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O trabalho de campo no Ensino Fundamental de Geografia: Instrumento para

análise espacial

Lucas Cavalheiro1; cavalheiro_prado@hotmail.com


Lucas Marques2; lucassmarquesluiz@hotmail.com
Marina Castilho Pradal3; marina.pradal@hotmail.com
Viviane Borges4; vivianecborges@hotmail.com
Universidade Estadual de Londrina

INTRODUÇÃO

Sabe-se que o trabalho de campo auxilia o geógrafo na compreensão da


dinâmica do espaço geográfico, possibilita e proporciona a aprendizagem de temáticas
essências e a criação de um olhar crítico voltado para as transformações e contradições
da sociedade.
Assim, o presente artigo tem como objetivo relatar o trabalho de campo
realizado em escola pública e como sua utilização serve como instrumento para a
compreensão da dinâmica do espaço geográfico. Especificamente o trabalho de campo
foi realizado com alunos do 8º ano do Ensino Fundamental e, surgiu diante discussões
nas reuniões do PIBID/Alfabetização Cartográfica (2012 – 2013) da Universidade
Estadual de Londrina, presente no Colégio Estadual Professora Maria José Balzanelo
Aguilera, Londrina – Paraná. Constatou, a necessidade de levar os alunos a campo, para
que visualizassem os fenômenos espaciais de maneira clara e objetiva.

1
Graduando do segundo ano do curso de Geografia da Universidade Estadual de Londrina e bolsista do
projeto PIBID desde 2014 (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência).
2
Graduando do segundo ano do curso de Geografia da Universidade Estadual de Londrina e bolsista do
projeto PIBID desde 2013 (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência).
3
Graduanda do quarto ano do curso de Geografia da Universidade Estadual de Londrina e bolsista do
projeto PIBID desde 2012 (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência).
4
Professora colaboradora do curso de Geografia da Universidade Estadual de Londrina/UEL
Para a concretização do artigo realizou um levantamento bibliográfico com
autores que demonstram a importância do trabalho de campo na ciência geográfica e no
ensino de geografia, e como pode ser útil como instrumento de percepção espacial.
Dentre as principais obras estão, o texto de Paulo R. R. Alentejano e Otávio M. Rocha-
Leão, intitulado Trabalho de campo: uma ferramenta essencial para os geógrafos ou
um instrumento banalizado? (2006) e o texto Trabalho de campo como instrumento de
ensino em Geografia (1999), de Luzia M. Saito Tomita.

O TRABALHO DE CAMPO NO ENSINO DA GEOGRAFIA

Desde os primórdios da geografia os trabalhos de campo são parte fundamental


do trabalho dos geógrafos e que para a sistematização da ciência geográfica os estudos e
pesquisas de campo, que antigamente elaborados por viajantes e naturalistas, foram
essenciais às bases de construção e desenvolvimento da geografia. Por esse motivo, o
trabalho de campo tornou-se o principal método com o predomínio de uma concepção
em que as análises empiristas eram dominantes (ALENTEJANO; ROCHA-LEÃO;
2006).
Dessa mesma maneira, o trabalho de campo contribuiu na consolidação da
Geografia brasileira, principalmente com o apoio dos geógrafos da Associação dos
Geógrafos Brasileiros (AGB) que foram responsáveis pela difusão do trabalho de
campo como instrumento fundamental aos geógrafos (ALENTEJANO; ROCHA-
LEÃO; 2006).
Como descrevem Alentejano e Rocha-Leão (2006, p. 57):

Fazer trabalho de campo representa, portanto, um momento do


processo de produção do conhecimento que não pode prescindir da
teoria, sob pena de tornar-se vazio de conteúdo, incapaz de contribuir
para revelar a essência dos fenômenos geográficos.
Neste sentido, trabalho de campo não pode ser mero exercício de
observação da paisagem, mas partir desta para compreender a
dinâmica do espaço geográfico, num processo mediado pelos
conceitos geográficos.
Para que realmente exista a compreensão da dinâmica do espaço geográfico
devem-se levar em conta as relações e os aspectos, como por exemplo, urbanos, rurais,
econômicos e culturais da paisagem, de modo que haja a interrelação dos fenômenos
mediadas pelos conceitos geográficos e que propicie conclusões diversas.
É importante considerar também que o trabalho de campo não pode ser
confundido com turismo ou passeio e que o olhar do pesquisador precisa estar focado
no objeto de estudo, sem desvinculá-lo do todo (SILVA; ALVES; LOPES, 2008).
Assim como na ciência geográfica, o trabalho de campo é importante ao ensino
de Geografia, no ensino fundamental II e no ensino médio, de modo que contribua à
construção do conhecimento. Atualmente um dos grandes desafios encontrados no
ensino da geografia é o trabalho com conteúdos distantes da realidade do aluno,
conteúdos abstratos, e por esse motivo, conforme relata Tomita (1999), um bom
embasamento teórico deve partir do conhecido ao desconhecido, do concreto ao
abstrato, do próximo para o mais distante.
É neste contexto que o trabalho de campo, como instrumento de auxílio ao
conhecimento geográfico, está inserido, pois permite a visualização dos fenômenos
espaciais, de forma menos maçante que em sala de aula, despertando a atenção dos
alunos, facilitando o aprendizado, além de ser importante na compreensão e leitura do
espaço geográfico (TOMITA, 1999).
De acordo com Alentejano e Rocha-Leão (2006, p. 63):
Torna-se evidente que no âmbito do ensino também surgem
necessidades em relação à articulação de escalas de análise para
visualização dos fenômenos, já que muitos dos processos
vistos/observados no campo se complementam com outros processos
operantes em distintas escalas espaço-temporais.

É perceptível que o trabalho de campo no ensino de Geografia, proporciona aos


alunos outra escala de análise, diferente da encontrada em muitas salas de aula, em que
os discentes têm a oportunidade de se aproximar da realidade, analisar e observar as
relações existentes no espaço geográfico.
Segundo Alentejano e Rocha-Leão (2006) a elaboração de trabalhos de campo
que se preocupam em evidenciar os fenômenos naturais e sociais torna-se um
instrumento integrador ao ensino de Geografia. E conforme relatam Souza e Chiapetti
(2012) o estudo e a prática do trabalho de campo proporciona didaticamente a
compreensão da dinâmica do espaço geográfico de vivência dos alunos (SOUZA;
CHIAPETTI, 2012).
O trabalho de campo é um instrumento pedagógico essencial ao ensino da
Geografia, que com a quebra da rotina escolar fomenta o aprendizado, permite à
compreensão e leitura do espaço geográfico de modo mais racional, a percepção dos
fenômenos espaciais e a articulação entre a teoria e a prática (BELO; RODRIGUES
JUNIOR; 2010).
Portanto, o campo em si não deve ser utilizado como a única ferramenta, mas
ser um instrumento de auxílio ao ensino e conforme relata Venturi (2006) as
informações obtidas em campo, podem ser, muitas vezes, insubstituíveis. Por esse
motivo, o trabalho de campo no ensino deve ser cada vez mais valorizado e realizado de
modo que realize uma análise das relações existentes no espaço geográfico, e que seja
um instrumento complementar a construção do conhecimento geográfico.

RELATO DE EXPERIÊNCIA: O TRABALHO DE CAMPO COMO


INSTRUMENTO DE ANÁLISE ESPACIAL NA ZONA SUL DA CIDADE DE
LONDRINA – PR

Em 2013, ao se trabalhar a temática Alfabetização Cartográfica, através do


Programa PIBID, no Colégio Estadual Professora Maria José Balzanelo Aguilera, zona
sul da cidade de Londrina – PR, com alunos de 8° ano, percebemos que os alunos
necessitavam participar de um trabalho de campo que possibilitasse a visualização e
compreensão os fenômenos espaciais, pois apresentavam dificuldades em
compreenderem a realidade do espaço vivido.
O trabalho de campo realizado com os alunos do 8º ano teve como principal
objetivo proporcionar a percepção das espacialidades e as transformações que
ocorreram ao longo da história no processo de evolução do espaço urbano londrinense.
Ao pensarmos em um campo aos alunos, primeiramente os objetivos a serem
alcançados foram traçados, para assim, escolhermos os lugares ideais para correlacionar
e articular os conteúdos. Deste modo, o trajeto foi planejado e o tempo de percurso
estipulado.
Uma aula pré-campo foi realizada a fim de proporcionar explicações e
orientações necessárias, reforçamos o que é trabalho de campo, o que é croqui e o
objetivo das fotografias e os métodos de avaliação. Explicamos o objetivo do campo e
tudo o que deveria ser realizado, antes, durante e depois do estudo do meio. Entregamos
aos alunos, em folha individual, um roteiro que continha o objetivo, o motivo da escolha
do itinerário, os tópicos que seriam abordados, todas as orientações (como o material
necessário, as roupas que seriam adequadas, autorização dos pais e orientação para
lanche, água e protetor solar) e recomendações comportamentais, assim como uma
representação cartográfica do trajeto (Imagem 1) do trabalho de campo na zona sul da
cidade.

Imagem 1 – Representação cartográfica do trajeto do trabalho de campo.


Fonte: Google Maps (2014)

O trabalho de campo ocorreu em dois dias, 21 e 23 de outubro de 2013, com


duas turmas em cada dia (aproximadamente 40 alunos), e contávamos com a presença
de mais uma professora, além do professor regente e dos 8 estagiários do PIBID.
Saímos do Colégio às 13h30 e retornamos às 17h30, mesmo horário das aulas de
determinadas turmas e percorremos de ônibus todo o trajeto. Reforçamos o objetivo e
como deveria ser o comportamento dos educandos durante todo o campo.
O campo foi composto de seis paradas, em que os estagiários e o professor,
possibilitaram a compreensão de temáticas importantes correlacionando os fenômenos
espaciais e proporcionando a percepção das análises espaciais. Algumas paradas foram
realizadas em lugares habituais aos alunos, porém outras foram em lugares
desconhecidos.
A primeira parada (Rua Tarcisa Kikuti – Conjunto Cafeza 4) foi realizada no
bairro do Colégio, para contextualização do lugar e os aspectos históricos do bairro
foram abordados. Muitos alunos não tinham conhecimento da história do bairro do
Colégio, já outros contribuíram com exemplos e informações básicas. Após a
explicação os alunos puderam fotografar a paisagem.
Segunda parada, na Avenida: Waldemar Spranger permitiu ter uma visão sobre
a face sul da área central da cidade, em que se pode visualizar a verticalização urbana da
cidade de Londrina. Nesta parada, além da explicação dos motivos e da época que
levaram à construção de uma grande quantidade de prédios, foi pedido aos alunos
produzirem um croqui com o objetivo de representarem a verticalização e a quantidade
de construções. Alguns alunos conseguiram representar a verticalização da cidade,
como pode ser observado na Imagem 2.

Imagem 2 – Croquis representando a verticalização vista a partir da face sul da cidade


de Londrina – PR

Fonte: acervo dos autores

A terceira parada (Rua Ademar Pereira de Barros – Jardim Bela Suíça) foi
desempenhada em um bairro nobre de Londrina, que possui uma população com alta
concentração de renda. Os aspectos trabalhados foram a segregação no espaço
geográfico e as características tanto do bairro quanto dos moradores, assim como os
principais objetos geográficos ali encontrados, como o 6º Distrito Policial de Londrina,
por exemplo. Os alunos demonstraram muito interesse, pois o bairro apresenta
construções de luxo e de grande porte, ruas monitoradas com câmeras de segurança e
seguranças particulares. Grande parte dos alunos não conhecia o lugar, mesmo se
localizando ao lado do Lago Igapó, um dos principais pontos turísticos de Londrina.
A quarta parada (Av. Madre Leônia Milito – Gleba Palhano) foi realizada em
um bairro de classe média/alta em que há uma grande quantidade de prédios de
tamanhos elevados e que atualmente está em constante expansão. Um ponto importante
a ressaltar, é que mesmo se tratando de um lugar mais habitual aos alunos, pelo fato das
ruas percorridas serem vias de acesso a shoppings centers da cidade, os alunos ficaram
admirados com os tamanhos e quantidade dos prédios. Também foi enfatizado a
quantidade de comércio existente no lugar.
A quinta parada (Avenida da Maratona - Jardim Olímpico) foi realizada em um
contexto contrário até então percorrido, levamos aos alunos em uma região próxima a
que nos encontrávamos, porém com concentração de população de baixa renda, com
moradias simples e até mesmo precárias. Assim, trabalhamos o conceito de periferia e
de contradições produzidas no espaço geográfico, o que de certo modo introduziu as
correlações para a última parada. Os alunos ficaram impressionados com o lugar,
principalmente pelo fato de que algumas casas precárias às condições básicas de
moradia se encontram em terrenos com grande declividade.
A sexta e última parada foi em uma região bem próxima a quarta parada,
contudo com um contexto totalmente inverso. Áreas de condomínios residenciais de
luxo, com pessoas que apresentam alta concentração de renda, o que permitiu
demonstrar as características do conceito periferia e que nem sempre é sinônimo de
pobreza, bem como as contradições encontradas no espaço, pois os bairros praticamente
são vizinhos. Também foi abordado o shopping center que se encontra na região, com
lojas de alto padrão, e que atua como um subcentro da cidade de Londrina e à região.
Nesta parada solicitou aos alunos que produzirem um croqui com o objetivo de
representarem a área em que é possível a visualização dos condomínios de luxo com a
região de moradias simples (Imagem 3).

Imagem 3 – Croqui representando o contato das áreas subnormais com os condomínios


de luxo na cidade de Londrina – PR.
Fonte: acervo dos autores

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A utilização do trabalho de campo no ensino de Geografia é fundamental à


análise das relações espaciais, à interrelação dos fenômenos, percepção das
espacialidades e à leitura e compreensão do espaço geográfico, além de oferecer aos
alunos um contato com a realidade de modo mais concreto.
O estudo do meio faz com que exista mais participação dos alunos dando a
possibilidade da observação in loco e, torna perceptível a análise espacial do espaço
geográfico, um olhar crítico do aluno seja acentuado.
No caso do trabalho de campo realizado com os alunos do Ensino Fundamental
do 8˚ ano, percebemos que eles obtiveram conhecimentos e visualizaram fenômenos
espaciais de lugares anteriormente nunca visitados, e até mesmo esteriotipados pela
sociedade. Houve também quebra de conceitos preestabelecidos, principalmente sobre o
conceito de periferia e segregação espacial.
Os alunos realizaram uma atividade após o campo, em que apresentaram um
trabalho escrito que trazia todas as paradas abordadas em campo, com textos sobre o
assunto, fotos e análises dos croquis realizados por eles. Os textos e análises produzidos
por eles, mesmo que de maneira simples, consolidou os aspectos trabalhados durante o
trabalho de campo.
Deste modo, o trabalho de campo é essencial e uma prática indispensável ao
ensino de Geografia no ensino básico e deve ser aplicado de modo que não seja apenas à
observação da paisagem, mas que possibilite a análise das relações espaciais e espaço-
temporais e que viabilize o entendimento de conteúdos e categorias geográficas de
maneira clara e objetiva.

REFERÊNCIAS

ALENTEJANO, Paulo R. R.; ROCHA-LEÃO, Otávio M. Trabalho de Campo: Uma


Ferramenta Essencial Para os Geógrafos ou um Instrumento Banalizado? IN:
Boletim Paulista de Geografia. São Paulo: AGB, n. 84, p. 51 – 68, 2006.

SILVA, Kássia Nunes da.; ALVES, Lidiane Aparecida; LOPES, Michelly de Lourdes.
A importância de se praticar o trabalho de campo na ciência geográfica. A MARgem
Revista Eletrônica de Ciências Humanas, Letras e Artes. Uberlândia, nº 1, p. 10-19,
jan./jun. 2008.

SOUZA, S. O. ; CHIAPETTI, R. J. N. O Trabalho de Campo como estratégia ao ensino


de Geografia. Revista de Ensino de Geografia, Uberlândia, v. 3, p. 3-22, 2012.
Disponível em: <http://www.revistaensinogeografia.ig.ufu.br/N.4/Art1v3n4. pdf>.
Acesso em 27 ago. 2013

TOMITA, Luzia Mitiko Saito. Trabalho de campo como instrumento de ensino em


Geografia. Geografia (Londrina), Londrina, v. 8, n.1, p. 13-15, 1999.

VENTURI, L. A. B. O Papel da Técnica no Processo de Produção Científica. IN:


Boletim Paulista de Geografia. São Paulo: AGB, n. 84, p. 69 – 76, 2006.

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