AULA 1: INTRODUÇÃO, FÍSICA DAS RADIAÇÕES E Inicialmente, os raios-x foram utilizados
RADIOPROTEÇÃO como atração em feiras e exposições. Anúncios de
1896 trazem frases como: “veja através de um bloco de madeira” ou “conte as moedas dentro de sua INTRODUÇÃO carteira”. Logicamente, as pessoas não faziam ideia dos potenciais danos que a radiação poderia Os raios-x foram descobertos por Wilhelm C. ocasionar. Na medicina, aplicações como a detecção Röentgen em 1895 (recebendo por esta descoberta o de fraturas e tratamento de micoses no couro Prêmio Nobel de Física em 1901), enquanto cabeludo eram comuns. trabalhava estudando a condução de eletricidade no Não demorou muito tempo, entretanto, para interior de um tubo de Crookes. Ao realizar o disparo que os pesquisadores e médicos começassem a notar elétrico, o assistente de Röentgen notou um brilho um aumento no número de lesões de pele das emanando de uma placa coberta em platinocianeto pessoas que lidavam diretamente com a radiação. de bário que estava próxima ao tubo. O tubo, Um dos pioneiros na radiologia americana, Dr. entretanto, estava coberto, de modo que o brilho Mihran Kassabian foi um dos primeiros a relatar os fluorescente na placa não poderia ser explicado pela danos biológicos da radiação. luz no interior do mesmo. Algo invisível estava “escapando” do interior do experimento e atingindo esta placa. A esse “raio invisível”, Röentgen deu o nome de Raio-X (o “X” se refere ao “desconhecido” em uma operação matemática). A repercussão da descoberta foi quase imediata. Menos de um ano após a divulgação, mais de 49 livros e 1000 artigos haviam sido escritos sobre o assunto. As notáveis aplicações dos raios-x na medicina foram rapidamente descobertas, após Röentgen experimentar com radiografias de sua própria mão e a mão de sua esposa.
Figura 2. Foto das mãos do Dr. Kassabian. Em decorrência das lesões
induzidas pela radiação, teve dois dedos amputados e desenvolveu uma neoplasia que o matou aos 39 anos de idade.
Com o passar dos anos o conhecimento
médico sobre a física das radiações e seus efeitos biológicos evoluiu de forma significativa, levando à criação de aparelhos cada vez mais seguros e capazes de obter imagens de alta fidelidade com emprego de doses mínimas de radiação. Os raios-x ainda são amplamente utilizados para o radiodiagnóstico, porém diversos outros métodos de imagem foram agregados ao arsenal dos médicos, tais como a ultrassonografia e a ressonância magnética. Nesta primeira aula, entretanto, o foco é nas radiações ionizantes, os raios-x. Vamos estudar como são formados, como produzem uma imagem, quais os potenciais danos decorrentes de seu uso e como Figura 1. Primeira radiografia realizada (mão da esposa de Röentgen. podemos nos proteger. COMO FUNCIONAM OS RAIOS-X? E quais são as densidades básicas que podemos ver nas radiografias em geral? Em resumo, os raios-x são fótons de alta energia com um excelente poder de penetração nos → AR tecidos do corpo humano. Atualmente, eles são gerados em um “tubo de raios-x”, que nada mais é do que um aprimoramento do tubo de Crookes, → GORDURA consistindo de um polo negativo (cátodo) e um positivo (ânodo) com uma diferença de potencial elétrico entre eles. Quando se liga a corrente, os → PARTES MOLES elétrons se desprendem do ânodo e atingem o E LÍQUIDO cátodo, determinando a liberação de raios-x. O vídeo abaixo fala um pouco mais sobre o funcionamento do tubo de raio-x: → OSSO
PRODUÇÃO DE RAIOS X (ANIMAÇÃO)
→ METAL Ao serem disparados sobre o corpo do paciente, os raios-x deverão atravessar os tecidos humanos e colidir com um receptor, que também Quanto mais BRANCO um material, mais pode ser chamado de placa ou clichê radiográfico. RADIOPACO ele é. Quanto mais PRETO um material Existem alguns fatores que podem interferir na radiografia, mais RADIOTRANSPARENTE ele é. Se na capacidade dos raios-x em penetrar os tecidos: acostumem com esses termos, pois serão bastante utilizados daqui para a frente. Vamos exercitar com a 1) Densidade do material → Diz respeito à imagem abaixo: composição do material. Materiais pouco densos, como o hidrogênio ou o oxigênio do ar, praticamente não “freiam” partículas de raio-x, aparecendo PRETOS na radiografia. Ao contrário, materiais densos como o chumbo e outros metais apresentam alto poder de absorção dos raios-x, ficando BRANCOS na radiografia. 2) Espessura do material → Mesmo materiais pouco densos, como a gordura por exemplo, podem ir ficando progressivamente mais BRANCOS na radiografia conforme se aumenta sua espessura. 3) Energia do feixe de raios-x → Este é um ● A moeda no estômago da criança é bastante pouco mais complicado. Lembra que falamos densa, portanto fica mais BRANCA, mais que no tubo de raio-x existia uma diferença RADIOPACA que os demais tecidos. de potencial entre o cátodo e o ânodo? Esta ● Observem que existe diferença sutil na diferença de potencial vai determinar a densidade da gordura e do músculo. A energia dos raios-x resultantes. Quanto maior gordura é levemente mais PRETA ou esse energia, maior o poder de penetração RADIOTRANSPARENTE. nos tecidos. ● Observem como o gás (presente tanto fora do corpo como no estômago e nas alças intestinais) é o mais RADIOTRANSPARENTE. ● O osso, apesar de bastante RADIOPACO, é mais RADIOTRANSPARENTE que o metal. Existe mais um detalhe que pode influenciar tumores ou mutações genéticas na prole do o modo como formamos a imagem ao adquirir uma indivíduo. São efeitos que demoram anos para ser radiografia, o chamado “efeito de ampliação”. Este percebidos e, apesar da chance de sua ocorrência efeito os diz que quanto mais PRÓXIMO do filme aumentar com a dose, não existe dose conhecida ou radiográfico a estrutura estiver, mais FIEL ao dose segura para evitá-los. Mesmo um simples raio-x tamanho natural ela vai aparecer. Ao contrário, de tórax pode desencadear uma mutação dessas estruturas mais DISTANTES do filme irão aparecer (embora a chance seja realmente minúscula!). AMPLIADAS. Já os efeitos DETERMINÍSTICOS são aqueles que ocorrem de uma forma relativamente previsível a partir de uma dose conhecida de radiação. Eles acontecem por uma lesão direta às células do corpo, não por uma mutação genética. São exemplos de efeitos determinísticos a catarata, queimaduras de pele e esterilidade permanente. Para exercitar, podemos lembrar dos efeitos nos sobreviventes de desastres como Chernobyl: as pessoas que morreram logo em seguida foram acometidas por queimaduras e falência da medula óssea, efeitos DETERMINÍSTICOS. Após anos, algumas pessoas começaram a desenvolver tumores ligados à exposição acidental, por efeitos ESTOCÁSTICOS.
RADIOPROTEÇÃO
E como devemos nos proteger (e proteger os
pacientes) da radiação? Para responder essa pergunta, existem as normas brasileiras de proteção radiológica, que estão baseadas em 4 pilares:
1) JUSTIFICAÇÃO → O benefício da realização
Figura 3. Observem como, apesar de possuírem o mesmo tamanho na de um exame deve sempre superar os riscos. vida real, a posição das três “bolinhas” em relação ao filme muda o seu 2) OTIMIZAÇÃO → Utilizar sempre a menor tamanho na projeção final. dose de radiação possível para obtenção de imagens de adequado valor diagnóstico. É por causa deste efeito de ampliação ou 3) LIMITAÇÃO DE DOSE → Define valores magnificação que sempre preferimos realizar a máximos para a exposição ocupacional e do radiografia com as estruturas mais importantes, público em geral. CUIDADO! Não existe “dose como o coração, próximas ao filme. segura” de radiação, apenas “dose tolerável”. 4) PREVENÇÃO DE ACIDENTES → Deve-se EFEITOS BIOLÓGICOS DA RADIAÇÃO sempre minimizar a possibilidade de ocorrência de exposições acidentais. Muito se fala sobre os riscos da radiação hoje em dia, mas o quão perigosa realmente ela é, quando Existem também numerosos acessórios com utilizadas da forma correta? derivados de chumbo para reduzir a dose absorvida Os raios-x podem interagir com o nosso naqueles profissionais que não conseguem evitar corpo na forma de dois tipos de efeitos: completamente a exposição. ESTOCÁSTICOS e DETERMINÍSTICOS. Os efeitos ESTOCÁSTICOS decorrem da lesão do DNA celular pela radiação, levando à formação de MATERIAL DE BASE
1) Apostila de física do Colégio Brasileiro de
Radiologia:http://homolog.cbr.org.br/wp-con tent/uploads/2019/06/Apostila-de-Fisica_20 08.pdf 2) Normas de Radioproteção do CNEN: http://appasp.cnen.gov.br/seguranca/norma s/pdf/Nrm301.pdf