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INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

CURSO SUPERIOR DE ENGENHARIA METALÚRGICA

RAPHAEL MARIANO DE SOUZA

ESTUDO DA MODIFICAÇÃO E REMOÇÃO DE INCLUSÕES NÃO METÁLICAS


EM AÇO VIA TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL E ESTATÍSTICA
DESCRITIVA

Vitória
2019
RAPHAEL MARIANO DE SOUZA

ESTUDO DA MODIFICAÇÃO E REMOÇÃO DE INCLUSÕES NÃO METÁLICAS


EM AÇO VIA TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL E ESTATÍSTICA
DESCRITIVA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Coordenadoria do Curso de Engenharia
Metalúrgica do Instituto Federal do Espírito Santo
como requisito parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Engenharia Metalúrgica.

Orientador: Prof. Dr. Felipe Fardin Grillo

Vitória
2019
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Biblioteca Nilo Peçanha do Instituto Federal do Espírito Santo)

S729e Souza, Raphael Mariano de.


Estudo da modificação e remoção de inclusões não metálicas em
aço via termodinâmica computacional e estatística descritiva / Raphael
Mariano de Souza. – 2019.
80 f. : il. ; 30 cm.

Orientador: Felipe Fardim Grillo.

Monografia (graduação) – Instituto Federal do Espírito Santo,


Coordenadoria de Cursos Superiores em Metalurgia, Curso Superior
de Engenharia Metalúrgica, Vitória, 2019.

1. Metalurgia. 2. Aço -- Indústria. 3. Processos de fabricação. 4.


Termodinâmica. 5. Estatística industrial. 6. Engenharia metalúrgica.
I. Grillo, Felipe Fardin. II. Instituto Federal do Espírito Santo. III. Título.

CDD 21 – 669
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus que, pela sua graça, misericórdia e amor, me deu a
vida, me sustentou todos os dias e até aqui me ajudou; que me deu a capacidade de
aprender e que colocou ao meu entorno pessoas maravilhosas que, direta ou
indiretamente, contribuíram com toda ou parte da minha caminhada.

À minha família por todos os momentos juntos e por sempre acreditarem em mim. Aos
meus pais, Magno e Valéria, pelo suporte e amor durante toda a vida e pela liberdade
para trilhar meu próprio caminho. À minha irmã, Manoella, pelo companheirismo de
sempre e à minha namorada, Beatriz, que me inspira com sua dedicação e disciplina
em seus estudos e me ajuda com tanto amor, carinho e cumplicidade.

Agradeço ao Professor Doutor Felipe Fardin Grillo pela confiança no meu trabalho e
pela oportunidade de buscar novos desafios; e ao corpo docente do Ifes, por todo
conhecimento transmitido. Agradeço especialmente ao professor Doutor José Roberto
de Oliveira, que me deu as primeiras oportunidades de trabalho em pesquisa e tanto
contribuiu para meu desenvolvimento profissional e acadêmico.

Agradeço à equipe do Global R&D Brazil (ArcelorMittal) que, durante o estágio, fez
despertar ainda mais meu interesse pelo trabalho com pesquisa e desenvolvimento.
Em especial, ao meu supervisor José Eduardo Pereira, sempre disposto a contribuir
com todo o conhecimento específico.

Obrigado aos colegas de graduação e à incrível turma de 2014; aos amigos Elton
Volkers do Espírito Santo, Julia Ohnesorge Pontes e Carlos Kossmann. Espero levar
vocês sempre comigo.

Meus agradecimentos em menção especial à Márcia Spelta, gerente da unidade


técnica da aciaria na ArcelorMittal Tubarão, sempre muito acessível e disposta a
ajudar, e à Julia Norbim Rones, que em nenhum momento mediu esforços quando
solicitada. Muito obrigado!

Aos amigos que sempre estiveram ao meu lado, nos bons e maus momentos, dentro
e fora da graduação, a todos, meu muito obrigado!
RESUMO

O presente trabalho tem como objetivos principais utilizar a termodinâmica


computacional e a estatística descritiva para estudar a modificação de inclusões para
o estado líquido, avaliando o uso do software Thermocalc para predição da obstrução
de válvulas e analisando a influência do oxigênio no processo de modificação e na
geração de inclusões. Foram utilizadas corridas de uma usina siderúrgica com dados
de composição química para realização das simulações termodinâmicas e dados de
análise de inclusões via microscopia eletrônica de varredura para análises estatísticas
de correlação e regressão linear múltipla. Os resultados das simulações
termodinâmicas demonstraram que a sua realização é um método adequado para
predizer a ocorrência de obstrução de válvulas no lingotamento contínuo. Além disso,
o teor de oxigênio se mostrou ser uma variável relevante para a determinação do teor
de cálcio a ser adicionado para modificação das inclusões. A análise de correlações
entre variáveis de composição e de medição de inclusões, das regressões e da
literatura ainda mostram que o aumento de fração líquida das inclusões desfavorece
sua remoção e que a composição química é importante na determinação das
condições de modificação e remoção de inclusões, porém não descreve
completamente esses processos, evidenciando a necessidade da análise da
perspectiva fluidodinâmica de transporte de massa para melhor determinação dessas
condições.

Palavras-chave: Inclusões. Aciaria. Termodinâmica Computacional. Estatística


Descritiva. ASCAT.
ABSTRACT

This work aims to use computational thermodynamics and descriptive statistics to


study the modification of non-metallic inclusions to the liquid state, evaluating the use
of the software Thermocalc to predict continuous casting nozzle clogging and
analyzing the influence of oxygen on the modification process and on formation of
inclusions. Steel’s chemical composition data, from steelmaking plant’s heats, were
used to perform thermodynamic simulations, and inclusion analysis data by scanning
electron microscopy were used for statistical analysis of correlation and multiple linear
regression. The results of the thermodynamic simulations showed that these
simulations are an adequate method to predict the occurrence of nozzle clogging in
continuous casting. In addition, oxygen content proved to be a relevant variable to
determine the calcium content to be added for modification of inclusions. The analysis
of correlations between composition and inclusion data, regressions and the literature
also show that the increase in the fraction of liquid inclusions is detrimental to their
removal and that chemical composition is important in determining the conditions of
modification and removal of inclusions. However, it does not fully describe these
processes, highlighting the need to use the fluid dynamics approach, on the
perspective of mass transfer, to better determine these conditions.

Keywords: Inclusions. Steelmaking. Computational Thermodynamics. Statistics.


Automated Steel Cleanliness Analysis Tool.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................... 8
2 OBJETIVOS ......................................................................................... 11
2.1 OBJETIVO GERAL .....................................................................................................11
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...................................................................................11

3 REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................... 12


3.1 FUNDAMENTOS DA TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL ............. 12
3.2 PROCESSOS SIDERÚRGICOS .......................................................... 15
3.2.1 Panorama Geral .................................................................................. 15
3.2.2 Refino Primário ................................................................................... 16
3.2.3 Refino Secundário .............................................................................. 19
3.2.4 Lingotamento Contínuo ..................................................................... 25
3.2.5 Inclusões ............................................................................................. 31
3.2.5.1 Panorama Geral ................................................................................... 31
3.2.5.2 Formação de inclusões ........................................................................ 36
3.2.5.3 Modificação de inclusões ..................................................................... 38
3.2.5.4 Remoção de inclusões ......................................................................... 40

4 MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................... 46


4.1 DADOS................................................................................................. 46
4.2 ANÁLISES ............................................................................................ 47
4.2.1 Análise de Obstrução......................................................................... 47
4.2.2 Análise da Influência do Oxigênio .................................................... 48
4.2.3 Análise Estatística .............................................................................. 50
4.2.4 ASCAT ................................................................................................. 51
4.2.5 Simulações Termodinâmicas ............................................................ 51

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................... 54


5.1 ANÁLISE DE OBSTRUÇÕES VIA TERMODINÂMICA
COMPUTACIONAL .............................................................................. 54
5.2 INFLUÊNCIA DO OXIGÊNIO ............................................................... 62
5.3 ANÁLISE ESTATÍSTICA ...................................................................... 69

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................. 77


REFERÊNCIAS .................................................................................... 78
8

1 INTRODUÇÃO

A crescente demanda por requisitos mais restritos de qualidade de materiais e


diminuição da tolerância a falhas e defeitos, seja por motivos de segurança, seja por
responsabilidade ambiental dentre outros, fomenta a busca por novos materiais e por
aprimoramento dos já existentes. Nessa perspectiva, busca-se melhorias nos
processos de fabricação do aço a fim de se obter produtos com qualidade satisfatória
aos fins desejados, produtividade e baixo custo.

Para os requisitos de qualidade e produtividade, o desenvolvimento de metodologias


que proporcionem um controle de qualidade ágil e com grau satisfatório de
confiabilidade depende de uma ampla compreensão dos fundamentos que imperam
sobre os processos siderúrgicos que, por sua vez, norteia-se por uma
interdependência entre a termodinâmica metalúrgica e a cinética.

No século passado, por um período considerável, os processos de aciaria foram


desenvolvidos de forma basicamente empírica. Na década de 1940, iniciou-se o
desenvolvimento significativo de metodologias para o tratamento de problemas de
equilíbrio termodinâmico em ligas metálicas líquidas e, no final da década de 1960, a
aplicação sistemática de modelos físicos e matemáticos, aliada ao desenvolvimento
da área computacional, começou a viabilizar a compreensão dos principais
fenômenos relevantes para a eficiência dos processos de aciaria (SILVA, 2014).

Adicionalmente, boa parte desses processos opera em condições distantes daquelas


de equilíbrio termodinâmico e, embora o atual estado do conhecimento da cinética
desses processos permita compreender esse desvio do equilíbrio, muitas explicações
preliminares foram baseadas em premissas que contrariavam a termodinâmica do
processo. Hoje é bem estabelecido que o conhecimento do estado de equilíbrio indica
a tendência do sistema, ou seja, para onde o sistema vai, e esse conhecimento é
fundamental para o modelamento e a compreensão dos processos que se passam e
são concluídos ainda fora de equilíbrio (SILVA, 2014).
9

Por outro lado, processos que se passam próximos ao equilíbrio, ou em que o


equilíbrio termodinâmico é, praticamente, atingido, envolvem sistemas muito
complexos, multicomponente e, em geral, duas ou mais fases, não sendo tratáveis
pelos métodos simplificados desenvolvidos antes da década de 1970 (SILVA, 2014).

Dado esse cenário, a introdução de ferramentas baseadas na termodinâmica para fins


práticos na siderurgia foi limitada pelos enfoques simplificadores em detrimento da
valorização dos conceitos fundamentais e do potencial da termodinâmica como
ciência, trazendo um descrédito à capacidade desse conhecimento no auxílio do
desenvolvimento e na compreensão dos processos que ocorrem na aciaria. Assim,
fomentou-se o desenvolvimento de modelos empíricos ou semiempíricos para o
controle e o projeto de processos de aciaria com as limitações associadas a esse
empirismo (SILVA, 2014).

No entanto, nos últimos 10 anos, há uma quantidade de mais de 1.700 artigos


relacionados ao software de termodinâmica computacional Thermocalc na plataforma
ScienceDirect, mais de 2.400 pertinentes ao software FactSage e mais de 4.000
relacionados ao grupo CALPHAD. Considera-se como expressivo esse dado
numérico de estudos que foram e vêm sendo realizados lançando mão da
termodinâmica aplicada por meio da computação. Esses estudos têm apresentado
relevância no auxílio à compreensão e a tomadas de decisões em processos de
produção de aço.

A engenharia de inclusões começa pela definição das propriedades desejáveis à


inclusão e, depois, pela definição das condições adequadas de processo. O produto
é feito de forma que as inclusões formadas sejam, predominantemente, as
pretendidas (SILVA, 2019).

Nas produções siderúrgicas contemporâneas a limpidez dos aços, que diz respeito à
quantidade de inclusões-não-metálicas, o tamanho e a morfologia de inclusões no
produto final são requisitos essenciais na garantia das propriedades mecânicas e na
trabalhabilidade do material (SILVA, 2019). Algumas propriedades dessas inclusões
possuem fundamental importância em como elas afetam o comportamento dos aços,
10

como a plasticidade e a dureza, em função da temperatura, e o coeficiente de


expansão térmica. E um número excessivo de inclusões ou uma morfologia
inadequada podem levar a problemas como: obstrução de refratários (válvulas e
reatores), rompimento de fios de aço durante estampagem, trincas induzidas por
hidrogênio, fragilização em baixas temperaturas, falha por fadiga e degradação da
qualidade superficial (JUNG; DECTEROV; PELTON, 2004; REIS; BIELEFELDT;
VILELA, 2014).

Na prática industrial, a relevância exercida por inclusões-não-metálicas na


performance do aço é difundida e é foco de constantes estudos e melhorias. Isso se
tornou especialmente importante com a utilização do aço sendo desafiada por
materiais alternativos e por aplicações que demandam mais do material. A melhoria
de várias propriedades só se tornou possível pela compreensão de suas relações com
o tipo, tamanho e distribuição das inclusões presentes no aço (SILVA, 2019).

Assim, este trabalho tem como objeto de estudo a modificação de inclusões-não-


metálicas em aço por meio da utilização do software de termodinâmica computacional
Thermocalc e pela análise estatística de corridas reais de uma companhia siderúrgica
integrada.
11

2 OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL

Este trabalho tem como principal objetivo compreender a modificação de inclusões-


não-metálicas em aço por meio da utilização do software de termodinâmica
computacional Thermocalc e pela análise estatística de corridas reais de uma
companhia siderúrgica integrada.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Para atender ao que propomos como objetivo geral, elencamos os seguintes objetivos
específicos:

• Avaliar o uso da termodinâmica computacional no estudo de obstruções de


válvula (clogging) no lingotamento contínuo;
• Analisar a influência do oxigênio na modificação de inclusões;
• Avaliar a influência da composição química na modificação das inclusões.

Apresentados os objetivos deste trabalho, tratamos, no próximo capítulo do referencial


teórico no qual ancoramos nossos estudos.
12

3 REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 FUNDAMENTOS DA TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

As principais reações nos processos de aciaria envolvem sistemas multifase, tais


como: metal-óxido (metal-escória, metal-refratário, metal inclusões-não-metálicas),
metal líquido-metal sólido, metal-gás. Nesses sistemas, além da necessidade de se
conhecer a tendência da reação química entre os elementos ou “espécies” presentes,
é necessário conhecer como esses elementos ou espécies se comportam quando se
encontram em solução em uma fase multicomponente (SILVA, 2014). Em outras
palavras, a reação de uma espécie A com uma espécie B em um sistema multifase
não depende da interação apenas entre esses dois elementos, mas também da
interação destes com outras espécies.

Em um sistema multicomponente, multifásico, à temperatura e pressão constantes, as


fases presentes, suas composições e quantidades se ajustarão de forma a atingir um
mínimo para o valor de uma função termodinâmica do sistema, a energia livre de
Gibbs. Isto é, se conhecermos todas as fases que podem vir a se formar () e
pudermos calcular a energia livre de Gibbs de cada uma dessas fases em função da
pressão, da temperatura, e da composição química (%E1,E2,....En-1 ), como indicado
na Figura 1, o mínimo de energia livre do sistema será obtido pela minimização da
equação apresentada na Figura 2 (SILVA, 2014).

Figura 1 – Equações da energia livre de Gibbs das fases em função da pressão,


temperatura e composição química.

Fonte: Silva, 2014.


13

Figura 2 – Equação da energia livre de Gibbs total do sistema.

Fonte: Silva, 2014.

A energia livre molar de cada fase é uma função de P, T e da composição química da


fase (quando x elementos estão presentes, x-1 variáveis de composição são
independentes) e a energia livre de Gibbs total do sistema é a soma da energia molar
de cada fase, multiplicada pelo número de moles “n” de cada fase. A ausência de uma
fase no equilíbrio é caracterizada pelo número de moles dessa fase igual a zero
(SILVA, 2014).

Dado isso, para se fazer uso da termodinâmica computacional como ferramenta


prática, precisa-se descrever a energia livre de Gibbs em cada uma das fases
possíveis em função da temperatura, da pressão e da composição química, além de
calcular a combinação de fases, suas composições e quantidades que resultarão em
um mínimo da energia livre de Gibbs do sistema (SILVA, 2014).

Em primeiro lugar, é preciso formular modelos matemáticos que descrevam, de forma


satisfatória, o comportamento das soluções reais. Em segundo lugar, é preciso ajustar
os coeficientes dos modelos às medidas experimentais. Uma vez ajustados os
coeficientes de determinado modelo à determinada fase, armazena-se essa
informação em “bancos de dados” termodinâmicos.

Como a estrutura de termodinâmica é tal que as funções termodinâmicas (entalpia,


entropia, energia livre de Gibbs) de determinada fase são relacionadas entre si,
conforme mostram as equações na Figura 3, basta escolher uma dessas funções para
a constituição do banco de dados (SILVA, 2014).
14

Figura 3 – Equações das funções termodinâmicas entalpia, entropia e energia livre de


Gibbs em função da temperatura e do calor específico à pressão constante.

Fonte: Silva, 2014.

A entalpia (H), a entropia (S), o calor específico, a pressão constante (Cp) e a energia
livre de Gibbs (G) de uma fase são perspectivas diferentes do comportamento
termodinâmico dessa fase e estão ligados, física e matematicamente (SILVA, 2014).

A maior parte das medidas experimentais realizadas em termodinâmica é


calorimétrica, assim, tem-se acesso a valores experimentais de calores específicos
(em metalurgia, Cp é o mais útil, à pressão constante) e entalpia (calor trocado a P
constante), e as relações apresentadas na Figura 3 definem o “modelo matemático”
para G, desde que um polinômio tenha sido escolhido para o Cp (SILVA, 2014).

Para o uso como ferramenta prática no dia-a-dia, é suficiente saber que a estrutura
da termodinâmica computacional se baseia no mínimo da energia livre de Gibbs e
como esta condição de equilíbrio se reflete no equilíbrio entre fases. Ao usar um
programa de termodinâmica computacional, não é importante, para o usuário,
conhecer em detalhe qual o modelo empregado para descrever cada fase, desde que
este tenha sido adequadamente selecionado pelo desenvolvedor do programa. É
necessário, entretanto, conhecer as limitações de uso (faixas de composição química,
compostos e elementos contemplados, faixa de temperatura, entre outras)
estabelecidas pelo desenvolvedor do banco de dados. Extrapolações além dos limites
recomendados podem levar a resultados não-confiáveis (SILVA, 2014).
15

3.2 PROCESSOS SIDERÚRGICOS

3.2.1 Panorama Geral

Os processos siderúrgicos consistem em processos utilizados para a fabricação de


aço, por meio de reações químicas em sua elaboração e de etapas mecânicas para
sua conformação. A Figura 4 ilustra a sequência em algumas possíveis rotas para
uma usina siderúrgica integrada.

Figura 4 – Sequência de produção em uma usina siderúrgica integrada.

Fonte: Garcia, 2006.

As etapas de elaboração do aço são conduzidas em temperaturas acima de 1.400ºC,


nas quais algumas reações conseguem, inclusive, se aproximar do equilíbrio químico,
enquanto outras não (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

As reações na siderurgia são heterogêneas por natureza, ou seja, envolvem a


interação entre várias fases simultaneamente, como escória e metal, gás e sólido etc.
Essas reações ocorrem na interface entre as fases, logo a taxa dessas reações é
diretamente proporcional à área interfacial. Entretanto, para que estas se procedam,
é necessário o transporte de reagentes até as interfaces e o transporte dos produtos
16

para longe delas. Isso é conseguido por meio de uma série de etapas cinéticas que
podem ser divididas e classificadas em (GHOSH; CHATTERJEE, 2010):

1. transporte de massa na matriz ou solvente longe da interface: etapa


suficientemente rápida apenas em fluidos com fluxo turbulento; utiliza-se, de
forma comum, o termo “mistura” para esse tipo de transporte de massa;

2. transporte na interface ou próximo: depende da concentração de espécies na


interface, temperatura, área total disponível etc.;

3. reação química interfacial: formação de novas fases/espécies como resultados


da interação entre reagentes; etapa que depende de condições
termodinâmicas.

3.2.2 Refino Primário

O refino primário é a etapa do processo que trata da conversão do ferro-gusa em aço.


Etapa esta que é, de forma mais difundida, realizada em reatores denominados
convertedores (ou conversores) LD, nos quais a eliminação de C é, quantitativamente,
a reação mais relevante, e ocorre a partir do sopro de oxigênio através de uma lança
com jato supersônico que, por meio de reação direta ou indireta com o carbono, o
elimina na forma de gás CO. Além do oxigênio, em muitos convertedores se utiliza
também o sopro de gás inerte (argônio e/ou nitrogênio) pelo fundo da panela para
homogeneizar e facilitar as reações de oxidação, promovendo melhores condições
cinéticas para isso (GHOSH; CHATTERJEE, 2010; MACHADO, 2006; RIZZO, 2006).

Um esquema do reator é mostrado na Figura 5, bem como as reações químicas que


nele ocorrem em regiões respectivas às indicações. Nessa etapa, além do C, o teor
de Si é reduzido, bem como o P e parte do Mn. Ao final do sopro tem-se então a
presença de duas fases no reator: o aço líquido e a escória sobrenadante, com os
óxidos resultantes das reações metálicas com o oxigênio dissolvido proveniente do
sopro (banho de óxidos fundidos) (GHOSH; CHATTERJEE, 2010; MACHADO, 2006;
RIZZO, 2006).
17

Figura 5 – Reações químicas no convertedor LD durante refino primário de aços

Fonte: Rizzo, 2006

Apesar de a reação de dissolução do gás oxigênio ocorrer em prol das reações de


oxidação dos elementos que se deseja remover, tais reações dependem do transporte
de massa dos reagentes (GHOSH; CHATTERJEE, 2010). À medida que se remove
um determinado elemento, a diminuição da sua concentração diminui também a
probabilidade de colisão atômica, ou seja, do “encontro” entre os átomos de oxigênio
e os do elemento que se deseja retirar do aço. Logo, nem todo o oxigênio incorporado
é reagido e, então, permanece no interior do aço líquido na forma de oxigênio
dissolvido. Pode haver também alguma parcela de óxidos retida no banho metálico,
cujas correntes convectivas não foram suficientes para transportá-los até a escória,
para sua separação do aço.
18

A Figura 6 ilustra uma instalação típica de um convertedor LD, sendo este basculado
ao final do sopro de oxigênio para que o aço seja transferido para uma panela onde
ocorrerá a etapa de refino secundário. Nessa transferência, são adicionados
elementos de liga, recarburante, quando necessário, e desoxidantes, a fim de remover
o oxigênio dissolvido (GHOSH; CHATTERJEE, 2010; RIZZO, 2006).

Figura 6 – Esquema da estrutura organizacional de um galpão para o processo de


refino em convertedor LD.

Fonte: Rizzo, 2006

A desoxidação se faz necessária, pois um grau de oxidação inadequado traz uma


série de inconvenientes para os processos posteriores, como (RIZZO, 2006):

- a formação de inclusões indesejáveis no aço;


19

- a projeção de metal líquido ou de escória durante o transporte, tratamento ou


lingotamento do aço;

- a redução de rendimento das ligas adicionadas para ajuste de composição química


com a conseqüente perda de controle desta composição;

- a formação de FeO com a conseqüente diminuição do rendimento metálico;

- a formação de bolhas que poderiam originar trincas na pele solidificada durante o


lingotamento contínuo, causando inclusive um rompimento de pele e a interrupção, e
muitos casos, desastrosa do processo de lingotamento; e

- a formação de bolhas de gases (CO) na superfície dos produtos lingotados.

3.2.3 Refino Secundário

O refino primário tem a capacidade de refinar o metal em um nível “macro” e entregar


as especificações menos restritas do material, mas não é projetado para atender às
demandas mais restritas de qualidade e de consistência de temperatura e composição
requeridas para vários tipos de aços (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Na atualidade, todos os requisitos e restrições são assegurados nos processos de


refino secundário, que atuam como unidades “multitarefas”, se encarregando de
realizar um ou mais dos seguintes processos: desoxidação; dessulfuração (possibilita
teores abaixo de 0,005%); desfosforação e descarburação (possibilita teores abaixo
de 0,002%); desgaseificação (remoção de hidrogênio e nitrogênio); adição de ligas;
ajuste de temperatura para o lingotamento; homogeneização química e térmica;
modificação de inclusões; e remoção de inclusões (ARNOLD et al., 2006; GHOSH;
CHATTERJEE, 2010; MACHADO, 2006).

Dessa maneira, o refino secundário constitui-se uma etapa primordial nas aciarias
modernas que buscam obter produtos com alto controle de qualidade e requisitos
restritos. A Figura 7 ilustra como a adição de cálcio atua na modificação das inclusões
de alumina, diminuindo seu ponto de fusão.
20

Figura 7 – Tabela esquemática dos pontos de fusão de inclusões de cálcio-aluminatos


e sulfetos.

Fonte: GHOSH, 2000.

As impurezas danosas nos aços incluem enxofre, fósforo, oxigênio, nitrogênio e


hidrogênio. O principal efeito desses elementos é a perda de ductilidade, a perda de
tenacidade e a piora na resistência à corrosão.

Oxigênio e enxofre são também constituintes de partículas não-metálicas, conhecidas


como inclusões, nos aços, e também são prejudiciais às propriedades do material
devendo, portanto, serem removidas ao menor nível possível (GHOSH;
CHATTERJEE, 2010).

A Figura 8 mostra a variação da solubilidade de H e de N com a diminuição da


temperatura no aço. Essa diminuição também ocorre com o oxigênio (GHOSH;
CHATTERJEE, 2010).
21

Figura 8 – Gráfico esquemático da solubilidade de hidrogênio e nitrogênio no aço em


função da temperatura.

Fonte: Ghosh, 2010

Dessa maneira, resta evidente que, durante a solidificação, a presença de teores


inadequados de H, N e O, dissolvidos no aço, pode prejudicar o material pela evolução
de gases e formação de bolhas, que ocorrem pelas reações ilustradas na Figura 9, e
causam fragilidade como concentradores de tensão e má qualidade superficial
(GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Figura 9 – Reações de gaseificação de hidrogênio, nitrogênio e oxigênio dissolvidos


no aço.

Fonte: Ghosh, 2010


22

Esses elementos são provenientes do refino primário. No caso do O, do vazamento


do aço do convertedor; no caso do N e do H, ocorre na absorção pelo contato com a
atmosfera (MACHADO, 2006).

Os equipamentos do refino secundário podem ser agrupados em duas categorias:


sistemas de injeção e sistemas de tratamento sob vácuo. A simplicidade de operação
e o baixo custo operacional e de capital para as unidades de tratamento de injeção as
torna recomendáveis para aços comuns (MACHADO, 2006).

Dois possíveis tipos de equipamento designados à etapa da aciaria são o IR-UT


(Injection Refining-up Temperature), sendo um sistema de injeção, conforme ilustrado
à direita da Figura 10, e o RH-KTB (Ruhstall Heraeus-Kawasaki Top Blowing), de
tratamento sob vácuo, conforme ilustrado à esquerda da Figura 10 (MACHADO,
2006).

Figura 10 – Ilustração de dois reatores da estação de refino secundário de aços: RH


(à esquerda) e IR-UT (à direita).

Fonte: Adaptado de Ghosh, 2010.

No RH, os dois tubos da câmara de vácuo (conhecidas como snorkels) são imersos
no material fundido e, enquanto é aplicado o vácuo, injeta-se gás argônio no tubo
23

ascendente do banho metálico. Bolhas de argônio crescentes e em expansão


fornecem ação de bombeamento e elevam o líquido para a câmara de vácuo, onde se
desintegra em gotículas finas, é desgaseificado, e desce através do tubo
descendente, causando a circulação do fundido (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

No IR-UT, usa-se um snorkel cilíndrico, lança de sopro de oxigênio pelo topo, com
calha de adições e uma lança de gás inerte para agitação do banho. O sopro de
oxigênio em conjunto com a adição de Al fornece aquecimento pela aluminotermia, e
o aquecimento com adição de liga FeSi também ocorre, via reações exotérmicas,
conforme mostradas na Figura 11 (STOLTE, 2002).

Figura 11 – Reações de oxidação do alumínio e do silício metálico e seus respectivos


valores de entalpia

Fonte: ZDENĚK; LADISLAV, 2016.

As principais atividades do IR-UT são (MACHADO, 2006): reaquecimento de corridas


por meio da adição de alumínio (aluminotermia;, ajuste fino de composição química;
homogeneização do aço líquido (composição química e temperatura); remoção de
inclusões não-metálicas por meio do borbulhamento do argônio; controle da
morfologia de inclusões pela injeção de pó Ca-Si; resfriamento de corridas por
intermédio de adição de sucata; e dessulfuração do aço para produção de materiais
com nível de enxofre muito baixo.

As principais atividades do RH-KTB são (MACHADO, 2006): desgaseificação; ajuste


fino de composição química; homogeneização do aço líquido (composição química e
temperatura); descarburação (natural ou forçada); e ajuste de temperatura
(aquecimento químico ou resfriamento com sucata).

Devido à sua baixa solubilidade no aço sólido, durante a solidificação, o excesso de


oxigênio é rejeitado e, ao reagir com C, Mn e Si, gera defeitos como a formação de
24

bolhas de CO e as inclusões de óxido (inclusões não-metálicas), que deterioram as


propriedades mecânicas do material. Portanto, para reduzir o teor de oxigênio no aço,
adicionam-se elementos com grande afinidade para formação de óxidos, como Si, Al
e Ca (em forma de ligas como ferrosilício, alumínio e cálcio-silício) (GHOSH;
CHATTERJEE, 2010).

O cálcio se encontra na forma gasosa nas temperaturas de fabricação do aço, pois


tem ponto de ebulição em 1.484ºC. Então, adiciona-se cálcio metálico na forma de
liga Ca-Si, a fim de proporcionar profunda desoxidação, dessulfuração e modificação
das inclusões, para conferir ao aço as propriedades desejáveis (GHOSH;
CHATTERJEE, 2010).

Na composição da liga empregada, a atividade do cálcio aCa é, aproximadamente, 0.1,


fazendo com que a pressão de cálcio pCa seja menor que 1 atm, eliminando-se, dessa
forma, a possibilidade de formação de vapor. Ainda assim, há uma considerável perda
de Ca na forma de vapor, uma vez que a solubilidade do elemento no aço é
consideravelmente baixo (0.025% em massa a 1.600ºC) e atinge a saturação
rapidamente (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Na adição do Ca, o pó de Ca-Si é encapsulado em um tubo de aço e introduzido no


banho metálico em forma de arame, sendo recomendável a inserção do material o
mais profundo possível no aço. A injeção de pó Ca-Si proporciona uma melhor
dessulfuração devido à área da superfície aumentada. No entanto, a alimentação do
arame é particularmente adequada para a modificação da inclusão (GHOSH;
CHATTERJEE, 2010).

Além das adições, no refino secundário a agitação do banho metálico desempenha


um importante papel no resultado do processo. Como exemplo, o grau de desoxidação
aumenta com o aumento da energia de agitação até um ponto ótimo, conforme
evidenciado pelo gráfico à esquerda na Figura 12, e o conteúdo total de oxigênio
também decresce com o tempo de agitação, conforme o gráfico à direita apresentado
na Figura 12.
25

Figura 12 – Gráficos de análise de desoxidação de aços em função da energia


empregada na agitação do metal (à esquerda) e do tempo de agitação (à direita).

Fonte: Ghosh, 2000.

3.2.4 Lingotamento Contínuo

O lingotamento contínuo constitui um processo importante na remoção de inclusões e


na prevenção à formação de novas inclusões via oxidação atmosférica, uma vez que
essas são algumas das funções do pó de cobertura no distribuidor e do pó fluxante no
molde, em sinergia com a transferência de massa fornecida pelo fluxo do aço líquido
em ambos os reatores (GARCIA et al., 2006; GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

No fluxo da panela para o distribuidor (esquematizado na Figura 13), a utilização de


barreiras e diques direcionam o movimento do metal líquido de forma a melhorar a
mistura e arrastar inclusões para a superfície. A geometria do sistema, o
posicionamento das barreiras e a velocidade de vazão do aço exercem influência
nesse processo de limpeza do aço.
26

Figura 13 – Esquema ilustrativo de um distribuidor do processo de lingotamento


contínuo de aços.

Fonte: Garcia, 2006

Os controles de composição química e temperatura no distribuidor são realizados por


meio da utilização do pó de cobertura, que isola termicamente o sistema, absorve
inclusões e previne a reoxidação. A atuação do pó de cobertura durante o processo
pode ser explicada pela presença de três camadas em trabalho: uma camada sólida
de pó, uma camada sinterizada e uma camada líquida de pó fundido.

A fração sinterizada deve ser a de maior espessura, no intuito de isolar termicamente


o sistema, enquanto a camada líquida tem função de absorver as inclusões (GARCIA
et al., 2006). A camada superior é composta por pó sólido, a camada intermediária é
composta por pós “amolecidos” e sinterizados, e a camada inferior, em contato com o
metal líquido, se torna a escória fundida, que exerce a função de absorver as inclusões
do aço líquido, auxiliando na limpidez do produto (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

A composição típica desse material é uma mistura de palha de arroz (fonte sílica),
cinzas de carvão (fonte de carbono) e pós sintéticos (mistura de óxidos), podendo o
pó de cobertura ser do tipo ácido (palha de arroz calcinada com cerca de 90% de
SiO2), neutro (à base de alumino-silicatos ou cálcio-aluminatos) ou básico (à base de
magnesita ou dolomita) (GARCIA et al., 2006; GHOSH; CHATTERJEE, 2010).
27

Desses componentes, a sílica é o que possui maior capacidade de isolamento térmico,


mas, entretanto, sua proteção à reoxidação não é tão eficiente. O carbono no pó
melhora tanto o isolamento quanto a proteção à reoxidação. A menor velocidade de
fusão do pó de cobertura, conforme maior o teor de carbono, aumenta a longevidade
da camada superior de isolamento térmico. Ademais, de acordo com GHOSH e
CHATTERJEE (2010), a presença de 5 a 10% de carbono no pó é recomendada, pois
esse elemento reage com o oxigênio atmosférico e auxilia na diminuição da
reoxidação. Entretanto, um teor excessivo de carbono pode causar contaminação do
aço por recarburação.

Dependendo, então, do tipo de aço e de seus requisitos composicionais pode-se


utilizar palha de arroz para bons isolamentos, alumino-silicatos com carbono abaixo
de 1% para aços que demandam baixo e ultra-baixo carbono, e pós com baixo teor
de SiO2 para melhoria de limpidez. Além dos compostos citados, o MgO também
constitui um bom isolante térmico, possui alto ponto de fusão e age como
dessulfurante (GARCIA et al., 2006). Verifica-se que, para um desempenho
satisfatório, a escória deve ser composta por CaO, SiO2, Al2O3 e MgO, com uma
razão CaO/SiO2 acima de 6 (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Do ponto de vista estrutural, para o distribuidor, a constituição interna do reator por


refratário à base de MgO ganhou popularidade do ponto de vista da qualidade do aço.
O uso de revestimento refratário faz-se necessário para a prevenção da perda de
temperatura, entretanto, altas temperaturas de vazamento e fluxos mais turbulentos
de metal favorecem a erosão dos refratários, podendo ocasionar incorporação dos
óxidos do revestimento na forma de inclusões (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

A transferência do aço do distribuidor para o molde pode ser realizada por jato aberto,
sem canal de alimentação; ou por válvula submersa, geralmente de sílica fundida ou
de alumina-grafite, sendo adotado, na ArcelorMittal Tubarão, o sistema guiado,
comum em aços acalmados ao alumínio, ao silício e aços especiais. É importante
ressaltar que as válvulas de alumina-grafite são sensíveis ao ataque da escória e as
28

de sílica são suscetíveis à erosão causada pelo manganês presente no aço (GARCIA
et al., 2006).

O molde, feito de cobre devido à alta condutividade térmica e resfriado a água, é um


reator que tem o formato que se quer dar ao produto semiacabado. A Figura 14 mostra
um esquema representativo de um molde de placas.

Figura 14 – Imagem ilustrativa de um molde de placas de lingotamento contínuo.

Fonte: Garcia, 2006.

A Figura 15 ilustra o sistema que compõe o funcionamento do molde no lingotamento


contínuo, no qual o aço líquido é conduzido para dentro do reator pela válvula
submersa em uma vazão controlada, dependente da abertura da válvula gaveta (porta
de passagem entre o distribuidor e a válvula submersa) e do projeto da válvula
submersa (GARCIA et al., 2006; GHOSH; CHATTERJEE, 2010).
29

Figura 15 – Sistema de funcionamento de um molde de lingotamento contínuo de


placas.

Fonte: Garcia, 2006.

As inclusões no molde se originam das seguintes fontes: reações químicas no molde;


inclusões advindas do metal líquido das etapas anteriores; aprisionamento do pó
fluxante (com o aumento da velocidade de lingotamento, aumenta-se as chances do
aprisionamento); e desgaste do refratário da válvula (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

No molde, assim como no distribuidor, o nível residual de inclusões é governado pelo


balanço dinâmico entre as taxas de formação e de remoção dessas inclusões. O pó
fluxante funde-se quando adicionado ao molde e flutua até o topo do aço líquido, e,
então, a escória resultante previne o pick-up de oxigênio da atmosfera e absorve as
inclusões (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Pós fluxantes são escórias sintéticas utilizadas para lubrificação do molde quando a
transferência do aço do distribuidor para o molde é feita via válvula submersa. Além
disso, ele cumpre outras funções, tais como: fornecer camada protetora à reoxidação
atmosférica; absorver inclusões; promover a formação de compostos que regulam a
transferência de calor no molde, como a cuspidina e fornecer isolamento térmico
(GARCIA et al., 2006).
30

Assim como o pó de cobertura no distribuidor, o fluxante possui três camadas,


conforme fora representado na Figura 15: uma camada superior sólida, uma camada
intermediária rica em carbono e uma camada inferior líquida em contato com o aço.
Um possível efeito adverso da escória fundida é a possibilidade de ataque ao refratário
da válvula submersa (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Para a escolha ou elaboração adequada do pó, algumas das propriedades essenciais


a serem analisadas são a viscosidade, a taxa de fusão, a temperatura de cristalização
e o índice de basicidade, que são dependentes da composição química do material.
Entre os mais diversos pós comerciais desenvolvidos para atender os requisitos do
lingotamento contínuo, em média, eles são uma mistura de SiO2, CaO, Al2O3, Na2O
ou LiO2 e CaF2 com adições minoritárias de MgO, MnO, FeO e K2O. Além disso, pó
de carbono é sempre um constituinte, assim como no pó de cobertura (GARCIA et al.,
2006; GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Medidas experimentais da taxa de absorção de inclusões de alumina em função da


basicidade do pó, bem como a equação de cálculo desse índice, são apresentadas
na Figura 16, evidenciando que a taxa aumenta conforme aumenta a basicidade.

Figura 16 – Gráfico da taxa de absorção de inclusões de alumina pela basicidade do


pó fluxante.

Fonte: Garcia, 2006


31

A remoção das inclusões ainda depende de fatores cinéticos, relacionados ao


transporte de massa. Durante o resfriamento no molde, a pele de metal sólido
aprisiona algumas inclusões, o que prejudica a flotação de outras, pois diminui a
probabilidade da formação de clusters (a flotação é favorecida pelo aumento do
tamanho das partículas, conforme a lei de Stokes). Dessa maneira, o padrão de fluxo
do aço líquido exerce influência fundamental na distribuição das inclusões do produto.

No lingotamento contínuo, o fluxo ascendente é resultado da corrente turbulenta,


portanto o design apropriado dos outlets da válvula submersa exerce influência
fundamental nesse fluxo. Ao mesmo tempo, qualquer componente horizontal do fluxo
é indesejável, visto que tende a empurrar as inclusões em direção à pele. Algumas
configurações utilizam injeção de argônio em baixa velocidade com objetivo de que
as bolhas ascendentes ajudem as inclusões a flotarem (GHOSH; CHATTERJEE,
2010).

A injeção de argônio favorece a redução de depósitos de alumina nas paredes internas


das válvulas submersas e o arraste de inclusões para as superfícies do banho líquido,
favorecendo a absorção pelo pó fluxante ou pó de cobertura (GARCIA et al., 2006).

3.2.5 Inclusões

3.2.5.1 Panorama Geral

Inclusões, ou inclusões-não-metálicas, são partículas indesejadas de compostos que


podem se apresentar, em geral, na forma de óxidos, sulfetos, silicatos e outros tipos,
encontrados em meio ao aço. Normalmente, elas são frágeis à temperatura ambiente
e não possuem forte coesão com a matriz metálica (INFOMET) (SILVA, 2019).

As inclusões surgem em decorrência dos processos de fabricação de ligas ferrosas,


por meio de reações químicas e/ou arraste de matéria provenientes de diversas
fontes: matéria-prima, condições ambientais durante a fabricação, adições (Al na
desoxidação, FeSi, pós utilizados no lingotamento), dentre outras (INFOMET, 2019).
32

É conveniente separar a influência das inclusões durante o processamento e na


aplicação, propriamente dita, do material, uma vez que, em geral, as condições nos
processos de fabricação do aço são diferentes daquelas às quais o material será
submetido em trabalho (SILVA, 2019).

Além disso, elas também são classificadas como inclusões primárias ou secundárias
e como endógenas ou exógenas. As inclusões formadas antes do início da
solidificação do aço são denominadas primárias e as formadas após o início da
solidificação, secundárias. As que se originam das reações químicas do processo
siderúrgico são classificadas como endógenas e as que surgem de fontes "externas",
como fragmentos de refratários, escória retida e pós, são classificadas como
exógenas (GHOSH; CHATTERJEE, 2010). As fontes de inclusões podem ser
provenientes de (GHOSH; CHATTERJEE, 2010):

a) precipitação devido à reação com o aço líquido, ou durante o resfriamento pela


reação entre o oxigênio dissolvido e os desoxidantes, com consequente
formação de óxidos, ou da reação com enxofre dissolvido, formando sulfetos
(esse tipo é chamado de inclusão endógena);

b) erosão mecânica e química dos revestimentos refratários;

c) aprisionamento de partículas da escória no aço;

d) pick-up de oxigênio da atmosfera durante vazamento e consequente formação


de óxidos.

De forma geral, essas partículas são consideradas prejudiciais às propriedades


mecânicas e à resistência à corrosão do aço, e isso é ainda mais pertinente no caso
de aços de alta resistência utilizados para aplicações críticas. Devido a isso há um
movimento no sentido de produzir aços limpos, ou seja, livre de inclusões, afetando
todos os estágios do processo, como seleção de matéria prima para evitar
contaminação por alumínio, o design da composição da escória, a otimização das
condições do refino secundário, como tempo de processo e condições
33

fluidodinâmicas, os controles rigorosos da operação do distribuidor, do molde e de


reoxidação (SILVA, 2018).

Contudo, a limpidez é um termo relativo, pois atualmente é impossível conceber um


aço completamente sem inclusões. Logo, a classificação entre qual material está
limpo ou não é algo ligado à aplicação pretendida e, consequentemente, quais as
propriedades requeridas (GHOSH; CHATTERJEE, 2010).

Um dos conceitos mais utilizados para descrever o comportamento sob deformação é


a “plasticidade relativa” das inclusões (SILVA, 2019). Kiessling (1969) resumiu esse
conceito em um gráfico (Figura 17) que mostra a variação da deformação plástica
sofrida por inclusões dependendo da composição química e temperatura de trabalho:

Figura 17 – Variação da plasticidade relativa de inclusões em função da composição


química e temperatura de trabalho.

Fonte: Silva, 2019


34

É possível, dessa maneira, compreender a complexidade do comportamento das


inclusões presentes no aço quando este é deformado. Dependendo da composição
química e da temperatura, a plasticidade pode ser mais elevada e a partícula
deformar, ou pode ser menor e ela não deformar, trincar ou ter um comportamento
misto, como ilustrado na Figura 18:

Figura 18 – Ilustração esquemática do comportamento de inclusões após trabalho a


quente em função da plasticidade relativa.

Fonte: Silva, 2019

A Figura 19 mostra imagens obtidas em microscópio eletrônico de varredura, de um


fio que se rompeu devido à presença de uma inclusão durante estampagem a frio, e
vazios formados ao redor de uma outra inclusão também presente durante uma
estampagem a frio.
35

Figura 19 – Formação de vazios ao redor de um inclusão não metálica (à esquerda) e


fratura de um fio metálico durante estampagem causada pela presença de inclusão (à
direita).

Fonte: Silva, 2019.

Esses vazios formados ao redor de inclusões tendem a coalescer com outros vazios
formados ao redor de outras inclusões, conforme mostrado na Figura 20, e, dessa
forma, geram trincas que podem levar o material à fratura.

Figura 20 – Micrografia de um aço cuja presença de inclusões levou ao coalescimento


de vazios.

Fonte: Silva, 2019

Nas últimas três décadas, três importantes ocorrências caracterizaram a questão da


limpidez interna dos aços: a) a assimilação do conceito de que determinadas inclusões
são decorrência inevitável do processo de elaboração, resultando na chamada
“engenharia de inclusões”, isto é, no controle de processos de modo a obter inclusões
36

adequadas à aplicação prevista para o aço; b) o nível aceitável de inclusões foi


reduzido drasticamente e; c) a conjugação dessas duas ocorrências com as ações daí
decorrentes impôs a obsolescência das metodologias clássicas de medição de
limpeza interna e fomentou o desenvolvimento de grande número de novas técnicas
para a medição dessa característica (BIELEFELDT et al., 2006).

Uma vez que se definem as inclusões que se deseja obter, calcula-se a composição
do aço que vai gerar essas inclusões e, depois, calcula-se, pelo equilíbrio metal-
escória, qual escória irá estabelecer a composição de aço que se deseja. Essa escória
pode, então, ser usada no forno panela e, nesse caso, utiliza-se o preceito “Look after
the slag, and the metal will look after itself”. Isso quer dizer que a composição do aço
se ajustará à escória “modelada”, portanto fomenta que se concentre na definição da
escória para que se consiga o metal desejado. Esse conceito foi aplicado com sucesso
a uma ampla gama de aços (SILVA, 2018).

De acordo com Ghosh (2010), algumas importantes medidas para a produção de aços
limpos são: a minimização da passagem de escória do convertedor para a panela,
visto que é uma escória rica em FeO e MnO, dificultando a desoxidação; os produtos
de desoxidação quimicamente mais estáveis, como SiO2 e Al2O3 em relação ao MnO;
os produtos de desoxidação preferencialmente líquidos, pois possuem maior
velocidade de crescimento por aglomeração, favorecendo remoção mais rápida por
flotação; a agitação do metal líquido por fluxo de argônio na panela para mistura e
homogeneização, crescimento mais rápido e flotação dos produtos da desoxidação.

Remover inclusões primárias do aço líquido é possível, ao contrário das inclusões


secundárias, que se formam durante a solidificação, que são, provavelmente,
impossíveis de se remover, e podem apenas ser modificadas pela “engenharia de
inclusões”, resultando em efeitos menos prejudiciais ao produto final (SILVA, 2018).

3.2.5.2 Formação de inclusões

Devido às altas temperaturas de fabricação do aço, as reações de formação das


inclusões se aproximam do equilíbrio. Por esse motivo, a termodinâmica é uma
37

ferramenta importante na compreensão de sua formação, embora haja ainda


discrepâncias relevantes entre os resultados da termodinâmica e a formação de
inclusões de alumina, por exemplo (SILVA, 2018). Silva (2019) diz também que sob
algumas condições de processamento no tratamento de aço na panela o equilíbrio da
desoxidação é alcançado ou aproximado, mesmo não sendo uma regra geral.

Quando o equilíbrio é alcançado, é relativamente fácil calcular a composição esperada


do aço, especialmente se alguém tiver acesso a ferramentas termodinâmicas
computacionais. Se, no entanto, o equilíbrio não for alcançado, o estado final
dependerá de muitas variáveis do processo e, em princípio, um modelo cinético
complexo seria necessário (SILVA et al., 2019).

Nos processos metalúrgicos, a termodinâmica se ocupa das mudanças de estado do


sistema tendo como força motriz a energia deste, e com os cálculos de variação de
energia as possibilidades e “extensão” das reações químicas são definidas (YOU et
al., 2017).

A nucleação das inclusões pode ser homogênea ou heterogênea, sendo que a


homogênea não depende de substrato para se formar. Porém, devido à maior
facilidade energética (menor “obstáculo” energético) para nucleação em substratos,
na prática a nucleação heterogênea é predominante em relação à homogênea (YOU
et al., 2017).

Enquanto a termodinâmica define “para onde o sistema está indo”, a cinética define a
velocidade disso. Em outras palavras, a taxa das reações químicas. Especificamente
quando se trata de formação de inclusões, a evolução do tamanho e a densidade
numérica são descritas utilizando a cinética (YOU et al., 2017).

Três mecanismos contribuem para o crescimento das inclusões: difusão, colisões e


“espessamento”. Assim que a inclusão é termodinamicamente estável e atende a
condição de nucleação, o núcleo começa a crescer. O crescimento ocorre incialmente
pela difusão de constituintes em direção à partícula, seguida de reação química. A
colisão de partículas individuais levam posteriormente ao crescimento da partícula
38

com uma densidade numérica reduzida. O “espessamento” ocorre segundo o que


denomina-se “amadurecimento de Ostwald”, no qual inclusões maiores crescem pelo
consumo de partículas menores (YOU et al., 2017).

Quando a inclusão formada é termodinamicamente instável, ela começa a se


dissolver. Durante a dissolução de partículas, os elementos se difundem da interface
inclusão-líquido para um líquido. Comparado com o crescimento controlado por
difusão, acredita-se que a dissolução seja um processo inverso.

Com um modelo termodinâmico, a estabilidade, composições, constituintes e tipos de


inclusões podem ser alcançados; mudanças de inclusões durante o processo de
resfriamento e solidificação são simuladas; e as influências das concentrações de
soluto e enriquecimento na formação de inclusões são previstas.

Com base na termodinâmica da formação, os modelos cinéticos são capazes de


avaliar a taxa de evolução das inclusões e a distribuição de tamanho e a densidade
numérica são mensuráveis. Os efeitos das condições de resfriamento e as
concentrações dos elementos formados no tamanho e quantidade de inclusões
podem ser investigados e controlados.

3.2.5.3 Modificação de inclusões

A presença de inclusões líquidas após o refino secundário é considerada um pré-


requisito para o fluxo sustentável de metal através dos pequenos orifícios das válvulas
do lingotamento. A lingotabilidade do aço é influenciada principalmente pela presença
de micro inclusões sólidas no aço líquido, sendo a taxa de deposição de inclusões nas
válvulas uma função da concentração dessas inclusões no aço líquido (LINO et al.,
2019).

A adição de cálcio em fio permite alterar o estado físico das inclusões geradas no
processo de desoxidação. A passagem de sólido para líquido é, evidentemente,
função da temperatura liquidus dessas partículas, que é menor conforme maior o teor
de Ca na inclusão. As fases presentes nas inclusões em equilíbrio em uma
39

temperatura específica podem ser estimadas através de diagramas de fase cálcio


versus alumínio, onde a fase líquida define a região dos diagramas denominada
“janela de lingotabilidade” (LINO et al., 2019; MAGALHÃES, 2010; SILVA, 2014).

Além de permitir o fluxo ininterrupto de aço no processo lingotamento contínuo, a


modificação da morfologia das inclusões através do tratamento com cálcio
proporciona um importante incremento na qualidade de aços ligados de alta
resistência. A propriedade de resistência à fadiga requerida em determinadas
aplicações depende diretamente da composição química, forma e distribuição de
tamanho das inclusões, por exemplo.

Inclusões angulares, longas e duras devem ser evitadas, pois elas não podem ser
deformadas junto com a matriz de aço durante a laminação a quente, o que pode
resultar em uma concentração de tensões na interface aço/inclusão (JIANG et al.,
2010).

Inclusões com ponto de fusão relativamente mais baixo, menores em tamanho e com
morfologia esférica são mais indicadas para a melhoria das propriedades de
resistência a fadiga e da tenacidade dos aços e para evitar ou reduzir a fragilização
por hidrogênio (CHOUDHARY; GHOSH, 2008; DUAN; REN; ZHANG, 2019; GUO et
al., 2018; JIANG et al., 2010).

As inclusões de sulfeto formadas a temperaturas elevadas normalmente


precipitam ao redor dos aluminatos formados previamente. Essa característica é
bastante interessante do ponto de vista da aplicação do produto, pois favorece a
morfologia esférica das inclusões que melhora os resultados relativos à formação de
micro trincas e a resistência a fadiga (JIANG et al., 2010).

Como a alumina sólida, as inclusões de sulfeto sólido (CaS) também são prejudiciais
à lingotabilidade do aço líquido. Além disso, inclusões de sulfeto tornam o aço
propenso a trincas induzidas por hidrogênio (CHOUDHARY; GHOSH, 2008).
40

Quando o cálcio é adicionado ao aço líquido, ele pode (a) modificar inclusões de óxido,
(b) dessulfurar aço e (c) controlar a forma das inclusões de sulfeto. Contudo, a adição
insuficiente de cálcio leva a modificações incompletas das inclusões de alumina e
consequente formação de aluminatos sólidos de cálcio com altos pontos de fusão, que
são prejudiciais para a fundição do aço.

Por outro lado, a adição excessiva de cálcio leva à formação de um grande número
de inclusões de CaS, deteriorando a lingotabilidade do aço, além de causar erosão da
válvula gaveta e refratários das válvulas em geral (CHOUDHARY; GHOSH, 2008).
Portanto, o sucesso do tratamento com cálcio exige a otimização da quantidade de
cálcio a ser adicionada ao aço líquido.

O teor de oxigênio e enxofre no aço desempenha papel importante na modificação da


inclusão pelo tratamento com cálcio, pois o cálcio tem forte afinidade pelo oxigênio e
pelo enxofre. As energias livres padrão da formação CaO e CaS são -853 kJ / mol e -
693 kJ / mol, respectivamente, a 1 873 K. Portanto, é importante considerar quais
reações são mais favoráveis termodinamicamente durante o tratamento com cálcio do
aço (CHOUDHARY; GHOSH, 2008).

Dessa maneira, a quantidade de cálcio necessária para modificar os óxidos depende


do teor total de oxigênio. Porém, até o momento, não existe um método para
determinar o oxigênio total a tempo de usá-lo para a decisão sobre a quantidade de
cálcio a ser adicionada. Isso representa um problema importante na prática industrial.
(BOTELHO et al., 2017).

3.2.5.4 Remoção de inclusões

Teoricamente a remoção de inclusões não metálicas a partir de aço fundido pode ser
conseguida por meio de vários mecanismos diferentes. De acordo com a lei de Stokes,
devido às diferenças entre as densidades das inclusões não metálicas e do aço, as
inclusões flotam até a superfície. A flotação é o mecanismo que poderia conduzir à
remoção de inclusões não-metálicas e teoricamente é possível calcular a taxa de
41

inclusão retirada por flotação. Outro mecanismo para remoção de inclusões é o uso
de agitação eletromagnética ou por gás inerte (NEVES; MOTTA; VIANA, 2014)

Os mecanismos acima citados podem ser usados para entender o movimento da


inclusão no aço desde o fundo da panela até a superfície do aço, entretanto, sem uma
escória com propriedades adequadas estas inclusões podem não ser removidas
efetivamente (NEVES; MOTTA; VIANA, 2014).

Inclusões são geralmente removidas por reação com escória. Isto é conseguido
principalmente por otimização das condições do processo para promover o contato e
reação entre a inclusão e a escória. Para a remoção eficiente, as inclusões devem
juntar-se e dissolver-se na fase de escória. Se a interação escória/inclusão é fraca,
então as inclusões estarão sujeitas a serem reincorporadas no metal.

A força de fixação (reatividade) entre a inclusão e a fase de escória pode ser


caracterizada pela molhabilidade da escória nas inclusões (NEVES; MOTTA; VIANA,
2014). No caso de inclusões no estado líquido, uma vez que elas deixam o metal, sua
dissolução na escória é considerada (SILVA, 2018).

A remoção da inclusão pela escória é dividida em quatro etapas na panela (3). Na


Figura 21, uma ilustração esquemática da parte superior esquerda de uma panela é
vista. Primeiro a inclusão é transportada até uma camada limite pela agitação
turbulenta do aço líquido, em seguida é transportada para a interface escória/aço. A
separação de inclusão para a fase de escória, então, é possível na região 3 e, caso
ocorra, ela é incorporada à escória (4) (NEVES; MOTTA; VIANA, 2014).
42

Figura 21 – Ilustração esquemática da remoção de inclusões na parte superior de uma


panela de aciaria.

Fonte: NEVES; MOTTA; VIANA, 2014.

Holappa e colaboradores investigaram o desenvolvimento de pós de cobertura para


distribuidores nos quais a absorção de inclusão é uma “propriedade essencial”. Os
autores observaram que a eficiência com que uma dada escória dissolverá inclusões
não metálicas sólidas depende da interação complexa entre composição da escória,
termodinâmica, tensão superficial e viscosidade (REIS; BIELEFELDT; VILELA, 2014).

Uma inclusão só pode ser considerada eliminada do aço quando estiver


completamente dissolvida na escória. A maioria das pesquisas baseadas na
fluidodinâmica que busca otimizar o transporte da inclusão para a interface
aço/escória pressupõe que, uma vez lá, a inclusão seja removida do aço. No entanto,
para que isso ocorra, a inclusão deve primeiro separar do aço para a interface e depois
da interface para a escória. Esses passos correspondem à separação e dissolução,
respectivamente. Caso isso não ocorra, a inclusão poderá retornar ao banho de aço,
dependendo dos padrões de fluxo na panela, distribuidor ou molde (NEVES; MOTTA;
VIANA, 2014).

Embora a agitação seja um parâmetro crítico para a cinética das reações escória-
metal, é bem estabelecido que o controle deve ser exercido para evitar a oxidação e
43

o aprisionamento de escória ou pós (SILVA, 2018). Para aços processados no refino


secundário sob condições ideais de agitação e com o devido cuidado para evitar
reoxidação, observa-se que a composição final é próxima do equilíbrio, segundo
SILVA (2018). Nesse caso, o equilíbrio de todas as possíveis reações de oxidação
deve prevalecer e o valor único de oxigênio em solução deve satisfazer todos os
equilíbrios calculados.

Os resultados de simulações feitas por REIS, BIELEFELDT e VILELA (2014) mostram


a dinâmica da remoção de inclusões não metálicas no banho como resultado de
colisões turbulentas em uma dada energia de mistura. Foi estabelecido que o
processo de aglomeração ocorre muito mais rápido para partículas maiores e com
maior energia de mistura.

No caso de inclusões maiores, sua aglomeração devido a colisões ocorre mais


rapidamente e isso é causado por uma maior probabilidade de partículas maiores
colidirem. Conforme as partículas sofrem mais aglomeração, sempre permanecem
algumas partículas devido à considerável queda de probabilidade de colisão quando
as partículas são pouco numerosas (REIS; BIELEFELDT; VILELA, 2014).

Os fatores que controlam a remoção da inclusão não metálica do aço são o padrão
de fluxo de fluido e os fenômenos de agregação e flotação da inclusão, bem como as
condições que prevalecem na interface escória/metal onde as inclusões podem ser
removidas ou formadas, dependendo nas propriedades da escória e nas reações com
elementos de liga. Uma das funções da escória é remover e assimilar as inclusões
não metálicas contidas no aço líquido (REIS; BIELEFELDT; VILELA, 2014).

O processo de separação da inclusão não-metálica na interface entre metal e escoria


é, em grande parte, controlado pelo fenômeno interfacial no sistema metal-escoria-
inclusão. Logo o conhecimento das propriedades interfacial que governam a
separação da inclusão permite o seu controle para alcançar resultados desejados
(NEVES; MOTTA; VIANA, 2014).
44

Durante a permanência do metal liquido na panela, as inclusões podem ser trazidas


para a interface metal/escoria e, podem adotar 3 tipos de comportamento: O modelo
passante (pass), o qual é o mais favorável, onde a inclusão está completamente
separada do metal, o modelo de permanência (remain) onde a inclusão permanece
na interface não permitido ser totalmente transferida para a escória, e o modelo
oscilante (oscillate), onde a inclusão oscila até alcançar um ponto de equilíbrio abaixo
da interface. Nos dois últimos casos, a inclusão pode retornar ao banho (NEVES;
MOTTA; VIANA, 2014).

Os parâmetros de maior influência na transferência da inclusão para a escória são a


viscosidade da escória e a tensão interfacial (NEVES; MOTTA; VIANA, 2014). As
tensões interfaciais podem ser consideradas como forças e um equilíbrio de força no
ponto de contato leva a equação de Youngs, relacionando assim a tensão interfacial
com o ângulo de contato entre a inclusão, o metal e a escória (Figura 22), o que
determina a molhabilidade (cosθIMS) da inclusão.

Figura 22 – Equação do cosseno do ângulo entre inclusão, metal e escória, em função


das tensões interfaciais entre estes

Fonte: NEVES; MOTTA; VIANA, 2014.

Sendo σ a tensão interfacial, θ o ângulo de contato e os índices I, M e S referências a


“inclusão”, “metal” e “escória”, respectivamente.

A molhabilidade da inclusão pelo sistema ocorre quando cosθ IMS>0, e se for menor
que zero a molhabilidade não ocorre. A Figura 23 mostra o modelo de WIKSTRÖM
que infere o comportamento de uma inclusão sólida de alumina menor que 100µm em
função da molhabilidade e da viscosidade da escória.
45

Figura 23 – Modelo de Wikström da inferência de comportamento de uma inclusão na


interface metal-escória em função do ângulo de molhabilidade e da viscosidade da
escória.

Fonte: NEVES; MOTTA; VIANA, 2014.

Strand, por meio de testes com escórias em condição industrial concluiu que a
molhabilidade deve ser elevada e o valor da viscosidade baixo para se obter inclusões
completamente emergidas na escória e logo uma ótima transferência de inclusão,
entretanto deve-se ter cuidado com viscosidades de escorias muito baixa para se
evitar arraste de escória para dentro do banho resultando em mais inclusões no aço
(NEVES; MOTTA; VIANA, 2014).
46

4 MATERIAIS E MÉTODOS

4.1 DADOS

Os dados experimentais usados neste trabalho foram de composições químicas de


aços produzidos em uma usina siderúrgica integrada. Os principais elementos
químicos de cada corrida que possuem relação com a formação de inclusões,
conforme a base teórica apresentada, estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1 – Composição química e tipo de aço das corridas obtidas.


Composição Química
Corrida Família de Aço
%Si %S %Al %Ti %Ca %O
C1 MC ao Boro 0,259 0,0023 0,053 0,032 0,0015 0,0028
C2 MC ao Boro 0,228 0,0027 0,046 0,030 0,0019 0,0018
C3 MC ao Boro 0,229 0,0030 0,046 0,029 0,0003 0,0022
C4 MC ao Boro 0,227 0,0023 0,031 0,035 0,0021 0,0021
C5 MC ao Boro 0,252 0,0026 0,047 0,031 0,0022 0,0034
C6 MC ao Boro 0,281 0,0015 0,049 0,031 0,0018 0,0055
C7 MC ao Boro 0,249 0,0018 0,050 0,031 0,0013 0,0043
C8 MC ao Boro 0,239 0,0022 0,043 0,027 0,0018 0,0058
C9 MC ao Boro 0,255 0,0021 0,055 0,032 0,0019 0,0064
C10 MC ao Boro 0,238 0,0027 0,040 0,030 0,0014 0,0060
C11 MC ao Boro 0,235 0,0026 0,042 0,033 0,0020 0,0023
C12 MC ao Boro 0,220 0,0027 0,038 0,029 0,0041 0,0022
C13 MC ao Boro 0,229 0,0022 0,047 0,033 0,0022 0,0031
C14 MC ao Boro 0,244 0,0024 0,043 0,034 0,0021 0,0023
C15 MC ao Boro 0,227 0,0028 0,050 0,033 0,0013 0,0027
C16 MC ao Boro 0,226 0,0028 0,043 0,029 0,0014 0,0050
C17 MC ao Boro 0,248 0,0023 0,043 0,034 0,0016 0,0019
C18 MC ao Boro 0,242 0,0019 0,054 0,036 0,0031 0,0012
C19 MC ao Boro 0,253 0,0024 0,042 0,033 0,0020 0,0015
C20 MC ao Boro 0,256 0,0021 0,044 0,036 0,0021 0,0027
C21 MC ao Boro 0,255 0,0019 0,046 0,034 0,0014 0,0026
C22 MC ao Boro 0,260 0,0016 0,049 0,030 0,0033 0,0028
C23 MC ao Boro 0,259 0,0025 0,055 0,034 0,0028 0,0056
C24 MC ao Boro 0,252 0,0021 0,044 0,033 0,0015 0,0051
C25 MC ao Boro 0,251 0,0019 0,051 0,032 0,0017 0,0047
C26 MC ao Boro 0,269 0,0023 0,037 0,034 0,0019 0,0042
C27 MC ao Boro 0,265 0,0020 0,046 0,033 0,0008 0,0019
C28 MC ao Boro 0,238 0,0024 0,039 0,032 0,0022 0,0046
C29 MC ao Boro 0,240 0,0022 0,049 0,032 0,0017 0,0028
C30 MC ao Boro 0,247 0,0013 0,056 0,033 0,0001 0,0058
Cobs1 UBC Refosforado 0,046 0,0078 0,064 0,001 0,0003 0,0031
Cobs2 UBC 0,008 0,0049 0,049 0,047 0,0002 0,0067
Cobs3 UBC 0,012 0,0062 0,051 0,054 0,0001 0,0028
Cobs4 UBC 0,008 0,0054 0,078 0,087 0,0003 0,0033
Cobs5 UBC 0,006 0,0054 0,077 0,089 0 0,0035
Cobs6 UBC Refosforado 0,054 0,0068 0,037 0,048 0,0001 0,0025
Cobs7 BC Micro Ligado 0,143 0,0019 0,025 0,010 0,0021 -
Fonte: Autor, 2019.
47

As corridas de C1 a C30 são de um aço médio carbono ligado ao boro (MC ao Boro),
e de Cobs1 a Cobs7 são corridas em que houve ocorrência de obstrução de válvula no
lingotamento contínuo, sendo que dentre estas estão contemplados aços do tipo
ultrabaixo carbono (UBC), ultrabaixo carbono refosforado (UBC Refosforado) e baixo-
carbono micro ligado (BC Micro Ligado).

4.2 ANÁLISES

4.2.1 Análise de Obstrução

Na primeira fase deste trabalho, realizou-se a análise sobre a obstrução de válvulas


por inclusões não metálicas através do uso da termodinâmica computacional. Para
isso, utilizou-se dados de composição química de 31 corridas de um aço médio
carbono ligado ao Boro, para o qual não há ocorrência pertinente de clogging; e de 6
corridas em que houve essa ocorrência. Esses dados foram utilizados como dados de
input no software de termodinâmica computacional Thermocalc. A Figura 24 traz o
fluxograma representativo do estudo sobre obstrução de válvulas por inclusões no
lingotamento contínuo via termodinâmica computacional.

Figura 24 - Fluxograma representativo do estudo sobre obstrução de válvulas por


inclusões no lingotamento contínuo via termodinâmica computacional.

Aços
Médio Carbono ao Boro UBC e UBC Refosforado
•Sem obstrução de válvula •Com ocorrência de obstrução de válvula

Comparação

Análise Termodinâmica + ASCAT Análise Termodinâmica

Fonte: Autor, 2019.


48

Para a validação da termodinâmica computacional nesse tipo de análise, foram


utilizados os resultados da análise de inclusões denominada ASCAT, que são feitos
de forma rotineira para os aços médio carbono em questão.

4.2.2 Análise da Influência do Oxigênio

Na segunda etapa, após concluída a primeira, realizou-se a análise da influência do


oxigênio na formação de inclusões, tanto em relação ao tipo quanto à quantidade,
devido à possibilidade de reoxidação após o refino secundário.

Para isto, utilizou-se dos dados de ASCAT da corrida Cobs7, apresentada na Tabela
1. Dentre as corridas com obstrução de válvula, esta é a única que possui a análise
microscópica de varredura, porém não possui o dado de teor de oxigênio, o que
dificulta inferir com convicção sobre a ocorrência de reoxidação.

Além disso, foram conduzidas simulações termodinâmicas nas quais, verificou-se a


influência do oxigênio no tipo e na quantidade de inclusões. Mantidas as demais
condições de composição química e temperatura, variou-se o teor de oxigênio de 5
em 5 ppm, entre um total de 10 a 65 ppm.

Foi medida a distância entre o ponto de cálcio zerado até o início do campo de
inclusões líquidas para cada teor de oxigênio, conforme representa a distância “d” na
Figura 25, sendo esta distância a denotação da quantidade de cálcio a ser adicionado
para se atingir o campo de inclusões líquidas. Essas medidas de distância foram feitas
através do software WebPlotDigitizer.
49

Figura 25 – Foto da interface do software WebPlotDigitizer e representação da


medição feita.

Fonte: Autor, 2019.

Foi medida, de forma análoga, a distância entre o início e o fim do campo de inclusões
líquidas, chamado de ΔCa_janela. Os resultados de medida de distância foram
armazenados conforme a Tabela 2.

Tabela 2 – Modelo de tabela utilizado para a plotagem dos gráficos gerados a partir
das medições feitas segundo a Figura 13.

Oxigênio (ppm) Distância


0
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
Fonte: Autor, 2019.
50

Os resultados foram plotados em gráficos e foi feita a regressão linear dos pontos.
Então, as equações de regressão geradas nos gráficos foram utilizadas de modo a
criar uma função de teor objetivo de cálcio (Ca_objetivo) em função do teor de
oxigênio.

4.2.3 Análise Estatística

Na terceira fase do trabalho, foi feita uma análise estatística, na qual, para verificar a
correlação entre a quantidade de inclusões, modificação destas para o estado líquido
(medida pela fração de fase líquida), a equação de cálcio objetivado e composição
química, foi gerada uma matriz correlação entre o total de inclusões medido pelo
ASCAT, fração de inclusões líquidas medida pelo ASCAT (sendo considerado o
numerador a soma entre as fases Liquid e Partially Liquid, e como denominador o total
de inclusões), teores de elementos químicos, razões entre teores de elementos
químicos e o desvio do cálcio objetivado pela função Ca_objetivo.

Essa matriz é baseada no coeficiente de Pearson, que indica a força de uma relação
linear entre duas variáveis (geralmente não caracteriza completamente sua relação).
Quanto mais próximo o coeficiente estiver dos valores extremos -1 e 1, mais forte é a
correlação linear entre as variáveis, enquanto uma correlação igual a 0 pode significar
que as variáveis não estão correlacionadas linearmente, mas podem estar
correlacionadas de forma não linear, ou as variáveis, de fato são completamente
independentes. Coeficientes negativos indicam uma proporcionalidade linearmente
inversa, enquanto coeficientes positivos indicam parâmetros diretamente
proporcionais e as diretrizes adotadas para classificação do grau de correlação (alta
ou baixa, por exemplo) são, de modo geral, arbitrárias e dependentes do contexto e
objetivos.

O critério adotado no presente trabalho foi desprezar correlações de módulo menor


que 0.1 e considera-se como baixa correlação entre variáveis um módulo entre 0.1 e
0.4, sendo um coeficiente acima de 0.4 considerado como de alta correlação.
51

A partir desta tabela de correlações e dos conhecimentos tácitos metalúrgicos foram


escolhidas variáveis independentes e feitas regressões multilineares a fim de avaliar
a influência dessas variáveis na fração de inclusões líquidas e no número total de
inclusões.

4.2.4 ASCAT

A análise via ASCAT (Automated Steel Cleanliness Analysis Tool) é realizada através
de um sistema acoplado a um microscópio eletrônico de varredura (MEV), constituído
em hardware e software, que através de um algoritmo próprio permite determinar de
forma automática o tipo, dimensões e número de inclusões na área varrida.

As amostras de aço, retiradas no refino secundário para análise de inclusões,


permitem a análise do tipo e quantidade de inclusões obtidas após o tratamento na
panela. Nas análises do presente trabalho, os resultados obtidos, via método ASCAT,
foram dispostos conforme representado na Tabela 3, onde “X” representa a
quantidade total de inclusões medida pelo software, sendo que em cada corrida foi
detectada a ocorrência de tipos variados de inclusões e em diferentes proporções.

Tabela 3 – Representação genérica da apresentação de dados fornecidos pela análise


via ASCAT.

% do número total de % da área total de


Classes Quantidade em ppm
inclusões inclusões
Partially Liquid A E A/X
Solid CaOAl2O3 B F B/X
Ti-rich C G C/X
Liquid D H D/X

Total A+B+C+D E+F+G+H X


Fonte: Autor, 2019.

4.2.5 Simulações Termodinâmicas

Para o estudo dos dados obtidos sob a óptica da termodinâmica, foi utilizado o
software Thermocalc (Figura 26), com o banco de dados SLAG3 para o cálculo dos
52

equilíbrios termodinâmicos. A Figura 26 mostra a seleção do banco de dados e dos


elementos de entrada.

Figura 26 – Página inicial do software Thermocalc.

Fonte: Software Termocalc, 2019.

Figura 27 – Seleção do banco de dados e elementos de composição química para os


cálculos termodinâmicos.

Fonte: Software Termocalc, 2019.


53

Os dados de composição química no refino secundário foram utilizados como entrada


para cálculo do equilíbrio termodinâmico das fases do sistema, conforme mostra a
Figura 28.

Figura 28 – Janela de definição do sistema para as simulações termodinâmicas.

Fonte: Software Termocalc, 2019.

A temperatura, para esta análise, foi mantida constante para todas as corridas, pois
não é objeto de estudo deste trabalho. Os resultados para análise de obstrução e
análise da influência de oxigênio foram obtidos na forma de gráficos, apresentados na
sessão de resultados e discussão.
54

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 ANÁLISE DE OBSTRUÇÕES VIA TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

Os resultados gráficos para as simulações termodinâmicas dos aços médio carbono


ao boro (corridas C1 a C30 da Tabela 1) foram obtidos nos moldes da Figura 29, no
qual o equilíbrio multifásico permite que se obtenha qual fase, ou tipo de inclusão,
tenderá a se formar com base na composição química do aço, em função do teor de
alumínio (eixo x) e de cálcio (eixo y). A fase “SLAG” é referente a inclusões que se
apresentam na forma líquida na temperatura em questão (1565 ºC).

Figura 29 – Gráfico das fases em função do teor de Al e Ca, gerado para a corrida
C16.

Fonte: Autor, 2019.

Sob perspectiva da prática industrial siderúrgica, esse gráfico fornece um resultado


útil ao estudo e otimização da quantidade de cálcio a se adicionar nas etapas de refino
secundário do aço para modificação das inclusões de alumina, que por sua vez
55

prejudicam a lingotabilidade do metal líquido, pelo depósito de óxidos nas válvulas


refratárias de passagem do aço do distribuidor para o molde, causando obstrução
destas.

A análise comparativa entre os resultados dos gráficos “cálcio versus alumínio” e o


ASCAT só é possível ser realizada de forma direta em termos de tipo de inclusão
formada, pois o gráfico da janela de lingotabilidade não apresenta quantificação.

O gráfico na Figura 30 sintetiza os resultados das simulações, de forma a demonstrar


qual a porcentagem do total de corridas analisadas, de C1 a C30, se concentrou em
cada campo de fases apresentado no gráfico de equilíbrio termodinâmico, em função
de seus teores de Ca e Al. Sendo “slag” referente a inclusões líquidas e “CA” referente
a cálcio-aluminatos sólidos.

Figura 30 – Porcentagem das corridas de C1 a C30 referente a cada tipo de inclusão


previsto pelo software Thermocalc.

50,00% 45,16%
Porcentagem do total de

45,00%
40,00%
corridas (C1 a C30)

35,00%
30,00%
25,00% 22,58% 22,58%
20,00%
15,00%
10,00% 6,45%
3,23%
5,00%
0,00%
slag+CaS slag slag+CA CA CA+Al2O3
Tipo de Inclusão (Thermocalc)

Fonte: Autor, 2019.

De forma diferente das fases previstas e apresentadas pelas simulações


termodinâmicas, nas análises ASCAT existem até 24 tipos diferentes de fase de
inclusões a serem identificadas e cada amostra de aço analisada no microscópio
eletrônico de varredura pode conter cerca de 10 tipos diferentes ao mesmo tempo
somando 99% das inclusões presentes. O gráfico na Figura 31 sintetiza os resultados
56

encontrados pelas análises destas amostras, evidenciando as principais fases


encontradas e qual a porcentagem do total de inclusões identificadas é de qual tipo.

Figura 31 – Porcentagem do total de inclusões detectadas referente ao tipo.

60,00%
Porcentagem do total de inclusões

50,00% 47,84%

40,00%

30,00%

20,00% 14,91% 14,54%

10,00% 7,74%
2,89% 3,49% 4,13% 3,69%
0,35% 0,28% 0,14%
0,00%

Tipo de Inclusão (ASCAT)

Fonte: Autor, 2019.

Do total de inclusões, das 30 corridas, apenas 4 não apresentaram inclusão rica em


titânio, o que implica sua ocorrência em cerca de 87% das corridas. Nas simulações
termodinâmicas, por outro lado, nenhuma corrida com presença de inclusões de
titânio foi prevista. Infere-se que tal fato se deva à heterogeneidade composicional
devida ao regime transiente e turbulento do aço líquido, que gera regiões
empobrecidas em alumínio. Em outras palavras, o equilíbrio termodinâmico é
calculado considerando que todos os átomos têm a “oportunidade” de reagir entre si,
com a reação ocorrendo para o processo de menor energia livre de Gibbs, conforme
SILVA (2014).

Mas as reações químicas, como as de formação das inclusões, são dependentes da


probabilidade de colisão atômica, sujeita ao transporte de massa gerado pelas
condições fluidodinâmicas do processo. Portanto, a ocorrência de regiões onde o
57

oxigênio dissolvido se encontra na presença de átomos de titânio, e não de alumínio,


faz com que sejam geradas inclusões ricas em titânio, e esse fato é explica pela Figura
32, onde a região hachurada indica uma área no gráfico de inclusões ricas em titânio,
que se formam a partir de teores menores que 150 ppm de alumínio para a corrida
representada (C16). Tal fato, justifica a necessidade de estudos no âmbito da
fluidodinâmica computacional, via simulação numérica, como instrumento auxiliar na
compreensão da formação de inclusões.

Figura 32 – Indicação da região rica em inclusões de titânio para a corrida C16.

Fonte: Autor, 2019.

Além disso, o titânio é o elemento de liga de maior proporção nesse aço (teor médio
de cerca de 300ppm) e, dentre os elementos disponíveis no metal líquido, é o
elemento com maior favorecimento termodinâmico para formar óxidos depois do
alumínio, conforme evidenciado no diagrama da Figura 33, elaborado no software
FactSage 7.2.
58

Figura 33 – Diagrama de estabilidade dos óxidos e sulfetos medida pela energia livre
de Gibbs em função da temperatura.

Fonte: Autor, 2019.

Apesar das diferenças discutidas na comparação entre as simulações termodinâmicas


e o ASCAT, os gráficos que sintetizam ambos apresentam correlação na distribuição
de resultados, com centralidade nas regiões que apresentam fase líquida total ou
parcial, conforme evidenciado na Figura 34. Além disso, em aproximadamente 97%
das corridas analisadas há a presença de fase líquida ou parcialmente líquida.
59

Figura 34 – Comparativo da porcentagem de inclusões líquidas medidas pelo ASCAT


e previstas pela termodinâmica computacional em função do tipo.

Fonte: Autor, 2019

A inclusão do tipo aluminato de cálcio sólido no gráfico do ASCAT, na comparação


entre as porcentagens de fase líquida dadas pela simulação e pela caracterização, foi
feita pois no software termodinâmico há um campo de equilíbrio entre inclusões
líquidas e cálcio-aluminatos, enquanto no software de varredura, essas fases são
separadas. A soma de todas as fases contendo inclusões líquidas para as simulações
termodinâmicas e para o gráfico adaptado da análise de ASCAT dá aproximadamente
74% (em ambos). Tal resultado corrobora positivamente para a validação do uso do
software como ferramenta de avaliação do processo de modificação das inclusões
para aços acalmados ao alumínio.

A adição de cálcio na etapa de refino secundário tem como função tornar as inclusões
de alumina líquidas a fim de evitar a obstrução das válvulas do lingotamento. A
estatística descritiva das simulações para o aço em questão mostra que a quantidade
de cálcio adicionada tem sido suficiente para esta modificação, o que é comprovado
pelo fato de que este aço representa uma porcentagem relevante da produção da
empresa e, no ano de 2019, até a data de 30 de Outubro, apenas cerca de 3,65% do
total de ocorrências de obstrução foram referentes a esta família de produto. Além
disso, de acordo com fontes que lidam com o controle de qualidade do processo na
60

usina em questão, este aço, de fato, não representa uma preocupação no que diz
respeito ao clogging.

Este favorecimento da lingotabilidade do aço (fluidez sem ocorrência de obstrução) se


dá pela adição de cálcio pois este atua como um “fundente”, de forma que o aumento
da proporção de CaO nas inclusões de cálcio-aluminatos, até um determinado teor,
diminui a temperatura de fusão do composto até este estar líquido na temperatura de
fabricação do aço. A Figura 35 já mostra os resultados de simulação termodinâmica
para corridas em que houve a ocorrência de obstrução, com fim de comparação com
as simulações realizadas para o primeiro grupo de aço, em que não ocorre o
fenômeno.

Figura 35 – Simulações termodinâmicas das corridas Cobs1 a Cobs6 com obstrução de


válvula.

Fonte: Autor, 2019.


61

Das corridas com ocorrência de obstrução simuladas, 100% das simulações


resultaram em sistemas na região de cálcio-aluminato sólido com alumina ou alumina
pura. A não modificação das inclusões para o estado líquido é justificável em vista dos
teores apenas residuais de cálcio nas composições químicas (de 1 a 3 ppm). Tal
resultado corrobora com o que já fora discutido e apresentado na revisão bibliográfica,
pois a obstrução de válvulas no lingotamento contínuo é associada principalmente à
deposição de alumina sólida e cálcio-aluminatos sólidos nos tubos refratários de
transferência do aço líquido entre reatores, de acordo com TEHOVNIK et al. (2015).

Portanto, provavelmente, os aços cuja composição se encontre no campo de


aluminato sólido com alumina ou alumina pura serão mais susceptíveis à ocorrência
de clogging do que aços com composição mais próxima da janela de inclusões
líquidas. O processo de obstrução começa quando o aço líquido infiltra o refratário
removendo a camada protetiva de zircônia presente nas válvulas, permitindo a
deposição de aluminatos. A Figura 36 mostra a caracterização de um corte transversal
de válvula obstruída, onde da parte superior da foto até a baquelite representa o raio
interno do tubo refratário (a região destinada à passagem do aço líquido).

Figura 36 – Análise microscópica de um corte transversal de uma válvula submersa


de lingotamento contínuo obstruída.

Fonte: TEHOVNIK et al., 2015.

Considera-se que o processo de obstrução acontece da parte inferior da foto até a


parte superior (da parede refratária de zircônia até o centro da válvula) e verifica-se,
na divisão da válvula em regiões, a ocorrência de infiltração do aço líquido, seguida
do depósito de alumina em uma camada sinterizada que age como substrato para
adesão de mais alumina, cálcio-aluminatos e espinéis (TEHOVNIK et al., 2015).
62

Nesse mesmo trabalho, o mapeamento via MEV-EDS da primeira região de deposição


de alumina mostra a presença de cálcio, o que sugere que as inclusões tenham sido
previamente modificadas pela adição de cálcio (TEHOVNIK et al., 2015).

5.2 INFLUÊNCIA DO OXIGÊNIO

A possível reoxidação do aço, seja no distribuidor ou pelo transporte de oxigênio


através do poros da válvula devido ao gradiente de pressão, é um risco para a garantia
de efetividade da modificação de inclusões (TEHOVNIK et al., 2015).

O resultado de ASCAT feito para a corrida Cobs7 corrobora para este problema trazido
pela reoxidação, visto que para esta corrida houve a adição de liga CaSi para
modificação de inclusões (teor medido de 21 ppm de Ca no aço), mas ainda assim
ocorreu obstrução de válvula submersa. Duas amostras da mesma corrida foram
analisadas e os resultados estão dispostos nas tabelas 4 e 5.

Tabela 4 – Resultado 1 de ASCAT da corrida Cobs7.

% do número total de % da área total de


Classes
inclusões inclusões
Partially Liquid 43 51
Liquid 15 23
Solid Oxide-CaS 20 11
Solid CaOAl2O3 12 9

Total 90 94
Fonte: Autor, 2019.

Tabela 5 – Resultado 2 de ASCAT da corrida Cobs7.

% do número total de % da área total de


Classes
inclusões inclusões
Partially Liquid 45 42
Liquid 28 39
Partially Liquid-CaS 6 4
Solid CaOAl2O3 8 4

Total 87 90
Fonte: Autor, 2019.
63

A análise ASCAT das amostras do refino secundário atestam uma modificação bem-
sucedida, visto que há predominância de inclusões líquidas e parcialmente líquidas, e
consistência nos resultados, visto que nas diferentes amostras o ranking das classes
de inclusão é qualitativamente mantido. Desta maneira, a hipótese de obstrução
devido à reoxidação do aço demonstra pertinência para justificar a ocorrência.

Para analisar esta influência foram feitas simulações termodinâmicas que resultaram
nos gráficos das figuras 37 e 38, onde o campo “FE_LIQUID+SLAG” corresponde à
combinação dos teores de cálcio e alumínio para se obter as inclusões líquidas e evitar
a obstrução de válvula.
64

Figura 37 – Influência do oxigênio nos campos de fase de inclusões, variando seu teor
de 10 a 35 ppm.

Fonte: Autor, 2019.


65

Figura 38 – Influência do oxigênio nos campos de fase de inclusões, variando seu teor
de 40 a 65 ppm

Fonte: Autor, 2019.

A análise visual permite inferir que, termodinamicamente, o aumento do teor de


oxigênio, para um mesmo percentual de alumínio, aumenta o percentual de cálcio
necessário para se atingir o campo de formação de inclusões líquidas, logo a
66

reoxidação age como fenômeno concorrente do processo de liquefação das inclusões


pela adição de cálcio no refino secundário.

Analisando de forma mais precisa, é apresentado graficamente na Figura 39 o


resultado das medições da distância de teor de cálcio zero até o campo de inclusões
líquidas para cada teor de oxigênio simulado, conforme pré-disposto na sessão 4.2.2
na Figura 25.

Figura 39 – Quantidade de cálcio (em ppm) necessário para se atingir a “janela de


lingotabilidade” (campo de inclusões líquidas) em função do teor de oxigênio.

Adição de Ca para atingir o campo de inclusões líquidas


40

35
Ca_i (ppm) = 0.5858[O] - 1.1858
30 R² = 0.9987

25
Ca_i (ppm)

20

15

10

0
0 10 20 30 40 50 60 70
Oxigênio (ppm)

Fonte: Autor, 2019.

O teor de cálcio a se adicionar para chegar ao campo referido, Ca_i, aumenta de forma
linear com o aumento de oxigênio, sendo que pela análise gráfica, a cada 5 ppm de
oxigênio, cerca de 2,5 ppm de cálcio a mais são necessários.

A Figura 40 mostra os resultados de variação dos limites inferior e superior da janela


de lingotabilidade (região “FE_LIQUID+SLAG”). Ou seja, apresenta qual é a
espessura dessa área no gráfico (medida em ppm de cálcio) em função do teor de
oxigênio.
67

Figura 40 – Espessura da “janela de lingotabilidade” em função do teor de oxigênio.

Delta de Ca da janela de lingotabilidade (ppm)


30
ΔCa_janela (ppm) = 0.5305[O] - 0.0348
25 R² = 0.9973
ΔCa_janela (ppm)

20

15

10

0
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
Oxigênio (ppm)

Fonte: Autor, 2019.

Logo, verifica-se que o ΔCa_janela da “janela de lingotabilidade” também se relaciona


linearmente com o teor de oxigênio, sendo que ele aumenta cerca de 2,5 ppm a cada
aumento de 5 ppm de oxigênio.

Utilizando como objetivo o teor de cálcio no meio da janela de inclusões líquidas, a


função foi gerada somando-se a função de adição de cálcio (Eq. 3) com a metade do
ΔCa_janela (Eq. 4), gerando uma equação de cálcio objetivado em função do teor de
oxigênio, Ca_objetivo (Eq. 6).

Ca_i (ppm) = 0.5858[O] - 1.1858 (Eq. 3)

ΔCa_janela (ppm) = 0.5305[O] - 0.0348 (Eq. 4)

Ca_objetivo = Ca_i + 0.5 x ΔCa_janela (Eq. 5)

Ca_objetivo = 0.85105 [O] - 1.2032 (Eq. 6)

A fim de avaliar a utilização dessa equação, foi gerado um parâmetro calculado ΔCa,
que representa o desvio entre o teor de cálcio real e o cálcio objetivado de acordo com
a Equação 6. Espera-se que quanto maior o delta, menor seja a fração de inclusões
líquidas na corrida.
68

A análise da influência do teor de oxigênio na quantidade de inclusões, do ponto de


vista termodinâmico, foi realizada através da construção dos gráficos na Figura 41, a
partir dos cálculos computacionais de equilíbrio multicomponente. Foram feitos
gráficos para quatro diferentes teores de cálcio fixos.

Figura 41 – Variação da fração mássica de inclusões em função do teor de oxigênio


para 10, 15, 30 e 60 ppm de cálcio.

Fonte: Autor, 2019.

As simulações termodinâmicas mostram que o aumento do teor de oxigênio, ao


mesmo tempo que geram modificação do tipo de inclusão, geram aumento do número
de inclusões, representado pela fração mássica no sistema aço-inclusões (eixo y da
Figura 41).
69

5.3 ANÁLISE ESTATÍSTICA

A matriz de correlação gerada com base nos dados de composição e nos resultados
de ASCAT, em 30 corridas do aço médio carbono ao boro, está disposta na Figura 42.
Fonte: Autor, 2019.
Inclusões
Temperatura Total de
Desvio do Líquidas/
%Al %Ca %Si %Ti %S %O %Ca/%O %Ca/%Al %Ca/%S %Al/%O %Al/%S final no Inclusões
Ca_objetivo Total de
refino 2º (ºC) (ppm)
medidas na análise ASCAT.

Inclusões
%Al 1
%Ca -0.17111 1
%Si 0.324831 -0.07915 1
%Ti 0.050257 0.049344 0.273795 1
%S -0.41491 0.071681 -0.6079 -0.25999 1
%O 0.235165 -0.21452 0.250703 -0.32318 -0.2341 1
%Ca/%O -0.12125 0.737433 -0.22056 0.272685 0.048369 -0.65584 1
%Ca/%Al -0.46846 0.938004 -0.20657 0.02322 0.167701 -0.25382 0.693204 1
%Ca/%S -0.22512 0.988152 -0.2161 0.007844 0.144923 -0.24819 0.756194 0.955352 1
%Al/%O 0.130301 0.20512 -0.13139 0.352462 0.055315 -0.82899 0.765665 0.114482 0.21679 1
%Al/%S 0.735082 -0.19801 0.504328 0.130748 -0.88308 0.309225 -0.12568 -0.37101 -0.26058 -0.01813 1
Temperatura final no refino 2º (ºC) -0.40611 0.183122 -0.2824 -0.0116 0.321441 -0.16602 0.179483 0.262832 0.23052 0.060118 -0.42529 1
Desvio do Ca_objetivo 0.280838 -0.18744 0.066789 -0.3754 -0.2957 0.778303 -0.3009 -0.20722 -0.18139 -0.44515 0.442561 -0.1426201 1
Total de Inclusões (ppm) -0.10855 0.620872 -0.33614 -0.22422 0.27463 -0.0644 0.392317 0.578619 0.647529 0.03988 -0.26876 0.149649468 -0.042581 1
Inclusões Líquidas/Total de Inclusões -0.22313 0.466957 -0.18432 -0.34008 0.383642 -0.1095 0.178831 0.447135 0.474163 -0.06138 -0.44751 0.29158852 -0.2578659 0.442323 1
Figura 42 – Matriz correlação entre dados de composição química e inclusões
70
71

A análise dos coeficientes na matriz permite identificar, para as corridas referidas, que:

1 - O teor de oxigênio possui correlação, ainda que baixa, com a fração de inclusões
líquidas, de modo que quanto maior esse teor, menor a fração de inclusões líquidas,
conforme mostrado na análise termodinâmica.

2 - O teor de cálcio possui alta correlação (maior que 0,4) tanto com o total de
inclusões como com a fração de inclusões líquidas, entretanto a correlação é maior
com o total de inclusões.

3 - O ΔCa (desvio do cálcio objetivado pela função Ca_objetivo) possui correlação


desprezível com o número total de inclusões, mas apresenta correlação, com a fração
de inclusões líquidas, de modo que quanto menor o desvio, maior é a fração de
inclusões líquidas.

4 - O total de inclusões apresenta alta correlação (maior que 0,4) com a fração de
inclusões líquidas, sendo que quanto maior a fração, maior o número total de
inclusões.

O cálcio se mostrou o elemento mais relevante tanto na liquefação de inclusões


quanto no aumento do número de inclusões medidas por corrida, sendo este
diretamente proporcional a ambos, porém com maior “peso” na quantidade de
inclusões.

A prática industrial corrobora com este resultado estatístico de tal forma que na
produção dos aços com ocorrência pertinente de clogging, sem adição de cálcio, não
é realizado de forma rotineira o controle de inclusões via análises de ASCAT, isso
porque tais famílias de aço não representam preocupação em termos de qualidade de
produto quanto à incorporação de inclusões. Em contrapartida, para o aço médio
carbono ao boro, com adição de cálcio, não há problemas relevantes com obstrução,
mas há o controle rigoroso quanto à desclassificação do produto devido à
incorporação de inclusões.
72

Tal resultado pode levar a um impasse entre se obter inclusões líquidas, evitando o
clogging, mas dificultando a remoção destas, ou ter inclusões sólidas, aumentando a
ocorrência de obstrução, entretanto facilitando a remoção.

A dificuldade da remoção não se dá apenas pelo maior número de inclusões geradas


da adição de cálcio, mas também pelo tipo da inclusão.

De acordo com REIS, BIELEFELDT e VILELA (2014), a remoção das inclusões ocorre
em três etapas: flotação, separação do aço e dissolução na escória. Enquanto a
flotação é mais fácil para partículas sólidas, a dissolução para partículas líquidas é
imediata quando, separada do aço, atinge a interface metal-escória.

Isso se justifica, pois a flotação é favorecida pela aglomeração e aumento no tamanho


das partículas em meio ao líquido, e, de forma geral, as inclusões sólidas se
aglomeram mais facilmente do que as líquidas.

A remoção de uma partícula isolada é limitada, sendo importante para a melhoria


desse processo o fenômeno de colisão e agregação das inclusões. A aglomeração
desempenha o papel mais importante na remoção das inclusões e a susceptibilidade
a esse fenômeno depende das suas características físico-químicas. A forma física e
a composição química das inclusões não-metálicas determinam a maneira pela qual
as partículas se atraem. Outro efeito importante é a adesão e molhabilidade de uma
dada fase não metálica pelo metal líquido.

Geralmente, inclusões sólidas baixa molhabilidade no aço devido a um ângulo de


contato que excede 90 graus, como as inclusões de alumina (136º) e sílica (102º), e
aglomeração ocorre com relativa facilidade entre essas inclusões, de maneira a formar
clusters (DUAN et al., 2019).

De acordo com KALISZ, ZAK e KUGLIN (2016) os óxidos podem ser classificados
quanto ao ângulo de molhabilidade da seguinte maneira: BeO> Al2O3 (135º)> SiO2
(102º)> ZrO2> CaO> MgO (90º). E esta classificação corresponde à capacidade de
aglomeração decrescente de partículas específicas. Os autores provaram, ainda, que
73

a atração capilar é responsável por esse mecanismo, portanto partículas sólidas de


composição química semelhante agem sobre si mesmas na maior extensão possível.
Essa afirmação está de acordo com as observações de EMI et al. (1997) e YIN et al.
(1997), de que ocorre “forte” atração entre alumina e partículas compostas
principalmente por Al2O3. A atração entre uma partícula sólida e líquida ou semilíquida
é menor e também foi observado que a força da atração não depende da composição
do banho metálico.

A etapa dissolução, por sua vez, não é problemática para soluções líquidas, uma vez
que estas são predominantemente miscíveis nas escórias de refino secundário,
distribuidor ou molde. Por outro lado, inclusões sólidas têm solubilidade limitada em
escórias e, portanto, são sensíveis às características físicas e químicas. A dissolução
de inclusões sólidas é controlada por transferência de massa e pode ser limitada pela
cinética de difusão ou reação (REIS; BIELEFELDT; VILELA, 2014).

Experimentos realizados por XU et al. (2017), sobre remoção de inclusões no RH,


indicam que a maior taxa de remoção, de fato, ocorre para partículas sólidas em
detrimento das líquidas, como evidenciado na Figura 43. O autor aponta, ainda, que
inclusões líquidas não tendem a aglomerar-se, enquanto inclusões sólidas
aglomeram-se rapidamente. Este resultado corrobora que as inclusões sólidas são
mais facilmente removidas do que as inclusões líquidas.

Figura 43 – Taxa de remoção de diferentes tipos de inclusões durante desgaseificação


no RH.

Fonte: XU et al., 2017.


74

Para verificar a capacidade dos dados de composição química, temperatura e as


simulações termodinâmicas (via ΔCa) em prever a fração de inclusões líquidas e o
total de inclusões foram feitas regressões multilineares, cujos resultados são
apresentados na Tabela 6, bem como no gráfico da figura 44. As variáveis
independentes foram escolhidas pela análise da matriz correlação, de modo a
descrever o máximo possível dos resultados evitando colinearidade entre estas
variáveis.

Tabela 6 – Coeficientes obtidos na regressão multilinear para previsão da fração de


inclusões líquidas.

Coeficientes
Interseção -4.83479
%Ca 176.451
%Ca/%Al -2.97746
%Ca/%S -10.2507
%Ti -26.2878
%Al/%S -0.00496
%O 17.32542
Temperatura final no refino 2º (ºC) 0.003952
ΔCa -42.4158
Fonte: Autor, 2019.

Figura 44 – Gráfico de análise da capacidade da regressão multilinear em prever a


fração de inclusões líquidas, através da comparação com a fração calculada pelos
resultados de ASCAT.

Fonte: Autor, 2019.


75

A partir dos resultados das regressões, a análise dos coeficientes permite afirmar que,
para estes dados, as três variáveis com maior influência na fração de inclusões
líquidas são, em ordem decrescente:

1 - O teor de cálcio, que é diretamente proporcional ao aumento de fase líquida e


representa um peso de 64% entre todas as variáveis;

2 - O desvio do cálcio em relação ao “Ca_objetivo”, de modo que quanto maior o


desvio, menor é a porcentagem de inclusões líquidas, e representa um peso de 15%
entre todas as variáveis;

3 - O teor de titânio, de modo que quanto maior esse valor, menor é a fração de
inclusões líquidas, e representa um peso de 9,5% entre todas as variáveis.

Visto que, neste trabalho, utilizou-se como objetos de análise apenas elementos de
influência termodinâmica, é válido ressaltar que os dados não descrevem totalmente
a formação, modificação e remoção de inclusões não metálicas no processo
siderúrgico. Para isto, é necessário lançar mão de análises de perspectiva
fluidodinâmica de transferência de massa e cinética. Os coeficientes de determinação
das regressões (R²) indicam que os parâmetros termodinâmicos (composição química
e temperatura), para os dados do aço médio carbono ao boro em questão, descrevem
cerca de 50% das variações de fração de inclusões líquidas (R²=0,5464).

Ainda é pertinente reafirmar que a análise de regressão foi feita para comportamento
linear de variação. Todavia, os fenômenos e parâmetros analisados não
necessariamente se relacionam de maneira linear, nem tomados em pares, nem como
um todo. Portanto é relevante a análise exploratória dos fenômenos aqui estudados a
partir de outras abordagens descritivas, utilizando métodos regressivos ou
classificatórios de ciência de dados, como técnicas de machine learning, e
abordagens estatísticas inferenciais para processos estocásticos.

A equação gerada para o teor de cálcio objetivado foi construída com base na variação
de apenas um parâmetro, o teor de oxigênio, e apresentou influência relevante na
76

regressão de previsão da fração de inclusões líquidas, mostrando a aplicabilidade dos


resultados de simulação termodinâmica computacional.

Dessa maneira, justifica-se a realização de estudos posteriores para melhoria desta


equação, a fim de agregar variáveis e implementar coeficientes de ajuste que
complementem a descrição do processo de modificação das inclusões e permita
práticas industriais preditivas.
77

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho permitiu identificar o software Thermocalc, de base termodinâmica


computacional, como uma ferramenta adequada à previsão da ocorrência de
obstrução de válvulas no lingotamento contínuo.

O resultado da regressão multilinear para a previsão de fração líquida de inclusões


mostra que o desvio do teor de cálcio objetivado, gerado com base no teor de oxigênio,
possui influência relevante na fração de inclusões líquidas. Além disso, as simulações
termodinâmicas mostram que o aumento do teor de oxigênio, aumenta o número de
inclusões. Ou seja, a minimização do teor de oxigênio, seja pela desoxidação ou
evitando que ocorra reoxidação em etapas posteriores ao refino secundário, minimiza
a quantidade de cálcio a ser adicionado para modificação de inclusões e minimiza o
número de inclusões.

Pelo resultado da matriz correlação gerada, o número de inclusões aumenta com o


aumento da fração de inclusões líquidas, o que corrobora com os estudos de DUAN
et al. (2019), KALISZ, ZAK e KUGLIN (2016), EMI et al. (1997), YIN et al. (1997) e XU
et al. (2017), levando à inferir que o estado líquido das inclusões desfavorece sua
remoção, apesar de favorecer a não obstrução de válvulas.

A composição química do aço mostrou-se como um fator de influência relevante na


quantidade de inclusões não metálicas, porém não totalmente capaz de descrever
esse número, devido à dependência de variáveis de transporte de massa.
78

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