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Hanseníase

Definição: doença infecciosa bacteriana crônica de pele e nervos periféricos (dermatoneurológicas).


Sinônimo: lepra

Agente etiológico: Mycobacterium Leprae (Bacilo de Hansen)

 Agente intracelular obrigatório


 Tropismo por células cutâneas e células do sistema nervoso:
o Sua capacidade de invasão neuronal é responsável pelo potencial incapacitante da
hanseníase
o Agride e destrói a bainha de mielina e o nervo, com consequente fibrose do nervo.
Consequentemente, as manifestações clínicas mais comuns são dor e espessamento dos
nervos periféricos.
 Multiplicação lenta: 12-16 dias
 Período de incubação: 2-7 anos (média: 5 anos). Pode incubar até 20 anos.
 Bacilo álcool-ácido resistente (BAAR), fracamente gram +, que infecta os nervos periféricos e, mais
especificamente, as células de Schwann. Faz globias (baciloscopia)
 Baixa patogenicidade (10% adoecem): o sistema imunológico consegue combater a bactéria (cura
espontânea em 90% dos casos). Doença depende da resposta celular (Th1 – cura ou paucibacilar;
Th2– multibacilar)
 Evolução da doença (sem tratamento):
o Forma indeterminada: pode evoluir para a forma tuberculoide OU forma Dimorfa ou forma
Virchowiana (sistema imunológico comprometido – não há manchas)
o Forma indeterminada = forma mais branda, pode apresentar cura espontânea ou evoluir
para os outros tipos.

Transmissão: inalatória (contato principalmente por vias aéreas superiores). Não se pega com o toque.
Com o tratamento não há transmissão!

Epidemiologia:

 Brasil: doença endêmica, 2º país do mundo com mais casos, perdendo apenas Índia
o Vitória da Conquista: endêmico para hanseníase em crianças
o Maranhão: 44,94% de detecção (maior índice)
o Bahia: 17º lugar entre os estados brasileiros e o 5º lugar entre os estados nordestinos em
incidência de casos novos
o Centro de referência de Hanseníase: VC, Salvador ...
 Atinge pessoas de todas as idades, ambos os sexos.
 Fatores de risco: baixo nível socioeconômico, aglomeração, suscetibilidade genética
 Doença de Notificação compulsória.

Avaliação de contatos: pessoas que convivem com o pct nos últimos 5 anos

 Exame dermato e neurológico (palpação de nervos – radial, ulnar, mediano, fibular e tibial)
 Acompanhar por 5 anos (1x ao ano)
 Encaminhar os contatos para vacinação BCG (acelera o aparecimento da doença, quem possui o
bacilo encubado): média de 6 meses para aparecer a doença
o Sem cicatriz de BCG: fazer 1 dose
o 1 cicatriz: faz 1 dose
o 2 cicatrizes: não faz nenhuma

Suspeita diagnóstica (OMS):

 Lesões cutâneas (hipopigmentadas ou avermelhas), com perda de sensibilidade; OU


 Envolvimento dos nervos periféricos (espessamento neural com perda de sensibilidade ou motora
e/ou autonômica); OU
 Baciloscopia e/ou anatomopatológico positivos (positivo: 10%/multibacilar >> só auxilia na
classificação)

OBS.: Diagnóstico clínico e epidemiológico!

Classificação de Madri: baseada em aspectos clínicos da doença (OMS – PAUCIBACILAR x MULTIBACILAR)

 Forma Paucibacilar (até 5 lesões e/ou 1 nervo comprometido – difícil diagnóstico, pois há menos
manifestações/ forte resposta Th1)
o Forma indeterminada (HI)
 Lesões hipocrômicas, mal delimitadas, que não coçam, não aderem, não doem, não
desaparecem; hipoanestesíca (perca apenas da sensibilidade térmica)
 Não há alteração de pelo
 Alteração das glândulas sudoríparas: mancha “ressecada”
 Geralmente única e pequena
 Baciloscopia: negativa
o Forma tuberculóide (HT):
 Lesão placar eritematosa, com bordas bem definidas e constituída de pequenos
tubérculos/pápulas
 Alteração de sensibilidade: anestésica ou hipoestesia
 Não descama, não coçam, não dói, geralmente única (acometimento de tronco
neural único)
 Faz muita neurite, neurite incapacitante em decorrência da resposta do sistema
imunológico (a que mais deixa sequela: mãe em garra, perda de força)
 Hanseníase nodular infantil (lesão no rosto): é um tipo de tuberculoide, que
acomete crianças que convivem com pcts que tem hanseníase virchowiana
 Forma multibacilar (> 5 lesões e/ou > 1 nervo comprometido)
o Forma Dimorfa (HD):
 Múltiplas lesões, lesões variadas e grandes
 Caracterizada por lesões hipocrômicas múltiplas e/ou lesões placares eritemato-
infiltradas com bordas externas imprecisas e centro hipocrômico, ditas foveolares
(mal delimitadas por fora e bem delimitadas por dentro)
 As lesões também podem ser esbranquiçadas (hanseníase dimorfa hipocromiante)
 Baciloscopia positiva (dimorfo virchowiana) ou negativa (dimorfo – dimorfo)
o Forma Virchowiana (HV):
 Facie leonina (infiltração de face); madarose (extremidade p/ o centro), infiltrado.
 Geralmente não tem mancha, mas há múltiplos nódulos / pápulas.
 Hansenoma (tem muito bacilo): orelhas, mãos, pernas
 Sinais de infiltração: dobras com poucas rugas, movimento da pele em bloco;
aspecto cutâneo de casca de laranja por infiltração e dilatação dos poros; aumento
dos lobos das orelhas.
 Baciloscopia positiva / Pode biopsiar tb que vai apresentar bacilos da Hansen

OBS.: macrófagos ricos em bacilos de Hansen são chamados células de Virchow e caracterizam a forma
virchowiana da hanseníase
Aspectos cutâneos:

 Pode acometer todos os componentes da pele


 Alteração da pigmentação: manchas esbranquiçadas (hipocrômicas), acastanhadas ou
avermelhadas (não há cor específica)
 Destruição dos anexos cutâneos: pelos (madarose, rarefação de pelos); destruição glândulas
sebáceas e sudoríparas (xerostomia)
 Perda da sensibilidade
 Febre e artralgia, associados a caroços, de aparecimento súbito
 Ressecamento e sensação de areia nos olhos

Aspectos neurológicos:

 Distúrbios subjetivos:
o Parestesias (sensações anormais) ou disestesias: queimação, ferroadas, choques,
formigamentos. Mais intensa à noite e ao frio
o Dores nevrálgicas: neurite (quadro reacional)
 Distúrbios Objetivos:
o Alteração se sensibilidade superficial
o 1º sensibilidade a perder: térmica, depois dolorosa e tátil.
 Sensibilidade central é perdida primeiro.
 Teste de sensibilidade térmica: tubos de ensaios com água aquecida e fria ou
instrumento metálico gelado e aquecido. Tempo de permanência com o objetivo
na pele é o tempo de dizer “1001”
 Teste de sensibilidade dolorosa: utiliza-se objeto pontiagudo
 Teste de sensibilidade tátil: estesiômetro; mecha de algodão, papel dobrado, fio
dental
 Alterações motoras: decorrente da paralisia do nervo, gerando amiotrofia, diminuição ou perda da
força muscular
 Alopecia (madarose): destruição do nervo que estimula o musculo eretor do pelo, causa
enfraquecimento do pelo.
 Ictiose: destruição dos nervos simpáticos responsáveis pela sudorese (glândulas sudoríparas), causa
uma desidratação da epiderme. Ausência de suor.

OBS.: Hanseníase Neural Primária = PRESENÇA de um déficit neurológico e espessamento neural (com o
sem sensibilidade) na AUSÊNCIA de lesão cutânea. >> PAUCIBACILAR (baciloscopia negativa)

 Nervos acometidos:
o Facial: fechar os olhos (lagoftalmia: leva ao ressecamento do olho); elevar as sobrancelhas,
buscando assimetria;
o Trigêmeo: aplicar fio dental sobre o quadrante inferior externo da íris observando o reflexo
de piscar (ocorre de maneira lenta ou está ausente na hanseníase)
o Auricular: pode estar espessado
o Palpação: Radial, ulnar, mediano, tibial posterior e fibular comum
 Buscar: espessamento, choque, dor e assimetria
OSB.: As manifestações da hanseníase se caracterizam pela constatação de áreas de hipoestesias e/ou
anestesias circunscritas por áreas normoestésicas, estabelecendo um padrão quase que exclusivo da
hanseníase pelo acometimento neural intradérmico ramuscular inicialmente.

Manejo:

 Notificação compulsória
 Solicitar baciloscopia ou raspado dérmico: exame negativo não exclui diagnóstico clínico
 Solicitar exames complementares (HMG e perfil hepático)
 Realizar avaliação neurológica simplificada e grau de incapacidade: avaliar a cada 3 meses até a alta
por cura
 Tratar

Exames complementares:

 Baciloscopia (raspado dérmico) e/ou histopatologia


 Fotografia digital/autocontraste: melhor para visualizar as lesões
 Teste da Histamina: pinga-se uma gota de fosfato de histamina 1,5% sobre a área suspeita e outra
na região normal mais distante. Em seguida, faz-se uma leve puntura nos locais e observa-se os
sinais
o 1º: sinal da puntura – eritema circunscrito
o 2º: eritema reflexo secundário (30-60 seg): ausente na área com sensibilidade alterada
(devido a alteração autonômica)
o 3º: pápula edematosa lenticular no local da puntura (3-3min): presente em ambas as áreas
 Teste do IODO-AMIGO (Reação de Lugol): resultado se firma pela ausência e/ou diminuição de
coloração azulada na área suspeita (iodo negativa) como se apresenta na periferia com sudorese
normal (iodo positiva)  avalia função autonômica SIMPÁTICA responsável pela sudorese.

TTO padronizado: SUS gratuito, associação de drogas (poliquimioterapia – PQT)

 Dapsona e Rifampicina – paucibacilar (6 meses/ até 9 meses) – ADULTO (criança = metade da dose)
 Dapsona, rifampicina e clofazimina (multibacilar) – multibacilar (12 meses/até 18 meses) – Criança:
metade da dose

Fármacos:
 Rifampicina: altamente bactericida: uma dose mensal elimina quase todos os bacilos. Vida média:
2-3 horas
 Dapsona e Clofazimina: pouco bactericidas isoladamente, mas associados eliminam quase todos os
bacilos em 3 meses. Dapsona vida média: 1-2 dias. Clofazimina vida média: cerca de 70 dias
TTO ambulatorial: interrompe a cadeia de transmissão; diminui a taxa de recidiva; diminui carga bacilar

TTO emergencial: reações hansênicas; efeitos adversos a medicamentos.

Retorno ambulatorial a cada 28 dias para:

 Tomar dose supervisionada.


 Receber cartela de medicamentos autoadministrados
 Avaliação clínica e terapêutica
 Oriente e agende o exame clínico de contatos e vacinação dos contatos sem sinais da doença

Efeitos adversos do medicamento:

Indica esquemas substitutivos: anemia hemolítica, hepatite medicamentosa, meta-hemoglobinemia,


agranulocitose, síndrome pseudogripal, síndrome da dapsona, eritrodermia, dermatite esfoliativa e
plaquetopenia.

Rifampicina

 Hepatoxidade: pode se manifestar por icterícia assintomática, anorexia, náuseas e aumento de


enzimas hepáticas em 2 a 3 vezes.
 Cutâneos: rubor, prurido e exantema.
 Coloração vermelha-alaranjada das secreções.
 Gastrointestinais: náuseas, vômitos e diarreia.
 Trombocitopenia e anemia hemolítica.
 Síndrome pseudogripal (hipersensibilidade por dose intermitente) é rara: febre, calafrios, mialgias,
cefaleia, dores ósseas, eosinofilia, falência renal aguda, trombocitopenia, anemia hemolítica e
choque.
 Interage com anticoncepcionais orais diminuindo a sua ação, aumentando o risco de gravidez.
Clofazimina
 Cutâneos: fotossensibilidade, ictiose, coloração vermelho-acobreada ou acinzentada, dependendo
da dose e do grau de infiltração, que regride em meses após o tratamento.
 Gastrointestinais: vômitos, náuseas, diarreia e dor abdominal que sugere obstrução intestinal.
Dapsona

 Cutâneos: rash, eritrodermia, síndrome de Stevens-Johnson.


 Hepáticos: icterícia colestática ou hepatite tóxica.
 Síndrome nefrótica.
 Neurológicos: psicoses, neuropatia motora periférica.
 Anemia hemolítica, em especial, em indivíduos com deficiência da enzima glicose-6-fosfato-
desidrogenase (G-6-PD).
 Meta-hemoglobinemia: cianose, dispneia, taquicardia, cefaleia, fadiga.
 Síndrome da sulfona: dermatite esfoliativa, ou rash cutâneo, linfadenopatia,
hepatoesplenomegalia, linfocitose atípica e febre.
Talidomida

 Teratogenicidade.
 Neuropatia periférica (sensitiva e motora periférica proximal).
OBS.: Na suspeita de efeitos adversos graves aos medicamentos da PQT, o esquema terapêutico necessita
ser suspenso, com imediato encaminhamento da pessoa para avaliação em serviço de referência para
realização de exames laboratoriais complementares e prescrição da conduta adequada.

 Os efeitos mais graves estão relacionados à dapsona e, em geral, ocorrem nas primeiras 6 semanas
ou primeiros meses de tratamento.

Exames laboratoriais: recomendados no início do tratamento e quando há suspeita de efeitos adversos aos
medicamentos e/ou nos episódios reacionais

 Hemograma, urina tipo I, parasitológico de fezes, glicemia, avaliação bioquímica renal e hepática,
eletrocardiograma.

Reações Hansênicas:

 Quadros agudos inflamatórios provocados por alterações imunológicos que podem ser
desencadeados ou exacerbados por infecção, estresse físico ou emocional, cirurgias, internações,
vacinação, gestação e outras situações.
 Podem ocorrer antes, durante e após término da PQT  quando ocorrem no curso da PQT, esta
deve ser mantida, associada aos TTOs específicos para as reações.
 Tipo 1 (reação reversa): hiperatividade da resposta celular - Th1; acomete os pcts paucibacilar;
caracteriza-se pelo surgimento de múltiplas lesões eritemato-placares inflamatórias nos mesmos
locais das antigas lesões e de novas lesões satélites. As neurites (também consideradas reações do
tipo 1) podem ocorrer isoladamente, caracterizam-se por dor aguda intensa nos trajetos neurais e
podem repercutir em perdas funcionais sensitivas e/ou motoras quando não tratadas de imediato.
Pode ocorrer edema de mãos e pés (dedos em salsicha). TTO: prednisona 0,5- 1mg/kg/dia por 30
dias, no mínimo. Cálcio e vitamina D
 Tipo 2 (eritema nodoso): multibacilar (Virchowiana). Caracteriza-se por nódulos dolorosos
eritemato-vinhosos múltiplos ou lesões em alvo, associados a importantes manifestações
inflamatórias sistêmicas como artralgia, orquite, febre, calafrios e mal estar geral. TTO: Talidomida
100 – 300mg/dl por pelo menos 4 meses (teratogênica, mesmo o homem tomando); Pentoxifilina
1,2g/dl; Prednisona 0,5-1mg/kg.

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