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CFESS Manifesta

27 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente


Brasília (DF), 13 de julho de 2017
Gestão É de batalhas que se vive a vida! www.cfess.org.br

D
esde o movimento pré-constituinte que embalou o timas duas décadas, conselhos tutelares, responsáveis por
Brasil, que emerge da Ditadura Militar, foram percor- zelar pelos direitos de crianças e adolescentes, expandindo
ridos inúmeros caminhos na luta incessante por ma- sua inserção pelo país afora; criou e consolidou conselhos
terializar os direitos previstos no Estatuto da Criança e fundos dos direitos da criança e do adolescente.
e do Adolescente (Eca). Agregou aos debates em torno da infância a presença
A luta por direitos, uma das expressões dos anseios da do controle social, por meio dos conselhos, fóruns e confe-
sociedade e da organização dos segmentos que se põem rências, de modo transparente e assegurando a construção
em ação, é repleta de contradições, interconectadas com coletiva. Se, por um lado, se avançou no arcabouço da po-
cada momento sócio-histórico. Desse modo, situam-se as lítica pública de viés participativo e com controle popular,
principais conquistas desse período e, ao mesmo tempo, não se escapou das armadilhas. Alguns conselhos de direi-
ouvir o som rouco das violações persistentes que rondam tos tornaram-se balcão de negociação de convênios, com
o cenário nacional. Neste ano de 2017, a crise econômi- ênfase ao cunho cartorial de sua atuação. Por seu turno, os
ca e política intensifica os retrocessos nos direitos sociais. conselhos tutelares, em alguma medida, sofreram seu apa-
Nesse contexto, não escapam as políticas para crianças e relhamento político-partidário e religioso. Contudo, fazem
adolescentes. Ao contrário, de modo sutil ou gritante, esse parte da legítima luta pelo poder e do amadurecimento do
segmento social é capturado por lógicas moralistas, puniti- exercício democrático na esfera pública, de modo que, nos
vas e meritocráticas. fluxos e contrafluxos dos processos sociais, implicam no
Neste quarto de século, a sociedade brasileira pôde avanço e retrocesso nos desafios apresentados.
vivenciar a constituição de um sistema de garantia de di- Preocupa, sobremaneira, no momento presente, a di-
reitos, que abarca políticas sociais básicas e especiais, es- mensão que adquirem, especialmente a partir do governo
pecíficas ou transversais ao segmento infanto-juvenil, e de- ilegítimo de Michel Temer, as políticas públicas voltadas
senvolveu mecanismos, ainda que insuficientes, voltados à para a infância e juventude. Evidencia-se o aceleramento
defesa e garantia de direitos. O Brasil implementou, nas úl- do viés neoliberal das forças políticas que se alçaram ao
CFESS Manifesta 27 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente Brasília (DF), 13 de julho de 2017

poder; porém, mais do que isso, revigoram-se No contraditório real, constituíram-se avan- As políticas sociais, de modo geral, pas-
correntes profundamente conservadoras. ços que, entremeados em si, trouxeram a essência sam a sofrer os cortes, tendo como resultado
É indubitável o recente histórico de expan- do que se buscava superar. Desse modo, superar a contração dos serviços prestados e sua pre-
são de políticas para a infância e a juventude, práticas higienistas, prescritivas e moralizantes é, carização paulatina. Crianças e adolescentes
em diversas áreas. Aqui, serão citadas somen- senão a centralidade, parte constitutiva das lutas são atingidos: fechamento de escolas, cor-
te algumas: combate à violência sexual, com que precisam ser travadas cotidianamente. tes de turmas, fechamento ou ausência de
especial atenção a regiões conflagradas com Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS),
essas práticas; o combate ao trabalho infan- ambulatórios, unidades de saúde, equipes
til nas suas diferentes formas, associado ao diminuídas; acolhimentos sem as equipes
Programa Bolsa Família e ao trabalho inter As políticas sociais, de modo mínimas; número reduzido de Centros de
políticas sociais; a expansão das unidades do Referência de Assistência Social (Cras) e
sistema socioeducativo, particularmente nos geral, passam a sofrer os cortes, Centro de Referência Especializado em As-
casos da internação e da semiliberdade; a mu- tendo como resultado a contração sistência Social (Creas) ou com equipes ter-
nicipalização das medidas em meio aberto e dos serviços prestados e sua ceirizadas; ampliação de crianças e adoles-
sua alocação na política de assistência social centes em semáforos, trabalhando. Os sinais
(embora criticada por alguns estudiosos da precarização paulatina. Crianças da retração das políticas encontram-se em
área da infância e juventude!); a expansão de e adolescentes são atingidos: diversas regiões do país.
experiências criativas em diferentes territórios fechamento de escolas, cortes de O conservadorismo, por sua vez, se forta-
amplia saberes e possibilidades de crianças e lece a partir de visões que desqualificam as di-
adolescentes; a obrigatoriedade da escolariza- turmas, fechamento ou ausência de ferenças e moralizam as expressões da questão
ção dos 4 aos 17 anos faz com que a escola Centro de Atendimento Psicossocial social. Acompanhada da onda punitiva, essas
se abra para a massificação do acesso (uma (CAPS), ambulatórios, unidades correntes defendem a redução da maioridade
ruptura histórica em uma sociedade na qual penal, o aumento do tempo máximo de inter-
a educação representa um bem das elites); o de saúde, equipes diminuídas; nação, a aceleração dos processos de destitui-
combate à mortalidade infantil. acolhimentos sem as equipes ção familiar, entre outras medidas alardeadas
Enfim, são inúmeras as frentes nas quais mínimas; número reduzido como salvacionistas.
lutadores/as sociais, entre eles/as assistentes Nesse contexto, os acolhimentos institu-
sociais, estão implicados/as, fazem avançar o de Centros de Referência de cionais, em inúmeros espaços, tornaram-se
acesso a direitos, materializam políticas sonha- Assistência Social (Cras) e Centro uma réplica moderna do “Panóptico de Ben-
das, desenham novas políticas, em um movi- de Referência Especializado em tham”, uma “penitenciária ideal” com câmeras
mento incessante, pois, ao alcançar um pata- de segurança em vários cômodos das casas
mar, se enxerga um horizonte mais amplo para Assistência Social (Creas) ou com para vigiar (pergunta-se: quem?). Aliás, as câ-
a classe trabalhadora. equipes terceirizadas; ampliação meras tornaram-se instrumentos de controle
Porém, como nos diz Karel Kosik, é no de crianças e adolescentes em também nas escolas.
claro-escuro do real que essas políticas são Por último, distante do pessimismo que en-
palmilhadas. E o novo traz em si o velho! Tão semáforos, trabalhando. Os sinais gessa a vontade e a capacidade de se indignar e
simples seria suplantar o velho: de uma vez da retração das políticas encontram- lutar, é preciso enxergar os espaços de resistên-
por todas deixar para trás as antigas unidades se em diversas regiões do país. cia nessa conjuntura. Emerge com intensa ener-
da Febem (Fundação Estadual do Bem Estar gia, nesse momento, a capacidade de a juventu-
do Menor), com seus corpos queimados em de se apresentar como segmento protagonista
motins; superar o internato/patronato/orfana- nas lutas, o que se expressou vigorosamente
to que buscava a institucionalização da puni- O atual estágio do capitalismo não deixa nas ocupações das escolas de ensino médio pelo
ção e da norma, com suas filas e continências; dúvidas, busca a intensificação da superex- país afora, e se estende ao ensino superior.
não ouvir mais falar que a escola não é para ploração da força de trabalho, em meio a um Mais do que lutar pela infância e juventu-
todos/as, afinal, alguns/algumas não foram fei- mundo altamente tecnologizado e sem fron- de, é preciso lutar com a infância e a juventude,
tos/as para aprender, não gostam da escola; e, teiras para o capital. As políticas públicas são rearticular forças, mobilizar, discutir o contexto
quem sabe, deixar de constatar sentenças que vistas como dispêndios para um Estado que no qual se encontra o país e os rebatimentos da
destituem o poder familiar de pais e mães que precisa ser enxuto. Nesse diapasão, há espaço retração de direitos na vida concreta da popula-
sequer foram escutados, pois sua fala é des- somente para a política de segurança pública ção. Os direitos não são lineares, nem fixos; são
prezada, já que inculta, e seu modo de vida na sua versão mais pontual: penal, forças de moldáveis às conjunturas e à capacidade de or-
julgado de forma taxativa como negligente e segurança ostensivas, arsenal bélico e constru- ganização da sociedade. Por isso, Temer jamais!
incapaz de promover cuidados. ção de presídios. Avante, assistentes sociais!

Gestão É de Batalhas que se vive a vida! (2017-2020)


Presidente Josiane Soares Santos (SE) Suplentes CFESS Manifesta
Vice-presidente Daniela Neves (RN) Solange da Silva Moreira (RJ) 27 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente
1ª Secretária Tânia Maria Ramos Godoi Diniz (SP) Daniela Ribeiro Castilho (PA) Conteúdo (aprovado pela diretoria):
2ª Secretária Daniela Möller (PR) Régia Prado (CE) Silvia da Silva Tejadas - assistente social do Ministério
nosso endereço
SCS Quadra 2, Bloco C, Edf.
1ª Tesoureira Cheila Queiroz (BA) Magali Régis Franz (SC) Público do Rio Grande do Sul
Serra Dourada, Salas 312-318. 2ª Tesoureira Elaine Pelaez (RJ) Lylia Rojas (AL) Organização: Comissão de Comunicação
CEP: 70300-902 - Brasília - DF Mauricleia Santos (SP) Revisão: Diogo Adjuto
Fone: (61) 3223-1652 Conselho Fiscal Joseane Couri (DF)
comunicacao@cfess.org.br
Diagramação e arte: Rafael Werkema
cfess@cfess.org.br Nazarela Silva do Rêgo Guimarães (BA), Francieli Piva Neimy Batista da Silva (GO)
www.cfess.org.br Borsato (MS) e Mariana Furtado Arantes (MG) Jane de Souza Nagaoka (AM)

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