Promotores de Justiça de urbanismo e meio
ambiente “têm como missão promover e defender os valores ambientais, culturais
e humanos que garantam um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as
presentes e futuras gerações, contribuindo no processo de transformação
social.”103
Para isso, valem-se das prerrogativas constitucionalmente previstas acerca
das funções institucionais do Ministério Público. Dentre as quais destacam-se o
Inquérito Civil, a Ação Civil Pública (art. 129, inciso III, da Constituição Federal) e o
Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), todos instrumentos viabilizadores de
justiça ambiental, de caráter protetivo, preventivo e reparatório. Para a
concretização do disposto de forma mais eficaz, surgem os grupos de atuação
especial, em evidência neste trabalho, o GAEMA.
Ao Poder Público incumbe defender os interesses da sociedade, dentre eles,
o direito a um Meio Ambiente saudável e autossustentável.104 Tendo em vista que
os problemas ambientais são capazes de atravessar fronteiras, alcançar grandes

103
MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO, 2020, não paginado.
104
Ata da Reunião (Protocolo nº 594/20 GAEMAPP), vide anexo.
P á g i n a | 48

áreas, quiçá gerar consequências em todo o território nacional, fez-se necessária a


mudança no delineamento das competências.
Incutiu-se a ideia de uma atuação regionalizada, identificando, prevenindo e
reprimindo as atividades causadoras de degradação ambiental no Estado de São
Paulo, instituindo assim o Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente, que
cuida de temas prioritários em âmbito regional.
É preciso salientar que Meio Ambiente não é intocável, e apesar das decisões
que o afetam serem tomadas por uma parcela ínfima da sociedade, todos os
cidadãos são atingidos, justificando a necessidade de ações locais, uma vez que
“normas de proteção ambiental nada mais são do que normas de proteção de
direitos humanos mais básicos e elementares.”
Os pesquisadores elaboraram para a reunião questionamentos com base na
Resolução nº 1.220/2020-PGJ, de 17 de agosto de 2020, a qual define metas gerais
e regionais para a atuação do GAEMA e da Rede de Atuação Protetiva do Meio
Ambiente, para o ano de 2020105, vide anexo. Expõem-se agora as indagações e as
explicações relativas às políticas públicas no Oeste Paulista.
Notou-se que na resolução acima referida, existe uma vasta quantidade de
metas a serem cumpridas por meio das políticas públicas, as quais abrangem
diversas matérias, como saneamento básico, resíduos sólidos, atividades de
grande impacto ambiental, dentre outras. Por esse motivo, perguntou-se de que
maneira as ações são feitas para que todas aquelas previsões sejam cumpridas, sem
juízo de valor de relevância.
Vossa Excelência esclareceu que em sua opinião, não são metas, e sim temas
que carecem igualmente de cuidados. À vista disso, em tese todas as disposições
possuem a mesma relevância, o que se altera são as estratégias de atuação, os
instrumentos utilizados pelo MP para o cumprimento a depender da necessidade
encontrada na região, a título exemplificativo, mencionou que a questão dos
resíduos sólidos ainda é deficientemente tratada, logo, uma atuação mais enfática
é essencial e a via judicial é mais aconselhável nesses casos; enquanto outras

105
MPSP, 2020.
P á g i n a | 49

podem ser tratadas pela via extrajudicial, utilizando-se de recomendações, sem


caráter vinculante.
Apesar do MP poder se valer desses recursos, o Promotor constatou o fato
de que a instituição não possui aparelhamento para ser a constituidora das políticas
públicas. Ainda que evolução social tenha conduzido à interação das instituições, o
funcionamento aperfeiçoado e harmônico destas, há que se respeitar a
abrangência dos demais poderes.
Acrescentou que o MP não dispõe de poder coercitivo nem de
judicialização, devendo operar com cautela, não incorrendo em ações que
substituem um órgão por outro, sendo preferível a existência de subsídios para que
o desempenho das funções seja feito da forma mais profissional e benéfica possível
à sociedade.
Nesta baila, encontra-se a principal dificuldade para implementação e
desempenho das políticas públicas: a falta de subsídios, isto é, a crise orçamentária,
agravada neste momento pela situação pandêmica mundial trazida pelo Covid-19,
impasse não concernente ao Ministério Público e sequer ao GAEMA.
Outros pontos também foram discutidos no encontro, como a questão do
desmatamento, monocultura extensiva, biodiversidade, agrotóxicos, normas
nacionais frente às internacionais, etc. Todavia, a fim de não evadir-se da temática
proposta para este tópico, justifica-se a concentração das opiniões e impressões
pessoais do convidado sobre políticas públicas.
Ressalta-se que o encontro representou o verdadeiro significado de
democratização do conhecimento, já que uma pequena parte do vasto universo do
Meio Ambiente foi aclarada, matéria muitas vezes desconhecida pelos cidadãos e
não estudada com afinco pelos estudantes de Direito nos bancos das universidades

3.2.4 Programa Produtor de Água (PPA)

As estradas rurais na bacia do Rio Santo Anastácio devem receber investimento


de mais de R$1 milhão para fins de conservação e adequação.106 A bacia
hidrográfica do alto curso do Rio Santo Anastácio, em Presidente Prudente deve

106
Noticiado pelo jornal G1 em 31 de outubro de 2020. FONSECA, 2020, não paginado.
P á g i n a | 50

ser contemplada com o investimento de R$ 1.015.337,55, sendo R$ 1.000.337,55


de repasse do governo federal, por meio da Agência Nacional de Águas e
Saneamento Básico (ANA), e R$ 15.000 de contrapartida de Presidente Prudente.
Para uma melhor compreensão da informação divulgada pelo jornal online,
os pesquisadores acessaram o website da Agência Nacional de Águas (ANA),
(autarquia federal responsável pela criação do Programa Produtor de Água (PPA),
objeto de estudo do tópico em tela), oportunidade em que se encontrou um vídeo
educativo para livre acesso e de simples assimilação, cujo texto fora transcrito e
passa-se a expor.

Figura 18: Print Screen do vídeo didático sobre o Programa Produtor de Água (PPA).107

No Brasil, 70% da água doce é aplicada na agropecuária. Tal dado evidencia


a destinação de grande parte deste recurso natural limitado à atividade, que deve
ser controlada e coordenada, uma vez que os impactos ambientais negativos
podem ser infindos, e ainda não limitados ao local de origem, encadeando-se,
atingindo toda a bacia hidrográfica, alterando o meio ambiente e a vida da
população.108

107
CANAL ‘ANAGOVBR’ DO YOUTUBE, 2014.
108
ANAGOVBR, 2014, online, não paginado.
P á g i n a | 51

Dentre as possíveis consequências prejudiciais, destacam-se os agrotóxicos


e fertilizantes quando utilizados de forma desordenada podem contaminar o solo,
os lençóis freáticos, rios e lagos; ocorrência de redução da vazão dos córregos, rios;
degradação das águas; desmatamento, erosão e assoreamento. Porém, a
produção resultante do campo é responsável por movimentar em larga escala a
economia do país, e as propriedades rurais fornecem maior cobertura vegetal e
preservação da fauna.109
Nesse contexto, os produtores possuem papel indispensável para que os
efeitos positivos sejam superiores aos negativos. Contudo, as soluções despendem
de investimentos além dos monetários, tais como técnicos, o que muitas vezes se
torna um encargo custoso ao proprietário. Em vista disso, o ANA criou o PPA,
usando o conceito de PSA: Pagamento por Serviços Ambientais.110
O sistema PSA incentiva os produtores rurais a adotarem boas práticas
conservacionistas, pois a sociedade local beneficiárias dos serviços e cuidados
ambientais, se organiza para remunerar esses serviços, ou seja, o produtor
encarrega-se de cuidar das águas e para isso recebe dinheiro e apoio técnico para
diversas ações, como construção de terraços, readequação de estradas rurais,
recuperação e proteção de nascentes, reflorestamento e manutenção de reservas
florestais. 111
Vejamos:

A ideia se baseia no princípio que há um grupo de pessoas interessadas


no produto água e dispostas a contribuir e, por outro lado, há os
produtores rurais que podem integrar-se e possibilitar a conservação de
recursos hídricos mediante o manejo adequado de suas propriedades,
transformando-as assim em prestadoras de serviços ambientais que, por
sua vez, são exportados para fora de seus limites e alcançam a população
beneficiária.112

Assim, os produtores rurais, além de produzir grãos, carne e leite, também


melhoram a quantidade e a qualidade da água da região. Cerca de 1.200 já

109
ANAGOVBR, 2014, online, não paginado.
110
ANAGOVBR, 2014, online, não paginado.
111
ANAGOVBR, 2014, online, não paginado.
112
AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUA, 2018, p. 1.
P á g i n a | 52

aderiram à iniciativa, abrangendo uma área de cerca de 400 mil hectares, dos quais
40 mil já foram recuperados pelo Programa Produtor de Água. O apoio já
beneficiou habitantes das regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro,
Palmas, Rio Branco, Campo Grande, Goiânia e Brasília, agora favorecendo também
o Oeste Paulista.113
No caso do projeto do manancial do Rio Santo Anastácio, o projeto
norteador das ações é o Plano Integrado de Recursos Hídricos da Bacia
Hidrográfica do Rio Paranapanema (PIRH-Paranapanema), no qual para que haja
efetiva atuação, somam-se esforços entre instituições públicas e privadas,
comunidade urbana e rural, sendo parceiras as seguintes instituições:
Prefeitura de Presidente Prudente; Sindicato de Produtores Rurais de
Presidente Prudente; Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA);
Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paranapanema (CBH-Paranapanema);
Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) no município; Companhia de
Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP); Coordenadoria de
Desenvolvimento Rural Sustentável (CDERS); Universidade Estadual Paulista
(UNESP) de Presidente Prudente; Associação de Recuperação Florestal do Pontal
do Paranapanema (Pontal Flora).114
Frisa-se que a participação do CBH-Paranapanema é uma iniciativa inédita,
tendo sido escolhido por ter uma metodologia diferenciada, baseada em ações em
execução, uma delas o PSA. Até hoje o PPA tinha sido trabalhado de forma direta
com os municípios, a participação do Comitê valoriza o Sistema de Gerenciamento
de Recursos Hídricos (SINGREH), demonstrando que o PIRH-Paranapanema está
realmente sendo executado. Nesse cenário, Presidente Prudente, localizado em
uma das bacias prioritárias do Paranapanema, é o primeiro município a participar
da iniciativa.115

113
FONSECA, 2020.
114
FONSECA, 2020.
115
FONSECA, 2020.
P á g i n a | 53

3.3 Educação Ambiental e participação social

A CF/88 trouxe pela primeira vez na história do Brasil um tratamento especial


de proteção jurídica ao meio ambiente. Dentre as previsões encontra-se o direito à
educação ambiental em todos os níveis de ensino e conscientização pública para a
preservação. A Educação Ambiental é como um poderoso instrumento de
erradicação do desconhecimento acerca de uma matéria de vital importância, a fim
de proporcionar meios de superação dos problemas, existentes entre a garantia
dum ambiente saudável versus o progresso e desenvolvimento do país.116
“O desenvolvimento e o progresso devem caminhar juntos com a proteção
ao meio ambiente; caso contrário, colocaríamos em risco a própria existência
humana.”117 Nesse segmento, defendem que o binômio educação/ambiente
desaparecerá com o tempo, uma vez que a educação terá que ser ambiental, ou
simplesmente não será, no sentido de construir uma nova sociedade sustentável,
em busca de sentido e significação para a existência do homem.
No século XXI, afora a emergência ecológica, há também uma crise
socioambiental. Refere-se ao estilo de pensamento predominante na sociedade e
que sustenta a modernidade: dominação da natureza e mercantilização do mundo.
Os sujeitos externalizam condutas sociais autodestrutivas, seja nos espaços
externos, na degradação da natureza e na própria qualidade de vida, e por tal
razão, a solução dos problemas baseada na gestão dos recursos naturais não é mais
suficiente. “A resolução requer amadurecimento da espécie humana, ruptura das
hipocrisias sociais, construção de novos desejos, de novos horizontes, de novos
estilos de pensamento e de sentimentos.”118
Desta forma, a complexidade da questão ambiental vai além, emergindo a
indispensabilidade de que os processos educativos propiciem a obtenção de
conhecimento e habilidades para que possam intervir de forma ativa nos processos
decisórios, a fim de modificar a realidade do local sobre o qual recai a

116
IBRAHIN, 2014.
117
IBRAHIN, 2014, p. 74.
118
PHILIPPI JR; PELICIONI, 2014, p. 445.
P á g i n a | 54

problemática. Logo, a educação ambiental no aspecto político, visa à participação


do cidadão na formação de soluções, reflexões e na tomada de decisões.119
No entanto, historicamente, a formação brasileira se deu nos moldes
paternalistas, isto é, há uma visível predisposição da sociedade em abdicar de suas
reivindicações, transferindo tais responsabilidades para as classes dominantes.
Assim, poucos são os processos significativos de participação da população na
discussão dos problemas comuns encontrados na história, resquícios ideológicos
presentes na atualidade.120

A divisão de poder faz parte do sistema democrático. Na prática, porém, a


atuação do povo nesse poder termina na eleição de representantes da
sociedade para a defesa de seus interesses. No entanto, a sociedade
acompanha com muita timidez o desempenho dos representantes eleitos.
Por essa razão, o poder costuma ser exercido na defesa de interesses
pessoais e políticos, em detrimento dos anseios da coletividade.121

Por conseguinte, cabe à educação ambiental instruir os indivíduos para o


exercício da cidadania, que assumam seus direitos e deveres com uma visão
interdisciplinar integrada de mundo, considerando que os dilemas ambientais, os
aspectos biológicos e físicos também são problemas sociais, econômicos, culturais
e vice-versa. Adotando, portanto, uma postura participativa e crítica sobre as
deliberações que os cercam, uma vez que “todo poder emana do povo.”122
Quanto à atuação dos indivíduos, existência de inúmeras maneiras para
participar das instâncias decisórias, dentre elas, por meio dos Conselhos de Meio
Ambiente, que são os fóruns instituídos para exercício do controle social sobre as
políticas públicas. Caracterizam-se por serem espaços abertos à formulação e às
proposições de ações para atender as necessidades locais, bem como para avaliar
as aplicações dos recursos financeiros existentes.123
Com o escopo de identificar novos possíveis meios de integração da
participação da população sobre as questões ambientais, como também das
políticas públicas, durante a formação do referencial teórico, os pesquisadores

119
PHILIPPI JR; PELICIONI, 2014.
120
PHILIPPI JR; PELICIONI, 2014.
121
PHILIPPI JR; PELICIONI, 2014, p. 467.
122
BRASIL, 1988, não paginado.
123
PHILIPPI JR; PELICIONI, 2014.
P á g i n a | 55

depararam-se com a Agenda 21 Local, a qual será discutida e evidenciada no


tópico seguinte.

3.3.1 Agenda 21 Local

Sabe-se que a relação do homem com o meio ambiente existe desde os


primórdios da sociedade, no entanto, a consciência acerca da imprescindibilidade
de sua preservação é tópico de discussão recente. Um símbolo de referência dessa
mudança de concepção ocorreu na Rio 92 - Conferência das Nações Unidas sobre
o Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, definida como um instrumento de
planejamento participativo visando o desenvolvimento sustentável. Durante a
reunião, concebeu-se um documento de substancial importância: a Agenda 21,
assinada por 179 países que tem por finalidade estabelecer princípios e ações de
gestão ambiental para o Século XXI.124
Na reunião ficou acordado que os países deveriam desenvolver as
respectivas Agendas 21 nacionais, traduzindo as propostas convencionadas para a
realidade e o contexto pátrio. Em relação às particularidades regionais, a AG21
mundial também aconselhou aos municípios e as regiões o desenvolvimento e
elaboração da Agenda 21 Local.125
A Agenda 21 Local é o processo de formação de planejamento participativo,
ou seja, o plano de desenvolvimento sustentável de determinado território é
elaborado pelas autoridades locais em parceria com vários setores, incluindo ainda
toda a comunidade, implantando-se na região o Fórum de Agenda 21, composto
pelo governo e a sociedade civil.

[...] o Fórum é responsável pela construção de um Plano Local de


Desenvolvimento Sustentável, que estrutura as prioridades locais por meio
de projetos e ações de curto, médio e longo prazo. No Fórum são também
definidos os meios de implementação e as responsabilidades do governo
e dos demais setores da sociedade local na implementação,
acompanhamento e revisão desses projetos e ações. 126

124
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2020.
125
MOURA, 2016.
126
CONEXÃO AMBIENTAL, 2020, não paginado.
P á g i n a | 56

Trata-se de um processo contínuo, que não se encerra com a concepção de


um documento norteador, já que não existe um índice de coisas a serem feitas, mas
compromissos, que incluem diversas atividades, a serem escolhidas de acordo com
as circunstâncias locais. A fim de auxiliar e fomentar a instauração dos Fóruns
municipais, a coordenação da Agenda 21 do Ministério do Meio Ambiente
elaborou uma metodologia visando orientar os processos de implantação, à
disposição para visualização e download online127.
As instruções servem de apoio mas não são vinculativas, pois “cada Agenda
21 local pode buscar sua própria ‘fórmula do sucesso’, resultado da influência da
conjuntura local no processo.”128 Como realizado pelo município de São Paulo, que
teve sua AG21 aprovada pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Sustentado
(CADES) em agosto de 1996. “É o resultado de uma etapa de trabalho, iniciada
após a Rio 92, e visa instrumentalizar o poder municipal no sentido de combinar
desenvolvimento econômico, proteção ao meio ambiente e justiça social.”129
Apesar da existência do programa na capital, por meio de pesquisas, os
pesquisadores notaram que até o momento atual, não houve a elaboração de
Agendas nos municípios do Oeste Paulista. Medida esta que seguramente serviria
de incremento à participação popular na tomada de decisões sobre as questões
ambientais, representando o progresso da efetivação da cidadania, sendo
apresentada neste tópico como possível meio de intervenção social, a fim de
proporcionar melhorias nas condições de vida da comunidade, incutindo os ideais
políticos de defesa dos recursos indispensáveis à pessoa humana.

3.3.2 Considerações Finais

No que tange a coleta de dados sobre a incidência de políticas públicas na


região do Oeste Paulista, os pesquisadores encontraram dificuldades. São medidas
que quando analisadas abstratamente aparentam ser triviais, já que em um Estado
Democrático de Direito, as atividades são desempenhadas para o povo, em

127
Manual sobre Agenda 21 Local, MMA.
128
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2020, não paginado.
129
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2020, não paginado.
P á g i n a | 57

respeito aos Direitos Humanos, fundamentais e naturais garantidos a todos os


cidadãos.
Entretanto, são informações de difícil obtenção, não há um documento
publicado expondo os feitos já realizados, os processos, os órgãos envolvidos, os
recursos utilizados, que dirá se houve ou não participação popular para a
implementação. Por isso, essa parte da pesquisa se embasou tão somente nas
informações divulgadas pelos veículos de comunicação, que tendo por função
precípua difundir notícias ao público, não precisam apresentar os pormenores, em
razão de não se tratar de dever.
Assim sendo, os pedidos de complementação dos materiais, bem como de
detalhamentos foram necessários e efetuados por meio de solicitações via e-mail
perante os órgãos acima apresentados. O que não significou notáveis resultados,
com efeito, surgiram novas realidades a serem questionadas e refletidas, tais como
a desarticulação entre os órgãos do Meio Ambiente e ainda a ausência de
solicitude, tendo em vista respostas meramente indicativas.
Mesmo desta maneira, constatou-se que a região do Oeste Paulista, em
destaque o município de Presidente Prudente, têm se engajado para fazer parte
das políticas públicas, com envios de projetos, inscrição a programas, cumprimento
de metas, incentivo às condutas de preservação.
Por fim, dentre os recursos utilizados, enfatiza-se a reunião realizada com Dr.
Gabriel Lino de Farias Pires - Promotor de Justiça do Estado de São Paulo,
Secretário Regional do GAEMA - Pontal do Paranapanema, que apesar de não ter
sido realizada exclusivamente para tratar de políticas públicas, deixou um benéfico
ensinamento: a melhor forma de se conscientizar sobre o tema ambiental decorre
do ato de aprender, a troca de informações permitida pela comunicação entre os
indivíduos torna o estudo dinâmico, sobretudo quando proveniente de experiência
e familiaridade com a coisa pública.
Motivo pelo qual apresentou-se a Educação Ambiental como um
instrumento para a formação de cidadãos críticos capazes verdadeiramente de
exercer a cidadania, por meio da fiscalização das tomadas de decisão pelo Poder
Público quanto as questões ambientais; da exigência da instituição de programas
e espaços que permitam a participação popular, como a Agenda 21 Local.
P á g i n a | 58

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P á g i n a | 65

ANEXOS

ANEXO A – PORTAL PRUDENTE TRANSPARENTE – SECRETARIA DE


INFRAESTRUTURA E MEIO AMBIENTE DE PRESIDENTE PRUDENTE

ANEXO B – SISTEMA FALE CONOSCO – ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO


DE SÃO PAULO

ANEXO C – REUNIÃO Nº 594/20 – GRUPO DE ATUAÇÃO ESPECIAL EM DEFESA


DO MEIO AMBIENTE (GAEMA)
P á g i n a | 66

EIXO LGBTQIAP+ E GÊNERO | ODHOP

INTRODUÇÃO

Para identificar e promover uma melhor compreensão dessa população tão


heterogênea, entendendo as mudanças na sigla como disputa de narrativas e que
ela carrega outras variâncias, adotaremos a sigla LGBTQIAP+ (lésbicas, gays,
bissexuais, travestis, transgêneros, queers, intersexuais, assexuais, pansexuais) e
outras expressões que designa um grupo de orientações e identidades que
compõem o campo mais amplo da “diversidade sexual”.
Diferentes dimensões da vida podem ser afetadas pela condição de ser
LBTQIAP+, sobretudo pelo fato de ser um grupo que foi histórico e culturalmente
estigmatizado, e que segue ainda atingido por limitações e violações de seus
direitos. Tal situação se agrava ainda mais no atual governo, que vem gerando
ainda mais barreiras no que se refere à efetivação de políticas públicas que
objetivem assegurar os direitos dessa população, posta à margem da sociedade,
ou melhor, fora da margem.
Neste processo de exclusão, marcação e estigmatização dessa população,
de acordo com Bento (2003)130, deve-se ter a preocupação de dar audibilidade e
visibilidade, permitindo um olhar ampliado para essas experiências, considerando
os diferentes marcadores e como eles se cruzam, uma vez que, ao se pensar as
vivencias LGBTQIAP+, é preciso também fazer uso deste olhar interseccional,
observando como os marcadores irão atravessar estes sujeitos de modos
diferentes, a conjugar outras possibilidades de ser e estar no mundo. Essa
intersecção de categorias de análise nos possibilita a elaboração de reflexões
comprometidas com a realidade e com a crítica social, sobretudo na área
geográfica de atuação do Observatório, em que as vivências de gênero e
sexualidade são atravessadas por marcadores e valores tradicionais e
conservadores, característicos de uma região interiorana.

“A sociedade tenta materializar nos corpos as verdades para os gêneros através das reiterações
130

das instituições sociais” (BENTO, 2003, p. 4)


P á g i n a | 67

Essas práticas discriminatórias e os estigmas que essa população carrega


não partem apenas da sociedade em sua totalidade, mas também de instituições
sociais. Estão também ligadas a outros marcadores que não apenas o de gênero,
mas também o de classe, raça, deficiência e outras intersecções que atravessam
estes corpos dissidentes. Dessa forma, não podemos, portanto, desconsiderar a
existência da LGBTQIAP+fobia institucional, que age por diversos mecanismos
permeando todas as camadas sociais e se expressa na materialidade do espaço,
em suas múltiplas manifestações, atingindo os sujeitos em diferentes
intencionalidades e o lugar social nos quais alguns sujeitos vivem o da exclusão.
Assim, o Estado brasileiro caracteriza-se pelo caráter fragmentado de iniciativas de
inclusão dessa população, ilustrando como suas demandas tem sido atendida,
carecendo ainda de respaldo jurídico e atenção por parte do Estado brasileiro por
não ser agente de políticas públicas mais organicamente articuladas.

2. DIREITOS E GARANTIAS DA COMUNIDADE LGBTQIAP+

Nas democracias contemporâneas, constatam-se fenômenos e movimentos


políticos, culturais e sociais, que constituem desafios à esfera prática institucional
dos Estados. As democracias liberais, por exemplo, experimentam esse processo
de pluralista na defesa da dimensão coletiva, outrora tão negligenciado pelo
liberalismo tradicional, mas que atualmente torna-se uma atuação necessária na
condução a legitimação dos direitos de todos.
Num primeiro momento, os direitos e garantias fundamentais
constitucionalmente consagrados, são instrumentos de proteção do indivíduo
frente à atuação do Estado. São direitos que garantem o mínimo necessário para
que o indivíduo exista de forma digna dentro da comunidade política, conforme
consagrados no art. 5º da Constituição Federal.
Em se tratando da comunidade LGBTQIAP+, os direitos de dignidade
humana e de cidadania se aplicam de igual modo, garantido a todas e a todos os
cidadãos. No Brasil, há de reconhecer um trabalho em prol de leis propositivas que
visam reduzir a violência e a discriminação à comunidade, bem como a sua efetiva
inclusão nos espações de socialização.
P á g i n a | 68

Ademais, no que se refere à institucionalização dos direitos da comunidade


LGBTQIAP+ em si mesmos, grande maioria desses foram respaldados pela via
jurisprudência e da militância, e essas dimensões tem importância especial na
definição da agenda LGBTQIAP+.
No Brasil, nos últimos anos, o sistema judicial tem promovido sérios avanços
no reconhecimento da igualdade de pessoas pertencentes à comunidade
LGBTQIAP+. No rol de direitos que se inserem nesse panorama, há que se destacar
a união civil de pessoas do mesmo sexo, declarada legal pelo Supremo Tribunal
Federal (STF) em 2011 e outorgada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em
2013 (FARIA, 2018). Da união homoafetiva, decorrem os direitos subsequentes
referentes à adoção, direitos de herança, de divórcio, de seguro de vida e saúde e
toda a sequela de direitos básicos que se possam acrescentar.
Outro ponto importante faz menção à identidade. O nome social é o modo
que pessoas transgêneros e travestis decidem serem chamadas em função da sua
identidade de gênero, devido a não se identificarem com o sexo do seu
nascimento. Tal direito foi assegurado por meio do Decreto Presidencial n.
8.727/2016, que dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da
identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da
administração pública Federal. Muito recentemente, um acordo entre Advocacia
Geral da União (AGU), a Defensoria Pública da União (DFU) e a Secretaria de
Trabalho e Previdência Social do Ministério da Economia determina que o nome
social adotado poderá ser usado oficialmente na Carteira de Trabalho e
Previdência Social, respaldando que o processo de identidade de gênero também
é um direito a ser respaldado.
No que se refere ao ordenamento jurídico do Direito Internacional dos
Direitos Humanos, não existe nenhum tratado internacional dedicado
exclusivamente a pessoas LGBTQIA+. A identificação da temática ocorre mediante
os assuntos relacionados a orientação sexual ou identidade de gênero em matéria
de direitos humanos. Há uma alusão direta que os direitos LGBTQIAP+ são direitos
humanos e devem ser preservados por quaisquer organizações internacionais que
tenha por fim guardar esses direitos na esfera internacional (NOGAMINE, 2019). No
âmbito latino americano, a orientação sexual e a identidade de gênero são
P á g i n a | 69

categorias protegidas pela Convenção Americana dos Direitos Humanos, pelos


artigos 2 e 24, tratado do qual o Brasil é signatário desde 1992. Para tal efeito,
organizações, bem órgãos internacionais como as Nações Unidas e o Sistema
Interamericano de Direitos Humanos (SIDH), alertam constantemente sobre as
violências reiteradas contra pessoas LGBTQIAP+.

3. MONITORAMENTO DA COMUNIDADE LGBTQIAP+: VIOLAÇÕES


DE DIREITOS HUMANOS NO OESTE PAULISTA

A despeito de todos os esforços alcançados pela comunidade LGBTQIAP+


na luta por direitos de igualdade, a discriminação social continua sendo uma
constante provocadora e um estigma ainda maior para quem vive em
vulnerabilidade, sem acesso a recursos e informação. Por um lado, o impedimento
de pessoas LGBTQIAP+ de se realizarem plenamente, seja pelo direito de adequar
se corpo ou de mudarem seu nome no registro civil, pode ocasionar diversos
sofrimentos psíquicos e acompanhado a isso, registra-se frequentemente a
intolerância e suas diversas implicações aos direitos humanos.
Pessoas travestis e transexuais são os que mais sofre violência em
decorrência do preconceito advindo da sociedade. Segundo dados da Associação
Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) e o Instituto Brasileiro Trans de
Educação (IBTE), e também da ONG Tansgender Europe131 (TG), que monitora e
analisa dados de homicídios de pessoas trans ou de gênero diversos em todo o
mundo, relata que o Brasil ocupa o 1º lugar na posição de países que mais matam
transexuais, com 47% da mortes notificadas (ANTRA, 2018, p. 24). Dados da TG
sugerem que entre 2017 e 2018, 163 pessoas Trans morreram no Brasil em 2018
(Trans Murder Monitoring 132, 2018).
Em números proporcionais, a região Sudeste é responsável por 27% dos
casos de assassinatos de pessoas Trans, sendo São Paulo o terceiro Estado no

131
A Transgender Europe é uma Organização Não-Governamental que trabalhar em prol de um
mundo livro de discriminação a partir das regiões Europa, Ásia Central, bem como o restante do
mundo. Sua ação perpassa a defesa e promoção de direitos, a construção de comunidades
LGBTQIA+ e projetos de monitoramento.
132
Monitoramento dos Assassinatos de Pessoas Trans.
P á g i n a | 70

ranking nacional da ANTRA de 2018, com 14 casos de vítimas. Em 2016, o


estudante homossexual Ítalo Costacurta Rodrigues sofreu uma agressão em
Presidente Prudente (SP) durante a Virada Cultural Paulista. Ítalo teve sua perna
fraturada por agressores que a perseguiram a constrangendo e violentando
(JUNQUEIRA, 2016).

Figura 1: Mapa de assassinatos do ano de 2019

Fonte: Antra, 2019.

Em dados absolutos, o estado de São Paulo foi o que mais registrou


assassinatos contra essa população no ano de 2019, com 21 notificações, em
segundo o Ceará com 11 casos, em terceiro os estados de Pernambuco e Bahia
com 8. Em quarto lugar ocupam os estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de
Janeiro com 7 notificações. Já os estados do Acre e Amapá, Santa Catarina e o
Distrito Federal não obtiveram nenhuma notificação. De acordo com o mapa da
Figura 1, em números proporcionais, considerando uma morte por 100 mil
P á g i n a | 71

habitantes, destaca-se no topo do ranking dos assassinatos o estado de Roraima,


Mato Grosso em segundo, Tocantins ocupando a terceira posição, Paraíba em
quarto e o Amazonas em quinto lugar como os estados mais violentos, em dados
proporcionais para a população Transexual e Travesti no Brasil.
Paralelo a esse cenário desolador, pessoas LGBTQIAP+ possuidoras de
direitos como qualquer outro cidadão, continuam sendo muitas vezes privados de
liberdade por motivos da ignorância e o preconceito. Em Marília (SP), no ano de
2017, um casal gay foi repreendido pelo dono de um comércio por trocarem afetos
em um espaço público. O caso teve repercussão e vários militantes foram ao local
protestar contra o ato discriminatório (PAIS, MORAES, 2017). No mesmo ano, em
Presidente Prudente homossexuais foram agredidos por estarem juntos como
namorados e tiveram o carro danificado no estacionamento de uma conveniência.
“O caso foi registrado como lesão corporal e dano”, relata a notícia (G1, 2017), mas
não como ação LGBTFóbica.
Os direitos LGBTQIA+ também um grande respaldo na jurisprudência como
fruto de um relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que nos
últimos anos tem tratado os assuntos de orientação sexual e gênero de forma mais
atenciosa e sob o olhar do interesse e da proteção regional dos Direitos Humanos.
O caso Luiza Melinho versus Brasil em trâmite na CorteIDH, monitora a capacidade
do Estado Brasileiro em responder com eficácia a “suposta violação de Direitos
Humanos no processo relacionado à cirurgia de afirmação sexual, tendo em vista
que o Estado se negou a arcar com tal procedimento em 2009 [...]” (RIOS et al, 2017,
p 4).
O Grupo SOMOS LGBTI+ de Presidente Prudente é uma organização sem
fins lucrativos, composta por pessoas da sociedade civil que atua em defesa da
população LGBTQIAP+, em diversos campos de ações no município de da região
do Oeste Paulista. Houve no município também uma casa de acolhimento
(CASASSA) para atender a comunidade LGBTQIAP+ em situação de extrema
vulnerabilidade, porém, este projeto encontra-se inativo no momento.
P á g i n a | 72

4. CRÍTICAS NECESSÁRIAS PARA O MELHOR DESENVOLVIMENTO DA


COMUNIDADE LGBTQIAP+ FRENTE ÀS INÚMERAS VIOLAÇÕES
COTIDIANAS

Diante de uma crise e aumento no número de violações de direitos humanos


à comunidade LGBTQIAP+, vemos atualmente a violência se inserindo cada vez
mais no cotidiano dessas pessoas, em diferentes intensidades e atravessamentos.
Neste contexto, mesmo diante de algumas barreiras que foram vencidas, o
sentimento de desproteção e insegurança ainda são presentes na vida dessa
população, sobretudo em relação à população transgênero, tendo em vista que a
violência da qual essa população está constantemente acometida não se configura
apenas materializada no corpo, ela permeia todas as camadas sociais em suas
múltiplas manifestações.
Tendo em vista que o Brasil é um país com desigualdades históricas que
ainda não foram resolvidas, de classe, raça e de gênero, a população LGBTQIAP+,
possui uma situacionalidade muito particular neste contexto. O panorama geral da
população LGBTQIAP+ no Brasil é o de ser um grupo que historicamente sofre com
os processos de estigmatização, exclusão, invisibilização e de violação de seus
direitos. Neste sentido, ao pensar a segurança para a população LGBTQIAP+ no
Brasil, constatado como o país em que mais se mata LGBTQIAP+ no mundo,
sobretudo a população transgênero, que é assassinada com requintes de
crueldade, segundo os dados divulgados anualmente pelo Grupo Gay da Bahia
(GGB)133, faz-se necessário compreender a segurança pública como objeto central
e que deve ser analisado com profundidade e cuidado.
Somando-se a essa realidade, o Brasil acumula uma série de políticas
públicas voltadas a atender as demandas da população LGBTQIAP+ que foram
negadas historicamente e as que foram conquistadas, nos últimos anos vem

133
Fonte. GRUPO GAY DA BAHIA. Assassinatos de LGBT no Brasil em 2018. Disponível em:
<https://grupogaydabahia.files.wordpress.com/2020/03/relatc3b3rio-2011.pdf>. Acesso em: 31
nov. 2020.
P á g i n a | 73

sofrendo sucateamento com a precarização de alguns aparelhos públicos, que se


não fechados, foram inviabilizados.
Do ponto de vista da população LGBTQIAP+ e de outros grupos identitários,
a administração Bolsonaro tem tomado uma série de medidas antipolíticas,
aplicando alterações significativas para os poucos avanços nas estruturas
construídas para atender essas populações. Essas mudanças vão desde a emenda
constitucional do teto de gastos públicos (Emenda Constitucional Nº 95, de 15 de
Dezembro de 2016), determinando um corte gigantesco na educação e na saúde,
a mudança dos ministérios de Direitos Humanos, agora Ministério da Mulher da
Família e dos Direitos Humanos, que no seu ato de criação não previa a estrutura
da secretaria LGBTQIAP+ e as demandas relacionadas a essa população. Soma-se
também a extinção do Ministério do Trabalho, que se caracterizava por ser um dos
órgãos muito importante junto ao do Ministério dos Direitos Humanos, para se
pensar políticas públicas para essa população.
A total desarticulação, associada a visão deste governo de não atendimento
as necessidades da população LGBTQIAP+ e ao histórico de ser o país mais
violento, essa população que historicamente sofre um processo de exclusão social
e que atualmente, neste contexto de pandemia onde a população vivencia um
processo de exclusão espacial, evoca questionamentos acerca de como Estado, em
sua obrigação irá garantir o direito a quarentena para uma população que já tem
seus direitos negados e que se quer é reconhecida e que ainda não alcançou
parâmetros mínimos de dignidade, respeitabilidade e cidadania.
Entretanto, inúmeros avanços foram conquistados pela forte articulação do
movimento LGBTQIAP+ , na área da saúde por exemplo, ao situar o Brasil como
referência mundial no tratamento do HIV/AIDS, na conquista da Política Nacional
de Saúde Integral da População LGBT, Portal de Direitos Humanos Disque 100,
casamento homoafetivo, desta discorre os demais direitos conjugais, adoção,
nome social, processo transexualizador no SUS, doação de sangue, criminalização
da homofobia e equiparação a lei do racismo entre outras conquistas. Porém,
mesmo diante todas essas conquistas, o Brasil ainda carece de políticas públicas
mais organicamente articuladas.
P á g i n a | 74

Neste sentido, em uma sociedade democrática os Estados devem garantir a


igualdade e segurança de direitos de sua população, quando estes não lhes são
assegurados. De acordo com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
(CIDH):

[...] se o aparelho estatal atua de modo que a violação permanece impune


e a vítima não seja reparada, na medida do possível, pode-se afirmar que
o Estado descumpriu com o dever de garantir o livre e pleno exercício dos
direitos humanos às pessoas sujeitas à sua jurisdição. (OEA, 2015, p. 274)

Deste modo, fica a cargo do Estado realizar esforços e assegurar recursos


suficientes fomentar a busca de dados estatísticos das demandas da população
LGBTQIAP+, a fim de analisar a efetividade das medidas de prevenção e combate
à violência e a violação de direitos humanos dessa população. O Estado deve
garantir e assegurar esses direitos de forma coletiva, porém, seu alcance é efetivo
quando se respeita e contempla as individualidades.
Diante da inexistência de dados oficiais por parte do poder público, este
trabalho vem sendo realizado a certo tempo por vários movimentos sociais,
identificando e mapeando as violências que seus corpos são acometidos, como
também buscar uma maior participação e inserção em espaços de articulação
política levando as pautas LGBTQIAP+ para a construção de políticas públicas em
todas as esferas sociais. Assim, fica a cargo do Estado apoiar essas iniciativas de
efetivação de acordos internacionais como também a criminalização da homofobia
e criando políticas públicas de inserção destes sujeitos na saúde, educação,
esporte, cultura, mercado de trabalho e demais campos sociais que vão de
encontro com legislações já postuladas no ordenamento jurídico brasileiro para
essa população que ainda se encontra sobre a luta pelo reconhecimento de suas
identidades.

5. A COMUNIDADE LGBTQIAP+ E A PANDEMIA DA COVID-19

O distanciamento social desencadeado pela pandemia do COVID-19 é


particularmente desafiador e perigoso para lésbicas, gays, bissexuais e
trânsgêneros – comunidade LGBTQIAP+ como unidade. O enclausuramento em
P á g i n a | 75

massa destaca um aumento de pressão psicológica e outros tipos de violência, até


mesmo física, entre as pessoas que sofrem maus tratos, tendo em vista que
necessitam passar mais tempo em casa com familiares que não as aceitam, por
exemplo.
Segundo um texto elaborado por estudantes da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) sobre a população LGBTQIAP+ em tempos de pandemia,
foram relatados vários casos em que pessoas pertencentes a essa comunidade
estão passando por inúmeros problemas decorrente das limitações e incertezas do
momento atual que, consequentemente, agravam a saúde mental, causando como
exemplo a solidão, depressão, ansiedade e ideação suicida.
Um estudo realizado pelo coletivo “#VoteLGBT” sobre o Diagnóstico
LGBTQIAP+ na pandemia, de 28 de abril a 15 de maio de 2020, evidenciou:

A piora na saúde mental foi citada por 42,72% dos entrevistados como o
principal impacto da pandemia para a população LGBT+. Uma parcela
ainda maior, 54%, afirmou que precisa de apoio psicológico. As novas
regras do convívio social, a solidão e o convívio familiar foram
mencionados por 39,23% e associadas ao afastamento das redes de apoio
que muitas pessoas tinham antes da pandemia. Entre os respondentes,
17,62% citaram as dificuldades econômicas como os maiores impactos,
por falta de trabalho ou de dinheiro. (UFMG, 2020).

Com isso, é evidente a piora de casos por saúde mental em que as pessoas
pertencentes a essa determinada comunidade. Logo em seguida, vemos a falta de
apoio que essas pessoas tinham antes da pandemia, e por fim, as dificuldades
financeiras.
Por conseguinte, ainda em tempos de pandemia, o público LGBTQIAP+ tem
a possibilidade de acesso a serviços de natureza socioassistenciais. E se tratando
de direitos, é mister destacar que essa comunidade tem que fazer valer o seu
direito, no seu município, por meio de um artifício já existente: a Assistência Social
e o Centro....
A Assistência Social (CRAS) e o Centro de Referência Especializado de
Assistência Social (CREAS) tem o condão de orientar a comunidade LGBTQIAP+ na
esfera social e jurídica, garantindo direitos e cuidando do bem-estar.
P á g i n a | 76

A escritora Ketryn Carvalho do Observatório G, parafraseando Paulo Sena,


chefe do Departamento de Direitos Fundamentais e Cidadania relatou que
“Precisamos alertar a população LGBTI+ de seus direitos e garantir em todos os
âmbitos sua proteção, fornecendo mais oportunidade, inclusão e dignidade”
(OBSERVATÓRIOG).
Enfim, a importância de recolher esses dados vai de encontro com todas as
pessoas da sociedade como alerta de um cuidado especial com as pessoas dessa
comunidade. Mas também, entra a informação de que essa comunidade tem
subsídios do governo para fazer valer o seu direito em tempos de pandemia através
de órgãos assistenciais ou outras organizações que se preocupam com o bem-estar
delas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

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http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Folders/cartilh
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Bento, Berenice A. de Melo. (2003). Transexuais, corpos e próteses (Vol. 4.) Estudos
feministas.

BENEVIDES, Bruna G.; NOGUEIRA, Sayonara N. B (org). Dossiê sobre Assassinatos


e Violências contra Travestis e Transexuais no Brasil em 2018. Brasil: Associação
Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil, 2018.

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de São Paulo. São Paulo. Disponível em:
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HOMOSSEXUAIS são agredidos e têm carro danificado após trocarem beijos em


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JUNQUEIRA, Diego. Estudante Sexual é agredida e tem a perna quebrada durante


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P á g i n a | 78

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POPULAÇÃO LGBT+ ficou mais vulnerável com a pandemia. Pró-reitoria de


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Assassinadas (TMM). Transrespect versus TransphobiaWorldwide (TvT) Project.
P á g i n a | 79

EIXO PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE | ODHOP

1. Levantamento da população carcerária: Presos x Vagas; denominação


e qualificação, dados referentes à população e suas especificações

INTRODUÇÃO

Diversas são as fontes de levantamento de dados a respeito da população


carcerária nacional, sendo exemplos, o Departamento Penitenciário Nacional
(DEPEN), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que por meio de seu
Sistema de Informações (SISDEPEN), emite o Levantamento Nacional de
Informações Penitenciárias (INFOPEN) e o Banco Nacional de Monitoramento de
Prisões (BNMP), mantido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ademais, há de
se falar em iniciativas como o Projeto Sistema Prisional em Números, que apresenta
dados do sistema prisional brasileiro compilados pelo Conselho Nacional do
Ministério Público e o Monitor da Violência, uma parceria entre o G1, o Núcleo de
Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que tem
como objetivo discutir a questão da violência no país e apontar caminhos para
combatê-la juntando linguagem jornalística e acadêmica.
Em virtude da multiplicidade de fontes de levantamento de dados, há
notável dissonância entre os dados emitidos por cada órgão, o que torna os dados
sobre pessoas privadas de liberdade no Brasil carentes de certa forma de
credibilidade e atualidade. Destarte, o presente levantamento de dados utilizar-se-
á de diferentes fontes de informação, de modo a expor tais dados em sua
integralidade, não tomando como verdade absoluta uma única fonte.
Atualmente o Brasil desponta como um dos países com o maior número de
pessoas privadas de liberdade. Hoje somos o 3º país com o maior número de
encarcerados, atrás dos Estados Unidos, e da China.
Como citado, em vista da multiplicidade de fontes, com dados referentes à
população privada de liberdade, os números variam aproximadamente entre 740
P á g i n a | 80

mil a 880 mil pessoas. Em contraposto este número, o número de vagas é pouco
mais da metade dos números absoluto, cerca de 440 mil vagas.
Apenas com os dados básicos, da população carcerária, vemos a enorme
discrepância entre os números. Esses dados são referentes ao último balanço, feito
pelo Departamento Penitenciário Nacional. Além dos dados gerais, é possível
notar, por estes mesmos dados, que a população carcerária brasileira está em
constante aumento, e desde 2003, tem tido sempre a elevação dos números do ano
anterior.

Figura 1: Dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN)

Já no que tange os dados do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões,


(BNMP - CNJ), os quais são diariamente atualizados de acordo com as ordens de
prisão/internação e soltura expedidas em todo o território nacional por meio do
Cadastro Nacional de Presos, até o dia 07 de outubro/2020 constam como privadas
de liberdade no território brasileiro:
P á g i n a | 81

Figura 2: Dados do Portal: Banco Nacional de Monitoramento de Prisões, População


Carcerária (BNMP - CNJ)

• 885.563 pessoas, das quais 883.213 estão presas e 2.440 internadas.


Entre as pessoas presas, 400.571 são provisórias, 191.746 em execução provisória,
289.698 em execução definitiva e 1.181 em prisão civil. Entre as pessoas internadas,
533 são provisórias, 353 em execução provisória e 1.551 em execução definitiva.
• Entre as pessoas presas, também segundo dados do Banco Nacional
de Monitoramento de Prisões, (BNMP - CNJ), 836.048 são homens e 47.165 são
mulheres, já entre as pessoas internadas, 2.283 são homens e 157 são mulheres. Em
relação às pessoas privadas de liberdade com filhos, segundo dados do INFOPEN
referentes ao período de julho a dezembro de 2019 há um total de 204.268
(27,31%) pessoas em território nacional.

O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN),


emitido pelo Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional
(SISDEPEN), fornecessem os dados das Polícias Judiciárias (Federal, Distrital e
Estadual) e Batalhões e Polícias e Bombeiros Militares.
P á g i n a | 82

Figura 3: Dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) - População Carcerária

• Total de 748.009 pessoas privadas de liberdade (período de


julho/dezembro 2019).

Os dados fornecidos pelo projeto Sistema Prisional em Números,


compilados pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), atinentes ao
terceiro trimestre de 2019, apontam como capacidade total de vagas das unidades
prisionais no território brasileiro o total de 446.389 vagas. Por outro lado, a
ocupação real de pessoas privadas de liberdade por unidade prisional é de 721.363
pessoas, sendo a taxa de ocupação de 161,60% da capacidade.

Figura 3: Dados Sistema Prisional em Números: Conselho Nacional do Ministério Público


(CNMP)

Ainda sobre os dados que o CNMP traz sobre as especificações da


quantidade de estabelecimentos prisionais, e a classificação destes
estabelecimentos, bem como o quantitativo por sexo:
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Figura 4: Dados Sistema Prisional em Números: Quantidade de Estabelecimentos


Prisionais: Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP)

Tais dados demonstram superlotação em todo o território nacional, em


geral e, da mesma forma, em todas as modalidades de regime de cumprimento de
pena.
Ainda segundo dados do INFOPEN, em relação ao período de julho a
dezembro de 2019, no que tange a faixa etária da população carcerária, temos os
seguintes dados:
P á g i n a | 84

Figura 5: Dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) - Faixa Etária

Duas situações, descritas pelos números oficiais trazem o retrato do Sistema


Prisional Brasileiro: a falta de vagas, em detrimento ao número de privados de
liberdade, e o número de presos provisoriamente, que é o retrato da justiça
ineficiente, para que se julgue de forma veloz e eficaz, dentro dos trâmites legais,
de acusação e defesa.

Figura 6: Dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) - Presos por Regime


P á g i n a | 85

2. A POPULAÇÃO CARCERÁRIA PAULISTA

O Estado de São Paulo concentra a maior população do país, com


aproximadamente 45 milhões de habitantes, e possui a maior porcentagem do
número de presos do país.
No estado de São Paulo, de acordo com dados do Banco Nacional de
Monitoramento de Prisões (BNMP-CNJ), no dia 07 de outubro de 2020, no Cadastro
Nacional de Presos, constam os seguintes dados:

Figura 7: Dados do Portal: Banco Nacional de Monitoramento de Prisões, População


Carcerária (BNMP - CNJ)

• 264.615 pessoas privadas de liberdade, das quais 263.614 estão


presas e 1.001 internadas. Entre os presos, 95.642 são provisórios, 81.874 em
execução provisória, 85.555 em execução definitiva e 543 em prisão civil. Já entre
os internados, 111 são provisórios, 129 estão em execução provisória e 761 em
execução definitiva.
P á g i n a | 86

Já de acordo com os dados disponibilizados pelo Departamento


Penitenciário Nacional (DEPEN), constam os seguintes dados:

Figura 7: Dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) - População Carcerária


SP

A partir dos dados disponibilizados pelo Departamento Penitenciário


Nacional (DEPEN), pudemos constatar que, na região do Oeste e Centro do Oeste
Paulista, existem cerca de 80.086 pessoas privadas de liberdade, sendo 63.027 em
regime fechado, 12.998 em regime semiaberto e 4.052 em prisão provisória, que
somam cerca de 30% de toda a população carcerária do estado de São Paulo.
Os números citados acima se mostram alarmantes quando constatamos
que, conforme dados relatados no Relatório Mensal do Cadastro Nacional de
Inspeções nos Estabelecimentos Penais (CNIEP) e publicados no site do Conselho
Nacional de Justiça, o Brasil conta apenas com 443.437 vagas nos 2.813
estabelecimentos prisionais.
O retrato dos privados de liberdade provisoriamente, se repete em um
número muito considerável, visto que, seu número ultrapassa até mesmo os em
situação de regime semiaberto, e novamente, o reflexo da justiça, que não possui
eficiência, na hora que se julgue aquele acusado, e que tenha os trâmites
processuais céleres, uma vez que, estamos dizendo sobre a vida de uma pessoa,
encarcerada, num sistema com inúmeras falhas.
P á g i n a | 87

Em SP, a maioria dos presos (44%) está no sistema prisional por causa de
crimes contra o patrimônio, ou seja, roubos e furtos. Em seguida, estão os detidos
pela Lei de Drogas, como o tráfico (38%). Crimes contra a pessoa e contra a
dignidade sexual, como homicídios e estupros, representam juntos 13%, são os
dados do INFOPEN

2.1. Levantamento da Quantidade de Estabelecimentos Prisionais na


Região de Atuação do Observatório e Comparação com Outras
Regiões do Estado de São Paulo

Figura 8: Estabelecimentos Prisionais - SP: SAP/SP

De acordo com os dados da Secretaria de Administração Penitenciária


(SAP/SP), estes são os Estabelecimentos Prisionais do Estado de São Paulo. O
Estado de São Paulo possui, de acordo com as informações da SAP/SP, 176
estabelecimentos prisionais.
Segundo esses mesmos dados, da Coordenação da Região Oeste da
SAP/SP, o Oeste Paulista, englobando as regiões de: Presidente Prudente,
Araçatuba, Marília e Bauru, contam com um total de 45 unidades prisionais, das
quais: 28 penitenciárias, 9 centros de detenção provisória, 3 centros de progressão
P á g i n a | 88

penitenciária, 4 centro de ressocialização e 1 unidade de regime disciplinar


diferenciado.
A área de atuação deste Observatório engloba, assim, as regiões oeste, com
alguns estabelecimentos da região noroeste, nos limites limítrofes das regiões de:
Araçatuba, Presidente Prudente, Marília e Bauru.

(vide comentário 1)
(vide comentário 2)
(vide comentário 3)

Os 3 comentários acima trazem especificados os 44 estabelecimentos


prisionais da região do Centro Oeste Paulista (Presidente Prudente, Araçatuba,
Marília e Bauru), bem como capacidade e lotação do estabelecimento prisional.
Diante de tais dados, e comparando-os com outros dados, que constam no mapa
acima, é de percepção nítida que, nossa região abrange talvez a maior quantidade
de estabelecimentos prisionais do Brasil.
Apenas para compararmos, entre o próprio Estado de SP, a Região
Metropolitana de São Paulo conta com 28 unidades prisionais, das quais: 8
penitenciárias, 17 centros de detenção provisória e 3 centros de progressão
penitenciária. A Região do Vale do Paraíba e Litoral possui 18 unidades prisionais,
das quais: 8 penitenciárias, 7 centros de detenção provisória, 2 centros de
progressão penitenciária e 1 centro de ressocialização. A Região Noroeste conta
com 43 unidades prisionais, das quais: 25 penitenciárias, 7 centros de detenção
provisória, 4 centros de progressão penitenciária e 7 centros de ressocialização. A
Região Central possui 39 unidades prisionais, das quais: 18 penitenciárias, 8 centros
de detenção provisória, 3 centros de progressão penitenciária e 10 centros de
ressocialização.
No estado mais rico e populoso do país, quase todas as cadeias têm mais
presos do que deveriam. São Paulo é disparado o estado com a maior população
carcerária: 230 mil presos, para 137 mil vagas. Das 166 prisões do estado, só 22 não
abrigam mais presos do que deviam. 87% das prisões estão superlotadas, de
P á g i n a | 89

acordo com levantamento feito pela CBN a partir dos dados da Secretaria de
Administração Penitenciária do Estado de São Paulo.

3. MONITORAMENTO DA POPULAÇÃO PRIVADA DE LIBERDADE:


VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS EM ESTABELECIMENTOS
PRISIONAIS

Cruel, desumano e degradante. Foram essas as palavras usadas pelo relator


especial da ONU, Juan Méndez, para descrever o cárcere brasileiro. O relatório
apresentado pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU, em 2016, denunciou a
situação caótica e violadora que os presídios do Brasil se encontram, em total
desacordo com as normativas nacionais e internacionais. O nosso sistema carcerário
assusta pela recorrente prática de torturas, mortes e outros tratamentos desumanos,
principalmente contra pessoas negras.
O principal problema enfrentado pelo sistema prisional é a superlotação.
Um levantamento feito pelo G1 em fevereiro de 2020 constatou que 67,8% das
prisões estão operando acima da capacidade. Devido à superlotação, a saúde dos
presos é colocada em risco. Em Alagoas, a Defensoria Pública e a OAB cobraram
explicações aos gestores da penitenciária sobre um vídeo gravado em setembro
deste ano, que mostra cinco presos no chão de uma unidade do Complexo Prisional
de Maceió agonizando por falta de ar. A pessoa que gravou a situação relata que
eles passaram mal por falta de oxigênio circulando nas celas abarrotadas.
O cárcere é um lugar bastante propício para a disseminação de diversas
doenças. Se não bastasse a pandemia de COVID-19, enfermidades como sarna,
furúnculos, meningite e pneumonia são fáceis de transmitir em um ambiente
superlotado e sem higiene adequada. De acordo com dados do Departamento
Penitenciário Nacional, o país registrava 28.131 casos confirmados de COVID-19 e
115 óbitos entre aprisionados. Só no estado de São Paulo eram 1.189 casos
confirmados e 27 óbitos.
A situação da pandemia nos presídios brasileiros está tão fora de controle
que Organização dos Estados Americanos (OEA), por meio de sua Comissão
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Interamericana de Direitos Humanos, emitiu um comunicado expressando sua


preocupação com o avanço do vírus nas prisões. Diz o documento: “... a Comissão
já se referiu às deploráveis condições de detenção nas prisões brasileiras, que se
caracterizam por níveis alarmantes de superlotação, infraestrutura deficiente,
atendimento médico negligente, completa falta de higiene, ausência de artigos de
primeira necessidade, e alimentação inadequada. Tais condições criam um
ambiente propício para a proliferação e avanço do vírus do COVID-19.” E conclui:
“Diante do exposto, a Comissão reitera ao Estado brasileiro que adote medidas
para reduzir a superlotação nas unidades de privação de liberdade, tais como a
avaliação da concessão de medidas alternativas, especialmente com respeito aos
que se encontram em situação especial de risco. Do mesmo modo, o Estado deve
adequar as condições de detenção para evitar o contágio e fornecer tratamento à
enfermidade do COVID-19.

4. AS CIRCUNSTÂNCIAS DAS SITUAÇÕES DE MULHERES GRÁVIDAS E


EM PERÍODO DE LACTAÇÃO, NOS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS

O Brasil encontra-se hoje na quarta posição mundial de países que mais


encarceram mulheres no mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, da
China e da Rússia, e dentre esses, foi o que mais apresentou aumento na taxa de
encarceramento em 16 anos, liderando o ranking com 455%. Conforme dados do
Infopen Mulheres, divulgado em 2019 pelo Departamento Penitenciário Nacional
(DEPEN), a população prisional feminina atingiu a marca de 37,2 mil mulheres
privadas de liberdade, e 45% dessas mulheres não haviam sido ainda julgadas e
condenadas. A taxa de ocupação é de 156,7%, apresentando um déficit de mais de
15 mil vagas, o que significa dizer que em um espaço destinado a 10 mulheres,
encontram-se custodiadas 16 no sistema prisional. No mapeamento realizado em
março de 2020, do total de mulheres presas, 12.821 são mães de crianças de até
12 anos, 434 possuem idade igual ou superior a 60 anos.
No que tange à faixa etária das presidiárias, 25,22% possuem entre 18 a 24
anos e 22,11% entre 25 a 29 anos, ou seja, 47,33% da população carcerária feminina
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é jovem. Porém, o recorte racial é ainda mais revelador: 63,55% se declaram negras
(somatório entre pardas e pretas); enquanto apenas 35,59% se declaram brancas
(dados de 2017).
Das unidades prisionais analisadas, apenas 14% contavam com berçário
e/ou centro de referência materno-infantil, para crianças até 2 anos de idade, e
somente 3% declararam conter espaço de creche para crianças acima de 2 anos.
No mapeamento realizado em março de 2020, do total de mulheres presas, 12.821
são mães de crianças de até 12 anos, 434 possuem idade igual ou superior a 60
anos.
São Paulo concentra 36% de toda a população prisional feminina do país,
com 15.104 mulheres presas. Dentre essas, encontram-se 169 gestantes e 109
lactantes, e apenas 60 delas estariam custodiadas em celas adequadas para recebê-
las, ou seja, 36%.
De acordo com o Relatório Estatístico: Visita às mulheres grávidas e
lactantes privadas de liberdade, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
no ano de 2018, onde foram percorridas 26 unidades da federação, totalizando a
visita a 34 estabelecimentos penais, todos asseguravam acompanhamento médico
à mulher grávida, especialmente no pré-natal e pós-parto. Em 79, 41% foi declarada
a existência de acompanhamento psicológico da mulher grávida. Mais da metade
(58, 82%) possuíam berçário, e pouco mais da metade (52, 94%) possuíam seção
para gestante e parturiente.
Ainda sobre o mesmo estudo, foi constatado que 20, 6% dos
estabelecimentos não asseguravam o cumprimento da Lei 13.434/2017, que veda
o uso de algemas durante o parto e durante a fase de puerpério imediato. 14, 71%
dos estabelecimentos declararam não fazer o registro imediato dos filhos das
mulheres privadas de liberdade. Foram encontradas 33 crianças sem registro de
nascimento. Depois do período de amamentação, 92,3% dos estabelecimentos
entregavam as crianças às famílias de um dos genitores.
A respeito da proteção internacional, inúmeras são as fontes as quais
estabelecem diretrizes de procedimento para mulheres gestantes e lactantes
privadas de liberdade, tanto tratados internacionais, como resoluções e também
precedentes de Corte Internacionais. As Regras das nações Unidas para o
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Tratamento de Mulheres Presas e Medidas Não Privativas de Liberdade para


Mulheres Infratoras, também conhecidas como Regras de Bangkok, logo em seu
preâmbulo, parágrafo º, enfatiza que ao sentenciar ou decidir medidas cautelares a
mulheres grávidas ou pessoas que sejam fonte primária ou única de cuidado de
uma criança, medidas não privativas de liberdade devem ser preferíveis quando
possível e apropriado, deve-se considerar impor penas privativas de liberdade a
casos de crimes graves ou violentos.
Segundo dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias
(INFOPEN) Mulheres de junho de 2017, o crime de tráfico de drogas é o principal
responsável pela maior parte das prisões femininas, somando um total de 59,9% os
casos, seguido do crime de roubo, somando 12,90% das prisões efetuadas e, por
fim, o furto, somando 7,80% dos casos.
A partir de análise histórica dos tipos penais consumados e tentados por
mulheres no Brasil durante o período de 2005 a 2017, conclui-se que o crime de
tráfico de drogas também se fez responsável pela maioria dos encarceramentos
femininos no país, totalizando 59,6% das prisões femininas anualmente, a partir de
uma média dos encarceramentos de cada ano.
Sabe-se que o cenário brasileiro a respeito da configuração do crime de
tráfico de drogas não apresenta diretrizes precisamente firmadas, principalmente
em relação a quantidade de droga portada para que se configure o tráfico, o que
resulta em inúmeras condenações por este ainda nos casos em que há porte de
quantidades mínimas de entorpecentes, as quais deveriam configurar apenas
utilização para consumo próprio, resultando somente em pena de advertência.
Faz-se nítido o descumprimento às diretrizes das Regras de Bangkok em
relação à adoção de penas privativas de liberdade para mulheres grávidas somente
para os crimes mais graves e violentos, vez que, a grande maioria dos
encarceramentos de mulheres grávidas motivados por tráfico de drogas, em
realidade não deveriam configurá-lo.
As mulheres grávidas ou lactantes deverão receber orientação sobre dieta
e saúde dentro de um programa a ser traçado e supervisionado por um profissional
da saúde qualificado, inclusive das mulheres que recentemente tenham dado à luz,
porém que não se encontrem com seus filhos na prisão. Deverá ser fornecida
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gratuitamente alimentação adequada e pontual para gestantes, bebês, crianças e


lactantes em um ambiente saudável e com a possibilidade para exercícios físicos
regulares, ademais, a amamentação dos filhos pelas suas mães deve ser estimulada,
a não ser que haja razões de saúde específicas para fundamentar tal desestimulação
[1].
A respeito da higiene pessoal, a acomodação de mulheres presas deverá
conter instalações e materiais exigidos para satisfazer as necessidades de higiene
específicas das mulheres, incluindo toalhas sanitárias gratuitas e um suprimento
regular de água disponível para cuidados pessoais das mulheres e crianças, em
particular às mulheres ocupadas com a cozinha e às mulheres grávidas, que estejam
em amamentação ou menstruação [2].
A realidade das unidades prisionais em que se encontram mulheres
grávidas e em amamentação é completamente diferente, vez que logo após o parto,
ao voltarem para as unidades prisionais, não encontram sequer as instalações e
materiais mínimos para que possam realizar sua higiene pessoal e de seus filhos,
que, na condição de recém-nascidos, necessitam de cuidados especiais.
O regime prisional deve ser flexível o suficiente para atender às
necessidades de mulheres grávidas, lactantes e mulheres com filhos. Deve-se
oferecer, nas unidades prisionais, os serviços e instalações para o cuidado das
crianças a fim de possibilitar às presas a participação em atividades prisionais [3].
Ademais, não deverão ser impostas sanções de isolamento ou segregação
disciplinar a mulheres grávidas, nem a mulheres com filhos ou em período de
amamentação [4].
As decisões de autorização para que os filhos permaneçam nas unidades
prisionais com suas mães devem ser fundamentadas unicamente no melhor
interesse da criança, considerando suas necessidades especiais e jamais as tratando
nas mesmas condições de presas. Nos casos em que a decisão autorizar a
permanência das crianças com suas mães, deverão ser adotadas medidas para que
tais mulheres passem o maior tempo possível com seus filhos [5].
Tais crianças deverão ter acesso a serviços permanentes de saúde e seu
desenvolvimento será supervisionado por especialistas, em colaboração com
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serviços de saúde comunitários. Também, o ambiente oferecido à educação dessas


crianças deverá ser o mais próximo possível àquele de crianças fora da prisão [6].
Por fim, a decisão a respeito do momento da separação da mãe e de seu
filho deverá considerar cada caso concreto, devendo ser fundamentada no melhor
interesse da criança. No momento em que determinar-se tal separação, a remoção
da criança da unidade prisional deverá ser realizada com o máximo de cuidado e
somente após a identificação das providências necessárias para o cuidado da
criança. A partir da separação das crianças de suas mães, deverão ser
encaminhadas a familiares ou parentes, ou outra forma de abrigo e serão dadas
todas as oportunidades às mães de encontro com as crianças, respeitando o melhor
interesse da criança e a segurança pública.
Dados da Divisão de Atenção às Mulheres e Grupos Específicos do
Departamento Penitenciário Nacional, divulgados em 29 de abril de 2020 e
realizados com o intuito de reunir informações para o enfrentamento do novo
Coronavírus (COVID-19) revelaram, em todo o território brasileiro, 208 presas
gestantes, 44 presas puérperas e 12.821 presas mães de crianças com até 12 anos.
Já em relação às presas provisórias, contabilizou-se 77 gestantes, 20 puérperas e
3.136 presas mães de crianças de até 12 anos.
Ainda, os dados do projeto Sistema Prisional em Números, compilados pelo
Conselho Nacional do Ministério Público, durante o ano de 2018, a ocupação de
mulheres nas unidades prisionais do território nacional somava, em sua totalidade,
35.216 mulheres presas, das quais 401 (1,14%) eram presas gestantes. Analisando-
se cada região do território brasileiro, a região Centro-oeste somava um total de
3.939 mulheres presas, das quais 54 (1,37%) são gestantes, já a região Nordeste, de
um total de 5.848 mulheres presas, 105 (1,80%) são gestantes, a região Norte, em
sua totalidade soma 3.116 mulheres em unidades prisionais, das quais 31 (0,99%)
são grávidas já a região Sudeste, a qual concentra 18.429 mulheres presas,
concentra, entre estas, 153 (0,83%) grávidas, por fim, a região Sul soma o total de
3.884 mulheres em unidades prisionais, das quais 58 (1,49%) são mulheres grávidas
em unidades prisionais.
A Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo aponta
que, durante o primeiro semestre de 2017, 447 bebês chegaram às unidades
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prisionais através de suas mães ainda gestantes. Ademais, em levantamento


referente ao estado de São Paulo, no ano de 2013, 396 bebês nasceram na prisão,
enquanto no ano de 2014, tal taxa elevou-se para 429 nascimentos na prisão,
durante o ano de 2015, a taxa de nascimentos na prisão vai para 359 bebês,
enquanto em 2016, o número é de 373 nascimentos, e, por fim, de acordo com
dados de janeiro a junho de 2017, 276 crianças nasceram em ambiente carcerário.
A respeito da idade com que tais crianças deixaram as unidades prisionais,
ainda segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de
São Paulo, na faixa etária de até 3 meses, nos anos de 2013 (19 crianças), 2014 (24
crianças), 2015 (17 crianças), 2016 (20 crianças) e até junho de 2017 (26 crianças),
deixaram as unidades prisionais com até 3 meses de idade.
Já em relação à faixa etária de 3 a 6 meses, em 2013 (153 crianças), 2014
(121 crianças), 2015 (117 crianças), 2016 (131 crianças) e até junho de 2017 (79
crianças). Por fim, a respeito da faixa etária de 6 meses a 1 ano, em 2013 (14
crianças), em 2014 (102 crianças), em 2015 (150 crianças), em 2016 (121 crianças) e
até junho de 2017 (45 crianças).

[1] Regra nº 48, Regras de Bangkok.


[2] Regra nº 5, Regras de Bangkok.
[3] Regra nº 42, Regras de Bangkok
[4] Regra nº 22, Regras de Bangkok.
[5] Regras nº 49 e 50, Regras de Bangkok.
[6] Regra nº 51, Regras de Bangkok.

5. A SITUAÇÃO DA POPULAÇÃO LGBTQIAP+ NOS


ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS

Em um estudo intitulado “LGBT nas prisões do Brasil: diagnóstico dos


procedimentos institucionais e experiências de encarceramento” produzido pelo
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em 2020, das 508
unidades que aceitaram participar da pesquisa, apenas 106, todas masculinas,
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indicaram que dispõem de um espaço para realizar a custódia de pessoas


LGBTQIAP+. As celas abrigam mais indivíduos que a capacidade real: são 2048
vagas, para uma ocupação de 2302 pessoas privadas de liberdade. A região
Sudeste foi a que apresentou a maior proporção de celas ou alas LGBTQIAP+ por
região (52,8%), seguido da região Nordeste (25,5%), Centro-Oeste (15,1%), Sul
(5,7%) e Norte (0,9%).
Quando questionadas sobre a importância da separação de alas ou celas
para a população LGBTQIAP+, pouco mais da metade dos estabelecimentos sem
nenhuma política institucional voltada para a população em estudo (58%)
respondeu favoravelmente à importância da adoção de políticas de proteção do
público LGBTQIAP+, mas se queixaram de dificuldades estruturais e superlotação.
É mister ressaltarmos que a adoção de celas ou alas para a custódia de LGBTQIAP+
tem sido relativamente eficiente na redução mais imediata das vulnerabilidades
dessa população no sistema carcerário.
Outro problema que estudo apontou é o da subnotificação. O
pertencimento só pode ser mapeado por meio da autodeclaração, e diferente de
outros marcadores, se autodeclarar LGBTQIAP+ pode conferir riscos ao
encarcerado, uma vez que essa população é constantemente alvo de violência
cometida por outros presos. Desse modo, a pesquisa desenvolvida nessa área não
pode ser utilizada como instrumento de censo, já que não há como garantir que
todas as pessoas LBTQIAP+ foram efetivamente consultadas.
O estudo mostrou ainda que 29,7 % da população LGBTQIAP+ encarcerada
no Brasil é de jovens, de 18 a 24 anos, seguido por pessoas de 25 a 29 anos,
somando 24,8%. A população entre 30 a 34 anos e 35 a 45 anos ficaram empatadas,
com 18,8% cada. Maiores de 45 anos somam 7,9% da população carcerária
LGBTQIAP+ do Brasil. A faixa etária da população Travesti é expressiva: travestis
entre 18 a 24 anos somam 40,9% da população desse gênero encarcerada
atualmente. O número se deve à situação de vulnerabilidade ao qual esse grupo
está sujeito desde a mais tenra idade. Os relatos de abandono familiar, expulsão
escolar e difícil acesso a postos de trabalho regulamentados são situações comuns
para essas pessoas, o que torna mais fácil o envolvimento pelas atividades ilícitas.
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Os dados também mostraram que a população LBGTQIAP+ autodeclarada


negra chega a 51,3% nas prisões masculinas, e 69,5% nas femininas. No tocante às
visitas, somente 40% dos LGBTQIAP+ tem visita cadastrada nos registros das
unidades respondentes. Mister ressaltar que o cadastro de visitas cadastradas não
mostra, necessariamente, as visitas que de fato ocorrem, ou seja, o número de
visitas que a população em estudo recebe é ainda menor do que a apresentada no
estudo.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou recentemente uma decisão
que permite que as pessoas condenadas devem ser direcionadas a presídios e
cadeias conforme sua autoidentificação de gênero. A medida permite que lésbicas,
gays, bissexuais, transexuais, travestis ou intersexo condenados e privados de
liberdade possam cumprir suas penas em locais adequados ao seu gênero
autodeclarado. De acordo com matéria publicada no próprio CNJ, apenas 3% das
unidades prisionais (36 cadeias) possuem alas destinadas ao público LGBTI. Outras
100 cadeias possuem celas exclusivas para esse grupo. No geral, 90% das
penitenciárias não possuem celas ou alas destinadas ao público LGBTQIAP+. A
medida beneficiará principalmente a vida de mulheres trans, que sofrem graves
situações de violência e discriminação dentro dos presídios masculinos.

6. A CONJUNTURA DAS PESSOAS IDOSAS NOS ESTABELECIMENTOS


PRISIONAIS:

Um dos grupos mais precários dentre aqueles que cumprem pena no


sistema prisional são os idosos.
Imaginemos as condições de um estabelecimento prisional para uma
pessoa, jovem, faixa etária mais comum dentre aqueles privados de liberdade.
Agora imaginemos como é enfrentar um estabelecimento prisional nesta mesma
situação um idoso dentre 60 anos ou mais.
Não se trata de situação em que se compare situação do jovem ou do idoso,
mas que a pessoa idosa obviamente possui limitações maiores do que o jovem,
necessitando de maiores atenções e condições especiais de vivência, convivência.
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Se em uma vida normal, tal situação é óbvia, imaginemos dentro de um


estabelecimento prisional.
Em números absolutos, são 3.740 idosos no sistema prisional paulista, de
acordo com a SAP/SP. No interior do estado, apenas como citação para exemplo,
uma única unidade prisional, a Penitenciária Orlando Brando, de Iaras, abriga 12%
dos idosos presos. Lá há 5 profissionais de saúde (entre médicos e clínicos gerais,
enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem), para atender 2.500 presos, ou
seja, 1 profissional para 500 pessoas.
Não é porque a pessoa é idosa, que o Estado deverá deixar de cuidar deste,
ainda mais no sistema carcerário, e em condições tão desumanas e precárias como
o sistema carcerário brasileiro.
Essa situação, já gravosa, piorou ainda mais com a pandemia de Covid-19,
pois pessoas idosas são do grupo de risco da doença que causa complicações no
sistema respiratório. Cumprir pena no sistema prisional, no Brasil, sendo a pessoa
idosa, no meio de uma pandemia, de uma doença respiratória, agrava ainda mais a
situação do idoso, vivenciando condições desumanas, assim, a Defensoria Pública
de SP, impetrou habeas corpus coletivo no Supremo Tribunal Federal, pedindo
liberdade aos mais de 3 mil presos, no sistema carcerário paulista, seguindo
recomendação do próprio CNJ, o qual recomendou a concessão de liberdade
àqueles que fazem parte de grupo de risco da Covid-19.
Tal pedido ainda não foi julgado, e a justiça que possui o dever de ser célere
em condições de ser humana, ao condenado, oferecendo seus direitos básicos,
mais uma vez, não cumpre com aquilo que deveria, e mais de 3 mil idosos, (apenas
citando o estado de SP), continuam em uma situação ainda, em comparativos, pior
do que outros condenados, enfrentando as condições de saúde próprias, as
condições desumanas nos estabelecimentos prisionais, e com o risco de contrair
uma doença dentro do sistema prisional, sem possuir culpa alguma dessa possível
contaminação do vírus.
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7. PROGRAMAS DO ESTADO PARA A RESSOCIALIZAÇÃO DE


PRIVADOS DE LIBERDADE

Os fundamentos básicos de uma prisão, além é claro, da punibilidade do


estado perante aquele que cometeu o delito, é a reeducação e ressocialização
daquele privado de liberdade. Isso é notório, esse seria, ou era pra ser, os
fundamentos básicos do sistema carcerário, mas, vemos que na realidade é
totalmente o oposto disso, onde aqueles que uma vez condenados, saem do
estabelecimento prisional, ainda em piores condições de quando o adentrou.
Ainda sim, que saibamos que o sistema é totalmente falho, existem, poucas,
e crescentes situações, onde condições básicas de ressocialização e reeducação
dos privados de liberdade realmente e efetivamente ocorra.
A oferta de condições de trabalho, e estudo, oferecidas aos privados de
liberdade, já se provaram em diversas situações serem uma das opções mais viáveis
para que aquele que uma vez condenado, inicie seu processo de fazer
parte novamente da sociedade, e ainda ter a oportunidade de sair com maiores
qualificações de quando entrou.
Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), o Grupo de
Ações de Reintegração Social (GARS) é responsável por promover iniciativas para
ressocialização nas unidades prisionais do Estado de São Paulo. O grupo contempla
o Centro de Referências Técnicas (CTR) que, por meio das Células de Referências
Técnicas (CLLs), possuem contato com as unidades para acompanhar e orientar as
atividades técnicas, promover as ações de reintegração social em diversas áreas.
Também faz parte do GAR o Centro de Políticas Específicas (CPE) que atua
com foco na diversidade, promovendo ações voltadas para grupos específicos de
idade, gênero, etnias e necessidades especiais.
Apenas para citar como exemplificação, de como uma vez aplicado, a
ressocialização, ainda nos estabelecimentos prisionais, como uma forma de
reeducação do privado de liberdade, durante a pandemia, muitos dos utensílios,
como máscaras, foram produzidos dentro de estabelecimentos prisionais, por
privados de liberdade. Em SP mais de 6 milhões de máscaras foram produzidas por
P á g i n a | 100

pessoas condenadas. Fora é claro os inúmeros exemplos, que são possíveis de


conhecer.
O sistema prisional é falho, em grande parte dos países do mundo,
especialmente no Brasil, por conta de condições desumanas de tratamento àqueles
privados de liberdade, não tem como se esperar que uma vez um condenado, saia
em condições sociais e educacionais melhores de quando o mesmo adentrou esse
sistema.
Assim, o primeiro passo para a transformação do sistema, além é claro de
oferecer condições dignas de cumprimento de pena, como direito básico de todo
o ser humano, é também oferecer opções e meios para que aquele seja educado,
ressocializado, e que possa se tornar parte de uma sociedade.

8. POSSÍVEL CONSTRUÇÃO DE NOVOS ESTABELECIMENTOS


PRISIONAIS PELA SECRETARIA DE ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA:
INICIATIVAS PÚBLICAS OU PARCERIAS PÚBLICAS PRIVADAS

O Estado de São Paulo possui iniciativas de Parceria Público Privadas (PPP),


na construção de estabelecimentos prisionais. Dentre os planos mais recentes, o
estado visa a construção de 4 estabelecimentos, lançando editais de licitação para
empresas, visando a construção dessa parceria (PPP).
Dentre o andamento dos trâmites, para o início dos trabalhos licitatórios,
uma ação foi impetrada, visando a interrupção desta parceria. Tal iniciativa possui
dúvidas de sua eficiência, visto que, seria os primeiros passos da privatização ou
terceirização do sistema prisional, além de que, a Emenda 104, diz que, iniciativas
de terceirização de atividades de custódia e segurança dos presídios.
Apesar da vigência da emenda, o Presidente do TJ-SP, autorizou a
continuação do processo licitatório, ainda que com críticas, que tal medida seria o
ensejo para o início de possíveis terceirizações ou privatizações do sistema
prisional.
Tal medida, já é de certo modo, mal vista por entidades que analisam o
sistema prisional, e que, tais mudanças, poderiam ao invés de diminuir a presença
P á g i n a | 101

e gastos do estado, aumentando drasticamente, “custo por detento seria quase o


triplo do sistema público”. Além de tais situações como esta, outras não só no Brasil,
mas no mundo, trazem situações que, mostram que tais PPP, ou terceirizações, com
experiências mal-sucedidas no Amazonas e no Maranhão, onde ocorreram
sucessivas chacinas em presídios controlados por empresas privadas também
mostram que esse não é o caminho. Até mesmo nos Estados Unidos, a privatização
dos presídios tem sido apontada como um dos fatores que contribuíram para a
explosão dos índices de encarceramento nas últimas décadas.
A privatização dos presídios é contrária à proposta do Banco Mundial, que
em relatório em 2013 propôs a redução no número de presos provisórios, hoje
estimados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em mais de 337 mil pessoas,
41,5% da população carcerária. Além de ser um modelo que provoca o
recrudescimento penal e vai contra os interesses dos agentes penitenciários.
Vimos que muitas vezes, ações de Governos, sejam eles nas três esferas do
país, usam a privatização, ou a terceirização como formas de "diminuírem" a
presença do Estado, e que em alguns segmentos a saída para tal diminuição de
gastos, seriam tais medidas, mas muitas vezes, o Estado abdica de suas
prerrogativas, como forma de economia, e ao fim, os serviços prestados, pela nova
iniciativa acabam piores que anteriormente.
Por iniciativa pública, por parte do próprio Estado, além das mais de 174
unidades prisionais do Estado de SP, sendo 44 na região de atuação deste
Observatório, possui ainda a construção do “Centro de Detenção Provisória de
Álvaro de Carvalho”, em Álvaro de Carvalho, e o “Centro de Detenção Provisória I e
II de Gália”, em Gália. Assim, além das 44 unidades prisionais, o estado possui mais
duas unidades em construção, indo ao total de 46 unidades prisionais, na região
que abrange as maiores cidades do Centro Oeste Paulista, ¼ dos estabelecimentos
prisionais, encontram-se nesta região.
O Estado novamente, se presa em “investir” na construção de
estabelecimentos prisionais, em detrimento do investimento correto da verdadeira
ressocialização, reeducação, para trazer novamente o privado de liberdade, a
sociedade, após seu cumprimento de pena.
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9. ATUAL: A COVID-19 NOS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS DO


CENTRO OESTE PAULISTA

Ainda no período que antecedeu o “boom” de casos de Covid-19 no Brasil,


a maior preocupação era com a ocorrência de casos de Covid, no sistema prisional,
e que o contágio da doença seria de forma mais rápida que a própria população,
por razões óbvias. Num sistema com variantes de 740 a 880 mil pessoas, sendo
oferecidas pouco menos de 440 mil vagas, ou seja, o dobro do número de pessoas
privadas de liberdade.
Medidas como o cancelamento das visitas, foram tomadas, para que o vírus
não adentrar os estabelecimentos prisionais, ainda que, de maneira ou outra, o vírus
adentraria os estabelecimentos, lembremos dos servidores que ali trabalham, e
que, correm o risco de possuírem o vírus, serem assintomáticos, e o transmitir para
os privados de liberdade.
De acordo com o boletim diário do dia 7 de outubro de 2020, divulgado
pela Secretaria de Administração Penitenciária, atualmente são 994 servidores
confirmados com exame PCR, 727 positivos em Teste Rápido e 30 óbitos. 875
presos foram confirmados para COVID-19 com o exame PCR, e 7.659 testaram
positivos em Teste Rápido. O número de óbitos confirmados também foi 30.
Ainda segundo o mesmo boletim, os servidores possuem taxa de letalidade
de 1,71%, enquanto os presos tem 0,35%. 93,99% dos servidores já se encontram
recuperados, número inferior à porcentagem de presos recuperados, que é de
96,04%. O gênero mais afetado dentre os servidores é o masculino, com 81% de
afastamento por suspeita, descarte, contaminação ou recuperação da COVID-19
(4622 servidores). Já as servidoras do gênero feminino somam 19% do total de
afastamentos (1058 servidoras).
A estatística também é regra entre as pessoas privadas de liberdade. Os
presos do gênero masculino apresentaram 98% do total de contaminação (9.550
presos), enquanto as pessoas do gênero feminino somaram 2% do total (193
presas).
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A Resolução 1/2020 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos,


intitulada “Pandemia e Direitos Humanos nas Américas”, recomenda em sua parte
resolutiva, a adoção de medidas especiais em relação aos grupos em situação de
vulnerabilidade, a qual pode agravar-se no contexto da pandemia do COVID-19.
Em relação às pessoas privadas de liberdade, definidas pela CIDH com especial
vulnerabilidade durante a pandemia, devem os Estados adotar medidas para
enfrentar a aglomeração nas unidades prisionais, inclusive por meio da reavaliação
dos casos de prisão preventiva para identificar as possibilidades de conversão em
medidas alternativas à privação de liberdade, priorizando os grupos de maior risco
à saúde frente ao contágio pela COVID-19 (pessoas pertencentes ao grupo de risco
informado pela OMS), como idosos e mulheres grávidas ou com filhos em período
de amamentação.
Devem os Estados avaliar os pedidos de benefícios carcerários e
medidas alternativas à pena de prisão em relação às pessoas em situação de risco
no contexto da pandemia. Impondo requisitos mais exigentes para a análise dos
casos envolvendo condenações por graves violações de direitos humanos e delitos
de lesa-humanidade, atendendo o bem jurídico afetado, a gravidade dos fatos e a
obrigação dos Estados de punir os responsáveis por tais violações, utilizando-se dos
princípios de proporcionalidade e os parâmetros interamericanos aplicáveis.
Em relação às condições de detenção das pessoas privadas de
liberdade, em relação à alimentação, saúde, saneamento e medidas de quarentena,
estas devem ser adequadas para impedir o contágio intramuros pela COVID-19,
também por meio da garantia de assistência médica em todas as unidades
prisionais.
Por fim, é necessário estabelecer protocolos para a garantia da
segurança e da ordem nas unidades de privação da liberdade, em particular para
prevenir atos de violência relacionados com a pandemia e respeitando os padrões
interamericanos a respeito desta. Também, assegurar a proporcionalidade em
todas as medidas que limitem os contatos, comunicações, visitas, saídas e
atividades educativas, recreativas ou de trabalho, garantindo-as por todos os outros
meios que se fizerem possíveis.
P á g i n a | 104

EIXO MIGRAÇÃO E REFÚGIO | ODHOP

INTRODUÇÃO

Neste tópico, com base nos levantamentos bibliográficos e documentais


realizados, buscou-se realizar: uma introdução filosófica e conceitual no que
concerne à temática da migração, com especificidade para o refúgio, à luz das
contribuições teóricas de Zygmunt Bauman (2017) e Erving Goffman (1988), no que
tange à relação entre pessoas em situação de refúgio, sociedades receptoras e a
retórica de exclusão estadista-midiática; bem como apontamentos acerca das
respostas político-jurídicas em níveis internacional e doméstico frente ao contexto
pandêmico que impactam diretamente no deslocamento humano internacional,
dialogando diretamente com as professoras Emília Lana de Freitas Castro 134 (2020),
Marilda Rosado de Sá Ribeiro135 (2020) e o professor André de Carvalho Ramos136
(2020); e, por fim, uma apresentação quantitativo-estatística do contexto da
pandemia no Brasil com enfoque para o Estado de São Paulo, a partir de

134
Doutora em Direito pela Universität Hamburg (2019). Ex-bolsista de doutorado da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação do Ministério da Educação (MEC).
Mestre em Direito Internacional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2014). Bacharel em
Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2011). Membro da Associação de Juristas
Alemanha-Brasil (DBJV), membro pleno da Asociación Americana de Derecho Internacional Privado
(ASADIP) e membro de Netzwerk Migrationsrecht (Alemanha). Ex-bolsista de Mestrado do Programa
de Recursos Humanos n. 33, da Agência Nacional do Petróleo (2013-2014). Ex-bolsista de Graduação
do Programa de Recursos Humanos n. 33, da Agência Nacional do Petróleo (2008-2010).
135
Possui graduação em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1975), graduação em
Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1974), mestrado em Filosofia do Direito
pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1979), doutorado em Direito Internacional
pela Universidade de São Paulo (1996) e Pós-Doutorado pelo Institut d'Études Politiques de Paris,
Sciences Po (2014). Atualmente é professora associada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
– UERJ; Sócia de Barbosa, Raimundo, Gontijo e Câmara - BRGC Advogados; membro-sócio da
Sociedade Brasileira de Direito Internacional; integrante da Association of International Petroleum
Negotiators; sócia fundadora do Centro de Excelência em Desenvolvimento, Petróleo, Energia e
Mineração (CEDPEM); membro-sócio do Instituto Brasileiro do Petróleo e membro-sócio da
International Law Association (ILA).
136
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP – Largo São Francisco). É
Professor Titular do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu - Mestrado e Doutorado - da Faculdade
Autônoma de Direito (FADISP). É Livre-Docente e Doutor em Direito Internacional pela Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo. Foi visiting fellow do Lauterpacht Centre for International Law
(Cambridge). É Procurador Regional da República. Foi Secretário de Direitos Humanos da
Procuradoria-Geral da República (2017-2019). Foi Procurador Regional Eleitoral do Estado de São
Paulo (2012-2016). É autor de obras em Direito Internacional Público, Direito Internacional Privado e
Direitos Humanos.
P á g i n a | 105

contribuições advindas da professora Rosana Baeninger137 (2020) em conjunto com


os pós-doutorandos Luís Felipe Magalhães138 (2020), Natália Demétrio139 (2020) e
Jóice Domeniconi140 (2020).

1. MIGRAÇÃO E REFÚGIO: DIÁLOGO COM ZIGMUNT BAUMAN


(2017) E ERVING GOFFMAN (1988)

Conforme Zygmunt Bauman (2017), no capítulo denominado “O pânico


migratório e seus abusos”, da obra “Estranhos à nossa porta”, a partir da última
virada de século, para além das migrações que ele define como econômicas 141,
potencializou-se o fluxo de refugiados e de pessoas em busca de asilo. Tal cenário
é consequência, nas palavras do autor, do

Número crescente de Estados “afundando”, ou já submersos, ou – para


todos os fins e propósitos – de territórios sem Estado, e portanto também
sem leis, palcos de intermináveis guerras tribais e sectárias, assassinatos
em massa e de um banditismo permanente do tipo salve-se quem puder
(BAUMAN, 2017, p. 11).

Nesse esteio, Bauman (2017) argumenta que se trata de uma evasão frente
a um cenário caótico e violento, onde o refúgio é, máxime, “impulsionado pelo
regime de violência arbitrária [que leva as pessoas] a abandonar[em] suas casas e
propriedades consideradas preciosas”. (BAUMAN, 2017, p. 12). Isto posto, Bauman
(2017, p. 13) disserta que “refugiados da bestialidade das guerras, dos
despotismos e da brutalidade de uma existência vazia e sem perspectivas” estes

137
Professora Colaboradora no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e no Núcleo de Estudos de
População Elza Berquó da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/NEPO/UNICAMP).
Coordenadora do Observatório das Migrações em São Paulo (NEPO/UNICAMP).
138
Pós-doutorando no Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC – SP e
Coordenador-adjunto do Observatório das Migrações em São Paulo (NEPO/UNICAMP).
139
Pós-Doutoranda no Núcleo de Estudos de População “Elza Berquó” (NEPO/UNICAMP) e
Coordenadora-Adjunta do Observatório das Migrações em São Paulo (NEPO/UNICAMP).
140
Doutoranda no Programa de Pós-graduação de Demografia do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/UNICAMP) e pesquisadora do Observatório
das Migrações em São Paulo, Núcleo de Estudos de População Elza Berquó (NEPO/UNICAMP).
141
“Estimulados pelo desejo demasiadamente humano de sair do solo estéril para um lugar onde a
grama é verde: de terras empobrecidas, sem perspectiva alguma, para lugares de sonho, ricos em
oportunidades”. (BAUMAN, 2017, p. 12). Esta, conforme Bauman (2017), é uma realidade que
advém de tempos remotos, tendo sido apenas acelerada nos tempos modernos.
P á g i n a | 106

são assumidos enquanto ‘estranhos’ nas sociedades receptoras. Dito de outra


forma, diferentemente do que se pensa sobre as pessoas as quais se estabelece
relação no cotidiano – que se imagina conhecer e saber o que esperar de seus
comportamentos –, os refugiados proporcionam, segundo o autor – à medida que
são percebidos como diferentes –, ansiedade142.
Por conseguinte, e dentro desse contexto, Bauman (2017) afirma que, em
termos de estratégia política, posturas que se aproveitam do sentimento social
supramencionado para fomentar o distanciamento, potencializam o estranhamento
e a desconfiança. Tal-qualmente, este autor conclui que, na contramão da recusa
de se encarar os desafios impostos na contemporaneidade, deve-se ter em vista
uma “fusão de horizontes” em detrimento de uma “fissão induzida e planejada”, na
medida em que se enxerga o outro enquanto espelho de si mesmo. (BAUMAN,
2017, p. 23).
Em “Flutuando pela insegurança em busca de uma âncora”, Bauman (2017)
disserta sobre a problemática que enxerga na subordinação da questão migratória
à paróquia da segurança nacional, dialogando com o debate entorno “da admissão
versus rejeição de refugiados e pessoas em busca de asilo”. (BAUMAN, 2017, p.
46). Neste desígnio, o autor menciona Erving Goffman (1988) à luz do conceito de
estigma – definido e trabalhado por este em sua obra homônima143 –, associando-o
à categoria da migração e do refúgio.
Outrossim, conforme Goffman (1988), a literalidade do termo estigma
remonta à Grécia Antiga – quando fora criado para denotar marcas físicas que
realçassem algo de anômalo no âmbito moral de quem as possuíssem. Já no século
XX, como disserta, o estigma segue associado à concepção grega, todavia não mais

142
Nas palavras do autor: “Estranhos tendem a causar ansiedade por serem “diferentes” – e, assim,
assustadoramente imprevisíveis, ao contrário das pessoas com as quais interagimos todos os dias e
das quais acreditamos saber o que esperar. Pelo que conhecemos, o influxo maciço de estranhos
pode ser o responsável pela destruição das coisas que apreciávamos, e sua intenção é desfigurar
ou abolir nosso modo de vida confortavelmente convencional. (...) Sobre os estranhos [...] sabemos
muito pouco para sermos capazes de interpretar seus artifícios e compor nossas respostas
adequadas – adivinhar quais possam ser suas intenções e o que farão em seguida. E a ignorância
quanto a como proceder, como enfrentar uma situação que não produzimos nem controlamos, é
uma importante causa de ansiedade e medo” (BAUMAN, 2017, p. 14).
143
Goffman, Erving. Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada, Rio de Janeiro,
Editora LTC, 1988.
P á g i n a | 107

no âmbito corporal, e sim, em suas palavras, “à própria desgraça”. (GOFMANN,


1988, p. 05).
A sociedade, para Goffman (1988), categoriza o que se entende por
normalidade entre seus entes dentro de cada fragmento. De modo que em cada
meio social há categorias de indivíduos os quais possivelmente serão ali
encontrados. Tal-qualmente, no ‘estranho’ – no ‘outro’ – recai a interpretação social
de indesejabilidade (GOFFMAN, 1988). Destarte, ao se “deixar de considera-lo
criatura comum, reduzindo-o a uma pessoa estragada e diminuída” (GOFMANN,
1988, p. 06), sobremaneira quando se reverbera em substantiva nódoa social,
denota-se em estigma. Em outras palavras, é o “indivíduo que está inabilitado para
aceitação social plena”. (GOFFMAN, 1988, p. 07).
À vista disso, Goffman (1988) classifica três tipos de estigmas: o estigma que
decorre de deformações físicas; os atinentes a distúrbios de caráter; e, por fim, os
estigmas que denomina enquanto tribais (GOFFMAN, 1988). Estes, em seus
termos, “podem ser transmitidos através de linhagem e contaminar por igual todos
os membros de uma família”. (GOFFMAN, 1988, p. 07). E aplicam-se, para além da
religião, à raça e à nação.
Articulando o estigma tribal (GOFFMAN, 1988) à categoria do refúgio, para
Bauman (2017), securitizar o “problema da migração” incorreria no “estímulo a
intenções interconectadas da Al-Qaeda, do Daesh e de seus potenciais apêndices
e seguidores”. (BAUMAN, 2017, p. 41). Assim, como uma dessas intenções,
Bauman (2017) entende que tais grupos “tiram proveito das dinâmicas do estigma”
(BAUMAN, 2017, p. 43) tal como conceituada por Goffman (1988). Argumenta-se,
ademais, que as pessoas não estigmatizadas utilizam a sua condição como
parâmetro para validar a humanidade alheia, de modo que, por conseguinte,
acabam por desumanizar o diferente (BAUMAN, 2017). “O resultado direto disso é
uma recusa à aceitação social e à alienação de pessoas categorizadas como
anômalas”. (BAUMAN, 2017).
Logo, Bauman (2017) argumenta que rejeitar a perspectiva “nós contra eles”
seria necessário para evitar que tais estigmatizados sejam recrutados por grupos
como o Daesh e a Al-Qaeda, de modo que, conforme o autor, citando Pierre
Baussand, “em vez de travar guerras contra o Daesh na Síria e no Iraque, as maiores
P á g i n a | 108

armas que o Ocidente pode empregar contra o terrorismo são investimentos


sociais, inclusão social e integração em nosso território”. (BAUMAN, 2017, p. 48,
grifo nosso).

2. APONTAMENTOS SOBRE AS RESPOSTAS INTERNACIONAL E


NACIONAL FRENTE AO CONTEXTO DA PANDEMIA

2.1. A resposta internacional

É insigne, conforme Castro & Ribeiro (2020), a insegurança que o contexto


pandêmico traz a toda a sociedade. De modo que mesmo quem tem a
oportunidade de permanecer no conforto do seu lar, sente-se inseguro. Algo que,
segundo as autoras, é intensificado no que tange aos migrantes, pessoas que
sofrem inseguranças em relação ao ir, vir, estar e permanecer todos os dias. Por
conseguinte, ademais do fato de que a insegurança atinente à Covid potencializa a
insegurança natural dos movimentos migratórios – sobretudo no que diz respeito à
tomada de decisões por parte dos migrantes –, o posicionamento dos Estados e
lideranças políticas no combate à pandemia intensifica esse sentimento, à medida
que decisões político-jurídicas, por parte dos Estados, influenciam e impossibilitam
o movimento de pessoas (CASTRO & RIBEIRO, 2020).
Neste esteio, segundo Castro & Ribeiro (2020), diversos Estados tomaram
medidas para proteger os seus nacionais, impactando vulnerabilidades no que
tange aos migrantes no contexto. Logo, conforme as autoras, para além do Brasil,
é necessário refletir sobre tais vulnerabilidades, bem como, a partir da reação da
comunidade internacional frente à problemática, repensar sobre o direito dos
migrantes em um momento de crise sanitária144.
A partir da análise do processo pandêmico, Castro & Ribeiro (2020)
observam, basicamente, três tipos de deslocamentos humanos: os deslocamentos
internos; o retorno de pessoas aos seus países de origem; e a maior precarização

Na medida em que os deslocamentos nos moldes contemporâneos potencializam o aumento do


144

contágio (CASTRO & RIBEIRO, 2020).


P á g i n a | 109

dos refugiados. Ressalta-se, nesse sentido que, em termos de nomenclatura, as


mesmas entendem que a migração, no contexto, seja de natureza híbrida – forçada
e voluntária, à medida que todos os tipos145 de deslocamento foram limitados
(CASTRO & RIBEIRO, 2020).
Os deslocamentos internos, conforme as autoras, ocorrem em consequência
da economia informal, ou seja, no âmbito de pessoas que necessitam dessa renda
diária para sobreviver – vide: o caso indiano onde as pessoas andavam milhares
quilômetros dos grandes centros urbanos para as áreas rurais; e o peruano, de
modo que, no país, mais de 60% da economia refere-se à economia informal, logo
as pessoas tiveram que sair dos grandes centros urbanos para conseguir
sobreviver, ao passo que a oferta, nesses locais, tornou-se escassa (CASTRO &
RIBEIRO, 2020).
Já quanto ao retorno aos países de origem, houve casos, observados pelas
autoras, de voos de repatriação. Vide o voos de repatriação – por uma questão de
cooperação internacional com Portugal – de brasileiros que, do dia para a noite,
perderam seus empregos, ficando desamparados (sem ter o que comer, onde
morar e para onde ir) – e nesse esteio, o governo brasileiro facilitou a volta dos
mesmos. Bem como casos de colombianos e bolivianos no aeroporto de São Paulo,
na mesma situação que a supramencionada, esperando algum por um auxílio
diplomático nesse sentido (CASTRO & RIBEIRO, 2020).
E no que tange ao refúgio, as autoras observaram que alguns Estados
detiveram146 refugiados a partir da retórica de se “evitar a disseminação da
pandemia no país”. No contexto europeu, houve casos de detenção e “devolução”
de refugiados em razão das medidas de proteção ao Coronavírus – nesse meandro,
observou-se o confinamento dessas pessoas em campos de refugiados sem a
menor infraestrutura de higiene (CASTRO & RIBEIRO, 2020).
Como argumentam Castro & Ribeiro (2020), quanto às reações da
comunidade internacional para a proteção de migrantes no contexto, observou-se,
à guisa de exemplo, no esteio dos Estados – como Portugal – a flexibilização dos

145
Da pessoa, em um âmbito privilegiado, que em 2020 tenha decidido investir em um negócio no
exterior e não pôde se deslocar à pessoa que perdeu o seu emprego e não tinha o que comer no
dia seguinte (CASTRO & RIBEIRO, 2020).
146
No sentido, conforme as autoras, de “detenção”.
P á g i n a | 110

procedimentos migratórios e aceitação do status de ilegalidade migratória para


proteção dessas pessoas até que tudo se normalizasse. E no entorno das
organizações internacionais, conforme as autoras: a) na América Latina, a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos emitiu a Resolução “Pandemia y Derechos
Humanos en las Americas”, estabelecendo padrões e recomendações de
tratamento aos migrantes considerando as medidas de exceção adotadas pelos
Estados (OEA) no combate ao vírus. De modo que a ideia central dessa resolução
é o respeito aos Direitos Humanos no contexto pandêmico – vide a proibição de
detenções, evitando expulsões e deportações em massa. Ademais de uma tentativa
de facilitar com que o direito ao regresso por meio de cooperações internacionais
fosse possível, respeitando, por exemplo, a união familiar. E uma recomendação de
que os Estados se abstenham de intimidar e desencorajar o acesso de pessoas em
situação de mobilidade humana a programas e políticas de resposta à atuação à
pandemia; b) Já a Organização Internacional para as Migrações lançou um
programa estratégico regional e um plano de resposta à Covid-19,
especificamente, para América do Sul, por meio de financiamento 147. Tal-
qualmente, a resposta reverberou no sentido de contribuir para: uma redução da
morbidade e da mortalidade associadas à Covid; a garantia do acesso dos
migrantes aos insumos, cuidados básicos de saúde e serviços sociais de proteção;
e o apoio a parceiros nacionais e internacionais para responder aos impactos
socioeconômicos causados (CASTRO & RIBEIRO, 2020).
E em relação à resposta da comunidade acadêmica internacional, destaca-
se, conforme as autoras, um documento de uma escola de ensino superior em Nova
Iorque148, desenvolvendo 14 princípios de proteção à mobilidade humana em
tempos de Covid-19 aplicados a refugiados, deslocados internos e migrantes em
geral. E além dos pontos que normalmente constam em Constituições, enfocam-
se: o direito do estrangeiro à saúde; o combate ao preconceito, racismo,
xenofobia149; o princípio de que a contenção do vírus não deve impedir a
movimentação entre os Estados; e o direito à informação sobre a Covid, não

147
$21 milhões reservados a 10 países da América do Sul (CASTRO & RIBEIRO, 2020).
148
Zolberg Institute on Migration and Mobility.
149
Lembrando, conforme as autoras, do grande preconceito sofrido pelos chineses, sobretudo no
início da pandemia, nos EUA e na Europa – como também no Brasil.
P á g i n a | 111

somente em torno de medidas de prevenção na língua dos estrangeiros, mas


também informação sobre como está o contágio no país e na região em que os
estrangeiros estão baseados (CASTRO & RIBEIRO, 2020).
Por fim, enquanto conclusão, Castro & Ribeiro (2020) dissertam que o novo
contexto pandêmico trouxe novas garantias e proteções aos migrantes – antes não
tão óbvias –, como a garantia à informação (na língua materna). Outrossim,
entendem ser interessante a movimentação da comunidade internacional – no
tocante a servir para outros contextos de outras pandemias que possam surgir –
que embora na paróquia de recomendações (soft law), são necessárias150. Ademais,
as autoras argumentam que o apoio intelectual e institucional de atores de direito
internacional e da academia se mostra cada vez mais importante, principalmente
em um contexto onde Estados, argumentando a primazia pela “diminuição da
periculosidade do vírus”, impedem a entrada de migrantes em situações de
vulnerabilidade ou que não fornecem a proteção e prevenção necessárias a
indivíduos em campos de refugiados (CASTRO & RIBEIRO, 2020).

2.2. A resposta doméstica

No esteio doméstico, introdutoriamente, Ramos (2020) pontua que a


pandemia gerou, em 30 de Janeiro, uma declaração, por parte da Organização
Mundial da Saúde (OMS), de uma emergência de saúde pública de importância
internacional. De modo que, quando assim o faz, a OMS busca sensibilizar e
coordenar os Estados com base no entendimento de que a doença não está restrita
a um único território, à medida que detém um alto grau de expansão tanto do
ponto de vista geográfico como populacional, impactando em mortes. Tal-
qualmente, em 11 de Março, a OMS declara a pandemia global dado o impacto
generalizado em relação à população em mais de 180 países.
Por conseguinte, Ramos (2020) afirma que no plano normativo brasileiro, a
reação foi quase que imediata. Em 03 de Fevereiro, adotou-se uma portaria (138),
pelo Ministério da Saúde, que declarou emergência em saúde pública de

Na medida em que quanto menos atuantes são os Estados no contexto, mais essenciais se tornam
150

as atuações de tais entidades (CASTRO & RIBEIRO, 2020).


P á g i n a | 112

importância nacional. Imediatamente, em 06 de Fevereiro, foi editada a Lei da


Pandemia (9.779), reverberando em medidas provisórias – algumas delas
debatidas no Supremo Tribunal Federal – e portarias. Tal lei traz em seu artigo 3º,
entre diversas medidas, a possibilidade do chamado “fechamento de fronteiras151”
– que, juridicamente falando, conforme este autor, representa a restrição
temporária e excepcional da entrada de não nacionais no país (RAMOS, 2020).
Nesse esteio, Ramos (2020) disserta que houve certa dúvida sobre qual seria
o alcance desse fechamento de fronteiras. De modo que após uma escala de
portarias nesse sentido – vide o fechamento da fronteira com o Uruguai – houve a
unificação das mesmas, que se deu, com a portaria conjunta 255 – a partir de
ministros da Casa Civil, Justiça, Infraestrutura e Saúde.
Desse regime jurídico, destaca-se, para o autor, os limites subjetivos. De
modo que, nesse meandro, não somente se buscou excluir o não-nacional como
também houve discriminação especial àqueles possuem residência definitiva no
Brasil (mesmo portadores de registro nacional migratório) – de modo que, para a
quase totalidade das fronteiras brasileiras, foi admitido o ingresso dessas pessoas,
menos para os migrantes provenientes da Venezuela (artigo 4º da portaria 255).
Logo, houve, conforme Ramos (2020), discriminação de origem venezuelana sem
fundamentação clara e com precisão de motivo. Já objetivamente, limitou-se os
meios de transporte, de modo que se discutiu o papel de cada um desses meios
para a disseminação e propagação do vírus (RAMOS, 2020).
Para Ramos (2020), as sanções para o ingresso do não-nacional no território
brasileiro foram estabelecidas nessas portarias de maneira draconiana. Ou seja,
houve a menção às responsabilidades civil, administrativa e penal, todavia foi
prevista a repatriação, deportação imediata e a inabilitação do pedido de refúgio.
Logo, desde Fevereiro, com o fechamento de fronteiras, houve um grande impacto
no número de acolhidos no país – para além, o meio utilizado, conforme o autor,
não foi proporcional, visto que: ao estabelecerem hipóteses de exclusão, as

Uma medida emergencial tomada no contexto sob forma de reação imediata de vários países que
151

impediram a entrada de não nacionais – alguns até impedindo a entrada de nacionais residentes em
outros países. De modo que não se pode perder de vista, que no âmbito dos não nacionais, há
solicitantes de refúgio e àqueles que necessitam de uma acolhida humanitária, algo que, por
conseguinte, proporciona uma reflexão sobre a constitucionalidade e convencionalidade de tais
medidas (RAMOS, 2020).
P á g i n a | 113

portarias não levaram em consideração o regime jurídico dos solicitantes de


refúgio, na medida em que o princípio da proibição do rechaço é considerado
norma jus cogens do Direito Internacional (RAMOS, 2020) – tal princípio,
extremamente caro ao Estatuto do Refugiado, foi ratificado pelo Brasil 152. Em
situação nas quais, por violação maciça de Direitos Humanos ou perseguição
religiosa, o Brasil deve acolher e verificar – caso a caso – a situação de solicitantes
de refúgio. O fechamento e a sensação de inabilitação do pedido de refúgio
denotam uma situação que não encontra previsão nos diplomas normativos
supramencionados (RAMOS, 2020).
Nesse esteio, Ramos (2020) argumenta que é possível que o Estado utilize a
existência da pandemia como um argumento que – em nome do balanceamento
entre os direitos envolvidos – atesta a possibilidade de se utilizar previsão do
Estatuto dos Refugiados sobre a cessão ao princípio em relação à admissão no
território, argumentando a iminência de “ofensa à segurança” do mesmo (no
âmbito de disseminação e propagação do vírus)153. Todavia, segundo Ramos
(2020), há métodos menos custosos ao direito ao acolhimento, comprimindo-o de
maneira mais adequada sem destruir o seu núcleo essencial – vide a execução de
medidas profiláticas (testagem, isolamento por 14 e 28 dias, etc.), medidas essas
que foram aplicadas aos brasileiros que retornaram ao território nacional.
Tal-qualmente, em conclusão, Ramos (2020) entende que se o Estado
brasileiro tivesse previsto tais medidas de prevenção à disseminação do vírus,
preservando o direito a acolhida, o país teria se comportado melhor, diante da
pandemia, em face da mobilidade humana internacional.

2.3. O Nexo Argumentativo

Realizada a exposição com base na análise em torno da resposta imediata ao


contexto de pandemia por parte de Estados, Organizações Internacionais e

152
De modo que a Lei 9474 demonstra a aceitação a tal princípio, concretizando o direito ao
acolhimento (RAMOS, 2020).
153
Postura essa, conforme o autor, extremamente danosa ao desenvolvimento do Direito
Internacional, à medida que estimula outros Estados e gera uma perniciosa sensação do não
cumprimento dos compromissos internacionais livremente assumidos pelo Brasil.
P á g i n a | 114

acadêmicos, onde buscou-se enfocar, primeiramente, o âmbito internacional e,


posteriormente, o escopo doméstico, verificou-se que o nexo argumentativo entre
tais escopos é, sobretudo, a retórica de preocupação sanitária utilizada para
desrespeitar o princípio non-refoulement154 tanto a nível internacional quanto a
nível local.
Em outros termos, o paralelo que se faz é que, internacionalmente, como
apontam Castro & Ribeiro (2020), houve, na Europa, a detenção e “devolução” de
refugiados com base no argumento de que seria medida necessária para a
proteção doméstica à proliferação do Coronavírus – vide, como supramencionado,
o confinamento dessas pessoas em campos de refugiados sem a menor
infraestrutura de higiene. E, no âmbito local, como disserta Ramos (2020), desde
Fevereiro, a partir do fechamento de fronteiras, o Brasil estabeleceu hipóteses de
exclusão, na medida em que as portarias não levaram em consideração o regime
jurídico dos solicitantes de refúgio – de modo que o princípio da proibição do
rechaço é considerado norma jus cogens do Direito Internacional.
Outrossim, entende-se que em ambos os prismas – internacional e
doméstico – haveria outras formas, conforme aponta Ramos (2020), de se proteger
frente a disseminação e propagação da Covid-19 que fossem menos custosas ao
Direito Internacional, restringindo o direito ao acolhimento sem dilacerar o seu
cerne fulcral. A guisa de exemplo, como sugere Ramos (2020), por que aplicar as
medidas profiláticas que foram utilizadas nos casos de brasileiros que retornaram
ao território nacional no contexto?

2.4. Os números da pandemia no Brasil com enfoque no estado de


São Paulo: região metropolitana e interior

A base para o desenvolvimento deste tópico é a pesquisa “Impactos da


Pandemia de Covid-19 nas Migrações Internacionais no Brasil” (2020). Esta,

“Princípio internacional de não devolução (non-refoulement): previsto na Convenção sobre o


154

Estatuto dos Refugiados de 1951 e no respectivo Protocolo de 1967, ratificados pelo Brasil, que
determina a impossibilidade de extradição do refugiado como meio para impedir que essas
pessoas sejam devolvidas para países onde suas vidas ou liberdade estejam sendo ameaçadas”.
(AMBITO JURÍDICO, 2011, n.p.).
P á g i n a | 115

consistiu em um levantamento de campo online realizado, entre maio e julho de


2020, a partir da parceria interinstitucional entre a PUC Minas e a Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), com o apoio de diferentes instituições de ensino
superior, sociedade civil e agência das Nações Unidas (BAENINGER &
FERNANDES, 2020).
Nesse meandro, os pesquisadores optaram pelo levantamento de campo
remoto como um desafio metodológico para conhecer a situação dos imigrantes
internacionais e refugiados residentes no Brasil e suas condições de vida frente à
pandemia de Covid-19. Para tanto, a pesquisa contou com a aplicação de
questionários online com diferentes grupos de imigrantes (BAENINGER &
FERNANDES, 2020).
O questionário foi disponibilizado em seis idiomas – português, espanhol,
inglês, francês, creole haitiano e árabe, e contabilizou aproximadamente 56
questões que abordaram temas relativos à população imigrante quanto ao: perfil
sociodemográfico; condição de moradia e renda; chegada ao
Brasil; status migratório; questões laborais; direitos sociais; acesso à saúde e
mudanças nas condições de vida advindas da pandemia por Covid-19
(BAENINGER & FERNANDES, 2020).
Da mesma forma, com 2.475 participantes no Brasil, e alcançando 171
municípios – correspondentes aos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Roraima,
Rondônia, Região Nordeste, Região Centro Oeste, São Paulo, Minas Gerais, Rio de
Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. E os resultados da pesquisa
indicam o aumento da vulnerabilidade econômica e social para essa população
imigrante na pandemia (BAENINGER & FERNANDES, 2020).
No estado de São Paulo, a pesquisa envolveu 743 respondentes na Região
Metropolitana de São Paulo (RMSP) e 203 respondentes nos municípios do Interior
do estado de São Paulo, totalizando 946 respondentes. De modo que na RMSP
participaram da pesquisa respondentes de 31 nacionalidades. Destas, destacam-
se, conforme demonstram os pesquisadores, os provenientes do Haiti (378
respondentes, o equivalente a 50,87% do total de imigrantes que responderam à
pesquisa na RMSP); e os provenientes da Venezuela (212 respondentes, o
equivalente a 28,53% do total de imigrantes que responderam à pesquisa na
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RMSP). Com volumes de respondentes menor, mas também com especificidades


importantes, estão os imigrantes de nacionalidade da República Democrática do
Congo, Angola e Colômbia (MAGALHÃES et. al, 2020).

É importante notar, conforme demonstrado no mapa acima, que a pesquisa


realizada no interior abarca poucas cidades que compõem, de fato, o Oeste
Paulista. Todavia, pensa-se que os dados obtidos possam ser interessantes para, no
mínimo propor uma reflexão e buscar uma investigação sobre as maiores
dificuldades enfrentadas por migrantes no contexto pandêmico no âmbito da
nossa região – ademais, pensa-se que há muitos pontos de convergência e
similitudes, com base nos dados aqui enfocados, no que tange ao interior de São
Paulo de modo geral.
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Tal-qualmente, aos resultados que nos interessam, dentre os gráficos


produzidos pela pesquisa, destacam-se – afunilando a análise ao esteio do interior
de São Paulo –, aqueles relacionados a:
A. Direitos sociais e pandemia, qual seja, as medidas tomadas durante a pandemia.

Aqui, nota-se que, no interior paulista, foram 171 os respondentes a esta


questão, de modo que as principais respostas afirmadas – em comparação com a
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RMSP – foram as mesmas. A saber, que a maioria (134, equivalente a 78,36%),


respondeu que teve que reduzir suas despesas, ao passo em que 34 respondentes
(19,88%) afirmaram que estão em uma situação muito difícil que dificulta sua
sobrevivência; 23 respondentes (13,45%) afirmou que pediram empréstimos para
amigos/bancos, e 2 respondentes (1,16%) afirmaram que estão buscando
informações sobre outros países para emigrar (MAGALHÃES et. al, 2020).
B. Informações pertinentes à posse de cartão do Sistema Único de Saúde (SUS) por
parte dos imigrantes internacionais respondentes à pesquisa.

Neste ponto, dos 203 respondentes no interior paulista, 177 (87,19%)


declararam possui cartão do SUS, ao passo que 23 (um número absoluto superior
ao da RMSP, e que corresponde, dentre os respondentes do Interior, a 11,33%)
declarou não ter o cartão do SUS. Logo, o percentual dos imigrantes respondentes
que não têm cartão do SUS é significativamente superior no interior paulista em
relação à RMSP – maior, como visto, inclusivo em termos absolutos. Novamente, é
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um indicador, conforme os autores, de limitação das possibilidades de acesso à


estrutura de atendimento à saúde (MAGALHÃES et. al, 2020).
C. Informações sobre aqueles respondentes que afirmaram ter testado positivo ou
que têm alguma pessoa da família que testou positivo, para a Covid-19.

Quanto a tal questão, tem-se que no interior paulista, foram 2 os


respondentes que afirmaram ter testado positivo ou ter alguém de sua família que
testou positivo (equivalente a 0,98%, um percentual bastante inferior ao da RMSP155,
que fora de 9,10%). Destes 2, não houve casos de procura de atendimento médico
no SUS. E ainda no interior paulista, foram 194 os respondentes que afirmaram não
ter testado positivo ou não tem alguém de sua família que testou positivo para a
Covid-19 (95,56%). Mesmo assim, em um caso houve a procura de atendimento
médico no SUS (MAGALHÃES et al., 2020).

Nesse sentido, os autores argumentam que o percentual mais elevado de testagem positiva para
155

a Covid-19 nos respondentes na RMSP em relação aos respondentes no interior está condicionado
não apenas por uma maior cobertura de testagem na região metropolitana, como também a uma
maior incidência da doença na região metropolitana em relação ao interior no momento de
realização desta pesquisa – meses de Junho e Julho (MAGALHÃES et al., 2020).
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D. Informações relacionada aos imigrantes respondentes que testaram positivo ou


que têm alguém de sua família que testou positivo, para a Covid-19 e que buscaram
atendimento no SUS, perguntando a estes qual sua avaliação do tratamento no
SUS.

Neste gráfico, percebe-se, primeiramente, um equívoco na numeração do


mesmo que, na verdade, trata-se do gráfico de número 27, bem como a não
aplicação desse questionamento em específico para o interior. Destarte, no que
tange à RMSP, dos 29 respondentes nessa condição, 18 (62,06%) afirmaram que o
atendimento foi satisfatório, ao passo que 5 (17,24%) foram a óbito (neste caso,
alguém de sua família). Dois respondentes (6,89%) afirmaram que houve
atendimento ambulatorial com isolamento domiciliar. Apenas 1 respondente
afirmou o atendimento foi não satisfatório (MAGALHÃES et. al, 2020).
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E. Informações relacionadas ao grau de dificuldade em lidar com as restrições


impostas pelo isolamento social.

Aqui, por fim, verifica-se que, no interior paulista156, dos 203 imigrantes
internacionais respondentes, 85 afirmaram ter sido fácil lidar com as medidas de
restrição impostas pelo isolamento social (41,87%), ao passo que 101 respondentes
afirmaram ter sido difícil lidar com essas restrições (49,75%).

Os pesquisadores argumentam, nesse meandro, que no interior paulista, tanto o número absoluto
156

como a proporção dos respondentes que afirmaram ter achado difícil lidar com as restrições são
maiores que na RMSP. Essa resultado, segundo os mesmos, pode ser entendido como uma síntese
da rede mais restrita de acolhimento no interior, do menor conhecimento dos direitos sociais, do
menor acesso aos programas sociais, do menor recebimento de apoio, da menor posse de cartões
do SUS e de outros indicadores que, como podemos ver ao longo deste relatório, foram mais
precários no Interior paulista (MAGALHÃES et. al., 2020).
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REFERÊNCIAS E MATERIAL CONSULADO

A extradição e o princípio de não-devolução (non-refoulement) no direito


internacional dos refugiados. ÂMBITO JURÍDICO, 2011. Disponível em:
<https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-88/a-extradicao-e-o-principio-de-
nao-devolucao-non-refoulement-no-direito-internacional-dos-refugiados/>.
Acesso em 22 out. 2020

Impactos da pandemia de Covid-19 nas migrações internacionais no Brasil –


Resultados de Pesquisa / Duval Fernandes; Rosana Baeninger (Coordenadores);
Maria da Consolação Gomes de Castro; Henrique Galhano Balieiro; Juliana Rocha;
Felipe Borges; Luís Felipe Magalhães; Natália Demétrio; Jóice Domeniconi
(Organizadores). Campinas, SP: Núcleo de Estudos de População “Elza Berquó” –
NEPO/UNICAMP, 2020.

Migrações internacionais e a pandemia de Covid-19/Rosana Baeninger; Luís


Renato Vedovato; Shailen Nandy (Coordenadores); Catarina von Zuben; Luís Felipe
Magalhães; Paolo Parise; Natália Demérito; Jóice Domeniconi (Organizadores). –
Campinas: Núcleo de Estudos de População “Elza Bequó” – NEPO/UNICAMP, 2020.

MUSEU DA IMIGRAÇÃO. Webinário | Contexto da pandemia: direitos de migrantes


e refugiados e temas emergentes. 2020. (1h16m48s). Disponível em:
<https://youtu.be/cExdPZJC7Jg>. Acesso em: 22 out. 2020.

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