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MAR ATONA LUMINE - O CINEMA E A GUERR A

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O C I N EM A E
A GUERR A
USA ND O FI L M E S PAR A
ENT ENDER O D R AM A H U M AN O
MAR ATONA LUMINE - O CINEMA E A GUERR A

A guerra é um fenômeno complexo, cujas


causas e consequências jamais podem ser
reduzidas a um ou outro fator. Diferentes
disciplinas podem jogar luz sobre faces diversas
da mesma questão. Ao longo dos séculos,
historiadores, economistas, antropólogos,
políticos, psicólogos, entre outros, deram
contribuições que nos auxiliaram a entender um
fenômeno que, apesar de tudo, é tão humano.

Assim também a arte. Por meio da leitura


dos épicos de Homero, assistindo às peças de
William Shakespeare, ou admirando o quadro
Guernica (1937), de Pablo Picasso, temos
acesso a conhecimentos que outras formas
de expressão não são capazes de oferecer.
As obras de arte, além de nos dar a ver os
jogos de poder, as disputas que emolduram
as guerras, nos permitem contemplar as
agitações interiores de quem as vive.

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Abordando com talento a temática da


guerra, os artistas podem retratar e dar
testemunho da amplitude a que corresponde a
condição humana, mostrando o que ela tem de
pior e de melhor. Dizia o psicólogo austríaco
Viktor Frankl, sobrevivente dos campos de
concentração nazistas: “o ser humano é o ser
que inventa as câmaras de gás, mas é também
aquele que entrou ali de cabeça erguida, com
uma oração nos lábios.”

Ódio, medo, sofrimento, amor, morte,


esperança: encontramos a expressão depurada,
cristalina, desses e de outros aspectos da vida
humana na literatura, no teatro, na pintura e
também nos filmes que colocam a guerra como
evento central. As cinco obras que compõem
esta Maratona Lumine permitirão ao assinante
conhecer retratos desta experiência, no que
ela tem de mais radical, contundente e grave.

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Em 1895, num café parisiense, é projetado


o filme A saída dos operários da fábrica, dos
irmãos Auguste e Louis Lumière. Uma nova
tecnologia era apresentada, capaz de registrar
movimentos e reproduzi-los como nenhuma
outra anteriormente conseguira fazer. Ali,
naquela noite, surgia o cinema, às vésperas
do século XX.

A saída dos operários da fábrica, 1895.

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Nos primeiros anos de seu


desenvolvimento, ainda quando não era
considerado algo mais que uma atração
em feiras de variedades, os operadores
de câmera testavam as possibilidades do
cinema, dedicando-se, principalmente, a
filmar os modos de vida que despontavam
à época nos centros urbanos em que
viviam, as transformações desses espaços,
e também algumas pequenas narrativas, em
geral cômicas.

A profusão de filmes e experimentos


nesse começo logo conduziu à consolidação
de algumas convenções que permitiram, nos
anos seguintes, serem produzidos filmes mais
ambiciosos em termos de narrativas, escalas,
duração. Nesses filmes, passariam a ser
representados temas importantes da história
dos países onde eram produzidos.

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Nos Estados Unidos, O nascimento de uma


nação (The Birth of a Nation, 1915), de D.W.
Griffith, contava a história da Guerra Civil
Americana; na França, o cineasta Abel Gance
lançou Napoleão (Napoleon, 1927), épico
de quatro horas sobre o imperador. Desde o
começo, notamos como as guerras serviam de
tema para alguns cineastas produzirem seus
próprios afrescos, à semelhança dos pintores
da antiguidade.

Griffith e Gance abordavam nesses


filmes acontecimentos do passado. Ao longo
do século XX, porém, as circunstâncias
históricas iriam impor aos realizadores de
cinema que se voltassem ao presente. O
mundo testemunharia algumas das maiores
atrocidades já cometidas, e a técnica
cinematográfica seria utilizada para registrá-
las. Filmes seriam feitos como testemunhos
do que se passou em tempos tão sombrios.
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Na Segunda Guerra Mundial, os Estados


Unidos enviaram alguns dos nomes mais
importantes e consagrados da indústria
cinematográfica de Hollywood para os
campos de batalha. Diretores como Frank
Capra, William Wyler, John Huston, George
Stevens e John Ford foram encarregados de
fazer documentários que mostrassem aos
jovens soldados a necessidade de lutar contra
os inimigos que avançavam, e que também
apresentassem à população em geral um
pouco da dura realidade da guerra.

Longe da segurança dos sets de filmagem,


sem ter em mãos roteiros com ações pré-
definidas, os cineastas presenciam em estado
bruto, à queima-roupa, a violência, o medo,
mas também atos de sacrifício e inúmeros
casos de heroísmo.

A experiência marcaria para sempre suas


vidas e carreiras.
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Desde o começo,
notamos como as
guerras serviam
de tema para
alguns cineastas
produzirem seus
próprios afrescos,
à semelhança
dos pintores da
antiguidade.

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Depois de uma sequência de oito


documentários, John Ford realizou o seu
primeiro longa-metragem de ficção sobre
a Segunda Guerra Mundial: Fomos os
sacrificados (They Were Expandable, 1945).
O filme é uma adaptação do best-seller de
mesmo nome de William L. White, sendo
atravessado também por vivências do próprio
Ford e de pessoas que ele conheceu no tempo
em que serviu no exército.

John Ford (centro) no set de Fomos os sacrificados

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Nas palavras do crítico de cinema Tag


Gallagher, especialista no diretor americano,
o filme parece ser endereçado às mães e aos
pais da América, e transmitir a mensagem de
que “seus filhos foram traídos e abandonados
nas Filipinas, que eles sofreram e morreram
desnecessariamente por nada.” A batalha no
filme, observa Gallagher, não é a guerra do
lado de fora, mas os conflitos internos das
personagens.

A abordagem emotiva e pessoal de Ford


foi bem acolhida pelo público. Os fuzileiros
navais, mais especificamente, se sentiram
representados pelo filme. No entanto, nem
sempre é assim: controvérsias envolvendo
filmes de guerra costumam acontecer.

Pouco mais de uma década depois, em


1956, o cineasta americano Robert Aldrich

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dirigiu Morte sem glória (Attack!), em cujo


trailer lia-se: “essa é a face nua e crua da
batalha, onde nem todo mundo é um herói,
e nem toda arma está apontada para o
inimigo”. Por trazer personagens covardes
e maliciosos entre os que compunham
o pelotão, o filme foi rechaçado pelo
Departamento de Defesa americano.

Nos livros, nos filmes, talvez uma


personagem aja diferente de como gostaríamos
de vê-la agindo, ou de como nós mesmos
pensamos que agiríamos naquela situação,
e por isso nos sintamos decepcionados. É
importante reconhecer, porém, que ao nos dar
a ver possibilidades de vidas diferentes das
nossas, as obras de arte nos oferecem uma
ferramenta importante: elas ampliam nosso
horizonte de consciência.

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Ao conhecer o modo de ser de uma


personagem, somamos este ao quadro de
referências que carregamos no nosso interior.
Durante as nossas vidas, poderemos passar
por situações semelhantes às que aquela
personagem vivenciou, e, por tê-la conhecido
antes, a situação que se apresenta poderá ser
enfrentada com alguma referência, seja de
como é melhor agir, ou, no mínimo, do que
evitar fazer.

Como dissemos anteriormente, os


campos de batalha dos filmes de
guerra são palcos para o que o ser
humano tem de melhor e de pior.
Naquelas circunstâncias, uma mesma
ação, a depender do ponto de vista,
pode ser considerada virtuosa ou vil.

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Dedicar atenção ao que essas obras


mostram, meditar sobre as ações das diferentes
personagens, suas contradições, seus dilemas,
tudo isso pode transformar essas sessões de
cinema em fontes de valiosos aprendizados.

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As obras de arte
nos oferecem
uma ferramenta
importante: elas
ampliam nosso
horizonte de
consciência.

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Os acontecimentos da Segunda Guerra


Mundial deram nova forma ao imaginário
daqueles que diretamente a vivenciaram, e
também das gerações seguintes.

Nas palavras do crítico de cinema


André Bazin, os amontoados de cadáveres,
as imensas destruições, as inumeráveis
migrações, os campos de concentração, as
bombas atômicas, todos esses acontecimentos
– e outros que poderiam ser enumerados –
“deixavam para trás a arte da imaginação que
pretendia reconstituí-los”.

Dito de outro modo: a realidade dos fatos


ultrapassava o que até então se imaginava.
Os roteiristas de cinema, por exemplo, nunca
haviam concebido barbáries como as que se
tornavam conhecidas. Como filmar depois de
saber do que a humanidade é capaz, depois

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de ter estado lá, registrando, capturando as


evidências de tão gigantesco Mal?

Do lado de fora das salas de projeção,


cidades inteiras encontravam-se em
ruínas, com seus habitantes iniciando a
caminhada em direção à reconstrução
dos edifícios e de suas próprias
vidas, lutando, minuto a minuto, para
sobreviver. Nas artes, no cinema, seria
possível, ou adequado, continuar a
fazer o mesmo de antes?

Cada vez mais a crítica passava a cobrar


dos filmes uma semelhança, uma aproximação
com o mundo real, a presença dos dramas
estampados nos rostos das pessoas comuns,
vistas nas ruas. Os cineastas, por sua vez,

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refletiam sobre as formas adequadas para


filmar esse novo contexto. O que se havia
convencionado fazer desde os primórdios
do cinema não parecia servir para tratar das
questões que eram agora colocadas.

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Imaginemos um filme de mistério em que


um detetive é chamado para solucionar um
crime. Ele reúne as pistas, conecta os pontos,
e ao final é capaz de afirmar, com certeza
quase absoluta, a origem de todos os males,
isto é, o culpado. Em comparação, essa
lógica não funcionaria para dar conta do que
se abatera sobre os países durante a Segunda
Guerra Mundial. Milhares de pessoas
participaram dos eventos que levaram os
países à devastação física, moral, espiritual.
Não havia explicações fáceis.

Para lidar com uma realidade que os


transcendia, os cineastas passaram a lançar
mão de meios que permitissem que esta
aparecesse sem precisar ser moldada,
manipulada, ou interpretada por eles. Se
os filmes antigos eram como esculturas,
resultados de longas preparações, ensaios,

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ajustes e correções, agora se passava a


preferir a própria pedra, com todas as suas
imperfeições, falhas, rasuras, sem as marcas
do artista e seu cinzel.

Daí as mudanças no jeito de filmar


efetuadas por um grupo de realizadores
italianos nos anos 1940: em vez de
permanecer nos estúdios, eles saíam às
ruas, sem roteiros definidos, mais abertos
ao improviso, misturando atores amadores
e profissionais, desfazendo as barreiras que
separavam documentários e ficções. Por
compartilharem tais características ao buscar
retratar nas telas com muita verossimilhança
a presente situação do seu país e da Europa, o
conjunto de filmes feitos por esses diretores
foi abrigado sob um mesmo nome, o chamado
“neorrealismo italiano”.

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Fizeram parte desse movimento


cinematográfico diretores como Vittorio De
Sica, Luchino Visconti e Roberto Rossellini,
que o descreveu com as seguintes palavras:
“o neorrealismo consiste em seguir um ser,
com amor, em todas as suas descobertas,
todas as suas impressões. Ele é um ser muito
pequeno sob alguma coisa que o domina e
que, de uma vez, o atingirá terrivelmente
no momento preciso em que ele se encontra
livre no mundo, sem esperar nada que seja.
O que importa antes de tudo para mim é essa
espera; é ela que é preciso desenvolver, a
queda devendo permanecer intacta.”

Rossellini, na sua trilogia da guerra –


formada por Roma, cidade aberta (Roma
città libera, 1945), Paisà (1946) e Alemanha,
ano zero (Germania anno zero, 1948) –
deu forma às suas intenções: nesses filmes,

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acompanhamos minuciosamente algumas


personagens, pessoas comuns cercadas por
pessoas comuns. Não há tramas mirabolantes,
apenas fragmentos do dia a dia nos quais
angústias, tristezas, e até felicidades são
compartilhadas em meio aos escombros.

Os filmes não procuram dar conta da


totalidade dessas vidas: não sabemos
ao certo aonde seremos levados, ou o
que acontecerá a essa gente depois de
o filme terminar. Tal como acontece
conosco, as histórias são inacabadas,
apesar das adversidades; histórias,
como dizia Rossellini, cujos finais ainda
estão à espera de serem escritos.

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Ao longo dos séculos, as artes estiveram a


serviço de a humanidade expressar e conhecer
a sua condição. O cinema, em especial, devido
à capacidade privilegiada de representar a
realidade com extrema verossimilhança, foi
um meio convocado a registrar algumas das
experiências mais impactantes de que tivemos
notícias, servindo como um espelho no qual
podemos identificar a amplitude que compõe
nosso drama.

Em diferentes campos de batalha, sejam os


mares do Pacífico em Fomos os sacrificados,
as florestas das Ardenas em Morte sem glória,
as ruas destruídas da Itália, em Roma cidade
aberta e Paisà, ou de Berlim, em Alemanha,
ano zero, o cinema se prestou a acompanhar
as trajetórias de algumas personagens em
confronto com os outros e, principalmente,
com o que carregam dentro de si mesmas.

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Nesta Maratona Lumine – O cinema e a


guerra, convidamos os assinantes a verem
materializadas em cinco filmes algumas
histórias com o potencial de enriquecê-los.

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PARTICIPE DA MAR ATONA LUMINE

O C INEMA E A GUE RR A

PAISÀ
Roberto Rossellini

ESTREIA 17 DE FEVEREIRO

ROMA CDADE ABERTA


Roberto Rossellini

ESTREIA 18 DE FEVEREIRO

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ALEMANHA ANO ZERO


Roberto Rossellini

ESTREIA 19 DE FEVEREIRO

MORTE SEM GLÓRIA


Robert Aldrich

ESTREIA 20 DE FEVEREIRO

FOMOS SACRIFICADOS
John Ford

ESTREIA 21 DE FEVEREIRO

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O UT R OS F I L MES D I SP O N Í VE I S N A
L UMI NE T V S O B R E G UE R R AS

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Adeus, meninos
(Au revoir les enfants, Louis Malle, 1987)

Narrando o cotidiano de um
grupo de alunos num colégio
na França, o filme faz um
retrato de como era ser criança
durante a ocupação nazista.

Ivan
(Guto Pasko, 2011)

A história de Ivan Bojko,


sobrevivente ucraniano de
guerra. O documentário mostra
como certas feridas ficam por
toda a vida.

O leopardo
(Il gattopardo, Luchino Visconti, 1963)

As guerras pela anexação da Sicília


ao novo reino da Itália, acontecidas
na segunda metade do século XIX,
acarretam transformações na vida
da aristocracia local.

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Coordenação editorial:

MATHEUS BA ZZO
Direção de Arte:

YURI SILVA
Texto:

MATHEUS CARTA XO

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Todos os direitos reservados. Proibida toda e qualquer


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