Você está na página 1de 8

11

ANNA MARIA KIEFFER

APONTAMENTOS
MUSICAIS
DOS VIAJANTES
E
ANNA MARIA m sua Histoire d’un Voyage Faict en da vida musical brasileira, tanto do ponto de
KIEFFER é cantora la Terre du Brésil, Autrément Dite
e pesquisadora na
vista iconográfico, como da crônica: Alexan-
área de Música do Amérique, no capítulo sobre as aves, dre Rodrigues Ferreira retrata instrumentos
século XX. Jean de Léry descreve a beleza do indígenas e africanos (3), Gentil de La
pássaro amarelo, o canidé-iuve, que os Barbinais descreve seresteiros baianos que
tupinambás mencionam em seus cantos: se acompanham à guitarra (4) e Nuno Mar-
1 Jean de Léry, Histoire d’un
Voyage Faict en la Terre du “Canidé-iouve, canidé-iouve heura ouech (1). ques Pereira, no Peregrino da América, es-
Brésil, Autrément Dite
Amérique, 3a ed., Genève, Mais adiante, no capítulo sobre os peixes, Léry candalizado pelo “profano das modas e mal
Antoine Chuppin, 1585, p.
159.
faz referência ao camurupuí-uassu, grande soante dos conceitos”, menciona a viola como
2 Idem, ibidem, p. 173.
peixe saborosíssimo, também cantado pelos instrumento de uso corrente:
tupinambás: “Pira-ouassou aoueh / Kamou-
3 Alexandre Rodrigues Fer-
reira, Viagem Filosófica roupouy-ouassou aoueh” (2). “[...] estando eu huma noyte na cidade da
pelas Capitanias do Grão
Pará, Rio Negro, Mato Esses dois fragmentos, de um total de cinco Bahia, ouvi ir cantando pela rua huma
Grosso e Cuiabá: Memóri-
as, Antropologia, Conselho transcritos por Léry, constituem o primeiro e voz: e tanto que punha fim à copla, dizia,
Federal de Cultura, 1974.
único registro de música recolhida no Brasil e como por apoyo da cantiga: Oh Diabo! E
4 M. le Gentil de la Barbinais,
Nouveau Voyage autour du
grafada em pauta no período: outros viajantes fazendo eu reparo em palavra tão inde-
Monde, Amsterdam, chez
Pierre Mortier, 1728, 3o vol.,
seus contemporâneos, como Staden, Thevet e cente de se proferir, me disserão, que não
p. 148. Fernão Cardim, descrevem instrumentos, dan- havia negra, nem mulata, nem mulher
5 Apud Mozart Araujo, A ças e cantos indígenas sem, no entanto, grafá-los. dama, que o não cantasse; por ser moda
Modinha e o Lundu no Sé-
culo XVIII, São Paulo, Do século XVII, poucas notícias temos, até nova, que se usava. Porém eu me persu-
Ricordi Brasileira, 1963, p.
35. agora, sobre a atividade musical praticada no Brasil. ado, que a mayor parte dessas modas lhas
São do começo do século XVIII as infor- ensina o Demonio: porque he helle gran-
mações um pouco mais detalhadas a respeito de Poeta, contrapontista, músico, e
tocador de viola, e sabe inventar modas
profanas, para as insinar àquelles, que
não temem a Deos” (5).

Só no início do século XIX é que os via-


jantes nos fornecem testemunhos em maior
quantidade: relatos, iconografia e música
6 Johan Moritz Rugendas, grafada, esclarecimentos importantíssimos
Viagem Pitoresca através
do Brasil, trad. Sérgio para a reconstituição, principalmente, da
Milliet, Belo Horizonte,
Editora Itatiaia/São Paulo, música popular e de salão do período e para
Editora da Universidade de
São Paulo, 1981.
a interpretação de partituras análogas de fins
7 C. F. von Martius & J. B. von
do século XVIII. (A música religiosa obede-
Spix, Atlas zur Reise in cia a critérios mais internacionais e chegou
Brasilien: Três Séculos de
Iconografia da Música no até nós, em maior quantidade, através de par-
Brasil, Rio de Janeiro, Bi-
blioteca Nacional, 1981. tituras conservadas por confrarias, irmanda-
8 20 Modinhas Portuguezas des e agremiações musicais.)
por Joaquim Manoel da
Camera, notées et Através da informação desses viajantes,
arrangés avec acct de Pfe
par S. Neukomm, Paris, Bi-
temos a confirmação de que os instrumentos
blioteca Nacional, ms.
7699 (36).
melódicos mais usados na música profana
brasileira do período eram a flauta e a rabeca
9 apud Bruno Kieffer. A
Modinha e o Lundu, Porto (violino) que, como a voz, e principalmente a
Alegre, Editora Movimen-
to/Porto Alegre, UFRGS, voz, se faziam acompanhar por violas e gui-
1977, p. 21.
tarras, vez por outra, por um cavaquinho.
10 Antonio Candido, Forma-
ção da Literatura Brasilei- O piano, utilizado na corte e numa ou noutra
ra: Momentos Decisivos,
Belo Horizonte, Itatiaia,
casa mais abastada, só vai entrar na vida da famí-
1981. lia brasileira a partir da década de 30 do século
11 Manuel Veiga, Um Poeta, XIX, quando se desenvolve a impressão musical
Três Textos, Três Desti-
nos, Comunicação apre- no Brasil e são abertos os primeiros estabeleci-

136 R E V I S T A U S P , S Ã O P A U L O ( 30 ) : 1 3 4 - 1 4 1 , J U N H O / A G O S T O 1 9 9 6
mentos de venda de instrumentos e de partituras
no Rio de Janeiro.
Através da iconografia dos viajan-
tes, podemos conferir cada instru-
mento: diferentes tipos de guitar-
ras e violas de cordas duplas e
triplas, herança do período
barroco, encordoadas, se-
gundo eles, com metal.
Nas gravuras de
Rugendas (6), Spix e
Martius (7) podem-se
observar com clareza os
diferentes tipos de dan-
ças, principalmente batu-
ques e lundus, dançados
longe ou perto das casas
só por negros, mestiços ou
brancos, e estabelecer di-
ferentes critérios na interpre-
tação dessas peças, principal-
mente quanto a caráter e anda-
mento.
Os principais documentos mu-
sicais recolhidos pelos viajantes na pri-
meira metade do século XIX são:
• 20 Modinhas Portuguesas (8), compostas
pelo compositor guitarrista e brasileiro Joa-
quim Manoel da Camera, citado por Freycinet:

“[...] quanto à execução, nada me parece Aceite o nome Acima, “Gentio


mais espantoso do que o raro talento à Da minha amada”. Carajá”, desenho
guitarra de um outro mestiço do Rio de aquarelado de
Janeiro chamado Joaquim Manoel. Sob Nesse caso, entretanto, consegui identifi- Desenhos de
seus dedos o instrumento tinha um encan- car o nome do poeta (10). Trata-se de Domin-
Gentios e Animais
to inexprimível, que nunca mais encon- gos Borges de Barros, futuro visconde de
trei entre os nossos guitarristas europeus, Pedra Branca, que Manuel Veiga reconhe- Quadrúpedes... ,
os mais notáveis” (9). ceu como autor do texto de outra modinha da de Alexandre
mesma coleção: “Vem cá Minha Companhei- Rodrigues Ferreira,
Joaquim Manoel não deixou partituras. As ra (A Flor Saudade)” (11). Biblioteca do Museu
20 modinhas em questão foram recolhidas e • Cantigas Populares Brasileiras e Melodias Bocage, Lisboa; na
harmonizadas por outro viajante, o composi- Indígenas, recolhidas por Spix e Martius du-
página anterior,
tor austríaco Sigismund Neukomm, que viveu rante sua viagem pelo Brasil (1817-20) e
no Rio de Janeiro entre 1816 e 1821. Não tra- Zuringer e
publicadas como adendo de Viagem pelo Bra-
zem indicação do autor dos textos, alguns de- sil (12). São ao todo oito cantigas, um lundu Rugendas,“Costumes
les inspirados, como o da modinha número 15: instrumental e 14 melodias indígenas. As can- de São Paulo”,
tigas vêm escritas para uma voz feminina com litografia do álbum
“Triste Salgueiro acompanhamento de piano, embora Spix e Voyage Pittoresque
Rama inclinada Martius, no relato da viagem, as descrevam au Brésil
Folhagem pálida acompanhadas pela viola. É muito possível
Sombra magoada que, ao publicá-las, tenham pensado no leitor

R E V I S T A U S P , S Ã O P A U L O ( 30 ) : 1 3 4 - 1 4 1 , J U N H O / A G O S T O 1 9 9 6 137
alemão que não dispunha de tal instrumento. estrofe e o estribilho tal como aparecem em
O arranjo, muito simples, pode ter sido exe- Viagem pelo Brasil:
cutado pelo próprio Martius, hábil músico e
excelente violinista amador. Do lundu ins- “Acaso são estes
trumental está publicada apenas a linha me- Os sitios formosos
lódica, sem texto. As melodias indígenas, Aonde passava
que Martius descreve como cantos e danças Os annos gostosos?
acompanhadas, em alguns casos, por instru- São estes os prados
mentos, são, na verdade, fragmentos e, como Aonde brincava
no caso das cantigas e do lundu instrumen- Enquanto pastava
tal, têm descrição pormenorizada no decor- O gordo rebanho
rer do relato de Viagem pelo Brasil. No en- Que Alceo me deixou?
tanto, a ordem da publicação das cantigas
não obedece exatamente ao percurso da vi- São estes os sitios
agem. Para facilitar a explanação, reúno-as São estes, mas eu
por região de coleta: O mesmo não sou
São Paulo – “Acaso São Estes”, “Qual Marilia, tu chamas?
Será o Feliz Dia”, “Perdi o Rafeiro” e “Escuta Espera, que eu vou”.
Formoza Marcia”, ouvidas em sarau descrito
pelos viajantes: Minas Gerais – “No Regaço da Ventura”.
Segundo Spix e Martius, seu texto também é
“Fomos levados uma noite, por um de Gonzaga. Não o encontrei, porém, entre as
compatrício europeu do extremo norte, o liras do poeta, mesmo entre as consideradas
sr. Dankwart, capitão sueco aqui residen- apócrifas.
te, a um sarau, que nos deu opinião muito Bahia – “Huma Mulata Bonita”, “Foi-se
favorável sobre o talento musical dos Jozino e Deixou-me”, “Prazer Igual ao que
paulistas. O seu canto é todo de singeleza Sinto” mais o “Landum-Dança Brasileira”.
e ingenuidade e, pela extensão da voz não “Huma Mulata Bonita” aparece como sendo
muito forte de alto soprano, corresponde “de Minas e Goyaz” mas incluo-a neste grupo
perfeitamente aos idílios poéticos. As em função de seu caráter e da explanação dada
modinhas são de origem portuguesa ou por Martius em nota ao capítulo “Viagem à
brasileira. Estas últimas distinguem-se das Comarca dos Ilhéus e Regresso à Bahia”:
primeiras pela naturalidade do texto e da
melodia; são inteiramente ao gosto do “Também os seguintes versos são canta-
sentada ao IV Encontro
Anual da Associação Naci- público e revelam, algumas vezes, ver- dos na província da Bahia em danças se-
onal de Pesquisa e Pós-
Graduação em Música –
dadeira inspiração lírica dos poetas, na melhantes [referindo-se ao lundu]:
Anpom, acompanhada de
cassete com gravações de
maioria anônimos. Amor desprezado, tor-
modinhas sobre textos do mentos do ciúme, dores da despedida são Uma mulata bonita não carece de rezar:
visconde de Pedra Branca
(Andrea Daltro, canto, e os assuntos da sua musa, e a referência, Abasta o mimo que tem, para a sua alma
Manuel Veiga, piano), Por-
to Alegre, UFRGS e CNPq, cheia de fantasia à natureza, dá a esses [salvar.
de 16 a 19 de setembro de
1991. desafogos da alma uma trama genuína, Mulata, se eu pudera no mundo formar
12 Spix & Martius, Viagem pelo
tranqüila, que ao europeu parece tanto [altar,
Brasil: 1817-1820, trad. mais adorável e verdadeira, quanto mais Nele te colocaria, para o povo te adorar”
Lúcia Furquim Lahmeyer,
Belo Horizonte, Itatiaia/São ele mesmo se sentir num enlevo idílico, (15).
Paulo, Editora da Universi-
dade de São Paulo, 1981. pela riqueza e o gozo pacífico, proporci-
13 Idem, ibidem, vol. 1, pp. onados pela natureza que os cerca” (13). Os versos das cantigas “baianas” perma-
141-2.
necem anônimos, salvo no caso de “Foi-se
14 Tomás Antonio Gonzaga,
Maríla de Dirceu, São Pau- A primeira delas, “Acaso São Estes”, tem Jozino e Deixou-me”, que Manuel Veiga con-
lo, Livraria Martins Editora,
1944.
texto de Tomás Antonio Gonzaga, mais pre- sidera uma variante de “Jozino e Marilia”
15 Spix & Martius, op. cit., vol.
cisamente a lira V da primeira parte de Marília (“Vais-te Jozino e me deixas”), mais uma vez
2, p. 196. de Dirceu (14), da qual transcrevo a primeira de autoria de Domingos Borges de Barros (16).

138 R E V I S T A U S P , S Ã O P A U L O ( 30 ) : 1 3 4 - 1 4 1 , J U N H O / A G O S T O 1 9 9 6
Das Melodias Indígenas, destaco aquela clinam à direita. Deste modo, movimen- “Dança dos Puris”,
que Martius recolheu entre os puris, em Mi- tam-se alternadamente, com pequenos litografia que
nas Gerais: passos, um pouco mais para diante. Logo ilustra o atlas do
que o tema musical se conclui, recuam,
Reise in Brasilien...,
“Os homens puseram-se lado a lado em primeiro as mulheres com as meninas, e
de Spix e Martius
fila; atrás deles puseram-se igualmente depois os homens com os meninos, como
em fila as mulheres. Os meninos, aos dois que em fuga desordenada. De novo se
ou três, abraçaram-se aos pais; as meni- colocam em posição e repete-se a mesma
nas agarravam-se por trás, às coxas das dança. Um negro que viveu muito tempo
mães. Nessa atitude, puseram-se eles a entre os puris, nos interpretou aquelas pala-
cantar o triste ‘Han-jo-ha, há-há-há’. Com vras plangentes, cantadas na dança, como
emoções melancólicas foram repetidas lamentação de haver caído quando queriam
várias vezes a dança e a cantiga e ambas colher uma flor de uma árvore. A explica-
as fileiras avançam lentamente, num com- ção que nos ocorria diante deste quadro me- 16 Manuel Veiga, Em Torno
da Identidade de uma
passo de três tempos. Nos primeiros três lancólico era do paraíso perdido” (17). Modinha da Coleção de
Spix e Martius: Comunica-
passos colocam o pé esquerdo à frente e ção apresentada ao I En-
contro Anual da Associa-
inclinam-se à esquerda; no primeiro e ter- E segundo nota do próprio Martius: ção Nacional de Pesquisa
e Pós-Graduação em Mú-
ceiro passos, batem com o pé esquerdo, sica – Anpom, Salvador,
no segundo com o pé direito; nos seguin- “Admira terem as melodias, que Léry UFBA, Anpom e CNPq, de
22 a 25 de agosto de 1988.
tes três passos colocam no primeiro e no assinalou, há mais de duzentos nos, entre
17 Spix & Martius, op. cit., vol.
último passo o pé direito à frente e se in- os índios dos arredores do Rio de Janeiro, 1, p. 228.

R E V I S T A U S P , S Ã O P A U L O ( 30 ) : 1 3 4 - 1 4 1 , J U N H O / A G O S T O 1 9 9 6 139
tanta semelhança com as que nós nota- Chegou a idade
mos aqui” (18). Da liberdade;
Que f’licidade
Embora Debret não tenha propriamente P’r’a humanidade!
recolhido no Brasil música grafada, em seu Tudo agiganta o progresso;
livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil Viva o amor! Fóra o regresso!” (21).
abre espaço a Araujo Porto-Alegre, então seu
aluno em Paris, para que fale da música de Deixando de lado a atualidade deste tex-
sua terra (19). to de Araujo Porto-Alegre, quero evidenci-
Porto-Alegre cita o padre José Maurício, ar, mais uma vez, a importância que os apon-
Marcos Portugal e, principalmente, seus con- tamentos musicais (e mesmo não-musicais)
temporâneos Cândido Inácio da Silva e Fran- dos viajantes representam para todos aque-
cisco Manuel da Silva. A intimidade com les que, hoje, estudam e interpretam a músi-
que fala dos assuntos musicais de seu tempo ca brasileira do passado. A recuperação de
reitera sua participação ativa na vida musi- instrumentos originais, como a viola de ara-
cal carioca: além de pintor e escritor, foi me, por exemplo, a comparação de instru-
letrista sarcástico, colaborando com seus mentos indígenas de séculos atrás com os
amigos músicos na criação de lundus de sátira confeccionados hoje, a evolução dos instru-
política. É o caso de “Lá no Largo da Sé”, mentos africanos no Brasil e até mesmo o
musicado por Cândido Inácio da Silva: ambiente onde era executada determinada
música constituem elementos importantes
“[...] Os estrangeiros dão bailes na reconstrução da memória musical brasi-
P’ra regalar o Brasil leira e passam, necessariamente, pelo viés
Mas a rua do Ouvidor dos viajantes:
He de dinheiro hum funil.
Lindas modinhas “Deixamos o Rio de Janeiro a 8 de de-
Vindas de França zembro de 1817, com destino a São Pau-
Nossos vintens lo, ansiosos por conhecer seus famosos
Levão na dança. jardins tratados com grande gosto e curi-
18 Idem, ibidem, vol. 1, p. 227.
Bravo à especulação osa elegância. Na verdade, São Paulo se
19 Jean Baptiste Debret, Via-
gem Pitoresca e Histórica São progressos da nação” (20). assemelha a uma cidade da Andaluzia. O
ao Brasil, trad. e notas de
Sérgio Milliet, São Paulo, Li- jasmim é a planta favorita em toda parte e,
vraria Martins Editora, Edi-
tora da Universidade de
E de “Fóra o Regresso”, de parceria com em seu clima magnífico, as flores desa-
São Paulo, 1972, vol. 2, pp. o dr. José Maurício Nunes Garcia Filho: brocham perenemente. Não é raro ouvir-
101-3.
se, como em Cadiz, o som de uma guitar-
20 Cândido Inácio da Silva, Lá
no Largo da Sé: Lundu Bra- “[...] Decora um rapaz seis phrases, ra, em hora avançada da noite, debaixo de
sileiro para Canto e Piano,
Texto de Manoel de Araujo De um author ou libellista, alguma janela gradeada que se abre por
Porto-Alegre, Rio de Janei-
ro, Imprensa de Música de Ei-lo já com longa vista, uma indecisa mão” (22).
Filippone e Tornaghi, rua do
Ouvidor, 101.
Novo regeneradôr.
21 José Maurício Nunes Gar-
Promettendo o sol e a lua Em geral, os viajantes chamam de guitar-
cia Filho, Fóra o Regresso: Cabala, sahe Deputado; ra a todos os representantes desta grande fa-
Lundu, Texto de Manoel de
Araujo Porto-Alegre, Rio de Vende o voto, é magistrado, mília de instrumentos de cordas dedilhadas
Janeiro, Biblioteca Nacio-
nal, ms. M-III-2. E já visa a Senador. que inclui a viola de arame, a guitarra portu-
22 Anna Maria Kieffer, in Via- Que môço guesa e a guitarra romântica, o ancestral mais
gem pelo Brasil, Encarte do
CD de mesmo nome com De tino! próximo do violão atual (23).
Anna Maria Kieffer, meio-
soprano, Gisela Nogueira,
É um pôço Se o clima, o ambiente e as partituras re-
viola de arame, e Edelton
Gloeden, guitarra. São
De fino! ferentes a São Paulo remetem a uma música
Paulo, Gravadora Eldo-
rado/São Paulo, Akron Pro-
Menino de caráter intimista, na Bahia nos deparamos
jetos Culturais, 1990. De trôço! com a exuberância das danças ao ar livre ou
23 Gisela Nogueira e Edelton Carôço com a delicada malícia de lundus executa-
Gloeden, in Viagem pelo
Brasil, Encarte do CD cit. Ladino! dos, dentro de casa, após o jantar:

140 R E V I S T A U S P , S Ã O P A U L O ( 30 ) : 1 3 4 - 1 4 1 , J U N H O / A G O S T O 1 9 9 6
“[...] antes de se sentarem à mesa, passam Jean-Baptiste
os convivas ao quarto contíguo, para Debret, “Marimba.
mudar uma jaqueta branca de tecido O Passeio de
finíssimo, a fim de comerem mais à fres- Domingo à Tarde”,
ca, e, em geral, também para esse fim se
litografia deVoyage
fecham as venezianas. Nesses jantares,
aparece no fim um grupo de músicos, cujos Pittoresque et
acordes, às vezes desafinados, convidam Historique au
ao lundu, que as senhoras costumam dan- Brésil (Paris,
çar com muita graça” (24). 1834), Biblioteca
Municipal Mário
O seguinte lundu, recolhido por Martius
de Andrade
em Salvador em 1818, pode ter sido esse des-
crito acima. Não consegui identificar o autor
do texto. Seu acompanhamento foi recriado
Partitura de por Gisela Nogueira e Edelton Gloeden para
“Prazer Igual ao que Sinto”, viola de arame e guitarra. Quando o executa- 24 Spix & Martius, op. cit., vol.
andantino, Anônimo, col. Minas e Bahia mos em público, procuramos não desafinar. 2, p. 152.

R E V I S T A U S P , S Ã O P A U L O ( 30 ) : 1 3 4 - 1 4 1 , J U N H O / A G O S T O 1 9 9 6 141

Você também pode gostar