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Cesário

Verde

“Ele era um camponês/


Que andava preso em liberdade pela cidade.”
Alberto Caeiro (heterónimo de Fernando Pessoa)
Contextualização histórico-literária

Uma das personalidades mais originais, mais renovadoras, da poesia portuguesa do século XIX.
Nasceu em Lisboa, em 1855, oriundo duma família burguesa abastada, e morreu no Lumiar (Lisboa),
tuberculoso, em 1886. O pai era lavrador e comerciante (possuía uma quinta em Linda-a-Pastora e
uma loja de ferragens na capital), e por estas duas formas de aLvidade práLca se reparLu Cesário
Verde, embora, marginalmente, saLsfizesse o gosto da leitura e da criação poéLca. Chegou a
frequentar por algum tempo o Curso Superior de Letras. É nesta época (1873) que, pela primeira vez,
se publicam composições suas (no Diário de No*cias). Depois de 1875, «Num bairro moderno» é de
1877, «Em peLz» de 1878, segundo as datas indicadas pelo autor (foram publicadas respeLvamente
em 1878 e 79); «O senLmento dum ocidental» veio a lume em 1880. A críKca, porém, não o esKmula
e Cesário Verde, durante quatro anos, deixa de publicar, entregando-se por inteiro à vida práLca.
Com efeito, só em 1884 publica o poema «Nós», todavia escrito em 1881/2; nele evoca a morte duma
irmã (1872) e do irmão Joaquim Tomás (1882). Quando morreu, não reunira ainda em volume as suas
poesias. Foi um amigo, Silva Pinto, quem editou em 1887 O Livro de Cesário Verde. (…)

Jacinto do Prado Coelho. Dicionário de Literatura, vol. 4. 1994. Porto: Figueirinhas.
Contextualização histórico-literária

Contexto histórico Contexto literário

Segunda metade do século XIX Realismo


•  Clima de paz e de Progresso •  Escola literária surgida na segunda metade do século XIX
•  Regeneração como reação aos excessos do formalismo românLco
•  Ascensão da burguesia •  Forma de expressão arlsLca que procura reproduzir, de
•  Crescimento das cidades
forma mais ou menos evidente e naturalista, o mundo e os
objetos da realidade envolvente (representação da vida

burguesa e/ou urbana; denúncia e análise críLca dos vícios
da sociedade contemporânea).

Parnasianismo
•  ObjeLvidade no tratamento dos temas abordados.
•  O escritor parnasiano trata os temas baseando-se na
realidade, deixando de lado o subjeLvismo e a
emoção;
•  Impessoalidade: a visão do escritor não interfere na
abordagem dos factos;
•  Valorização da estéLca e busca da perfeição. A poesia é
valorizada por sua beleza em si e, portanto, deve ser
perfeita do ponto de vista estéLco;
Contextualização histórico-literária
A representação da cidade e dos Kpos sociais

Representação da cidade
Cesário, nos seus poemas, descreve uma cidade industrializada, com construções elegantes e
bairros modernos, com largos passeios públicos. É uma Lisboa com locais de convívio social e
hábitos culturais, mas também uma cidade onde vivem as classes trabalhadoras e onde a
degradação social está presente. Lisboa é ainda um local de confluência entre a vida urbana e o
mundo rural.

Representação dos Kpos sociais


Em Lisboa, cruzam-se burgueses, arLstas, artesãos, comerciantes, bailarinas, engomadeiras,
operários,… Os novos heróis da cidade são agora os homens e mulheres que vivem nos quadros
de quoLdiano domésLco, familiar e urbano fixados nos poemas.
A representação da cidade e dos Kpos sociais

Espaço confinador Símbolo de Representação minuciosa


e destruKvo, morte, doença e
e realista, segundo a
marcado pela aprisionamento.
ausência ou perceção sensorial e a
perversão do
reflexão / análise do
sujeito poéKco.
amor.
Representação
Captação de exteriores e
da cidade
interiores e de pequenos

Espaço oposto ao

episódios do quoKdiano,
decorrente da
campo (vitalidade,
deambulação do sujeito
energia, ânimo,
poéKco pela cidade e da
expressão observação acidental.
idílica do amor).


Deambulação e
Campo – símbolo
de vida, saúde e imaginação: o
liberdade. observador acidental
A representação da cidade e dos Kpos sociais

Povo / classes ProduLvidade, Alvo de simpaKa e
trabalhadoras vitalidade, autenLcidade. solidariedade por
Ex.: vendedora de
parte
legumes, calafates,
obreiras, varinas… do sujeito poéKco.


Ociosidade, inércia,
Burguesia Alvo de críKca e
arLficialidade.
Ex.: criado do bairro ironia por parte do
burguês, den4stas, sujeito poéKco.
Tipos arlequins, lojistas…
sociais

Marginais que Degradação social e moral.
Alvo de críKca por
vivem na cidade Ex.: ladrões,
bêbedos, jogadores, parte do sujeito
pros4tutas…
poéKco.

Mulher fatal Bela, atraente e sedutora Associada à cidade


Ex.: atrizita...

Mulher natural Simples, frágil e sedutora Associada ao campo


Ex.: vendedora de fruta...
A representação da cidade e dos Kpos sociais
Deambulação e imaginação: o observador acidental
A descrição da cidade Os contrastes sociais
A vertente críKca As preocupações sociais: solidariedade social
face aos desfavorecidos
O carácter deambulatório
A descrição objeKva da realidade e o real como
A observação objeKva enquanto ponto de inspiração
parKda para o trabalho de poeKzação
A poéKca de cariz realista
A apresentação do quoKdiano
O gosto pelo pormenor
A influência impressionista: as sensações e
impressões; o visualismo e o cromaKsmo; a As breves “fugas imaginaKvas”
dimensão cinéKca

•  O sujeito poéLco assume uma aLtude de deambulação e imaginação, nos seus poemas.
•  Importa reter a sua capacidade de descrever as paisagens e as gentes do seu tempo com distanciamento
críKco.
•  O sujeito é um observador acidental que regista fragmentos de realidade, impressões sensoriais,
recriando os instantâneos observados.

•  O poeta assemelha-se a um pintor ou a um fotógrafo na criação de instantâneos quase cinematográficos.


•  O sujeito parte do quoKdiano trivial e, por ação da memória e dos senLdos, transfigura-o, tornando-o
surpreendente e inesperado.
Perceção sensorial e transfiguração poéKca do real

A descrição objeKva da realidade As breves “fugas imaginaKvas”


A influência impressionista: as sensações e impressões; o visualismo e o
cromaKsmo; a dimensão cinéKca

PERCEÇÃO
TRANSFIGURAÇÃO POÉTICA DO REAL
SENSORIAL

Primado das sensações Conceção duma nova realidade, a parLr de


(visuais, audiLvas, elementos reais, através da visão
olfaLvas, gustaLvas, transfiguradora do sujeito poéLco.
táteis).
Ex.: “Num bairro moderno”
Ex.: “De tarde” (criação, pelo sujeito
(predomínio de sensações poé4co, de uma figura
visuais, complementadas antropomórfica,
com a par4r dos legumes
sensações gusta4vas) e os frutos da giga
(melancia – cabeça;
repolhos – seios;

azeitonas – tranças…)
“Num bairro moderno”

Dez horas da manhã; os transparentes O sujeito desloca-se para o emprego e observa


MaLzam uma casa apalaçada; incomodado o “conchego e a “vida fácil” do
Pelos jardins estancam-se as nascentes, “bairro moderno”, em contraste com a luz e o
E fere a vista, com brancuras quentes, calor da “larga rua macadamizada”
A larga rua macadamizada.

Rez-de-chaussée repousam sossegados,
Sossego e facilidade da
vida do bairro às 10h
Abriram-se, nalguns, as persianas,
E dum ou doutro, em quartos estucados, ≠
Ou entre a rama dos papéis pintados, mal estar do sujeito que
Reluzem, num almoço, as porcelanas. caminha contrafeito para
o emprego
Como é saudável ter o seu conchego,
E a sua vida fácil! Eu descia, Diferença social:
Sem muita pressa, para o meu emprego, •  o bairro Sinestesia –
Aonde agora quase sempre chego pertence à tato + visão
Com as tonturas duma apoplexia. classe alta;
•  ele à classe AdjeLvação
Ironia e exclamação trabalhadora expressiva
“Num bairro moderno”

E rota, pequenina, azafamada, Mudança de foco – o sujeito e a vendedeira –


Notei de costas uma rapariga, senLmento de simpaLa e solidariedade
Que no xadrez marmóreo duma escada,
Como um retalho da horta aglomerada Caracterização da rapariga •  A presença
Pousara, ajoelhando, a sua giga. feminina contrasta
Arrogância lpica dos com a descrição do
burgueses do bairro bairro;
E eu, apesar do sol, examinei-a.
•  Proveniente do
Pôs-se de pé, ressoam-lhe os tamancos; campo, é pobre,
E abre-se-lhe o algodão azul da meia, trabalhadora.
Se ela se curva, esguelhada, feia,
E pendurando os seus bracinhos brancos. Criado e vendedeira = oposição
Representante daqueles que serve:
Do patamar responde-lhe um criado: •  ALtude de profundo desprezo em relação à
"Se te convém, despacha; não converses. vendedeira;
Eu não dou mais.” E muito descansado, •  Arrogância com que fala com ela;
•  Paga pouco pelos produtos;
ALra um cobre lívido, oxidado,
•  Representa a relação cidade/campo.
Que vem bater nas faces duns alperces.
A cidade domina e humilha o campo, explorando
ALtude arrogante e que vai despoletar os que daí provêm.
uma reação no sujeito
“Num bairro moderno”
Subitamente - que visão de arLsta! - As azeitonas, que nos dão o azeite,
Se eu transformasse os simples vegetais, Negras e unidas, entre verdes folhos,
À luz do Sol, o intenso colorista, São tranças dum cabelo que se ajeite;
Num ser humano que se mova e exista E os nabos - ossos nus, da cor do leite,
Cheio de belas proporções carnais?! E os cachos de uvas - os rosários de olhos.

Bóiam aromas, fumos de cozinha; Há colos, ombros, bocas, um semblante
Com o cabaz às costas, e vergando, Nas posições de certos frutos. E entre
Sobem padeiros, claros de farinha; As hortaliças, túmido, fragrante,
E às portas, uma ou outra campainha Como alguém que tudo aquilo jante,
Toca, frenéLca, de vez em quando. Surge um melão, que lembrou um ventre.

E eu recompunha, por anatomia, E, como um feto, enfim, que se dilate,
Um novo corpo orgânico, ao bocados. Vi nos legumes carnes tentadoras,
Achava os tons e as formas. Descobria Sangue na ginja vívida, escarlate,
Uma cabeça numa melancia, Bons corações pulsando no tomate
E nuns repolhos seios injetados. E dedos hirtos, rubros, nas cenouras.

Transfiguração do real – visão de arLsta – transforma as hortaliças e frutos num corpo humano

Toda esta transfigfuração do real, despoletada pelo “cobre […] que vem bater nas faces duns
alperces”, pretende mostrar a ferLlidade do campo, a sua vitalidade e beleza, que contrasta com a
conotação negaLva que é atribuída ao espaço citadino – lugar de arLficialidade, de doença(“tonturas
de uma apoplexia”), de humilhação e de exploração.
“Num Bairro Moderno” - Transfiguração do real

Pela introdução do Campo na Cidade

“Subitamente – que visão de arLsta! -


“Se eu transformasse os simples vegetais,
[…]
Num ser humano que [se mova e exista
Cheio de belas proporções carnais?!”

Conteúdo da giga Visão surrealista

Melancia cabeça
Repolhos seios
Azeitonas negras tranças
“um retalho Nabos ossos “um novo
de horta Cachos de uva olhos corpo orgânico,
aglomerada” Melão ventre aos bocados”.
Legumes carnes
Ginja sangue
Cenouras dedos
“Num bairro moderno”
O Sol dourava o céu. E a regateira, Pedido de E enquanto sigo para o lado oposto,
Como vendera a sua fresca alface ajuda da E ao longe rodam umas carruagens,
E dera o ramo de hortelã que cheira, rapariga A pobre, afasta-se, ao calor de agosto,
Voltando-se, gritou-me, prazenteira: Descolorida nas maçãs do rosto,
"Não passa mais ninguém!... Se me ajudasse?!..." E sem quadris na saia de ramagens.

Eu acerquei-me dela, sem desprezo; Um pequerrucho rega a trepadeira
Reação do
E, pelas duas asas a quebrar, Duma janela azul; e, com o ralo
sujeito –
Nós levantamos todo aquele peso Do regador, parece que joeira
confirmação
Que ao chão de pedra resisLa preso, Ou que borrifa estrelas; e a poeira
do senLmento
Com um enorme esforço muscular. Que eleva nuvens alvas a incensá-lo.
de simpaLa

"Muito obrigada! Deus lhe dê saúde!" Chegam do gigo emanações sadias,
E recebi, naquela despedida, O sujeito Ouço um canário - que infanLl chilrada!
As forças, a alegria, a plenitude, recebeu vida Lidam ménages entre as gelosias,
Que brotam dum excesso de virtude da rapariga, já E o sol estende, pelas frontarias,
Ou duma digestão desconhecida. que ela tem a Seus raios de laranja desLlada.
energia do
campo
Hipérbole Caracterização da rapariga

O Sujeito volta a observar a realidade que o circunda


“Num bairro moderno”

E pitoresca e audaz, na sua chita, O sujeito fixa-se, novamente, na


O peito erguido, os pulsos nas ilhargas,
vendedeira
Duma desgraça alegre que me incita,
Ela apregoa, magra, enfezadita,
As suas couves repolhudas, largas. Contraste entre a vitalidade dos
produtos transportados por ela
E, como as grossas pernas dum gigante, e a sua própria fragilidade
Sem tronco, mas atléLcas, inteiras,
Carregam sobre a pobre caminhante,
Sobre a verdura rúsLca, abundante, Caracterização da rapariga:
Duas frugais abóboras carneiras. •  Apesar de “enfezadita”,
irradia luz e energia
Uso expressivo do diminuLvo (usado
anteriormente em “pequenina” e “bracinhos”) –
realça a fragilidade •sica da rapariga (que se Anltese
opõe à sua força psicológica) e aproxima-se
afeLvamente dela, manifestando o seu carinhyo
e solidariedade
O Imaginário épico em “O senKmento de um ocidental”

Poema longo
•  ConsLtuído por 44 quadras, divididas em quatro partes (de onze estrofes cada).
•  Versos alexandrinos (com doze sílabas métricas) e decassilábicos (com dez sílabas métricas) no
início de cada estrofe.

Tris/te/ ci/da/de! Eu/ te/mo/ que/ me a/vi[ves]


→ Decassílabo

U/ma/ pai/xão/ de/fun/ta! Aos/ lam/pi/ões/ dis/tan[tes]
→ Alexandrino

Estruturação do poema

•  Poema com uma estrutura narraLva:


ü  Progressão narraLva na noite, encadeada pelas quatro partes (Ave-Marias g Noite
Fechada g Ao Gás g Horas Mortas);
ü  Relato de pequenos episódios; rapidez da narraLva; inesperado da aventura.

h•ps://www.youtube.com/watch?v=DQ8R1xvtw1Y
“O senKmento de um ocidental”
“O sentimento de um ocidental”
Momento do dia Expressões textuais indicadoras Expressividade do subtítulo
I Final da tarde, anoitecer “ao anoitecer” (v.1) O subtítulo anuncia a hora da oração vespertina, remetendo
Avé para o final do dia.
Marias
II Início da noite “ao acender das luzes” (v.50) O subtítulo situa o passeio do eu-narrador na “noite fechada”,
Noite momento em que é necessário recorrer à iluminação artificial.
fechada
III Noite “A noite pesa, esmaga” (v.89) O subtítulo destaca a observação feita com a ajuda do “gás”
Ao gás dos candeeiros, uma vez que a noite vai adiantada e, por
isso, está muito escuro.
IV Madrugada “lágrimas de luz dos astros” (v.135) O subtítulo remete para as “horas mortas” da cidade, ou seja,
Horas e os momentos em que vai perdendo o movimento e a agitação.
mortas “às escuras” (v.138)

“O senKmento de um ocidental” – Avé Marias
E evoco, então, as crónicas navais:
Nas nossas ruas, ao anoitecer, Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
Há tal soturnidade, há tal melancolia, Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!
O céu parece baixo e de neblina, De um couraçado inglês vogam os escaleres;
O gás extravasado enjoa-me, perturba; E em terra num Lnir de louças e talheres
E os edi•cios, com as chaminés, e a turba Flamejam, ao jantar alguns hotéis da moda.
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Num trem de praça arengam dois denKstas;
Batem carros de aluguer, ao fundo, Um trôpego arlequim braceja numas andas;
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes! Os querubins do lar flutuam nas varandas;
Ocorrem-me em revista, exposições, países: Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!
Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Semelham-se a gaiolas, com viveiros, Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;
As edificações somente emadeiradas: E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Como morcegos, ao cair das badaladas, Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.
Vêm sacudindo as ancas opulentas!
Voltam os calafates, aos magotes, Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos; E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos, Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
Descalças! Nas descargas de carvão,
Deambulação e Deambulação e Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
observação observação E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
do “eu”: espaço do “eu”: figuras humanas E o peixe podre gera os focos de infecção!
“O senKmento de um ocidental” – Avé Marias
E evoco, então, as crónicas navais:
Nas nossas ruas, ao anoitecer, Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
Há tal soturnidade, há tal melancolia, Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!
O céu parece baixo e de neblina, De um couraçado inglês vogam os escaleres;
O gás extravasado enjoa-me, perturba; E em terra num Knir de louças e talheres
E os edircios, com as chaminés, e a turba Flamejam, ao jantar alguns hotéis da moda.
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Num trem de praça arengam dois denKstas;
Batem carros de aluguer, ao fundo, Um trôpego arlequim braceja numas andas;
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes! Os querubins do lar flutuam nas varandas;
Ocorrem-me em revista, exposições, países: Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!
Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Semelham-se a gaiolas, com viveiros, Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;
As edificações somente emadeiradas: E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Como morcegos, ao cair das badaladas, Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.
Vêm sacudindo as ancas opulentas!
Voltam os calafates, aos magotes, Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos; E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos, Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
Descalças! Nas descargas de carvão,
Descrição de cariz Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
sensorial E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
E o peixe podre gera os focos de infecção!
“O senKmento de um ocidental” – Avé Marias
E evoco, então, as crónicas navais:
Nas nossas ruas, ao anoitecer, Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
Há tal soturnidade, há tal melancolia, Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!
O céu parece baixo e de neblina, De um couraçado inglês vogam os escaleres;
O gás extravasado enjoa-me, perturba; E em terra num Lnir de louças e talheres
E os edi•cios, com as chaminés, e a turba Flamejam, ao jantar alguns hotéis da moda.
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Num trem de praça arengam dois denLstas;
Batem carros de aluguer, ao fundo, Um trôpego arlequim braceja numas andas;
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes! Os querubins do lar flutuam nas varandas;
Ocorrem-me em revista, exposições, países: Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!
Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Semelham-se a gaiolas, com viveiros, Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;
As edificações somente emadeiradas: E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Como morcegos, ao cair das badaladas, Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.
Vêm sacudindo as ancas opulentas!
Voltam os calafates, aos magotes, Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos; E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos, Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
Descalças! Nas descargas de carvão,
SenLmentos do Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
sujeito poéLco E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
E o peixe podre gera os focos de infecção!
“O senKmento de um ocidental” – Avé Marias
E evoco, então, as crónicas navais:
Nas nossas ruas, ao anoitecer, Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
Há tal soturnidade, há tal melancolia, Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!
O céu parece baixo e de neblina, De um couraçado inglês vogam os escaleres;
O gás extravasado enjoa-me, perturba; E em terra num Lnir de louças e talheres
E os edi•cios, com as chaminés, e a turba Flamejam, ao jantar alguns hotéis da moda.
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Num trem de praça arengam dois denLstas;
Batem carros de aluguer, ao fundo, Um trôpego arlequim braceja numas andas;
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes! Os querubins do lar flutuam nas varandas;
Ocorrem-me em revista, exposições, países: Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!
Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Semelham-se a gaiolas, com viveiros, Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;
As edificações somente emadeiradas: E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Como morcegos, ao cair das badaladas, Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.
Vêm sacudindo as ancas opulentas!
Voltam os calafates, aos magotes, Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos; E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos, Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
Descalças! Nas descargas de carvão,
Sugestão de Sugestão de Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
evasão: no espaço evasão: no tempo E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
E o peixe podre gera os focos de infecção!
“O senKmento de um ocidental” – Avé Marias
E evoco, então, as crónicas navais:
O passado de Lisboa (época dos
Nas nossas ruas, ao anoitecer, Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
heróis, das Descobertas, de Camões),
Há tal soturnidade, há tal melancolia, Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
que foi heroico e grandioso, Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
estabelece um contraste com o
E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!
presente, que é decadente e
O céu parece baixo e de neblina, De um couraçado inglês vogam os escaleres;
angusLante.
O gás extravasado enjoa-me, perturba; E em terra num Lnir de louças e talheres
E os edi•cios, com as chaminés, e a turba Flamejam, ao jantar alguns hotéis da moda.
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Num trem de praça arengam dois denLstas;
Batem carros de aluguer, ao fundo, Um trôpego arlequim braceja numas andas;
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes! Os querubins do lar flutuam nas varandas;
Ocorrem-me em revista, exposições, países: Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!
Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Semelham-se a gaiolas, com viveiros, Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;
As edificações somente emadeiradas: E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Como morcegos, ao cair das badaladas, Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.
Vêm sacudindo as ancas opulentas!
Voltam os calafates, aos magotes, Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos; E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos, Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
Descalças! Nas descargas de carvão,
Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
E o peixe podre gera os focos de infecção!
“O senKmento de um ocidental” – Noite fechada
Toca-se às grades, nas cadeias. Som Mas, num recinto público e vulgar,
Que morLfica e deixa umas loucuras mansas! Com bancos de namoro e exíguas pimenteiras,
O aljube, em que hoje estão velhinhas e crianças, Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,
Bem raramente encerra uma mulher de <<dom>>! Um épico doutrora ascende, num pilar!

E eu desconfio, até, de um aneurisma E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,
Tão mórbido me sinto, ao acender das luzes; Nesta acumulação de corpos enfezados;
À vista das prisões, da velha Sé, das cruzes, Sombrios e espectrais recolhem os soldados;
Chora-me o coração que se enche e que se abisma. Inflama-se um palácio em face de um casebre.

A espaços, iluminam-se os andares, Partem patrulhas de cavalaria
E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos Dos arcos dos quartéis que foram já conventos:
Alastram em lençol os seus reflexos brancos; Idade Média! A pé, outras, a passos lentos,
E a Lua lembra o circo e os jogos malabares. Derramam-se por toda a capital, que esfria.

Duas igrejas, num saudoso largo, Triste cidade! Eu temo que me avives
Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero: Uma paixão defunta! Aos lampiões distantes,
Nelas esfumo um ermo inquisidor severo, Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,
Assim que pela História eu me aventuro e alargo. Curvadas a sorrir às montras dos ourives.

Na parte que abateu no terramoto, E mais: as costureiras, as floristas
Muram-me as construções rectas, iguais, crescidas; Descem dos magasins, causam-me sobressaltos;
Afrontam-me, no resto, as íngremes subidas, Custa-lhes a elevar os seus pescoços altos
E os sinos dum tanger monásLco e devoto. E muitas delas são comparsas ou coristas.

E eu, de luneta de uma lente só,
Deambulação e Deambulação e Eu acho sempre assunto a quadros revoltados:
observação observação Entro na brasserie; às mesas de emigrados,
do “eu”: espaço do “eu”: figuras humanas Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.
“O senKmento de um ocidental” – Noite fechada
Toca-se às grades, nas cadeias. Som Mas, num recinto público e vulgar,
Que morKfica e deixa umas loucuras mansas! Com bancos de namoro e exíguas pimenteiras,
O aljube, em que hoje estão velhinhas e crianças, Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,
Bem raramente encerra uma mulher de <<dom>>! Um épico doutrora ascende, num pilar!

E eu desconfio, até, de um aneurisma E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,
Tão mórbido me sinto, ao acender das luzes; Nesta acumulação de corpos enfezados;
À vista das prisões, da velha Sé, das cruzes, Sombrios e espectrais recolhem os soldados;
Chora-me o coração que se enche e que se abisma. Inflama-se um palácio em face de um casebre.

A espaços, iluminam-se os andares, Partem patrulhas de cavalaria
E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos Dos arcos dos quartéis que foram já conventos:
Alastram em lençol os seus reflexos brancos; Idade Média! A pé, outras, a passos lentos,
E a Lua lembra o circo e os jogos malabares. Derramam-se por toda a capital, que esfria.

Duas igrejas, num saudoso largo, Triste cidade! Eu temo que me avives
Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero: Uma paixão defunta! Aos lampiões distantes,
Nelas esfumo um ermo inquisidor severo, Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,
Assim que pela História eu me aventuro e alargo. Curvadas a sorrir às montras dos ourives.

Na parte que abateu no terremoto, E mais: as costureiras, as floristas
Muram-me as construções rectas, iguais, crescidas; Descem dos magasins, causam-me sobressaltos;
Afrontam-me, no resto, as íngremes subidas, Custa-lhes a elevar os seus pescoços altos
E os sinos dum tanger monásKco e devoto. E muitas delas são comparsas ou coristas.

E eu, de luneta de uma lente só,
Descrição de cariz Eu acho sempre assunto a quadros revoltados:
sensorial Entro na brasserie; às mesas de emigrados,
Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.
“O senKmento de um ocidental” – Noite fechada
Toca-se às grades, nas cadeias. Som Mas, num recinto público e vulgar,
Que morKfica e deixa umas loucuras mansas! Com bancos de namoro e exíguas pimenteiras,
O aljube, em que hoje estão velhinhas e crianças, Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,
Bem raramente encerra uma mulher de <<dom>>! Um épico doutrora ascende, num pilar!

E eu desconfio, até, de um aneurisma E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,
Tão mórbido me sinto, ao acender das luzes; Nesta acumulação de corpos enfezados;
À vista das prisões, da velha Sé, das cruzes, Sombrios e espectrais recolhem os soldados;
Chora-me o coração que se enche e que se abisma. Inflama-se um palácio em face de um casebre.

A espaços, iluminam-se os andares, Partem patrulhas de cavalaria
E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos Dos arcos dos quartéis que foram já conventos:
Alastram em lençol os seus reflexos brancos; Idade Média! A pé, outras, a passos lentos,
E a Lua lembra o circo e os jogos malabares. Derramam-se por toda a capital, que esfria.

Duas igrejas, num saudoso largo, Triste cidade! Eu temo que me avives
Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero: Uma paixão defunta! Aos lampiões distantes,
Nelas esfumo um ermo inquisidor severo, Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,
Assim que pela História eu me aventuro e alargo. Curvadas a sorrir às montras dos ourives.

Na parte que abateu no terremoto, E mais: as costureiras, as floristas
Muram-me as construções rectas, iguais, crescidas; Descem dos magasins, causam-me sobressaltos;
Afrontam-me, no resto, as íngremes subidas, Custa-lhes a elevar os seus pescoços altos
E os sinos dum tanger monásLco e devoto. E muitas delas são comparsas ou coristas.

E eu, de luneta de uma lente só,
SenLmentos do Eu acho sempre assunto a quadros revoltados:
sujeito poéLco Entro na brasserie; às mesas de emigrados,
Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.
“O senKmento de um ocidental” – Noite fechada
Toca-se às grades, nas cadeias. Som Mas, num recinto público e vulgar,
Que morLfica e deixa umas loucuras mansas! Com bancos de namoro e exíguas pimenteiras,
O aljube, em que hoje estão velhinhas e crianças, Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,
Bem raramente encerra uma mulher de <<dom>>! Um épico doutrora ascende, num pilar!

E eu desconfio, até, de um aneurisma E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,
Tão mórbido me sinto, ao acender das luzes; Nesta acumulação de corpos enfezados;
À vista das prisões, da velha Sé, das cruzes, Sombrios e espectrais recolhem os soldados;
Chora-me o coração que se enche e que se abisma. Inflama-se um palácio em face de um casebre.

A espaços, iluminam-se os andares, Partem patrulhas de cavalaria
E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos Dos arcos dos quartéis que foram já conventos:
Alastram em lençol os seus reflexos brancos; Idade Média! A pé, outras, a passos lentos,
E a Lua lembra o circo e os jogos malabares. Derramam-se por toda a capital, que esfria.

Duas igrejas, num saudoso largo, Triste cidade! Eu temo que me avives
Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero: Uma paixão defunta! Aos lampiões distantes,
Nelas esfumo um ermo inquisidor severo, Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,
Assim que pela História eu me aventuro e alargo. Curvadas a sorrir às montras dos ourives.

Na parte que abateu no terremoto, E mais: as costureiras, as floristas
Muram-me as construções rectas, iguais, crescidas; Descem dos magasins, causam-me sobressaltos;
Afrontam-me, no resto, as íngremes subidas, Custa-lhes a elevar os seus pescoços altos
E os sinos dum tanger monásLco e devoto. E muitas delas são comparsas ou coristas.

E eu, de luneta de uma lente só,
Sugestão de Sugestão de Eu acho sempre assunto a quadros revoltados:
evasão: no espaço evasão: no tempo Entro na brasserie; às mesas de emigrados,
Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.
“O senKmento de um ocidental” – Noite fechada
Toca-se às grades, nas cadeias. Som Mas, num recinto público e vulgar,
Que morLfica e deixa umas loucuras mansas! Com bancos de namoro e exíguas pimenteiras,
O aljube, em que hoje estão velhinhas e crianças, Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,
Bem raramente encerra uma mulher de <<dom>>! Um épico doutrora ascende, num pilar!

E eu desconfio, até, de um aneurisma E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,
Tão mórbido me sinto, ao acender das luzes; Nesta acumulação de corpos enfezados;
À vista das prisões, da velha Sé, das cruzes, Sombrios e espectrais recolhem os soldados;
Por um lado, há a referência
Chora-me o coração que se enche e que se abisma. Inflama-se um palácio em face de um casebre.
à prisão literal do Aljube, por
A espaços, iluminam-se os andares, Partem patrulhas de cavalaria
outro, existe a metáfora
E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos Dos arcos dos quartéis que foram já conventos:
usada para representar o
Alastram em lençol os seus reflexos brancos; Idade Média! A pé, outras, a passos lentos,
Desigualdades sociais na cidade –
Derramam-se por toda a capital, que esfria.
senLmento de claustrofobia
E a Lua lembra o circo e os jogos malabares.
um palácio e um casebre (riqueza
na cidade – “Muram-me as
Duas igrejas, num saudoso largo, Triste cidade! Eu temo que me avives
e pobreza) coexistem lado a lado.
construções”
Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero: Uma paixão defunta! Aos lampiões distantes,
Nelas esfumo um ermo inquisidor severo, Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,
Assim que pela História eu me aventuro e alargo. Curvadas a sorrir às montras dos ourives.

Na parte que abateu no terremoto, E mais: as costureiras, as floristas
Muram-me as construções rectas, iguais, crescidas; Descem dos magasins, causam-me sobressaltos;
Afrontam-me, no resto, as íngremes subidas, Custa-lhes a elevar os seus pescoços altos
E os sinos dum tanger monásLco e devoto. E muitas delas são comparsas ou coristas.

E eu, de luneta de uma lente só,
Eu acho sempre assunto a quadros revoltados:
Entro na brasserie; às mesas de emigrados,
Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.
“O senKmento de um ocidental” – Ao gás
Longas descidas! Não poder pintar
E saio. A noite pesa, esmaga. Nos
Com versos magistrais, salubres e sinceros,
Passeios de lajedo arrastam-se as impuras.
A esguia difusão dos vossos reverberos,
Ó moles hospitais! Sai das embocaduras
E a vossa palidez românLca e lunar!
Um sopro que arripia os ombros quase nus.


Que grande cobra, a lúbrica pessoa,
Cercam-me as lojas, tépidas. Eu penso
Que esparLlhada escolhe uns xales com debuxo!
Ver círios laterais, ver filas de capelas,
Sua excelência atrai, magnéLca, entre luxo,
Com santos e fiéis, andores, ramos, velas,
Que ao longo dos balcões de mogno se amontoa.
Em uma catedral de um comprimento imenso.


E aquela velha, de bandós! Por vezes,
As burguesinhas do Catolicismo
A sua traine imita um leque anLgo, aberto,
Resvalam pelo chão minado pelos canos;
Nas barras verLcais, a duas Lntas. Perto,
E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,
Escarvam, à vitória, os seus mecklemburgueses.
As freiras que os jejuns matavam de histerismo.


Desdobram-se tecidos estrangeiros;
Num cuKleiro, de avental, ao torno,
Plantas ornamentais secam nos mostradores;
Um forjador maneja um malho, rubramente;
Flocos de pós-de-arroz pairam sufocadores,
E de uma padaria exala-se, inda quente,
E em nuvens de ceLns requebram-se os caixeiros.
Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.


Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes
E eu que medito um livro que exacerbe,
Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco;
Quisera que o real e a análise mo dessem;
Da solidão regouga um cauteleiro rouco;
Casas de confecções e modas resplandecem;
Tornam-se mausoléus as armações fulgentes.
Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe.

<<Dó da miséria!... Compaixão de mim!...>>
Deambulação e Deambulação e E, nas esquinas, calvo, eterno, sem repouso,
observação observação Pede-me esmola um homenzinho idoso,
do “eu”: espaço do “eu”: figuras humanas Meu velho professor nas aulas de LaLm!
“O senKmento de um ocidental” – Ao gás
Longas descidas! Não poder pintar
E saio. A noite pesa, esmaga. Nos
Com versos magistrais, salubres e sinceros,
Passeios de lajedo arrastam-se as impuras.
A esguia difusão dos vossos reverberos,
Ó moles hospitais! Sai das embocaduras
E a vossa palidez românKca e lunar!
Um sopro que arripia os ombros quase nus.


Que grande cobra, a lúbrica pessoa,
Cercam-me as lojas, tépidas. Eu penso
Que esparLlhada escolhe uns xales com debuxo!
Ver círios laterais, ver filas de capelas,
Sua excelência atrai, magnéLca, entre luxo,
Com santos e fiéis, andores, ramos, velas,
Que ao longo dos balcões de mogno se amontoa.
Em uma catedral de um comprimento imenso.


E aquela velha, de bandós! Por vezes,
As burguesinhas do Catolicismo
A sua trai^ne imita um leque anLgo, aberto,
Resvalam pelo chão minado pelos canos;
Nas barras verLcais, a duas Lntas. Perto,
E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,
Escarvam, à vitória, os seus mecklemburgueses.
As freiras que os jejuns matavam de histerismo.


Desdobram-se tecidos estrangeiros;
Num cuKleiro, de avental, ao torno,
Plantas ornamentais secam nos mostradores;
Um forjador maneja um malho, rubramente;
Flocos de pós-de-arroz pairam sufocadores,
E de uma padaria exala-se, inda quente,
E em nuvens de ceKns requebram-se os caixeiros.
Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.


Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes
E eu que medito um livro que exacerbe,
Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco;
Quisera que o real e a análise mo dessem;
Da solidão regouga um cauteleiro rouco;
Casas de confecções e modas resplandecem;
Tornam-se mausoléus as armações fulgentes.
Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe.

<<Dó da miséria!... Compaixão de mim!...>>
Descrição de cariz E, nas esquinas, calvo, eterno, sem repouso,
Pede-me esmola um homenzinho idoso,
sensorial
Meu velho professor nas aulas de LaLm!
“O senKmento de um ocidental” – Ao gás
Longas descidas! Não poder pintar
E saio. A noite pesa, esmaga. Nos
Com versos magistrais, salubres e sinceros,
Passeios de lajedo arrastam-se as impuras.
A esguia difusão dos vossos reverberos,
Ó moles hospitais! Sai das embocaduras
E a vossa palidez românLca e lunar!
Um sopro que arripia os ombros quase nus.


Que grande cobra, a lúbrica pessoa,
Cercam-me as lojas, tépidas. Eu penso
Que esparLlhada escolhe uns xales com debuxo!
Ver círios laterais, ver filas de capelas,
Sua excelência atrai, magnéLca, entre luxo,
Com santos e fiéis, andores, ramos, velas,
Que ao longo dos balcões de mogno se amontoa.
Em uma catedral de um comprimento imenso.


E aquela velha, de bandós! Por vezes,
As burguesinhas do Catolicismo
A sua trai^ne imita um leque anLgo, aberto,
Resvalam pelo chão minado pelos canos;
Nas barras verLcais, a duas Lntas. Perto,
E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,
Escarvam, à vitória, os seus mecklemburgueses.
As freiras que os jejuns matavam de histerismo.


Desdobram-se tecidos estrangeiros;
Num cuLleiro, de avental, ao torno,
Plantas ornamentais secam nos mostradores;
Um forjador maneja um malho, rubramente;
Flocos de pós-de-arroz pairam sufocadores,
E de uma padaria exala-se, inda quente,
E em nuvens de ceLns requebram-se os caixeiros.
Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.


Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes
E eu que medito um livro que exacerbe,
Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco;
Quisera que o real e a análise mo dessem;
Da solidão regouga um cauteleiro rouco;
Casas de confecções e modas resplandecem;
Tornam-se mausoléus as armações fulgentes.
Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe.

<<Dó da miséria!... Compaixão de mim!...>>
SenLmentos do E, nas esquinas, calvo, eterno, sem repouso,
Pede-me esmola um homenzinho idoso,
sujeito poéLco
Meu velho professor nas aulas de LaLm!
“O senKmento de um ocidental” – Ao gás
Longas descidas! Não poder pintar
E saio. A noite pesa, esmaga. Nos
Com versos magistrais, salubres e sinceros,
Passeios de lajedo arrastam-se as impuras.
A esguia difusão dos vossos reverberos,
Ó moles hospitais! Sai das embocaduras
E a vossa palidez românLca e lunar!
Um sopro que arripia os ombros quase nus.


Que grande cobra, a lúbrica pessoa,
Cercam-me as lojas, tépidas. Eu penso
Que esparLlhada escolhe uns xales com debuxo!
Ver círios laterais, ver filas de capelas,
Sua excelência atrai, magnéLca, entre luxo,
Com santos e fiéis, andores, ramos, velas,
Que ao longo dos balcões de mogno se amontoa.
Em uma catedral de um comprimento imenso.


E aquela velha, de bandós! Por vezes,
As burguesinhas do Catolicismo
A sua trai^ne imita um leque anLgo, aberto,
Resvalam pelo chão minado pelos canos;
Nas barras verLcais, a duas Lntas. Perto,
E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,
Escarvam, à vitória, os seus mecklemburgueses.
As freiras que os jejuns matavam de histerismo.


Desdobram-se tecidos estrangeiros;
Num cuLleiro, de avental, ao torno,
Plantas ornamentais secam nos mostradores;
Um forjador maneja um malho, rubramente;
Flocos de pós-de-arroz pairam sufocadores,
E de uma padaria exala-se, inda quente,
E em nuvens de ceLns requebram-se os caixeiros.
Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.


Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes
E eu que medito um livro que exacerbe,
Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco;
Quisera que o real e a análise mo dessem;
Da solidão regouga um cauteleiro rouco;
Casas de confecções e modas resplandecem;
Tornam-se mausoléus as armações fulgentes.
Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe.

<<Dó da miséria!... Compaixão de mim!...>>
Sugestão de Sugestão de E, nas esquinas, calvo, eterno, sem repouso,
Pede-me esmola um homenzinho idoso,
evasão: no espaço evasão: no tempo
Meu velho professor nas aulas de LaLm!
“O senKmento de um ocidental” – Ao gás
Longas descidas! Não poder pintar
E saio. A noite pesa, esmaga. Nos Apóstrofe e metáfora que representa a enfermidade
Com versos magistrais, salubres e sinceros,
Passeios de lajedo arrastam-se as impuras.
Ó moles hospitais! Sai das embocaduras
e a falta de vitalidade daqueles que estão
A esguia difusão dos vossos reverberos,
E a vossa palidez românLca e lunar!
internados nos hospitais. Metonimicamente, o
Um sopro que arripia os ombros quase nus.

hospital representa a cidade – doente e com falta de
Que grande cobra, a lúbrica pessoa,

Cercam-me as lojas, tépidas. Eu penso vitalidade
Que esparLlhada escolhe uns xales com debuxo!
Ver círios laterais, ver filas de capelas,
Sua excelência atrai, magnéLca, entre luxo,
Com santos e fiéis, andores, ramos, velas,
Que ao longo dos balcões de mogno se amontoa.
Em uma catedral de um comprimento imenso.


E aquela velha, de bandós! Por vezes,
As burguesinhas do Catolicismo
A sua traine imita um leque anLgo, aberto,
Resvalam pelo chão minado pelos canos; Para mostrar a doença da cidade alude-se:
Nas barras verLcais, a duas Lntas. Perto,
E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,
Escarvam, à vitória, os seus mecklemburgueses.
•  aos “hospitais” – doença fisiológica;
As freiras que os jejuns matavam de histerismo.

•  às “impuras”/prosLtutas - - enfermidade
Desdobram-se tecidos estrangeiros;
Num cuLleiro, de avental, ao torno,
Plantas ornamentais secam nos mostradores;
moral;
Um forjador maneja um malho, rubramente;
Flocos de pós-de-arroz pairam sufocadores,
E de uma padaria exala-se, inda quente, •  histerismo das freiras – doença
E em nuvens de ceLns requebram-se os caixeiros.
Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.

psicológica.
Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes
E eu que medito um livro que exacerbe,
Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco;
Quisera que o real e a análise mo dessem;
Da solidão regouga um cauteleiro rouco;
Casas de confecções e modas resplandecem;
Realidades que coexistem na cidade:
Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe.
Tornam-se mausoléus as armações fulgentes.

•  o comércio e a religião.
<<Dó da miséria!... Compaixão de mim!...>>
E, nas esquinas, calvo, eterno, sem repouso,
Enaltecimento do que existe de saudável e enérgico na cidade – o trabalho
Pede-me esmola um homenzinho idoso,
do forjador e do padeiro – elogio ao trabalho. Meu velho professor nas aulas de LaLm!
“O senKmento de um ocidental” – Horas mortas
Ah! Como a raça ruiva do porvir,
O tecto fundo de oxigénio, de ar, E as frotas dos avós, e os nómadas ardentes,
Estende-se ao comprido, ao meio das trapeiras; Nós vamos explorar todos os conLnentes
Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras, E pelas vasLdões aquáLcas seguir!
Enleva-me a quimera azul de transmigrar.
Mas se vivemos, os emparedados,
Por baixo, que portões! Que arruamentos! Sem árvores, no vale escuro das muralhas!...
Um parafuso cai nas lajes, às escuras: Julgo avistar, na treva, as folhas das navalhas
Colocam-se taipais, rangem as fechaduras, E os gritos de socorro ouvir, estrangulados.
E os olhos dum caleche espantam-me, sangrentos.
E nestes nebulosos corredores
E eu sigo, como as linhas de uma pauta Nauseiam-me, surgindo, os ventres das tabernas;
A dupla correnteza augusta das fachadas; Na volta, com saudade, e aos bordos sobre as pernas,
Pois sobem, no silêncio, infaustas e trinadas, Cantam, de braço dado, uns tristes bebedores.
As notas pastoris de uma longínqua flauta.
Eu não receio, todavia, os roubos;
Se eu não morresse, nunca! E eternamente Afastam-se, a distância, os dúbios caminhantes;
Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas! E sujos, sem ladrar, ósseos, febris, errantes,
Esqueço-me a prever caslssimas esposas, Amareladamente, os cães parecem lobos.
Que aninhem em mansões de vidro transparente!
E os guardas, que revistam as escadas,
Ó nossos filhoes! Que de sonhos ágeis, Caminham de lanterna e servem de chaveiros;
Pousando, vos trarão a niLdez às vidas! Por cima, as imorais, nos seus roupões ligeiros,
Eu quero as vossas mães e irmãs estremecidas, Tossem, fumando sobre a pedra das sacadas.
Numas habitações translúcidas e frágeis.
E, enorme, nesta massa irregular
Deambulação e Deambulação e De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
observação observação A Dor humana busca os amplos horizontes,
do “eu”: espaço do “eu”: figuras humanas E tem marés, de fel, como um sinistro mar!
“O senKmento de um ocidental” – Horas mortas
Ah! Como a raça ruiva do porvir,
O tecto fundo de oxigénio, de ar, E as frotas dos avós, e os nómadas ardentes,
Estende-se ao comprido, ao meio das trapeiras; Nós vamos explorar todos os conLnentes
Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras, E pelas vasLdões aquáLcas seguir!
Enleva-me a quimera azul de transmigrar.
Mas se vivemos, os emparedados,
Por baixo, que portões! Que arruamentos! Sem árvores, no vale escuro das muralhas!...
Um parafuso cai nas lajes, às escuras: Julgo avistar, na treva, as folhas das navalhas
Colocam-se taipais, rangem as fechaduras, E os gritos de socorro ouvir, estrangulados.
E os olhos dum caleche espantam-me, sangrentos.
E nestes nebulosos corredores
E eu sigo, como as linhas de uma pauta Nauseiam-me, surgindo, os ventres das tabernas;
A dupla correnteza augusta das fachadas; Na volta, com saudade, e aos bordos sobre as pernas,
Pois sobem, no silêncio, infaustas e trinadas, Cantam, de braço dado, uns tristes bebedores.
As notas pastoris de uma longínqua flauta.
Eu não receio, todavia, os roubos;
Se eu não morresse, nunca! E eternamente Afastam-se, a distância, os dúbios caminhantes;
Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas! E sujos, sem ladrar, ósseos, febris, errantes,
Esqueço-me a prever caslssimas esposas, Amareladamente, os cães parecem lobos.
Que aninhem em mansões de vidro transparente!
E os guardas, que revistam as escadas,
Ó nossos filhoes! Que de sonhos ágeis, Caminham de lanterna e servem de chaveiros;
Pousando, vos trarão a niLdez às vidas! Por cima, as imorais, nos seus roupões ligeiros,
Eu quero as vossas mães e irmãs estremecidas, Tossem, fumando sobre a pedra das sacadas.
Numas habitações translúcidas e frágeis.
E, enorme, nesta massa irregular
Descrição de cariz De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
A Dor humana busca os amplos horizontes,
sensorial
E tem marés, de fel, como um sinistro mar!
“O senKmento de um ocidental” – Horas mortas
Ah! Como a raça ruiva do porvir,
O tecto fundo de oxigénio, de ar, E as frotas dos avós, e os nómadas ardentes,
Estende-se ao comprido, ao meio das trapeiras; Nós vamos explorar todos os conLnentes
Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras, E pelas vasLdões aquáLcas seguir!
Enleva-me a quimera azul de transmigrar.
Mas se vivemos, os emparedados,
Por baixo, que portões! Que arruamentos! Sem árvores, no vale escuro das muralhas!...
Um parafuso cai nas lajes, às escuras: Julgo avistar, na treva, as folhas das navalhas
Colocam-se taipais, rangem as fechaduras, E os gritos de socorro ouvir, estrangulados.
E os olhos dum caleche espantam-me, sangrentos.
E nestes nebulosos corredores
E eu sigo, como as linhas de uma pauta Nauseiam-me, surgindo, os ventres das tabernas;
A dupla correnteza augusta das fachadas; Na volta, com saudade, e aos bordos sobre as pernas,
Pois sobem, no silêncio, infaustas e trinadas, Cantam, de braço dado, uns tristes bebedores.
As notas pastoris de uma longínqua flauta.
Eu não receio, todavia, os roubos;
Se eu não morresse, nunca! E eternamente Afastam-se, a distância, os dúbios caminhantes;
Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas! E sujos, sem ladrar, ósseos, febris, errantes,
Esqueço-me a prever caslssimas esposas, Amareladamente, os cães parecem lobos.
Que aninhem em mansões de vidro transparente!
E os guardas, que revistam as escadas,
Ó nossos filhoes! Que de sonhos ágeis, Caminham de lanterna e servem de chaveiros;
Pousando, vos trarão a niLdez às vidas! Por cima, as imorais, nos seus roupões ligeiros,
Eu quero as vossas mães e irmãs estremecidas, Tossem, fumando sobre a pedra das sacadas.
Numas habitações translúcidas e frágeis.
E, enorme, nesta massa irregular
SenLmentos do De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
A Dor humana busca os amplos horizontes,
sujeito poéLco
E tem marés, de fel, como um sinistro mar!
“O senKmento de um ocidental” – Horas mortas
Ah! Como a raça ruiva do porvir,
O tecto fundo de oxigénio, de ar, E as frotas dos avós, e os nómadas ardentes,
Estende-se ao comprido, ao meio das trapeiras; Nós vamos explorar todos os conKnentes
Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras, E pelas vasKdões aquáKcas seguir!
Enleva-me a quimera azul de transmigrar.
Mas se vivemos, os emparedados,
Por baixo, que portões! Que arruamentos! Sem árvores, no vale escuro das muralhas!...
Um parafuso cai nas lajes, às escuras: Julgo avistar, na treva, as folhas das navalhas
Colocam-se taipais, rangem as fechaduras, E os gritos de socorro ouvir, estrangulados.
E os olhos dum caleche espantam-me, sangrentos.
E nestes nebulosos corredores
E eu sigo, como as linhas de uma pauta Nauseiam-me, surgindo, os ventres das tabernas;
A dupla correnteza augusta das fachadas; Na volta, com saudade, e aos bordos sobre as pernas,
Pois sobem, no silêncio, infaustas e trinadas, Cantam, de braço dado, uns tristes bebedores.
As notas pastoris de uma longínqua flauta.
Eu não receio, todavia, os roubos;
Se eu não morresse, nunca! E eternamente Afastam-se, a distância, os dúbios caminhantes;
Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas! E sujos, sem ladrar, ósseos, febris, errantes,
Esqueço-me a prever casvssimas esposas, Amareladamente, os cães parecem lobos.
Que aninhem em mansões de vidro transparente!
E os guardas, que revistam as escadas,
Ó nossos filhoes! Que de sonhos ágeis, Caminham de lanterna e servem de chaveiros;
Pousando, vos trarão a niKdez às vidas! Por cima, as imorais, nos seus roupões ligeiros,
Eu quero as vossas mães e irmãs estremecidas, Tossem, fumando sobre a pedra das sacadas.
Numas habitações translúcidas e frágeis.
E, enorme, nesta massa irregular
Sugestão de Sugestão de De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
A Dor humana busca os amplos horizontes,
evasão: no espaço evasão: no tempo
E tem marés, de fel, como um sinistro mar!
“O senKmento de um ocidental” – Horas mortas
Ah! Como a raça ruiva do porvir,
No meio da cidade inóspita, a música
O tecto fundo de oxigénio, de ar, E as frotas dos avós, e os nómadas ardentes,
Estende-se ao comprido, ao meio das trapeiras; Nós vamos explorar todos os conLnentes
suave (“notas pastoris”) lembra que há
Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras, E pelas vasLdões aquáLcas seguir!
uma dimensão mais harmoniosa e
Enleva-me a quimera azul de transmigrar.
natural do ser humano, ligada ao campo,
Mas se vivemos, os emparedados,
Por baixo, que portões! Que arruamentos!
mas que parece estar ausente do espaço Sem árvores, no vale escuro das muralhas!...
Um parafuso cai nas lajes, às escuras: Julgo avistar, na treva, as folhas das navalhas
urbano (“longínqua flauta”).
Colocam-se taipais, rangem as fechaduras, E os gritos de socorro ouvir, estrangulados.
E os olhos dum caleche espantam-me, sangrentos.
E nestes nebulosos corredores
E eu sigo, como as linhas de uma pauta Nauseiam-me, surgindo, os ventres das tabernas;
A dupla correnteza augusta das fachadas; Na volta, com saudade, e aos bordos sobre as pernas,
Pois sobem, no silêncio, infaustas e trinadas, Cantam, de braço dado, uns tristes bebedores.
As notas pastoris de uma longínqua flauta.
Eu não receio, todavia, os roubos;
Se eu não morresse, nunca! E eternamente Afastam-se, a distância, os dúbios caminhantes;
Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas! E sujos, sem ladrar, ósseos, febris, errantes,
Esqueço-me a prever caslssimas esposas, Amareladamente, os cães parecem lobos.
Que aninhem em mansões de vidro transparente!
O homem está condenado a viver
E os guardas, que revistam as escadas,

Ó nossos filhoes! Que de sonhos ágeis, na “dor”, com dificuldade e
Caminham de lanterna e servem de chaveiros;
Pousando, vos trarão a niLdez às vidas! sofrimento.
Por cima, as imorais, nos seus roupões ligeiros,
Eu quero as vossas mães e irmãs estremecidas, Tossem, fumando sobre a pedra das sacadas.
Numas habitações translúcidas e frágeis.
E, enorme, nesta massa irregular
De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
A Dor humana busca os amplos horizontes,
E tem marés, de fel, como um sinistro mar!
O Imaginário épico em “O senKmento de um ocidental”

“O senKmento dum Ocidental” Os Lusíadas


Cesário Verde Luís de Camões
Espírito anLépico (aLtude face à Espírito épico –
Também está
realidade observada: descrença nas exaltação das
presente o espírito
capacidades humanas no capacidades
anKépico.
universo citadino). humanas.

Viagem pela cidade (representação da Viagem maríLma (epopeia dos


degradação social e moral da cidade). Descobrimentos).

Personagens anLépicas: Personagem coleLva épica: povo


Também há
•  marginais (ladrões, português (representado por Vasco da
exaltação das
bêbedos, jogadores, Gama e pelos marinheiros que com ele
personagens
prosLtutas); percorrem o caminho maríLmo para a
“épicas” (classes
•  ociosas, arLficiais Índia).
trabalhadoras).
(denLstas, arlequins,
lojistas).
O Imaginário épico em “O senKmento de um ocidental”

A homenagem insólita a Camões

A representação do reverso da epopeia camoniana

A denúncia da realidade decadente e anKépica do final do século XIX

A intertextualidade com Os Lusíadas, com intenção críKca e depreciaKva face à


atualidade da escrita do poema

O desfasamento entre a realidade desejada (o imaginário épico) e a realidade efeKva


(o real anKépico)
Temas – versos representaKvos

A representação da cidade e dos Kpos sociais


“Nas nossas ruas, ao anoitecer,”
“Voltam os calafates, aos magotes,”
“Num trem de praça arengam dois den4stas;”
“Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!”
“E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras, / Correndo com firmeza, assomam as varinas.”

NarraKva de passeios casuais


“Sem muita pressa, para o meu emprego”
O observador acidental
“Notei de costas uma rapariga,”
Deambulação e imaginação
“Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos,/Ou erro pelos cais a que se atracam botes.”
“Enleva-me a quimera azul de transmigrar.”
Temas – versos representaKvos

Perceção sensorial e transfiguração poéKca do real


“Julguei ver, com a vista de poeta, / Uma pombinha lmida e quieta / Num bando ameaçador de
corvos pretos.”
“Subitamente, – que visão de arLsta! – /Se eu transformasse os simples vegetais, /À luz do Sol, o
intenso colorista,/Num ser humano que se mova e exista /Cheio de belas proporções carnais?! ”

O imaginário épico

passado grandioso vs. presente de uma sociedade decadente e angusLante

“E evoco, então, as crónicas navais:/Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!/Luta Camões no


Sul, salvando um livro a nado!/Singram soberbas naus que eu não verei jamais!”
Linguagem, esKlo e estrutura

Conjunto de versos que, geralmente, apresenta um senLdo completo.


Estrofe
As estrofes têm designações diferentes consoante o número de versos que as
consLtuem.
Ex.: Quadra (“A débil”), quinLlha (“Cristalizações”)

Semelhança de sons que, normalmente, ocorre no final dos versos. Estamos


Rima perante rima consoante quando existe correspondência total de sons
(consonânLcos e vocálicos) a parLr da úlLma sílaba tónica. Pode ser cruzada
(ABAB), emparelhada (AABB) ou interpolada (ABBA, ABBCA).
Ex.: Triste cidade! Eu temo que me avives
Uma paixão defunta! Aos lampiões distantes, Emparelhada
Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,
Curvadas a sorrir às montras dos ourives. Interpolada

Dá-se o nome de sílaba métrica à sílaba contada no verso tal como é ouvida. Os
Metro versos têm designações diferentes consoante o número de sílabas métricas.
Ex.: Nas/ no/ssas/ ru/as,/ ao/ a/noi/te/cer → Decassílabo
Há/ tal/ so/tur/ni/da/de, há/ tal/ me/lan/co/li[a] → Alexandrino
Linguagem, esKlo e estrutura

Cesário Verde apresenta, geralmente, poemas longos, com estrofes de quatro ou cinco
versos. Recorre predominantemente ao verso alexandrino (doze sílabas métricas.

Cesário Verde capta a realidade, fixando instantâneos, selecionando adjeLvação abundante e


anteposta, recorrendo a nomes que trazem o trivial e o feio para o poema. Os seus poemas apresentam
uma estrutura narraLva, descrevendo o espaço ora real ora evocado.

A poesia cesariana recorre a uma linguagem quoLdiana e corrente que remete para a prosa,
dada a simplicidade e, por vezes, rudeza do vocabulário, como é exemplo: “via-férrea”, “varinas”,
“infeção”, “esgadelhada”, ...

Também a luz e a cor adquirem extrema importância na poesia de Cesário Verde,


assemelhando-se a uma tela impressionista.

O sujeito recorre frequentemente à enumeração, à adjeLvação expressiva, à sinestesia e a


hipálages sugesLvas.
Linguagem, esKlo e estrutura

Linguagem, esKlo e estrutura


• discurso pouco ornamentado
• vocábulos e expressões de vivência citadina “varinas”, “infeção”, “esguedelhada”
• tom coloquial “Nós acampamos, inda o sol se via”
• forte apelo visual “Foi quando tu, descendo do burrico”
• uso expressivo do adjeLvo “café devasso”
• uso expressivo do advérbio “Amareladamente, os cães parecem lobos”
• anteposição do adjeLvo “E rota, pequenina, azafamada (…) uma rapariga”
• sinestesia “brancuras quentes”
• recursos expressivos: comparação, metáfora, hipérbole
• apreciação subjeLva do real “Como é saudável ter o seu conchego,/E a sua vida fácil!”
• verso longo (decassílabo e alexandrino)
• predomínio da coordenação “Rez-de-chaussée repousam sossegados,/Abriram-se, nalguns, as
persianas,/ E dum ou doutro, em quartos estucados,/ Ou entre a rama dos papéis pintados,/
Reluzem, num almoço as porcelanas.”

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