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CHINA DUST

O caso do Tratado Transpacífico e a Diplomacia do Reinminbi

Samuel de Jesus

Doutor em Ciências Sociais pela UNESP

Prof. Adjunto História da América UFMS

Samueldj36@yahoo.com..br

Resumo: o anúncio de retirada dos EUA do Tratado TransPacífico, pela administração


Trump, possui implicações estratégicas, sobretudo altera a configuração política na
região da Bacia do Pacífico que tinha nos Estados Unidos uma força para fazer frente ao
poderio econômico e militar chinês. Tudo indica que a China ocupará o espaço deixado
em aberto pelos EUA. Este artigo procura reunir informações que nos permitem pensar
em alguns novos cenários em relação à esta nova configuração geopolítica e
geoeconômica.

Sem este acordo, os concorrentes que não compartilham nossos valores,


como a China, decretarão as regras da economia mundial... essa foi uma
afirmação feita pelo ex-presidente Barack Obama ao assinalar a importância da
aprovação do Tratado Transpacífico. O tratado foi assinado por 12 países: Austrália,
Brunei, Canadá, Chile, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Cingapura,
Estados Unidos e Vietnã, que representam 40% da economia mundial e um terço do
comércio global.
Nesta segunda-feira dia 23.01.2017 o atual presidente dos Estados Unidos, D.
Trump assinou uma ordem executiva para a retirada do país do Tratado de Associação
Transpacífico. Segundo Trump, o Tratado seria prejudicial aos trabalhadores
estadunidenses. Este gesto possui, evidentemente, implicações geopolíticas, talvez a
principal delas seja o predomínio econômico da China na Bacia do Pacífico, isto devido
ao recuo dos EUA. O ex-presidente Obama considerava a região do Pacífico
estratégicamente prioritária para as a manutenção da hegemonia economica e militar
dos EUA.
O governo da China afirmou que pretende, o mais rápido possível, concluir um acordo
de livre-comércio com os países asiáticos. Esta é uma tentativa do governo chinês ampliar sua
influência regional, frente à saída dos EUA da Parceria Transpacífico (TPP) .

Um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês afirmou


nesta terça-feira que os líderes asiáticos atuam para avançar nas
conversas sobre a Parceria Econômica Abrangente Regional, que
envolve dez países. A China defende essa iniciativa como uma
alternativa para o acordo liderado pelos EUA e "espera que essas
negociações possam atingir resultados rápidos.

(China busca fechar acordo de comércio na Ásia, enquanto EUA


podem recuar. Isto É – Dinheiro 22.11.2016).

A retirada dos EUA da parceria transpacífica representa para muitos países uma vitória
da China.

Alguns viram as mudanças como uma vitória para a China. O


professor de Economia Zou Zhengfang, da Universidade Renmim,
disse que o quadro representa uma boa oportunidade para Pequim
conseguir mais poder na arena global, a partir da economia, “e
ganhar uma voz maior”.

(China busca fechar acordo de comércio na Ásia, enquanto EUA


podem recuar. Isto É – Dinheiro 22.11.2016).

A Diplomacia do Reinminbi

As teses de substituição do dólar como lastro pela moeda chinesa, o


Reinminbi, carecem de uma mínima verificação, pois nos permitem questionar
se a China terá condições em curto ou médio prazo de suprimir o dólar como
padrão monetário e financeiro internacional e impor sua moeda. As
perspectivas do sistema financeiro internacional das próximas décadas fazem
pensar ou perguntar se o yuan não se tornará a moeda padrão, lastro,
substituindo o dólar nas transações comerciais. No entanto, hoje, podemos
afirmar que a pergunta é pertinente e merece um esforço mínimo para
respondermos se existe ou não esta possibilidade a partir do quadro econômico-
financeiro conjuntural.

Os chineses desenvolvem a estratégia de controle e direcionamento de


crédito doméstico ofertados por bancos como o Bank of China. Os principais
tomadores são as empresas públicas, semi-privadas que possuem a
implementação de projetos produtivos e infraestrutura: aeroportos, ferrovia,
mobilidade urbana. Faz parte dessa estratégia rígidos controles do sistema
financeiro, grandes volumes de depósitos e poupança. As exportações chinesas,
por exemplo, saltaram de 19,9 bilhões de dólares em 1980 para 1,9 trilhões de
dólares em 2011. O estoque de investimento estrangeiro em 1980 era de 57
milhões de dólares e em 2011, 124 bilhões de dólares. Se o Renminbi fosse
utilizado de maneira mais ampla nas transações internacionais, a China não
precisaria manter reservas em moeda estrangeira para ajustar seu balanço de
pagamento. As instituições chinesas de financiamento do comércio exterior
estão promovendo o Renmimbi, moeda referência na celebração de contratos.
Instituições como EXIMBANK da China ampliam a oferta de ativos em
Renmimbi, no mercado offshore em operações de empréstimo para investidores
internacionais. Desta forma, a China amplia a utilização do Renminbi para além
de suas fronteiras.
O desejo da China é de se tornar uma potência econômica mundial,
estabelecendo um contrapeso à hegemonia dos Estados Unidos no sistema
internacional. A expansão da economia chinesa nos primeiros anos do novo
século foi responsável por 25% de todo o crescimento econômico global.
(CARMODY & UWUSU, 2011, p. 244)

Comércio China - África - América Latina

A China tem avançado rumo à Africa. O comércio entre China e Africa


entre 2000 e 2005 triplicou. No biênio 2003-2004, as importações chinesas
oriundas da África cresceram espantosos 87%. Mais de 60% das exportações de
madeira africana foram destinadas ao Leste da Ásia, e 25% dos suprimentos
de petróleo da China vieram do Golfo da Guiné. A China já é, desde 2005, o
segundo parceiro comercial da África (o primeiro são os EUA). A China se
tornou a principal nação exportadora para a África desde 2007. (CARMODY &
UWUSU, 2011, p. 244)

A despeito disso, alguns elementos gerais da estratégia geoeconômica da China


na África puderam ser identificados, a saber: i) garantia de acesso aos recursos
naturais críticos, particularmente petróleo e gás natural, para manter o
crescimento econômico do país; ii) esterilização dos elevados volumes de
reservas cambiais por meio da saída de investimentos estrangeiros; iii)
facilitação para internacionalização das empresas multinacionais chinesas –
associada aos elementos anteriores; iv) abertura de novos mercados externos
para absorver a produção industrial chinesa; v) desenvolvimento da
agricultura africana para prover, além de alimentos à zona urbana chinesa em
expansão, produtos primários não alimentares necessários à estrutura
produtiva e aos consumidores chineses; e vi) aumento do know-how dos
trabalhadores sobre o mercado africano, aspecto fundamental para atender as
demandas da economia chinesa (CARMODY & UWUSU, 2011, p. 244).

Nos anos 90 a China aprimorou sua pauta de exportações de


manufaturados, sobretudo mudou o perfil das exportações industriais, antes
concentradas em produtos de baixo valor agregado – como têxtil e confecções –,
para uma gama cada vez mais diversificada de bens de consumo e de capital,
que passaram a representar mais de 50% das exportações industriais chinesas.
Tanto a África quanto a América Latina tem recebido investimentos chineses. A
América do Sul e Central respondem por 25% dos produtos agrícolas
consumidos pela China e por 13% dos produtos minerais, incluindo
combustíveis. No caso da África, respectivamente 2,3% e 16,1%. Em outras
palavras, quase um terço dos produtos agrícolas e minerais – inclusive
combustíveis – importados pela China originam-se destas duas regiões.
(BARBOSA, 2011, P. 287).

O grande problema destas relações comerciais entre China, Africa e


América Latina é que os chineses são os grandes exportadores de produtos
manufaturados. Entre 2000 e 2008, as exportações latino-americanas
multiplicam-se por 10,8, enquanto as importações oriundas da China
ampliam-se em 10 vezes. Porém esta taxa de crescimento não se manteve
constante e de forma linear por muito tempo. O boom de commodities
proporcionou um crescimento explosivo entre 2000 e 2005, de 45% a.a., mas
entre 2005 e 2008 declinou para 18%. (BARBOSA, 2011, P. 278).

Além de profundamente concentradas por países, as exportações latino--


americanas também o são em termos de produto. Os principais produtos
exportados para a China por oito países selecionados. São eles: minérios
(cobre, ferro e níquel), combustíveis (petróleo) e alimentos (soja, farinha de
peixe e pescados) ou matérias-primas industriais (lã, couro e celulose). Já
quando se compara o perfil das exportações do conjunto da América Latina
para a China e vice-versa, obtém-se o cenário descrito na tabela 5. Os
produtos primários representam 72% das vendas da região para a China, ao
passo que outros 15,8% são manufaturas intensivas em recursos naturais.
Do lado chinês para a região, o cenário apresenta-se invertido: 98% das
vendas externas chinesas são de produtos industrializados, sendo que 68%
do total se encaixam na categoria de alta e média tecnologia e 20% na de
baixa tecnologia.(BARBOSA, 2011, P. 282)

Países como Chile e Peru aumentaram o comércio de commodities com a


China, no entanto, esses países ainda tem os EUA como o principal mercado e o
mesmo acontece com Colômbia, México, Equador e Uruguai. Brasil e Argentina
aumentaram seu comércio com a China, em termos absolutos e relativos na
última década. (BARBOSA, 2011, P. 285).

A China, atualmente está financiando a contrução da Ferrovia Transoceânica que ligará


o Oceano Atlântico ao Oceano Pacífico. Ligará o Porto de Santos, passando por São Paulo,
Goiás, Mato Grosso e terminando no Peru.

Construção da Ferrovia Transcontinental deve começar em 2022


Principal aposta do novo plano de concessões, obra contará com
investimento brasileiro na ordem de R$ 40 bilhões
A construção da Ferrovia Transcontinental deve começar daqui sete anos. A
estimativa foi anunciada pelo embaixador da China no Brasil, Li Jinzhang,
junto com o governo de Mato Grosso. Outra novidade será a inauguração de
uma representação do estado em uma das províncias chinesas. A ideia é
aumentar o volume de exportação para o país asiático.
(Canal Rural, 2016)

A faixa do território brasileiro percorrida pela Ferrovia Transoceânica é de


aproximadamente 4.400km de extensão. O ponto inicial é Porto Açu–RJ até
Boqueirão da Esperança –AC. A ferrovia continua em território peruano até o
Oceano Pacífico. A ferrovia passará por Estados da Federação como Rio de
Janeiro, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Rondônia, Acre e tem como objetivo
oficial:

1. Estabelecer alternativas mais econômicas para os fluxos de carga de


longa distância;
2. Favorecer a multimodalidade;
3. Interligar a malha ferroviária brasileira;
4. Propor nova alternativa logística para o escoamento da produção agrícola
e de mineração para os sistemas portuários do Norte e Nordeste; e
5. Incentivar investimentos, que irão incrementar a produção e induzir
processos produtivos modernos.
(Disponível em:
http://www.valec.gov.br/acoes_programas/FerroviaTranscontinental.php Extraído em
23.01.2017).

A construção da ferrovia deve começar em 2022 e contará com


investimentos da ordem aproximadamente 40 bilhões. Essa estimativa foi
anunciada pelo embaixador da China no Brasil, Li Jinzhang com o governo de
Mato Grosso. (Disponível em: http://www.canalrural.com.br/noticias/rural-
noticias/construcao-ferrovia-transcontinental-deve-comecar-2022-56975 extraído em:
23.01.2017).
Um protocolo de intenções de construção da Ferrovia Transoceânica foi assinado em
Ji-Paraná (RO), no dia 08.02.2016, pelo governador de Mato Grosso, Pedro Taques, do Acre,
Tião Viana, e de Rondônia, Confúcio Moura. A cerimônia também contou com a presença do
embaixador da China no Brasil, Li Jinzhang, e um grupo de 23 empresários chineses. A ferrovia
seria uma alternativa ao Canal do panamá que está sobre influência dos EUA. Os investimentos
na ferrovia estão calculados em torno de 30 bilhões. Em 2014, a China importou de Mato
Grosso produtos no valor de US$ 4,9 bilhões, sendo que US$ 4,6 bilhões foram destinados à
importação de soja, conforme dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior (Mdic). (AMORIM. 2017)
Em 2015, a China mencionou um investimento de mais de 250 milhões de dólares em
obras de infraestrutura na América Latina. É conhecida a parceria sino-brasileira na contrução
dos satélites CBRS. Satélites avançados de sensoriamento remoto, chamado
Programa CBERS (China-Brazil Earth Resources Satellite) envolveu
inicialmente investimentos superiores a US$ 300 milhões, com
responsabilidades divididas (30% brasileiro e 70% chinês) que resultou no
programa CBERS. , É cada vez mais presente no país a presença de empresas chinesas,
como as empresas de tecnologia LE NOVO, automobilisticas como JAC MOTORS, LIFAN,
KASINSKY e CHERRY. As empresas brasileiras presentes na China são: Aços Villares, Atlas,
Banco do Brasil, Banco Itaú BBA, BEC Limited, Caloi, Embraer, Grupo Estado
de S. Paulo, Marfrig, Marcopolo, Odebrecht, TAM, Tramontina, TV
Bandeirantes, Votorantim, Vale, Riachuelo, Schulz, Petrobrás, Ab Inbev.

Considerações finais

A projeção chinesa na Ásia, África e América Latina demonstra a


capacidade de investimentos da China na periferia, sobretudo a exportação de
produtos manufaturados e de tecnologia e importação de commodities. Este fato
é importante, pois permite a obtenção de matérias primas para a sua
consequente agregação de valor a partir da exportação de produtos
industrializados. Este fato poderá ser muito importante em uma possível
mudança do padrão dólar para o padrão renminbi nas transações monetárias e
financeiras. No momento, a China possui uma relevância maior como país que
empresta, que possui o maior mercado consumidor do mundo, o país que ocupa
um assento permanente no conselho de segurança da ONU, o segundo maior
parceiro comercial da África, o maior parceiro comercial do Brasil. A
emergência da China, assim como dos BRICS, G-20, torna-se obrigatória uma
reforma nos órgãos de gestão do sistema monetário e financeiro que inclua os
países emergentes, dentre eles; Brasil e China.

BIBLIOGRAFIA

A construção da ferrovia transcontinental deve começar em 2022: In. Canal Rural - Leia mais
no link http://www.canalrural.com.br/noticias/rural-noticias/construcao-
ferrovia-transcontinental-deve-comecar-2022-56975 Extraído em 23.01.2017
AMORIM. Paulo Henrique, Ferrovia Transoceânica dá outro passo. Disponível em:
https://www.conversaafiada.com.br/economia/ferrovia-transoceanica-da-outro-passo
Extraído em 23.01.2017

BARBOSA. Alexandre de Freitas, CHINA E AMÉRICA LATINA NA NOVA


DIVISÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. In: A China na nova
configuração global : impactos políticos e econômicos / organizadores: Rodrigo
Pimentel Ferreira Leão, Eduardo Costa Pinto, Luciana Acioly.- Brasília : Ipea,
2011.

CARMODY. Padraig., OWUSU. Francis, A EXPANSÃO DA CHINA PARA A


ÁFRICA: INTERESSES E ESTRATÉGIAS. In: A China na nova
configuração global : impactos políticos e econômicos / organizadores: Rodrigo
Pimentel Ferreira Leão, Eduardo Costa Pinto, Luciana Acioly.- Brasília : Ipea,
2011.

China busca fechar acordo de comércio na Ásia, enquanto EUA podem recuar. Isto É –
Dinheiro 22.11.2016. Disponível em:
http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/economia/20161122/china-busca-
fechar-acordo-comercio-asia-enquanto-eua-podem-recuar/434547 Extraído em
23.01.2017

Ministério das Relações Exteriores: BRICS – Brasil, Rússia, Índia,


China e África do Sul. Disponível em
http://www.itamaraty.gov.br/index.php?
option=com_content&view=article&id=3672&catid=159&Itemid=436&lang=pt
-BR Extraído em 11.12.2016
OURIQUES. Helton Ricardo, As relações econômicas entre China e
África: uma perspectiva sistêmica. In: CARTA INTERNACIONAL Vol. 9, n. 1,
jan. -jun. 2014 [p. 19 a 43]

Obama diz que sem TPP China decretará regras do comércio mundial .In: G1
10/10/2015. Disponível em:
http://g1.globo.com/economia/noticia/2015/10/obama-diz-que-sem-tpp-
china-decretara-regras-do-comercio-mundial.html Extraído em 24.01.2017

Trump assina decreto para retirar EUA de acordo com países do pacífico. In:
G1 23/01/2017. Disponível em: http://g1.globo.com/economia/noticia/trump-assina-
ordem-para-retirar-eua-da-parceria-transpacifico.ghtml Extraído em 24.01.2017.

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