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HORROR
NOIRE
“Nossos nomes serão escritos
em milhares de paredes.
Venha comigo e torne-se imortal.”
CANDYMAN
ROBIN R.
MEANS COLEMAN
HORROR
NOIRE
SUMÁRIO
ASHLEE
BLACKWELL
Como chegamos aqui?

PRÓLOGO
Em busca do sentimento de equilíbrio

PREFÁCIO
A promessa revelatória do cinema de gênero

INTRODUÇÃO
Estudando negros e filmes de terror

PRÉ-1930
O nascimento do bicho-papão negro no imaginário

1930
Febre na selva: um romance de horror

1940
Bandidos aterrorizantes e miseráveis menestréis

1950, 1960
Invisibilidade negra, ciência branca e uma noite com Ben

1970
Grite, branquelo, grite: retribuição, mulheres duronas e carnalidade

1980
Nós sempre morremos primeiro: invisibilidade, segregação racial
econômica e o sacrifício voluntário

1990
Estamos de volta! A vingança e o terreno urbano

CONCLUSÃO
Capturando alguns Zzzzzs: os negroz e o terror no século XXI

NOTAS
CINEMATECA
BIBLIOGRAFIA
AGRADECIMENTOS
HORROR
NOIRE
INTRODUÇÃO À EDIÇÃO BRASILEIRA

ASHLEE
BLACKWELL
COMO CHEGAMOS AQUI?

Era uma noite insistentemente gelada, e, geralmente, eu


não estaria até tão tarde na rua numa terça-feira de
fevereiro. A rua principal, muitas vezes cheia, estava um
tanto deserta, me deixando ainda mais ansiosa para que
o meu ônibus chegasse. Meu plano, além de me manter
alerta e aquecida, era guardar as imagens da estreia
fenomenal de Corra! de Jordan Peele frescas em minha
mente. Eu morava do outro lado da cidade e precisava
anotar imediatamente minhas ideias em uma página
digital. Naquela época, eu já havia passado alguns anos
em um estudo on-line sobre terror que foi tão único e
respeitado que acabei sendo convidada para aquela pré-
estreia. Eu tinha esperanças de que Corra! pudesse se
tornar aquele filme de terror mainstream dirigido por um
artista negro e que seria abraçado pela estratosfera
autoral. E o filme definitivamente alcançou isso.
O aspecto mais tocante de Corra!, para mim, não
foram as várias camadas de racismo institucionalizado,
supremacia branca e subtextos de políticas raciais, mas a
personificação interna dessas questões maiores
enclausuradas na psique de Chris (Daniel Kaluuya). Rose
(Allison Williams) não apenas predou um homem negro
que estava vivendo sua vida: ela atacou a fragilidade da
perda de Chris. A perda da estabilidade familiar (pai
ausente, mãe morta em um acidente trágico) e o desejo
de uma comunidade (os reflexos da vida negra em sua
fotografia, sua confiança inabalável em Rod, interpretado
por Lil Rel Howery). É a perseverança de Chris, apesar
dessas adversidades, junto de seu olhar talentoso, que
fazem dele a presa ideal para que Rose o transporte ao
que parece ser outra dimensão, mas que na verdade não
é. Porque uma vez que pessoas negras saem da
segurança de suas casas, famílias e comunidades e vão
para um mundo repleto de microagressões raciais e
comportamentos discriminatórios, há uma verdadeira e
consciente angústia em relação à perda de identidade e
extinção. Essa angústia foi incorporada em nosso DNA por
meio de traumas geracionais.
Em minha resenha de Corra!, disponível no site
Graveyard Shift Sisters, eu descrevo Chris como uma
figura fragmentada. Foi uma revelação em meu próprio
trabalho como uma escritora e fã de terror, mulher e
negra, porque eu também me sentia fragmentada em
um ambiente onde poucos se pareciam comigo. Estive
desprotegida e era verbalmente insegura em lugares de
encontro de terror por ser a única. Minha presença era
claramente indesejada, e Corra! se utiliza do terror para
demonstrar esses sentimentos tão tangíveis que várias
pessoas não brancas sentem em espaços que sugerem
que suas cores e culturas sejam educadamente
suavizadas no melhor dos casos, e invisibilizadas nos
piores.
Pensamentos do tipo já estavam na minha cabeça,
como sementes, quando Corra! chegou aos cinemas. O
tipo de pensamento que, na época, eu não sabia como
expressar de forma exata ao meu novo amigo Phil Nobile
Jr. Ele era apenas um cara legal que conheci em uma
convenção de terror dois verões atrás e que eu via às
vezes no Twitter, até que ele me convidou para escrever
para o Birth.Movies. Death, um site famoso. Ele não
apenas surgiu na minha caixa de entrada do e-mail com
um pedido vago e genérico de resenha. Ele fez a
proposta sabendo que eu daria mais importância para
um filme de terror escrito e dirigido por um homem negro
e estrelado por negros, e para uma história com um
fundo definitivamente afro-estadunidense. O que eu
gosto no Phil é esse cuidado de tirar um tempo para
entender quais tópicos particulares compelem alguém a
usar seus talentos para ir mais a fundo. A fundação de
nosso relacionamento, como colegas de trabalho, nos fez
sentar juntos para um almoço em determinado dia,
sabendo que Corra! era o nascer do sol no horizonte de
um movimento.
A pergunta “Como chegamos aqui?” foi a transição
perfeita na preparação de um argumento para contar a
história e expressar teorias críticas em torno do terror
negro. E começou com Horror Noire, uma monografia de
mais de dez anos da dra. Robin R. Means Coleman. A dra.
Coleman é uma nativa da Pensilvânia, de Pittsburgh, que
dividia o tempo com sua família em drive-ins,
testemunhando as mais modernas novidades em relação
a criaturas e deleites fantasmagóricos. Uma vez que seu
lugar de origem foi o lar de alguns dos trabalhos mais
celebrados do cineasta George A. Romero, como A noite
dos mortos-vivos (1968) e Despertar dos mortos (1978) e
com as locações acessíveis, Robin pôde criar o que ela
descreveu como uma relação puramente “especial” com
o gênero. Essas influências indubitavelmente a fizeram
canalizar a energia dessas experiências em sua pesquisa
investigativa acerca da experiência negra no terror com
tanta riqueza de detalhes, que hoje este é o trabalho
mais seminal sobre o tópico, ainda não igualado. A dra.
Coleman acendeu em mim o tipo de chama com a qual
eu havia apenas sonhado enquanto era uma estudante
universitária. Foi uma honra usar meu conhecimento
adquirido para introduzir o trabalho de Robin a outras
pessoas. Mas, enquanto eu produzia alguns dos meus
primeiros escritos on-line de maneira intensa, não me dei
conta do quanto a minha pesquisa e a entrevista com a
dra. Coleman poderiam impressionar Phil e suas
sensibilidades como fã de terror.
Já estabelecido como profissional versátil e
desenvolvedor de produções cinematográficas e
televisivas na Center City Film & Video, na Stage 3
Productions e em outras companhias mais antigas na
Filadélfia, Pensilvânia, ele se utilizou de sua longevidade
e da confiança de seus superiores para pensar fora da
caixa em relação aos programas que eles estavam
desenvolvendo. Com seu entusiasmo em relação a
Corra!, minha proximidade imediata e igual fervor, ele
apresentou uma ideia que era insensata demais para
deixar passar: contar a história do terror negro na forma
de documentário. Corra! já tinha atenção mundial, mas
era importante, para manter a efervescência dessa
atenção, dar reconhecimento à história escondida que
havia levado a esse avanço na cultura pop.
Eu me coloquei à disposição para reuniões e
contribuições para colocar esse projeto em ação. Robin
estava entusiasmada com a ideia de transformar seu
livro em uma jornada multimídia e de se tornar uma
produtora executiva. Foram marcadas reuniões com
algumas produtoras em Los Angeles, onde Phil e eu nos
encarregamos de enfatizar a importância dessa história a
ser contada e o impacto que o terror teve na audiência
negra por décadas. Em uma tarde ensolarada em Santa
Mônica, eu olhei para Phil e propus a Shudder como o
meio de distribuição. Ele respondeu de maneira casual
que levaria a proposta em consideração.
Eu conhecia a Shudder como um serviço de streaming
com uma vasta e variada biblioteca de velhos clássicos e
lançamentos bombásticos saídos de festivais. Eles
também adquiriam documentários. Era um ambiente que
de fato poderia capitalizar com a produção de uma
programação fresca e original. Felizmente para nós, Phil
e eu, Sam Zimmerman, ex-editor-chefe do popular site
de terror Shock Till You Drop, era agora o curador de
filmes da Shudder. Um admirador do meu trabalho e o
primeiro a me oferecer uma oportunidade de escrever
fora do ambiente de meu próprio site, Sam recebeu um
resumo completo do documentário e ele realmente
desejou que o projeto chegasse aos seus chefes. O
conceito original era um seriado em quatro partes com o
título Separate Scares. O objetivo cinematográfico tinha a
ver com o pensamento mais dinâmico de Phil, que
apontava para a ideia do público negro “se ver” nas
telas. Como esse público reagiria, se houvesse uma
reação? Além disso, as pessoas negras contando suas
histórias a partir das cadeiras do cinema permitiria que o
documentário — algo que aprendi com o feminismo
negro — realizasse um exame crítico e imperativo do
conhecimento adquirido por meio da vivência de pessoas
que participaram daquela história. Ademais, seria uma
brincadeira interessante com o humorado estereótipo de
que o público negro é bem vocal em salas de cinema,
especialmente ao assistir filmes de terror. Nós tínhamos
um vídeo promocional que, engenhosamente, abria com
o comediante Eddie Murphy fazendo uma piada sobre
filmes de casas mal-assombradas em seu especial de
comédia stand-up Delirious, de 1983, seguido da
projeção de imagens de personagens negros ao longo
dos mais de cem anos de história do gênero. Nós
estávamos prontos para registrar visualmente essa
história em quatro horas ou mais, traçando
cuidadosamente as décadas e seus melhores momentos
com o livro de Robin servindo de guia. Sam se tornou um
meio de campo entusiasmado entre nós e os titulares da
Shudder para essa produção em potencial. Assim,
esperamos e respondemos perguntas por e-mail à
medida que elas chegavam.
Então, a nonagésima cerimônia do Oscar foi ao ar no
dia 4 de março de 2018. Eu nunca prestei muita atenção
em cerimônias de premiação, mas Peele deixou uma
impressão tão forte de Corra! que conquistou quatro das
principais indicações ao Oscar, o que é extremamente
raro para qualquer coisa que sequer se aproxime do
gênero de terror. Isso foi o bastante para gerar um leve
interesse naquilo que, na minha cabeça, era um assunto
imprevisível. Um choque agradável atravessou meu
corpo quando anunciaram que Jordan Peele havia
ganhado o prêmio de melhor roteiro original. Ele subiu ao
palco e falou sobre as dificuldades que enfrentou para
realizar seu projeto e sua enorme pilha de inseguranças.
Peele enfatizou uma mensagem de perseverança. Eu
ainda não tenho certeza se ele já havia se dado conta do
impacto que o filme criado por ele causaria. Horas
depois, no atribulado dia útil seguinte, Phil e Kelly Ryan
(parceira da Stage 3 e produtora executiva de Horror
Noire) receberam um aviso da Shudder de que eles
estavam prontos para transformar Horror Noire em
realidade.
De uma série em quatro partes, o projeto passou a ser
um filme de setenta a noventa minutos. Juntamente com
essa grande mudança, Phil aproveitou a oportunidade de
se tornar editor-chefe da relançada revista Fangoria, o
que tornou impossível seu envolvimento diário no
projeto. Ele e Kelly conseguiram outra produtora com
anos de experiência na televisão, Danielle Burrows, para
ajudar a tapar os buracos dos aspectos técnicos da
produção de vídeo com os quais eu não estava
familiarizada. Phil deu um jeito de estar conosco sempre
que possível, lidando com os dois empregos de forma
admirável e profissional.
Eu era a pessoa, agora produtora e coautora, que
tinha conhecimento e paixão pelo conteúdo. Meu
trabalho era assegurar que entrevistaríamos as pessoas
certas, confirmar os temas acerca da história do terror
negro que iríamos abordar, desenvolver todos os pontos
de discussão e conduzir cada entrevista. Encontrar um
diretor foi um desafio, já que vários candidatos
talentosos se interessavam por essa história. Xavier
Burgin, graduado na Escola de Artes Cinematográficas da
Universidade da Carolina do Sul, era tão afiado em sua
comunicação e tão cuidadoso em seus trabalhos,
conceitos e visão, além de ser amigável, que todos nós
concordamos que ele era a pessoa certa no lugar certo
para juntar um grupo predominantemente formado por
pessoas negras, as quais eu vi trabalharem juntas
arduamente para dar a Horror Noire a textura visual de
que precisava para ganhar vida. Apesar de problemas
climáticos, físicos ou mentais após mais de oito horas de
filmagem por dia, lançando perguntas e pontos de
discussão para pessoas que eu assisti em alguns dos
meus filmes favoritos por décadas, eu me vi extasiada ao
fazer o trabalho. Levei os feedbacks de Phil e Kelly a
sério e os apliquei. Fico agradecida que eles tenham me
deixado tomar a dianteira enquanto gravávamos, assim
pude afiar minhas habilidades mais adormecidas. Eu
precisava daquele empurrão.
A própria Robin estava na Universidade A&M, em
College Station, a duas horas de distância de Austin,
Texas. Danielle e eu fizemos a viagem e tivemos uma
recepção calorosa por parte de Robin e de sua adorável
equipe para um dia de filmagem. Sua presença na tela
ajudou bastante a arredondar a história que queríamos
oferecer ao público. Como um bebê curioso observando
uma anciã sábia, uma nova explosão de energia nasceu
dessa filmagem, pois, assim como Tananarive Due
(autora, educadora e produtora executiva de Horror
Noire), as duas se aprofundaram muito na história do
terror negro, ao ponto de nós três podermos discutir o
assunto em detalhes. A gravação com Jordan Peele
fechou o círculo quando seu escritório se transformou em
um grande aceno visual, com o diretor sentado na
mesma cadeira em que seu protagonista foi hipnotizado.
Com uma luz mais quente para acentuar suas
características e tendências geeks de terror, Peele
passou uma mensagem sóbria a respeito de como o
terror deve manipular as expectativas da audiência em
relação à representatividade negra. Para quebrar essas
expectativas, sendo ao mesmo tempo sensível à época
em que vivemos, Peele evidenciou que o vácuo de Corra!
é um lugar que ele sempre soube que deveríamos
desconstruir e eliminar de nossas vidas. Mesmo sendo
difícil, ele estava ciente de que nós poderíamos ser mais
e fazer mais em um gênero que havia esquecido a voz
negra por tanto tempo.
Após a filmagem, meu maior obstáculo foi entender
como criar um roteiro a partir de inúmeras páginas de
transcrições e tecer uma história com os temas que Phil
e eu concordávamos ser sólidos e perfeitos para o
projeto. Depois de algumas deliberações, decidimos que
uma abordagem cronológica seria mais interessante
antes de seguir para a edição. Se já houve no mundo um
lugar confortável para ser uma pessoa introvertida
determinada a contar a história dos negros afro-
estadunidenses no cinema, esse lugar foi a sala de
edição, com os editores Scott Strobel e Horatiu Lemnei.
Eles ouviam, eram pacientes e estavam se divertindo
tanto quanto eu. Eu precisava das sugestões deles e
aceitei os pedidos que faziam, e acabei aprendendo
muito sobre o que “funciona” e o que “não funciona”
quando você está montando os quebra-cabeças de horas
de filmagens para formar uma história coerente. Phil
preencheu buracos nas filmagens uniformemente,
Danielle conseguiu novos recortes de imagens e eu
intuitivamente sabia quais filmes usar e onde encontrar
as cenas de que precisávamos. Passamos semanas
refinando corte atrás de corte com notas executivas e
novos pareceres enquanto as notícias do terror
avançavam após o barulho criado por Corra!.
Nem é preciso dizer que o produto final foi o resultado
de um esforço em equipe e uma experiência que nunca
me cansarei de debater. Minha única esperança é que o
público ame o filme tanto quanto eu amei ajudar a lhe
dar vida. A recepção do público e da crítica excederam
minhas expectativas, e fico empolgada em saber que o
trabalho foi tão assertivo para as pessoas negras em
especial, no sentido de dar a entender que somos mais
do que vítimas com apenas cinco minutos na tela,
petulantes e grosseiros, servindo apenas para elevar a
taxa de sobrevivência dos protagonistas brancos. Nossa
presença em um gênero cuja intenção é causar medo
nos mostra como somos percebidos e o que vivenciamos
em nosso dia a dia no mundo. No entanto, mais do que
isso, Horror Noire corajosamente prediz para onde nos
encaminhamos quando se coloca o terror nas mãos de
artistas negros. Como isso impactará o gênero no futuro?
Essa história ainda está sendo contada. Para aqueles
entre nós investidos nesse progresso, estes são tempos
verdadeiramente animadores, em que tenho a honra de
poder participar ativamente. Horror Noire, tanto o
documentário quanto o livro, estão recebendo o
reconhecimento que merecem por serem tão essenciais
em nossa exploração e favorecimento do gênero de
terror. E já estava na hora.
ASHLEE BLACKWELL
Junho de 2019

ASHLEE BLACKWELL é mestre em artes pela Temple University, coprodutora


do documentário Horror Noire e pesquisadora do cinema de gênero.
Apaixonada por narrativas de terror desde os sete anos de idade, quando
assistiu a um dos filmes da franquia A Hora do Pesadelo, Blackwell se
dedicou a estudar os papéis femininos nas narrativas de terror. Ela mantém
o site Graveyard Shift Sisters, que também serve como um recurso
educacional e um jornal crítico que narra a história e o presente trabalho das
mulheres negras no horror para desfazer a marginalização de sua voz
criativa dentro desse espaço. Atualmente reside na Filadélfia com uma
coleção cada vez maior de livros e filmes.
HORROR
NOIRE

PRÓLOGO
EM BUSCA DO SENTIMENTO DE
EQUILÍBRIO

PERGUNTA: Por que não há pretos nos filmes de


terror?
RESPOSTA: Porque, quando a voz cavernosa diz
“CORRA!”, a gente faz isso.

E o filme vai acabar… diferente do que acontece com a frágil garotinha


branca que acende uma vela apressadamente e desce bem devagar os
degraus escuros para ver de onde vem aquela voz… Verdade ou não, essa
piada era uma justificativa improvisada para ajudar a explicar a ausência de
negros em filmes de terror feitos antes da década de 1970, um gênero
cinematográfico que tem sido popular entre a população afro-estadunidense
desde sempre.
Ainda que os negros componham apenas 13% da
população,* as pesquisas mostram que os negros são
responsáveis por mais de 25% da bilheteria total. E isso
apesar do fato de os negros, em determinadas épocas,
terem sido raramente vistos em filmes de qualquer
gênero, e, se aparecemos na tela, as imagens
representadas não serem motivo de orgulho.
Muito se tem pesquisado e escrito sobre a história dos
negros no cinema, mas até agora a nossa presença — ou
ausência — nos filmes de terror tem sido relegada a um
único capítulo ou a várias notas de rodapé. Este livro é
uma análise completa e profunda das imagens,
influências e impactos sociais dos negros nos filmes de
terror desde 1890 até o presente.
Fazendo um giro de 180 graus em relação ao seu livro
anterior, African American Viewers and the Black
Situation Comedy: Situating Racial Humor, a professora e
acadêmica premiada Robin Means Coleman compilou
uma gama impressionante de filmes e sua coleção de
vítimas de pele mais pigmentada que deram seu sangue,
se não um pouco mais que isso, aos enredos e histórias
dessas produções com temas sombrios. Este livro é um
estudo indispensável da participação negra no gênero de
terror que não só tem a acrescentar à riqueza da
pesquisa cinematográfica, mas também acentua e
celebra o papel que os negros desempenharam
historicamente nessa arena lucrativa do audiovisual.
Talvez, em nome de uma consciência, nós
devêssemos considerar as diferenças intrínsecas do
impacto social dos horrores “na tela” em oposição aos
horrores “da vida real”. Os filmes são ferramentas
poderosas para manipular fatos, informações e imagens
que frequentemente afetam as percepções, crenças e
atitudes mentais direcionadas ao tema apresentado.
Representações iniciais dos negros em filmes como A
Nigger in the Woodpile (1904),* uma comédia, na
verdade continham elementos do que poderia ser
considerado horror leve, nesse caso tanto em seu título
racista quanto na sua representação cinematográfica dos
negros, que, na verdade, foram encenadas por atores
brancos usando pintura blackface. Como comédia, o
filme não tinha a intenção de assustar ou aterrorizar no
sentido clássico, mas tentava alertar os brancos contra
uma raça em particular que eles precisavam temer.
Ainda mais desprezível foram os vários horrores “da
vida real” inspirados pelo notório filme O nascimento de
uma nação (1915) de D.W. Griffith. Enquanto os brancos
tentavam escapar dos perigos fictícios representados na
tela por uma turba voraz de negros que se levantava
para pegá-los em uma Amerikkka pós-escravidão, fora do
cinema os negros estavam sendo mortos de verdade,
vítimas de horrores verídicos ao serem linchados,
baleados, arrastados, estuprados, espancados, castrados
e queimados por grupos da supremacia branca e outros
racistas entusiasmados que “entraram de cabeça” e
compraram a mensagem incitadora de ódio do filme. São
coisas diferentes ficar animado ou horrorizado por algum
ato horrível que aconteceu com outra pessoa na tela do
cinema, ciente de que o ator depois lava o sangue falso e
vai para casa, e realmente sentir a dor e experimentar o
evento horrível e perturbador na vida real, com sangue
de verdade e sem nenhum diretor para gritar “corta!”.
Talvez o aspecto mais danoso relacionado ao espectro
limitado de papéis representados por atores negros nos
filmes de horror iniciais seja a falta de imagens positivas
para proporcionar um sentimento de equilíbrio. Ver um
personagem negro arregalar os olhos e empalidecer ao
se deparar com um fantasma não teria sido tão ruim se o
seu papel seguinte ou anterior tivesse sido como um
médico, advogado ou empresário de sucesso. Contudo,
os filmes hollywoodianos da época relegavam aos negros
os personagens subservientes, como mordomos,
empregadas e motoristas, ou que apareciam na tela só
para representarem malandros e bufões estereotípicos.
O famoso ator Willie Best pôde tremer o queixo
diversas vezes em uma série de filmes de terror,
incluindo O castelo sinistro (1940) e Veleiro fantasma
(1942). Outras figuras engraçadas constantes como
Eddie Anderson e Mantan Moreland também ficaram
conhecidas pela habilidade de arregalar os olhos e
tremer os joelhos nas horas de pânico e medo em filmes
como A volta do fantasma (1941) e A vingança dos
zumbis (1943), respectivamente.
Para uma gama mais ampla de imagens na tela, o
público podia sempre contar com filmes de elenco
totalmente negro sendo produzidos especificamente para
um mercado negro ansioso para se ver representado
dessa forma emocionante, poderosa e relativamente
nova de mídia de entretenimento. Os “filmes raciais”,
como foram chamados, eram majoritariamente
produzidos por companhias pertencentes a brancos que
chegavam à conclusão de que havia dinheiro a ser feito,
mas várias companhias cinematográficas negras
surgiram para preencher o buraco também. O popular
ator Spencer Williams Jr. escreveu e dirigiu vários filmes
estrelados por negros na década de 1940, incluindo o
conto de horror Son of Ingagi (1940), no qual uma
cientista pesquisadora mantém uma criatura da selva
africana em seu porão até que ela escapa para perseguir
os habitantes da casa. Com o filme Vodoo Devil Drums
(1944), do produtor Jed Buell, os frequentadores de
cinema viram pela primeira vez “A Dança Virgem da
Morte!” e “O Altar das Caveiras!”. Diferentemente dos
filmes protagonizados por brancos, onde os negros eram
usados majoritariamente como alívio cômico, em filmes
negros como esse, cada personagem em tela, o bom e o
mau, o alto e o baixo, representavam um vasto mundo
de peles mais pigmentadas que realmente existia na vida
real, mas que raramente era visto na tela grande.
Nas décadas de 1950 e 1960, os afro-estadunidenses
estavam mais uma vez sendo ignorados por Hollywood,
não apenas nas telas de cinema, mas nas telinhas da TV
também. Mais ou menos nessa época, fiquei surpreso em
ver Ben, o protagonista negro do clássico filme de terror
A noite dos mortos-vivos (1968) de George A. Romero,
sobreviver durante o filme inteiro, mas ainda assim a
produção se recusou a se afastar muito da tendência de
morte dos negros.
Contudo, na década de 1970 os filmes mudaram.
“Diga sem medo: eu tenho orgulho de ser negro!”* se
tornou o novo mantra à medida que um novo estilo de
filme começou a aparecer nas telas para abrir as portas
de nosso novo orgulho racial e despertar social. Os filmes
da era blaxploitation não forneceram apenas dramas
urbanos violentos como Shaft (1971) e The Mack (1973)
aos negros, mas também produziram várias
interpretações de histórias clássicas de terror, como
Blácula: o vampiro negro (1972), Blackenstein (1973) e
Monstro sem alma (1976). Conforme essa curta era de
afro-iluminismo nas telas ia sendo esquecida, ao que
parece, as portas do horror popular começavam a abrir
com rangidos, mas apenas o suficiente para que alguns
poucos negros fossem para o abate.

PERGUNTA: Por que o personagem preto é sempre o


primeiro a ser comido pelo monstro?
RESPOSTA: Carne preta tem gosto bom e enche
menos!

Foi na década de 1980 que Hollywood entrou em sua


fase “Mate um Negão”. (Nota: Eu sei que a Associação
Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor [NAACP]
enterrou a palavra que começa com N, mas eu a uso aqui
pelo bem da precisão histórica.) Durante esse período,
parecia que se um personagem negro fosse permitido em
cena, ele ou ela estariam mortos quando os créditos
rolassem. Em Lobos (1981), Gregory Hines foi atacado
por um lobo; em Gremlins (1984), Glynn Turman virou
almoço; em Quadrilha de sádicos 2 (1985), Willard E.
Pugh foi esmagado; em Coração satânico (1987), Lisa
Bonet foi abusada sexualmente por uma arma
carregada… e assim por diante. A grande maioria dos
personagens negros não era apenas morta durante esse
período, mas eles eram os primeiros a morrer, e existe
pelo menos um site que documenta esse fenômeno:
<www.blackhorrormovies.com/dyingyoung.htm>.*
Meu interesse pessoal no terror começou há muito
tempo e se estende ao meu trabalho pessoal. Em virtude
da minha tese apresentada na Universidade da
Califórnia, em Los Angeles, em 1985, The Black Beyond,
uma série antológica estilo Além da imaginação/Quinta
dimensão, mas sob uma perspectiva negra, eu fui
convidado por Warrington Hudlin, da Black Filmmakers
Foundation em Nova York, para participar de um fórum
sobre negros no terror, ficção científica e fantasia.** Eu
dirigi da Filadélfia, onde eu morava na época, até Nova
York ansioso para participar e ver os outros trabalhos
independentes do gênero que estavam sendo feitos, só
para descobrir que, naquele momento, na metade para o
final dos anos 1980, eu estava sozinho.
Já tinha lido em algum lugar que não há um filme de
terror feito que tenha perdido dinheiro. Sendo assim,
quando eu decidi fazer o meu primeiro filme, The
Embalmer (1996), escolhi fazer um filme de terror e
acabei declarando falência… Eu sei, informação
desnecessária. Independentemente disso, aquela
afirmação acabou se provando verdadeira porque o filme
deu lucro… Só que eu não fiquei com nada. Produzi The
Embalmer com um elenco e equipe formados por alunos
da Universidade Howard com um orçamento abaixo de
30 mil dólares, financiado em sua maior parte por um
empréstimo cuja garantia era a minha casa. O filme
rendeu mais de 100 mil dólares no mercado audiovisual
amador, mas os distribuidores, Yvette Hoffman e Toni
Zobel da Spectrum Films em Mesa, Arizona, preferiram
sair do mercado a me pagar os direitos autorais.
Posteriormente, cheguei à conclusão de que eu estava
bem antenado em relação ao conceito, pois vários outros
filmes de terror estavam sendo produzidos por afro-
estadunidenses, incluindo Contos macabros (1995) de
Rusty Cundieff e Os demônios da noite (1995) de Ernest
Dickerson.
Nos anos que se seguiram, mais e mais negros
apareceram em filmes de terror, fossem eles os primeiros
a morrer ou não. A popular e lucrativa série Todo mundo
em pânico, introduzida por Keenen Ivory Wayans, que se
destina a parodiar filmes modernos de terror, foi um
acréscimo ao grande escopo do gênero e ajudou a
aumentar ainda mais a bilheteria desses filmes. O
mercado de filmes que vão direto para o suporte do DVD
tem agora várias produções de horror com negros para
serem escolhidos, com variados níveis de medo,
qualidade e orçamentos. E, com as novas e avançadas
tecnologias que tornam a produção de filmes mais
acessível para as massas, além de lugares para exibição
on-line como o Facebook e o YouTube, muitos outros
negros irão morrer de forma horrível em futuros filmes de
terror. Os produtores de filmes de horror de hoje,
independentemente da cor de suas peles, sabem que só
existe uma cor de sangue na tela e para eles tanto faz a
cor do dinheiro usado para comprar os ingressos na
bilheteria…

STEVEN TORRIANO BERRY


Agosto de 2010

STEVEN TORRIANO BERRY é cineasta e professor adjunto da Universidade


Howard, em Washington, D.C. Dirigiu o filme The Embalmer, considerado um
dos primeiros exemplos de horror urbano no cinema e escreveu alguns
livros, entre eles The 50 Most Influential Black Films e Historical Dictionary of
African American Cinema.
* De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) de 2018, 55% das pessoas no Brasil se declaram
negras ou pardas, tornando o público uma maioria minorizada,
enquanto nos Estados Unidos, a população negra é também minoria
numérica. [Nota da Editora, daqui em diante NE]
* O título do filme faz referência a uma expressão (originada na
época da escravidão nos Estados Unidos) que denota algo suspeito
ou oculto. O filme então usa a expressão de modo literal para
ampliar seu significado. No livro Migrating to the Movies: Cinema and
Black Urban Modernity, de Jacqueline Najuma Stewart, a autora
comenta que, no filme, há dois homens negros se esgueirando em
uma pilha de lenha e, com isso, não há necessidade de motivar de
forma narrativa suas ações criminosas. Segundo a autora, eles
confirmam a expressão popular, incorporando seus significados
literais e figurativos. [NE]
* Referência à canção escrita por James Brown e Alfred “Pee Wee”
Ellis em 1968, “Say It Loud - I’m Black and I’m Proud”. [Nota do
Tradutor, daqui em diante NT]
* Desde a primeira publicação do livro Horror Noire, em 2011, alguns
dos sites indicados podem ter saído do ar, mas foram preservados
em suas menções. [NE]
** Uma forma usual de classificar a junção de gêneros como a fantasia,
ficção cientifica e horror sobrenatural é o “termo guarda-chuva”
ficção especulativa, sobretudo porque as barreiras entre eles são
tênues. A categorização de Coleman de que o terror estético
significa para pessoas negras, e um fórum que se dispõe a discutir
sobre negros no terror e fantasia evidencia a proximidade, mas pode
nos fazer questionar se obras como Kindred (Octavia Butler)
poderiam ser classificadas assim. O texto se refere a uma
experiência vivida nos anos 1980, certamente não poderia prever as
implicações teóricas que, na década seguinte, seriam discutidas
sobre uma perspectiva nova: o Afrofuturismo. Sobre Afrofuturismo,
ver: SOUZA, Waldson Gomes de. Afrofuturismo: o futuro ancestral na
literatura brasileira contemporânea. 2019. Dissertação (Mestrado em
Literatura) – Instituto de Letras, Universidade de Brasília, Brasília.
[NE]
HORROR
NOIRE

PREFÁCIO
A PROMESSA REVELATÓRIA DO
CINEMA DE GÊNERO

Rick Worland (2007), em seu livro The Horror Film,


observa de forma jocosa, ainda que astuta, que autores
que escrevem sobre filmes de terror têm uma propensão
a incluir “declarações mais ou menos irônicas indicando
que seu interesse [em filmes de terror] começou na
infância ou recentemente, argumentando de forma
implícita que a credibilidade que uma pessoa possui para
falar sobre o tema foi de alguma forma melhorada ou
piorada apenas em relação à época em que o interesse
do autor começou”.1
Aqui eu me junto a essa banal tradição para oferecer
minha própria declaração de interesse — comecei a
gostar de filmes de terror bem cedo, talvez com apenas
cinco anos de idade. Essa revelação vai além das minhas
confissões em relação às “florestas psicológicas” da
minha infância levemente insana.2 Minha honestidade
quanto ao consumo do terror — e quanto a gostar disso!
— é oferecida para fornecer a vocês alguma base
relacionada às minhas experiências únicas com o gênero.
Tenho esperança de que este vislumbre do meu mundo
psicológico ajude você a compreender de onde surgiram,
em parte, minhas interpretações sobre a representação
dos negros no cinema.

CONFISSÕES DE UMA CRIANÇA DO TERROR


Escrevo este livro cheia de um sentimento de posse. Eu
nasci e fui criada em Pittsburgh, Pensilvânia. Para os
verdadeiros fãs de terror, eu não preciso dizer mais nada,
pois vocês entendem o motivo de eu dizer que este livro
é o meu destino. Para aqueles que precisam de uma
pista: o lugar do meu nascimento foi o berço do Hércules
do terror, George “A noite dos mortos-vivos” Romero,
assim como do extraordinário criador de efeitos visuais
Tom “Padrinho do Gore” Savini.3
Na pré-adolescência, eu estava levemente ciente de
que literalmente seguia os passos de Romero e Savini em
meu shopping favorito de Pittsburgh — o Monroeville
Mall. O “Shopping” (como nós de Monroeville o
chamamos) é a assustadora peça central em espaço e
ideologia no filme Despertar dos mortos (1978) de
Romero. O filme também continha a magia dos efeitos
espetaculares de Savini nos mortos-vivos, ele, que
também faz uma ponta como um “zumbi motoqueiro”.
Em 1979, aos dez anos de idade, eu gostava de fazer
o que crianças entediadas do país inteiro gostam de
fazer — andar no shopping. O personagem adolescente
Flip Dog (Danny Hoch) do filme Garotos brancos (1999)
colocou este rito de passagem mundano da juventude
moderna em perspectiva de forma sucinta: “Tudo que
eles fazem é andar pelo shopping o dia todo […] Indo da
Chi-Chi’s pra Footlocker e da Footlocker pra Chi-Chi’s […]
Umas ocupações idiotas pra caralho”.4 Idiotas mesmo.
Foram as crianças da minha geração que, de forma
desavergonhada, começaram a abandonar os parquinhos
e os cantinhos de areia, preferindo andar pelas alas dos
shoppings como zumbis.
Mas o Monroeville Mall nos anos 1970 era uma coisa
realmente especial. Primeiro, porque o seu primeiro
andar era uma pista de patinação no gelo coberta. Com o
rinque envolto em acrílico, o lugar parecia o Civic Arena
(também conhecido como O Grande Iglu), lar dos
Pittsburgh Penguins. Você podia se sentar perto do Pup-
A-Go Go, um restaurante que se parecia com uma
barraca de cachorro-quente, e assistir ao pequeno Mario
Lemieuxs patinando de forma acanhada pra lá e pra cá
no gelo enquanto a pequenina e futura Michelle Kwans
ficava no centro do rinque, cruzando as pernas e
pulando. Alguns anos depois, a direção do shopping, não
aquiescendo à missiva de Romero sobre os perigos da
produção em massa, iria desmontar o idiossincrático
rinque de gelo com o Pup-A-Go Go. O lugar foi
abocanhado por uma loja de biscoitos Mrs. Fields
(trocadilho proposital).
Eu assisti Despertar dos mortos com a minha avó e
com a minha mãe no Greater Pittsburgh Drive-In, que
frequentemente exibia filmes de terror tarde da noite.
Embora tenha surgido uma década depois de A noite dos
mortos-vivos, o Despertar de Romero pareceu atrair sua
parcela de negros. Existem pelo menos duas teorias
interseccionadas sobre a afinidade dos negros em
relação ao Despertar. A primeira explicação é que, uma
década antes, muitos dos cinemas que exibiram A noite
dos mortos-vivos atendiam cidades do interior, servindo
uma audiência predominantemente negra.5 Talvez o
acesso tenha contribuído para o amor inicial dos negros
para com Romero. Contudo, creio que essa proximidade
foi apenas uma parcela daquilo que atraiu espectadores
negros para os filmes seguintes do diretor. O outro ponto-
chave foi que Noite tinha Ben! Ben (Duane Jones) — um
personagem principal negro complexo e corajoso, que se
mostrou calmo sob pressão, tomou controle de uma
situação mortal com competência, e, de forma
surpreendente, chutou alguns traseiros (brancos) e
mostrou respeito (afinal de contas, ele bate e atira em
um homem branco).
Nós, duas mulheres e uma criança, nos dirigimos até
aquele drive-in para ver se Romero nos daria mais uma
vez outro herói negro empoderado que não vacilava e
não era apelativo. Romero não nos decepcionou. Ele
provocativamente proporcionou um conquistador negro e
mais, através do personagem durão Peter (Ken Foree),
que sobrevive à praga zumbi e busca segurança com
uma estranha — uma mulher branca grávida (suspiro),
Francine (Gaylen Ross). Poderiam Peter e Francine
encontrar esperança e uma vida sem zumbis em outro
lugar? Quem vai fazer o parto do bebê de Francine
(suspiro duplo)? Seja em 1968 com Noite, 1978 com
Despertar, ou até mesmo hoje, representações desse
tipo de raça, sexo e relações de gênero continuam a ser
muito importantes.
Se não me falha a memória, minha viagem até o
drive-in com a minha família ficou ainda mais sublime
quando Noite passou logo depois de Despertar como
parte de uma dobradinha de Romero. Eu mantive o meu
sono distante para que pudesse ver Noite outra vez (eu
já tinha assistido antes), com os olhos “maduros” de uma
criança de dez anos de idade. Vi o canibalismo como algo
“nojento”. Contudo, fiquei profundamente afetada, de
forma indescritível, pelo infame final de Noite, que, na
minha mente, serviu, tanto na época quanto hoje, como
uma crítica poderosa a respeito das relações raciais. Nas
doloridas cenas finais de Noite, depois de Ben ter
vencido todas as dificuldades para sobreviver à noite
contra os zumbis canibais, ele é (simbolicamente)
linchado por uma turba de homens brancos com
espingardas. O filme refletia diretamente o clima social
da sua época. O assassinato de Martin Luther King Jr.
aconteceu no mesmo dia — 4 de abril de 1968 — em que
Romero levava Noite até Nova York para ser distribuído.
Para muitos negros em 1968, depois do assassinato do
dr. King, era plausível se questionar se um homem negro
seguro de si como Ben poderia ao menos sair da tela
grande em segurança. Embora o filme de Romero fosse
uma fantasia com seus zumbis comedores de carne,
ainda assim era um obra de realismo significante. Ele
dirigiu a atenção da audiência, exigindo que levássemos
em consideração que no mundo real dos negros as
multidões brancas são bem mais mortais.
Eu me lembro da minha avó disposta a colocar a mão
sobre uma pilha de bíblias e jurar que reconhecia um
daqueles “matadores de pretos com armas nas mãos,
este e aquele”, à medida que os via aparecendo no filme.
Eu odeio dizer isso, mas ela podia estar certa. Policiais da
área de Pittsburgh e de outros locais atuaram como
figurantes na cena principal que decidiu o futuro de Ben.
O que vimos em Despertar e Noite era realmente as
nossas experiências em Pittsburgh naquela tela.
Pittsburgh, assim como várias cidades dos Estados
Unidos nas décadas de 1970 e 1980, tornou fácil ter
certa hesitação em relação ao seu potencial progressista
(especialmente para as minorias). Pittsburgh era, e ainda
é, uma cidade segregada. Seus bairros são ricos
culturalmente, mas também servem como fronteiras
raciais. O bairro de Bloomfield é predominantemente
italiano. Polish Hill [Colina Polonesa] fala por si só. No
lado norte da cidade, os negros, especialmente aqueles
que vivem nas segregações elevadas e remotas do
projeto habitacional Northview Heights, precisam fazer
um grande esforço para chegar ao centro de Pittsburgh.
São obrigados a descer a colina mais íngreme da cidade,
atravessar “as planícies” e as pontes acima dos três rios
famosos de Pittsburgh — o Allegheny, o Monongahela e o
Ohio — para chegar no centro da cidade, também
conhecido como o “distrito cultural”. O distrito cultural
sedia alegremente shows da Broadway em turnê,
convenções e, ocasionalmente, até mesmo um festival
de filmes de terror. Para se conectar com os negros que
vivem, por exemplo, nas altitudes da região leste,
esforços comparáveis são necessários. Logo, não apenas
a conexão inter-racial é um desafio na antiga Cidade do
Aço, mas a união intrarracial também não é nem um
pouco fácil.
Romero fez a sua quarta produção da franquia dos
mortos em 2005 com o filme Terra dos mortos. O
comentário social de Terra tem tudo a ver com limites —
corporativo versus público, ricos versus pobres,
integrados versus marginalizados — e localização,
especialmente sobre como aqueles três rios reforçam
todas as formas de divisas e separações. Ao assistir
Terra, eu vibrei quando o frentista negro, que se tornou o
líder de uma facção zumbi rebelde, tomou o longo
caminho para sair do seu bairro. Ele mergulhou na área
em que os três rios se encontram e marchou no fundo
escuro das águas com seu exército de compatriotas
destituídos para expressar sua insatisfação, de uma
forma bem “especial”, em relação aos valores daqueles
que se encontravam do outro lado das faixas raciais, de
classe e corporativas no distrito cultural. Romero entende
Pittsburgh tão bem.
Pittsburgh também tem, de forma dúbia, me fornecido
algum capital de horror cultural para chamar de meu. Em
1982 o filme de terror Cão branco contou a história de
um cruel pastor-alemão treinado por um racista branco
para matar negros. Quando as pessoas comentam sobre
o enredo fantasioso de Cão branco, eu as recordo de
Dolpho, um pastor-alemão da polícia. Em um subúrbio de
Pittsburgh, em 2002, Dolpho teve três reclamações
registradas contra ele por negros que relataram ataques
sem provocação. As coisas chegaram ao limite quando o
cão preferiu atacar um menino negro de nove anos de
idade em vez de perseguir, sob o comando de seu
treinador branco, um homem branco suspeito de tráfico
que estava por perto.6 Dolpho foi suspenso da força
policial.
Atualmente, Pittsburgh também é o lar de um “clube
de encontros” de vampiros (mas qual cidade não é?) e
está trabalhando para expandir seu grupo de lobisomens
para pessoas como “Nicole”, que postou no grupo de
mensagens do site <werewolf.meetup.com>: “Olá,
pessoal. Tenho 20 anos de idade, sou mulher e
lobisomem. E só”. A cidade também possui a Associação
dos Caçadores de Fantasmas de Pittsburgh (PGHA), que
investiga atividades paranormais na área desde 2002. Os
“caçadores” da PGHA afirmam conhecer particularmente
um instrumento transcomunicador (ITC). Isso significa que
eles gravam “mensagens do além” (imagine Michael
Keaton em Vozes do além [2005]).7
Então, sim, o fato de eu ser de Pittsburgh, e de ser
uma fã de terror desde cedo, significa que trago uma
nova relação com, e uma perspectiva única sobre, os
filmes de terror.

DESAFIANDO O TERROR
Meu interesse nos filmes de terror e em suas narrativas
acerca de raça certamente não começam e muito menos
terminam nos filmes de Romero. Filmes como King Kong
(1933), com seus nativos de pele preta entoando “uga-
buga” e que se enamoram da pele branca, são
extraordinariamente úteis para jogar uma luz na forma
como entendemos o papel de raça, assim como
(imaginárias) práticas culturais. E nem me fale de filmes
como Bones: o anjo das trevas (2001), inspirados pela
cultura hip-hop, com seus temas neo-blaxploitation ao
som de rap. A corda que une todos os filmes que vou
examinar aqui é a sua habilidade de inspirar abordagens
raciais provocativas e que oferecem lições únicas e
mensagens acerca das relações raciais.
Eu mostrarei neste livro que existem muitos filmes de
terror que contribuem para a conversa sobre negritude.
Acredito que seja particularmente importante entender
que existe uma miríade de filmes de terror, geralmente
feitos por criadores negros como Spencer Williams (O
sangue de Jesus, 1941), Bill Gunn (Ganja & Hess, 1973) e
Ernest Dickerson (Def by Temptation, 1990), que exibem
temática negra, elenco negro e cenários negros que
contribuem para o conteúdo inovador do gênero.
O horror tem algo a dizer sobre religião, ciência,
estrangeiros, sexualidades, poder e controle, classe,
papéis de gênero, origem do mal, sociedade ideal,
democracia etc. Esses tópicos mudam completamente de
figura quando são examinados sob a ótica da cultura
negra. Meu ponto é: a história da negritude contada pelo
terror é interessante e complexa. Enquanto o terror às
vezes tem sido marcado pela sua reputação de “filme B”,
de baixo orçamento e/ou de gênero explorador, é
impossível negar sua capacidade única de expor as
questões e preocupações do nosso mundo social,
incluindo nossas sensibilidades raciais.8
“Uma forma de rebaixar o gênero do terror”, escreve
Hutchings, “é subestimar sua audiência […] dizendo que
as únicas pessoas que possivelmente podem gostar
desse tipo de coisa são doentes ou estúpidos (ou doentes
e estúpidos)”.9 Eu não quero desconsiderar o que para
alguns é uma “pulga atrás da orelha” no que diz respeito
aos filmes de terror. Muitos desses filmes são, realmente,
repletos de sanguinolência (a doença) e com roteiros
fracos (a estupidez). Filmes de terror raramente são
coisas dignas de vencer um prêmio no Festival de
Cannes, mas o seu público pode ser bem mais esperto do
que alguns críticos e acadêmicos imaginam. Esse público
entende que o gênero como um todo não é inerte, e que
realizadores de filmes de terror revelam algo muito,
muito mais horrorizante: que o nosso mundo e as
relações são realmente unidos por pouco mais do que
cola de peruca spirit gum.
A noite dos mortos-vivos é um clássico cult agora. Os
aficionados do gênero concordam que foi uma das
maiores contribuições de Romero para o gênero e para a
mídia. Contudo, já se passaram algumas décadas desde
que Noite exigiu que nos perguntássemos o que era mais
assustador: zumbis comedores de carne, ou aquilo que
fazemos uns com os outros diariamente.
Então, aí está. Eu obviamente acredito que o gênero
do terror tem uma grande promessa revelatória e é isso
que me move a explorar sua miríade de definições de
negritude, assim como aquilo que o gênero revela sobre
os tipos relevantes de personagens negros, em relação
aos níveis de participação dos negros em filmes e a
respeito da contribuição negra para o nosso mundo
social.
HORROR
NOIRE

INTRO
ESTUDANDO NEGROS E FILMES DE
TERROR

:01 segundo de início do filme Jurassic


Park: o parque dos dinossauros (1993): O
guarda negro sem nome #1 é empurrado
para dentro de uma cela com um
velociraptor em movimento [Oh, não.
Tome cuidado guarda negro #1!] :04
segundos depois, o guarda negro #1 é
transformado em um verdadeiro purê pelo
velociraptor.

Jurassic Park talvez tenha sido um entretenimento de


ficção científica emocionante para alguns naquele
cinema escuro em Columbia, no estado do Missouri, mas
para mim essa primeira cena de aniquilação negra
prometia um show de terror. Eu me lembro de ter
passado vários minutos em luto pelo guarda negro #1
(Jophery C. Brown), cuja morte foi testemunhada com o
único propósito de evidenciar o que todos já sabíamos —
que o velociraptor é um monstro terrível. Para se
certificarem disso, diretores como Steven Spielberg
brincam de forma sagaz com as expectativas da
audiência, incluindo a descoberta de que não há modo
melhor de mostrar a letalidade extrema de alguém, ou
algo, do que assegurar uma vitória sanguinária em
detrimento de um homem negro com uma gigantesca
arma negra.
Enquanto as pessoas ao meu redor no cinema davam
risadinhas com as bizarrices do encontro entre crianças e
dinossauros, eu me sentia estranhamente
desconfortável… talvez porque eu estivesse olhando
para o cepo ensanguentado do engenheiro (negro) Ray
Arnold (Samuel L. Jackson) do Parque dos Dinossauros.
Ele também tinha sido capturado pelos dinossauros. Ray
não era o advogado desagradável, o ladrão de segredos
corporativos, ou mesmo o grande caçador, que foram
todos merecidamente devorados pelas criaturas. Assim
como o guarda negro #1, Ray Arnold era inocente;
portanto, os dois únicos personagens negros do filme
foram unidos pelo fato de terem experimentado mortes
horríveis e absolutamente injustificadas.
O objetivo dessa lembrança é revelar que, às vezes,
os negros têm uma relação bastante única com a
representação dos negros em filmes estadunidenses. Ao
assistirem um filme, alguns levam, ou vão embora
carregando, expectativas culturalmente específicas — o
que Kozol chama de “o olhar racial”1 —, esperando ver a
si mesmos como sujeitos completos, redondos e
complexos em vez de simples “ornamentos no set de
filmagem”2 ou carne humana para elevar a
sanguinolenta contagem de corpos.
Em Horror Noire: A Representação Negra no Cinema
de Terror, eu estou interessada naquilo que o terror pode
revelar, por meio das representações, sobre nosso
entendimento dos negros e dos tropos da cultura negra,
ou negritude, bem como em saber com que tipos de
discursos sociopolíticos esses filmes contribuem e quais
significados provocam. Mais ainda, eu especulo sobre os
ímpetos acerca das narrativas e imagens racializadas dos
filmes de terror. Em meus esforços para rehistoricizar e
recontextualizar os filmes de terror, eu noto como o
gênero “fala” sobre diferença. Isto é, marcando as
pessoas negras e sua cultura como o Outro — à parte
das populações e culturas dominantes (brancas) nos
Estados Unidos. O título principal do livro, Horror Noire,
funciona como uma espécie de duplo sentido. Ele
referencia o “escuro”, ou o “noire” (como em bête noire),
e ao mesmo tempo oferece um reconhecimento das
relações complexas do horror com o bem e o mal, certo e
errado, assim como um outro gênero, o filme noir,
também lida com essas questões. Contudo, este livro não
toma o filme noir como foco. Em vez disso, Horror Noire é
um título que trabalha para saudar e unir a riqueza das
formas populares de cultura oferecidas com foco nos
negros norte-americanos — que também se apropriam
da palavra francesa noir(e) para se referir a “negro” —
por exemplo: Noire Digerati, uma organização
tecnológica que foca na inclusão de negros no
desenvolvimento de jogos, computação móvel e mídia
interativa;3 ou o livro Black Noir, composto por escritores
afro-estadunidenses de histórias policiais;4 ou o site
NetNoir, um portal de notícias e política que trabalha sob
“uma perspectiva afro-estadunidense”.5
O terror é um gênero que, de acordo com Mark Reid
em Black Lenses, Black Voices: African American Film
Now, exige escrutínio quando “a diferença demoniza
personagens e cria ou resiste a noções estáticas de bem
e mal”.6 Isso não quer dizer que apenas os filmes de
terror que apresentem, ou lidem, com nossas
desigualdades sociais ou que debatam nossa hipocrisia
mereçam ser estudados. Para o escritor de livros de
terror Stephen King, aquilo que está enterrado sob a
fantasia de terror é válido o suficiente; como ele afirma:
“para início de conversa, nós entendemos que a ficção é
uma mentira. Ignorar a verdade dentro da mentira é um
pecado contra o ofício”.7 Para nos certificarmos, a
intrínseca “qualidade fantástica [do horror] produziu mais
pensamentos imaginativos, inovadores e provocadores
(bem como tortuosos e confusos) do que é por vezes
aparente naquelas áreas de representação mais
engessadas pelas exigências do realismo”.8 Por meio da
sua imaginação, inovação e inclinação à provocação, o
terror não apenas comenta sobre a cultura negra, mas,
como Clover afirma, também “dedura” a mídia
dominante, reparando seus lapsos em relação a
convenções, visões culturais e representacionais e
coragem.9
O que eu procuro evitar aqui é tratar o gênero do
terror como “uma longa cadeia de códigos imutáveis”
onde as mudanças históricas significativas são
descartadas como “pouco mais do que variações
insignificantes”.10 Outros estudiosos têm trabalhado de
forma eficiente e influente para identificar e organizar o
tratamento dos negros ao longo do tempo na cultura
popular e na mídia. Por exemplo, Brown categoriza os
tipos de personagens negros frequentemente vistos na
literatura dominante no início do século XX como
“escravo contente” ou o “livre miserável”.11 Clark12
contribuiu com uma tipologia organizada em torno da
participação negra, ou da falta dela, na mídia. Ele
identifica representações recorrentes e modismos como
o “não reconhecimento” (ou ausência) e o “ridículo”.
Nelson13 e Coleman14 focam nos sitcoms de televisão
para providenciar uma rubrica que elucida o impacto
sociopolítico dos discursos de mídia que incluem as
mensagens nas entrelinhas de “separados mas iguais” e
“assimiladores”. Em Horror Noire, eu comecei a apreciar
essas e outras contribuições organizacionais
importantes, enquanto inovo meu próprio exame
histórico — década por década — da participação negra
no gênero dos filmes de terror.
Ainda assim, tomei bastante cuidado para não
encaixar forçosamente este histórico dos filmes de terror
em décadas. Contudo, a posteriori, minha análise
realmente revelou um ciclo de representações que
coincide com a ascensão e queda dos rumos
sociopolíticos em cada década, e apresento aqui meu
entendimento e a minha interpretação dos eventos.
Ainda que delineado por década, o gênero do terror
apresenta tanto tendências de longa duração e que
atravessam eras quanto alguns modismos temporários.
Eu trabalho bastante para notar exemplos de cada um.

O TERROR COMO UM GÊNERO (RESISTENTE)


A questão imediata, dada a constante simultânea (por
exemplo, medo e violência) e a natureza flexível (por
exemplo, bom gosto e estética) do gênero, é: “O que,
então, constitui um filme de terror?”. É válido notar de
imediato que discutir o que entra ou sai dos limites de
um gênero é um processo complexo, quiçá impossível e,
às vezes, infrutífero. Hoje, especialmente na era da
multimídia e das novas mídias tecnológicas, limites
puristas e genéricos são extremamente difíceis de ser
definidos. Seria um filme de terror, um filme de verdade,
apenas se estiver, vamos dizer, numa tela de cinema
hollywoodiana, ou podemos aceitar agora que o terror
encontrou sua casa em telas cada vez menores (como as
tecnologias digitais portáteis)? Pode o filme de terror ser
feito não apenas por grandes estúdios, ou estúdios
independentes, mas também por um ou dois indivíduos
com uma câmera digital, um roteiro que de roteiro não
tem quase nada e orçamento zero? O Jurassic Park, por
exemplo, seria um filme de aventura, ficção científica,
uma comédia, ou todas as opções ao mesmo tempo?
Continuando com o exemplo de Jurassic Park, o filme se
aproximaria da categoria de terror por causa dos seus
monstros assassinos, do sentimento de medo que causou
ou mesmo porque ao menos uma pessoa da plateia o
interpretou como um filme de terror com base em sua
crença de que a taxa de mortalidade entre as pessoas
negras no filme, embora baixíssima, seja assustadora?
Essas questões revelam que, mesmo juntando mídia,
produção e recepção, não é possível conseguir uma
definição clara.
Hutchings, em seu livro The Horror Film, está certo em
sua observação de que as definições são fugidias: “quais
filmes são terror e quais filmes não são é uma questão
que continua sendo uma incógnita […], talvez a
característica mais emocionante e impressionante do
cinema de horror nesse aspecto seja que, assim como
um de seus monstros metamorfos, o gênero está sempre
mudando, sempre em processo”.15 Contudo, aceitar a
inconclusão é insatisfatório aqui, já que, dentro do
contexto deste livro, é útil abordar pelo menos algum
entendimento sobre o que seria, e o que não seria, um
filme de terror.
Certamente, a noção de gênero e a prática de
distribuir tipologias, especialmente dentro do terror, são
“particularmente contestadas”.16 Hoje, nosso
entendimento de gênero vai além das noções iniciais
aristotélicas/Poética e daquelas de Northrop
Frye/Anatomia da crítica17 de desafiar as fórmulas e
convenções distintas e separadas das formas de arte
para criar um sistema classificatório. Em vez disso, o
gênero tem muito a ver com o poder heurístico que
envolve a nomeação de “algo”, e também se relaciona
com eufonia sociopolítica. Ao “nomear algo”, Gateward
nos ajuda a revelar a profundidade do problema; como
ela aponta: “na verdade, existem tantos filmes de
vampiro com tantas convenções compartilhadas em
relação a temas e personagens, que o filme de vampiro
acabou se tornando um gênero por si só”.18 O mesmo
pode ser dito sobre negros em filmes. Isto é, existem
tantos filmes exibindo a negritude, compartilhando de
tantas convenções, que filmes negros se tornaram um
gênero por si só.19
Marcar ou nomear alguma coisa, no fim das contas, é
intrinsecamente perigoso porque pode subordinar ainda
mais essa coisa (como a figura da mãe versus a mãe que
depende da ajuda do governo).* Contudo, a nomeação
de algo contém o potencial de ser politicamente
poderoso e pode funcionar para expor materiais de
qualidade que teriam permanecido invisíveis de outra
forma. Por exemplo, existem categorias úteis e criativas
criadas em reconhecimento aos motivos recorrentes e
papéis disponíveis para a negritude. Quando chamamos
certos filmes de “blaxploitation”, por exemplo, a
nomenclatura serve tanto para expor uma certa
categoria de filmes cheia de estereótipos sobre as
relações raciais, papéis de gênero, sexo e violência, e
também funciona como uma crítica em relação àqueles
que criaram os estereótipos, a economia política
(investimentos financeiros, distribuição e marketing) por
trás de tais esforços, e a recepção e o grande impacto
cultural que as imagens contêm dentro e fora do escopo
da negritude. Categorias adicionais, guiadas pelo
consenso cultural, impacto social, assunto tratado, estilo,
técnica ou qualidade, continuam a surgir a todo
momento, como os “filmes de gueto”, tipo Os donos da
rua (1991) ou Perigo para a sociedade (1993). De forma
compreensível, muitos se recusam a categorizar filmes
por meio de alguma espécie de raciologia. Esse tipo de
alocação corre o risco de criar uma sobredeterminação
de todas as formas de variáveis das diferenças, como
visão de mundo, classe, sexualidade, gênero etc. Ainda
assim, David Leonard criou um argumento convincente e
persuasivo para delinear filmes negros a fim de facilitar o
estudo em Screens Fade to Black: “é preciso analisar o
cinema negro como um fenômeno em si — como algo
que possui a sua própria história, tradição cultural e
normas expressivas (africanismo, tradição oral, estilo
narrativo, espiritualidade, sincretismo, hibridização)”.20
Assim sendo, o que, então, é o terror conceitualizado
aqui? Eu tomo a discussão de Phillips acerca das
definições em seu livro Projected Fears: Horror Films and
American Culture.21 Nessa obra, ele argumenta que o
terror, como um gênero, é marcado por aquilo que é
reconhecível instantaneamente como aterrorizante;
aquilo que corresponde a nossa compreensão e
expectativa do que é aterrorizante; e por aquilo que é
discutido e interpretado como sendo parte do terror.
Isabel Christina Pinedo, em Recreational Terror: Women
and the Pleasure of Horror Film Viewing, sintetiza de
forma hábil a variedade das considerações acerca do
terror, definindo o gênero de acordo com cinco
descritores: (1) o horror perturba o mundo corriqueiro;
(2) infringe e viola limites; (3) incomoda a validez da
racionalidade; (4) resiste aos fechamentos narrativos; e
(5) trabalha para evocar o medo.22 Na verdade, neste
livro, eu acredito que seja mais proveitoso abordar o
nosso entendimento dos filmes de terror por meio de um
apanhando de considerações. Ao fazê-lo, eu tento evitar
as armadilhas e os limites de estabelecer categorias
fixas, enquanto dou crédito à ambiguidade e abertura
textual ou polissemia.
Há muito o que considerar quando exploramos o
terror, e existem limites em minha análise. Em minha
abordagem crítica cultural/crítica racial, eu notavelmente
omito o psicanalítico, além da ênfase na agressão e na
violência, que contribuíram na definição de um
conhecimento sobre os filmes de terror. Meu
questionamento sobre identidade cultural e mensagens
mediadas apresenta um interesse diferente daquelas
questões focadas nos efeitos do terror e da violência
sobre a psicologia e o desejo de sangue dos
telespectadores reais. Enquanto o meu desinteresse em
relação à psicanálise é guiado pelas minhas questões
culturalmente focadas, Hutchings apresenta uma
perspectiva mais pessimista das leituras psicanalíticas,
descrevendo tais críticas cinematográficas como
“profundamente problemáticas”, em grande parte por
causa de seu embate naquilo que se refere a “noções de
coletividade, economia, tecnologia, história, raça e
classe”.23 Jonathan Lake Crane, em Terror and Everyday
Life, também expressa dúvidas acerca do foco em
“violência nas telas […] desejo libidinoso ou qualquer
outro tipo de agitação psíquica”.24
Outra marca do gênero de terror é a sua
complexidade. Assim como é capaz de fornecer as
narrativas mais empolgantes, heroicas e imaginativas, o
terror também pode produzir filmes de violência
assustadora, repugnante e indescritível. Não é possível
ignorar que as violências psíquicas e emocionais são
frequentemente centrais no gênero. Enquanto filmes
(hiper)violentos e dramáticos dos gêneros de guerra,
crime e suspense, como Pulp Fiction: tempos de
violência, O resgate do soldado Ryan e Onde os fracos
não têm vez são aclamados criticamente e poupados dos
desvios acadêmicos em pesquisas experimentais sobre
agressão e perturbações psicológicas, é impossível
ignorar a dependência que o horror guarda na violência
como ferramenta narrativa. É reconhecido aqui que não é
apenas o derramamento de sangue que constitui um
filme de terror, mas “o contexto niilista no qual a
violência ocorre”.25 É fácil perceber como a violência do
filme de terror veio a ser vista como algo esvaziado de
qualquer valor elucidativo. Talvez tenhamos que
agradecer aos filmes de assassinos sanguinolentos por
isso (por exemplo, Baile de formatura [1980]). Contudo, o
que observamos aqui é que, muitas vezes, a violência no
terror e na negritude trabalham juntas para prover
incursões discursivas importantes, como a violência
exibindo algum tipo de “retorno do re/oprimido”. Aqui, a
violência, seja ela gratuita ou assertiva, não irá encobrir
as narrativas revelatórias de negritude que os filmes de
terror têm para oferecer.

NEGROS NOS FILMES DE TERROR


(VERSUS FILMES NEGROS DE TERROR)
Este livro contribui para o diálogo acerca do filme de
terror ao oferecer duas categorias adicionais para o
léxico. A primeira é filmes de terror “com negros” e a
segunda é “filmes negros” de terror.
Filmes de terror “com negros lidam com a população
negra e a negritude no contexto do terror, ainda que o
filme de terror não seja completamente ou
substancialmente focado em um ou outro. Contudo,
esses filmes possuem um poder discursivo particular em
seu tratamento da negritude. Esses filmes de terror
geralmente são produtos de grandes estúdios, embora
não universalmente. Eles têm sido produzidos, histórica e
tipicamente, por pessoas não negras para o consumo
mainstream. Filmes de terror “com negros” apresentam
algumas das imagens mais importantes para se entender
como a negritude é representada. Exemplos de filmes de
terror “com negros” que serão discutidos neste livro
incluem King Kong (1933), A noite dos mortos-vivos
(1968), A maldição dos mortos-vivos (1988) e O mistério
de Candyman (1992). O elo que une muitos desses
filmes, primeiramente, é que eles tendem a provocar um
consenso do que constitui um filme de terror — eles
perturbam nossas noções de uma vida racional,
mundana e segura. Em segundo lugar, esses filmes
contribuíram de maneira significativa para as discussões
e debates em relação não apenas à negritude, mas
também à sua proximidade com interpretações acerca do
que é aterrorizante e onde ela é incorporada. Esses são
filmes que frequentemente “codificam o monstro como
um Outro racial associado a uma poderosa religião
selvagem”.26 Na verdade, nós vemos o Outro racial em
filmes como O mistério de Candyman, e a religião negra
como selvagem e poderosa em A maldição dos mortos-
vivos. Além disso, esses filmes são “mais
hiperbolicamente preocupados do que nunca com a
questão da diferença” (citado em Grant 2).27
Não estão incluídos neste livro os filmes de terror que
não fornecem uma percepção significativa relacionada ao
legado que une a negritude com o horrorizante. Excluí os
filmes nos quais personagens negros são incidentais ou
estão ali só para marcar presença, e dos quais algum
comentário sobre a negritude também está ausente —
exceto para dizer que se trata de algo com pouca
relevância. A inclusão de filmes como Chamas da
vingança (1984) ou O mestre dos desejos (1997), em que
os negros são relegados “ao status de vítimas,
personagens descartáveis amplamente
subdesenvolvidos”,28 foi omitida desta análise. Contudo,
aqui foram incluídos casos de filmes que falam muito
sobre negritude, ainda que por meio de sua exclusão. A
omissão completa dos negros e da negritude revela
muito sobre a nossa cultura estadunidense em diferentes
pontos da história. Por exemplo, existem razões
intrigantes para o fato de haver poucos — ou uma total
ausência de — negros nos subúrbios da década de 1980
em que monstros como Freddy Krueger e Michael Myers
caçavam e eram caçados. Isso significa que um filme não
precisa ter um personagem negro para dizer algo sobre
ou contra a negritude. As discussões a respeito de filmes
que parecem oferecer metáforas raciais também serão
incluídas. O monstro da lagoa negra (1954), em
particular, é um filme que não possui uma presença
negra significativa em tela, mas merece atenção por
exibir o herói branco ocidental moderno cuja missão
primordial é proteger uma mulher branca similarmente
situada de um monstro negro primordial.29
Também é válido levar em consideração as noções de
aparência do bem e do mal em um filme. Isso quer dizer,
por exemplo, que existem alguns contribuintes para a
categoria de filmes de terror “com negros” que merecem
a nossa atenção por causa de sua significativa
contribuição para o nosso entendimento do negro-como-
monstruosidade. O nascimento de uma nação (1915), o
épico pró-Ku Klux Klan da Guerra Civil, é um filme que
elenca os negros de forma escandalosa como figuras
horríveis — eles são monstruosos, bichos-papões
selvagens (frequentemente homens) que possuem
práticas culturais perturbadoras. Logo, neste livro, a
definição de filmes de terror “com negros” pode ir além
das expectativas tradicionais daquilo que constitui um
filme de terror para revelar — em forma e processo —
que aquilo que aterroriza é solidificado na imaginação.
Alguém irá se perguntar inevitavelmente por que este
ou aquele filme não entrou no livro. O critério para a
inclusão que foi empregado aqui se relaciona à saliência
em exemplificar as eras históricas e os temas que os
próprios filmes trabalharam para criar e informar. O
objetivo não é ser enciclopédico.

FILMES NEGROS DE TERROR


(VERSUS FILMES DE TERROR COM NEGROS)
Existe um segundo tipo de filme tratado neste livro, os
“filmes negros” de terror. Filmes negros de terror são
constituídos por muitos dos mesmos indicadores dos
filmes de terror, como a perturbação, monstruosidades e
medo. Contudo, filmes negros de terror são filmes
“raciais” na maioria das vezes. O que significa que
possuem um foco narrativo adicional que chama a
atenção para a identidade racial, nesse caso, a negritude
— cultura negra, história, ideologias, experiências,
políticas, linguagem, humor, estética, estilo, música e
coisas do tipo. Filmes negros, diz (e acautela) Cripps:

[…] têm um produtor, diretor e escritor, ou


artistas negros; que falam com o público negro
ou, de forma incidental, com o público branco
possuidor de curiosidade sobrenatural, atenção
ou sensibilidade em relação aos assuntos
raciais; e isso emerge de intenções conscientes,
sejam elas artísticas ou políticas, para iluminar a
experiência afro-estadunidense. […] Se
fôssemos trazer essa definição para âmbitos
mais pontuais, nós iríamos discutir eternamente
sobre quem tem o direito de participar da
dança.30
Em resumo, os negros podem aparecer em todos os tipos
de filmes de terror, mas os próprios filmes podem não ser
negros em si, em relação ao criador, público ou a
experiência que apresentam. É válido notar o
apontamento que Yearwood coloca de que a compleição
do criador do filme e do público não são medidas
suficientes para se definir um filme negro, seja de terror
ou não. O filme negro trata sobre a experiência negra e
as tradições culturais negras — um meio cultural e
histórico negro girando e impactando as vidas negras nos
Estados Unidos. Embora seja difícil definir um filme
negro, isso não quer dizer que ele não exista, apenas que
é algo dinâmico de onde novas estéticas e limites
surgem.31
Neste livro, Def by Temptation (1990) é um “filme
negro” de terror. É feito por produtores negros: James
Bond III é o autor, diretor e produtor, e Ernest R.
Dickerson é o diretor de fotografia. Apresenta um elenco
todo negro, incluindo Bond, Kadeem Hardison e Samuel
L. Jackson. Ele saúda o público negro ao apresentar
cantores de R&B, como Melba e Freddie Jackson, e lida
com tropos específicos da cultura negra — invoca rituais
das igrejas sulistas negras, espaços negros urbanos,
performances de masculinidade negra, vernáculos
negros, música, estilo e outras características estéticas.
Contudo, é importante notar que nem todos esses
elementos precisam estar presentes para que um filme
seja “negro”.
Ao contrário, existem filmes de terror que voltam sua
atenção para a negritude, mas falham em ser filmes
negros. As criaturas atrás das paredes (1991) é oferecido
por um criador de imagens não negro (Wes Craven). O
filme é notável por ter o personagem “Fool”, uma criança
negra ladra, como protagonista. Mas a produção também
estrela um casal branco incestuoso, “Mãe” e “Pai”, que
são os antagonistas grotescos. As criaturas atrás das
paredes exibe Mãe e Pai como senhores do gueto em um
bairro pobre predominantemente negro. Além dos negros
criminosos e negros pobres, o foco narrativo recai em
cima de Mãe, Pai e de uma “filha” branca, Alice, que foi
sequestrada e sujeitada a abusos. Assim sendo, As
criaturas atrás das paredes trata da branquitude com um
elenco e uma equipe majoritariamente brancas, assim
como seu impulso textual. Pelas minhas contas, trata-se
de um esforço do tipo filmes de terror com negros.
Contudo, o ponto de igualdade entre os dois filmes, Def e
As criaturas, é que, como argumenta Tony Williams,
assim como vários outros filmes de terror, ambos contêm
“temas altamente relevantes para o público que ocupa
uma posição marginal na sociedade”.32
Outro filme dirigido por Wes Craven, Um vampiro no
Brooklyn (1995), foi escrito pelos afro-estadunidenses
Eddie e Charlie Murphy e Vernon Lynch. O filme estrela,
além de Eddie Murphy, os atores negros Angela Bassett,
Allen Payne, Kadeem Hardison e John Witherspoon. A
produção conecta o Caribe com uma vizinhança negra no
Brooklyn, apresenta formas de arte negras e conta com
um humor derivado culturalmente. Aqui, Um vampiro no
Brooklyn é tratado como um filme negro de terror. É
válido lembrar, então, aquilo que o estudioso de cinema
Ed Guerrero escreve em Framing Blackness: “nenhum
filme hollywoodiano de imagem negra é fruto da
inspiração ou esforço de um indivíduo, mas um esforço
colaborativo no qual estética, economia e política
compartilham (às vezes de forma antagônica)
influências”. 33

Juntos, filmes de terror “com negros” e “filmes


negros” de terror oferecem uma oportunidade
extraordinária de se examinar como raça, identidades e
relações raciais são construídas e representadas. Talvez o
mais interessante para os dois tipos seja quando e de
que maneira esses filmes posicionam de forma variada
os negros como a coisa que horroriza ou como a vítima
que é horrorizada. A narrativa única do gênero de terror,
assim como sua estética e suas qualidades comerciais,
providencia a noção de que “o gênero, mais do que
nunca, se mostra ‘útil’ para debater os dilemas da
diferença”.34 Certamente, o terror sempre prestou
atenção aos problemas sociais de forma provocativa. No
entanto, este momento da sociopolítica estadunidense —
nas interseções da globalização de mídia, formação
identitária, performance e circulação, entendimento de
raça (negritude em particular e a noção de uma era pós-
racial), além do acesso a (e o uso de) novas tecnologias
— é um momento ideal para mergulhar nesse fenômeno
cinematográfico, criador de raças e ideologias.

FLUXO EPISTEMOLÓGICO
Horror Noire é guiado por várias conjecturas básicas. A
primeira delas é que o estudo de raça continua a ser
importante. Em seu livro Darkwater: Voices from Within
the Veil (1920), W.E.B. Du Bois nota que, ao focar no
assunto de raça nos Estados Unidos, ele se encontra
mais uma vez escrevendo (tristemente) acerca de um
tema “sobre o qual grandes almas já disseram grandes
palavras”.35 O tema da raça não perde o interesse para
Dubois pelas mesmas razões que o impeliram a escrever
sobre o assunto pela primeira vez — o problema sempre
presente da divisão entre cores. O “estranho significado
de ser negro” no início do século XX, quando Dubois
escrevia, nos seguiu até o século XXI. O “estranho
significado” de ser negro neste milênio continua a se
referir, em partes, ao “problema da divisão entre cores”
(ao contrário das proclamações recentes a respeito de
uma sociedade pós-racial). Trata-se de um questão ainda
exacerbada pelo “sentido de sempre olhar para si
mesmo por meio dos olhos de outros, de medir a própria
alma pela fita métrica de um mundo que o olha com
divertido desdém e pena”.36 Para o historiador de cinema
Thomas Cripps, os filmes de Hollywood, “desde o início”,
tiveram um papel vital em aguçar a distinção da linha de
cor, enquanto trabalhavam de maneira efetiva para
espalhar as crenças raciais e as angústias da
sociedade.37 Este livro também leva em conta um
número de “-ismos”. Ele interroga as consequências do
racismo, machismo, classismo, separatismo,
heterossexismo, noções de masculino e masculinidade,
assim como de feminino e feminilidade. As notórias
estudiosas feministas Patricia Hill Collins e bell hooks
exigem que entremos em sintonia com as intersecções e
interconexões entre discursos dominantes sobre raça,
classe, gênero e sexualidades. Assim sendo, este é um
projeto de viés negro/feminista no qual os negros são
identificados como sujeitos, e não apenas como objetos
(o que também é o caso em muitos destes filmes); a
realidade histórica da negritude de acordo com os filmes
é definida e exposta; e a história do filme negro de terror
é contada de um vantajoso ponto de empoderamento e
com o objetivo de elevar a consciência.38
Este livro é também uma extensão do ensaio “Her
Body, Himself: Gender in the Slasher Film”,39 de Clover, e
da obra de Pinedo, que, em Recreational Terror: Women
and the Pleasures of Horror Film Viewing,40 argumenta
que há mais nos filmes de terror do que misoginia,
violência e olhares voyeurísticos. Embora esses e outros
casos problemáticos de “-ismos” sejam encontrados nos
filmes, este livro argumenta que também existem
oportunidades — ainda que não haja muito esforço —
dentro dos filmes para perturbar ou eviscerar nossas
visões dominantes e presunçosas acerca do lugar de
cada um no mundo. Questões perturbadoras de mácula,
escuridão e bufonaria não são as únicas intenções deste
livro. Em vez disso, o terror também tem sido um meio
capaz de tomar todos os tópicos de empoderamento e
revolução para reescrever os lugares do heroísmo e da
maldade. “Embora os paralelos diretos entre as forças
sociais e a cultura popular sejam arriscados, na melhor
das hipóteses”, estão presentes aqui dois entendimentos
distintos a respeito do funcionamento da participação
negra nos filmes de terror.41 Na primeira instância, os
negros têm sido mostrados como deficientes — infantis,
contaminosos, situados nas esferas mais baixas da
escala socioeconômica, servindo de metáfora e como
catalizadores do mal, e demonizados, ainda que nem
sempre tenham sido escalados, propriamente, no papel
do diabo. No segundo momento, este livro trabalha para
revelar como o gênero do terror tem o potencial de
desmitificar representações onerosas dos afro-
estadunidenses, que são calcadas em, e derivadas de,
um tipo de “menestrel do fim do século”.42 Ao contrário,
a negritude pode ser tão madura, temente a Deus e
resistente ao mal, inteira e completa, sábia e antiga,
totalmente engajada contra o mal, e estar presente no
centro ou nas cercanias das edificações de bondade.

UM SÉCULO DE HORROR NEGRO


O capítulo 1, “O nascimento do bicho-papão negro:
pré-1930”, começa com os filmes mudos e os curtas
“antropológicos” como Native Woman Washing a Negro
Baby in Nassau, de 1895, para situar como os negros
eram representados e a negritude era percebida nos
primeiros anos do cinema. Este capítulo descreve de que
maneira filmes iniciais (usando a pintura facial
blackface), como A Nigger in the Woodpile, de 1904,
eram apresentados como curtas humorísticos para a
população não negra, mas também podiam ser
interpretados como horror por causa de suas
representações de ataques violentos e criminosos contra
as comunidades negras. Esses filmes não apenas
refletem as sensibilidades do tempo, mas também
apresentam lições devastadoras acerca da hierarquia
racial e supremacia branca na virada do século XX. O
capítulo também examina o uso de convenções do horror
por parte de inovadores do cinema como George Méliès,
um cineasta e ilusionista que apresentou um dos
primeiros casos de filmes de terror “com negros”, e D.W.
Griffith, um diretor de cinema que ofereceu um dos mais
duradouros e pérfidos entendimentos dos negros como,
literalmente, bêtes noires, ou feras negras. Essa era do
cinema também é notável por sua contribuição seminal à
mídia do entretenimento pelos cineastas negros
pioneiros do país, os quais buscavam desafiar as
miríades de discursos danosos que igualavam a
negritude à maldade.
Esse capítulo revela que cineastas negros como John
W. Noble e Oscar Micheaux, por meio de Deus e a
humanidade (1918) e Nos limites dos portões (1920),
respectivamente, trabalharam para combater as imagens
racistas ao apresentarem negros nas telas como figuras
desenvolvidas e complexas.
O capítulo 2, “Febre da selva — um romance de
horror: os anos 1930”, revela a fascinação do terror por
figuras de primatas predadores, assim como sua
tendência narrativa problemática de identificar negros e
macacos como inseparáveis na escala evolutiva. Negros
e primatas nesses filmes de terror “com negros” são
ligados, como alguns já observaram em relação à
representação de King Kong (1933). Também, durante
esse período, eles estão explicitamente (de forma literal
e figurativa) unidos pela biologia — quer dizer, negros e
primatas são apresentados procriando (bestialidade),
produzindo, dessa maneira, a cria de negros/macacos
que são indistinguíveis em sua primitividade. O capítulo
então se dirige para a ilha de Hispaniola, e para o Haiti. O
país viu trabalhadores negros escravizados trazerem
práticas culturais que eram vistas como estrangeiras na
melhor das hipóteses, e deficitárias na pior delas, pelos
colonizadores franceses, espanhóis, norte-americanos e
britânicos. Práticas e religiosidade de matriz africanas
foram exotizadas de forma imagética e distorcidas
durante essa década em filmes seminais como Zumbi
branco (1932).
No terceiro capítulo, “Bandidos aterrorizantes e
miseráveis menestréis: os anos 1940”, eu examino a
transição que os filmes de terror fazem ao exibir os
negros como símbolos perigosamente mortais do mal
(por exemplo, os malignos praticantes de vodu) para
mostrá-los como um povo digno de ser alvo de risadas e
ridicularizações. Explorando a presença e o uso de
negros como alívio cômico no terror, o capítulo foca nas
contribuições de atores como Willie “Sleep ’n’ Eat” Best e
Mantan Moreland e suas performances influenciadas
pelos shows de menestréis (por exemplo, O rei dos
zumbis [1941]). Em seguida, o capítulo se atenta à
qualidade crescente e poderosa dos “filmes negros” de
terror. Esses filmes revelam uma confiança em contos
moralizantes que definem a imoralidade como uma porta
ao mal sobrenatural. Os filmes de Spencer Williams (O
sangue de Jesus [1941]), por exemplo, são usados para
ilustrar como o monstruoso é definido quando criadores
(conscientes de raça) estão no controle.
O capítulo 4, “Invisibilidade negra, ciência branca e
uma noite com Ben: os anos 1950-1960”, conta a história
de como Hollywood mudou o foco de sua atenção dos
males sobrenaturais para os males tecnológicos. Tem
início a Era Atômica e, com ela, surgem temas
assustadores que dão conta de como a ciência e a
tecnologia se perdem quando a experimentação e a
descoberta não são supervisionadas. Uma vez que os
norte-americanos achavam que os laboratórios eram o
berço das coisas mais terríveis (como a bomba de fusão),
Hollywood considerou que esses espaços de realizações
intelectuais e inventivas estavam fora do alcance dos
negros (isto é, na imaginação da mídia, os negros não
poderiam ser eruditos analíticos). Como resultado, os
negros foram omitidos do gênero ou relegados aos
papéis coadjuvantes de lanches para insetos mutantes.
Monster from Green Hell (1957) é a epítome desse
modismo. Nesse capítulo também detalho a grande
significância cultural do clássico cult A noite dos mortos-
vivos (1968), do diretor George Romero, um filme que
falou direta e abertamente sobre os problemas sociais e
o clima racial dos Estados Unidos nos anos 1960.
Os negros voltam aos filmes de terror querendo
vingança (trocadilho intencional), conforme detalhado no
capítulo 5, “Grite, branquelo, grite — retribuição,
mulheres duronas e carnalidade: os anos 1970”. Nele, eu
aponto o retorno dos negros para o terror, tanto nos
“filmes negros” de terror quanto nos filmes de terror
“com negros”, por meio de um fluxo de filmes oferecidos,
sem nenhuma surpresa, durante a ascensão do
movimento Black Power. Os dois tipos de filmes foram
profundamente influenciados por esses tempos de
nacionalismo negro, bem como pela duradoura e gráfica
“guerra televisionada” do Vietnã e a violência nacional
(assassinatos e revoltas). Nesse capítulo, eu detalho
filmes que são notáveis por suas ideologias contrárias à
assimilação, temas de revolução e vingança, e
“resistência” heroica, assim como mulheres negras
resilientes que derrotam o monstro e permanecem vivas,
prontas para vencer outro dia. Eu também observo que o
vodu é retomado nesses filmes como uma arma
poderosa contra o racismo (Os gritos de Blácula [1973] e
A vingança dos mortos [1974]). Os filmes de terror da
década de 1970 também não escapam da rotulação
“blaxploitation” — a predominância de filmes financeira e
culturalmente exploradores que exibiam a negritude
durante aquela década. Aqui, filmes da era blaxploitation
frequentemente empregavam a noção de
empoderamento negro por meio da revolução violenta
(Bem-vindo de volta, irmão Charles [1975]), enquanto
apresentavam simultaneamente narrativas contra os
direitos humanos que eram alternadamente
heterossexistas e homofóbicas, hiper-masculinas e
misóginas. Também é possível notar no capítulo que,
embora houvesse muitos filmes de terror contendo
negritude, essas produções foram derivadas de clássicos
— Blácula (1972), Blackenstein (1973), e Monstro sem
alma (1976), todos tomavam emprestado dos filmes de
Drácula, Frankenstein e O médico e o monstro.
O capítulo 6, “Nós sempre morremos primeiro —
invisibilidade, segregação racial econômica e o sacrifício
voluntário: os anos 1980”, revela um declínio dos temas
cinematográficos inspirados pelo movimento Black Power
que eram comuns nos anos 1970. Na década de 1980,
numa reversão notável, os negros iniciam uma relação
de apoio com brancos (monstruosos), na qual exibem um
sistema de lealdade e confiança que geralmente é
desproporcional e unilateral. Notavelmente, essa
lealdade é medida pelo sacrifício extremo do negro —
que entrega a própria vida (por exemplo, O iluminado
[1980]). Essa tendência de representação do
autossacrifício negro e devoção aos brancos aparece de
forma mais proeminente nos filmes de terror “com
negros”. Ou seja, a negritude é mais valiosa quando se
submete aos sistemas de valores e ideologias de uma
(estereotipicamente monolítica) branquitude. Nesse
capítulo, eu também detalho como a década de 1980
gentrifica e segrega sua branquitude — conduzindo os
monstros brancos e presas para os subúrbios, lugares
considerados inacessíveis para os negros. Esses lugares
incluem paisagens rurais ou suburbanas como a Elm
Street, Haddonville, Illinois e o Acampamento Crystal
Lake, representados em A hora do pesadelo (1984),
Halloween: a noite do terror (1978) e Sexta-feira 13
(1980), respectivamente. Finalmente, nesse capítulo, eu
aponto o retorno do “curta” de terror com Michael
Jackson (Thriller [1983]).
O capítulo 7, “Estamos de volta! A vingança e o
terreno urbano: os anos 1990”, saúda o retorno dos
“filmes negros” de terror, definidos pela reintrodução da
subjetividade negra autônoma e o reconhecimento de
personagens resilientes e empoderados — que
representam os novos filmes raciais. Esse capítulo
descreve como a negritude é, mais uma vez, exibida
como um todo completo, diverso e complexo, e,
portanto, vista em situações e papéis de terror que foram
amplamente elusivos aos negros ao longo das décadas. A
mais notável entre essas produções é Def by Temptation
(1990), que lembra as histórias morais de Spencer
Williams nos anos 1940. Os filmes negros de terror da
década de 1990 também ofereceram uma inversão única
dos papéis de maioria/ minoria racial. Se os brancos
eram sequer apresentados, a eles eram destinados os
papéis de coadjuvantes ou alívios cômicos
incompetentes. Durante os anos 1990, particularmente
em “filmes negros” de terror, a branquitude se tornou o
símbolo deficitário. Nesses filmes, há uma
autoconsciência narrativa que deixa evidente para o
público que a perturbação e a inversão dos tipos são
propositais — parte vingança, parte reparação forçada.
Isso fica mais óbvio no filme Contos macabros (1995), do
diretor Rusty Cundieff, no qual ele apresenta histórias
morais que dão conta da preservação e salvação do
“gueto” — enclaves urbanos negros. No fim das contas,
essa era exibe um período no qual a sobrevivência de
personagens negros e/ou o seu desaparecimento não
cresce nem diminui de acordo com a vontade e os
favores de não negros. Os filmes dessa época também
apresentam as batalhas entre o bem e o mal
acontecendo dentro dos confins dos centros urbanos
predominantemente negros e da classe baixa
trabalhadora. O interior das cidades é tão assustador nos
anos de 1990 que entidades estranhas de todos os tipos,
como o Predador em O predador 2: a caçada continua
(1990) e as crianças de Colheita maldita 3: a colheita
urbana (1995), decidem fazer uma visita aos centros
urbanos.
Eu termino o livro com “Capturando alguns Zzzzzs —
os negroz e o terror no século XXI”. Aqui eu apresento
uma análise focando amplamente em “filmes negros” de
terror que são inspirados pela cultura hip-hop. Esse
capítulo detalha a (potencialmente) problemática
exaltação da blaxploitation em filmes de cineastas
negros, como Bones: o anjo das trevas (2001), dirigido
por Ernest Dickerson e estrelado pelo rapper e ator
Snoop Dogg. Esses “filmes negros” de terror do novo
milênio continuam a apresentar uma aliança espacial
com o gueto como na década de 1990. Contudo, nos
anos 2000, uma explicação racional para tal foco
geográfico é a credibilidade histórica e estética que
lugares do tipo prometem. Filmes que têm a geração hip-
hop como alvo prevalecem de forma quantitativa nesse
período (por exemplo, Bloodz vs. Wolvez [2006]) e são,
de forma bem literal, embalados por batidas do hip-hop
(Now Eat [2000]).
Não há falta de “filmes negros” de terror nesse
período, e alguns deles evidenciam grande imaginação e
criatividade, enquanto outros são banais graças à
proliferação de filmes underground de baixo orçamento
que miram no grande mercado em crescimento direto-
para-DVD (como Dream House [2006]). As possibilidades
de liberdade do meio comercial estabelecido e as
possibilidades alternativas de distribuição são
consideradas. Eu identifico empresas de produção de
filmes como a Maverick Entertainment como realizadoras
independentes e inovadoras da indústria, que estão
fazendo e distribuindo filmes negros de terror de
qualidade. Esse capítulo também apresenta uma
discussão final provocativa sobre a linha que entremeia
os capítulos anteriores, dando proeminência aos pontos
que trabalham para responder às difíceis perguntas: O
que o terror significa para a negritude? E o que a
negritude significa para o terror?
O filme de terror é fascinante, ainda que apenas pelo
fato de se vangloriar por chegar de fininho perto do tabu,
ao mesmo tempo que confunde nossas noções de bem e
mal, monstruoso e divino, sagrado e profano. É uma das
formas mais intrépidas de entretenimento em seu
escrutínio da nossa humanidade e do nosso mundo
social. Eu espero sinceramente que Horror Noire: A
Representação Negra no Cinema de Terror não seja
considerado a palavra final em relação à contribuição
negra aos filmes de terror. Pelo contrário, minha intenção
e esperança é iniciar um debate engajado, provocar
divergências incríveis e engatilhar investigações ainda
mais detalhadas e exatas.
* O livro Pensamento Feminista Negro, da socióloga Patricia Hill
Collins (Boitempo, 2019), fala a respeito das imagens de controle
como uma representação específica de gênero para pessoas negras
que se articula a partir de padrões estabelecidos no interior da
cultura ocidental branca eurocêntrica. As imagens de controle são
diferentes de estereótipos por serem manipuladas dentro dos
sistemas de poder e controlam o comportamento e os corpos de
mulheres negras, criando obstáculos intransponíveis nos processos
de subjetivação, autonomia e e exercício da cidadania destas
mulheres. [NE]
HORROR
NOIRE

PRÉ-1930
O NASCIMENTO DO BICHO-PAPÃO
NEGRO NO IMAGINÁRIO

Você só precisa procurar “negro” no


Dicionário Oxford da Língua Inglesa para
ver a gama de associações estabelecidas
no século XVI; a palavra é usada como
sinônimo para, entre outras coisas,
maligno, sinistro, cruel, triste etc. Ainda
mais revelador, “homem negro” podia
fazer referência tanto a um Preto quanto
ao Diabo. — LIVELY (14)1

Em meados de 1800, os homens brancos com ocupações


tão diversas quanto cientistas, fabricantes de óculos e
mágicos, começavam a explorar os limites tecnológicos
dos filmes e a usar suas habilidades de contar histórias.2
Na Europa, os cineastas provavam que qualquer coisa
que saísse da imaginação deles podia ser transposta
para os filmes. Isso incluía dar à luz (possivelmente) ao
primeiro filme de terror propriamente dito — um curta
mudo de dois minutos chamado O solar do diabo,
apresentado numa noite de Natal de 1896 no Théâtre
Robert-Houdin em Paris pelo mágico/ator de teatro
francês Georges Méliès:

Um grande morcego voa para dentro de um


castelo medieval. Circulando lentamente, ele
bate suas asas monstruosas e, de repente, se
transforma em Mefistófeles. Conjurando um
caldeirão, o demônio produz esqueletos,
fantasmas e bruxas do conteúdo borbulhante
antes que um dos cavaleiros vindos do
submundo erga um crucifixo e Satanás
desapareça em uma lufada de fumaça.3

Era a época dos filmes mudos (fim de 1800 até o final da


década de 1920), um período em que a imagem em
movimento ainda não podia ser unida a um sistema de
som sincronizado para a reprodução em massa e
exibição nos cinemas. Era também o período em que ser
um cineasta significava ter acesso ao equipamento
necessário (geralmente experimental, de invenção
própria) para capturar uma série de imagens paradas e
fazê-las se movimentar (por exemplo, os zootropos ou
“lanternas mágicas”) ou possuir a capacidade de
capturar imagens usando uma câmera de filme.4 Os
diretores criaram as chamadas “peças cinematográficas”
(photoplays), que em sua maioria duravam meros
minutos ou segundos inicialmente, e, dessa forma, seus
filmes foram apelidados de “curtas”. Os filmes,
inicialmente, eram assistidos por meio de máquinas
como o cinetoscópio, que acomodava um espectador por
vez. Contudo, o avanço na tecnologia de filmes evoluiu
rapidamente e a projeção de imagens em movimento
para grandes audiências pagantes foi alcançada em
1893. Embora mudos, não era incomum que os filmes
desse período fossem acompanhados por música
orquestral ao vivo e efeitos sonoros. “Intertítulos”,
imagens de textos escritos ou diálogos transcritos, eram
inseridos nos filmes para detalhar pontos da história
enquanto os atores pantominavam suas falas. Em 1926 o
primeiro filme com som pré-gravado e sincronizado foi
lançado.5 Em 1927, O cantor de jazz incluía música, sons
e, significativamente, diálogos. Daí em diante, os “filmes
sonoros” se estabeleceram.6
Nos primeiros anos do cinema, os negros eram
representados por brancos, que encenavam estereótipos
racistas usando a pintura blackface. Um dos primeiros
tratamentos conhecidos de negros naquilo que pode ser
considerado um filme de terror propriamente dito
(embora o termo “terror” não fosse amplamente usado
na época) ocorreu no filme francês L’Omnibus des toqués
blancs et noirs (1901).7 O filme foi feito pelo mágico e
ilusionista Georges Méliès, também conhecido por suas
performances no teatro e aproximadamente quinhentos
curtas que incluem temas sobrenaturais e macabros. O
curta em questão é repleto de figuras fantasmagóricas
descritas da seguinte forma no catálogo de Méliès:

Um ônibus puxado por um extraordinário cavalo


mecânico é puxado por quatro pretos. O cavalo
chuta e irrita os pretos, que ao caírem se
transformam em palhaços brancos. Eles
começam a se estapear, e a cada tapa se
transformam em negros novamente. Chutando
uns aos outros, eles se tornam brancos de novo.
De repente todos eles viram um só preto
grande. Quando ele se recusa a pagar sua
passagem, o condutor incendia o ônibus e o
preto explode em mil pedaços.8

Os “pretos” do filme foram representados por atores


brancos com os rostos pintados de preto, que,
aparentemente, foram encarregados de mostrar a
violência iminente ao se cruzar limites raciais, as tensões
ao redor do baile de máscaras racial e, finalmente, o fim
brutal do metafórico fardo do homem branco com a
destruição do negro.
O público norte-americano dificilmente ficou de fora
das primeiras experiências do cinema. Uma referência
inicial de negros associados a temas assustadores data
de 1897, quando o estúdio norte-americano Biograph
lançou um curta, provavelmente uma comédia, com o
título ofensivo de Hallowe’en in Coontown [Halloween na
Cidade dos Pretos Malandros], relacionando, assim, os
negros ao feriado assustador.9 Hallowe’en se uniu a
vários outros filmes de “pretos malandros”, como The
Wooing and Wedding of a Coon [O cortejo e o casamento
com um preto malandro] (1907) ou Coontown
Suffragettes [As sufragistas da Cidade dos Pretos
Malandros] (1914), nos quais os negros, representados
por brancos com pintura blackface, eram ridicularizados
de forma cômica. O curta Minstrels Battling in a Room
[Menestréis duelando em uma sala] (c. 1897-1900)
situava-se em local mais complexo. Aqui, homens e
mulheres negros (representados por homens brancos em
blackface) estão dentro de alguma espécie de clube
noturno onde as coisas começam a ficar pesadas. Os
“negros” chegam até mesmo a se voltarem contra um
branco.10 O destino dos negros no filme por duelarem
com um homem branco é desconhecido — mas na ficção
da época existem sérias consequências para negros que
atacam brancos. O estado deteriorado do filme
impossibilita uma conclusão acertada.11 Na verdade,
muitos filmes anteriores à década de 1950 foram
perdidos ou danificados de forma irrecuperável. A
deterioração de um filme pode ser atribuída à maneira
como foi feito — com o uso de nitratos altamente
inflamáveis. G. William Jones, no livro Black Cinema
Treasures: Lost and Found, detalha o problema:
O nitrato era usado universalmente em filmes de
35 mm até a Segunda Guerra Mundial. A
composição química do nitrato é muito próxima
da composição química da pólvora, e isso
acelerou a transição para um estoque de acetato
não inflamável para que o nitrato fosse usado na
guerra. […] porque o nitrato estocado tem a
tendência de se destruir. Primeiramente, esses
filmes ficam cobertos por uma camada fina de
poeira amarelada à medida que as bordas
começam a se partir. Então, as imagens
começam a grudar no rolo seguinte, de forma
que desenrolar o filme causa ainda mais danos
[…]. Por fim, o filme se torna uma mistura de
massas grudentas e semissólidas em uma poça
de poeira. Estimase que quase 50% da herança
cinematográfica pré-1950 esteja perdida para
sempre — a maioria por causa da decomposição
do nitrato.12

Alguns filmes realmente sobreviveram. Por exemplo, em


1898 os diretores Edwin S. Porter e George S. Fleming,
trabalhando sob os auspícios da Edison Manufacturing
Company, filmaram Shooting Captured Insurgents. Uma
filmagem real de quatro soldados brancos executando
quatro homens negros. Ao fazer isso, a companhia de
Edison talvez tenha produzido um dos dois curtas mais
horríficos dos Estados Unidos. O segundo é o curta
documental An Execution by Hanging, de 1898. A
produtora do filme, Biograph, saudou An Execution, que
registrava o enforcamento de um negro em uma prisão
de Jacksonville, na Flórida, como o único enforcamento
capturado em câmeras ao vivo. Butters descreve as
cenas como “explícitas” e “assombrosas”:

o carrasco ajusta um capuz sobre a cabeça do


prisioneiro. A forca é colocada em seu pescoço.
Depois que o homem é enforcado, seu corpo
treme e sacode por causa da tensão. A
afirmação nostálgica acerca da inocência do
cinema mudo é quebrada por esse filme. A
morte de um afro-americano é vista em cena
claramente. Seu crime nunca é anunciado; sua
punição é tudo que o espectador entende.13

Negros “de verdade”, e não brancos com a cara pintada,


eram vistos frequentemente em filmes mudos e
etnográficos com cenas de pessoas levando a vida
enquanto um branco “aventureiro”/cineasta
documentava as atividades delas. Contudo, essas
representações tinham pouco de real, pois serviam para
elencar os negros como os Outros — curiosidades e
estranhezas tão marcadamente diferentes dos brancos
que até os seus hábitos mais mundanos precisavam ser
documentados e exibidos como se os negros fossem
animais em um zoológico.* A filmagem parece, em
determinados momentos, ter sido feita à paisana, sem o
conhecimento de sua “estrela” negra, ou, em outros
momentos, os personagens dos filmes parecem dar
continuidade a suas atividades conscientes, e apesar, da
câmera apontada para eles. Em 1895, curtas como
Native Woman Coaling a Ship at St. Thomas, Native
Woman Washing a Negro Baby in Nassau e Native
Woman Washing Clothes at St. Vincent apresentavam
negros em suas rotinas, conforme a seleção do diretor.
Musser alerta para o fato de que essas imagens não
apresentavam “um tipo de inocência não racista e
primitiva”, já que estão longe de ser documentais.14
Essas perspectivas de negros como estranhos e
primitivos se tornariam algo constante no terror ao longo
do século seguinte, especialmente em filmes que
retratavam os negros como selvagens, nativos perigosos
(como em Lua negra [1934]).
Frequentemente, os filmes focavam em uma pequena
gama de atividades negras, muitas das quais eram
preparadas pelos cineastas. Por exemplo, houve o filme
Watermelon Contest (1895), estrelando um grupo de
homens negros incitados a competir um com o outro
para ver quem acabava primeiro com um enorme pedaço
de melancia. Edison (1898) e o imigrante alemão
Sigmund Lubin (1903) produziram filmes com o nome de
Buck Dance. Lubin, ao descrever sua versão, afirmou que
o filme continha “um bando esfumaçado dançando por
causa de sua melancia favorita”.15 Estranhamente, os
filmes do início do século XX diziam muito sobre a forma
como os cineastas brancos eram obcecados por aquilo
que julgavam ser inerente aos negros — melancia e
galinhas (por exemplo, Watermelon Feast [1903] e Who
Said Chicken? [c. 1910]). Ao longo das décadas
seguintes, o terror iria se apropriar de tais estereótipos,
usando o tal amor dos negros por melancia e galinhas
como uma grande distração dos monstros que os
perseguiam. Para ilustrar, anos mais tarde, na comédia
de terror Os “anjos” no castelo misterioso (1940), o
personagem negro Scruno (Ernest “Sunshine Sammy”
Morrison) para de tremer de medo de um fantasma por
tempo suficiente para cantarolar louvores a uma
melancia, bem como comê-la.
O mundo negro, de acordo com os primeiros curtas,
era bem definido em classe, status e contribuição. Os
negros eram vistos sempre na rua, e não em casa. Seus
trabalhos, quando tinham, eram sempre braçais.
Imagens íntimas da família negra eram sempre elusivas.
Lubin lançou In Zululand (1915), descrito como “humor
cartunesco”, no qual mulheres negras se vestem de
fantasma com o intuito de assustar uma parente para
que ela não se casasse com “um crioulo que não vale
nada”.16 O filme Hoodoo Ann (1916), de Lloyd Ingraham,
também possui uma trama de casamento. Uma mulher,
Ann (Mae Marsh), convoca sua empregada, Preta Cindy
(Madame Sul-Te-Wan), a ajudá-la a se livrar de uma
maldição para que o casamento dela seja “o funeral do
vodu”.17 O público não recebia nenhuma dica de que
existiam intelectuais negros como W.E.B. Du Bois, Booker
T. Washington, Ida B. Wells, James Weldon Johnson e
Nannie Helen Burroughs. Nesses curtas não haviam
poetas, políticos, jornalistas, doutores em Harvard,
presidentes de grêmios estudantis ou ativistas dos
direitos humanos. Ainda assim, talvez, uma ausência de
referências aos negros teria sido melhor do que a
alternativa, evidenciada, por exemplo, pela
representação do clero negro em A Nigger in the
Woodpile, de 1904.
A Nigger in the Woodpile não foi imbuído com os
tropos do gênero de terror. Contudo, pode ser
considerado horripilante do mesmo jeito. No filme, um
diácono negro (interpretado por um ator branco com
pintura blackface) é retratado como um ladrão frequente
da lenha de um fazendeiro branco. Esperando acabar
com o roubo, o fazendeiro substitui um toco de lenha por
gravetos de dinamite. Conforme esperado, o diácono
surge para roubar a lenha e, sem saber, pega os
explosivos. O diácono é exibido em sua volta para casa,
quando se detém para cumprimentar a esposa (um ator
branco com o rosto pintado de preto, contribuindo
também para o detrimento da mulher), que está
preparando comida na cozinha, e então coloca a “lenha”
no fogão. A casa explode ao redor deles, e o que resta é
o casal, chamuscado pelo fogo, cambaleando por seu lar
em ruínas. Então, o fazendeiro branco chega juntamente
com um ajudante branco. Eles seguram o diácono e o
levam. Talvez os fazendeiros planejassem levar o diácono
para que as autoridades responsáveis cuidassem do caso
(como se explodir a casa de alguém já não fosse uma
punição suficiente); contudo, o contexto real de 1904 nos
impossibilita imaginar tal conclusão. Nesse período,
havia linchamentos desenfreados, e os supremacistas
brancos militantes aterrorizavam os negros.
Por boa parte do início de 1900, as qualidades
genéricas do terror permaneceram inexploradas. O
conceito de filme de “terror” não entrou no léxico
popular até a década de 1930. Contudo, os elementos
mais genéricos do terror podem ser vistos desde o início:
a inclusão do fantástico, batalhas entre o bem e o mal,
perturbação do cotidiano e da racionalidade, e, claro, a
invocação do medo. O modo como os negros
asseguraram o seu lugar no gênero e a natureza dessas
representações requer uma exploração dos momentos
iniciais do cinema norte-americano, quando a noção da
negritude como algo monstruoso foi introduzida.
Embora tais representações de negritude tivessem
sido conceituadas primeiramente fora do gênero do
terror, essas imagens deram uma grande contribuição
para o gênero e continuam, até mesmo hoje, a figurar de
forma proeminente na noção cinematográfica americana
do que é mais horrífico em nossa sociedade. Elas
funcionam como lembranças-chave do pouco valor
atribuído à vida negra e poderiam ser interpretadas
como horrorizantes. Butters nota que as ações
representadas em filmes como A Nigger in the Woodpile
podem ser facilmente relevadas por alguns: “Alguém
pode argumentar que as representações violentas de
afro-estadunidenses eram apenas parte da tradição de
humor pastelão que dominava as representações iniciais
nas telas. Comédia pastelão […] envolve humor cruel e
violência.”18 No entanto, o filme também explora as
ansiedades acerca dos negros e os estereótipos de
criminalidade negra para evocar os medos dos brancos
em relação à presença inquietante de “crioulos” entre
eles.19
O cineasta Lubin, conhecido pela sua série de filmes
com Sambo e Rastus, introduzidos por volta de 1909 e
repletos de estereótipos, uniu terror e pastelão com
atores negros de verdade para lançar um dos primeiros
“filmes negros” de terror. A comédia de terror The
Undertaker’s Daughter, dirigida por Willard Louis, é um
curta mudo estrelando John Edwards e Mattie Edwards.
De acordo com o material publicitário de Lubin, The
Undertaker’s Daughter contava a seguinte história:
Mattie Cook, a filha do coveiro, ama John Scott,
que não tem emprego, mas seu pai quer que ela
se case com Sime Sloan, que tem um emprego,
e Mattie precisa usar todo o seu poder de
persuasão para dobrar o pai, mas ela está à
altura do desafio. Ela se livra de Sime e de Bime
[outros pretendentes] ao prometer se casar com
um deles caso provem seu amor por ela. Um
deles precisa dormir em um dos caixões do pai e
outro deve ficar sentado perto dele a noite
inteira. [Com a ajuda de barulhos e de John, ela
se livra deles. ] Cheios de medo, eles correm
para uma reunião domiciliar presidida pelo pai,
que leva alguns tombos. Ele finalmente decide
que John é o mais indicado e pode ajudar a
tomar conta do negócio.20

As estrelas do filme, John e Mattie, que eram parte da


“companhia de estoque de negros da seção de comédia
da Companhia Lubin”, apareceriam também em dois
filmes do diretor negro Oscar Micheaux.21

D.W. GRIFFITH E O NASCIMENTO DE UMA


NAÇÃO: TORNANDO OS NEGROS
ASSUSTADORES

É o racista que cria o seu inferior.


— Fanon (93)22

D.W. (David Llewelyn Wark) Griffith nasceu em 1875 em La Grange,


Kentucky, filho de um soldado do Exército Confederado que se tornou
legislador estadual. Durante a Reconstrução, em 1885, enquanto a família
de Griffith passava por dificuldades financeiras significativas, o patriarca da
família morreu. Depois de abandonar a escola para ajudar no sustento da
família, Griffith acabou voltando sua atenção para o objetivo de se tornar um
autor de peças de teatro. Tanto o teatro quanto o cinema eram opções de
carreira aceitáveis para Griffith, e ele tentou escrever e atuar tanto para o
teatro quanto para as telas. Griffith era considerado um escritor sem muita
relevância, e seus roteiros eram frequentemente rejeitados. Em 1907,
depois de se mudar para a Califórnia, Griffith falhou em vender seus roteiros
para Edwin Porter, o famoso diretor da (Thomas) Edison Manufacturing. Em
1908, Griffith procurou Sigmund Lubin para pedir um emprego. A inscrição
de Griffith foi rejeitada. Griffith então foi para Nova York, conseguindo
finalmente um trabalho de atuação com a Biograph Company em 1908.
Pouco depois, Griffith recebeu a chance de dirigir na Biograph, e ao longo
dos cinco anos seguintes ele fez a incrível soma de 450 curtas onde
aprimorou suas habilidades de câmera e edição, incluindo técnicas como
close-ups e edição paralela. Em 1913, como um diretor produtivo e de
sucesso, Griffith saiu da Biograph para abrir o seu Reliance-Majestic Studios.
Foi por meio de seu estúdio que Griffith produziu O nascimento de uma
nação.
O nascimento de uma nação (1915), de D.W. Griffith,
não exibiu suas habilidades de escrita ou a falta delas. O
roteiro do filme foi baseado principalmente em dois livros
pró-supremacia branca e de temática terrorista escritos
por Thomas Dixon Jr., The Leopard’s Spots: A Romance of
the White Man’s Burden (1901) e The Clansman: An
Historical Romance of the Ku Klux Klan (1905). Dixon era
descrito de maneira favorável em uma revista como
“pregador, palestrante, escritor e cavalheiro sulista
conhecido há muito pela seriedade, podemos chamar de
fanatismo, com que ele lida com o […] problema
preto”.23
Griffith pagou Dixon alguns milhares de dólares, e
uma porção dos lucros, em troca de suas histórias e
opiniões. Em resposta, Dixon também passou a integrar
a promoção do filme. Foi Dixon que fez o filme ser
exibido na Casa Branca para o presidente Woodrow
Wilson, que comentou sobre o filme, em partes: “E a
minha tristeza é que, terrivelmente, é tudo verdade”.24
Juntos, Griffith e Dixon arrecadaram milhões com a
produção.

O NASCIMENTO DO BICHO-PAPÃO NEGRO


O filme O nascimento de uma nação conta a história de
duas famílias — os sulistas Camerons e os nortistas
Stonemans — durante a Guerra Civil e o período da
Reconstrução. O enredo do filme, com quase três horas,
é bem direto. A primeira parte conta a versão de Griffith
da história do fim da Guerra Civil e do assassinato do
presidente Abraham Lincoln. A segunda trata a respeito
de “raça e vingança”, com a união entre os sulistas
brancos, nortistas de bom coração, e os servos negros
fiéis.25
Os Camerons vivem na cidade de Piedmont e são
antigos donos de escravos. Trata-se de uma família
distinta, cheia de heróis de guerra e mulheres
apaixonadas e compassivas. Os membros da família
Stoneman são seus amigos da Pensilvânia, liderados pelo
patriarca da família, o deputado Austin Stoneman (Ralph
Lewis). Stoneman é um abolicionista que, apesar de um
político influente, também é retratado como uma figura
fraca e emasculada — é doente, não tem uma esposa,
manca por conta de um pé torto e é exibido como um
integracionista que foi ideologicamente enganado pelos
negros. A família Cameron possui três filhos que se
juntam ao Exército Confederado. Dois dos filhos de
Cameron são mortos na Guerra Civil. Um deles, Ben
(Henry Walthall), se torna um herói de guerra e é
apelidado de “o Coronelzinho”. O Coronelzinho (como ele
passa a ser chamado pelo resto do filme) é enviado a um
hospital no norte para se recuperar dos ferimentos, onde
conhece Elsie Stoneman (Lillian Gish) e se apaixona. A
família Stoneman possui dois filhos que se juntam à
União. Um é morto e o outro se apaixona por Margaret
Cameron (Miriam Cooper), que ele conhece durante uma
visita à casa da família Cameron. Políticos progressistas
do norte, como Stoneman, são retratados como
descontentes em relação ao sul por suas tentativas de se
separar do resto do país. Stoneman até importa para
Piedmont um “mulato” chamado Silas Lynch (George
Siegmann) para ajudar no trabalho de integração.
De acordo com o historiador de cinema Ed Guerrero,
Nascimento foi o primeiro filme de longa duração feito
nos Estados Unidos a estabelecer o “padrão técnico e
narrativo para a indústria” enquanto continuava a
perpetuar a tendência uniforme em Hollywood de
desvalorizar os afro-estadunidenses como “bufões,
servos e um tipo de subordinados”.26 Os personagens
negros principais em Nascimento são representados por
brancos com pintura blackface. Eles incluem: Gus (Walter
Long), um soldado da União que é linchado pela Ku Klux
Klan por dar em cima de Flora “Irmãzinha” Cameron
(Mae Marsh), uma garotinha; Silas Lynch, um político
corrupto; Lydia (Mary Alden), uma “mulata” maldosa que
sequestra e amarra Elsie porque Lynch deseja a mulher
branca; e Mammy (Jennie Lee) e Tom (Thomas Wilson),
dois ex-escravizados que permanecem fiéis aos Cameron
e continuam a trabalhar como servos. Esses personagens
são unidos a vários outros, alguns interpretados por
atores negros de verdade, e retratam políticos corruptos,
ladrões, supostos estupradores, incendiadores,
trapaceiros e (pretensos) assassinos.
A definição dos negros e de negritude em O
nascimento de uma nação é extremamente
problemática. A introdução inicial dos espectadores à
negritude e a prontidão em associar a cultura negra com
uma monstruosidade surgem quando soldados negros da
União chegam na cidade de Piedmont como uma gangue
de ladrões, saqueando e levando a destruição, conforme
“entram na cidade como monstros”, atacando pessoas
brancas inocentes.27 Eles aparecem em contraste com os
soldados confederados brancos, que se encontram
sitiados e cansados da guerra, mas também são
honestos e estão decididos a proteger suas terras
(brancas) e famílias (brancas). Enquanto a violência da
Guerra Civil era aterrorizante, seu verdadeiro horror, de
acordo com o filme, surgiu depois, na forma de homens
negros livres e incontidos. Por exemplo, em uma cena, o
Coronelzinho está numa calçada. Os negros abrem
caminho de forma violenta e o Coronelzinho é forçado a
sair aos pulos da calçada para não se ferir. Sobre esse
espetáculo, Lynch afirma: “Esta calçada pertence a nós
tanto quanto pertence a você, coronel Cameron”.
Contudo, à medida que Griffith exibe a cena, não há
nenhuma esperança de que alguém julgue o
comportamento dos homens negros ou a reação de
Lynch como equitativos. De tal forma, Griffith retrata os
negros como lobos dominando uma ovelha.
Se os negros são os lobos no filme de Griffith, eles não
são avessos ao canibalismo. Em uma cena, quando
Mammy encontra o servo negro nortista da família
Stoneman, ela dá um chute no traseiro dele enquanto
diz: “Us pretu livri du norti é tudu doido”. Em outra cena,
muito mais violenta, quando o leal (e submisso) Tom se
recusa a se bandear com os soldados contrabandistas da
União, eles amarram Tom pelos braços numa árvore e o
chicoteiam, evocando um poderoso simbolismo de
linchamento. Quando um homem branco tenta resgatar
Tom, ele é baleado pelos negros.
Os negros também apreciam galinhas e bebida, como
Griffith retrata em uma cena chamada “A revolta no
Master Hall: o partido preto no controle da câmara dos
representantes estaduais”. A cena, primeiramente, tem o
objetivo de ser interpretada como tragicômica. Uma série
de homens negros (interpretados por atores negros) são
reunidos em uma legislatura; eles começam a se
comportar mal — um deles leva um pedaço de galinha
escondido, outro tira o sapato e coloca o pé sujo em cima
da mesa, outro bebe sorrateiramente de uma garrafa. Os
homens devem ser vistos como ineptos dignos de pena.
Isto é, até que aprovam uma legislação que autoriza o
casamento inter-racial. Com os homens brancos e
mulheres assistindo à votação do alto da seção branca
numa sacada (em um tipo de segregacionismo reverso
na representação de Griffith), os negros se viram para
olhar as mulheres brancas. A cena agora mostra os
negros menos interessados em carne de galinha e mais
animados com a carne das mulheres brancas.
Contudo, é na cena mais infame e chocante do filme,
“A colheita sombria”, que Griffith se esforça para
solidificar a ideia de que os negros são assustadores.
Gus, “o renegado”, como ele é chamado no filme, está
ansioso para tirar vantagem da sua recente liberdade e
da nova lei de casamento inter-racial. Ele se decide por
uma criança, a filha mais nova da família Cameron, a
“Irmãzinha”. A Irmãzinha é mostrada brincando sozinha
na floresta enquanto Gus a vigia. Por fim, ele se aproxima
e diz: “Sabe, eu sou um capitão agora e quero me
casar”, e toca no braço da garota. A perseguição começa
quando a Irmãzinha se desvencilha e corre em pânico.
Com Gus em seu encalço, a Irmãzinha adentra ainda
mais na floresta até que chega na beira de um precipício.
Enxergando Gus como um destino pior que a morte, a
Irmãzinha se joga. Pouco depois, em seu suspiro de
morte, a Irmãzinha revela para o Coronelzinho que Gus
fora o seu carrasco. Fica claro que Gus deve ser visto
como um negro predador sexual que ataca mulheres
brancas. No livro de Dixon, The Clansman, o estupro
realmente acontece, e não fica implícito como no filme,
com o predador sendo associado a um monstro: “as
garras negras da besta afundaram no pescoço macio e
branco”.28 O filme foi feito numa época em que o mero
olhar de um homem negro na direção de uma mulher
branca (“olho do estupro”) resultava em um linchamento.
O impacto dessas cenas racistas alojadas em um dos
filmes mais importantes dos Estados Unidos do ponto de
vista tecnológico é uma marca que não podemos apagar.
Até mesmo hoje representações negras são influenciadas
por aquelas criadas e popularizadas por Griffith (e Dixon).
A negritude foi efetivamente transformada, e o negro se
tornou uma das criaturas mais terríveis e temidas de
todas.
O ataque de Griffith contra a negritude não parou por
aí. Griffith continuou a usar o “mito da sexualidade
exacerbada do negro” e a ideia de que “todo negro
almeja uma mulher branca” por meio do personagem
Lynch.29 Quando Lynch faz mais do que tocar o braço de
uma branca, como Gus fez, ao ponto de sequestrar e
apalpar Elsie, não resta dúvida de que Griffith quis
indicar todos os negros (até mesmo os “mulatos”) como
estupradores perigosos. As ações de homens como Gus e
Lynch justificam a ascensão da Ku Klux Klan — “Irmãos,
esta bandeira tem a mancha vermelha do sangue de
uma mulher sulista, um sacrifício inestimável no altar de
uma civilização indignada” —, e o grupo de ódio não
desaponta quando lincha Gus e Lynch (fora de cena).
Bolge (1993) confirma que a construção que Griffith
fez do negro como uma fera foi proposital:
FIGURA 1.1 GUS ENCONTRA O SEU FIM PELAS MÃOS DA KKK EM O
NASCIMENTO DE UMA NAÇÃO.
David W. Griffith Corp./Photofest
Os comentários de Lillian Gish na edição de
janeiro de 1937 da revista Stage atestam o fato
de que Griffith estava bem ciente do contraste e
que ele o usou para atiçar o público. Gish disse:
Um dia, enquanto ensaiávamos a cena em que o
homem de cor pega a menina do norte como um
gorila, meu cabelo, que era muito loiro, ficou
bem abaixo da minha cintura, e Griffith, vendo o
contraste entre as duas figuras, me deu o papel
de Elsie Stoneman.30

Apenas seis anos mais tarde, a organização pelos direitos


civis NAACP encarou o desafio de banir o filme. Dixon
driblou a NAACP e levou o filme até a Casa Branca para
exibi-lo ao presidente Wilson e sua família, assim como à
Suprema Corte e a membros do Congresso.31 Depois de
ver o filme, o presidente Wilson, um historiador, disse: “é
como se a história tivesse sido escrita com um
relâmpago”.32 Com o apoio famoso do presidente, os
distribuidores cobraram uma entrada premium de 2
dólares para um público estimado em 3 milhões de
pessoas apenas em Nova York, ao longo do período de
onze meses e 6.266 exibições.33
Griffith não havia terminado de abusar
imageticamente dos negros. Em 1922 ele fez uma
comédia de horror com personagens negros com o título
Uma noite de terror, sobre uma casa mal-assombrada.
“Os personagens negros”, escreve Cripps, “eram
marcadamente bizarros. O personagem central, um
detetive improvável, era um ‘cafre, o terror negro da
gangue do contrabando’. Os outros papéis negros eram
interpretados por brancos com pintura blackface como os
lacaios dóceis de sempre, que passeavam pela
narrativa”.34 Peter Noble acrescenta isso à descrição
enquanto acusa Griffith:
Essa comédia é um exemplo digno de nota sobre
como um diretor imerso em preconceito contra
negros pode influenciar seu público. O
personagem negro em Uma noite de terror
[interpretado por um ator branco com o rosto
pintado] deu início a uma longa linha de
marionetes cinematográficos conhecidos, os
negros covardes cujos cabelos ficam brancos ou
somem quando encontram qualquer tipo de
perigo. Nós os conhecemos bem a esta altura;
eles têm medo do escuro, de trovoadas, de
armas de fogo, de animais, da polícia, e assim
por diante. […] Em O nascimento de uma nação
ele retratou o homem de cor com ódio, e sete
anos depois, em Uma noite de terror, ele o fez
com desdém.35

Apesar dos protestos contra os seus filmes, e de um


encontro desagradável com sua empregada negra — que
disse: “Me machucou, sr. David, ver o que você fez com o
meu povo” —, Griffith se recusou a reconhecer o dano
causado pelos seus filmes.36

GUS COMO O MONSTRO (DE FRANKENSTEIN)


Pegando uma frase emprestada de Carol Clover, autora
de Men, Women and Chain Saws: Gender in the Modern
Horror Film: “Mas onde, exatamente, está o terror
aqui?”.37 Para entender a racialização do negro como
terror em O nascimento de uma nação, é importante e
ilustrativo comparar a infame sequência “A colheita
sombria”, com Gus como o monstro que persegue a
garota branca e que resulta em sua morte, com uma
cena igualmente notável em um evidente filme de terror,
Frankenstein (1931), no qual o monstro mata uma garota
branca.38 Embora os filmes tenham surgido num
intervalo de quinze anos de diferença, que vai da era do
cinema mudo até a era do som, tal comparação é
apropriada, já que os dois filmes habilmente centram a
atenção do público em algo perigoso, acentuando e
significando a monstruosidade por meio da justaposição
de um triunvirato de pureza — branquitude, feminilidade
e infância. O que se torna central é a forma como esses
filmes tratam de maneira diferente os seus monstros e
como pedem que o público sinta algo por eles.
Em Frankenstein (não há negros nesse filme), um
jovem cientista médico, dr. Henry Frankenstein (Colin
Clive), recria um homem a partir de pedaços de corpos e
o anima com eletricidade. O dr. Frankenstein cria o
homem (daí em diante “o Monstro”) apesar dos protestos
de sua noiva, Elizabeth (Mae Clarke), e de seu antigo
professor, dr. Waldman (Edward Van Sloan). O culto e
iluminado dr. Frankenstein tem um ajudante, Fritz, a
quem falta tanto cultura quanto iluminação. Fritz (Dwight
Frye) é marcado como aberrante por meio de suas
deformidades (uma corcunda e cicatrizes faciais) e se
delicia de forma cruel ao torturar o Monstro (Boris
Karloff).
O Monstro está escondido em um porão no laboratório
de Frankenstein, mas não está a salvo de Fritz, que o
atormenta com uma tocha. Quando o medo do Monstro é
interpretado como fúria descontrolada, Frankenstein e
Waldman decidem que ele precisa ser restringido. O
Monstro então é confinado ao porão e acorrentado.
Enquanto está acorrentado, ele mais uma vez é
ameaçado por Fritz e o mata para se defender. Ao
descobrirem o assassinato, Frankenstein e Waldman
drogam o Monstro, e Waldman se prepara para
desmanchar a criatura. Quando Waldman está prestes a
dar início ao procedimento, o Monstro acorda e, em outro
momento de autopreservação, mata Waldman. O
Monstro escapa do confinamento do laboratório de
Frankenstein e sai para explorar o mundo. O Monstro
encontra Maria (Marilyn Harris), uma garotinha que está
brincando sozinha perto de um lago e o chama para
brincar com ela. A besta e a garota começam a brincar
de jogar flores no lago para vê-las flutuar. O Monstro,
pensando que todas as coisas bonitas flutuam, pega
Maria e a joga dentro do lago, descobrindo tarde demais
que havia cometido um erro mortal. A repreensão é
devastadora:

a Criatura não agiu por maldade. Ela erra em


lógica, mas não em sentimento. Suas ações são
a consequência natural de tentar descobrir como
deveria brincar com a menina. Ela queria tratá-
la tão delicadamente quanto havia tratado as
adoráveis flores da montanha. A menina morre,
e a criatura é condenada tanto pelo crime de ser
uma monstruosidade quanto por ser uma
assassina de crianças.39

O Monstro vai até a casa de Frankenstein e entra no


quarto de Elizabeth, onde ela fica assustada o suficiente
com sua aparência para gritar e desmaiar. Os gritos dela
fazem o Monstro fugir para o interior. Enquanto isso, o
pai camponês de Maria recupera o corpo dela e o leva
até a porta de Frankenstein, a quem ele culpa pela morte
da filha. O pai é seguido por uma turba intencionada a
destruir o Monstro. Nas cenas finais do filme, o Monstro é
cercado e encurralado em um velho moinho. O Monstro,
que está triste e perturbado com o entendimento em
relação ao que ele é, dirige sua raiva para Frankenstein.
O Monstro agarra o médico e o atira em direção a morte.
A multidão então incendeia o moinho, destruindo o
Monstro. O que tornou o Monstro tão único, e, dessa
forma, diferente dos “monstros” de O nascimento de
uma nação, como Gus e Lynch, foi a técnica narrativa de
exigir que a audiência simpatizasse com a fera e sua
difícil situação, pois “um monstro que odeia a própria
vida e contempla a existência com um olhar baixo exibe
paralelos perturbadores com humanos deprimidos”.40
Diferente do Monstro, Gus e Lynch estão longe de ser
personagens simpáticos. Seu dilema é a crença
arrogante de que tomar as coisas por meio da força,
assim como literalmente tomar uma mulher branca, está
ao alcance deles. Ainda pior, a “falha” de Gus e Lynch,
que serve para atrair a ira, é sua inabilidade de ver a
própria monstruosidade, ou negritude, como algo
problemático.
FIGURA 1.2 O MONSTRO E MARIA EM FRANKENSTEIN.
Universal/Photofest
A semelhança entre Gus, particularmente, e o Monstro
reside em seus corpos grotescos, que se tornam “pontos
de contradição”.41 O Monstro é uma atrocidade gigante
montada com partes de corpos. Sua carne tem cor de
cadáver e não possui vivacidade; ele ganhou vida por
meio de um choque elétrico, não tem nenhum sangue
pulsando em seu corpo morto-vivo e reanimado. E ainda
assim essa aberração da natureza não cria repulsa no
espectador, apenas pena. É o dr. Frankenstein, um tipo
de intelectual que, com seu complexo de Deus, deve ser
humilhado.
Gus se parece mais com um monstro. Seu uniforme é
sujo e rasgado. O próprio Gus tem a compleição escura e
às vezes parece mais rastejar do que andar de forma
ereta e orgulhosa como os homens da família Cameron
(ou até mesmo como o Monstro). Sua aparência
monstruosa é acentuada pelo uso de blackface. Como
resultado, os grandes olhos brancos de Gus parecem
selvagens e desvairados, sua pele tem um tom escuro
acinzentado e lamacento. Depois que a Irmãzinha se
mata em vez de “se casar” com Gus, ele assegura o seu
destino quando atira e mata um dos seus perseguidores
brancos. Embora o corpo do Monstro tenha a intenção de
ser igualmente problemático, seus olhos taciturnos lhe
dão uma marca de profundidade. O Monstro se torna
mais humano do que Gus jamais será, pois ele não mata
seus perseguidores (a multidão de camponeses); em vez
disso, atormentado, ele mata seu criador — um símbolo
do homem e da ciência cometendo erros —, e assim
salva a humanidade de tal húbris.
Gus e o Monstro revelam horrores díspares, ainda que
ambos prometam “momentos particularmente intensos”
de nascimento, entrada, transformação e destruição.42
Ambos são retratados como crias de mentes
privilegiadas. O Monstro é criação do dr. Frankenstein, e
Gus e Lynch nasceram de um progressismo social que
deu errado. Tanto Frankenstein quanto Stoneman são
vistos como cientistas loucos embarcando em um
experimento social irracional e perigoso, ou, como
Butters coloca: “Dessa forma, assim como o dr.
Frankenstein cria o seu monstro sem entender
completamente o que está fazendo, Stoneman cria
Lynch”.43 A entrada de Gus, Lynch e do Monstro no
mundo revela que cada um deles, estejam cientes ou
não, possui uma dependência em relação ao seu mestre
(branco). O Monstro é infantil e vulnerável em sua
entrada. Ao contrário, durante a Reconstrução, Gus e
Lynch entram no mundo branco com seus poderes
incontidos e comportamentos sem limites. A
transformação em monstruosidade por parte do Monstro,
Gus e Lynch só acontece quando cada um deles está
completamente afastado de seus mestres. Mas apenas o
Monstro aprende lições importantes e se torna um novo
“homem” por causa delas. Mesmo que o Monstro tenha
cometido três assassinatos, tendo matado Fritz, o dr.
Waldeman e Maria, sua morte necessária é um ato de
misericórdia. De uma maneira importante, o Monstro não
é visto como monstruoso por conta da luxúria. Esse seria
o caso de Gus e Lynch, já que eles não confundem
garotinhas brancas com flores, mas as enxerga como
amantes em potencial. Como Williams nota, a marca
principal de um monstro é a sua diferença sexual — uma
aberração — em relação ao homem “normal”.44 Ainda
pior, Gus e Lynch não podem ser “normais”; em vez
disso, a tentativa deles de misturar raças é uma
transgressão sexual realçada como algo claramente
perigoso.
Não há, em Nascimento, uma tentativa de
responsabilizar Stoneman por sua criação. Na verdade,
quando Lynch olha de forma romântica para Elsie, a filha
de Stoneman, ele está condenado a ser destruído por
Stoneman, seu próprio criador. Ao fazer isso, Stoneman é
realocado dentro da branquitude, parecendo se libertar
de sua confiança errada nos negros, ou, até mesmo,
deixando seu estado de insanidade temporária. No fim,
não há negros em Nascimento dos quais sentir pena ou
com quem se identificar.
Ao tomar emprestados os livros de Dixon e Shelley,
tanto Nascimento quanto Frankenstein adotaram a
contribuição literária antiga do bom/virtuoso/iluminado
contra o mal/corrupto/escuro. Contudo, o alcance do
filme como mídia de massa, o apelo do cinema como
uma nova tecnologia e as imagens surpreendentes de
Nascimento conduziram as histórias racistas de Dixon a
novos patamares. Nascimento foi o primeiro filme a ser
exibido na Casa Branca. O filme tem sido creditado como
responsável por ciclos de ressurgimento do interesse
pela Ku Klux Klan.45 Já foi usado como peça de
propaganda e ferramenta de recrutamento de
movimentos de supremacia branca e grupos
semelhantes à Ku Klux Klan, os neo-confederados e os
neo-nazis.46 Nascimento foi homenageado pela
Biblioteca do Congresso com a sua inclusão no Registro
Nacional de Filmes (1992) e celebrado pelo Instituto
Americano de Cinema, que o colocou como o 44° filme
mais importante de todos os tempos. Em 2004, o popular
DJ e produtor musical afro-estadunidense DJ Spooky
começou uma turnê mundial para grandes públicos em
locais como o Lincoln Center (Nova York) e o Festival de
Viena, apresentando o seu “remix” do filme, que ele
batizou de O renascimento de uma nação do DJ Spooky. O
DJ Spooky colocou uma batida de hip-hop no filme e
inseriu gráficos coloridos.
Para que fique entendido, O nascimento de uma nação
não faz parte do gênero de terror. Ainda assim, o filme
inseriu e fixou na imaginação popular estadunidense um
personagem de terror por excelência para instigar o
medo. Ao apresentar Gus, assim como outros homens
negros, como malévolos, Nascimento tem a dúbia
distinção de introduzir o desprezível “macho brutal” no
cinema. O macho brutal é um desprezível homem negro,
ainda mais perigoso por seu foco implacável na maldade.
Não é possível ser racional com ele, pois ele é irracional.
O personagem é tão primitivo e básico que só pode ser
visto como animalesco. Donald Bogle traz uma famosa
discussão sobre o dano que Griffith causou ao apresentar
os homens negros como machos brutais: “Crioulos
sempre enormes e malvadões, supersexuais e selvagens,
violentos e loucos ao sonharem com carne branca.
Nenhum pecado é grande demais para o homem negro.
[…] Griffith investiu pesado na bestialidade de seus
vilões negros e usou isso para criar ódio”.47 E, de fato,
variações do tema continuaram a aparecer na mídia,
como o infame comercial político sobre as saídas da
prisão de Willie Horton (1988), no qual um negro
assassino e estuprador condenado é apresentado, e em
filmes como O mistério de Candyman (1992), no qual
homens negros exalando sexualidade mantêm mulheres
brancas como prisioneiras.

NEGROS ASSUMEM OS FILMES DE SUSTO


Em resposta ao Nascimento, com o objetivo de combater
os seus efeitos, filmes negros — ou seja, filmes
estrelando atores negros e apresentando histórias
negras, e (idealmente) feitos e distribuídos por negros —
começaram a aparecer “com força”48 imediatamente.
Cineastas negros anteciparam corretamente o poder das
representações de Griffith e não ficaram parados
enquanto sua raça e cultura eram maculadas em
imagens. Filmes negros foram produzidos em resposta ao
Nascimento. Por exemplo, George e Noble Johnson, por
meio da sua Lincoln Motion Picture Company, fundada no
verão de 1915, lançaram The Realization of a Negro’s
Ambition (1916) em um esforço para apresentar um
contraste positivo a representação dos negros em
Nascimento. Então veio a Frederick Douglass Film
Company, fundada em 1916 pelo dr. George Cannon e
pelo reverendo dr. W.S. Smith com o objetivo específico
de rebater os efeitos de O nascimento de uma nação. O
primeiro filme da empresa, The Colored American
Winning His Suit (1916), mostrava os afro-
estadunidenses como trabalhadores, e a habilidade que
possuíam de se ajudar era o tema dominante.
O aclamado escritor e cineasta Oscar Micheaux, por
meio da sua Micheaux Book and Film Company (1919),
lançou o filme Nos limites dos portões (1920). Portões é
mais memorável não apenas por sua tentativa de rebater
o épico de Griffith, mas por reimaginar a infame cena “A
colheita sombria”. Em Portões, uma mulher negra49 é
quem se vê perseguida por um homem branco que
deseja estuprá-la.
Um dos benefícios do aumento de histórias negras,
produzidas por negros ou não, foi a introdução de uma
gama de imagens negras diversas, apresentando
personagens complexos e multidimensionais, assim
como uma ampla variedade de narrativas, incluindo
filmes de susto. Por exemplo, a Unique Film Co. lançou
Shadowed by the Devil (1916), um “filme negro” de
terror com três rolos e um elenco totalmente negro. Devil
é um conto moral focado em três personagens — “o bom,
o mau e o feio”50 — e naquilo que significaria ser um
“bom homem [negro]”.51 O filme “contrasta as
características de três indivíduos — uma ‘princesa’
mimada, um homem possuído pelo diabo [precisamente],
e Everett, ‘um filho bom e trabalhador de pais pobres,
um jovem sério e quieto, um marido amoroso e […] pai
[que] mostra os traços de sua aprendizagem precoce’”.52
Por mais intrigante que o filme possa parecer, Devil veio
e foi tão rápido quanto a própria Unique, pois a empresa
lançou apenas mais um filme (que não era de terror)
antes de seu súbito desaparecimento. A escassez de
lançamentos da Unique não era uma coisa incomum, já
que “a vulnerabilidade econômica de companhias
cinematográficas, fossem elas negras ou brancas, na era
dos filmes mudos significava que a maior parte delas só
tinha um ou dois filmes para mostrar”.53
Na verdade, as dificuldades econômicas encaradas
pelas companhias de cinema eram muito reais. Por
exemplo, Richard Norman, o proprietário branco da
Norman Film Manufacturing Company, detalhou, em uma
carta para Anita Bush, uma atriz negra que estrelou no
filme negro de susto The Crimson Skull (1921), os
desafios monetários e a escassez de recursos que ele
enfrentava. Bush pediu um salário maior pelo seu
trabalho, e, em resposta, Norman explicou suas
limitações financeiras: “como nosso filme vai passar
apenas em cinemas para pessoas negras, ele vai ter uma
distribuição em mais ou menos 120 cinemas; 85% dos
quais tem uma média de 250 assentos. Esses números
não se comparam com os 22 mil cinemas brancos nos
quais o nosso produto não terá espaço”.54 Bush não
recebeu o seu aumento de salário, mas assinou o
contrato com Norman para atuar em The Crimson Skull,
unindo-se ao seu antigo colega de teatro, o ator negro
Lawrence Chenault, no filme.
The Crimson Skull foi anunciado como “um filme de
mistério de faroeste” apresentando “o Caveira” e sua
gangue de “Terrores”, que, numa roupa preta com o
desenho de um esqueleto, brinca com as superstições ao
assombrar, aterrorizar e roubar suas vítimas. O filme
teve uma recepção tão boa em Baltimore, Maryland, no
Carey Theater, que foi “exibido por mais dois dias”.55
Assim como a Norman Film Manufacturing, a Ebony
Film Company (1915) não pertencia a negros. Assim
como algumas companhias brancas de cinema faziam, a
Ebony forneceu suas contribuições estereotípicas para as
representações da negritude em filmes como Money
Talks in Darktown (1916) e Shine Johnson and the
Rabbit’s Foot (1917). Embora fosse de propriedade
branca, a companhia era gerenciada por Luther J. Pollard,
o único funcionário negro, e mantinha um número
considerável de artistas negros. A Ebony Film Company
produziu vários filmes de susto, elevando seu catálogo a
uma impressionante coleção de duas dúzias de filmes. A
Ebony colocou negros no grande número de cinco curtas
de comédia de terror entre 1917 e 1918. Os cinco foram:
Devil for a Day (1917), Ghosts (1917), Mercy, The
Mummy Mumbled (1918), Spooks (1918) e Do The Dead
Talk? (1918).56
Os filmes foram exibidos para audiências brancas e
negras, ainda que fossem mais direcionados aos brancos,
como esta propaganda da empresa publicada em 1918
na revista Motion Picture World revela: “Pessoas de cor
são engraçadas. Se o povo de cor não fosse engraçado,
não existiriam as canções das plantações, nem banjos, a
dança do bolo,* sapateado, nenhum show de menestrel e
nem de vaudeville com pintura blackface. E eles são
engraçados no estúdio”.57
Em resposta aos lançamentos da Ebony, os
espectadores negros ficaram ofendidos, como escreveu a
“sra. J.H.” em uma carta ao editor publicada no jornal
Chicago Defender:
Eu considero meu dever, como parte da
respeitável classe de clientes do cinema,
protestar contra um certo tipo de filme que tem
sido e está sendo exibido nos cinemas deste
distrito. Eu me refiro aos filmes que vêm sendo
explorados pela Ebony Film Company, de acordo
com as propagandas, e que fornecem uma
amostra exagerada das ações desgraçadas dos
elementos mais baixos da raça. Foi com abjeta
humilhação que eu e muitos de meus amigos
assistimos às cenas de degradação exibidas no
cinema, e se o objetivo delas era causar riso, o
resultado não foi esse. Quando ações bestiais
dos degradados do nosso povo são ostentadas
diante dos nossos olhos como diversão, é
chegada a hora de protestar em nome da
decência comum.58

A imprensa negra foi igualmente contundente nas


críticas aos filmes da Ebony. O Chicago Defender
apontou: “quando você topar com a propaganda de um
desses tais filmes ‘só com gente de cor’, guarde o seu
dinheiro e economize tanto as suas moedas quanto o seu
respeito próprio”.59
Tal qual foi o teor geral dos filmes de susto — “pretos”
assustados arregalando os olhos em troca de risadas —
por quase duas décadas do século XX. Contudo, Oscar
Micheaux iria arrancar sorrisos e reinar supremo com
seus lançamentos de “filmes negros” de terror.

OSCAR MICHEAUX: MESTRE DO MACABRO


Oscar Devereaux Micheaux, filho de antigos
escravizados, nasceu em 1884 e foi criado no Kansas.
Com aproximadamente 26 anos de idade, em março de
1910, ele escreveu para o jornal negro semanal Chicago
Defender, descrevendo sua vida como um “residente,
pioneiro e dono de terras” no condado
predominantemente branco de Gregory, Dakota do Sul.
Enquanto cultivava (ele não abraçava a identidade de
“fazendeiro”), Micheaux começou a encher cadernos com
contos autobiográficos do personagem (pouco) ficcional
“Oscar Devereaux”, por fim transformando suas
anotações em seu primeiro livro autopublicado e
distribuído de maneira independente, The Conquest: The
Story of a Negro Pioneer. Este seria o primeiro dos seis
romances que ele escreveria.
A mudança de Micheaux para o cinema começou em
1918, quando George Johnson, da Lincoln Motion Picture
Company, fez contato com o escritor depois de ver um
anúncio no Chicago Defender sobre o seu livro The
Homesteader. A Lincoln estava interessada em adquirir
os direitos do livro a fim de adaptá-lo para as telas. Uma
enxurrada de comunicação entre eles resultou em
Johnson tentando “convencer Micheaux de que tinha
conhecimento suficiente do ‘ramo dos filmes’ e
prometendo que poderia transformar o livro em ‘um filme
de primeira classe’”.60 Contudo, Micheaux insistia que o
seu romance, de quinhentas páginas, merecia um longa-
metragem de seis rolos, e não apenas os dois ou três que
eram produzidos tipicamente pela Lincoln, comum para
os filmes negros do período. As negociações falharam, e
Micheaux determinou-se a produzir ele mesmo The
Homesteader em sua Micheaux Book and Film Company.
A companhia de Micheaux só iria produzir longas, um
reconhecimento de suas ambições em fazer filmes
longos.
Em 1919, com o filme mudo The Homesteader,
Micheaux se tornou o primeiro norte-americano negro a
fazer um longa-metragem. Micheaux continuou a
escrever e também trabalhou com o fim de adaptar seus
romances para a tela grande. O cineasta “escreveu a si
mesmo na história” ao tomar sua, agora famosa,
biografia para criar trabalhos que fornecessem um
ângulo sociopolítico sobre negritude que ainda não tinha
sido visto na cultura popular.61 Essas histórias se
tornaram a base de alguns de seus trabalhos mais
famosos, como os filmes mudos Nos limites dos portões
(1920), O símbolo do inconquistado (1920) e Corpo e
alma (1925). Micheaux era a epítome do cineasta
independente, que usava da bondade de sua rede de
amigos negros que o deixavam “filmar em suas salas e
disponibilizavam cadeiras para as exibições”.62 O
resultado foi uma carreira de mais de trinta anos em que
Micheaux produziu aproximadamente quarenta filmes.
Entre essas produções, havia pelo menos três filmes
mudos de susto que mais se assemelhavam ao gênero
terror de hoje. Micheaux não fazia comédias de terror.
Seus filmes tratavam sobre narrativa, um assunto muito
sério. Um dos filmes do tipo, um filme de susto
dramático, A Son of Satan (1924), quase não chegou a
ver a luz do dia por causa de algumas manobras escusas
de negócio por parte do próprio Micheaux.
As notáveis estudiosas de Micheaux, Pearl Bower e
Louise Spence, no livro Writing Himself into History:
Oscar Micheaux, His Silent Films, and His Audiences,
explicam que, para economizar dinheiro e maximizar os
lucros, o cineasta virou um distribuidor esperto. Ele não
submetia seus filmes, como era exigido, ao
licenciamento até que já estivessem agendados o filme e
a propaganda. A tática permitiu que Micheaux
economizasse tempo e recursos associados ao
asseguramento de uma licença, que eram gastos para
depois ele se ver obrigado a cortar alguma coisa a fim de
atender aos requerimentos do quadro de censores. Em
vez disso, Micheaux tentou fazer a banca agir a seu
favor, de maneira rápida e sem confusão, ao explicar que
os cinemas estavam esperando pelo filme dele e que os
censores não precisavam se preocupar com o conteúdo
dos filmes, porque eles só seriam vistos pelo público
negro.63 Para persuadir a banca, “seu cabeçalho durante
esse período listava todos os filmes que ele tinha em
distribuição e descrevia sua firma como “Produtores e
Distribuidores de Filmes Negros de Alta Classe”.64
Quando a banca da Virginia ameaçou o lançamento de
A Son of Satan, Micheaux agendou o filme mesmo assim,
sem aprovação, no Attucks Theatre em Norfolk, e fez
circular propagandas e outros materiais promocionais
para o filme. Só então a banca teve notícias de
Micheaux, que vinha ignorando os pedidos para que
mudanças fossem feitas no filme. No fim, a estratégia foi
uma proeza descarada:

Sua resposta tardia evidencia como ele


manipulou o sistema para fazêlo trabalhar em
sua vantagem, enquanto evitava as
consequências desagradáveis de suas próprias
artimanhas. Estabelecendo a cena para um
melodrama, e fazendo o papel do trapaceiro, ele
apelou para uma nota de “contrição”, dizendo
que havia viajado pelo sul em vagões Jim Crow
infestados de cinzas durante todo o verão e que
estava “sempre cansado e distraído” e por isso
nunca conseguiu ficar bem o suficiente para
“parar e explicar os motivos”. Usando o
paternalismo da banca, ele alegou pobreza e os
lembrou que, afinal, os filmes só eram vistos
pelo público negro”.65

O estado aplicou uma multa de 25 dólares, a pena


mínima, e rejeitou as cenas de miscigenação por
“motivos de discrição”.66
Os sete rolos de A Son of Satan incluíam Lawrence
Chenault, famoso por The Crimson Skull, em seu elenco.
De acordo com as propagandas, o filme apresentava “um
poderoso elenco coadjuvante de cor” atuando em uma
adaptação de uma história de Micheaux, The Ghost of
Tolston’s Manor.67 O filme fala sobre um homem que, em
uma aposta, concorda em passar a noite em uma casa
mal-assombrada, e foi descrito como “uma história de
aventura de deixar os cabelos em pé, que se passa em
uma casa assombrada, onde o arrastar de correntes e
fantasmas ambulantes são tão comuns quanto papagaios
e filhotes de cachorro”.68
O filme, contudo, não escapou de controvérsias. A
produção de Micheaux encontrou o desdém de alguns
por causa de sua representação de negros bebendo,
apostando e jogando dados. A Comissão de Cinema do
Estado de Nova York rejeitou o filme, impedindo, dessa
forma, sua licença para tais representações, como afirma
a Comissão em sua carta para Micheaux:

O filme é repleto de cenas de bebedeiras e


baderna, e mostra homens mascarados ficando
bêbados. Mostra jogos de azar envolvendo
dinheiro, um homem enforcando sua esposa até
a morte, o assassinato do líder do bando
mascarado e o assassinato de um gato por
apedrejamento. Existem muitas cenas de crime.
O filme é tão caricato que, na opinião da
comissão, é “inumano” e “incitaria o crime”.69

O longa, de acordo com os padrões da época, era


particularmente recheado de estereótipos, exibindo
homens negros fazendo “badernas” de todos os tipos,
enquanto os homens brancos eram retratados como
membros selvagens da Klan. De tal forma, o filme
evidenciava como Micheaux podia ser “descaradamente
desafiador para negros e brancos nos Estados Unidos”.70
Ainda assim, A Son of Satan foi, em geral, bem recebido.
D. Ireland Thomas, do Chicago Defender, escreveu sobre
o filme:

alguns podem não gostar da produção, pois ela


exibe a nossa raça nas cores deles. Podem
protestar contra a linguagem empregada. Eu
mesmo não apoiaria esse aspecto do filme, mas
preciso admitir que é realista, sim, eu acho, até
demais. Devemos dar créditos a Oscar por nos
ter fornecido coisas reais […] eu não quero ver a
minha raça em botecos ou mesas de apostas.
Mas o que desejamos não dá dinheiro. Aquilo
que o público pede é o que faz o saco de
moedas tilintar.71

O próximo filme de susto de Micheaux, The Devil’s


Disciple (1925), tem Lawrence Chenault em seu elenco
mais uma vez. É descrito no New York Amsterdam News
como “intensamente cativante e dramático” ao contar a
história dos perigos da cidade grande, o Harlem, no caso,
para mulheres jovens. O perigo toma a forma de um
homem no filme, um discípulo de Satã, que seduz e
explora “mulheres das ruas”. Uma mulher acredita que
ela pode mudar o homem, mas em vez disso se torna
uma vítima da degradação. De acordo com o Pittsburgh
Courier, “o que se segue cria uma história tão cheia de
suspense inquietante e situações dramáticas que você
fica preso no êxtase do entretenimento do qual não
escapa até que o final passe pelos seus olhos”.72
Micheaux ainda não havia terminado de lançar coisas
assombrosas. The Conjure Woman (1926) foi baseado na
coletânea homônima de contos de Charles Chesnutt de
1899. O livro apresenta sete contos, todos situados em
Patesville, Carolina do Norte, centrados nos atos de
conjuramento — uma magia vodu73 — feitos por negros
(escravizados e livres) ao resistirem às crueldades
infligidas a eles por brancos racistas e violentos.
Micheaux escreveu para Chesnutt delineando suas ideias
para uma adaptação cinematográfica da primeira história
de The Conjure Woman:

Eu acho que você poderia desenvolver uma boa


sinopse da primeira história de The Conjure
Woman. Transformar o caso do homem e da
mulher em uma boa história de amor, deixar que
tenha, se possível, uma casa mal-assombrada,
sendo que as assombrações seriam segredos
revelados perto do final, e a heroína que foge
para lá escondida — qualquer coisa que choque
ou surpreenda, mas que tenha um bom final e
que forneça homens e mulheres como
protagonistas fortes (Oscar Micheaux para
Charles Waddell Chesnutt, 30 de outubro de
1921, Arquivos de Charles Waddell Chesnutt,
Sociedade Histórica de Western Reserve,
Cleveland, Ohio).74

Porém o filme, por motivos desconhecidos, não fez muito


barulho. O que se sabe é que a produção não foi muito
promovida e teve exibições limitadas.75
Os filmes de Micheaux têm sido interpretados como
“filmes raciais” e contos morais que tinham o duplo
objetivo de circular mensagens positivas de ascensão da
raça enquanto exibiam os negros como seres humanos
complexos — capazes de amar e bons, falhos e fracos,
maus e honestos. Micheaux também tinha um bom olho
para histórias cativantes. Seus filmes de susto eram
provocativos, suspenses psicológicos (não apenas filmes
assustadores de “encontrões no escuro”). Seu trabalho
abriria as portas para pessoas como o diretor/ator
Spencer Williams e seus “filmes negros” de terror com
temas morais dos anos 1940. Até então, contudo, a
participação negra no terror seria quase exclusivamente
desfigurada por descasos imagísticos em filmes de terror
“com negros”.

CONCLUSÃO
Foi contra o pano de fundo desse início do século XX,
quando W.E.B. Du Bois lamenta pelo negro que mede “a
própria alma pela fita métrica de um mundo que o olha
com divertido desdém e pena”, que os negros entraram
na produção de filmes.76 Eles buscaram oferecer
entretenimento a partir de seu próprio e vantajoso ponto
de vista da negritude enquanto combatiam as
representações desdenhosas prevalecentes que eram
circuladas por aqueles particularmente investidos em
preservar noções puras de brancura. Certamente, para
esses cineastas negros, o lucro em potencial também
não incomodava. Contudo, as mentiras de Griffith se
mostraram motivações fortes para que negros entrassem
na área — rapidamente e em grande número.
Companhias independentes de filmes negros e cinemas
negros começaram a aparecer. No fim da década de
1920, o número impressionante de setecentos cinemas
negros atendiam ao público negro (provando que a
“renascença” não foi apenas um fenômeno do Harlem).77
Ainda assim, a vida do cineasta negro estava longe de
ser fácil. Censura, distribuição, acesso a recursos (como
equipamentos, atores, pagamentos) e a necessidade de
um retorno do investimento eram problemas
significativos e frequentemente impossíveis de serem
resolvidos. Como resultado, cineastas não negros ainda
dominavam a indústria, e a visão deles acerca dos
negros e da cultura negra prevalecia. Parecia não haver
meios de deter as representações de negros como
figuras monstruosas ou as comédias de terror
racialmente ofensivas, nas quais os negros eram vítimas
de violências nas mãos dos brancos. Pior ainda, o negro
assustado de olhos arregalados estava só começando a
aparecer, chegando ao ápice na década seguinte. A
próxima década, de 1930, viu uma diminuição de
performances com pintura blackface, dando mais
oportunidades para atores negros “reais”. Contudo, os
papéis destinados aos negros, especialmente no gênero
do terror, que estava sendo formalizado nos anos 1930,
eram terrivelmente regressivos. A década também viu
um aumento da participação de mulheres negras: elas
não seriam mais interpretadas por homens brancos com
o rosto pintado, e assim mais papéis foram escritos para
elas, ainda que frequentemente interpretassem bruxas
vodus seminuas ou empregadas completamente vestidas
e praticantes de vodu.
Na década seguinte havia ainda mais problemas
representacionais para os negros surgindo no horizonte.
“Filmes da selva” — sobre as vidas não civilizadas de
negros que viviam em lugares como o continente
africano ou a ilha do Haiti — se tornaram populares nos
anos 1930. As contribuições desses filmes para o gênero
do terror foram profundas, e os tropos dessas produções
continuam populares até hoje. Negros retratados como
figuras selvagens, praticantes malvados de vodu falando
“uga-buga” enquanto se açoitam numa frenética dança
vodu cadenciada por música da selva (percussão)
rivalizavam com o grotesco de Gus e Lynch. Além disso,
os brancos ainda eram retratados como superiores e
iluminados… e ainda eram os protetores e salvadores
das mulheres, que continuavam a ser ameaçadas pelos
negros. Havia muito pouco para combater essas
imagens, já que 1930 foi mais uma década de filmes de
terror “com negros” do que de “filmes negros” de terror.
* Embora a autora naturalize uma hierarquia entre humanos (negros)
e animais em um zoológico, como se o absurdo da exibição fosse o
fato de ser experienciado por humanos, para um discurso
antirracista que vai na raiz do problema, é interessante pensar que a
lógica da mentalidade racista (diferenciação e hierarquização com
base no fenótipo) é correlata à lógica do especismo (diferenciação e
hierarquização com base na diferença de espécie, basicamente a
oposição animal “humano” e animal “não humano”). Dizer “como se
negros fossem animais” pontua uma necessidade de dissociar
negros de animais com veemência (devido ao histórico de
animalização dos negros, no discurso que associa negritude a
características não-humanas) tal que não pontua o fato de que os
“animais não-humanos” não deveriam ser violados, exibidos e
agredidos. Para as irmãs Aph e Syl Ko, grupos sociais marginalizados
tendem a focar que a diferença mórfica e “espiritual” deveria
pressupor uma diferença de tratamento do grupo privilegiado,
porque ignoram o fato de que por “humano” a mentalidade
eurocêntrica quer dizer “branco”, e os demais grupos marcados pela
diferença são “não-humanos” e, por extensão, lidos como “animais”.
Assim, elas defendem que a luta não deveria ser pra ser tratado
melhor que o animal, mas pelo fim da lógica hierarquizante. Ver: Ko,
Aph; Ko, Syl. Aphro-ism: essays on pop culture, feminism, black
veganism from two sisters. Nova Iorque: Lantern Books, 2017. [NE]
* Cakewalk no original, refere-se à dança dos escravos norte-
americanos de ritmo sincopado surgida a partir de uma tentativa de
imitação do minueto e das quadrilhas dos brancos europeus em
meados do século XIX. Mario Jorge Jacques conta, em seu livro
Glossário do Jazz (Biblioteca 24 horas, 2009), que o nome surgiu das
reuniões em certas fazendas que autorizavam a dança aos domingos
como diversão também para os brancos e que presenteavam com
um bolo os melhores dançarinos. A base musical era composta por
marchas sincopadas e que vieram a contribuir para a característica
rítmica do ragtime. [NE]
HORROR
NOIRE

1930
FEBRE DA SELVA, UM ROMANCE DE
HORROR

Vodu e zumbis. Coisa de criança, não é?


Filmes B. Bem, errado. A uma hora de
avião de Miami está o país caribenho do
Haiti, e esse país está sendo tomado
como refém por sacerdotes vodus que
podem, e transformam, pessoas em
zumbis. — BILL O’REILLY (20)1

Em 35 curtos anos (1895-1930), nos Estados Unidos, os


filmes se transformaram de passatempos caros e
experimentais de inventores em uma indústria comercial
completa — “Hollywood”. Na metade da década de 1930,
a produção de filmes era saudada como uma indústria
líder nos Estados Unidos, valendo 2 bilhões de dólares. A
média de frequentadores de cinemas cresceu
bruscamente, de 40 milhões em 1922 para 48 milhões
em 1925 e 110 milhões em 1930.1 A década de 1930
também foi quando o termo “filme de terror” finalmente
entrou para o vocabulário.2
Quase todas as companhias de cinema começaram a
produzir filmes de terror; contudo, a Universal pode ser
creditada pela inovação dessa “Era de Ouro” dos filmes
de terror com sua série de filmes de monstros hoje
considerados clássicos — Drácula (1931), Frankenstein
(1931), A múmia (1932) e O homem invisível (1933).3 Os
monstros da Universal receberam a companhia de outros
filmes populares de terror, como Os assassinatos da rua
Morgue (1932), e várias sequências, como A noiva de
Frankenstein (1935) e A filha de Drácula (1936). Graças,
em parte, aos esforços da Universal, a década de 1930
permanece como um dos períodos mais celebrados na
história do cinema. Infelizmente os negros ficaram
amplamente ausentes dos filmes de monstros da
Universal, com a rara exceção do ator negro Noble
Johnson, que fazia pontas como o servo “Janos, o Negro”
em Os assassinatos da rua Morgue, e como o empregado
“o Núbio” em A múmia. Um escritor do jornal negro
Pittsburgh Courier acreditava que a Universal tinha pouco
respeito pelo público negro durante esse período.4 Os
negros realmente estavam sendo desprezados pelo
cinema, mas esse desprezo não vinha apenas da
Universal.
Cineastas negros tinham poucas oportunidades de
informar a indústria cinematográfica nessa época. A
chegada do som, uma inovação tecnológica cara, e a
ocorrência da Grande Depressão, que causou um colapso
econômico nos mercados globais, foi uma mistura mortal
para os cineastas negros. Já com dificuldades financeiras,
muitos viram suas empresas falirem completamente.
Filmes negros passaram a ser roteirizados, produzidos e
distribuídos por brancos, que também detinham sua
propriedade, mas com atores negros (e, ainda que
raramente, brancos em blackface), sendo destinados
para um público branco. A representação de negros no
cinema, fosse no terror ou não, era notavelmente
estática. Realismo social frequentemente ficava em
segundo plano em favor de representações de negros
felizes servindo brancos, como em dramas como Noivado
na guerra (1935), Cantando saudades (1936) e … E o
vento levou (1939).
O terror não era diferente, encontrando até mesmo
um jeito de incluir alguma cantoria jovial (por exemplo,
Lua negra [1934]). Os negros não eram representados
nessa década como os “novos negros” progressistas
celebrados durante a era da Renascença do Harlem. Pelo
contrário, eram apresentados como figuras
subdesenvolvidas e infantis. Em vários casos, seu lar
ainda era uma plantação branca, embora o cenário da
plantação não fosse mais o sul pré-guerra, mas algum
tipo de selva caribenha amaldiçoada que ameaçava
engolir o espaço civilizado criado pelos brancos. Magia
vodu do mal figurava de forma proeminente, assim como
animais monstruosos, em especial o gorila, que também
tinha uma queda por loiras. Contra esse emaranhado de
temas genéricos, uma constante era o romance, que
fazia questionar: seriam a floresta, o vodu ou até mesmo
o gorila, capazes de atrapalhar a busca por um amor
branco?

CONQUISTANDO O MUNDO NEGRO


O terror de 1930 tinha uma obsessão por histórias
“saídas da África”, nas quais os brancos “conquistavam”
a África. Era uma preocupação que poderia ser atribuída
às aventuras do início do século XX do presidente
Theodore Roosevelt (1901-1909). Roosevelt era um
historiador publicado (foi nomeado presidente da
Associação Histórica Americana); era um naturalista,
conservacionista e explorador (ele é creditado pela
descoberta de mais de mil quilômetros não mapeados do
rio Roosevelt); trabalhou com o Smithsonian, com o
Museu Nacional de História Natural (Washington, D.C.) e
com o Museu Americano de História Natural (Nova York).
Roosevelt pode ter sido o primeiro presidente
“midiático”, já que sua voz, em um discurso político, foi a
primeira a ser gravada para circulação em massa.
Roosevelt também permitiu que sua imagem fosse
gravada em uma coleção de clipes de filme mudos.
Existem vários escritos acadêmicos e de não ficção de
autoria de Roosevelt. Juntos, esses artefatos de mídia
fizeram de Roosevelt um dos líderes mais publicamente
acessíveis do início do século XX.
Como resultado da presença voluntária de Roosevelt
na mídia de massa, os norte-americanos tiveram uma
ampla cobertura das labutas de sua vida, incluindo suas
escapadas em safáris. Em 1909 ele visitou o então Congo
Belga em uma expedição, com o objetivo de adquirir
animais para museus norte-americanos. Ele e seu time
voltaram com um tesouro de 11 mil espécimes
(elefantes, hipopótamos, rinocerontes, insetos) para
preservação e/ou montaria. Na mente do público,
Roosevelt havia “conquistado” a África.
Roosevelt contribuiu com os próprios mitos por meio
de seus escritos sobre safáris e regularmente se
apresentava como uma figura gentil e racional. Escreveu
que quase sentia pena dos carregadores negros em suas
expedições, já que eles tinham apenas suas roupas, um
lençol e uma tenda; isto é, até conhecer Kikuyu, que
tinha apenas um pequeno lençol e nenhuma roupa ou
tenda. Foi então que Roosevelt acalmou sua culpa ao
proclamar “o quão mais bem tratados” eram seus
carregadores “pelo simples fato de estarem no safári de
um homem branco”.5 Tais experiências foram bem
documentadas graças ao grande compêndio
robustamente divulgado dos escritos, citações e escritos
de Roosevelt. O projeto do compêndio começou em 1928
e foi concluído em 1941, o que coincide com a grande
proliferação de filmes sobre norte-americanos dominando
a selva.

AMOR NA SELVA… COM MACACOS… QUE


NOJO!
Ocasionalmente um boato de algum tipo vira uma
história de primeira página, mas seria melhor que
os jornais fossem “avisados” da estratégia.

— The Encyclopedia of Exploitation (138)6

“Animalística, sexualidade ‘selvagem’.” Patricia Hill


Collins, em seu livro Black Sexual Politics, observa que
mulheres negras não conseguem se livrar de tais
estereótipos sexuais. Hill Collins escreve sobre
“percepções ocidentais de corpos africanos”, notando
que a “mistura de peles de animais, […] culto aos seios e
foco no traseiro” continuam sempre presentes.7 Hill
Collins nota que desde Sarah Baartman (apelidada
pejorativamente de “Vênus Hotentote”) até Josephine
Baker e as Destiny’s Child, a atração — ou, mais
precisamente, a comerciabilidade —— dos corpos dessas
mulheres negras tem sido ligada a figuras primitivas
hipersexuais, referidas de forma coloquial como
“aberrações”. De forma significativa, é a sexualidade da
mulher negra — e não o romance negro ou o amor — que
captura a imaginação e a atenção dos criadores de
imagens durante o ciclo do terror da década de 1930.
O filme de terror “com negros” Ingagi, de 1930, é
inteiramente dedicado à sexualidade animalesca de
mulheres negras. Situado no Congo, é dito que o filme foi
influenciado pelas viagens de Roosevelt pelo país. Ingagi
é um dos filmes de terror mais nauseantes, não por
causa dos tropos esperados de horror, como sangue e
violência (não há nada disso), mas por causa de seu
ataque nojento contra a sexualidade negra.
Ingagi conta a história de cientistas pesquisadores
brancos que viajam para as profundezas da selva
congolesa a fim de investigar os estranhos rituais de uma
tribo que tanto reverencia quanto teme os gorilas, ou
“ingagis”. Os congoleses oferecem suas mulheres
virgens para as feras. A história do filme é uma daquelas
que dão conta do iluminismo branco. Chocados com os
sacrifícios rituais dos nativos e incapazes de tolerar essa
prática por mais um momento sequer, os cientistas
trabalham para resgatar uma jovem vítima negra das
garras de uma besta-símia. Enquanto salvam a vida da
mulher negra e matam o animal, os homens, e,
consequentemente, a plateia do filme, são levados a crer
que a mulher não foi livrada apenas de ser espancada
e/ou devorada pelo animal. Em vez disso, ela foi poupada
de um encontro altamente erótico com a bestialidade.
Para encerrar o assunto, outra mulher seminua emerge
da selva no fim do filme segurando um bebê humano que
tem a pele coberta de pelos. O infante é descrito como
“uma criança estranha, mais símia do que humana”.
Ingagi não foi vendido como um filme de terror pelo
seu diretor William Campbell ou pelos produtores da
Congo Pictures, Ltd. Pelo contrário, foi promovido como
um verdadeiro e factual documentário. Ou seja, Campbell
afirmou que Ingagi foi simplesmente editado, mas que
era filmagem não adulterada e feita pelos membros da
exposição. Ele garantiu ao público que os membros da
expedição e as atividades da tribo eram bem reais, e que
nada fora ensaiado. Em materiais promocionais, frases
de efeito incentivavam os frequentadores de cinema a
acreditarem que os eventos representados em Ingagi
eram verdadeiros: “Você já ouviu falar sobre coisas
assim, mas não acreditou […] Mas este filme mostra a
realidade pela primeira vez”, e “Um milhão de emoções
[…] Uma gravação verdadeira de aventura africana!”, e
“Mitos e lendas da parte mais escura da África trazidas
para a realidade por meio do incrível trabalho das
câmeras!”. Rapidamente, o filme passou a ser
popularmente referido como “o filme de sexo com
gorila”, quebrou recordes de bilheteria e até inspirou
uma música chamada “My Ingagi”.8
Uma humana fazendo sexo com um gorila nunca
apareceu em cena. Em vez disso, o público foi mantido
literalmente no escuro à medida que o trabalho de
câmera e a baixa iluminação apenas sugeria a cópula
interespécies, impedindo a visão de atrizes brancas com
o rosto pintado de preto que retratavam algumas das
nativas.9 Contudo, a arte do pôster de divulgação
prometia bestialidade explícita (de forma figurativa e
literal), pois mostrava um gorila, em posição ereta,
sequestrando uma mulher negra careca com os seios
expostos. O gorila segura a mulher com os seus dois
“braços” e aperta um dos seios da negra entre os dedos.
De tal forma, Ingagi alude a uma “sexualidade masculina
negra e agressiva na forma do gorila” que caça mulheres
negras lascivas.10 Aqui, mulheres negras são envolvidas
em um esquema complexo de aberração, onde são
hipersexuais e disponíveis ao mesmo tempo, mas nem
um pouco femininas, bonitas ou atraentes (de acordo
com os padrões tradicionais do Ocidente). Materiais
promocionais também incluíam a pergunta: será que
Darwin estava certo? Logo, Ingagi sugeria uma ligação
direta entre a genética dos negros e as “bestas negras
supermasculinas”.11 O resultado foi um filme que
convidava o público a associar as práticas sexuais negras
com bestialidade e provocava nojo diante da habilidade
única dos negros de acasalar com um animal.* De tal
forma, o filme inteiro se utilizava de dicotomias binárias,
trabalhando de forma eficiente para separar os brancos
civilizados (humanos) dos negros selvagens (bestas),
distinguindo, assim, os brancos como exemplos de
superioridade racial.
A controvérsia em relação à Ingagi não parou por aí.
De acordo com Andrew Erish, repórter do LA Times, que
escreveu uma longa matéria especial sobre o filme,
vários meses depois de seu lançamento as dúvidas sobre
sua autenticidade começaram a surgir. Ingagi incluía
cenas e sobras de filmagem de filmes mais antigos e
bem conhecidos como Heart of Africa (1915) (outro
“documentário” sobre safáris na África). Muitas das
cenas com gorilas em Ingagi foram filmadas em um
zoológico na Califórnia. Foi provado, por meio de um
depoimento juramentado assinado, que o ator Charles
Gemora interpretou o gorila usando uma fantasia.
Alguém reconheceu uma das mulheres “africanas” do
filme como uma atriz figurante recorrente em filmes
hollywoodianos. O jornal Los Angeles Examiner reportou
que “negros comuns das ruas” foram escalados como
homens tribais. Ainda assim, quando questionados, o
diretor do filme e outros envolvidos na produção
insistiram que Ingagi era autêntico, e as cidades
continuaram a exibir o filme dessa maneira. Três anos
depois, quando a estadia do filme nos cinemas acabou, e
depois que a companhia responsável pela produção do
filme alardeou lucros de mais de um milhão de dólares, a
Comissão Federal de Comércio (FTC) determinou que os
cineastas não poderiam mais divulgar o filme como uma
produção autêntica.12 Como parte das evidências, o FTC
notou que “ingagi” era uma palavra inventada.13
Em meio a toda essa controvérsia, ninguém pareceu
se importar com os ataques contra a sexualidade negra.
Apesar do estabelecimento de um código governante de
moral e decência na indústria do cinema, que incluía a
rejeição de nudez feminina, verdadeira ou implícita, se
estivessem a serviço de um interesse lascivo, os corpos
de mulheres negras não contavam. O corpo negro
“nativo”, nem moral e nem decente, “se tornou
instantaneamente um local de excitação sexual e
degradação racial sancionada”.14 Infelizmente, não
existiram campanhas para boicotar o filme, como
aconteceu no caso de O nascimento de uma nação. No
fim, Ingagi entrou para a história, de acordo com uma
resenha do jornal The New York Times, como “um dos
trotes mais ultrajantes já feitos”.15
Pouco depois de Ingagi, surgiu O passo do monstro
(1932). Esse filme de terror “com negros” é mundano
(principalmente quando comparado com Ingagi). A
ganância motiva uma dupla de empregadas domésticas
a se livrar de Ruth (Vera Reynolds), a filha de seu
empregador recentemente falecido. Ruth acabou de
herdar a fortuna do pai e a mansão, que, por acaso,
também tem um gorila no porão. As empregadas se
fantasiam de gorila, planejando matar Ruth e colocar a
culpa no animal. Contudo, no último minuto, Ruth é salva
por seu intrépido noivo, Ted (Rex Lease).
O passo do monstro exibe vários clichês de terror que
vinham sendo desenvolvidos ao longo dos anos —
animais assustadores, a mansão gótica e mal-
assombrada, a bela vítima branca, o salvador branco,
romance, e, de forma interessante, o negro engraçado. O
passo do monstro conta com a participação do famoso
(infame) ator Willie Best, que é apresentado com o nome
artístico obviamente ofensivo “Sleep ’n’ Eat” [dorme e
come], no papel de Exodus. No filme, Exodus é o
motorista e mordomo de Ted. Exodus é infantil,
indisciplinado e sempre se assusta, profunda e
comicamente, com tudo — relâmpagos, o escuro, casas
grandes, barulhos e até mesmo um tapete de urso. O
filme é uma sucessão de sustos levados a sério, exceto
quando Exodus aparece em cena. O filme até mesmo
termina de maneira cômica. Exodus e o gorila finalmente
ficam de frente um para o outro. Espera-se que seu
encontro com o animal credite a teoria darwiniana de
que o homem (negro) descende do macaco (como
também é teorizado em Ingagi): “Quer dizer que ele tem
parentesco comigo?! […] Bem, eu não sei dizer. Eu tinha
um avozinho que se parecia um pouco com ele. Mas que
não era tão ativo assim.”
De maneira significativa, Exodus também ilustra a
maneira tendenciosa como o público via o negro norte-
americano em relação àqueles de outras partes não
ocidentais do mundo. Quando se dava em ambientes
domésticos, a representação dominante dos negros
durante o período era cômica. Essa representação se
alinhava às representações seguras, alegres,
subservientes e dessexualizadas de filmes como … E o
vento levou, que remontavam a um período mais estável
e ordeiro da história americana. Contudo, quando os
negros (interpretados por atores afro-estadunidenses)
eram transplantados para locações estrangeiras, eles
eram representados como figuras perigosas, selvagens
hipersexuais que se mostravam uma ameaça
considerável para os brancos. Ingagi e vários outros
filmes de selva (como Tarzan, o filho da selva [1932] e
Lua negra [1934]) apoiam essa teoria.

O REI DO AMOR SÍMIO


A popularidade de Ingagi e o sucesso de bilheteria
provou que a fórmula de primitivos “escuros” somada a
uma superioridade “clara” continuaria a trabalhar bem e
de forma lucrativa. Foi o sucesso de Ingagi que
convenceu o estúdio RKO a autorizar o filme de terror
“com negros” King Kong (1933), no qual um macaco
gigante, Kong, se apaixona, persegue e sequestra uma
mulher branca.16
Se Ingagi fez com que o público considerasse os
costumes sexuais repulsivos das mulheres negras, então
King Kong estendeu o ataque metafórico aos homens
negros por meio das imagens de um grande gorila negro
perseguindo uma mulher branca. É um caso, como Snead
argumenta de maneira persuasiva, do “negro codificado”,
quando a negritude é representada implicitamente na
figura do macaco.17 Kong é “enegrecido”, ou racialmente
codificado, quando justaposto em relação à presença de
brancos no filme. Kong é a cor negra emergindo de uma
cultura primitiva mais “baixa”, onde ele é cercado por
nativos negros — ou mini-Kongs, quando se vestem como
macacos para adorar o grande Kong. A trilha sonora que
acompanha as cenas com Kong e os outros negros no
filme consiste de tambores, uma pista auditiva que é
típica dos filmes de selva e da aparição de negros
nativos.18 O filme também continua a confinar os
entendimentos acerca da negritude na primitividade, e
sua sexualidade na selvageria, acrescentando o medo de
grandes falos negros. Assim, King Kong adicionou mais
um motivo para o extermínio do Outro negro — seu corpo
é muito bem-dotado quando comparado ao homem
branco padrão. Kong é acorrentado e enviado para os
Estados Unidos (sua trajetória marítima diaspórica), onde
experimenta um pouco de escravidão antes de ser
executado por sair enlouquecido atrás de uma mulher
branca.
King Kong não se afastou muito do artifício narrativo
de um-filme-dentro-do-filme empregado em Ingagi — um
tipo de “colonização óptica”.19 Em Kong, um cineasta
norte-americano branco e sua equipe navegam até a Ilha
da Caveira, localizada em algum lugar do oceano Índico
(perto da Indonésia), para fazer um filme estrelado por
uma mulher loira e bonita, em contraste com o fundo de
primitivismo real da ilha intocada pela evolução.
Quando chegam à ilha, a equipe monta uma
expedição e encontra uma tribo composta de nativos
negros (não indonésios). Bogle (2005) afirma que o
elenco de Kong incluía “todo mundo que encontrassem”,
desde que não tivessem feições claras. O estúdio
procurava por atores figurantes com “feições escuras,
lábios grandes e cabelo crespo”.20 O uso de atores
negros para interpretar indonésios ilustra um impulso
racial típico de Hollywood, de relegar qualquer um com
pele escura ao papel de Outro.21 Os nativos, que são
vestidos com pedaços de pele de animais e carregam
lanças, têm o rosto pintado e usam perucas afro. O
“chefe nativo”, um papel pequeno, é interpretado pelo
ator Noble Johnson. A tribo (e isso vai soar muito, muito
familiar) oferece suas mulheres virgens, silenciosas,
submissas e seminuas como “noivas” para Kong, com o
objetivo de permanecer nas graças do gorila.22 A
representação das noivas combinava de forma única o
feroz e o selvagem com uma servitude complacente.
Com a chegada da equipe branca, o chefe e sua tribo
notam a jovem e bela loira Ann Darrow (Fay Wray). Os
nativos imediatamente concluem que sua pele branca a
torna bem especial. A exclamação de júbilo do chefe,
“Olhem para a mulher dourada!” (frase traduzida pelo
capitão do navio que, por acaso, fala a língua “nativa”),
une o olhar masculino negro com o do gorila, que
também olha com adoração para Darrow assim que a vê.
Quando o aspirante a cineasta Carl Denham (Robert
Armstrong) responde “Sim, loiras estão em falta por
aqui”, o comentário do personagem funciona não apenas
para elevar a branquitude, mas também para dispensar a
possibilidade de que a beleza possa ser encontrada nas
mulheres negras. E então o chefe propõe uma troca
perturbadora: ele entregaria seis mulheres negras para
os norte-americanos em troca de Darrow. O plano é
sacrificar Darrow, que, teoriza o chefe e sua tribo, vai
agradar Kong muito mais. A oferta do chefe, claro, é
recusada. Como Greenberg elabora, esse confronto é
uma criação de mitos raciais da pior espécie:

De acordo com essa visão depravada de outras


terras e povos, uma das “nossas” mulheres deve
valer seis das mulheres deles. E embora os
homens “delas” sejam capazes das agressões
mais ferozes, um dos “nossos” consegue
aguentar e chicotear meia dúzia dos homens
deles em um combate limpo […] Kong, então, é
a epítome do sonho branco de homens negros
brutos, sem coração, estrangeiros
descerebrados, que se alimentam de violência e
rapinagem.23

Mais tarde, os nativos se esgueiram para dentro do navio


e sequestram Darrow, um evento que é descrito num
inglês ruim pelo cozinheiro chinês, Charlie (Victor Wong),
que diz: “Negros loucos estiveram aqui”. Quando Charlie
pede para ir para a terra — “Eu querer ir também!” —,
seu pedido é prontamente ignorado, e Charlie nunca sai
do barco e nem é visto novamente. Na verdade, essa é
uma briga apenas entre negros e brancos.
Depois do sequestro de Darrow pela tribo, os nativos a
entregam para o gigantesco Kong numa grande
cerimônia. Certamente é válido nos perguntarmos “o que
o monstro faria com aquela moça se ele conseguisse tê-
la […] dada a natureza obscura do seu desejo e aparato
genital”.24 Contudo, Ingagi deixou implícito que tudo é
possível e que resgatar Darrow das garras do animal
significa salvá-la do encontro mais inimaginável com
uma besta de 15 m de altura.25
O filme também afirma que, diferente de seus
encontros passados com mulheres negras, a reação de
Kong diante de Darrow é única porque ele não a devora,
mas se apaixona por ela e deseja tê-la por perto. Na
verdade, o profundo desejo de Kong por uma parceira
“humana” não é mostrado quando uma mulher negra é
oferecida a ele. Em vez disso, seu desejo sexual se torna
humano e humanizado de maneira mais completa
quando ele se interessa por Darrow. Sua afeição é
mostrada por meio de seu heroísmo protetor e de seus
afagos gentis no cabelo loiro dela — e cabelo, o filme
lembra ao público, não é algo que o macaco tenha visto
antes entre os habitantes negros da Ilha da Caveira.
Darrow é resgatada das garras do gorila por Driscoll.
Contudo, é a tribo que sofre as consequências quando
Kong perde a sua “noiva” branca. Ele fica furioso, destrói
a aldeia e mata vários nativos. Ele morde suas cabeças,
bate neles, os devora e pisoteia até a morte. Em uma
cena, deletada de várias cópias, ele trucida as crianças
da aldeia.26 Kong é capturado, escravizado pelos norte-
americanos e posto acorrentado em exibição num palco
em Nova York; ele, dessa forma, tem uma surpreendente
semelhança com os escravizados colocados despidos em
leilão, expostos para uma dissecação visual e fetichista.
Kong escapa dos seus captores e sai em busca de
Darrow. De forma parecida com o Monstro em
Frankenstein, Kong, o grande macaco preto, comete o
erro fatal de entrar no quarto de Darrow e levá-la para
aquele que será seu último momento juntos. O objetivo
narrativo implícito é o de manter a fera longe dos
aposentos das damas (brancas).27 Há pouco desacordo
em relação à afirmação de que Kong representa a
masculinidade e a dominância sexual, já que existem
“poucas imagens de dominância masculinas na arte
ocidental mais estranhas e inesquecíveis do que um
macaco gigante segurando [Darrow] como um prêmio no
topo do deco-falicismo delirante do recém-inaugurado
Empire State Building”.28 Comparando as infames
imagens de dominação exibidas por Gus e Silas Lynch em
O nascimento de uma nação com Kong, Young escreve:
“King Kong oferece uma versão dessa fantasia cultural
racista sobredeterminada” enquanto reforça “o ‘realismo’
histórico mais suave de O nascimento [de uma
nação]”.29 De forma pouco surpreendente, Kong é
baleado e morto, executado pelas forças militares,
terminando de uma vez por todas seus ataques de fúria
por Nova York atrás de uma mulher branca.
A história de amor entre o macaco primitivo e a bela
mulher branca continuaria a encantar cineastas e
plateias por várias décadas. Em 1976, John Guillermin
refez King Kong, anunciando inicialmente um homem
negro “encorpado” no papel de Kong.30 O nome de Ann
foi mudado para Dwan, e o propósito da expedição, de
uma filmagem, passou a ser a exploração de uma ilha do
Pacífico Sul ainda “não descoberta”, embora
completamente habitada, pela equipe de uma empresa
petrolífera. Muito do restante do filme permanece igual
ao original. Embora se trate de um lançamento pós-
Direitos Civis/movimento Black Power, há pouca
evidência de sensibilidade racial. A representação dos
ilhéus como negros primitivos permaneceu, assim como
sua noção de que seis mulheres negras equivalem a uma
mulher branca.
Em 2005, quando Peter Jackson realizou o terceiro
remake de King Kong por um grande estúdio, o
lançamento reavivou debates antigos acerca do grande
macaco negro como metáfora para a depravação negra,
em contraste com a superioridade e a desejabilidade
branca ocidental. O King Kong de Jackson é fiel ao filme
original de 1933. Contudo, Jackson trabalha para
reimaginar algumas cenas-chave que tivessem a ver com
negritude. Os nativos negros da Ilha da Caveira (muitos
dos quais são escurecidos com maquiagens e têm dentes
afiados) representam o horror no filme — eles são sujos,
assustadores, hostis e violentos. Hordas deles se lançam
contra a equipe de filmagem branca, espetando e
batendo em seus integrantes assim que eles chegam à
ilha. Os nativos são representados como monstros que,
inexplicavelmente, tremem e se sacodem e rosnam
enquanto reviram os olhos. Essa performance de
possessão permite ao telespectador enxergar melhor o
povo maldito, que se adorna com ossos e se enfeita com
amuletos feitos de caveiras.
FIGURA 2.1 AS PRÓXIMAS VÍTIMAS DE KONG EM KING KONG.
RKO Radio Pictures/Photophest
O outro princípio da representação de Jackson da
negritude é demonstrado por meio do autossacrifício do
personagem Ben Hayes (Evan Parke), um veterano da
Primeira Guerra Mundial que é o confiável e engenhoso,
segundo capitão do navio. O personagem é poupado de
dividir uma cena com os nativos fantasmagóricos e
enegrecidos, pois fica a bordo do navio para consertá-lo
enquanto os outros desembarcam. Quando os nativos
atacam, Hayes aparece na ilha, mas só depois que os
nativos fogem por causa dos tiros disparados pelo
capitão do navio. Hayes faz o papel de um pai protetor
para um adolescente branco chamado Jimmy, que é
parte da tripulação do navio. O laço entre Hayes e Jimmy
é tão profundo que Hayes se sacrifica quando a
expedição, da qual Jimmy participa, é atacada por Kong.
Na cena final de Hayes, na metade do filme, ele atrai
Kong para si, gritando “Olhe pra mim!” e alertando os
demais: “Fujam. Por trás das árvores. Tirem o Jimmy
daqui. Você precisa correr, Jimmy. Faça o que eu estou
mandando. Corra!”. Kong mata Hayes, e Jimmy vive para
ver outro dia.
Quando Kong é forçado a se apresentar nos Estados
Unidos, sua revelação é precedida por nativos
enegrecidos e com perucas afro em um animado número
de canto e dança. A morte do personagem de Hayes
serve para remover o dilema constrangedor do negro
moderno em confronto com o negro primitivo no roteiro.
O Kong de Jackson recebeu Oscars de melhores efeitos
especiais e som, lucrando mais de 650 milhões de
dólares em ingressos e venda de DVDS, o que fez do filme
uma das produções de maior bilheteria distribuídas pela
Universal Pictures.
O LEGADO DO MACACO — ALÉM DOS ANOS
1930
Filmes de ficção científica como O planeta dos macacos
(1968) estenderam o tema da superioridade racial
branca em relação a espécies inferiores racialmente
codificadas como macacos. O planeta dos macacos, que
rendeu quatro continuações, um remake e duas séries de
TV (uma delas em animação), conta a história de um
grupo de astronautas norte-americanos que viaja pelo
espaço do ano 1972 para o ano 3978 e aterrissam em
um “mundo invertido” em que símios (gorilas,
orangotangos e chimpanzés) dominam humanos
primitivos e mudos. A raça aparece de maneira
proeminente em O planeta dos macacos, onde até os
macacos invocam um sistema de casta baseado em raça.
Os astronautas formam um grupo de três homens. O
coronel George Taylor (Charlton Heston), um loiro branco
de queixo quadrado que comanda a missão e lidera seus
dois companheiros enquanto tentam descobrir onde e
em que época eles estão. Landon (Robert Gunner)
também é um astronauta branco, mas seu jeito tímido e
sua abordagem humanística do mundo o transformam
em um subordinado de Taylor. Um terceiro homem,
Dodge (Jeff Burton), fecha o time. Negro, ele é saudado
como um grande cientista pelos seus colegas. Quando os
homens são atacados pelos macacos falantes e vestidos
que portam armas, Taylor é ferido, mas sobrevive.
Landon é lobotomizado, mas não é morto. Apenas Dodge
é morto. Um taxidermista o empalha e ele é colocado em
exibição num museu.
Uma quarta astronauta, uma jovem loira chamada
Stewart (Dianne Stewart), enfrenta um problema em seu
sistema de suporte vital durante a viagem e morre antes
do pouso da nave no planeta dos macacos. Com a
remoção da mulher branca logo no início, Stewart, uma
beleza branca ou “a carga mais preciosa”, como Taylor a
descreve, é poupada de um encontro com os macacos
que agora, nesse filme, possuem a habilidade de
examinar e invadir o corpo humano. Na continuação de
1970, De volta ao planeta dos macacos, a obsessão por
mulheres loiras mostra suas cores rapidamente. Quando
um soldado gorila (o mais negro e bruto dos símios no
planeta dos macacos) tropeça no corpo de uma mulher
branca platinada, ele fica tão enamorado dela que se
detém para alisar suas mechas sedosas e alvas.
A conquista do planeta dos macacos (1972), uma
alegoria das relações raciais e opressão nos Estados
Unidos, é o único filme da série que pode ser associado
mais de perto com o horror: “Veja a tela explodir ao ver o
homem enfrentar o espetáculo mais horrível na história
da ficção científica”.31 Tal tipo de promoção indicava que
Conquista não seria uma ficção científica para toda a
família como os filmes anteriores haviam sido
anunciados. A história do filme, uma prequela situada em
1991, mostra como os macacos, por meio de uma
revolução armada, conseguiram dominar a Terra.
Inspirados pelas revoltas de Watts em 1965, narrativas
negras permeiam o filme. MacDonald (Hari Rhodes), o
assistente negro do governador, é mostrado como uma
figura simpática e heroica ao suportar e erguer a voz
contra uma série de injúrias raciais. Em uma cena,
MacDonald é acusado por um policial branco de amar
macacos, ao que um outro policial responde: “Faz
sentido”. O público é convidado a ver os policiais como
racistas. MacDonald também é obrigado a aturar um
leilão de escravos símios onde um chimpanzé é descrito
como estando “no ápice da juventude e em perfeitas
condições físicas” e como “familiar, obediente e dócil”,
com ofertas que começavam em oitocentos dólares. Essa
inversão dos macacos se tornando mais humanos (com
os humanos se tornando mais selvagens) é acentuada no
filme quando os macacos são ligados à história de
políticas raciais nos Estados Unidos:

MACDONALD: Como você pretende ganhar essa


liberdade?
CAESAR (Chimpanzé): Da única forma que nos
resta — revolução. … Você, acima de todos,
deveria entender. Não podemos ser livres até
que tenhamos poder. […]
MACDONALD: A violência prolonga o ódio. O ódio
prolonga a violência. Com que direito você
derrama sangue?
CAESAR: Com o direito do escravo de punir seus
perseguidores.
MACDONALD: Caesar. Eu, um descendente de
escravos, peço que você mostre humanidade.

Nas cenas finais do filme em que os macacos se revoltam


contra a escravidão, eles aparecem armados com M16s,
e os cineastas adotam propositalmente um esquema de
cores vermelho, preto e verde para aumentar o
sentimento de desconforto (essas também são as cores
associadas ao movimento Pan-Africano). Em entrevistas,
os cineastas observaram que estavam cientes de que
não poderiam fazer um filme que estrelasse o líder das
revoltas de Watts, mas era viável retratar um macaco
como líder revolucionário.32 Houveram afirmações de
que o público negro se identificou com a mensagem
pouco sutil do filme, e uma revista informou que era
possível ouvir negros gritando “É isso aí!” enquanto os
macacos lutavam contra os “branquelos”.33
Na década de 1930, e ao longo do século XX, os filmes
continuaram com sua obsessão pela figura de homens
brancos em terras estrangeiras conquistando lugares
“sombrios” e seus habitantes “escuros”. A preservação
da feminilidade branca continuaria a ser um tema
central, assim como a mensagem de que negros eram
primitivos em seu desenvolvimento e de menor valor. A
união dessas duas mensagens, a pureza da mulher
branca e o animalismo dos negros, tem se provado tão
implacavelmente popular que, em 2008, a estrela do
basquete LeBron James posou como o perigoso Kong ao
lado da modelo branca Giselle no papel de Ann Darrow
na capa de abril da revista de moda Vogue. Ao reencenar
a cena do famoso filme de terror, James e Giselle
aproximaram um pouco mais do mundo real a ligação
entre homens negros como macacos lascivos e a mulher
branca como sua presa.

DO HAITI VEM A CONSTRUÇÃO DE MITOS


Mas no Haiti há os ligeiros, os mortos e, então, os
Zumbis.
— Hurston (179)34

O Haiti, com aproximadamente 27.750 km2, compreende


a parte ocidental da ilha de Hispaniola. Embora pequeno,
ao longo dos últimos quatro séculos, o país tem tido uma
grande presença na história, situando-se no centro de
um cabo de guerra disputado por um grande número de
ocupantes estrangeiros. Hoje, o Haiti conta com menos
de cem anos de independência. Tendo (por pouco)
sobrevivido a um ciclo explorador de invasões e
subjugação, e, recentemente, sendo vítima de um
terremoto catastrófico, o custo para o Haiti tem sido alto,
daí a impressão de se tratar da “nação mais pobre no
hemisfério ocidental”.35
Os problemas do Haiti começaram em 1492, quando
Cristóvão Colombo “descobriu” a ilha e a batizou de
Hispaniola, enquanto reivindicava a terra e seus
habitantes, os taino aruaques, para a Espanha. A
Espanha levou para a ilha armas sofisticadas e doenças,
contra as quais os aruaques não podiam lutar. Uma
geração mais tarde, por volta de 1517, com a dizimação
dos aruaques, escravizados da África Ocidental, de
países como o Benin (antigo Daomé), foram levados para
lá para trabalhar no cultivo de cana e na produção de
açúcar. Os escravizados levaram com eles uma
variedade de práticas religiosas que eram rejeitadas
pelos europeus. Impossibilitados de praticar abertamente
a sua fé, os escravizados de Hispaniola hibridaram suas
crenças e celebraram suas próprias tradições no interior
da religião dos escravizadores — especialmente o
catolicismo, que oferecia uma estrutura muito similar.
Essa ocultação de religiões originárias não era uma
prática incomum. O dr. Bellegarde-Smith, um estudioso
de história haitiana e de vodu nascido no Haiti, explica a
história:

O vodu é relacionado a outras tradições


africanas transplantadas, como a santeria, que
teve lugar em Cuba, e o candomblé no Brasil.
Em todos esses lugares o catolicismo era a
religião oficial dos colonizadores. Escravos e
pessoas comuns escondiam os espíritos que
conheciam dentro da veneração a santos
católicos. Até hoje muitos haitianos combinam
práticas vodu com devoção católica.36

Durante o fim dos anos 1600, a ilha foi novamente vítima


de violência quando os franceses tomaram conta de uma
porção mais ao norte e saquearam as plantações de
tabaco, dando início a um conflito entre França e
Espanha. Em 1697, os dois países europeus decidiram
dividir o Haiti, e a França ficou com o terço ocidental do
país, nomeando-a de Saint-Domingue (que mais tarde
seria o Haiti).
Em 1793 aconteceu uma das revoltas de escravizados
mais significativas — a Revolução Haitiana —, que
finalmente levou à abolição da escravidão. O líder da
revolução, o escravizado nascido haitiano Toussaint
L’Ouverture, “um voduísta, ou seja, um praticante de
vodu” rezou ou “convocou os espíritos” com o fim de
libertar o Haiti.37 Os espíritos aparentemente
responderam com algum tipo de graça, já que
L’Ouverture e seu exército escorraçaram inclusive os
ingleses, que também tentavam ganhar espaço na ilha.
L’Ouverture, ao se tornar o novo líder do Haiti, criou uma
constituição e trabalhou para consertar a economia
explorada da ilha em favor de seus habitantes. Por
aproximadamente cinco anos (1798-1802), o Haiti
experimentou uma liberdade e governo próprio que
nunca tivera por três séculos.
A independência do Haiti foi mais uma vez ameaçada
quando L’Ouverture tentou livrar completamente o país
do controle europeu, uma condição que encontrou
resistência por parte da plantocracia europeia que
restava na ilha, com a ajuda de 30 mil soldados
franceses. Para impedir qualquer resistência, L’Ouverture
foi preso contra a sua vontade e morreu de pneumonia,
quando teve atendimento médico negado. Em seu lugar,
o escravizado nascido africano Jean-Jacques Dessalines
assumiu o posto, liderando os haitianos a uma vitória
sobre os franceses e rasgando a faixa branca da tricolore
francesa num famoso ato para declarar o país como uma
república negra, e (mais uma vez) pronunciar o Haiti
independente em 1804. A França tentaria tomar a ilha
novamente em 1825, o que resultou num tratado em que
a França reconheceria o Haiti como um país
independente, mas ao custo de 90 milhões de francos
por ano para o empobrecido país.
Enquanto isso, alguns dos 10 mil haitianos e
escravizados, assim como colonizadores brancos
franceses, fugiram do caos, indo para Nova Orleans,
Louisiana (atraídos pelas plantações similares),
causando, dessa forma, um impacto dramático no
cenário cultural da cidade. Essa migração se provou
importante para a construção de mitos sobre o Caribe,
que veio a ser visto como um “lugar fatal e promíscuo”,
cujos produtos culturais “viajavam por bem ou por mal
pelo mundo, mudando em cada lugar onde chegavam”.38
Na verdade, nos Estados Unidos o vodou se tornou
voodoo (embora alguns tenham rejeitado essa grafia por
considerá-la vulgar). Até mesmo um filme de terror, The
Love Wanga (1936), explicou que a religião do Haiti veio
a “ser conhecida para o homem branco como VOODOO”
[ênfase minha].39
Os Estados Unidos se recusaram a reconhecer a
independência do Haiti até 1862.40 A ascensão do Haiti
no mundo foi complicada também por vários golpes de
Estado, alimentados por interesses externos.
Em 1915, o presidente norte-americano Woodrow
Wilson ordenou uma outra ocupação no Haiti. Por
dezenove anos, entre 1915 e 1934, os Estados Unidos
possuíram o Haiti, uma apreensão preventiva motivada
durante a Primeira Guerra Mundial por receio de que a
Alemanha pudesse desejar a ilha para sua própria
vantagem militar. A ocupação militar do Haiti, liderada
pela Marinha, tomou a forma de uma ditadura, marcada
por extrema violência, onde toda forma de dissidência
política era respondida com derramamento de sangue. A
violência também foi pontuada por um racismo
profundamente entranhado por parte dos militares norte-
americanos: “O soldado da Marinha de alta patente
Smedley Butler se referiu aos líderes da resistência
popular como ‘macacos depilados, sem nenhum tipo de
inteligência, apenas uns crioulinho [sic]’”.41 Em 1932,
durante o governo Roosevelt, foi anunciado que o tempo
da Marinha no Haiti havia chegado ao fim, quando
ocorreram partidas em massa escalonadas. O último
marinheiro foi embora em 1934, acenando adeus para
um país deixado em frangalhos sociais, políticos e
econômicos.
É provável que não seja coincidência que a partida da
Marinha tenha começado em 1932, coincidindo com o
lançamento do primeiro filme norte-americano de terror
inspirado no vodu, Zumbi branco (1932), que teve o Haiti
como cenário. Na verdade, os marinheiros trouxeram
histórias fantásticas sobre os modos supostamente
estranhos do povo do Haiti, incluindo o uso de magia
“negra” (feitiços mortais e envenenamentos).

NO INÍCIO, ZUMBI BRANCO


Representações do vodu no cinema existem há tanto
tempo quanto a própria mídia.42 Frequentemente, se
houvesse uma selva, algum tipo de representação de
feitiço ritual era jogado no meio para aumentar o
sentimento de perigo numa terra selvagem, completado
com a presença de cobras, nativas parcialmente nuas
dançando ao redor de círculos de fogo e, claro, uma trilha
sonora arrepiante associada aos negros — tambores.
Rhodes identifica alguns tratamentos iniciais do vodu na
história do cinema, começando com o filme Voodoo Fires
(1913), que prometia a união clichê de rituais malignos e
chamas. A companhia de cinema de Sigmund Lubin
também entrou na moda de elencar o vodu como algo
vulgar em Ghost of Twisted Oak (1915). O filme
Unconquered (1917) mostrou o vodu ligado a rituais de
sacrifício humano.43 O filme The Witching Eyes (1929),
um “filme negro” de terror produzido, escrito e dirigido
por brancos, foi uma adição inicial na moda popular de
mostrar como o vodu podia ser usado para perturbar
assuntos do coração.
Há muito o que ser dito sobre o que estava presente
nesses filmes, incluindo o tratamento exploratório dos
negros e das religiões negras. Ainda assim, o mais
notável entre essas produções iniciais sobre vodu é
aquilo que está ausente delas — zumbis. Na verdade, o
vodu era mostrado como algum tipo de religião pagã
cujas únicas propriedades envolviam rituais em
celebração a deuses negros e magia negra. Contudo, o
cinema de vodu teve uma mudança dramática em 1932
com o filme Zumbi branco, que focava em zumbismo e
na habilidade de ressuscitar os mortos para que eles
seguissem as ordens de alguém.
Zumbi branco pode ser creditado como o precursor do
prolífico subgênero dos filmes de zumbi (exemplos: A
noite dos mortos-vivos [1968] e A maldição dos mortos-
vivos [1988]). Contudo, a principal influência do filme e
do gênero subsequente é o relato de viagem A ilha da
magia (1929), de William Seabrook, que trata sobre a
criação de zumbis no Haiti. Enquanto monstros como
Frankenstein ou Drácula tinham uma origem literária, os
zumbis, supostamente, eram oriundos da não ficção;
descrições de vodu e zumbis eram encontradas em
relatos em primeira mão escritos por europeus e norte-
americanos. O livro de Seabrook é, de longe, o mais
citado e conhecido. Escrito durante a ocupação da
Marinha americana no Haiti, A ilha da magia servia para
descrever o país como um lugar extremamente difícil,
com haitianos e norte-americanos em conflito uns contra
os outros em grande parte por causa da falta de
civilidade e refinamento dos haitianos (até mesmo a elite
educada era tida como inepta). Os marinheiros eram
considerados racistas, mas a animosidade deles em
relação aos negros era ignorada e considerada
compreensível, dada a perversidade da terra.
O livro de Seabrook é baseado em sua estadia de dois
anos com uma sacerdotisa vodu. Escrito em um tom
dramático e sensacionalista, e acompanhado por
ilustrações caricaturais claramente racistas de Alexander
King, Seabrook descreveu na obra seus testemunhos de
rituais vodu:

sob a luz vermelha das tochas que faziam a lua


empalidecer, saltando, gritando, corpos negros
retorcidos, enlouquecidos por sangue, por sexo,
por deus, bêbados, rodopiavam e dançavam a
saturnália sombria deles, suas cabeças jogadas
para trás de forma estranha, como se os
pescoços estivessem quebrados, dentes brancos
e glóbulos oculares brilhantes.44

Seabrook se esforçou para dar credibilidade ao seu


trabalho citando fontes como o The Museum Journal
(1917), da Universidade da Pensilvânia, que davam conta
da selvageria do vodu haitiano, relatando como os
haitianos mordiam a cabeça de cobras, como eram
ensinados a “odiar os brancos” durante os rituais vodus e
como comiam “uma cabra sem chifres”, isto é, uma
criança humana, “crua ou parcialmente cozida”.45
Seabrook até mesmo afirma apresentar fórmulas
secretas para trazer os mortos de volta, receitas que
foram encontradas no corpo de um “bocor”, um
feiticeiro:

Invocar os mortos. Vá até um cemitério numa


sexta-feira à meianoite, em algum lugar onde
tenha ocorrido tiroteios. Vá até a sepultura de
um homem, leve uma vela branca com você,
uma folha de acácia selvagem e uma arma
carregada. Assim que chegar, faça este apelo:
“Exsurgent mortui et ad me veniunt. Eu exijo
que você, morto, venha a mim”. Depois de dizer
essas palavras, você vai ouvir um barulho de
tempestade; não se assuste e dispare o primeiro
tiro. O morto vai aparecer na sua frente; você
não deve correr, mas dar três passos para trás
lentamente, dizendo três vezes estas palavras:
“Eu te asperjo com incenso e mirra como a
tumba perfumada de Astaroth”. Mandar um
espírito embora depois de o ter invocado. Pegue
um punhado de terra e jogue na direção dos
quatro cantos da Terra, dizendo: “Volte para o
lugar de onde veio, da terra você foi criado e
para a terra retornará. Amém”.46

Seabrook continuaria a escrever mais livros de não ficção


sobre suas observações de primeira mão sobre a
adoração ao diabo na África, sua incursão no canibalismo
(e o gosto de vitela) e seu estudo das práticas de
bruxaria pelo mundo.
Zumbi branco fez pouco para desmentir as histórias
sobre o Haiti que Seabrook havia apresentado; em vez
disso, o filme usou o livro como base. O filme de terror
“com negros”, que também fala sobre trapaças e amor,
conta a história de Charles Beaumont (Robert Frazer), um
empresário branco e rico que mora no Haiti e conhece
um casal branco — Neil (John Harron) e Madeline (Madge
Bellamy) — de Nova York. O casal planeja se casar, e
Beaumont os convence a fazer a cerimônia em sua
propriedade, localizada numa área florestal remota no
Haiti. Os motivos de Beaumont, claro, não são puros, já
que ele se apaixona pela loira Madeline e espera atrair o
casal para sua casa, onde ele sequestrará Madeline,
mantendo-a na ilha para o seu bel-prazer. Beaumont
consegue a assistência de Murder Legendre (Bela
Lugosi), o plantador de cana branco que dominou os
poderes do vodu e controla uma horda de zumbis que
cumprem seus desejos sombrios. Quando Murder vê
Madeline, ele também a deseja, iniciando aí um cabo de
guerra pela única mulher (branca) da ilha (mulheres
negras são amplamente ausentes do filme). Murder e
Beaumont zumbificam Madeline e tentam forçá-la a
matar Neil; então Murder transforma Beaumont em um
zumbi também.
Zumbi branco é notável pela sua introdução do
monstro zumbi, que não havia sido visto em filmes
anteriormente. Daí, como o título do filme promete, o
foco é em zumbis brancos escravizados por Murder. Na
plantação de cana de açúcar de Murder, negros e
brancos trabalham um ao lado do outro em condições
perigosas, e Murder explica: “Eles trabalham com
lealdade, não ligam para as longas horas”. Essa premissa
relembra o capítulo de Seabrook intitulado “Homens
mortos trabalhando nas plantações de açúcar”, que
apresentam zumbis de forma semelhante como

um cadáver humano desalmado, ainda morto,


mas tirado da cova e dotado com um semblante
de vida pela feitiçaria […] e então faça dele um
servo ou escravo, ocasionalmente para cometer
um crime, mas frequentemente usado como um
burro de carga na habitação ou na fazenda,
onde realiza tarefas pesadas, e em quem você
pode bater como numa besta idiota caso
demonstre preguiça.47

É uma fantasia de docilidade pós-escravidão —


escravizados eternos trabalhando sob o sol e em
condições mortais para sempre e sem reclamações.
Murder tem vários desses brutos, mas se orgulha de
possuir cinco zumbis franceses brancos, todos inimigos
formidáveis antes que ele tirasse suas almas. Há um
capitão, um ladrão, o ministro do Interior da ilha e um
gigantesco carrasco, que, Murder explica, “quase me
executou”. O quinto zumbi é o maior troféu de Murder,
alguém que ele descreve como o seu “antigo mestre” —
um poderoso feiticeiro branco que Murder precisou
torturar durante muito tempo antes que ele revelasse
seus segredos vodu.
O verdadeiro terror desse filme, contudo, assim como
muitos filmes de terror antes e depois — de King Kong
até o mais recente O mistério de Candyman (1992) —, é
a ameaça feita contra uma mulher branca. Madeline se
junta a Ann Darrow de Kong como a arquetípica vítima
feminina. As duas mulheres enfrentam medos similares,
incluindo aí interações com o Outro. Para Madeline, seu
encontro com o Outro vem daqueles que habitam o Haiti,
e a ameaça que ela enfrenta é parecida com a de Darrow
— um tipo de escravidão branca por meio da
prostituição. No fim, assim como todos os monstros,
Murder e Beaumont pagam pela traição lasciva com suas
vidas, deixando que Madeline finalmente se una a Neil.
Rhodes escreve: “todos os homens — zumbis, noivos,
traidor — querem possuir sexualmente as mulheres”.48
Em relação ao desejo, o filme foi citado em 29 de julho
de 1932, numa resenha do jornal New York Times, por
usar zumbis como monstros porque “eles são bons
empregados. Podem acompanhar loiras sem ficar tendo
ideias na cabeça, o que é uma boa ajuda nos dias loucos
de hoje.”49
No mundo invertido do Haiti, os homens brancos
podem se tornar praticantes malignos de vodu, mulheres
brancas seduzidas podem ser levadas até a beira da
morte, e brancos poderosos podem ser transformados
em escravizados. Foi o impacto do Haiti na branquitude
que gerou o horror. Em uma frase de divulgação
relacionada ao filme, é afirmado que o Haiti sempre foi
perverso, mas que o fato não merecia atenção até se
voltar contra os brancos: “Eles sabiam que esse tipo de
coisa estava acontecendo entre os negros, mas quando
essa bruxaria foi praticada contra uma garota branca […]
tudo foi para o inferno”.50 Embora seja um filme de terror
que atribui principalmente aos brancos os tropos do
terror, Zumbi branco é uma acusação contra a negritude.
O público ouve que a ilha é “cheia de bobagens e
superstições”, e que é habitada por nativos adeptos de
um estranho “culto da morte”, que “usam ossos
humanos em suas cerimônias”. Essas práticas foram
“trazidas até aqui da África”, a suposta fonte do mal. A
pouca representação de negros no filme não os poupa da
estereotipação, pois mesmo assim são descritos como
figuras monstruosas, como quando Neil pensa que
Madeline está “nas mãos dos nativos” e proclama que
ela estaria “melhor morta do que assim!”.
FIGURA 2.2 UM ZUMBI COM MURDER EM ZUMBI BRANCO.
United Artists/Photofest
Na verdade, com o Haiti de cenário, é surpreendente
quão poucos personagens negros aparecem em Zumbi.
As mulheres negras são praticamente excluídas do filme,
enquanto homens negros se encontram mais presentes,
mas não em papéis centrais. Ainda assim, algumas
representações negras são dignas de nota, oferecendo
uma das primeiras representações eficazes de negros no
gênero. O filme apresenta uma cena de funeral em que a
câmera se detém por um momento em um grupo de
negros (não zumbis) carregadores de caixão. Os homens
não falam (como é esperado deles), mas são
memoráveis. Eles chamam a atenção — bem-vestidos e
reluzentes desde os penteados benfeitos até os ternos.
Eles são pomposos por causa daquilo que não está
representado ali; eles não são “malandros” ou
deficitários de nenhuma forma, apenas apropriadamente
elegantes.51
Contudo, a representação mais notável de negros em
Zumbi branco acontece nos primeiros minutos do filme,
em uma pequena participação do ator negro Clarence
Muse (não creditado) como um “Motorista de Carroça”. O
personagem de Muse (o Motorista) é encarregado de
levar Neil e Madeline até a mansão de Beaumont.
Quando o motorista encontra um grande grupo de
homens e mulheres negros escavando a estrada, e,
assim, bloqueando o caminho da carruagem, ele explica
de forma sucinta o motivo de os haitianos enterrarem
seus mortos na estrada: “É um funeral, mademoiselle.
Eles temem os homens que roubam corpos. Então,
enterram os corpos no meio da estrada, onde pessoas
passam o tempo todo”. Aqui, a influência de A ilha da
magia sobre o filme fica aparente mais uma vez, já que
Seabrook escreve o seguinte acerca de rituais na beira
da estrada: “por qual motivo, tão frequentemente, se vê
uma tumba ou cova tão perto de uma estrada
movimentada ou trilha, onde pessoas estão sempre
passando? Isso acontece para dar toda a segurança
possível ao pobre morto infeliz”.52 Em outra cena,
conforme o Motorista conduz Neil e Madeline para mais
perto do destino deles, ele vê alguns zumbis brancos. Em
resposta, o Motorista grita “Zumbis!” e trota os cavalos
em máxima velocidade para se distanciar dos monstros.
Assustado, Neil pergunta: “Por que você está dirigindo
desse jeito, seu idiota? Poderíamos ter morrido!”. O
motorista fornece um solilóquio em timbre tão medido
que mais se assemelha a uma palestra de professor:
“Pior do que isso, monsieur. Poderíamos ter sido pegos.
[…] Eles não são homens, monsieur. São corpos mortos
[…] Zumbis. Os mortos-vivos. Cadáveres removidos de
suas sepulturas, que são obrigados a trabalhar nos
moinhos de açúcar e nos campos durante a noite.” O
Motorista deixa o casal na mansão de Beaumont. Ele,
novamente, vê os monstros e alerta “Olhe, aí vem eles!”,
e então sai de cena (e deixa o filme). Ele não é o típico e
estereotipado pretinho—assustado—ai—meus—pezinhos
—pretos—valham-me—agora, mas ele vai embora
rapidamente por conta do perigo que se aproxima.53
A representação de Muse do Motorista, ainda que
pequena, contradiz muito do que Hollywood apresentava
em relação à negritude. Três anos depois de Zumbi
branco, parecia que a indústria havia aprendido um
pouco, como observou Robert Stebbins no jornal New
Theatre em julho de 1935:
A atividade do negro nos filmes de Hollywood é
limitada ao papel do empregado preguiçoso […]
ou um carroceiro que parece ridículo […]. Ele
também é […] um vilão enlouquecido pelo vodu
e determinado a exterminar a raça branca em
Lua negra, ou, na melhor das hipóteses, um bom
prisioneiro entoando o espiritual onipresente na
casa da morte enquanto o herói é preparado
para dar os derradeiros passos em sua “última
milha”.54

O próprio Muse pode ser implicado nessa acusação


contra a representação dos negros no cinema, já que sua
participação no filme de terror “com negros” Lua negra
(1934) apresentava uma queda no progresso
representacional.
Lua negra é centrado em Juanita (Dorothy Burgess),
uma mulher branca que é enviada de sua casa em San
Christopher para os Estados Unidos por seu tio, o dr.
Raymond Perez (Arnold Korff), um dono de plantação, e
por seu capataz, Macklin (Lumsden Hare). Os dois
homens brancos estão “sozinhos” em San Christopher,
cercados por mais de 2 mil “nativos” que são descritos,
em sua maioria, como “bandidos” do Haiti. Os nativos
levaram o vodu com eles para San Christopher, o que
inclui adoração ao sangue e sacrifícios humanos em
honra aos seus “deuses negros”. Juanita não consegue
abandonar sua conexão com a ilha e até começa a tocar
“tambores nativos” em seu tempo livre. É revelado que,
quando criança, depois que os nativos mataram seus
pais, Juanita teve uma cuidadora negra que,
secretamente, a envolveu com o vodu, enchendo-a “com
o som dos tambores e a visão do sangue”. Daí, o terror
nesse filme está na ideia de que o vodu pode se
esgueirar das florestas e entrar numa casa branca e em
uma mulher branca a qualquer momento.
Com saudades de casa, Juanita volta para San
Christopher com sua filha Nancy (Cora Sue Collins) (e seu
marido é esperado um pouco mais tarde). Ela é recebida
por uma horda de nativos, que a enchem de flores e
precisam apanhar do tio para se afastarem, o mesmo tio
que tem uma reputação por açoitar e matar os nativos.
Ainda assim, ao longo do filme, os nativos é que são
mostrados como figuras que possuem prazer em matar
— Macklin, Anna (a babá branca de Nancy, interpretada
por Eleanor Wesselhoeft) e um homem negro, que, sob
ordens, chama o marido de Juanita para salvá-la do
perigo, são todos mortos, assim como uma mulher negra
que é oferecida como sacrifício humano. Fica evidente
desde cedo que Juanita está maculada demais pelos
nativos para ser salva. Ela batuca, entra em transe e
dança de forma sensual em rituais vodu (cercada por
aproximadamente quinhentos afro-estadunidenses
fantasiados de nativos). 55 Juanita abandona sua filha
para fugir no meio da noite e ficar com os nativos, uma
transgressão que é encarada com a mais pura repulsa
por parte do tio, que, por sua vez, a abandona. Juanita
fica tão imersa — tão “enegrecida” pelo seu contato com
os nativos negros e com o vodu negro — que ela tenta
matar o marido e a filha. Por esses pecados, Juanita é
morta pelo seu marido salvador.
Aqui, novamente, a representação dos efeitos do Haiti
sobre uma mulher branca está calcada em registros
iniciais “reais” sobre o Caribe. Joan Dayan (175, 178), em
Haiti, History and the Gods, escreve que o tema de
mulheres brancas abraçando a negritude era algo
recorrente em muitos escritos de historiadores coloniais
sobre o Caribe. Dayan escreve que esses tomos
históricos afirmavam que: “As assimilações graduais que
os brancos faziam dos traços negros não eram vistas
como imitação, mas infecção”. Enquanto os negros
tentavam assimilar a cultura branca, quando os brancos
se apropriavam da cultura negra, eles eram descritos
como se tivessem “contraído uma doença, demonstrando
pouca força de vontade ou pouca fibra moral para resistir
à atração contagiosa da vida largada, pouca roupa e fala
lânguida. […] Calor insuportável e negros demais
contribuíam para a poluição inevitável da civilidade e da
graça”.56
FIGURA 2.3 A MARCA DA SOMBRA DE UM HOMEM NEGRO EM LUA NEGRA.
Columbia Pictures/Photofest
Lua negra, então, se torna mais um conto de horror
sobre o abominável enegrecimento de uma mulher
branca; também é um alerta violento e austero contra a
integração.
O “problema” negro no filme não termina com a morte
de Juanita. Logo após, entra Clarence Muse como
“Lunch”, o dono de uma escuna oriundo de Augusta,
Geórgia. Lunch leva pessoas de San Christopher para o
Haiti, entretendo-as com música enquanto velejam. É por
meio de Lunch que tanto os negros caribenhos quanto os
negros norte-americanos são marcados como figuras
deficitárias num sistema hierarquizante. Lunch se refere
aos negros da ilha como “perseguidores de macacos”,
explicando que os macacos gostam de cocos, assim
como os nativos, que perseguem os macacos para roubar
as frutas. Também por intermédio de Lunch é revelado
que os nativos precisam ser vigiados por olhos atentos e
repreendidos, pois eles preferem dormir em vez de
trabalhar. Na verdade, no fim do filme, os brancos fogem
dos nativos sedentos por sangue porque alguns dormem
durante o ataque, permitindo que Lunch leve os brancos
até um lugar seguro. Mas Lunch também é um preto
engraçado e um estereótipo do negro subserviente. Ele
se alterna entre arregalar os olhos de medo e ser
extremamente fiel e se sacrificar pelos brancos. As cenas
retratam oposições óbvias de negros contra negros,
sendo os afro-estadunidenses ligeiramente superiores
aos negros de San Christopher, “o lugar de violência sem
fim, batizado em homenagem ao santo padroeiro das
causas perdidas”.57
Muse era emocionalmente dividido por causa de suas
representações de personagens do tipo e ocupou-se em
falar e escrever sobre isso com frequência (por exemplo,
sua autopublicação The Dilemma of the Negro Actor,
1934). Em um ensaio intitulado de maneira fúnebre como
“When a Negro Sings a Song”, Muse escreve sobre o
dilema que os negros enfrentavam nos poucos papéis
cômicos e de cantoria que lhes eram oferecidos nos
filmes de Hollywood: “Existem dois públicos que
precisam ser confrontados nos Estados Unidos — o negro
e o branco. O público branco definitivamente deseja
besteiras, canções e danças do homem negro, enquanto
o público negro deseja ver e ouvir os verdadeiros
elementos da vida negra sendo exemplificados”.58 A
dignidade que Muse trouxe para a sua atuação ficava
mais aparente em filmes negros e nos roteiros que
escrevia, revelando ainda mais a tensão existente entre
filmes negros e filmes brancos.
Ignorando as indicações de Muse de “respeito próprio
e autoconsciência negra”, ele ainda foi questionado por
suas performances mais problemáticas.59 Bogle
descrevia os papéis de Muse como retratos de “servos
humanizados”, longe da performance cômica de Stepin
Fetchit ou de um negro completamente subserviente,
mas problemáticos do mesmo jeito.60 Contudo, Muse
também é conhecido por ter emprestado profundidade e
complexidade às suas performances, que também eram
distintas pela relativa ausência de estereótipos (dado o
período).
Por exemplo, em 1941, Muse teve um papel
coadjuvante substancial como Evans, o mordomo, no
filme de terror “com negros” O fantasma invisível.
Trabalhando mais uma vez com Bela Lugosi, que
interpretava o dr. Kessler, o Evans de Muse também
gerencia a propriedade de Kessler, o que inclui
supervisionar seus empregados brancos (cozinheiros,
jardineiros etc.). À medida que assassinatos começam a
acontecer no solar de Kessler, Evans vai sendo
apresentado como uma figura inteligente e informada, e
participa de uma entrevista civilizada com as
autoridades, que esperam que ele possa contribuir com a
investigação. Evans se torna uma peça central na
resolução do mistério, chegando, por fim, a ajudar na
prisão do verdadeiro culpado, Kessler.
Ainda assim, esses papéis mais complexos destinados
aos negros não eram o bastante para afastar o cinema
de lugares negros como o Haiti. Os negros se tornariam
eternamente associados ao vodu, magia negra e zumbis
no gênero do terror.

SE TE AMAR É ERRADO, EU NÃO QUERO


ESTAR CERTO
Filmes como King Kong e Zumbi branco eram, na
verdade, histórias de amor. Graças às ameaças de
nativos e um gorila, Ann apreciou ainda mais o seu
verdadeiro amor e salvador em King Kong, Jack Driscoll
(Bruce Cabot). Da mesma forma, se Madeline tinha
dúvidas em relação a se casar com Neil, tudo foi
resolvido quando ela viu suas outras opções, homens
brancos maculados pelo vodu. A múmia (1932) também
se apropriou do amor, da identidade racial mestiça e da
regra de uma gota de sangue, mas não havia nenhum
mulato trágico aqui. Nesse filme, Helen (Zita Johann) é
meio egípcia/meio inglesa, mas se mostra alheia aos
países africanos, incluindo o local de nascimento de sua
mãe no Egito. Para Helen, que observa as pirâmides de
dentro de um clube inglês, o país parece “belo”, ainda
que seja um local “desagradável”. Seu pai, o governador
do Sudão, a deixou no Egito para retornar àquele país
“bestial e quente”. De repente, Helen é mesmerizada,
caindo no feitiço de Ardeth Bey/Imhotep (Boris Karloff),
um sacerdote egípcio ressuscitado de 3.700 anos que
havia sido mumificado e enterrado vivo pelo pecado de
abusar da magia numa tentativa de lançar um feitiço
para trazer sua amada de volta à vida. Imhotep
reconhece que Helen “tem o nosso sangue” e lhe revela,
por meio da magia, que ela fora a sua amada em outra
vida. Na verdade, o sangue tem grande importância no
mundo de Imhotep. Quando o Núbio (Noble Johnson), o
servo de um “mestre” branco, também se vê sob o
feitiço de Imhotep, sua suscetibilidade à magia é
baseada em seu sangue negro: “O Núbio! O sangue
antigo. Você o transformou em seu escravo.” O Núbio se
transforma no escravo de Imhotep, assim como os núbios
haviam sido no antigo Egito, como é mostrado em um
flashback. Os brancos precisam resgatar Helen do
desesperado Imhotep. Mas eles estão fazendo bem mais
do que simplesmente a salvarem de um monstro; eles a
estão resgatando de um “outro étnico atrasado e
oprimido” por enxergar Helen como uma mulher branca
o suficiente.61 Helen também é capaz de fugir dos mitos
egípcios, cheios de superstições e politeísmo, quando
seu amor, Frank (David Manners), que disserta
enfaticamente sobre o valor do pensamento científico, a
salva.
Mulheres brancas não estavam procurando o amor
nos lugares errados, mas parecia que as mulheres negras
faziam isso o tempo todo. Ingagi era um lembrete
grotesco de como isso podia acontecer. O pior erro que
uma mulher negra podia cometer, contudo, era escolher
um homem branco como pretendente. Se ter alguma
coisa com um macaco era implausível, então, tentar
conquistar um homem branco era errado… mortalmente
errado.
No filme de terror “com negros” The Love Wanga
(1936), o cenário é a Paradise Island, próxima à costa do
Haiti.62 Lá vive Klili Gordon (Fredi Washington), uma dona
de plantação birracial (negra/branca) que está
apaixonada por Adam Maynard (Philip Brandon), um
homem branco dono de uma plantação vizinha. Nessa
“história real” em que “os nomes foram trocados”, o
problema é que, embora Adam conserve uma relação de
amizade muito próxima a Klili, ele não consegue amá-la,
pois, conforme explica: “não é possível transpor a
barreira de sangue que nos separa”. Embora tenha a tez
branca como a de Adam, o fenótipo de Klili indica que
nunca será branca o suficiente porque em algum lugar
de sua linhagem sanguínea existe uma ancestralidade
africana. Logo, ela está manchada pela regra da única
gota, segundo a qual apenas um pouco de sangue negro
marca alguém como negro de forma instantânea e
eterna. Quando Adam escolhe (de forma previsível) Eve
(Marie Paxton), uma branca pura, para ser sua noiva, Klili
fica enraivecida de ciúmes. Ela aproxima o seu braço do
braço de Eve proclama: “Eu também sou branca. Tão
branca quanto ela!”. A tragédia do sangue e da cor da
pele é o típico estereótipo do mulato trágico, em que sua
proximidade com a branquitude torna Klili bela ao
mesmo tempo que sua situação irreconciliável a torna
um perigo para si mesma e para os outros, e por fim a
enlouquece.63 Klili recorre ao vodu, usando um feitiço
para deixar Eve à beira da morte (da qual ela é
milagrosamente salva). Klili então é motivada a erguer
treze zumbis, homens negros mortos-vivos, que
sequestram Eve e a colocam em um transe para que Klili
possa matá-la.64 Aqui, os zumbis são levemente
reimaginados em relação ao que foi visto anteriormente.
Eles ainda são recipientes vazios e reanimados sob o
controle de alguém. Contudo, The Love Wanga remove os
discursos coloniais e de ocupação da memória do público
em favor daquilo que Dayan descreve como um novo
idioma que desmantela a culpabilidade dos Estados
Unidos em relação ao trabalho forçado.65 A nova
construção coloca os negros no centro da servitude
forçada e no cerne da morte, uma vez que os massacres
realizados pelos brancos não são expostos.
Contudo, o filme é mais notável pela sua atenção à
identidade racial. Fredi Washington, uma atriz negra cuja
tez é menos pigmentada e olhos verdes, sempre era
escalada para os papéis de mulata trágica, e seu papel
mais notável foi como Peola, uma mulher “que se
passava por branca”, em Imitação da vida (1934). The
Love Wanga continuava a brincar com as cores ao
escalar o ator branco Sheldon Leonard como LeStrange,
o cuidador negro da plantação de bananas de Adam.
Leonard foi uma escolha estranha para interpretar um
negro; contudo, essa escolha pode ter sido uma
precaução por parte dos realizadores, já que Washington
teve problemas com a censura em um filme que não era
de terror intitulado O imperador Jones (1933), também
situado no Haiti. Em Jones Washington beija o ator negro
Paul Robeson, o que os censores temiam ser algo muito
parecido com uma mulher branca beijando um homem
negro.66 Para remediar o problema, Washington foi
instruída a usar maquiagem mais escura a fim de
“parecer mais negra”. Em Wanga, a maquiagem não era
uma boa solução para o dilema racial, pois Klili deveria
se parecer “tão branca quanto” Eve. Talvez fosse melhor
que uma mulher que parecia ser branca fosse vista em
um abraço com um ator branco em vez de um ator
negro. Em Wanga, então, é o diálogo, e não a aparência,
que deve marcar LeStrange (um nome bem apropriado)
como negro. Ele se refere a Adam como “meu mestre” e
há esta proclamação:

LESTRANGE PARA KLILI: Você é negra. Você pertence a


nós. A mim.
KLILI: Eu te odeio, escória preta!
Assim como Klili, é impossível não associar a negritude
de LeStrange como causa de sua proximidade com o mal.
Ele é tão adepto do vodu, e tão perverso, quanto Klili.
LeStrange rouba o cadáver de uma mulher negra, veste
as roupas de Klili no corpo e o pendura em uma árvore
como parte de uma maldição vodu contra Klili por ela ter
rejeitado o seu amor. O grande amor de Klili por Adam é
mostrado como impossível, o que não causa surpresa, já
que ela e seus gostos se tornam parte do mito batido que
dá conta de que mulheres “mulatas”* gostam das
melhores coisas: “Existem vários relatos europeus sobre
a mulher mulata, em especial sobre seus gostos
requintados, amor pelas coisas finas e apreço especial
por rendas, linho, seda e ouro”.67 Obviamente, gostar e
ter são coisas diferentes, e Klili nunca terá Adam. Por
causa de tudo que ela fez, Klili se torna uma mulher
caçada. No fim, quando a maldição vodu de LeStrange
não mata Klili rápido o suficiente, LeStrange a estrangula
com suas próprias mãos.
Com exceção de seu tratamento da identidade racial,
The Love Wanga tomou o mesmo caminho de outros
filmes de terror que incluíam alguma atenção para com a
negritude. Praticantes negros de vodu estão por todos os
cantos de Paradise Island, trabalhando sem parar em
seus ofícios em um lugar onde o povo é, de acordo com o
filme, preguiçoso e primitivo. Existem muitos bocores
(feiticeiros), loas (espíritos) e zumbis, e o filme explica a
existência deles da seguinte forma: “os corpos sem vida
de negros assassinados, reanimados pelos bocores com
propósitos malignos”. Todos, bons ou maus, parecem
saber como fabricar um ouanga (wanga) ou
encantamento, que pode ser usado tanto para despertar
o amor quanto para causar a morte. Quando não estão
envolvidos com algum tipo de magia, os negros da ilha
passam a maior parte do tempo jogando dados,
apostando e dançando. The Love Wanga, é claro, não
nega aos negros uma batida para que dancem, e o
sempre presente batuque do tambor vodu, ou “rada”,
pode ser ouvido. O tambor é descrito em termos sensuais
— apresentando uma batida “latejante” e “pulsante” —
enquanto a câmera se demora no peito desnudo e
musculoso de um homem negro batendo no instrumento
com força.
The Love Wanga foi refeito em 1939 com um elenco
todo negro no “filme negro” de terror The Devil’s
Daughter. Escrito por George Terwilliger e dirigido por
Arthur Leonard, o filme foi roteirizado, dirigido e
produzido por brancos, mas mirava em um público negro.
As cenas iniciais do filme servem para estabelecer
como os negros caribenhos são diferentes. É possível ver,
em uma longa sequência, um grupo enorme de
trabalhadores malvestidos de uma plantação de bananas
cantando e dançando em uma clareira. O lugar também
serve para jogos de azar e brigas de galo. É mostrado
que os trabalhadores acreditam no vodu como uma
magia maligna que pode ser manipulada para todos os
tipos de fins imorais.
O filme conta a história de duas meias-irmãs
jamaicanas. A primeira é Isabelle (Nina Mae McKinney),
cuja mãe era uma haitiana praticante de vodu. Isabelle
tem cuidado da plantação da família com o amor e o
apoio de seus empregados negros e “crioulos”. A
segunda irmã é Sylvia (Ida James), que deixou a Jamaica
anos atrás em busca de uma educação superior nos
Estados Unidos e se tornou uma mulher refinada no
Harlem (o período de tempo coincide com a renascença
do Harlem). Quando o pai das irmãs morre, ele deixa a
plantação e a riqueza que vem com a propriedade para a
educada Sylvia, enquanto a mais grosseira Isabelle não
fica com nada. Sylvia volta para a Jamaica para cuidar da
herança e consegue a ajuda de um feitor chamado
Ramsey, que afirma estar apaixonado por ela, mas faz
isso apenas para roubar seu dinheiro. Ramsey é
interpretado pelo ator branco Jack Carter. Embora o ator
branco tenha “enegrecido” seu dialeto em The Love
Wanga, Carter não faz o mesmo aqui. Em vez disso, sua
raça nem é mencionada no filme. A codificação de cores
também pode ter contado até certo ponto com uma
escolha de elenco politicamente esperta, pois Ramsey se
mostra um homem mentiroso e traidor. Dois outros
personagens masculinos negros se revelam como tais:
John (Emmett Wallace), que ama Sylvia e no fim ganha o
seu amor, e Percy (Hamtree Harrington), o mordomo de
Sylvia no Harlem, que acredita que os negros jamaicanos
são inferiores e, com efeitos cômicos, aprende que eles
podem ser duas-caras quando o fazem acreditar que
guardaram a alma dele em um porco (que é comido
posteriormente).
O foco do filme, contudo, está nas diferenças entre as
duas irmãs, que na verdade servem para problematizar
as comparações entre os Estados Unidos e a Jamaica,
trazendo alguma profundidade para as representações.
Isabelle é mostrada como a irmã rude e desordeira que
faz o árduo trabalho de cuidar da plantação enquanto
suspira por John, que não tem interesse nela. Sylvia é
representada como uma mulher que se transformou
numa burguesa, passeando pela plantação em um
vestido chique e conduzida por um motorista. A diferença
entre as irmãs é alinhada com o urbano e os modos da
cidade grande em contraste com o rural sem
sofisticação. Contudo, até esse contraste é reformulado
por meio de um alerta sobre os perigos de abandonar a
casa, se tornar burguês e perder contato com o seu
próprio povo. Sylvia e Percy, duas figuras do Harlem, são
expostos como pessoas ingênuas por causa de sua
separação geográfica e cultural com o “lar”. Enquanto o
trabalho na plantação é visto como rudimentar e
desprovido de elegância, ser culto e conhecedor de livros
é tido como inútil.
Isabelle cria um plano para ter a plantação de volta —
ela explora as superstições vigentes ao lembrar Sylvia e
John de que sua mãe era haitiana, deixando implícito que
ela poderia praticar vodu. Isabelle instrui seus
trabalhadores, muitos dos quais são praticantes de vodu,
a baterem seus tambores na floresta com mais vigor do
que nunca, fazendo com que Sylvia note que o som dos
tambores soa ainda mais “ameaçador” do que em sua
juventude. Sylvia acredita que se tornou a vítima de um
ritual vodu quando Isabelle a droga e finge que vai
prepará-la para um sacrifício. O filme apresenta uma
longa cerimônia obeah (magia negra) presidida por
Isabelle, que faz encantamentos. É revelado que Isabelle
estava fingindo ter poderes — se ela realmente fosse
mágica, ela não precisaria ter recorrido às drogas. John
corre para resgatar Sylvia, enquanto o assunto de
mistura sanguínea é trazido à tona: Isabelle não é
haitiana “o suficiente” para praticar o vodu de forma
efetiva. Isabelle e Sylvia fazem as pazes. Sylvia entrega a
plantação para Isabelle, pois compreende seu não
pertencimento: “Eu não pertenço a este lugar”.
Chloe, Love is Calling You (1934) é um filme de terror
“com negros” racialmente intrigante, ainda que
controverso, já que aborda não só o mulato trágico mas
também a violência racial da era Jim Crow. É uma história
em que uma negra pobre, velha e praticante de vodu,
Mandy (Georgette Harvey), procura vingança pelo
linchamento de seu marido, Sam. Mandy é a “mamãe”
de uma filha jovem adulta, Chloe (Olive Borden, uma
atriz branca), que parece branca e sofre incômodos por
parte de negros e brancos em virtude de seu sangue
impuro. Chloe tem dois pretendentes. O primeiro é Jim,
um homem “de cor” (interpretado pelo ator branco Philip
Ober) apaixonado e sofredor que tem uma gota de
sangue negro nas veias e não é amado pela jovem. O
segundo é Wade (Reed Howes), um homem branco que
acabou de chegar na cidade para cuidar de uma
plantação de coníferas na região e, de início, toma Chloe
por branca. As preocupações com a censura foram
evitadas ao escalar atores brancos para os três papéis, já
que uma mulher branca não seria mostrada nos braços
de um homem negro.
Chloe ama Wade desesperadamente, mas foge dele
por causa de seu segredo racial. Por sonhar em estar
com brancos, Jim a acusa de dar ouvidos ao seu “sangue
branco falando”. Chloe então apresenta a história
clássica da mulata trágica na qual ela é atormentada por
se ver aprisionada na negritude, ainda que seu corpo
denuncie pouco essa questão. A população negra afirma
ver a negritude em Chloe, como fica evidenciado na cena
em que um homem negro tenta atacar Chloe, dizendo:
“Bem amarelinha, é assim que eu gosto da minha carne”.
E o mesmo acontece quando duas mulheres brancas
olham para ela, comentando: “Ela é tão escura”.
A surpresa aqui é que Mandy trocou seu bebê negro
morto por Chloe num ato de vingança contra o pai
branco de Chloe, o Coronel, que ordenou o linchamento
de Sam. Na parte de Mandy, todos enxergam Chloe como
negra e a tratam assim. A lição em relação ao
preconceito racial é apresentada, ainda que de maneira
falha. Quando se confirma que Chloe é realmente branca,
ela (como Tarzan) exibe a superioridade inata da
branquitude.* Nessa história nos moldes de Cinderela,
Chloe não tem dificuldade nenhuma em se estabelecer
no (rico) mundo dos brancos. Recentemente empossada
da branquitude, a jovem pede que ninguém a chame de
“Chloe” novamente, proclamando com confiança: “Eu me
chamo Betty Ann”. Ela se movimenta com naturalidade
por sua mansão, usa vestidos brancos luxuosos e
entretém a elite branca com facilidade. Sua nova casa é
a epítome da ostentação, colossal e cheia de
ornamentos. Parece apropriado, então, que essa Casa
Grande, de frente para a plantação, seja o local de uma
resistência negra. Casas assim, como suas “escadarias
monumentais”, um “labirinto de portas, salões e quartos
gigantescos”, e servos domésticos uniformizados
pairando “silenciosamente em suas tarefas”, eram
símbolos cruéis de histórias e mitos da servidão.68
Mandy quer punir tanto o Coronel quanto Chloe pelas
traições sacrificando Chloe em um ritual vodu. Há
tambores retumbantes de vodu, fogo e dança nativa.
Mandy se veste como o espírito vodu Barão Samedi. Mas
tudo dá errado… para os negros. Jim tenta resgatar Chloe
das garras de Mandy, mas é mortalmente ferido,
deixando-a para ser salva por Wade. Chloe, como Betty
Ann, e Wade finalmente encontram o amor como um
puro casal branco.
Chloe, assim como The Love Wanga e The Devil’s
Daughter, não provoca sustos de verdade. Contudo, os
três filmes encaram de frente o assunto das políticas
raciais. Chloe, em particular, se destaca por sua atenção
à violência racial. Filmes dessa época eram criticados por
falharem ao lidar com racismos do tipo, como revelado
na coluna “Camera Eye” (1933) do jornal The Harlem
Liberator: “Dificilmente ouvimos uma palavra sobre
linchamentos, trabalho forçado, arrendamento rural ou
presidiários acorrentados trabalhando. E quando são
debatidos, esses assuntos são vistos de relance”.69
Contudo, Chloe dá uma rara atenção ao linchamento. O
vodu de Mandy “realmente fala” quando ela volta para
Louisiana, o estado onde Sam encontrou o seu fim. “Óia
lá. Óia lá. A véia árvore do enforcado. Onde us branquelo
mataro o meu Sam e os cachorro rasgaram ele em
pedaço. Tô aqui, Sammy. A sua Mandy vortô pra
amaldiçoá o Coronel e os branco.” A morte de Sam no
filme, ordenada pelo dono da plantação, o Coronel, não é
contestada, mas descartada: “Eu demiti Sam. Não
lembro o motivo”. É possível ler o relato do Coronel sobre
o fim de Sam de diferentes maneiras. Sua frieza serve
para implicá-lo em um racismo que considera a vida
negra como algo sem importância. Ou a leitura pode ser
literal, dada a época, na qual a vida negra não tinha
valor. O Coronel explica que Sam, ao ser demitido, bateu
nele. Por esse motivo, o Coronel explica de forma direta:
“Sam foi linchado”. É nessa injustiça que Mandy se foca
durante todo o filme: “Não vai demorar muito, Sam… Eu
vou fazer o meu vodu. O trovão vai rugir e vai chover
raio. E o diabo vai andar na sepultura de um branco.”
Contudo, o filme não se aprofunda mais na questão
acerca do tratamento dos negros na era Jim Crow. Mandy
é mostrada como louca, e assim sua obsessão pelo
linchamento de Sam fica mais fácil de ser ignorada. No
fim do filme, o Coronel exige a prisão imediata de Mandy,
que está fugindo da cena do crime, dizendo: “Não
queremos linchar ninguém”. A frase “não queremos
linchar ninguém” insinua que, se Mandy continuar a
correr, então os brancos da comunidade vão ter que se
incomodar com o linchamento dela também.
O outro personagem negro central, aquele que mina
até mesmo a ilusão de um momento revolucionário no
filme, é o servo doméstico do Coronel, Ben (Richard
Huey). Uma típica representação do negro subserviente,
Ben é um servo feliz e grato, leal ao seu empregador
branco, que chega até mesmo a espionar Mandy e outros
negros da plantação para contar ao Coronel tudo o que
eles fazem. É Ben que revela ao Coronel que Mandy
voltou para Louisiana com o fim de “colocar um vodu no
senhor”. Ben chega a invadir a cabana de Mandy, junto
com o Coronel e Wade, para revirar os pertences dela.
Com os olhos arregalados e cheio de medo, Ben revira a
“bolsa de vodu” de Mandy, encontrando roupas de bebê
que foram usadas pela filha do Coronel, a qual todos
pensavam que havia se afogado. Por fim, quando um
médico procura confirmar que o bebê negro de Mandy
tinha morrido, e não a filha branca do Coronel, ele leva
Ben em sua companhia para exumar o bebê em busca de
uma evidência conclusiva. O doutor, triunfante, reporta:
“O cabelo é crespo”.

CONCLUSÃO
O amor estava no ar na década de 1930, mas estamos
falando do gênero do terror, e a estrada para a paixão,
de forma esperada, era cheia de curvas mortais.
Macacos, vodu, nativos e zumbis tinham o costume de
atrapalhar assuntos do coração. Parte do terror residia no
fato de que essas monstruosidades se intrometiam em
assuntos de corações brancos. Personagens monstruosos
como Kong, Murder, e até mesmo a Múmia, sabiam como
estragar uma noite de amor para Ann, Madeline e Helen,
respectivamente, ainda que tentassem ganhar a afeição
dessas garotas de pele menos pigmentada. Isso era algo
assustador e sério, já que o público médio (branco)
“consideraria extremamente abjeto o aprisionamento de
cristãos brancos por nativos de pele escura. E ainda pior,
pois, como as vítimas de feitiçaria vodu costumavam ser
mulheres nessas narrativas iniciais e amplamente
racistas […] isso atacava a paranoia racial
profundamente arraigada”.70 Que sorte a nossa haver os
cavaleiros brancos que cavalgavam para salvar o dia e
resgatar suas amadas da vilania, não? A lição aqui é que,
ao ser vítima de algum tipo de intruso maligno de pele
mais pigmentada, a pureza racial e sexual era desafiada,
mas, por fim, restaurada.
De fato, não há amor maior para um homem (ou
gorila) do que o amor de uma mulher branca pura. Mas ai
daquela que negociar com o mal e distribuir a maldade
— não existe pecado maior. Envolvidas nessas relações
sórdidas, estavam as Klilis, Mandys e Juanitas. Essas três
mulheres amaldiçoadas foram longe demais para
continuar vivas. De maneira interessante, embora as três
tenham utilizado a espada metafórica do vodu em vida,
nenhuma delas foi morta por ela. Em vez disso, homens
decidiram o destino dessas mulheres. Klili foi
estrangulada por um homem (miscigenado), Mandy foi
perseguida pelos homens brancos e a bala nas costas de
Juanita foi disparada por um homem branco. Essas
mulheres, com seus corações negros, estavam ainda
mais obscurecidas por conta de sua relação com o vodu.
Contudo, os mais acentuados desdém e desprezo foram
reservados para Juanita, uma mulher branca que, por
vontade própria, se submeteu e se aliou ao mundo dos
negros.
Certamente alguns poderiam dizer que o terror
precisa estar situado em algum ponto, e nesses filmes é
uma eventualidade que ele se encontre entre pessoas
negras e em locais majoritariamente negros. Contudo,
nos filmes desse período, o foco não recai tanto no terror
(ou no amor), mas na representação dos negros como
figuras pavorosamente horríveis, o que configura uma
diferença fundamental. Esses não são filmes de terror
modernos em que os monstros simplesmente surgem
para retalhar e torturar pessoas; mas são filmes em que
não basta localizar o terror no monstro (por exemplo, um
gorila): o monstro também precisa ser enegrecido. Além
disso, se esse monstro… enegrecido… tem relações
sexuais com uma nativa negra, o efeito é maior do que
aquele causado por um simples “Bu!”; quando isso
acontece, o assunto passa a ser a natureza nojenta dos
negros. A maldade negra sendo jogada de um lado para
o outro, os negros obedientes, as mamães pretas, os
malandros, todos são utilizados como estofo para a
ridicularização racial e para assegurar a supremacia
branca. Esse é o verdadeiro terror desses filmes.
De modo representativo, ao longo dos anos seguintes,
as coisas não ficariam mais fáceis para os negros. A
longo prazo, por exemplo, o Haiti e a zumbificação
seriam ainda mais explorados na cultura popular. Na
imprensa, os haitianos continuariam a ser retratados
como figuras perversas e contaminadas por meio de
bordões que davam conta de que o “povo dos barcos”
(em busca de liberdade política e econômica) estava
chegando, levando não só vodu para os Estados Unidos,
mas também doenças (tuberculose e AIDS).71 O terror
continuava a implicar os negros em zumbificação,
acrescentando também um pouco de satanismo (Coração
satânico [1987]) e canibalismo (Zumbiz [2005]).
Na década seguinte, os anos 1940, o progresso
continua a ser lento para os negros em filmes de terror.
Na verdade, o gênero estava regredindo ao escalar
negros como bufões e alívios cômicos, além de dar ainda
mais destaque para a performance do malandro em
filmes de susto como The Body Disappears (1941),
estrelando Sleep ’n’ Eat, e O rei dos zumbis (1941), com
Mantan Moreland. Vislumbres de esperança surgiram
para os negros com o retorno de um diretor negro,
Spencer Williams. Os “filmes negros” de terror de
Williams tinham monstros, o diabo, e uma boa dose de
lição de moral para acompanhá-los. Mas, primeiro,
teríamos que enfrentar outro filme de macaco: Son of
Ingagi (1940), um filme meio-macaco, meio-humano de
Williams.
* Para uma mentalidade supremacista branca, tudo o que destoa da
norma (homem branco heterossexual cisgênero, cristão e classe
média) são animalizados, mas o racismo anti-negro vitimiza este
grupo com mais violência simbólica explícita como a “habilidade de
acasalar com o animal”. Para Aph e Syl Ko, a categoria de animal foi
uma invenção colonial que tem sido imposta a humanos e a animais:
aos primeiros porque justifica serem tratados como os segundos; os
segundos porque é naturalizado que sejam violados. Ao investigarem
as noções de “humano” e “humanidade” elas compreenderam que a
categoria “animal” opera como ferramenta de opressão em relação
a grupos racializados, pois animalizar humanos (racializados) é uma
forma de justificar a exploração, violação e exposição — bem como o
“nojo” proveniente da “bestialidade” essencializada. Ver: Ko, Aph;
Ko, Syl. Aphro-ism: essays on pop culture, feminism, black veganism
from two sisters. Nova Iorque: Lantern Books, 2017. [NE]
* O termo é pejorativo. A palavra mulus, no latim, faz referência a
“mulo”, o animal híbrido, estéril e produto do cruzamento do cavalo
com a jumenta, ou da égua com o jumento. Por influência espanhola,
o termo passou a designar um mulo jovem, e foi pela analogia com a
origem mestiça do animal que a palavra ganhou tom pejorativo para
pessoas negras com a pigmentação mais clara. [NE]
* Conforme diz Grada Kilomba em Memórias da Plantação (Cobogó,
2019): “No mundo conceitual branco, o sujeito Negro é identificado
como o objeto ‘ruim’, incorporando os aspectos que a sociedade
branca tem reprimido e transformando em tabu, isto é,
agressividade e sexualidade. Por conseguinte, acabamos por
coincidir com a ameaça, o perigo, o violento, o excitante e também o
sujo, mas desejável – permitindo à branquitude olhar para si como
moralmente ideal, decente, civilizada e majestosamente generosa,
em controle total e livre da inquietude que sua história causa”. [NE]
HORROR
NOIRE

1940
BANDIDOS ATERRORIZANTES E
MISERÁVEIS MENESTRÉIS

Ao montar esta horrível orgia Que paralisa


no escuro de medo, Os filmes cometem
um erro; Eles erram a mira..
— JAFFRAY (174)1

O terror ganhou forma rapidamente, e vários realizadores


pegaram alegremente o bonde do terror, fosse se
especializando no gênero ou diversificando seu portfólio
ao acrescentarem filmes de terror no conjunto de suas
obras. Esse grande interesse logo resultou em uma
abundância de filmes desse tipo, e o público, que antes
formava filas para sentir o gostinho do medo, começou a
ser bombardeado por uma grande oferta (geralmente
rudimentar e banal); por isso, o público de terror
começou a escassear.
À medida que os filmes de terror da década de 1940
encontravam bilheterias cada vez mais anêmicas, a
indústria do cinema respondeu ao decréscimo na venda
dos ingressos com um sistema pareado de produção e
distribuição de filmes. Havia os filmes A, com grande
apoio financeiro, e os “filmes B”, como os filmes de
terror, com orçamentos e promoções menores.1 Os dois
tipos de filme, A e B, às vezes eram vendidos de uma vez
só, assim, quando o público fizesse fila para um “filme de
qualidade A”, como o vencedor do Oscar A grande ilusão
(1949), as pessoas também teriam a opção de ver um
filme de terror como alguns dos inúmeros filmes B de
múmia que entravam em circulação: A mão da múmia
(1940), A tumba da múmia (1942), A sombra da múmia
(1944) ou A praga da múmia (1945). Frequentemente
dois filmes B eram exibidos para que os clientes
pudessem, talvez, aproveitar uma tarde de monstros.
Mesmo com uma tática de marketing esperta de exibir
dois filmes de uma vez só, os filmes de terror
continuaram a ter dificuldades. Talvez as atrocidades da
Segunda Guerra Mundial, cuja parte mais repulsiva
mirava em civis, como o Holocausto e as bombas
atômicas lançadas em Hiroshima e Nagasaki, fossem
bem mais assustadoras e inescapáveis.2
O terror mal começara a ganhar fôlego e já estava
sendo ameaçado. Os monstros do famoso estúdio
Universal se tornaram embaraçosamente derivativos,
com a dupla de comediantes Bud Abbott e Lou Costello
“esbarrando” nos monstros em muitos dos seus filmes de
comédia pastelão. O RKO, o estúdio que produziu King
Kong (1933), sob a direção de Val Lewton, ofereceu uma
safra mais original de filmes, como Sangue de pantera
(1942). Sangue de pantera foi uma inovação rara o
gênero na época, pois muito do terror dos anos 1940 se
baseava no estilo homem-vestido-de-macaco, como O
gorila matador (1940) da Monogram Pictures.
Enquanto o gênero de horror estava começando a se
desfazer, o tratamento representacional dos negros nos
filmes, especialmente em filmes de terror “com negros”,
não melhorou. Após cinquenta anos de participação no
gênero, os negros ainda eram relegados a papéis de
figuras primitivas, nativos das selvas ou empregados de
brancos. A mudança mais dramática em relação à
representação de negros nos filmes de terror durante a
década de 1940 apenas agravou os problemas, pois os
menestréis do fim do século XIX e início do século XX
foram ressuscitados para criar comédias de terror nas
quais os negros eram apresentados como tolos
profundamente assustados — figuras absurdas e cômicas
cujos defeitos intelectuais (como a fala errada),
inferioridade cultural (como correr atrás de galinhas) e
tiques físicos (como arregalar os olhos) provocavam riso
e escárnio. Diferente do nativo e do servo, que
geralmente eram escalados como meros figurantes em
filmes de terror e se moviam silenciosamente nas cenas,
os papéis de negros assustados e cômicos (como vieram
a ser conhecidos) eram papéis coadjuvantes substanciais
e centrais aos enredos. O gênero só olhou para os negros
quando o terror se juntou ao humor, com atores cômicos
como Mantan Moreland e Willie “Sleep ’n’ Eat” Best
sendo convocados para fazer suas “melhores”
performances de malandros tolos.
De maneira mais significativa, o “terror negro” voltou
nessa década, e, graças ao cineasta Spencer Williams Jr.,
o gênero do terror viu algumas das suas histórias mais
intrigantes, caracterizações únicas e tratamento
aprofundado da vida e cultura negras. Os filmes de
Williams focavam na batalha entre o bem e o mal,
embebidos em religiosidade negra, e suas histórias eram
centradas em mulheres. Os filmes de Williams
questionavam como os cineastas negros, excluídos de
Hollywood e com orçamento apertado, poderiam trazer
algo tão inspirador para o gênero. Em resumo, este era o
dilema em relação à participação dos negros em filmes
de terror da década: representações proeminentes e
horrendas, ou representações promissoras e de alcance
limitado.

BRIGA DE MONSTROS
Os filmes de terror “com negros” lançados ao longo da
década evidenciam o quão ruim as coisas estavam para
os negros. A morta-viva (1943) é um filme situado no
Caribe, na ilha de St. Sebastian pós-colonização, em uma
plantação de açúcar e numa selva ao redor.3 Para os
negros no filme, St. Sebastian é uma ilha construída pela
morte por causa de sua antiga história de amor com a
escravidão. O filme começa de forma pejorativa com
uma mulher branca, Betsy (Frances Dee), ignorando de
maneira casual e acrítica as atrocidades da escravidão
enquanto conversa com um homem negro descendente
de escravizados:

COCHEIRO (CLINTON ROSEMON, NÃO CREDITADO):


O barco
enorme trouxe há muito tempo os pais e mães
de todos nós, acorrentados no porão de um
navio.
BETSY: Eles trouxeram vocês para um belo lugar,
não é?
COCHEIRO: Se você diz, senhorita, se você diz…

Embora o filme se esforce para mostrar que a história da


escravidão e seus efeitos continuam a afetar os negros e
sua existência na ilha, essa cena em particular funciona
para ilustrar como os cineastas não conseguiam deixar
de diluir as mensagens do tipo com alguma fantasia pós-
colonial de exotismo e beleza primitiva. St. Sebastian
pode chorar por causa do sangue negro derramado
(como Ti-Misery, o calcês selvagem de um navio
negreiro, faz simbolicamente durante a trama), mas o
filme trabalha duro para convencer o público de que o
Caribe, ainda assim, é um ótimo lugar onde tirar férias.
Humphries explica a cena da incompreensão de Betsy da
seguinte maneira: Betsy “só enxerga a beleza ao redor
dela, a beleza que é construída pelo discurso colonial
para o benefício daqueles que vivem dos frutos do
trabalho escravo. […] Seria difícil representar e sumarizar
a cegueira social e econômica de maneira mais
persuasiva”.4 O modo como Betsy enxerga St. Sebastian
pela primeira vez é reminiscente de Zumbi branco
(1932), quando o casal apaixonado, Neil e Madeline, se
surpreende pelo fato de o Haiti não ser o local
paradisíaco que eles esperavam para o seu casamento. A
habilidade de Betsy (de Neil e Madeline) de estar entre
tantos negros sem conhecê-los fornece entendimentos
surpreendentes sobre a repressão de culturas e histórias.
A morta-viva apresenta vários negros praticantes de
vodu que passam um tempo considerável “assustando”
os brancos com batuques de tambores e fazendo rituais.
Essa restrição dos negros ao estereótipo significa que o
filme mais se interessa em focar nos “problemas
psicológicos do povo branco” em vez de demonstrar
qualquer consideração, ou engajamento, em relação aos
personagens negros.5
Em A morta-viva existe, de forma esperada, um zumbi
entre os negros — Carre-Four6 (Darby Jones). Ele
caminha silenciosamente e de forma agourenta, nunca
representando uma ameaça até receber a ordem de
invadir uma casa em uma plantação branca para
sequestrar uma mulher branca. Obviamente, ele não
realiza a última parte da missão, já que homens negros
podem apenas olhar (o que talvez já seja ameaçador o
suficiente), mas jamais tocar. Carre-Four não é o único
zumbi da ilha; também há Jessica, uma mulher branca
que pode ou não ser uma zumbi. Há muito para se saber
acerca de Jessica enquanto os protagonistas brancos
lutam para reclamar a alma dela e os homens brancos
lutam pelo seu amor. Contudo, a história de Carre-Four
não merece ser explorada, e ninguém está interessado
em salvar sua alma.7 Também há Alma (Theresa Harris),
que mantém a tradição de seus ancestrais escravizados
de guardar luto quando uma criança negra nasce, mas
que fica “feliz em um funeral”. No filme, as lágrimas de
Alma (que não são vistas) são alinhadas e suplantadas
pelas lágrimas de Ti-Misery, o calcês transformado em
um irrigador da plantação, que parece chorar quando a
água do equipamento flui. No filme, a história da
escravidão na ilha é representada por Ti-Misery. O filme
nega aos vivos uma chance de recontar completamente
essa história de escravidão. Em vez disso, Ti-Misery, pelo
uso do simbolismo, filtra e carrega as histórias de
escravidão dos negros vivos de St. Sebastian. Fechando o
estranho grupo, que é visto pelos “olhares confusos dos
protagonistas brancos”,8 há um cantor onisciente de
Calypso representado por Lancelot Pinard, também
conhecido como Sir Lancelot. Lancelot contribui com o
filme armando fofocas, inventando histórias e também
com um aviso sombrio sobre o destino das pessoas em
uma de suas músicas de Calypso.
O que fica evidente nesse filme é que a negritude é
tão infecciosa que coloca os brancos em risco,
especialmente as mulheres brancas, que são
enfraquecidas pelo seu encontro com a negritude. No
filme, duas mulheres brancas se tornam vítimas da
cultura negra. A primeira fica obcecada por mitos e pelo
poder do vodu e, por isso, transforma uma outra branca
indefesa em zumbi. O crítico de cinema do New York
Times, Bosley Crowther fez pouco caso de A morta-viva,
afirmando delicadamente que o filme “acaba com todo o
respeito que alguém pode ter por fantasmas
ambulantes”.9
Dois anos depois, em 1945, a RKO (sem Val Lewton) fez
uma continuação de A morta-viva, com o título de
Zumbis na Broadway. Esse filme de terror tomou um
rumo cômico, assim como vários filmes feitos durante a
década de 1940, ao focar nas palhaçadas de Jerry Miles
(Wally Brown) e Mike Strager (Alan Carney), que são
parceiros como Abbott e Costello. O filme fala sobre os
esforços de Jerry e Mike a fim de encontrar um zumbi de
verdade para a abertura de um clube em Nova York
chamado A Tenda do Zumbi. A dupla viaja para San
Sebastian e são recebidos na ilha por uma canção de Sir
Lancelot que interpreta um Calypso que resume o
destino vindouro deles por meio de uma rima alegre. O
ator Darby Jones também está de volta no papel do
zumbi silencioso e discreto, embora seu nome tenha sido
mudado para Kolaaga e ele tenha ganhado um novo
mestre na forma do dr. Paul Renault, interpretado por
Bela Lugosi. A presença de Lugosi oferece um pouco de
humor intertextual para os fãs de terror quando ele diz
“Você já me viu criar um zumbi [antes]”, fazendo uma
homenagem ao seu papel no primeiro filme de zumbis,
Zumbi branco (1932). Kolaaga é representado de
maneira séria, sem efeitos cômicos. É explicado que
Kolaaga, “tomado” por Renault, está sendo forçado a
sequestrar vítimas para zumbificação, além de realizar
serviços domésticos na assustadora mansão de seu
mestre. No filme, Kolaag realmente captura uma mulher
branca e a entrega a Renault, que opta por não
transformá-la em zumbi após ver sua beleza. E mais:
nesse filme Kolaag é ainda mais empoderado, pois ele se
volta contra o seu mestre, recusando-se a matar pessoas
sob as ordens dele, e, em vez disso, acaba matando
Renault (com uma pá). O filme mostra os nativos como
primitivos seminus e faz referência aos tambores vodu
com suas “batidas mortais” que enlouquecem os
brancos; os “nativos das montanhas” também dançam
ao redor do fogo com lanças. O humor do filme é
performado em sua maior parte por Jerry e Mike, que
chega até mesmo a aparecer em cena usando pintura
blackface (enganando os nativos, que pensam que ele é
negro).
FIGURA 3.1 APENAS A SOMBRA DE UM HOMEM NEGRO PODE ENTRAR NO
QUARTO BRANCO EM A MORTA-VIVA .
RKO/Photofest
O filme de terror “com negros” Pongo, o gorila branco
(1945) ganhou destaque pelo emprego de mais de uma
dúzia de atores negros numa época em que os papéis
diminuíam por causa das restrições orçamentárias dos
filmes B. Aqui, a maior parte dos negros escalados é de
figurantes — parcialmente vestidos e sem falas. Eles
guiam um time de cientistas brancos pelo “continente
escuro” e por uma terra “não explorada pelo homem
branco” em busca de um grande achado antropológico,
um valioso gorila branco, ou “pongo”, que se acredita ser
o elo perdido. Um violento gorila negro — que ataca
pongo, mas perde a luta e paga com a sua vida — não é
desejado, sendo devolvido para a floresta pelos homens
brancos quando é capturado por acidente. Quando os
nativos fazem algum barulho, isso ocorre apenas por
breves momentos, como quando eles bajulam as roupas
europeias ou quando gritam no momento em que pongo
os esmaga até a morte. Apenas um sortudo adulto
nativo, Mumbo Jumbo (Joel Fluellen), consegue falar
“bwana” e se oferece para ser o Porteiro #1”.10 No filme,
Mumbo Jumbo, assim como Carre-Four, também tem a
oportunidade de encostar numa mulher branca, mas não
o faz. E assim como Carre-Four e Kolaag, pouco se sabe
sobre Mumbo Jumbo enquanto ele se junta ao batalhão
dos muitos negros que são tratados como objetos (de
trabalho), e não como sujeitos, nesses filmes.
Considerar Pongo, o gorila branco como um filme B é
um ato de generosidade. O filme é barato e se apoia em
uma boa quantidade de filmagens antigas de animais
bebendo água para esconder um roteiro mal escrito e
problemático. Contudo, Pongo parecia um filme A e digno
de prêmios perto de seu doppelgänger O gorila branco
(1945). A maior parte de O gorila branco é uma mistura
bagunçada de filmagens arquivadas e cenas de um
curta-metragem mudo de 1915 chamado Perils of the
Jungle. Esse filme caótico é basicamente um filme de
guerra racial entre um gorila negro, Nbonga, que faz de
um raro gorila branco, Konga, um “pária” na floresta por
ser diferente.11 Os dois brigam ao longo do filme, onde o
gorila negro representa o “monstro com o peito cheio de
ódio”, o instigador. De maneira previsível, o filme
acontecia em algum “país ruim” da África, no qual os
nativos “odiavam o homem branco” e onde os brancos
temiam os batuques dos tambores nativos. Quando o
gorila branco é morto por um contrabandista branco, ele
é altamente elogiado, como gorila negro, Nbonga,
lamentando pelo nobre e caído guerreiro branco que só
estava lutando por sua raça em “uma batalha pela
supremacia da selva”:12

Você sabe que eu fiquei meio triste de ter que


matar aquele gorila branco. Ele parecia quase
humano. […] Sua morte pareceu lançar um
feitiço de solidão na floresta […] um tributo
silencioso ao seu fim […]; Eu quase posso vê-lo
[o gorila negro] ao descobrir o pária branco
deitado como se estivesse dormindo. Seus
esforços para fazê-lo lutar. E então a mudança
[…]. Sua surpresa ao olhar para a figura imóvel.
Um tipo de emoção humana o avassala. Então, a
lenta conclusão de que o pária está morto. E o
instinto animal retorna, o instinto de enterrar e
esconder os restos daquele que caiu pelas mãos
dos exploradores da selva. Um gesto de perdão
assim como um canto de morto para o pária da
sua raça — o gorila branco.

No fim o público fica sabendo mais sobre o gorila branco


do que sobre Carre-Four, Kolaag e Mumbo Jumbo juntos.
REFORMANDO HOLLYWOOD, REINVENTANDO
A IMAGEM NEGRA
Preparando-se para uma nova década cinematográfica,
em dezembro de 1939, Spencer Williams e uma lista
enorme de estrelas do terror negro, incluindo Clarence
Muse (Lua negra, Zumbi branco, O fantasma invisível),
Laura Bowman (Drums o’ Vodoo, Son of Ingagi) e Earl
Morris (Son of Ingagi), se encontraram para discutir como
fazer frente aos “tipos derrogatórios e estigmas”
infligidos aos personagens negros em filmes de todos os
gêneros.13 Cineastas independentes, negros ou não,
haviam desaparecido completamente na época; logo, a
grande parte das representações vinha de Hollywood.
Pedir mudanças, contudo, era uma proposta arriscada,
pois Hollywood era a principal empregadora e a indústria
já havia mostrado que podia e iria trabalhar ao redor de
uma presença negra, como Williams “sabia que falariam
de um lugar de fraqueza, das fileiras dos filmes B, de
papéis prevalentemente servis”.14 Muitos artistas negros
já estavam se mantendo calados “sobre a insatisfação e
raiva que sentiam pela falta de papéis decentes. Assim
como as estrelas brancas, eles sabiam que falar mal da
indústria não lhes daria nada além de uma passagem de
volta para o local de onde haviam saído”.15 A outra
alternativa era seguir adiante com o trabalho em
Hollywood, atuando como agentes de mudança onde e
quando pudessem.
Muitos negros optaram por falar sobre o tratamento
que recebiam em Hollywood. Em 28 de dezembro de
1940, o ator Clarence Muse tornou pública a sua
esperança de um novo ano que traria uma melhora no
tratamento da imagem dos negros:

DE ALGUMA FORMA, EM ALGUM LUGAR, PRECISAMOS TER UM


GRANDE FILME NEGRO. ESSA é uma resolução séria
[…]. Uma grande história negra, grande o
suficiente, boa o suficiente para ser lançada por
uma grande empresa como qualquer outro filme
[…]. Inspirador, ousado, cativante e verdadeiro
para com a vida negra em todos os seus
elementos […]. Eu decidi fazer o meu melhor
para encorajar isso […]. E se isso acontecer […].
Que Ano-Novo mais feliz!16

Ainda assim, o tratamento dos negros dentro e fora do


gênero terror era problemático, e depois de muita
deliberação a NAACP tentou encurralar Hollywood —
escritores, produtores, diretores, publicitários, diretores
de elenco e similares —, fazendo com que fosse assinado
um plano que melhoraria a posição dos negros na
indústria. Depois de uma resistência significativa em
Hollywood, que até então havia se recusado a ouvir, em
1942 a organização dos direitos civis finalmente
conseguiu uma reunião com produtores de cinema e
executivos de estúdios, e os incitou a liberalizar os
papéis oferecidos às pessoas negras.17 Contudo, os
negros eram culpados pelos seus próprios problemas; um
representante do estúdio Columbia Pictures disse:
“enquanto pessoas de cor […] aceitarem representar
papéis subservientes ou de bufões […] a venderem a
dignidade de sua raça”, as representações
continuariam.18
Com a ausência daquilo que Cripps chamou de
“estética negra”, era difícil identificar o que constituía
uma melhoria de imagem.19 A indústria cinematográfica
tinha o seu “Código”, que os exortava a avaliar se as
imagens que produziam eram moralmente apropriadas
ou exploradoras. O Código era claro em relação ao que
se julgava estar fora dos limites; coisas como beijos
apaixonados, palavrões, perversões sexuais e
miscigenação. Imaginar um “Código” desse tipo para a
imagética racial era difícil, embora as melhores mentes
continuassem tentando desenvolver uma técnica para
lidar com Hollywood. Lawrence Dunbar Reddick foi um
dos mais conhecidos e respeitados entre as pessoas que
trabalharam para criar um plano de ação. Reddick
recebeu um doutorado da Universidade de Chicago em
1939, e naquele mesmo ano assumiu uma posição de
curador no (atual) Centro Schomberg de Pesquisa da
Cultura Negra, que é parte da Biblioteca Pública de Nova
York. Durante seu tempo lá (1939-1948), ele escreveu e
apresentou suas ideias acerca do tratamento dos negros
em todas as mídias, como livros didáticos, rádio, mídia
impressa e cinema. Em 1944 ele publicou suas ideias
sobre como lidar com Hollywood em um longo ensaio
acadêmico no Journal of Negro Education. Reddick
sugeriu que as instituições de censura, como o escritório
Hays, que administrava o Código, deveriam se esforçar
para “incluir o tratamento do negro no cinema” como
parte das regras.20 Além disso, para proteger o interesse
dos atores, Reddick propunha que “atores negros,
especialmente, deveriam ser apoiados quando
recusassem papéis de empregadas e servos”. Ele ainda
pediu ao Escritório de Informações de Guerra para banir
termos racistas como “crioulo”, “escurinho”, “pretinho”,
“fumaça”, “zambo” e “malandro” dos filmes com base no
fato de que tal linguagem poderia ser explorada pelos
inimigos dos Estados Unidos.21 Reddick continuou a
circular suas ideias acerca da reforma. A NAACP continuou
a pedir reuniões, nem sempre com sucesso. Aqueles em
Hollywood que tinham a mente mais aberta fizeram as
mudanças que julgaram apropriadas. Contudo, o
progresso no cinema era lento. O ator negro Spencer
Williams Jr. tomou para si a obrigação de efetuar
mudanças ao seguir adiante com o seu próprio plano de
oferecer representações dos negros feitas por negros.

MAQUIANDO O FILME DE MACACO


A primeira contribuição de Williams para a causa veio em
1940 com um “filme negro” de terror dirigido e estrelado
por ele. Contudo, o título do filme — Son of Ingagi (1940)
— era vergonhoso. O público de terror já tinha ouvido
falar sobre os míticos “ingagis” antes. Em 1930, o diretor
William Campbell apresentou um filme de terror “com
negros” infame e controverso chamado Ingagi, sobre
primatas, ou “ingagis”, e as mulheres congolesas que
carregavam seus filhos. Ingagi originalmente foi
apresentado como um documentário real e verdadeiro
que reportava as práticas estranhas e bestiais praticadas
pelas mulheres negras da selva. Ingagi terminava com
uma mulher negra acariciando um bebê meio-humano e
meio-macaco.
Estaria Williams imaginando Son of Ingagi como uma
continuação? Por que Williams indicaria uma conexão
com o filme antigo usando um título tão similar? Os dois
filmes não têm ligações; contudo, Son of Ingagi, dirigido
pelo diretor branco Richard Kahn, tem algumas
correlações com o filme original. Son of Ingagi conta a
história de um cientista que viaja para a África e volta
com um símio “meio-humano, meio-fera”, como a
criatura é descrita no pôster de divulgação do filme.
Além disso, o filme também força sutilmente a noção de
acasalamento entre espécies; afinal, de onde
exatamente vieram as crias de símio-humano? Por sorte,
as similaridades acabam por aí, com Son of Ingagi
tomando um caminho novo ao focar em negros da classe
média.
A primeira contribuição imagética significativa do
filme reside na escolha da figura que resgata ingagi: uma
cientista negra — dra. Helen Jackson (Laura Bowman),
uma pesquisadora rica, brilhante e de mais idade, que
exibe grande conhecimento em química, antropologia e
comportamento animal. Por meio da dra. Jackson, a
imagem do homem branco em um safári é recodificada,
embora a natureza exploratória de tais missões não seja
fácil de ignorar mesmo com a presença de um corpo
negro feminino. A dra. Jackson é vizinha e amiga de um
casal recém-casado em ascensão, Robert e Eleanor
Lindsay (Alfred Grant, Daisy Bufford), que estão
celebrando suas núpcias com amigos igualmente
ambiciosos. Aqui, mais uma vez, William quebra uma
barreira, mostrando os noivos negros e seu casamento.22
O filme inclui um número musical dos amigos de Lindsay,
representados pelo quinteto real Four Toppers. O filme
também inclui a representação do “proeminente” e
competente advogado sr. Bradshaw (Earl Morris), e o sr.
Nelson, um detetive interpretado por Williams.
FIGURA 3.2 A DRA. JACKSON SE PREPARA PARA ENCONTRAR O SEU FIM NAS
MÃOS DO INGAGI.
Sack Amusement Enterprises/Photofest
FIGURA 3.3 SPENCER WILLIAMS JR. (DE CHAPÉU).
CBS/Photofest
Na noite do casamento de Robert e Eleanor, a fábrica
onde Robert trabalha é completamente incendiada,
deixando-o sem emprego e imaginando como poderia
sobreviver. A dra. Jackson coloca o jovem casal debaixo
das suas asas, legando a eles sua casa e suas posses.
Quando a cientista é morta após um encontro com o
símio enfurecido, o animal escapa do confinamento e
passa a vagar às escondidas pela casa, e assim assusta
os Lindsays, que haviam se mudado para a casa da dra.
Jackson. Eles então ligam para a polícia e pedem que o
caso seja investigado. O casal não sabia, mas a dra.
Jackson tinha 20 mil dólares escondidos em casa, além
do macaco assassino. Embora o gorila em Son ande ereto
e use calças e uma túnica, o filme não explora a conexão
símio-humano, lidando com o monstro apenas como uma
besta destruidora. Graças a “um grande elenco de cor” e
à locação do filme em uma comunidade negra, os
salvadores dos Lindsays não são homens brancos que
chegam cavalgando para derrotar a besta selvagem,
como era visto em tantos filmes de gorilas com temas
coloniais. Em vez disso, a comunidade negra se junta
para ajudar os Lindsays.
O detetive Nelson (Williams) chega para resolver o
mistério dos assassinatos ocorridos na casa, que agora
incluem a morte do advogado, Bradshaw, que, durante
uma visita, é estrangulado secretamente pelo gorila.
Contudo, o símio se mostra tão elusivo quanto
enganador — quando Nelson termina de fazer um
sanduíche para si mesmo, o símio o rouba enquanto
Nelson está virado de costas, o que surpreende o
detetive. Assim sendo, Williams traz um pouco de humor
para sua performance, revelando algumas de suas
habilidades cômicas que usaria no (controverso e
pastelão) papel televisivo de Andrew “Andy” Hogg Brown
na sitcom The Amos ’n’ Andy Show (1951-1953).
Contudo, Williams não é nenhum idiota no filme. Ele é
mostrado como uma figura ao mesmo tempo séria e
engraçada. Notavelmente, com Nelson em sono
profundo, Eleanor fica alerta tentando escutar
movimentos e é ela quem descobre o gorila — embora
desmaie e tenha que ser resgatada por Robert, pois
Nelson é nocauteado pelo animal. Nelson se redime no
fim ao recuperar a riqueza escondida e entregar aos
Lindsays para que possam seguir suas vidas alegremente
e viver juntos o sonho norte-americano.
Son poderia ser encarado como um filme “B” que seria
lançado junto com outro — baixo orçamento e destinado
ao público negro, duas características mortais para as
bilheterias. Contudo, o filme teve sucesso ao dar o
primeiro passo para a recuperação dos filmes raciais e da
representação dos negros neles. O esforço tinha a ver
com a missão pessoal de Williams de mudar o
tratamento dos negros nos filmes de entretenimento.

LUTANDO CONTRA HOLLYWOOD, O


DIABO NÃO PODE ME DERROTAR
Bem, deixe-me ver, havia um cinema negro
antes, Spencer Williams se apresentou lá e fez
filmes relevantes. E havia público para isso. […]
Era uma cultura — cultura de cinema, cultura
negra — onde filmes sérios e relevantes eram
feitos.

— Charles Burnett, cineasta23

Natural da Louisiana, Spencer Williams Jr. entrou de


cabeça no mundo do entretenimento já adulto, depois
dos trinta anos de idade, após um tempo no Exército e
trabalhando no circuito de teatros, primeiramente como
ajudante e então fazendo pontas cômicas, também
contribuindo com alguns materiais cômicos para as
apresentações. Ele teve o seu início naqueles filmes
raciais cujo conteúdo era mirado em negros, mas feitos
por não negros. Williams apareceu em vários gêneros,
incluindo curtas musicais como Brown Gravy (1929),
faroestes como Harlem on the Prairie (1937) e dramas
criminais como Bad Boy (1939). Ele também foi um
escritor/roteirista creditado em filmes como a comédia
curta The Lady Fare (1929), Harlem Rides the Range e
Son of Ingagi, filmes nos quais ele também atuou.
Em 1983, quatorze anos depois da morte de Williams
em 1969, alguns de seus filmes foram encontrados e
recuperados em um galpão em Tyler, Texas (a duas horas
de distância de Dallas), pelo arquivista de filmes e vídeos
G. William Jones da Universidade Metodista Meridional,
em Dallas. Williams tinha um relacionamento especial
com a cidade de Dallas, tendo filmado e trabalhado por
lá em parceria com a Sack Amusement Enterprise, que
lhe fornecia apoio em financiamento, distribuição e
produção. A Sack permitiu que Williams fizesse filmes
fora do sistema de Hollywood, que afinal o teria excluído,
enquanto detinha o controle criativo de seu produto.
A década de 1940 pertenceu a Williams. Ele dirigiu
doze filmes, todos eles entre 1941 e 1949.
Notavelmente, ele escreveu, produziu (com sua
companhia Amegro) e dirigiu O sangue de Jesus, um
“filme negro” de terror, em 1941. O filme, que marca a
estreia de Williams na direção, tem sido saudado com “o
filme racial mais popular já produzido”.24 O sangue
nunca foi vendido como um filme de terror, mas fugia de
classificações genéricas, sendo às vezes classificado
como fantasia e em outras como um drama religioso.
Contudo, se Sobchack estiver correto quando afirma que
o filme de terror lida com “o caos moral, a perturbação
da ordem natural”, especialmente a ordem divina, e
“ameaça a harmonia do lar”, então O sangue de Jesus é
um filme de terror quintessencial.25 O filme é
profundamente inspirado pela religiosidade cristã e é
centrado no tema do livre-arbítrio — escolher um
caminho de retidão ou de pecado. A ameaça ao lar é
introduzida quando a “Irmã” Martha (Catherine
Caviness), uma frequentadora da igreja e temente a
Deus, que vive numa pequena cidade rural, não
consegue persuadir seu marido Razz (Spencer Williams)
a ir à igreja nem para testemunhar o batismo dela. Razz
é considerado um pecador porque ele prefere caçar a ir à
igreja, e, em uma cena cômica, ele caça na fazenda do
vizinho, levando dois porcos como prêmio. O caos se
instaura quando Martha, ao voltar de seu batizado e
enquanto reza em seu quarto, é acidentalmente baleada
quando o rifle de Razz cai no chão. O rifle dispara, a bala
atravessa a parede do quarto e atinge Martha e sua
imagem de Jesus (branco). Ela é mortalmente ferida,
deixando Razz devastado. Mas esse é um filme de terror,
e a perturbação da ordem natural é esperada. Razz se vê
orando sinceramente por Martha, que está morta, mas
que ainda não foi endereçada ao Céu ou ao Inferno. De
maneira interessante, é Martha, e não Razz, quem tem a
sua fé desafiada. Aqui, mais uma vez, Williams se
distingue ao colocar uma mulher negra, assim como
fizera em Son com a dra. Jackson e Eleanor, no centro da
narrativa. Martha traz ainda mais profundidade na
representação da mulher. Ela é a antítese de Razz, um
marido relapso que cairia facilmente nas garras do diabo.
Logo, Martha é quem deve ficar vulnerável para se ter
certeza de que ela é uma mulher justa, e não hipócrita.
Já morta, Martha é recebida por um anjo que a leva
até a Encruzilhada, a junção entre o Inferno e/ou o Sião.
Martha, com muita certeza, escolhe o Sião, mas o Diabo
(James B. Jones, de chifre, capa e tudo) intervém,
enviando um “falso profeta”, o sedutor Judas Green
(Frank H. McClennan) como uma “tentação” para seduzir
a certinha Martha a testemunhar um lado da vida que ela
nunca viu. Ele dirige a atenção dela de Sião para a visão
de uma cidade iluminada e cheia de pessoas e música
alegre. Judas se torna o “bête noire da burguesia negra”,
pois sua fala ligeira e suave, assim como sua conexão
com o urbano, o tornam excessivamente mau.26 O
terreno de Judas é marcadamente diferente da vida rural,
sem glamour e cheia da poeira que é familiar para
Martha; logo, ele é capaz de atraí-la com roupas
elegantes ao mesmo tempo que a conduz pelo caminho
do Inferno, repleto de bandas musicais e casais
dançando em salões. Ao definir piedade e pecado dessa
forma, o filme não tenta esconder nada; é uma visão
direta da religião, “todas as superfícies” de seu
tratamento do bem e do mal.27
Judas primeiramente leva Martha ao Clube 400, um
lugar de classe para negros com mais dinheiro. Contudo,
Martha permanece brevemente por lá antes que o plano
verdadeiro seja revelado. Judas secretamente vende
Martha por 30 dólares a um colega chamado Brown
(Eddie DeBase), que está no clube esperando para pegar
a sua mais nova presa. Daí a narrativa de Williams, que
já é um conto moralizante, acrescenta um aviso para as
moças que metaforicamente “acabaram de saltar do
ônibus”, vindas da segurança do lar rural e recém-
chegadas na urbe traiçoeira. Brown leva Martha para um
bar decadente onde as mulheres recebem dinheiro para
dançar com homens (e talvez algo mais).
Enquanto o horror já havia prestado atenção nas
mulheres negras antes, frequentemente retratadas como
sacerdotisas vodu, raramente elas conseguiam ser
centrais e femininas. Mulheres negras não são elegíveis
para o pedestal simbólico onde as mulheres brancas são
colocadas pelos homens, para serem romantizadas,
olhadas com admiração, e terem seus corpos, suas
emoções e sua beleza protegidos. Esses momentos de
pura adoração tendem a ser reservados apenas para as
brancas, como Ann Darrow em King Kong (1933).
Contudo, Martha é uma personagem negra que chega
bem perto de ser colocada no pedestal. Razz sente sua
falta e reza incessantemente por ela. A última vez que
uma mulher negra se viu recebendo cuidados tão
atenciosos por parte de um homem, ela acabou sendo
estrangulada até a morte por ele (Klili, em The Love
Wanga [1936]). Ainda, Martha também é retratada como
uma “dama” sulista; por isso ela é um grande prêmio
para o Diabo. Quando Judas é enviado para tentá-la, ele
faz isso colocando-a em um pedestal, explorando a falha
de Razz em não reconhecer completamente não apenas
o valor daquela mulher, mas o que ela representa
enquanto uma dama. Nessa parte, Judas age como um
trapaceiro, confundindo Martha ao unir sexo
(sexualidade, atração sexual) com o feminino. Aqui há
uma diferenciação sutil e importante, distinguível em
grande parte quando comparamos a performance da
masculinidade de Judas, que é moldada pelo desejo e
pelos impulsos sexuais, com a performance de Razz mais
adiante no filme, que se concentra no amor e na
intimidade. Na verdade, o dilema de Martha é um conflito
em relação ao tipo de feminilidade que ela irá abraçar: a
“dama” ou a figura sexual em vestidos chiques e sapatos
(antes que ela seja “apagada”). Manatu argumenta que o
acesso e participação na feminilidade foi e continua
sendo negado às mulheres negras. Como resultado,
mulheres negras não têm a chance de lutar contra ou
escapar da performance feminina, incluindo o tal
pedestal.28 Notavelmente, a feminilidade que Martha
escolhe — ser uma dama respeitável e temente a Deus
— é o que lhe permite ter amor e romance (Razz) e
finalmente a assegura no pedestal.
Enquanto está aprisionada com Brown no bar, Martha
cai de joelhos em oração, implorando perdão a Deus, e,
em resposta, uma guardiã celestial negra ajuda Martha a
escapar de seu destino. Sentindo-se restaurada e
empoderada, Martha (agora em um vestido esvoaçante e
angelical) volta para a encruzilhada. Durante a sua fuga,
os servos do diabo no bar aparecem, saem em seu
encalço e tentam apedrejá-la até a morte. A próxima
cena é uma das mais dramáticas e estilizadas do filme.
Cripps considera a imagética do filme como “diferente de
qualquer outra em filmes afro-estadunidenses”.29 Nas
cenas seguintes, assim que Martha chega na placa que
marca a encruzilhada, a placa se transforma em uma
grande cruz com uma imagem de Cristo. Martha,
prostando-se diante da cruz, é literalmente lavada pelo
sangue de Jesus, que escorre do corpo de Cristo pregado
na cruz acima dela. Por mais chocante que a cena seja
em aparência e simbolismo, também é significativa, pois
tem a ver com Martha negociando um estado complexo
de abjeção. Isto é, ela se encontra em um estado entre
objeto e sujeito. Martha representa vários níveis de
abjeção, já que ocupa uma posição limítrofe entre a vida
e a morte, e também entre um santidade falha mas nem
tão pecadora assim. Martha revela o quão traumático,
física e psicologicamente, pode ser o confronto com a
sua condição de ter sido separada do corpo (objeto) e
estar distante de sua característica humana/humanidade
(sujeito).
A escolha final de Martha, ficar com Deus, expelindo
assim aquilo que ela não deseja como parte do seu eu
subjetivo, é uma lição sobre rejeitar o “impróprio” e
“sujo”, substituindo-o por um “eu próprio e limpo”.30
Restaurada pelo sangue de Jesus, Martha de repente
acorda em casa. Ela e o agora crente Razz são reunidos
sob o olhar cuidadoso da guardiã.
Williams tomou muito cuidado com o seu primeiro
filme, buscando detalhes minuciosos para acomodar os
mais exigentes membros do público que poderiam
escrutinar sua mensagem religiosa. Ele apresenta o
(verdadeiro) reverendo R.L. Robertson e seu Coral
Celeste ao mesmo tempo que oferece um vislumbre
autêntico da igreja negra, de sermões até canções e
orações. Na verdade, os três primeiros minutos do filme
deixam evidente que se trata de uma produção que leva
a religião e sua iconografia a sério. A congregação fala
sobre os “dez mandamentos originais aceitos como a lei
civilizada” e que a religião deveria ser “praticada com
honesta sinceridade”. Bíblias, cruzes e retratos de Jesus
aparecem por todos os cantos. Hinos como “Good News”
e “Go Down Moses” são cantados pelo coral. O reverendo
Robertson realiza um autêntico batismo na beira de um
rio enquanto o coral canta e os paroquianos rezam e se
engajam em louvores e adoração.
O sangue de Jesus também populariza vários temas
que se tornariam centrais em “filmes negros” de terror
mais modernos a partir de 1990. Os temas de Williams,
de escolha entre o bem e o mal, tentação pela agitação
da vida (nortista) urbana versus a vida (sulista) humilde,
honesta e rural, com a figura de mulher salvadora e
árbitra moral, figuram de significativamente em filmes
como Def by Temptation (1990) e Spirit Lost (1997).

ALELUIA! ELOYCE GIST


Enquanto as mensagens de Williams e o estilo
cinematográfico eram duplicados várias vezes nos filmes
de terror, os próprios filmes de Williams não emergiam
de um vácuo cultural. Marca da vergonha (1927), de
Oscar Micheaux, usou o urbano, a música mundana e
tudo o que acompanhava o estilo de vida que esse tipo
de música incentivava como um aviso para as pessoas
permanecerem próximas às suas raízes (sulistas).
Seguindo os passos de Micheaux, a dupla de cineastas
formada pelo casal Eloyce e James Gist produziu dois
filmes por volta de 1930, Trem para o inferno e Veredicto:
inocente, que traziam temas relacionados ao bom/sul e
ao mau/norte. Trem para o inferno, aqui considerado um
“filme negro” de terror, é particularmente seminal. O
sangue de Williams lembra bastante a história de Trem
para o inferno, que é centrada em uma jornada, com
mensagens que ecoam o caminho para a retidão. A
iconografia do filme curto e mudo dos Gists pode ter
influenciado o filme de Williams, já que os dois
compartilham a figura do Diabo, encruzilhadas e imagens
de perdição. Embora não haja evidência de que Williams
tenha assistido ao filme dos Gists, fica claro que Williams
aplica em suas produções um estilo visto nos trabalhos
de Micheaux e dos Gists.
Gloria J. Gibson providencia uma das pesquisas mais
informativas sobre a vida dos Gists, Eloyce em
particular.31 De acordo com Gibson, Eloyce Gist nasceu
no Texas em 1892, e Washington, D.C. se tornou o seu lar
pouco depois da virada do século. Ela frequentou a
Universidade Howard. É dito que o pensamento de Eloyce
em relação à religião refletia suas próprias crenças na fé
baha’i e nas crenças de James, seu marido cristão
evangelista auto-ordenado. Eloyce trabalhou em parceria
com o marido, e suas contribuições para os trabalhos da
dupla são inegáveis, ainda que não sejam precisamente
conhecidas. Contudo, o filme mudo Trem para o inferno é
significativamente considerado fruto do trabalho de
Eloyce, já que o roteiro é amplamente de sua autoria,
além das várias cenas cujas filmagens foram preparadas
por ela. Os Gists não fizeram filmes para entretenimento,
mas como uma ferramenta para ajudar seu ministério. A
dupla viajou de igreja negra em igreja negra, de carro,
com seus filmes e equipamentos.32 Quando Gibson
entrevistou a filha de 82 anos de Eloyce, Homoiselle
Patrick Harrison, no início dos anos 1990, Harrisson se
lembrou de como o casal exibia seus filmes: Eloyce
tocava piano e liderava a condução dos hinos na
congregação. Então, o filme era mostrado, seguido por
um pequeno sermão de James Gist. Os ingressos eram
vendidos com antecedência, ou uma coleta era realizada
no fim da celebração, e o dinheiro era dividido entre os
Gists e a igreja.33 Os filmes dos Gists foram bem-
recebidos, chamando até mesmo a atenção da NAACP em
1933, quando a organização entrou em contato com o
casal para oferecer apoio aos esforços realizados por
eles.
Graças ao trabalho de acadêmicos do cinema como
Gibson e S. Torriano Berry, que têm remontado e
digitalizado fragmentos de filmes, a história do cinema é
bem discernível. Trem para o inferno começa com uma
citação em que se lê “O trem para o inferno está sempre
trabalhando, e o Diabo é o seu engenheiro”, e em
seguida vem uma mensagem do Diabo: “Entrada grátis
para todos — apenas entregue sua vida e sua alma. Sem
devoluções — viagem só de ida”. O filme então mostra
um grupo de pecadores fazendo fila para pegar seus
ingressos: “sem devoluções — viagem só de ida
[assinado] Satã”. O trem dedica vagões para todos os
tipos de pecadores, uma narrativa apresentada por meio
das sinalizações feitas por Eloyce.34 Por exemplo,
aqueles que dançam em festas e clubes têm o próprio
vagão porque “a dança de hoje é indecente”, com Eloyce
associando a dança e a música ao lado mais pecaminoso
da vida. Aqueles que vendem álcool também possuem
um vagão: “há espaço no inferno para os TRAFICANTES DE
BEBIDA e seus seguidores”. O álcool é mostrado como a
porta de entrada para todos os problemas das mulheres.
Vemos uma personagem sendo encorajada a beber por
um homem, que então a guia até um quarto privado.
“Enganada pelo sussurro de um homem”, ela é mostrada
em seguida sozinha, cuidando de um recém-nascido. De
maneira interessante, também há uma cena relacionada
à reprodução, em que uma mulher morre apesar dos
grandes esforços de um médico. O cartão indica: “Ela
usou da medicina para evitar se tornar mãe. É MELHOR ela
se acertar com Deus, porque isso é assassinato A SANGUE-
FRIO”.35 Também há outros pecados não identificados,
como apostas e assassinatos, assim como a
desonestidade e a mentira. O demônio tem um vagão
para os “desviados, hipócritas e ex-membros da
Igreja”.36 Tudo indica que se trata de um trem muito
longo e com muitos vagões para acomodar todos os
pecadores; e nenhum deles evitará o julgamento e o
inferno.
Diferente de O sangue de Williams, não é mostrado ao
público que um retorno à religiosidade é possível depois
que alguém peca. Em vez disso, o pecador assim
permanece e embarca em sua jornada, com o trem se
movendo rapidamente na direção da “Entrada Para o
Inferno”. De acordo com Gibson:

o trem entra no Inferno com um estouro (por um


túnel), batendo e explodindo em chamas. O
Diabo circunda o trem para atormentar ainda
mais as vítimas. […] Na cena final, um homem,
talvez James Gist, afirma: “E assim eu mostrei a
vocês este quadro que pintei como uma visão
que tive depois de ouvir um sermão em um
culto”. Atrás dele há um grande pôster ou
fluxograma da jornada do trem para o inferno.
Essa cena pode ter servido como uma guia para
o sermão de Gist depois do filme.37

Após a morte do marido, Eloyce continuou sua jornada,


“viajando com os filmes, um projetor e um assistente por
algum tempo, mas logo chegou à conclusão de que não
conseguia aguentar sozinha as inúmeras
responsabilidades. As atividades de planejadora, diretora
e exibidora exigiam muito.”38 Ainda pior, o som deixou os
filmes mudos obsoletos, abrindo caminho para esforços
como os de Williams. Eloyce morreu em 1974. A
magnitude de seus feitos pode ser medida hoje pela
condição de seus filmes. De acordo com a Biblioteca do
Congresso, exibir tantas vezes as películas teve o seu
custo: “Os filmes foram exibidos tantas vezes que eles
literalmente desfarelaram nas emendas e foram
recebidos pela Biblioteca em centenas de pequenos
fragmentos”.39
As mensagens religiosas/“filmes negros” de terror dos
Gists e de Williams atuaram como poderosas
intervenções nos discursos cinematográficos que
envolviam os negros nas décadas de 1930 e 1940. Os
filmes de terror deram uma atenção dicotômica às
práticas religiosas dos negros, onde eram representados
como praticantes malignos de vodu ou (idealmente)
como cristãos fervorosos. Notavelmente, nem os Gists
nem Williams exploraram religiões negras de forma mais
ampla além do cristianismo. Williams, em particular,
tinha uma maneira de lidar a com religiosidade negra,
como mostrado no filme de 1934 da Sack Amusement,
Drums o’ Voodoo, que examinava o vodu e o cristianismo
igualitariamente.
No filme, seguidores do vodu e do cristianismo
conviviam na mesma comunidade rural na Louisiana. O
letreiro inicial do filme mostrava os praticantes de vodu
como figuras malévolas por causa do batuque incessante
“às vésperas de um sacrifício”. Contudo, nenhum evento
do tipo acontece. Em vez disso, o mal surge na forma de
um vigarista cheio de estilo chamado obviamente de
“Tom Catt” (Morris McKenny). Aqui, Catt é muito parecido
com o Judas de Williams que persegue Martha, pois ele
deseja que uma jovem chamada Myrtle (Edna Barr)
trabalhe como um “agrado aos olhos” em seu bar. O
problema é que Myrtle não quer ter nada a ver com Catt
ou com seu bar. Outros lutam para que Catt não coloque
suas garras em Myrtle, incluindo um tio dela, que é
ministro da igreja, o Ancião Amos Berry ou Ancião Berry
(Augustus Smith), Ebenezer, o neto de tia Hagar, a bruxa
vodu local, e a própria tia Hagar (Laura Bowman). Hagar
usa sua magia para proteger a sobrinha do ministro. De
maneira significativa, ela tem o apoio do ministro, pois
ele anuncia: “Eu acredito que [ela] é a única pessoa por
aqui que pode expulsar Tom Catt desta comunidade”. Na
verdade, Hagar tem o apoio de toda a comunidade —
tanto a parte cristã quanto a vodu —, que deseja colocar
um fim nos modos perturbadores de Catt. É Catt quem
afasta as pessoas da igreja, mas é o trabalho de Hagar
que as une para declarar guerra contra Catt. Catt é
cegado, dentro da igreja, pela magia de Hagar. No fim,
atingido por Hagar, Catt cai em uma areia movediça e
morre. Tudo fica bem graças à união dos cristãos com os
praticantes de vodu, com os voduístas apresentando
uma religião negra diferente, mas nem um pouco
inferiorizada.40
Talvez Williams conhecesse o seu público e tivesse
optado por uma fórmula estritamente cristã que ele sabia
que funcionaria. O sangue de Jesus se provou popular e
lucrativo o suficiente para que a Sack Amusement
oferecesse apoio ao segundo filme de Williams com uma
pegada sulista rural e religiosa.41 O próximo filme de
terror religioso de Williams, Go Down, Death (1944), é
centrado em Big Jim Bottoms (Williams), que está longe
de ser um personagem cômico. Em vez disso, Jim é o
dono de um clube noturno que também serve como um
parque de diversões para homens e mulheres de pouca
moral. A história faz um paralelo muito próximo com
Drums o’ Voodoo, pois Jim considera Jasper seu inimigo,
um jovem pregador (Samuel H. James) que cuida da
Igreja Batista Monte Sião, a qual está “acabando com os
negócios de domingo” no clube. Jim consegue a ajuda de
três “garotas de estilo”, ou prostitutas, para incriminarem
Jasper. Enquanto o ministro presenteia as mulheres com
bíblias e lê as escrituras para elas, as garotas o cercam,
colocam uma bebida em sua mão e o beijam
rapidamente, bem a tempo de Jim tirar uma foto.
Antes que Jim “exponha” Jasper e arruíne sua
reputação, a mãe (adotiva) de Jim, Caroline, descobre o
esquema e confronta o filho. Caroline, uma cristã devota
e frequentadora da igreja, exige as fotos. Caroline
também implora a Jim que reconheça Cristo para que
toda a família possa “estar junta no Além”. Em vez de
fazer isso, Jim zomba da mãe e ignora suas súplicas. Ao
som da canção “Nobody Knows the Trouble I’ve Seen”,
Caroline conversa em voz alta com o falecido marido,
Joe, e pede a ele que converse com Deus sobre Jim.
Caroline fica chocada ao ver a imagem fantasmagórica
de Joe aparecer, conduzindo-a até um cofre onde Jim
guarda a foto escandalosa e todas as cópias. O fantasma
de Joe abre o cofre para Caroline, e ela pega as fotos.
O uso que Williams faz do fantasma de Joe é muito
parecido com o uso de Martha em O sangue de Jesus, já
que ambos voltam dos mortos para falar com negros
sobre a experiência de pessoas negras. A história de
pessoas negras vivas é contada tão raramente na cultura
popular que chega a ser frequentemente representada
como se fosse contada pelos mortos. A eficácia de uma
comunicação desse tipo tem sucesso ou falha
miseravelmente, dependendo do lugar de onde o morto
fala. “Na modernidade”, escreve Holland, “a ‘Morte’ não
ocorre mais entre os vivos, e, para alcançar a separação
entre os alegres (vivos) e os miseráveis (mortos/quase
mortos), o hospital foi criado”.42 Nesses filmes negros, a
conversa dos mortos e moribundos acontece
notavelmente no lar. As lições de religiosidade de Martha
são dadas a partir da cama, em casa, enquanto é
cuidada e atendida por Razz, que reza por ela em sua
cabeceira.43 Da mesma forma, no filme de Williams, Joe
se aproxima de Caroline e só consegue se fazer ouvir
dentro do “lar” e durante as orações.
Jim surpreende Caroline antes que ela possa fugir com
as fotos e briga com ela, causando sua morte por
acidente. O título do filme, Go Down, Death, vem de um
poema/sermão fúnebre homônimo de 1926, de autoria
de James Weldon Johnson, que é pregado no funeral de
Caroline enquanto Jim escuta, com remorso, tendo
colocado a culpa da morte de Caroline em um ladrão.
Durante o sermão, palavras de conforto são oferecidas, o
que inclui a promessa de que Caroline não está
exatamente morta, mas que foi para o além.
Jim começa a receber sua punição durante o funeral
da mãe. Quando Jasper prega, “filho enlutado, não
chores mais”, Jim abaixa a cabeça envergonhado e
começa a ouvir uma voz — sua consciência falando. A
condição mental de Jim piora depois do funeral. A voz
demoníaca e incorpórea grita com ele: “Você matou,
você matou, matou a sua melhor amiga!” e “O Senhor
não perdoa assassinos”. Jim corre assustado, mas o
tormento piora. Jim corre, porém cai no chão enquanto a
voz promete: “Eu vou mostrar para onde você vai […]
Inferno!”. Contudo, Jim não consegue encarar o inferno
de pé e em posição ereta, sendo derrubado, ainda que
não esteja morto, para que possa ter uma visão de seu
destino.
Como uma marca registrada de Williams, ilustrado de
forma assustadora em uma sequência estilizada, o
Inferno é revelado a Jim através de visões chocantes de
almas torturadas de mortos-vivos se contorcendo em um
lago de gelo, e um Lúcifer com chifres devorando
violentamente suas almas. A sequência é emprestada de
um assustador filme mudo chamado L’Inferno (1911),
uma adaptação do Inferno de Dante, a primeira parte do
poema épico do século XIV, A divina comédia, dirigido por
Francesco Bertolini e Adolfo Padovan. As limitações
orçamentárias de Williams o forçaram a ser criativo,
apelando para uma das mais assustadoras
representações alegóricas do bem e do mal como fonte
de imagens de arquivo. O filme exibe uma jornada em
espiral para o Inferno, onde os pecadores sofrem torturas
infinitas. O Diabo está presente, abusando dos perversos
e até mesmo devorando-os. Pouco depois de ser exposto
a tais visões, Jim é encontrado realmente morto, tendo
viajado para o “Lugar Terrível” por essência (não apenas
uma casa mal-assombrada ou um túnel assustador), um
elemento do terror obrigatório e até mesmo célebre.44
Contudo, esses tipos de filme não eram sustentáveis.
Em 1968 e 1970, o acadêmico de cinema Thomas Cripps
entrevistou Alfred e Lester Sack, da empresa Sack
Amusement Enterprises, distribuidores de O sangue de
Jesus e Go Down, Death. De acordo com Cripps, antes da
guerra, O sangue de Jesus (para usar de exemplo) “já
tinha se tornado quase uma arte folclórica para a
clientela rural sulista [de Williams], sua falta de artifício
parecia mais uma falha charmosa do que uma ferida
debilitante”.45 Contudo, os Sacks revelaram que a
locação do filme “naqueles dias […] quase esquecidos”
foi motivo de riso no norte durante os anos da guerra e
depois.46 Além disso, os assim chamados “filmes com
elenco inteiramente de cor” estavam competindo com
filmes em que os negros apareciam como coestrelas, e
não apenas figurantes, ao lado dos brancos. No gênero
do terror, infelizmente, papéis coadjuvantes para negros
significavam o papel do parceiro negro engraçado.
Williams teria que dividir sua década de conquistas com
tipos como Mantan Moreland e Willie Best, cuja
popularidade era construída em cima de papéis
humilhantes.

“NÃO TEM NINGUÉM AQUI ALÉM DE NÓS, AS


GALINHAS”
Será que os produtores de Hollywood estão
cientes de seus atos nocivos, Ou apenas
ignoram na cara dura e desconhecem os fatos?
Eles nos mostram como engraçados,
vagabundos, criminosos e preguiçosos,
Eles não sabem que pessoas de cor são como
todas as outras?

— Razaf (16)47

O cinema já tinha meio século de criação de imagens nas


costas; contudo, levando em conta a representação dos
negros durante esse período, as obras ofertadas parecem
saídas de algum palco de show de menestréis do século
XIX. Durante a escravidão e o período pós-reforma nos
anos 1800, as performances teatrais tinham muito a
dizer sobre as relações raciais ao oferecerem uma
representação oportunista da relação entre mestre e
escravizado. Os brancos eram representados como
figuras pacientes, cuidadores paternais de suas posses
humanas ineptas, fracas, mas contentes de qualquer
forma. Essa relação racial entre os brancos superiores e
os “escurinhos” alegres era uma fantasia poderosa que
suplantava a realidade das brutalidades da escravidão.48
Inicialmente, essas fantasias eram encenadas nos palcos
por brancos com o rosto pintado de preto e que
reproduziam um sotaque negro — um jeito de falar
simplório e cheio de palavras erradas. Enquanto parece
difícil imaginar que os negros participariam de sua
própria subjugação nos palcos, no fim dos anos de 1800
eles eram escalados em papéis de “escurinhos”, e alguns
até pintavam os rostos. Para atrair o público branco dos
shows brancos de menestréis, os atores negros
afirmavam ser de verdade, “verdadeiros escravos da
plantação, não uma ‘imitação’ como os brancos com o
rosto pintado”.49 O cinema apenas pegou essas
performances dos palcos (e às vezes também seus
atores) e as colocou em celuloide.
Por exemplo, o ator de teatro Harold Lloyd encontrou
sucesso no cinema, aparecendo em mais ou menos
duzentos filmes de humor. Um dos mais conhecidos foi a
comédia muda de terror de 25 minutos chamada
Haunted Spooks (1920). Haunted e filmes do tipo eram
chamados de “comédias de arrepio”, que misturavam
cenas tensas e arrepiantes ou sustos com muito humor.50
Nesse filme de terror “com negros”, um jovem, “o
Garoto” (Lloyd), ajuda sua nova esposa, “a Garota”
(Mildred Davis), a receber a herança dela, uma grande
mansão. A Garota não pode ser dona da mansão até
viver nela por um ano. O Garoto afasta o tio ganancioso
da Garota (Wallace Howe), que “assombra” a casa numa
tentativa de assustá-la até que ela vá embora. O filme
apresenta um grande grupo de atores negros
(aproximadamente dez) que interpretam servos e
escutam o tio dizer: “fantasmas sorridentes dos mortos
gritam de dentro de suas covas e vagam por estes
quartos”. O filme retrata os servos como pessoas
crédulas, espalhando a história (com o uso de letreiros)
com suas vozes negras cheias de palavras erradas: “I u
simitério todo fica virado dus avesso! Fantasmas de dar
medu, assustador, vêm pra zanzar nus quarto”. À medida
que o tio “assombra” a casa, um criado infantil (Ernest
“Sunshine Sammy” Morrison) mergulha em uma lata de
farinha, emergindo todo branco e petrificado. O mordomo
(Blue Washington) é mostrado como uma figura tão
assustada que ele só consegue sapatear no lugar
enquanto a tinta preta que cobre o seu rosto começa a
escorrer. A representação de negros era tão abismal no
filme que era possível achar que a palavra “spooks”
[sustos] no título era um xingamento ofensivo usado
para descrever os personagens negros.
Hollywood foi notavelmente prolífica em apresentar
tais comédias de terror, com os filmes desse tipo
dominando o gênero durante a década. O humor que os
negros exibiam, “um show de menestréis híbrido”, ainda
era orientado para os brancos, com os negros sendo
empregados para validar e velar o racismo.51 Essa foi
uma era marcada pela representação obsessiva de
negros como figuras “culturalmente inferiores”, que se
transformaram no fardo dos homens brancos, uma vez
que os eram mostrados como defeituosos, mas estavam
nos Estados Unidos para ficar.52 Os negros eram cada
vez mais apresentados como norte-americanos (fossem
do sul ou de Nova York, mais frequentemente do
Harlem), e não apenas como nativos da África ou do
Caribe. A mudança representacional teve um pouco de
propaganda, pois o Departamento de Cinema do
Escritório de Informações de Guerra afirmou que seria do
melhor interesse da nação a representação de uma
América unida (embora não totalmente integrada).53
Ainda assim, os filmes de Hollywood continuaram com
seus insultos. Por exemplo, no filme de terror “com
negros” O castelo sinistro (1940), Bob Hope,
interpretando Larry, fala em viajar para “Black Island”
[ilha negra] a fim de (numa piada de duplo sentido)
“conhecer de perto os fantasmas”. A proeminência de
filmes do tipo era, em parte, o resultado de planos
incompletos de censura que identificavam facilmente e
exigiam a remoção dos estereótipos mais escandalosos e
viciosos, mas ignoravam aqueles calcados no humor.
Como resultado, comédias de terror racistas se tornaram
comuns, e tudo isso serviu para reforçar a ascendência
branca.54

UM PECADO E UMA VERGONHA


“Eu estou com uma vontade danada de sair,
mas as minhas pernas não ajudam!”

— Birmingham Brown, Charlie Chan em O mistério do


rádio (1945)

Willie Best se vendia como Sleep ’n’ Eat [dorme e come].


Nellie (Wan) Conley se tornou Madame Sul-Te-Wan [uma
brincadeira fonética cuja tradução seria algo como
“southy one”, a sulista]. Ernest Morrison era conhecido
como Sunshine Sammy. Mantan Moreland não precisava
de truques do tipo, já que o seu próprio nome vendia.
Quando o nome de Moreland aparecia em um anúncio, o
público podia ter certeza de que iria ouvir os seus
melhores bordões e vê-lo arregalar os olhos e tremer de
medo. Os personagens que esses atores representavam,
e o que fizeram pela reputação deles e dos negros, têm
sido descritos nos termos mais implacáveis. Contudo,
parte do desdém mais feroz tem sido reservado para
Moreland. O acadêmico de cinema James Nesteby
descreveu os papéis que Moreland aceitou como “o
amigo alegre, o preto que vira um covarde ao primeiro
sinal de perigo, ou o preto que nem conseguia mexer os
pés enquanto o resto de seu corpo tremia”.55 O jornalista
britânico e historiador de cinema Peter Noble (181-182)
escreveu de forma brutal acerca de Moreland: “nenhum
ator negro revirou os olhos com tanta desolação quanto
Moreland, nenhum ator de cor se esforçou tanto para
retroceder às caracterizações sub-humanas de Stepin
Fetchit. Ele é a ideia aceita nos Estados Unidos do
supremo palhaço negro e atua na frente das câmeras
como um macaco bem treinado”.56
Nascido na Louisiana em 1902, Moreland começou sua
carreira como um artista itinerante, encontrando seu
caminho nos palcos de vaudeville por volta dos vinte
anos. Aparecendo em mais de cem filmes, foi a comédia
que deu fama a Moreland. Ele foi creditado como sendo
um artífice da comédia, exibindo um “arsenal de gestos e
caretas que os atores geralmente usavam para roubar a
cena e desenvolver personagens”.57 Suas performances
espirituosas eram perfeitas para as comédias de terror.
FIGURA 3.4 MANTAN MORELAND.
Toddy Pictures Co./Photofest
No filme de terror “com negros” O rei dos zumbis
(1941), que se passa durante a Segunda Guerra Mundial,
Moreland interpreta Jefferson “Jeff ” Jackson, um morador
do Harlem e motorista de seu mestre branco, Bill “sr. Bill”
Summers (John Archer). A dupla, juntamente com o seu
piloto, James “Mac” McCarthy (Dick Purcell), faz um
pouso forçado em uma ilha nas Bahamas. Lá, o trio
encontra a mansão do dr. Miklos Sangre (Henry Victor),
um cientista austríaco. Sangre também é um “agente
secreto” de um “governo europeu” que não é nomeado.
Ele usa os poderes do vodu como ferramenta de
interrogatório para conseguir segredos de guerra de um
almirante norte-americano a fim de que os inimigos da
América (que se comunicam por rádio em alemão)
tenham a vantagem militar. Os planos do cientista
dependem dos poderes de Tahama (Madame Sul-Te-
Wan), uma velha sacerdotisa vodu que também trabalha
como cozinheira. Apesar de seu pequeno tamanho,
Moreland rouba a cena quando arregala os olhos
enquanto fala uma coisa engraçada depois da outra a
despeito da própria negritude. Por exemplo, pouco antes
da queda, ele diz todo arrepiado: “Oh, oh!!! Eu sabia que
não tinha nascido pra ser um passarinho preto”. E
quando o seu personagem, Jeff, chega à conclusão de
que sobreviveu à queda, ele proclama: “Eu pensei que
tivesse a cor errada pra ser um fantasma”. O propósito
de Jeff no filme é ser acometido pelo medo, enquanto os
brancos ao redor dele são calmos e racionais, reforçando
dicotomias de emoção negra e razão branca.58
Quase todas as falas ditas por Jeff (ainda que corretas)
são sobre os perigos da ilha e a necessidade do trio de ir
embora rapidamente. De tal maneira, Jeff é covarde,
enquanto os homens brancos são sérios e heroicos. Mas,
claro, Jeff não corre, preferindo ficar perto do seu sr. Bill.
Em outra cena, Jeff recebe uma cama na ala dos
empregados, longe do sr. Bill. Ele é escoltado até lá pelo
estranho mordomo Momba (Leigh Whipper). Tanto por
medo quanto por lealdade, Jeff pergunta: “Ah, sr. Bill,
priciso memo ir, não posso ficá aqui com o senhô?”. Jeff
não apenas volta o seu humor contra si, mas implica
outros negros em sua ignorância ao descrever os zumbis
negros da ilha como “preguiçosos demais para deitar”.
Em 1943, a Monogram Pictures, a mesma empresa
que trouxe O rei dos zumbis ao público, lançou uma
sequência, A vingança dos zumbis. Enquanto os dois
filmes possuem basicamente a mesma premissa, as
narrativas não se conectam, e o segundo filme não faz
nenhuma menção ao primeiro. A vingança é situado na
Louisiana, com Moreland reprisando o papel de Jeff.
Madame Sul-Te-Wan também está de volta, mas desta
vez no papel de Mammy Beulah, uma velha empregada
tagarela. Eles se juntam a uma horda de zumbis
silenciosos que inclui James Baskett (vencedor do Oscar
por A canção do sul [1946]), como o sobrecarregado
escravo zumbi Lazarus.
A premissa de A vingança é parecida com a de O rei,
mas é ainda mais explícita em sua propaganda anti-
Alemanha/Nazi. O dr. Max Heinrich von Altermann (John
Carradine), que saúda os seus compatriotas alemães
com uma batidinha dos saltos de suas botas, está
fazendo experimentos com uma droga feita de “lírios do
pântano” que irá ajudá-lo a criar um exército de zumbis:
“Estou preparado para fornecer um novo exército ao meu
país, tantos milhares quanto necessário […] um exército
que não precisará ser alimentado, que não pode ser
parado por balas. Que é, realmente, invencível.”
Quando sua esposa zumbi (branca) desaparece, von
Altermann junta os negros em sua cozinha para
interrogá-los. A coisa mais interessante nessa cena é o
desprezo que os personagens negros têm pelo alemão.
Quando Altermann acusa sua empregada Rosella (Sybil
Lewis) de saber o paradeiro da zumbi, porque ela está
“sempre andando de fininho, observando e escutando
tudo”, Rosella responde em tom desafiador: “Num vi
nada, num ouvi nada”. Em seguida, uma desdenhosa
Mammy Beulah se intromete, desafiando o mestre: “Tem
certeza que num sabi pr’onde ela foi, tem certeza que
num consegue adivinhá?”. Quando Altermann responde
“Eu estaria perguntando se soubesse?”, Mammy Beulah
rebate: “Bem, mestre, ‘taria sim, se quisesse fingi que
num sabe”. No fim das contas, é uma ótima troca, dadas
as representações e relações raciais da vida real na
época. Os personagens negros não são “engraçadinhos”,
mas são oposição. É uma cena poderosa de propaganda
norte-americana mostrando os negros unidos pelo
desprezo ao alemão. Nos filmes dessa época, os negros
não eram mostrados em levantes em oposição aos
brancos dessa forma, e certamente não mereciam
impunidade. Os zumbis negros ou nativos praticantes de
vodu, na época, não eram os únicos monstros do período
da guerra. Os cineastas distribuíam monstruosidades
mais ao longe, e os zumbis se tornaram a representação
de um tipo de controle mental e social antidemocrático
que regimes mais fascistas empregariam.59
Mantan Moreland e Flournoy Miller, como Washington
e Jefferson, respectivamente, se uniram na comédia
negra de terror Lucky Ghost (1942). Lucky tinha um
elenco negro e mirava no público negro. Foi dirigido por
William Beaudine, um homem branco que, com mais de
350 filmes na carreira, era conhecido por fazer filmes B
em duas semanas ou menos. O filme foi distribuído pela
Dixie National Pictures, Inc. de Ted Toddy (mais tarde
transformada na Toddy Pictures Co.). Toddy, um homem
branco que apoiou vários filmes que estrelavam
Moreland, construiu sua fortuna produzindo e
distribuindo filmes com negros, como Harlem on the
Prairie (1937), Mantan Runs for Mayor (1947) e House-
Rent Party (1946).
Lucky Ghost conta a história de dois azarados,
Washington (Moreland) e Jefferson (Miller). Descobrimos
que eles estão encrencados com a justiça por causa de
um juiz que disse “Saiam da cidade e continuem
andando”, o que a dupla não muito inteligente fez de
forma literal, andando por dias a fio. Washington não
sabe escrever e não conhece os dias da semana, mas é
um exímio jogador de dados. Jefferson faz o homem sério
da dupla, que dá respostas sagazes e se engaja em
humor pastelão. A comédia deles não distancia os negros
dos velhos estereótipos. Por exemplo, os dois possuem
um radar interno para encontrar galinhas. Quando
Washington invade um viveiro para roubar galinhas, ele é
surpreendido pelo dono, que grita “Quem está aí!?”,
dando espaço para o coloquialismo popular de
Washington: “Não tem ninguém aqui além de nós, as
galinhas”. À medida que Washington foge do viveiro, o
proprietário atira em seu traseiro. Em 1915, a Lubin
Manufacturing Company produziu um desenho chamado
A Barnyard Mix-Up, centrado “no ladrão de galinhas
Rastus que escapa dos tiros do fazendeiro, mas é
derrubado pelo machado, embora seja ressuscitado de
forma inusitada por uma explosão de dinamite”.60 Lucky
serviu como lembrete de que o estereótipo de “negros
amando galinhas” pode ser uma coisa perigosa.
A sorte da dupla muda quando Washington ganha
uma bolada, um carro, um motorista e roupas em uma
partida de dados contra dois transeuntes que estão se
dirigindo para um clube ilegal (que funciona dentro de
uma mansão). Washington e Jefferson vão para o clube e,
enquanto estão lá, Washington ganha o clube inteiro em
um jogo de dados. No fim das contas, o clube é um lugar
mal-assombrado por uma família insatisfeita pelo fato de
seu “sobrinho inútil” ter transformado a casa, agora
propriedade de Washington e Jefferson, em um lugar
onde ocorrem “estripulias, dancinhas de jazz e
algazarra”. As assombrações dão grandes oportunidades
para que Washington, alternadamente, fique paralisado
de medo ou comece a implorar “que meus pés não me
falhem agora”.
A atuação de Moreland como “o pretinho que se
acovarda” não se limitava às comédias de terror.61 No
mistério The Strange Case of Doctor RX (1942), no papel
de Horatio Washington, seu cabelo ficou branco de medo.
Quando foi escalado na série de comédias de mistério do
detetive Charlie Chan como o motorista Birmingham
Brown, de 1944 até 1949, ele geralmente soltava frases
como: “Eu estou com uma vontade danada de sair, mas
as minhas pernas não ajudam!”.62
Cedric Robinson, em Forgeries of Memory & Meaning:
Blacks & the Regimes of Race in American Theater & Film
Before World War II, se esforça para reabilitar o legado de
Moreland63 argumentando que ele “não era um tolo” e foi
alguém que usou de um tipo de subterfúgio com o qual
fazia pouco caso e zombava dos brancos por não serem
tão superiores quanto diziam. Robinson cita O rei dos
zumbis (1941) como um filme em que Moreland entalhou
uma réplica negra. Por exemplo, Robinson enxerga
capacidades intelectuais em Jeff que são propositalmente
evidenciadas com o uso que Jeff faz de palavras como
loquaz, kosher e prevaricador. Realmente, Jeff usa tais
palavras, mas em Jeff, cuja fala também é repleta de
malapropismos, esse linguajar é usado para causar um
efeito cômico.
E, em relação à representação de Birmingham Brown
de Moreland, Robinson até enxerga esperança ali,
observando que Brown transformou a casa de Chan em
um lugar mais “diverso, vivaz, carinhoso e cômico”.64 A
inclusão de Moreland é certamente vivaz e cômica,
embora seja mais utilizada como um acessório do que
para proporcionar uma diversidade racial.
É difícil enxergar como, num todo, essas comédias de
terror fazem alguma coisa além de mostrar os negros
como inferiores. Enquanto os personagens de Moreland
permanecem ao lado de seus mestres, grudados feito
cola, os filmes comunicam que está tudo bem entre
negros e brancos. Tais representações mostram uma
“visão da harmonia racial ao apresentar para o seu
público-alvo uma imagem dos negros como figuras
engraçadas (eles não podem ser infelizes; eles nos fazem
rir), confusas (veja, eles precisam de nós para guiá-los) e
ansiosas para agradar (nós obviamente merecemos a
atenção deles)”.65 Esses filmes também são únicos
porque a violência neles é muito trivializada. Em filmes
de terror mais tradicionais, a violência está sempre
presente, mas dificilmente é trivializada. Quando uma
múmia estrangula ou quando um gorila esmaga, essas
ações são entendidas como violência. Quando o
personagem de Moreland leva um tiro no traseiro
durante uma fuga ou quando o personagem de Eddie
Anderson, Eddie, o motorista, em A volta do fantasma
(1941), leva repetidas cabeçadas de uma foca e quase se
afoga, as consequências da violência infligida contra
corpos negros (nessa era das leis Jim Crow, ainda por
cima) são silenciadas.
FIGURA 3.5 WILLIE BEST.
RKO Radio Pictures/Photofest
Willie Best era o outro ícone das comédias de terror na
década de 1940. Ele também começou a atuar cedo,
“com o preto alto e magro passando por toda a ladainha
banal do comediante vaudeville com o rosto pintado de
preto”.66 Bogle escreve, com um pouco de chiste, que
Best era o “step” de Stepin Fetchit (Lincoln Perry), com
Best se apropriando das caracterizações cômicas,
vacilantes e de gestos toscos de Perry, e, dessa forma,
roubando papéis que teriam ido para Perry.67 Best não
era nem de longe um bom ator como Perry e não
conseguia realizar as performances de pretos
preguiçosos e lentos com a mesma criatividade. Ele
simplesmente não era um bom ator. Em O castelo
sinistro (1940), Best aparece juntamente com Bob Hope,
fazendo bico enquanto atura frases como: “Você parece
um blecaute durante um blecaute. Se isso continuar
assim, eu vou ter que pintar você de branco”. Best era
sempre o mesmo, não muito engraçado, apenas um
parceiro idiota que não reagia a insultos ou disparava
alguma ferroada ocasional, como Moreland fazia. Best,
notoriamente, esticava o lábio inferior, arregalava os
olhos e vagava por filmes de terror “com negros” como O
passo do monstro (1932), no qual ele considera sua
semelhança com um gorila, e O fantasma risonho (1941),
em que ele acrescenta cruzar os olhos e ultrapassar
cavalos em debandada ao seu arsenal de performances
de “negrinho assustado”. Best seria chamado de novo e
de novo para fazer pouco mais do que tremer de medo e
pular por causa de sombras em outras comédias de
terror como The Body Disappears (1941), Veleiro
fantasma (1942) e Cara de mármore (1946).

NEGRO ASSUSTADO… MARIONETES?!


“Se eu sou ’marelo, cê é daltônico.”
— Scruno, Spooks Run Wild (1941)

A grande proliferação de comédias de terror pareceu


quase sufocar as conquistas de Spencer Williams. Até
mesmo a série de filmes The East Side Kids (1940-1944),
com o jovem Scruno (Ernest “Sunshine Sammy”
Morrison), usou do recurso do negro assustado. Em
Spooks Run Wild, enquanto Scruno anda por uma
mansão escura e assombrada, ele é repreendido pelos
colegas: “Da próxima vez que você for sair do escuro, se
cobre com uma mãozinha de tinta branca, ouviu?”, ao
que Scruno responde: “Tô tão assustado que tô ficando
branco agora”. Em Fantasmas à solta (1943), outro filme
de gravação rápida de William Beaudine, Scruno treme e
gagueja: “Quem é… diz quem é quando eu pergunto
quem é”, enquanto Emil (Bela Lugosi), um espião nazista,
o persegue.68 Não surpreende que Hollywood iria deixar
de infantilizar homens para implicar crianças — reais e
desenhadas — na encenação do negrinho assustado.
George Pal fez filmes em stop-motion com marionetes
de madeira chamadas de “puppetoons”. Os filmes mais
infames de Pal são os curtas da série Jasper (1942-1947)
que estrelam a marionete Jasper como “o pretinho”
(como Jasper era apelidado nas propagandas), retratado
numa caricatura de pintura blackface — olhos
arregalados, lábios sorridentes largos e brilhantes,
contrastando com sua pele preta como carvão —, que
vive com a sua “Mammy” em uma cabana decrépita.
Jasper e aqueles ao redor dele conversam com sotaque
negro. Ao longo da série, o amor de Jasper por melancias
é algo constante e representa a fonte de muitos de seus
problemas, situando-o no território dos filmes de terror,
com Jasper experimentando uma “violência arrepiante”
realçada por cenas escuras, mal iluminadas e que
emprestam um tom sinistro e agourento.69 Em Jasper and
the Watermelons (1942), Jasper rouba melancias de uma
plantação proibida. O filme então se transforma em uma
“sequência assustadora com a criança [mortificada]
sendo perseguida por figuras ameaçadoras”.70 À medida
que o dia vira noite, melancias aparecem cantando: “Vai
ter problema na Terra das Melancias hoje à noite”,
enquanto se transformam em monstros assustadores que
vão atrás de Jasper. As melancias monstros se tornam
predadoras ao se esforçarem para devorar Jasper, que
por pouco escapa delas, correndo e saltando e lutando
para se afastar de suas bocas. Uma cachoeira de suco de
melancia finalmente fornece a Jasper a vantagem de que
ele precisa, pois a correnteza o leva de volta para casa,
para sua Mammy… que dá a ele um pedaço de melancia.
Em Jasper and the Haunted House (1942) não é uma
melancia, embora normalmente seja, o que mete Jasper
em confusão, mas uma torta de groselha. Por ordem de
Mammy, Jasper precisa levar uma torta para o diácono
Jones, mas acaba em uma casa mal-assombrada. A
sombra de Jasper vira as costas e sai correndo, deixando
o menino sozinho. Aqui, com efeitos especiais, os olhos
de Jasper se arregalam e flutuam de medo, na velocidade
do som. Há um interlúdio musical em que fantasmas
tocam um pouco de jazz no piano e aparições dançam ao
redor.71 Por fim, Jasper foge da casa e, durante a fuga,
fica preso em uma placa onde é possível ler: “Dá próxima
vez, experimente a torta de groselha dos fantasmas”.
Jasper foi criado pela imaginação de Pal, que nasceu
em 1908 na Hungria e morreu em 1980 nos Estados
Unidos. Durante a sua carreira, seu trabalho de animação
lhe rendeu um Oscar, além de outras seis indicações. Pal
afirmava não ter nenhuma animosidade racial em mente
quando criou Jasper, dizendo que ele estava apenas
“trazendo à vida um verdadeiro personagem afro-
estadunidense e que não nutria nenhum preconceito
racial”.72 Ignorou-se o fato de que a série foi construída
em cima de uma sopa de estereótipos negros e
disfunções unidos à pobreza abjeta, um lar
monoparental, pai ausente e mãe negra, tendo como
centro um negro “à toa e problemático”, que, ainda por
cima, rouba melancias.73 Pouco importava a intenção do
criador, a recepção por parte dos negros foi ruim. A
revista Ebony publicou um artigo, “Little Jasper Series
Draws Protest from Negro Groups”, lamentando a
representação de um garoto negro que ama melancias
tanto quanto teme casas mal-assombradas.74
Richard Neuert faz um paralelo entre os filmes de
Jasper e, de maneira interessante, as produções de
Spencer Williams, escrevendo: “contudo, é válido notar
que alguns dos temas de Jasper, como o incentivo para
que o povo do campo permaneça onde está, que respeita
as velhas tradições e rechaça o furto, também
apareceram em filmes raciais com atores de verdade na
década de 1940, filmes como o famoso O sangue de
Jesus de Spencer Williams, feito por e para afro-
estadunidenses”.75 Contudo, os filmes de terror/religião
de Williams eram incomparáveis e se tornaram um
gênero por si só, “pristinamente negros em [sua]
advocacia, locação, ponto de vista, ética social, e […]
técnica popular resolutamente não hollywoodiana”.76
Não havia nada em Jasper que refletisse negritude, e ele
certamente não adotou os objetivos adicionais de
advogar ou privilegiar os valores da burguesia negra.
Williams apresentou sistemas de valores, posicionamento
de classe, rituais e comportamentos, relações amorosas
e ideologias de empoderamento que não haviam sido
vistos durante esse ciclo de filmes de terror. Os filmes de
Pal não apenas falharam em dialogar com essas visões,
mas eram simbolicamente devastadores. Na verdade,
quase duas décadas depois de Pal apresentar Jasper, os
grupos negros ainda tentavam manter estereótipos
desse tipo afastados dos telespectadores. Em 1959, um
canal de televisão de Portland, Oregon, precisou ser
persuadido pela Liga Urbana a cancelar a série por causa
de seus estereótipos óbvios. A imprensa negra — os
jornais Los Angeles Sentinel, Chicago Defender e Afro-
American (de Baltimore), entre outros — noticiou que a
Liga Urbana escreveu para o canal KOIN sobre a
representação de Jasper, que servia para “perpetuar
noções falsas sobre as peculiaridades dos negros como
raça”. O apelo também chegou a afirmar: “É uma coisa
trágica que Jasper e seus associados sejam
continuamente apresentados de maneiras que
solidificam noções falsas e atendam a uma demanda de
superioridade racial por parte dos telespectadores
brancos”.77

CONCLUSÃO
As produções de Spencer Williams não eram
tecnicamente complexos. Afinal, um dos filmes (O
sangue de Jesus) mostrava o Diabo como um homem
vestido com algo semelhante a uma fantasia de
halloween. Alguns críticos chegaram a dizer que suas
lições simplistas de piedade não correspondiam com os
tempos mortais em que eram transmitidas. Ainda assim,
Williams usou literalmente de sua fé para criar “filmes
negros” de terror populares e de sucesso centrados na
cultura negra (sulista) e pensados para o público negro.
Infelizmente, Hollywood ignorou as evidências e
continuou a procurar narrativas banais e estereotipadas.
Ainda assim, grupos de indivíduos instruídos e
organizações continuariam a fazer apelos a Hollywood,
pedindo que o tratamento dos negros sofresse alguma
revolução. Joel Fluellen (Pongo, o gorila branco [1945]) e
Betsy Blair (atriz e esposa de Gene Kelly), em 1946,
apareceram diante da Guilda dos Atores de Cinema (SAG)
e propuseram que a associação advogasse pela afiliação
de negros: “AGORA, PORTANTO, SEJA RESOLVIDO que a Guilda dos
Atores de Cinema use de todos os seus poderes para se
opor à discriminação contra os negros no cinema”.78 Em
1947, Boris Karloff (A múmia [1932]), como membro do
comitê antidiscriminação da SAG, notou os desafios que a
guilda enfrentava e o acréscimo de mudanças que a
organização buscava:

Se insistirmos que os produtores escrevam


papéis para os negros de acordo com um certo
padrão, é bem possível que excluam
completamente os papéis para negros. Contudo,
o que pretendemos fazer é lutar pela inclusão de
negros em todas as cenas que tenham
multidões. Planejamos insistir para que em
todas as cenas pelo menos 10% dos
personagens sejam negros fazendo coisas
normais como as outras pessoas.79

A proliferação de comédias de terror enterrou e minou os


pedidos de mudança. Nessas ficções, os negros são, de
maneira alternada e/ou simultânea e “de forma natural”,
autenticamente dóceis e selvagens, cuidadores e
monstruosos. Tais tratamentos exigiam que se
questionasse a possibilidade de algum dia os negros
interpretarem o monstro cotidiano nos filmes de terror,
ou criaturas retratadas na mitologia, ou serem inseridos
em um terror psicológico. Poderia o terror criar um
monstro negro sem apontar a raça inteira como
monstruosa, ou talvez retratar um personagem negro
como uma figura corajosa ou salvadora? Os Gists e
Williams começaram a responder essas perguntas de
forma afirmativa com alguns recursos. Enquanto se
provou fácil exibir uma participação inteira e complexa
dos negros no gênero do terror, a indústria do cinema
continuou a falhar em agir ao longo dos anos seguintes
por uma série de razões sociais (e algumas financeiras).
Os filmes de terror deixaram a década de 1940 assim
como entraram: ameaçados. Chamar de “filmes B”
alguns dos filmes que seriam produzidos na década
seguinte seria terrivelmente generoso, já que cineastas
dos anos 1950 seriam considerados sortudos se
conseguissem contratar algum humano de verdade para
entrar em roupas de borracha e interpretar monstros.
Cada vez mais, o terror virou motivo de chacota à
medida que os monstros se tornavam criaturas infláveis
(O cérebro do planeta Arous [1957]), tocos de árvore
feitos de borracha e papel machê (Veio do inferno
[1957]) e marionetes tinhosas controladas por cordas (O
ataque vem do Polo [1957]). Isso deixou tudo ainda mais
fácil para a televisão, que começou a transmitir
nacionalmente em 1948, tornando-se uma rival para o
cinema. Embora a TV fosse mais rigidamente regulada
pela Comissão Federal de Comunicações (FCC), se um
telespectador quisesse ver algo assustador, a televisão
tinha, fosse transmitindo filmes de terror ou criando uma
programação de suspense (nem tanto terror, mas algo de
ficção científica) como Alfred Hitchcock Presents (1955-
1965). Se o negro engraçado era desejado, a televisão
também oferecia isso, com negros “menestréis da TV”80
aparecendo em programas como Beulah (1950-1953) e
Amos ’n’ Andy (1951-1953).
Já com relação aos filmes de terror, invisibilidade e
ridículo são os melhores termos para descrever o que
havia adiante para os negros pelas próximas duas
décadas (1950 e 1960). Nos anos 1950, a ficção
científica e o terror tenderiam a criar monstros
deformados por bombas atômicas. Diferente de Spencer
Williams, que imaginou uma mulher negra cientista,
Hollywood não conseguia fazer o mesmo. Já que
Hollywood não conseguia imaginar cientistas negros em
laboratórios onde bombas e produtos químicos eram
criados e experimentos davam errado, não era possível
ter negros lidando com esses temas. Os negros se
tornaram basicamente invisíveis nos filmes de terror da
década de 1950 — a menos que algum cientista
precisasse fazer um safári africano. Com essa exceção,
os negros só apareceriam novamente nos anos 1960 em
híbridos de show de menestréis (por exemplo, The Horror
of Party Beach [1964]). Seria apenas em 1968, quase 25
anos depois dos filmes de Williams, com Ben, o
protagonista negro de A noite dos mortos-vivos, que o
gênero alcançaria a visão de Williams.
HORROR
NOIRE

1950/60
INVISIBILIDADE NEGRA, CIÊNCIA
BRANCA E UMA NOITE COM BEN

Eu sou um homem invisível. Não, eu não


sou uma assombração como aquelas que
atormentaram Edgar Allan Poe; nem sou
um dos seus ectoplasmas de Hollywood.
Eu sou um homem de substância, de
carne e osso, fibra e líquidos — e pode-se
até dizer que tenho uma mente. Sou
invisível, compreenda, simplesmente
porque as pessoas se recusam a me ver.—
ELLISON, 19521
Parecia algo saído do espaço sideral, e
também parecia um pesadelo, não uma
parte de mim. — MAMIE TILL BRADLEY,
mãe de Emmett Till, garoto de quatorze
anos que foi assassinado por brancos
racistas2

Algo estava errado. Na pacata e afável cidadezinha de


Santa Mira, a paz idílica da década de 1950 estava sendo
perturbada por um grupo de “eles” perigosos que se
esforçavam para invadir o “nós” comunitário. A cidade
reage rapidamente, embora de forma controversa, contra
a ameaça. Quando ônibus interestaduais deixam
forasteiros em Santa Mira, os intrusos são recebidos de
maneira agourenta pelo xerife da cidade, colocados na
parte de trás de seu carro e levados embora para nunca
mais serem vistos. Controle e conformidade eram as
novas preocupações de Santa Mira; logo, seus habitantes
não tolerariam mais visitantes (baderneiros de fora) que
tivessem potencial para fazer perguntas e que poderiam
influenciar os outros com suas agendas diferentes. A
cada dia, os cidadãos apertavam as rédeas, eliminando
toda e qualquer divergência. Uma banda de jazz/swing
que chegou alguns meses atrás para tocar em um dos
restaurantes populares da cidade, logo sinalizando um
flerte entre Santa Mira e o progresso — “estamos no
caminho” —, foi, neste novo clima, expulsa. A banda foi
substituída por um jukebox pré-programado. No geral,
era uma representação lamentável dos Estados Unidos,
que reprimia a humanidade de seus cidadãos: ser
“mecânico” nesse contexto era ser um “zumbi
ambulante!”.3
A cidade fictícia de Santa Mira do filme de terror/ficção
científica Vampiros de almas (1956) funcionava como
uma metáfora para as muitas ameaças que os Estados
Unidos enfrentavam em 1950 — mudança, guerras
(atômica/fria), invasão estrangeira, comunismo e
integração racial. E evidenciou, como muitos filmes dos
anos 1950 e 1960, “uma forte ressonância entre os
elementos do filme com várias ansiedades existentes na
cultura mais ampla”.4 No filme, embora a noção de
segurança-na-igualdade tenha sido levada por imigrantes
(ilegais) do outro lado do mundo, isso não obscureceu o
fato de que os norte-americanos estavam felizes em
assegurar a insularidade e estabilidade pelos meios que
fossem necessários. Vampiros, um filme de terror sem
nenhum personagem negro, evidenciava como alguns
norte-americanos acreditavam que, embora a estrada
para o fascismo cultural pudesse ser desagradável —
como ficar de pé na frente de uma escola para repelir o
individualismo —, o fim justificava os meios.
Vampiros permanece até hoje como um clássico cult
não apenas para os fãs, mas continua a ser um dos
filmes mais celebrados nos Estados Unidos.5 O filme
narra a história de como vagens alienígenas aterrissaram
na Terra, trazendo com elas a habilidade de replicar
completamente os humanos e então matá-los para
produzir clones emocionalmente neutros, ou “pessoas
vagens”.6 Metaforicamente, Vampiros pode ser visto
como o termômetro para o tratamento dispensado a
qualquer coisa que se mostrasse uma ameaça à
conformidade branca nos filmes de terror das décadas de
1950 e 1960. Acertadamente, houve pouca variação de
representação no gênero do terror ao longo das décadas
de 1950 e 1960, já que os negros eram invisíveis para os
invasores de Santa Mira.

OS INVISÍVEIS
À medida que os anos 1950 emergiam, os personagens
negros se tornaram uma presença rara no terror. O que
no passado constituía na representação do trabalho
“negro”, como empregados ou trabalhadores rurais, se
tornou menos necessário numa era em que o cinema
estava mais preocupado com ameaças científicas e
extraterrestres. Nesses desafios, os brancos, e
notavelmente as personagens femininas, assumiam o
papel de ajudante. Por exemplo, num filme de 1957, O
ataque vem do Polo, um (hilário) pássaro monstro
gigantesco com uma tela de energia anti-matéria
ameaça o planeta (os Estados Unidos, em particular).
Embora a invenção mais mortal da ciência, a bomba
atômica, não seja capaz de exterminar esse alienígena,
os cientistas permanecem resolutos, esforçando-se para
encontrar uma solução. Nesse filme, há pouca
necessidade da presença de negros carregando bolsas ou
servindo refeições. O pássaro é um dilema para
intelectuais, e o espaço em que essas pessoas trabalham
são laboratórios ou centros de pesquisa. Nesse contexto
de trabalho, os negros não servem, teoricamente, para
nada.
No filme, a “srta. Caldwell” (Mara Corday), uma
mulher branca matemática e analista de sistemas,
exerce a função de ajudante. Embora prometa ser uma
pessoa estudada, ela é incapaz de mapear o padrão de
voo básico do pássaro (isto é, analisar o seu sistema). Em
vez disso, Caldwell se transforma naquela que recebe
ordens e tolera abusos sexuais de maneira afável — ela é
referida como “mãe, querida mãe” e recebe ordens de
um colega de trabalho, “me beija e fica quieta” —, o que
ela faz avidamente. Esse tipo de “repressão severa da
sexualidade/criatividade feminina”, escreve Wood, não
apenas atribui passividade, subordinação e dependência
à figura da mulher, mas “em uma cultura dominada por
homens […] a mulher como o Outro assume uma
significância particular”.7 Embora o trabalho primordial
de Caldwell seja parecer bonita e servir como algum tipo
de empregada, servindo bebidas aos homens, ela é
capaz de fazer notas e cuidar de painéis eletrônicos —
tarefas que presumidamente vão muito além da
capacidade dos negros.
Até mesmo na ausência geral de diversidade racial, o
uso do simbolismo racial era abundante ao longo da
década de 1950. O filme A noiva do gorila (1951) une a
diferença e a aberração de forma parecida. Aqui, o
personagem Barney (Raymond Burr) é o capataz de uma
plantação de seringueiras que cuida do gerenciamento
de uma residência construída no interior da selva
amazônica. Barney é um gerente cruel que possui
lembranças saudosas: “Oh, quando eles tinham
escravos!”. Os cineastas sabiam que filmes de selva do
tipo tinham implicações raciais, e essa produção não foi
uma exceção, trazendo frases como: “Pessoas brancas
não deveriam viver por muito tempo na selva”. De
acordo com Thomas Cripps em Making Movies Black, um
escritor do jornal AfroAmerican, de Maryland, Carl
Murphy, “foi chamado para ser um consultor em […] A
noiva do gorila [daí] estabelecendo um ponto de vista
negro em relação a coisas que iam além do uso da
palavra ‘crioulo’ nos diálogos”.8 Na verdade, insultos não
estão presentes no filme, tampouco participações
significativas de negros. No filme, Barney passa a cobiçar
a esposa do chefe, Dina (Barbara Payton), e mata o chefe
para poder possuí-la. O assassinato é testemunhado por
Al-Long (Gisela Werbisek), uma bruxa que amaldiçoa
Barney. O homem é atormentado por alucinações nas
quais ele acredita que está se transformando em um
gorila. O filme apresenta uma pequena ponta do famoso
ator negro Woody Strode no papel de Nedo, um policial
local. Sua presença é breve aqui, e Strode interpreta de
maneira direta. Ele é estoico e profissional. Suas ações
estão largamente centradas na procura rápida pelo
quarto de Al-Long para ver se ela tinha escondido
alguma evidência do assassinato do chefe. Seus
princípios funcionam para dar credibilidade ao poder
assustador do vodu. Alarmado pelo poder da bruxa, Nedo
a censura de forma veemente: “Eu não acredito em
magia negra […]. Mas fique longe da minha casa. Eu não
quero bruxas perto das minhas crianças”. Ele então sai
de cena (e do filme) rapidamente. A brevidade da
participação de Strode é triste, já que serve para lembrar
o que atores negros poderiam acrescentar ao gênero —
um medo real, sem precisar arregalar os olhos para
parecer assustado. Contudo, qualquer tipo de
representação, assustada ou normal, na metade do
século XX, ainda era uma raridade.
Outra produção pertencente a esse ciclo de filmes de
terror, A noiva e a besta (1958), traz gorilas/primitivismo
e civilização no centro de tudo. Contudo, mais uma vez,
os negros desaparecem das telas. A noiva e a besta não
tem nenhuma pessoa negra em seu elenco, mas ainda
assim obteve sucesso ao exibir o “continente escuro” e
tudo que vem dele como algo grotescamente assustador.
No filme, Dan (Lance Fuller), um grande caçador, se casa
com Laura (Charlotte Austin). A licença de casamento
deles custa 6 dólares, o que faz Dan exclamar de forma
inexplicável: “Eu poderia comprar seis esposas por esse
preço no meio da África!”. Dan apresenta Laura para
Spanky, um gorila africano que ele capturou e mantém
aprisionado no porão de sua casa no topo de uma
montanha nos Estados Unidos. Laura exibe uma estranha
atração sexual pela besta ao conhecer Spanky, olhando
de forma luxuriosa para o gorila e, mais tarde, sonhando
com o animal. Em uma cena chocante, Spanky visita
Laura no quarto, onde a besta e a mulher se abraçam, e
o animal despe Laura em seguida. Dan mata Spanky
imediatamente. A estranha atração de Laura pelo animal
é explicada sob hipnose: em uma vida passada Laura foi
um gorila, a rainha dos gorilas, para ser mais exata.
Laura e Dan, juntamente com o “criado” Taro9
(interpretado pelo ator branco Johnny Roth com o rosto
pintado de marrom), cujo vocabulário é limitado a se
dirigir a Dan como “Bwana”, vão até a África para que
Dan volte a caçar. Aqui, os monstros (gorilas negros) e o
lugar (África) são abertamente racializados. Enquanto
está na África, a atração de Laura por todas as coisas
africanas — um tipo de febre da selva — se torna ainda
mais profunda, e Dan tentar curar a obsessão dela. O
filme termina com uma Laura entusiasmada sendo
levada para os confins da selva nos braços de um gorila
negro. Contudo, a cena provoca inquietação, mostrando
Dan como a verdadeira vítima, que perde o seu amor
para um tipo de miscigenação grotesca, uma mistura de
espécies que provoca um medo parecido com aquele da
mistura de raças. Em resumo, animais e negros são a
mesma coisa.

PRETO SAI, PRETO FICA


O filme de terror “com negros” de 1957 chamado
Monster from Green Hell evidenciou como os negros
poderiam ser empregados de maneira efetiva no gênero
do terror. Trata-se de uma produção B de terror/ficção
científica — baixo orçamento, efeitos especiais cômicos.
O filme começa com o questionamento: o que
aconteceria com a vida “no vácuo sem ar acima da
atmosfera da Terra” em uma “aglomerado de radiação
cósmica?”. Para descobrir a resposta, o programa
espacial dos Estados Unidos envia um macaco, vespas,
um caranguejo, aranhas e um porquinho-da-índia para o
espaço em dois foguetes não identificados. O desastre
acontece quando um dos foguetes é perdido “perto da
costa africana”. Dan (Robert Griffin) e Quent (Jim Davis),
dois cientistas norte-americanos brancos que trabalham
no projeto espacial, logo recebem relatos de vespas
monstruosas e misteriosas que estão causando
destruição na África Central e decidem fazer algo. Lá os
homens conhecem o médico branco dr. Lorentz (Vladimir
Sokoloff) e sua filha Lorna (Barbara Turner), que tratam
os nativos africanos com medicina “real” e cuja missão
secundária é ajudá-los a se livrar de suas crendices, o
que inclui medicina tradicional e orações para deuses
não judaico-cristãos. O filme toma um rumo previsível
com a inclusão de um safári pela selva com nativos
mudos, descamisados e de tangas que andam em fila
indiana e carregam bagagens na cabeça.
Contudo, entre os nativos há um homem chamado
Arobi. Arobi é interpretado por Joel Fluellen, um ator
negro que advogou incansavelmente por papéis
complexos e dignos de nota para os negros em
Hollywood. A influência de Fluellen é evidente, com o
personagem Arobi quase roubando o filme para si (se
assumirmos que alguém estaria prestando atenção em
tal personagem). Arobi é um personagem orgulhoso e
articulado que está bem longe do “Mumbo Jumbo”
interpretado por Fluellen, um servo no filme de terror
“com negros” Pongo, o gorila branco (1945). Arobi está
sempre bem-vestido com roupas ocidentais de safári —
calças cáqui, um chapéu característico, camisa passada,
meias até os joelhos e um cinto de utilidades com
munição e um rifle. Embora Arobi receba frequentes
instruções dos cientistas para trabalhar ou “fazer” coisas
— como a importante atividade de montar explosivos —,
ele também é questionado com frequência acerca de
suas ideias em relação ao plano que estão tramando.
Enquanto os guias nativos são subservientes aos
cientistas brancos, Arobi se torna um membro importante
da equipe, contribuindo com conselhos em tom
profissional. Ele não dorme com os nativos, mas ao redor
do campo com os brancos — perto, mas não junto (afinal,
há uma mulher branca na equipe).
O filme termina com o grupo assistindo ao fim dos
monstros e um diálogo final. Os três integrantes brancos
falam primeiro. Os dois homens e, então, a mulher, falam
brevemente. No fim, é Arobi quem solta o tocante trecho
final: “A morte das criaturas trará a libertação do meu
povo. Os deuses foram bons. Eles nos ensinaram, como o
dr. Lorentz nos ensinou, a ter fé.” A fala evidencia uma
dependência continuada em relação à sabedoria branca.
Contudo, também funciona para restaurar algum valor
cultural à negritude. Muito do filme tem a ver como
desdém pelos modos dos nativos, mas Arobi enfatiza
uma noção da existência de deuses (plural). Porque, na
verdade, não é a ciência que mata os mutantes. Quem
faz isso é a África, por meio de um de seus vulcões, que
os destrói, trazendo equilíbrio para a natureza.
Monster from Green Hell não é uma obra perfeita, e os
problemas são significativos. Com a exceção de Arobi,
ainda é um filme que invisibiliza os negros. Por exemplo,
uma das mortes mais ligeiras e corriqueiras ocorre
apenas dois minutos e 51 segundos após os créditos
iniciais. Aqui, um homem negro chamado Makonga (sem
créditos), de uma das vilas africanas, é encontrado
morto. Sua morte não é vista, e é simplesmente dito que
o homem encontrou o seu fim pelas mãos de um monstro
da selva — “o inferno verde” — que injetou uma
quantidade enorme de veneno nele. A cena serve para
estabelecer o que falta na negritude e aquilo que é
superior na branquitude. O corpo de Makonga é levado
até o dr. Lorentz. O dr. Lorentz representa a
modernidade, a sofisticação do iluminismo científico e
religioso dos brancos. Makonga é submetido a uma
autópsia sob a sombra de uma grande cruz pendurada
acima de seu corpo no hospital improvisado. A morte de
Makonga também simboliza o que há de errado na África
— seu “caos”, como menciona o filme. Seis meses depois
da morte de Makonga, os monstros se multiplicaram,
mas não há o menor sinal de qualquer forma de governo
africano, tampouco militares, centros médicos, indústrias
ou cidades modernas — há apenas a selva. A África é
retratada como rebelde, uma terra primitiva cheia de
superstições, sem modernização ou civilidade. Logo, são
os norte-americanos, cujos próprios experimentos
colocaram o continente em perigo, que saem voando
(literalmente, pois o filme faz uma propaganda das linhas
aéreas TWA) para tornarem-se os salvadores. Dan e Quent
chegam na África, de uma maneira que Sontag chamaria
de “fortemente moralista”, para fazer com que todos
saibam que eles dominam o uso próprio e humano da
ciência, e que eles, os homens brancos, não são
cientistas loucos.10 Em relação aos personagens negros,
com exceção de Arobi, há apenas “nativos” trabalhando
como uma junta de animais e sendo retratados como
vítimas desafortunadas dos monstros em fúria. Esses
papéis — carregadores e vítimas — não são mutuamente
exclusivos.

“EU REALMENTE AMO MULHERES


BRANCAS”11
Os cineastas continuaram a forçar a tendência de
oferecer aquilo que Gonder chama de “monstros
grosseiros racialmente codificados”, mas alguns também
acrescentaram mensagens antimiscigenação de maneira
aberta ou velada, só por via das dúvidas.12 O monstro da
lagoa negra (1954) é para os anos 1950 aquilo que King
Kong foi para a década de 1930, um filme
metaforicamente racializado e contra a mistura de raças.
O filme apresenta uma equipe de cientistas/arqueólogos
brancos viajando pela Amazônia em busca de uma
criatura negra que é ao mesmo tempo marinha e
terrestre — o Homem Guelra (Ricou Browning/Ben
Chapman). Assim como em O ataque vem do Polo, a
equipe conta com uma pesquisadora branca cujo papel
principal é ser um colírio aos olhos e gritar assustada
quando o Homem Guelra é avistado. Obviamente, ela
também é o objeto de desejo do monstro, que ataca
repetidamente a equipe para capturá-la. Os
pesquisadores são guiados na expedição por um grupo
de brasileiros que, assim como os africanos em Monster
from Green Hell, encontram fins terríveis e caóticos logo
no início do filme. As mortes desses homens — nativos —
são desimportantes, já que apenas a morte de um
cientista seria “um desperdício de experiência e
habilidade”.13 Contudo, o monstro evoca uma
racialização problemática.
Nesse filme a criatura é violenta e obstinada em seu
desejo por uma mulher branca. O Homem Guelra é Kong
e Gus de O nascimento de uma nação unidos em um só
corpo. Em relação ao seu corpo, o monstro parece uma
caricatura racista — os lábios são grandes e exagerados,
sua pele é pigmentada. É aparentemente vazio
mentalmente. Seus movimentos são trôpegos, exceto
quando faz um manobra rápida para roubar a mulher
branca. O monstro serve como uma imagem inversa da
evolução branca, que é mostrada como moderna,
intelectual e civilizada. Isto é, o filme nos diz que os
brancos — homens brancos no topo da hierarquia —
evoluíram, enquanto, note, outras raças permanecem
estáticas e imóveis em seu progresso. Logo, o filme fala
sobre onde, ou em quais lugares (a Amazônia exótica e
perigosa), e em quais populações (os brasileiros negros
ou não brancos) é possível encontrar a inferioridade.
Quando o monstro encara o seu esperado fim em seu
próprio território, pelas mãos da elite científica branca,
não apenas sua subordinação é assegurada, mas
também fica evidente que um Outro não tem lugar nem
pode contribuir para o mundo branco, e que sua mera
presença, ainda que em seu mundo não branco, é um
incômodo — algum tipo de fardo do homem branco.
Patrick Gonder, em seus ensaios “Like a Monstrous
Jigsaw Puzzle: Genetics and Race in Horror Films of the
1950s” e “Race, Gender, and Terror: The Primitive in
1950s Horror Films”, apresenta uma leitura detalhada e
profunda de O monstro da lagoa negra, argumentando
que a função do filme não é só reforçar a superioridade
branca e a inferioridade dos não brancos, ou sua
monstruosidade. Além disso, o filme também “toca nos
medos racistas de dessegregação”,14 como o monstro
negro, saindo do seu lugar na água e tentando se
integrar com aqueles que estão em terra, que é um
lembrete darwinista do motivo pelo qual a segregação é
necessária.15
É importante lembrar que O monstro não é apenas
uma história sobre uma ação sísmica na escala Richter
evolucionária. Mas, sim, uma história em que
pesquisadores brancos são levados a destruir o Homem
Guelra, em vez de estudar a criatura, pois ele cometeu o
maior pecado de todos: ter colocado seus olhos sobre
uma mulher branca.
A vida real e a arte foram amalgamadas em relação a
uma ameaça sexual à feminilidade branca. Em agosto de
1955, um garoto de quatorze anos de Chicago, Emmett
Till, foi assassinado por ter assobiado para uma mulher
branca enquanto estava de férias no Mississippi. A
brutalidade do assassinato do garoto foi terrível, pois ele
sofreu espancamentos e traumas graves, teve seus olhos
arrancados e levou um tiro na cabeça. Seu corpo
mutilado foi amarrado a uma peça de maquinário
agrícola de 45 quilos e jogado em um rio. A mãe de
Emmett, Mamie Till Bradley, exigiu que o mundo voltasse
sua atenção para essa atrocidade, bem como aos demais
horrores que os negros enfrentavam nos Estados Unidos,
quando abriu o caixão do filho e insistiu para que a
imprensa negra tirasse fotos e as publicasse em seus
periódicos.
Goldsby (250) escreveu sobre o impacto imagístico da
decisão de Till Bradley: “Em uma decisão surpreendente
que reformulou o escopo e a direção do caso, ela
autorizou um velório de quatro dias aberto a todos e
permitiu que a imprensa negra fotografasse o cadáver do
filho. As imagens do corpo mutilado de Till apareceram
em jornais e revistas de alcance nacional como Jet,
Chicago Defender, Pittsburgh Courier, New York
Amsterdam News e na Crisis”.16 As fotos do corpo
terrivelmente abusado e inchado de uma criança
representaram o ápice das imagens de horror. Em uma
rápida sucessão, vieram à tona casos históricos e de
grande notoriedade que reclamavam direitos e justiça
para os negros. Brown vs. Conselho de Educação de
Topeka, Kansas (1954), e o caso dos nove alunos afro-
estadunidenses que frequentaram a Central High School
em Little Rock, Arkansas (1957), foram desafios diretos
ao caso Plessy vs. Ferguson (1896), que assegurou a
segregação nas escolas. Até mesmo aqui, a segurança
das mulheres brancas era invocada — estariam as jovens
brancas a salvo de homens negros em suas salas
integradas? Till e o Homem Guelra sofreram destinos
similares, pois seus corpos foram destroçados de várias
maneiras e mortalmente feridos antes de serem jogados
em um túmulo cheio d’água. “Homens brancos não
apenas lincharam e torturaram afro-estadunidenses na
vida real”, escreve Butters, “mas viveram essa fantasia
por meio dos ataques cinematográficos violentos contra
homens negros”, fossem eles figuras reais, ficcionais ou
metafóricas.17

MUITO CHÃO PELA FRENTE


Não houve uma mudança muito discernível entre os
filmes de terror dos anos 1950 e as produções da década
de 1960. Os anos 1960 começaram da mesma forma que
a década anterior havia começado, com
cientistas/homens brancos procurando maneiras de
intervir na progressão da natureza enquanto os negros
sofriam com medidas de invisibilidade. A distância entre
brancos e negros foi mais bem ilustrada no filme de
terror The Alligator People (1959). Situado em uma
Louisiana “primitiva, selvagem”, numa casa em uma
plantação que até uma “bruxa conjuradora sabe que é
ruim”, o filme conta a história de um cientista branco
cujos experimentos científicos transformam humanos em
crocodilos e que agora trabalha para reverter os efeitos
por meio da radioatividade. Esse filme conta com a
participação de dois negros, Toby, o mordomo (Vince
Townsend Jr.) e Lou Ann, a empregada (Ruby Goodwin).
Os estranhos experimentos científicos são feitos em um
laboratório que fica separado da casa. Toby e Lou Ann
ficam limitados à casa, onde limpam, cozinham e cuidam
de outros afazeres domésticos; apenas os brancos e
homens-lagartos brancos saem da casa e entram no
laboratório. Durante sua breve participação, Toby e Lou
Ann se engajam com a branquitude, esforçando-se para
controlar um trabalhador rude, Mannon (Lon Chaney Jr.),
um bêbado violento e sujo cujo comportamento errático
(tentativa de estupro) ameaça a pesquisa. Contudo, o
encontro entre eles é limitado ao momento em que
Mannon vai até a casa ou o jardim, já que esse é o limiar
para a dupla. Mannon, ao contrário, anda por toda a
parte, indo inclusive até a entrada do laboratório, um
lugar que está fora de cogitação para os empregados
negros.
The Horror of Party Beach (1964), um “musical de
terror” muito sério, é parecido com The Alligator People
em seu tratamento dispensado aos negros. Os negros
não figuram na narrativa, com a exceção de uma
empregada mal-humorada, esforçada mas não muito
inteligente, chamada Eulabelle (Eulabelle Moore), que
nunca é vista fora da casa do empregador, um
médico/pesquisador cientista. Quando monstros saídos
do lixo tóxico começam a matar jovens veranistas
brancos, é Eulabelle quem entra em cena para afirmar
não menos que três vezes ao médico designado para
resolver o problema que deve haver algum tipo de vodu
no meio daquilo tudo: “É o vodu, é isso que é!”. Não é.
Ainda assim, a supersticiosa Eulabelle serve para apontar
a religião negra como algo ruim, chegando ao ponto de
andar com uma boneca vodu para amaldiçoar o monstro,
ou, como ela diz: “aqueles malditos zumbis”. O
verdadeiro culpado é o lixo tóxico radioativo despejado
na água e que reanima os mortos, cujos corpos estavam
em naufrágios, trazendo-os de volta à vida como figuras
meio-humanas/meio-monstros-marinhos. A implicação é
que, ainda que o perigo seja branco e criado pelo
homem, o vodu negro é a medida para todas as
monstruosidades.
Contudo, a segunda contribuição de Eulabelle é bem
mais interessante. Antenada em todas as questões
domésticas, é Eulabelle quem descobre que o sódio
caseiro pode matar os monstros marinhos radioativos.
Porém, o modo como Eulabelle descobre a solução
reafirma a noção de que os negros não possuem lugar
em um laboratório. No filme, Eulabelle tem medo de ficar
sozinha no escuro e ousa descer no laboratório do
doutor, onde ele trabalha em uma arma química para
matar os monstros. Apesar de ter a habilidade de
carregar travessas, limpar e cuidar da parte de cima da
casa, no laboratório Eulabelle é um desastre. Ela derruba
produtos químicos e quebra tubos de ensaio, e então
pede desculpas aos gritos. Por acaso, o acidente dela
conduz à solução — sódio. Mas Eulabelle não possui a
capacidade intelectual para dizer “sódio”, então ela se
refere ao produto como “nem sei o nome disso”. The
Horror of Party Beach se mostrou problemático de duas
maneiras diferentes. Primeiro, o filme realmente serviu
para reforçar a crença de que apenas os brancos,
qualificados ou não (fossem as esposas ou outras
mulheres apaixonadas), deveriam estar nos laboratórios.
Em segundo lugar, para o ano de 1964, quando os
movimentos dos Direitos Civis e do Nacionalismo Negro
se complementavam, parecia regressivo ver uma
personagem estilo mãezona negra ressuscitada.
De maneira significativa, Vaidade que mata (1960)
apresenta uma personagem principal negra como adepta
e central aos experimentos de um cientista branco. Paul
Talbot (Phillip Terry) espera criar uma fonte da juventude
farmacêutica, uma droga capaz de cessar e até reverter
o processo de envelhecimento. É aí que entra uma
mulher negra de 152 anos de idade chamada Malla
(Estelle Hemsley), uma ex-escravizada que carrega,
como ela explica, “a marca do mercador de escravos
árabe que roubou a mim e a minha mãe da África e nos
vendeu do outro lado do mar há 140 anos”. A origem
africana de Malla a torna misteriosamente mágica, já
que, ao encontrar a esposa de Paul, ela (corretamente)
declara: “Você não vai precisar se divorciar do seu
marido. Não será necessário. Ele vai morrer. A morte dele
vai te dar vida […]. Você aparece nos meus sonhos
sangrentos.” Por acaso ela também tem Nipea, uma
mistura orgânica capaz de retardar o envelhecimento.
Uma negociadora dura e esperta, Malla insiste para que
Paul pague por seu retorno à África, e somente então ela
fornecerá a segunda substância que, misturada com a
Nipea, reverte o envelhecimento, restaurando a
juventude. A droga só pode ser encontrada na África,
entre o povo Nando, uma “raça selvagem e orgulhosa
[…] que tem um ódio imortal pelos europeus”. Paul paga
pela passagem de Malla, mas ele e sua esposa June
(Coleen Gray), que caminha já para os seus setenta anos,
aproximadamente dez anos mais velha que Paul, seguem
Malla em segredo até a África para assegurarem o
segundo ingrediente da droga — a fonte da juventude.
Eles descobrem que a tribo de Malla realiza um ritual no
qual homens são mortos e têm a glândula pineal
extraída, e então essa secreção é misturada ao pó de
Nipea e ingerida para reverter o processo de
envelhecimento. Dando continuidade ao ritual, Malla se
torna a bela “ jovem Malla”, interpretada pela popular
atriz Kim Hamilton. O filme então muda o seu foco de
atenção para June tentando fugir da África (com a Nipea
roubada), deixando todos os personagens negros para
trás, rumo aos Estados Unidos. June, nos Estados Unidos
— velha e considerada pouco atraente —, mata os
brancos ao redor dela a fim de extrair suas glândulas
para que ela mesma possa fazer a droga da fonte da
juventude. A mudança para os Estados Unidos é
necessária, pois June não pode capturar homens
africanos e injetar os fluídos deles em seu corpo. O filme,
cuidadosamente, evita qualquer mistura de sangue e
implicações de miscigenação.
Para dar os devidos créditos, Vaidade que mata foi um
dos poucos filmes de terror “com negros” de sua época a
elencar uma mulher negra em um papel principal. Mais
do que isso, a personagem é uma feminista, afirmando
os direitos das mulheres ao mesmo tempo que protesta
contra o etarismo, notando que os cabelos grisalhos dos
homens são injustamente respeitados como símbolo de
intelecto e maturidade, enquanto mulheres envelhecidas
são alvo de zombaria e negligência. Malla foi uma das
personagens negras mais substanciais durante essa
época do cinema de terror e foi considerada uma
melhora em relação ao tipo de representação que os
negros experimentavam em filmes como The Alligator
People. Ainda assim, a inclusão dos negros nos filmes de
terror do período continuava desigual e confusa.

AQUI VAMOS NÓS OUTRA VEZ: VODU E


NEGROS ENGRAÇADOS
Filmes de terror adotaram novamente a África e o Caribe
como locações, lugares livres das tensões raciais
testemunhadas nos Estados Unidos durante o movimento
dos Direitos Civis, e portanto lugares em que era possível
ter uma presença de personagens negros sem que o foco
recaísse em questões de igualdade racial. A estratégia
era voltar aos temas vistos nos filmes de terror da
década de 1930. Como resultado, zumbis, vodu e a selva
tiveram uma segunda chance em filmes como Serpent
Island (1954), A ilha do terror (1957), Voodoo Woman
(1957) e O fantasma de Mora Tau (1957). Mas poucos (ou
nenhum) negros apareceriam em tais filmes. Em vez
disso, durante a maior parte da década de 1950 e em
boa parte dos anos 1960, como evidenciado pelo filme
Voodoo Bloodbath (1964), “quase todos os filmes de
terror com algum componente racial discernível
mantinham a presença dos negros restringida a
narrativas com ilhas exóticas, brancos se casando em
segredo e nativos (‘selvagens’) desinibidos praticando
vodu e experimentando zumbificação”.18 Por exemplo, o
filme de terror O fantasma de Mora Tau (1957) não tinha
nenhum personagem negro, mas esse fato não impediu
que a África fosse implicada, aquela terra “esquecida
pelo tempo”, no vodu maligno. Nesse filme com teor
político, que critica o colonialismo ocidental, é revelado
que, em 1894, um grupo de norte-americanos navegou
até a África para saquear diamantes. Os marinheiros
localizaram os espólios com sucesso e embarcaram os
diamantes em seu navio enquanto nativos africanos
praticantes de vodu (que não são mostrados)
amaldiçoam os homens, transformando-os em zumbis e
naufragando o navio. Como zumbis, os marinheiros são
condenados a proteger os diamantes para sempre. Ao
longo das décadas, outros caçadores de tesouros tentam
encontrar os diamantes, mas são mortos pelos zumbis.
Diferente da representação dominante de zumbis, esses
mortos-vivos norte-americanos brancos não têm um
“mestre”; isto é, esses zumbis brancos não são
controlados por africanos. Em vez disso, são monstros
bem autônomos que estão simplesmente aprisionados
em seus corpos mortos. Marinheiros estadunidenses
tentam novamente recuperar os diamantes. Uma mulher
velha branca (a esposa do capitão norte-americano que
foi transformado em zumbi) revela que os zumbis só
poderão finalmente descansar em paz quando os
diamantes estiverem perdidos para sempre no mar. No
fim, os diamantes são jogados ao mar, libertando os
brancos mortos-vivos da praga zumbi.
Com o retorno do terror para a África, o gênero
continuaria a culpar a negritude de formas diferentes. O
filme Bwana, o demônio, de 1953, tinha o potencial de
examinar o domínio colonial britânico sobre o Quênia e o
caminho de resistência do povo Kikuyu, que enfrentou
fome (devido ao racionamento britânico de comida),
excesso de trabalho em condições deploráveis,
humilhação, brutalidade e execuções nas mãos de seus
colonizadores. O protesto, por fim, culminou no
movimento Mau Mau de 1952, um levante contra o
domínio estrangeiro. Em vez disso, o filme mostra o
Quênia como uma terra inerentemente selvagem,
implicando até mesmo com a vida selvagem do país,
especialmente com os leões, em uma história de
vitimização racista em que os brancos são os
prejudicados. No filme, os leões quenianos decidiram que
os britânicos seriam a melhor escolha para o lanchinho
de um predador felino.
O público recebeu um filme de terror que referencia as
narrativas da década de 1940, em que os negros ficavam
assustados e sofriam abusos com o fim de causar um
efeito cômico. O filme Spider Baby or, The Maddest Story
Ever Told (1968) conta a história da família Merrye, que é
afligida pela Síndrome de Merrye. A doença herdada é
resultado de incesto e causa retardo mental. Um membro
da família, Virginia (Jill Banner), é obcecada por aranhas,
acreditando ser uma e usando cordas como teias e facas
de açougueiro como ferrões. Mantan Moreland, escalado
simplesmente como um “entregador”, abre o filme e
morre nos primeiros cinco minutos. O entregador sobe na
varanda da mansão isolada e decrépita da família Merrye
e espia pela janela, chamando por algum dos moradores.
A janela se fecha com força, prendendo-o de maneira
que sua cabeça e seu corpo ficam pendurados no interior
da casa enquanto suas pernas balançam do lado de fora,
na varanda. Virginia aparece com uma faca de
açougueiro em cada mão. Ela joga a sua “teia” no
entregador, enrolando-o. Alegremente, Virginia grita
“Ferroe, ferroe, ferroe!” enquanto retalha o entregador
com suas facas. O ataque tem tons de comédia. Uma
tomada da varanda mostra as pernas do entregador
sacudindo de maneira burlesca. Uma filmagem do
interior da casa mostra o torso superior do entregador
esmagado pela janela e Virginia segurando a orelha dele
como um souvenir. É uma cena típica do terror, exceto
pelo fato de que Moreland ressuscita sua risada e seus
olhos arregalados. Moreland, nessa ponta, é incluído
apenas com o objetivo de relembrar a figura do negro
engraçado sofrendo violências em filmes de terror.
Mantan Moreland talvez possa ser considerado uma
das pontes mais evidentes entre os filmes de zumbi dos
anos 1940, como O rei dos zumbis (1941) e A vingança
dos zumbis (1943), e a representação dos negros nos
filmes de terror. Moreland foi central na criação de filmes
sobre zumbis (e outros monstros) negros. Sua aparição
em Spider Baby marcou o fim de uma longa e árida
estação de filmes de terror livres de racialidades. Além
disso, as performances de Moreland lembraram ao
público de filmes de terror que negros e zumbis, para o
bem e para o mal, formavam uma dupla interessante, e
todos sentiam falta deles. Então não foi nenhuma
surpresa que o retorno dos negros ao gênero tenha
acontecido em um filme de zumbis (longe de ser
engraçado), A noite dos mortos-vivos (1968). A obra, que
merece ser discutido em detalhes, representaria uma das
mudanças mais dramáticas e provocativas em relação à
participação dos negros em filmes de terror.

UMA NOITE COM BEN


Foi na noite de 4 de abril de 1968. Algumas horas antes,
o diretor de cinema George R. Romero escutou, junto
com o resto do mundo, que o ativista dos Direitos Civis e
ganhador do Prêmio Nobel, dr. Martin Luther King Jr.,
havia sido assassinado em Memphis, Tennessee. Romero
já estava ansioso enquanto dirigia de Pittsburgh para
Nova York carregando no porta-malas A noite dos mortos-
vivos, o seu19 filme de terror de baixo orçamento e
produzido de maneira independente. Será que ele
conseguiria uma distribuidora para o seu filme, uma obra
que forçava o gênero do terror a novos limites com sua
violência gráfica e sanguinolenta e sua narrativa
sombria? A noite dos mortos-vivos, um filme de terror
“com negros”, traz um personagem negro como
protagonista, Ben (Duane Jones), que sobrevive de forma
heroica e única a uma noite longa e implacável de
ataques de monstros canibais apenas para ser morto em
plena luz do dia por um grupo de vigilantes brancos que
espetam seu corpo com ganchos para içá-lo acima de
uma fogueira. Certamente, no contexto do assassinato
de King, esse filme poderia ser considerado inflamatório
demais para conseguir financiamento. Contudo, pouco
depois de chegar em Nova York, Romero conseguiu o
financiamento para o filme com a Walter Reade
Organization/Continental, e (de maneira apropriada) no
halloween de 1968, A noite dos mortos-vivos estreou nos
cinemas, entrando para a história por conta da reforma
dramática que propôs ao gênero do terror. A noite dos
mortos-vivos é um filme de zumbis diferente de tudo que
veio antes e vem sendo copiado múltiplas vezes desde
então. O filme tem sido creditado pela revolução e
solidificação dos zumbis no subgênero do terror.
A noite dos mortos-vivos começa no cemitério de uma
cidade pequena próxima a Pittsburgh. Os irmãos Barbara
(Judith O’Dea) e Johnny (Russell Streiner) estão visitando
uma sepultura nesse cemitério. Um homem de terno se
aproxima lentamente da dupla, e ele parece normal de
longe. Contudo, à medida que o homem se aproxima,
fica claro que há algo de errado com ele — seu andar não
é lento, mas cambaleante; seu rosto duro não é solene,
mas guarda o olhar vazio de um morto-vivo. O homem
ataca Barbara, e Johnny corre para resgatá-la apenas
para ser morto quando o homem o empurra e ele cai,
batendo a cabeça em uma lápide durante a briga insana.
Barbara foge em pânico e assustada, incapaz de ajudar o
irmão, enquanto o “fantasma” ou zumbi a persegue.
Desfazendo-se mentalmente por causa do encontro
inexplicável, Barbara acaba em uma casa de fazenda,
onde encontra refúgio. Pouco depois ela se junta a Ben (a
única pessoa negra do filme), que também está tentando
sobreviver ao ataque dos zumbis.
Enquanto Barbara fica catatônica, Ben assume o
controle de modo confiante. Ele se ocupa reforçando a
segurança da casa com tábuas para bloquear a
passagem dos zumbis que tentam entrar. Ben encontra
uma espingarda na casa e repele a horda de zumbis com
tiros em seus cérebros, golpes em suas cabeças e fogo.
São as últimas defesas de Ben, e ele está vencendo de
maneira heroica e efetiva. Contudo, sem que Ben e
Barbara saibam, um grupo de sobreviventes se trancou
no porão da casa e se encontra em silêncio, escondendo-
se daquilo que acreditam ser zumbis andando no andar
acima. Depois o grupo emerge. Vemos Tom (Keith Wayne)
e Judy (Judith Ridley), um jovem casal. E também a
família Cooper: Harry (Karl Hardman), Helen (Marilyn
Eastman) e a jovem Karen (Kyra Schon), sua filha, que foi
mordida por um zumbi e, adoentada, permanece no
porão. Quase imediatamente uma briga se inicia entre
Ben, uma pessoa altamente competente e ativa, e Harry,
um homem irritado e reclamão que exige autoridade e
respeito. Harry propõe que o grupo se tranque no porão
até que a ajuda chegue. Sua sugestão é recebida com a
oposição de todos. Tom fica do lado Ben e implora para
que Harry reconsidere a ideia de isolamento no porão —
o que Ben chama de uma “armadilha mortal” sem saída.
Helen se pergunta por que Harry tem que estar sempre
“certo e os outros errados”. Para Helen, que melhor
conhece Harry, a questão não é tanto a solidez de
qualquer um dos planos, mas o fato de seu marido
desejar ser o chefe. Ben Harvey, em seu livro Night of the
Living Dead (2008) argumenta que: “Ben também não é
nenhum santo; embora ele seja mais heroico, honrado e
carismático do que Harry, ele também pode ser pouco
razoável, às vezes”.20 Por exemplo, quando Harry
continua a se esconder no porão, deixando todos que
ficaram contra ele entregues à morte, Ben se recusa a
deixar que Harry leve comida para a filha.
Uma reportagem na televisão mostra que os mortos-
vivos estão em todos os lugares, e em uma das várias
notícias os cientistas especulam se o surgimento dos
mortos pode ter alguma coisa a ver com uma sonda
enviada da Terra até Vênus, que voltou repleta de
radiação. Diferente de muitos filmes de terror anteriores
e subsequentes, A noite dos mortos-vivos não acusa a
negritude do mal que está acontecendo. Os zumbis não
são negros e não surgem de lugares negros como a
África, o Caribe ou algum pântano da Louisiana, nem se
levantam como resultado de algum ritual vodu. Em vez
disso, Noite usou de um hábito comum na década de
1950, que era culpar cientistas (brancos) e invasões
alienígenas. Chegam notícias de que abrigos estão sendo
erguidos para os sobreviventes. Com os zumbis ainda
cercando e atacando a casa, Ben cria um plano para que
o grupo fuja em uma caminhonete que está próxima,
mas sem combustível. Tom, Ben e Harry — os homens —
trabalham em equipe para levar a caminhonete até um
posto de gasolina nas proximidades. No último minuto,
Judy corre para ficar ao lado de Tom enquanto ele luta
para se aproximar da caminhonete a fim de abastecê-la.
O plano dá errado, e a caminhonete ensopada de
gasolina explode com Tom e Judy dentro dela. A morte
deles é uma surpresa chocante — certamente o jovem
casal representaria a imagem do futuro norte-americano
depois que sobrevivessem. Não. Os zumbis jantam os
corpos chamuscados de Tom e Judy.21
Ao ver a cena, Harry se encolhe dentro da casa,
deixando Ben do lado de fora lutando contra os zumbis.
Aqui, o filme, de maneira esperta, coloca Ben, o herói,
entre dois tipos diferentes de monstros, ambos munidos
de uma humanidade decadente. Essa é também uma
reviravolta única no filme, pois a representação da
monstruosidade geralmente funcionava para realçar os
traços iluminados e favoráveis dos personagens
brancos.22 Aqui, o filme nos faz lembrar que humanos e
monstros não são assim tão diferentes e, na verdade,
podem ser a mesma coisa. Mas a tensão da cena é
aumentada pelo componente racial.
Enquanto Ben implora para que Harry abra a porta,
Harry fica parado; ele está petrificado pelos zumbis e
irritado com Ben. Harry alternadamente olha para fora e
se esconde de Ben. Logo, Ben encontra uma maneira de
entrar na casa. Assim que entra, ele e Harry se unem
momentaneamente enquanto tentam consertar a
abertura na casa que Ben foi forçado a fazer. Ainda
assim, Ben está possesso, gritando: “Eu deveria ter
arrastado você pra fora e deixado que aquelas coisas te
devorassem”. E fica subentendido que Ben, mais alto,
mais jovem e em melhor forma poderia dar um jeito no
velho e atarracado Harry. Mas Ben não faz isso. Quando
os reparos são terminados, Ben apenas xinga Harry por
ter tentado abandoná-lo à morte. As ansiedades raciais
são realçadas quando Ben faz algo que nunca havia sido
feito por um personagem negro em um filme de terror
(pelo menos não sem uma reprimenda severa contra o
personagem): Ben derruba Harry com uma pancada, o
levanta e bate nele de novo, deixando Harry
ensanguentado e com hematomas. Na verdade, até
aquele momento, em 1968, era raro que qualquer tipo de
filme mostrasse um homem negro batendo em um
branco. Ben, que não está mais em perigo imediato, bate
em Harry porque está frustrado e com raiva. Não se trata
de uma representação exagerada, mas a questão racial
dos homens aumenta o drama.
Mais tarde, depois que Ben se oferece para carregar
Karen (a filha de Harry) até um lugar seguro, Harry está
ainda mais interessado na espingarda de Ben e no poder
que a arma promete. Helen diz a Harry para deixar Ben e
a arma em paz: “Já não foi o bastante?”. Harry não
consegue deixar isso de lado, pegando a espingarda e
apontando para Ben. Mas Ben consegue lutar, então a
arma dispara e fere Harry mortalmente. Harry vai até o
porão e descobre que sua filha morreu. Os zumbis
começam a encher a casa, e Johnny, o irmão morto-vivo
de Barbara, acompanhado da horda zumbi, quebra a
janela e as portas, capturando a jovem para ser
consumida. Harry morre no porão. Karen revive e começa
a se alimentar do cadáver do pai. Ela então encontra a
mãe encolhida no porão, ainda viva. Com uma pá, Karen
golpeia brutalmente a mãe repetidas vezes para que
possa se alimentar dela também. Ben se vê forçado a
“matar” todos eles de novo e, com os zumbis invadindo o
andar de cima, ele se tranca no porão até o dia seguinte.
À medida que o dia amanhece, Ben sai do porão ao ouvir
o som de vozes humanas. A polícia e um grupo de
moradores locais estão cercando os zumbis e os
matando. Ao sair, Ben é repentinamente baleado na
cabeça por alguém que o confunde com um zumbi.
Os realizadores do filme se mantêm inabaláveis na
afirmação de que a escolha de um ator negro aconteceu
por acaso — “ele apenas era a melhor pessoa para o
papel” — e que a questão racial não teve importância no
roteiro, o que fica evidenciado pelo fato de a raça de Ben
não ser mencionada no filme.23 Embora Romero
estivesse ciente de que seu filme seria o “primeiro filme
a ter um homem negro interpretando o papel principal
independentemente e apesar de sua cor”, ele também
diz que “nem mesmo quando Duane leva um tiro na
cabeça no final, nós estávamos pensando em conotações
de brancos e negros”. Apenas décadas mais tarde ele
descobriu “o que aquilo significava de verdade”.24
Se Romero precisou de anos para entender o que o
papel de Ben significou, parte do público compreendeu
de imediato. Nos meses seguintes ao lançamento de
Noite, Romero foi bombardeado com perguntas sobre
aqueles “caipiras” que mataram Ben — eram pessoas
reais (já que alguns figurantes do filme eram “reais”,
como o repórter televisivo Bill Cardille interpretando ele
mesmo em uma ponta) atuando, ou simplesmente sendo
elas mesmas? Em uma resenha de 1970, Romero explica:
“a maior parte das pessoas, na verdade, morava na
cidadezinha em que filmamos […] tivemos bastante
cooperação por parte das pessoas da cidade — da polícia
e dos administradores […] [eles ficaram] felizes em
poder empunhar armas”.25 Claro que rótulos de “milícia”
branca, “turba”, “caipiras” e até mesmo polícia
“provinciana” traziam à tona conotações racistas. Como
resultado, o desgosto que o público é levado a sentir em
relação aos personagens é aumentado e se transforma
em desprezo real e ódio quando fica entendido que se
tratam de pessoas reais dos fundões de Pittsburgh. Além
disso, em entrevistas, embora Romero seja cuidadoso
para não alienar aqueles que tanto o ajudaram ao se
voluntariar para o filme, ele admite não “ter feito muita
coisa” para dirigir a atuação dessas pessoas, já que “a
fantasia metafórica confronta uma realidade mal
filtrada”.26 Essa colisão entre fantasia e realidade se
torna ainda mais real quando, no remake do filme, feito
por Romero em 1990, o ator Tony Todd (famoso por O
mistério de Candyman) foi escalado como Ben. Todd se
lembra dos tons de intolerância real partindo dos
figurantes que interpretavam a turba:

Todo mundo na cidade queria ser um zumbi. E


nós filmamos em Washington, PA, que não é o
lugar mais progressista dos Estados Unidos.
Você deve ter visto O franco atirador. Coisas
estranhas acontecem na Pensilvânia. Então,
estou cercado por zumbis que eram caipiras na
vida passada […]. Eu sabia que seria um lance
fodido, porque eles estavam esperando para me
agarrar de verdade. Um pouco da tensão que
você vê é real, coisa genuína.27

Na versão original de Noite, o fato de que a turba


caçadora de zumbis estivesse acompanhada de cães
treinados para atacar os alinhava com as imagens já
familiares de cães policiais sendo incitados a atacar
ativistas dos Direitos Civis. Sua vestimenta rural, camisa
de flanela e jeans, o jeito de falar — “Bata neles ou
queime, eles morrem fácil” — e seus acessórios que
consistiam em balas, charutos e armas, no geral
anunciavam os “cidadãos de bem”,* que também
representavam perigo para os negros. O perigo que os
homens representam é mostrado na maneira descuidada
com que recolhem o corpo de Ben. Ele é baleado e tirado
do enquadramento da câmera apenas para ser visto
novamente em uma longa tomada que mostra seu corpo
sendo arrastado pelo chão. O xerife, de modo simplista,
diz: “Bom tiro” e “Mais um pra fogueira”. Hervey escreve:
“E acaba assim: sem nenhuma longa sequência de
morte, sem nenhuma glória para o herói”.28
Ao contrário das afirmações de Romero de que a raça
não havia sido levada em consideração, o ator Duane
Jones (que trabalhava como professor de inglês durante o
dia) rejeitou a ideia de que Barbara sairia do estupor
para se levantar e salvá-lo dos zumbis. Para Jones, tal
final teria sido “racialmente errado”. Jones acreditava
que “a comunidade negra iria preferir me ver morto a ser
salvo […] de uma maneira brega e simbolicamente
confusa”. A morte de Ben foi chocante, mas talvez tenha
sido um dos momentos mais realistas do filme, já que ele
é morto pelos seus “inimigos naturais, os policiais e
caipiras de Pittsburgh”.29
Aqueles que saíram do cinema antes de os créditos
finais rolarem não viram a forma como lidaram com o
corpo de Ben. Uma série de imagens granuladas são
exibidas rapidamente durante os créditos. Elas parecem
o que poderiam ser fotos antigas de Emmett Till, baleado
na cabeça, sendo jogado na parte de trás da
caminhonete de seus executores para ser levado até o
rio Tallahatchie, onde seu corpo seria sujeitado a mais
abusos. Em vez disso, as fotos são do cadáver sem vida
de Ben, sendo empalado por ganchos de açougues e
erguido para ser colocado em uma fogueira. O corpo de
Ben então é esmagado nas chamas por madeira e
destroços. No fim, “nosso herói não está apenas morto,
mas obliterado. Não haverá registro de sua luta, nenhum
funeral ou cerimônia, nenhuma esperança de justiça”.30
Há muito o que se dizer sobre a produção de A noite
dos mortos-vivos, assim como sobre seu simbolismo e
poder. Richard Dyer, em seu famoso ensaio “White”,
chama a atenção para o simbolismo de cor no filme,
como a fotografia em preto e branco numa era de cor
com o objetivo de acentuar e complicar os
entendimentos de bem e mal. A noite é escura (negra),
mas a luz do dia traz outro mal na forma da multidão
(branca).31 O filme foi acusado inicialmente de
apresentar uma “pornografia da violência” com suas
impávidas cenas de zumbis estripando suas vítimas e
então devorando suas entranhas, fazendo com que a
Associação Cinematográfica da América analisasse seu
sistema de classificação.32 E houve aqueles que
escreveram sobre a “família” disfuncional em guerra e
incapaz de trabalhar em união mesmo em um desastre
que transcendia raça e classe.33 Contudo, pouco se sabe
sobre a reação de Noite entre os negros — isto é, além
do fato de que uma grande quantidade de pessoas
negras apoiou o filme, contribuindo para a sua
popularidade.
FIGURA 4.1 BEN SENDO ATIRADO NUMA PIRA EM A NOITE DOS MORTOS-
VIVOS.
Ten/Photofest
A surpreendente bilheteria de Noite — tendo custado
aproximadamente 115 mil dólares, mas arrecadando 90
mil só no primeiro fim de semana — pode ser atribuída,
em grande parte, a sua recepção popular entre o público
negro.34 Kevin Heffernan aponta a contribuição dos
negros frequentadores de cinema para o sucesso de
Noite em seu livro Ghouls, Gimmicks, and Gold: Horror
Films and the American Movie Business 1953-1968 e em
seu artigo de jornal “Inner-City Exhibition and the Genre
Film: Distributing Night of the Living Dead”. Ele observa:
(1) normalmente, os negros compunham 30% da
primeira leva de público em comparação com os 15 a
20% cento da população geral; (2) os cinemas em bairros
negros contribuíram para o sucesso de Noite, pois tinham
dificuldade de conseguir filmes (especialmente durante o
boom do 3-D, quando adaptar os cinemas se mostrou
caro demais), e assim A noite dos mortos-vivos foi
recebido com ansiedade e por um longo período de
tempo; (3) um filme como Noite, com sua atenção
implícita ao assunto de raça, ficava em cima do muro
entre ser um “filme de prestígio sobre um problema
social” e um “produto apelativo”; e (4) o público negro
fez filas para ver um filme com um afro-estadunidense
orgulhoso, esperto e habilidoso como protagonista e
estrela principal.35 Heffernan também nota que, quando
cinemas de comunidades afro-estadunidenses (em
cidades como a Filadélfia, por exemplo) conseguiam
exibições de estreia (um acontecimento incomum), os
filmes geralmente eram de terror.
De fato, se a atenção que a impressa negra dispensou
ao terror nas décadas de 1950 e 1960 serve de
termômetro, é possível afirmar que o gênero tinha um
status favorecido na comunidade negra. Em jornais como
o Chicago Daily Defender, o New York Amsterdam News e
o L. A. Sentinel, artigos curtos e reportagens que davam
conta do gênero eram frequentemente publicados,
notavelmente quando nenhum outro filme ou gênero era
mencionado. O jornal Daily Defender era particularmente
prolífico: por exemplo, publicou um artigo em 1957,
“Horror Films Debut Soon”, prometendo que

pessoas que gostam do tipo de filme que faz


gelar o sangue serão agraciadas em breve com
a chegada de uma nova série chamada “Shock”.
Cinquenta e dois filmes de terror dos arquivos
da Columbia e da UniversalInternational
prometem um ano inteiro de entretenimento
sangrento […] fiquem atentos a esses filmes —
eles serão um agrado terrível.36

Um artigo de 1960 no mesmo jornal proclamava: “uma


tríade de filmes horripilantes em exibição no Royal
Theatre está metendo medo e provocando risadas em
espectadores que nunca experimentaram isso antes. Um
balde de sangue, O ataque das sanguessugas gigantes e
Ordem de matar compõem uma programação
eletrizante”.37 Em outro artigo de 1960, o Daily Defender
detalha alguns dos clichês do terror ao promover o filme
Paranoia, que estava em exibição no Oriental Theatre em
Chicago:

muitos filmes de terror desenvolvem um enredo


ao redor de uma bela vítima que está sozinha e
vulnerável ao assassinato […] outra técnica dos
filmes assustadores é deixar que o espectador
acredite que a vítima pode escapar […] um dos
ingredientes comprovados do terror é tentar
levar a vítima à loucura.38

Esse estilo de escrita estilizado sobre o terror continuou


até os anos 1970:
Dois filmes excelentes de terror e suspense,
chocantes e de dar calafrios, que são
assustadores e agoniantes mesmo nos
momentos mais amenos de suas histórias, estão
com sua dupla estreia marcada para a sextafeira
(17 de abril) em mais de trinta cinemas de
bairro, nos subúrbios e drive-ins por toda a
Chicago […]. Porém, tomem cuidado, pois esses
dois filmes não são para os fracos de coração.
Aqueles que duvidam do oculto, que são
assustadiços e nervosos, estão duplamente
avisados.39

Estar ciente da promoção e popularidade dos filmes de


terror nas comunidades negras é essencial para entender
como, de maneira geral, o gênero evoluiu graças ao
público negro, e por que Noite, especificamente, foi um
sucesso tão grande. Na época em que Noite chegou aos
cinemas, a Walter Reade/Continental estava pronta para
capitalizar com o mercado afro-estadunidense tão
maltratado normalmente. “Muitos dos cinemas que
exibiram A noite dos mortos-vivos”, escreve Heffernan,
“ficavam no interior das cidades e atendiam
majoritariamente um público negro”, em parte porque os
cinemas de bairro, ou nabe houses,* como eram
apelidados, que atendiam os negros tinham dificuldade
de conseguir filmes.40 Esses cinemas abraçaram uma
programação independente, eclética, fora do escopo dos
grandes estúdios. Noite, por exemplo, apareceu em
conjunto com o drama Um amor para Ivy (1968), de
Sidney Poitier, em sua primeira exibição em um cinema
negro de bairro na Filadélfia, e em outra sessão ele foi
pareado com o filme policial Quadrilha em pânico (1968)
que estrelava Jim Brown.41 Em cinemas desse tipo, A
noite dos mortos-vivos rodou bastante.42
Em 1999, A noite foi inserido na lista da US National
Film Registry e é material de referência para inúmeras
obras de zumbis, incluindo uma franquia de sequências e
outras histórias derivadas, ao mesmo tempo que ganha
status de clássico cult entre seus fãs.

DESPERTAR DOS MORTOS


Romero continuaria, em seus três filmes seguintes —
Despertar dos mortos (1978), Dia dos mortos (1985) e
Terra dos mortos (2005) —, a empregar homens negros
em papéis centrais importantes. Despertar dos mortos é
situado algumas semanas após o primeiro levante dos
mortos e revela que a praga zumbi se infiltrou em cada
canto da sociedade. Aqui, o desespero da situação é
revelado quando os zumbis são vistos causando
destruição na cidade altamente populosa da Filadélfia.
Grupos de oficiais da SWAT, predominantemente brancos
(uma versão urbana dos caipiras mostrados em Noite)
atravessam cortiços, pouco se importando em distinguir
zumbis dos residentes humanos negros e não brancos
dos prédios: “Acabe com todos os porto-riquenhos e os
crioulos de uma vez!”. Uma violenta limpeza racial/étnica
e de zumbis começa quando os residentes se recusam a
sair de suas casas conforme ordenado.
Um tema contínuo de Romero em seus muitos filmes
dos Mortos, os zumbis são metáforas para a branquitude,
mesmo que alguns zumbis sejam mostrados como não
brancos. Numa cena, uma zumbi negra ataca um homem
negro. A zumbi não só é pálida para evidenciar seu
estado defunto, mas parece embranquecida, um
contraste de cor “enfatizado em uma tomada de uma
zumbi negra embranquecida mordendo o pescoço do
homem negro”.43 Entra o herói negro, Peter (Ken Foree),
um membro da SWAT que se levanta contra os seus pares
brancos, exigindo que interrompam a matança de
inocentes. Quando um membro do grupo não para
imediatamente, Peter o mata, como faria com um zumbi,
dando um fim à performance hiper-masculina e de
dominação racial do outro. Peter está fora e acima de
ambas as coisas. Ele faz amizade com outro oficial tático,
Roger (Scott H. Reiniger), um homem branco que
despreza igualmente o tipo de violência que
testemunham. Peter e Roger decidem tentar escapar da
loucura zumbis/polícia procurando um refúgio livre do
caos. Eles se juntam a outros que possuem a mesma
intenção — um casal branco, Stephen (David Emge) e
sua amante Francine (Gaylen Ross), que são repórteres
de uma estação de notícias e têm acesso ao helicóptero
da estação. Mais tarde, é revelado que Francine está
grávida. Os quatro encontram um local seguro em um
shopping.
O filme é uma crítica ao consumo e ao consumismo
norte-americano, assim como um engajamento — graças
à presença da mulher grávida — com o movimento
feminista e a revolução sexual. Ao locar o filme em um
shopping, Romero continua a trazer mudanças
impressionantes e inovações ao terror. A escolha foi
importante porque décadas de cientistas malucos,
mulheres em transe, histórias de experimentos que
deram errado e locações como antigos laboratórios
domésticos se tornaram “chatas e rotineiras”.44 O
shopping foi uma novidade emocionante, com o grupo
atuando em meio a suas mercadorias.
A vida em Despertar é feita de materialismo, que é
ocasionalmente interrompido por zumbis. Da mesma
forma, a negritude não interrompe (muito). Em uma
cena, tambores da selva servem de trilha sonora quando
o grupo explora uma loja de armas com a foto de um
safári africano. Enquanto os tambores e a música
“africana” geralmente sinalizam vodu, não há zumbis de
vodu aqui, apesar do comentário (inexplicável) de Peter
dizendo que seu avô era um sacerdote vodu. Em vez
disso, esse é um filme sobre exploração econômica, que,
de acordo com Romero, significa que todos os norte-
americanos se tornaram zumbis consumindo sem pensar
— canibalizando os produtos, em sua maioria
desnecessários para a sobrevivência e o sustento. Não
dá para culpar o vodu negro por isso.
A vida de Peter se transforma em uma rotina chata,
que, de maneira pouco progressista, inclui assistir
Francine “limpar a casa”, em um apartamento que o
grupo montou no shopping. A esperta e talentosa
Francine “dá uma de Caldwell”, como no filme O ataque
vem do Polo, cozinhando e limpando para os homens
(embora ela exija ser consultada acerca dos planos e ter
permissão de aprender a atirar e pilotar o helicóptero).
No restante do tempo, a existência de Peter é vazia,
limitada a conversar com seu amigo Roger, que foi
mordido por um zumbi, até que ele morre e Peter precisa
atirar no parceiro.
FIGURA 4.2 PETER SE PREPARA PARA LUTAR CONTRA ZUMBIS EM DESPERTAR
DOS MORTOS.
United Film Distribution
Company/Photofest
Com o tempo, a relativa paz do grupo é perturbada
por uma gangue de motociclistas que deseja os espólios
do shopping. A gangue invade o local e hordas de zumbis
vêm atrás, enchendo o lugar. Os motociclistas se tornam
comida de zumbi, e Stephen é morto e transformado em
morto-vivo. Peter e Francine — que, após meses no
shopping, já se encontra em um estágio avançado da
gravidez — são os únicos sobreviventes. Francine os
conduz pelos ares para longe do shopping. O filme
termina convidando o público a se preocupar com o
destino da dupla. Eles têm pouco combustível e não
fazem ideia do rumo que deveriam tomar. Contudo, há
coisas que o filme não aborda — será que Francine
conseguira parir seu bebê sozinha? Peter, um oficial
treinado, seria capaz de ajudar? Qual será o futuro da
dupla? São nessas questões que a negritude e
masculinidade de Peter e a branquitude e feminilidade de
Francine aparecem de maneira mais óbvia.

DIA DOS MORTOS


A terceira produção de Romero, Dia dos mortos (1985),45
não teve a inovação política e, até certo ponto, racial,
dos outros filmes da série. O filme é situado em uma
época “após o fechamento de todos os shoppings” (uma
referência a Despertar dos mortos) e se passa em um
bunker militar subterrâneo na Flórida em que
experimentos grotescos são feitos nos zumbis por
cientistas civis sob direção militar. Acima do chão, as
coisas parecem sem esperança, com pouca vida restante
à medida que os zumbis tomam conta de tudo. Os
membros restantes do governo e do Exército esperam
que os experimentos revelem uma maneira de acabar
com o reino dos zumbis. O filme se foca em um zumbi,
Bub (Sherman Howard), que parece estar evoluindo e
pode sentir a maldade nos cientistas e militares de moral
decadente. Os cientistas são distantes, às vezes ríspidos.
Um deles faz experimentos em soldados mortos-vivos, e
até mesmo os joga como alimento para os outros zumbis.
Os cientistas são “loucos”. Os militares são a versão da
década de 1980 dos caipiras de Romero. Os soldados são
mostrados como figuras sádicas, racistas e machistas. Os
militares é que são os monstros, prontos para matar e
torturar tanto zumbis quanto humanos. Os homens
ameaçam estuprar a única cientista mulher, Sarah (Lori
Cardille), importunam e até matam os outros civis da
equipe por serem diferentes.
O personagem negro indispensável no filme é John
(Terry Alexander), um piloto civil de helicóptero oriundo
das Índias Ocidentais. Nesse contexto, John é uma tripla
minoria — negro, não militar/cientista e estrangeiro,
como fica evidente em seu sotaque. John também é
educado e civilizado. Ele cria um lugar de convivência
improvisado, mas idílico, que chama de “Ritz”, dentro do
bunker, e que tem até mesmo a réplica de uma cabana
na beira do mar que ele usa como sala de leitura. Ele
divide seus aposentos sem dificuldades com um civil
branco e direito chamado William (Jarlath Conroy), em
um acordo de convivência que alude a uma definição de
masculinidade mais iluminada, não associada aos
soldados, que dormem com suas armas.
No filme, as coisas dão errado, e Sarah, William e John
precisam lutar em duas frentes de batalha: contra os
zumbis, que lotam o bunker, e contra os soldados, cuja
sede de sangue é igual a dos mortos-vivos. Todos são
dispensáveis em potencial nesse filme, com exceção de
John, porque ele é o único que sabe como pilotar um
helicóptero e pode levar os sobreviventes até um lugar
seguro. Embora os militares precisem dele, ele é
claramente desprezado. John zombou do comportamento
primitivo dos soldados e não baixou a cabeça para suas
ameaças. Quando ele se recusa a abandonar Sarah e
William para encarar a morte iminente nas mãos dos
zumbis que estão no bunker, John é espancado até
obedecê-los — uma referência clara à escravidão.
Contudo, ele luta contra os soldados, resgata Sarah e
William, e salva o dia ao levá-los pelos ares para longe do
bunker e para uma ilha deserta que só ele parece
conhecer. O filme termina com John pescando em paz em
uma praia, junto com Sarah e William.
Em uma convenção de terror em 2010, em
Indianápolis, o ator Terry Alexander e o diretor Romero
falaram sobre o personagem John e, especificamente, a
respeito dessa cena final que mostra os três personagens
desfrutando uma sobrevivência pacífica. Ao notar a
capacidade do personagem John, Romero disse que,
embora tenha havido centenas de outros filmes em que
zumbis-dominam-o-mundo, talvez o público continue a
acreditar que “Terry ainda está pescando naquela praia”,
uma hipótese que Alexander abraçou de forma
entusiasmada.46 O comentário de Romero sobre o
personagem John confirma sutilmente a análise de Dyer,
de que “o ponto principal em relação a Ben, Peter e John
é que, de maneiras diferentes, todos eles possuem
controle sobre seus corpos, conseguem usá-los para
sobreviver, sabem como fazer coisas com eles”. Embora
os brancos percam o controle enquanto permanecem
vivos, muitas vezes voltando “na forma descontrolada de
zumbis”,47 esses homens negros, especialmente John —
que, diferente de Ben, sobrevive, e, diferentemente de
Peter, conduz o grupo até um local seguro —, continuam
donos de si, seguindo em frente.

TERRA DOS MORTOS


Em 2005, Romero lançou Terra dos mortos. Aqui, a
profundidade política de Romero volta, pois ele trabalha
para criticar o classismo. Em Terra existem duas classes.
A primeira é a classe superior, composta de humanos
ricos que vivem em um prédio requintado de frente para
a água, de vidro e aço, que tem três lados protegidos
pelos três rios da cidade e, do lado que dá para a terra,
há barricadas eletrificadas. O estilo de vida dessas
pessoas é mantido pela segunda classe, forrageadores
profissionais que vasculham as ruínas da cidade
enquanto lutam contra zumbis, ou “fedidos”, em busca
de mercadorias — comida, vinhos finos, tecidos e outros
suprimentos. Os forrageadores vivem, assim como a
maior parte dos cidadãos, numa terra devastada, caótica
e brutal. Essa segunda classe se encontra faminta e
imunda, vivendo e morrendo nas ruas. A terceira classe,
ainda que não seja a “mais baixa”, é formada pelos
zumbis, que andam livremente e, à medida que os
humanos morrem ou são capturados do lado de fora das
cercas, têm muito o que comer.
Um zumbi, um homem negro chamado “Big Daddy”
(Eugene Clark), acaba por ser especialmente evoluído e é
ciente da brutalidade continuada direcionada aos zumbis.
Ele se torna o líder de uma facção zumbi, aprende a se
comunicar com rugidos e rosnados, e descobre como
usar armas para destruir seus opressores humanos. Ele
até mesmo ensina seus compatriotas a pegarem em
armas como facas e facões. Em uma cena importante,
Big Daddy evidencia um alto nível de pensamento
racional, pois conclui que seu exército zumbi pode
alcançar o prédio — um símbolo que ostenta exclusão
até mesmo para os zumbis — indo pelo fundo do rio em
vez de arriscar uma eletrocussão na cerca. De fato, os
zumbis invadem, e Big Daddy busca uma vingança
particularmente brutal contra o malvado dono do prédio.
O filme termina com um grupo de sobreviventes
humanos, estrelas do filme, entregando a cidade para
Big Daddy enquanto os humanos procuram um novo
lugar para viver. Por sua vez, Big Daddy parece
reconhecer essa trégua enquanto lidera seu exército
zumbi.
Como um todo, os filmes de Romero podem ser
celebrados por seu tratamento complexo e até mesmo
positivo dos negros. Parte da profundidade de seus
personagens talvez venha da crença de Romero de que
raça não fazia diferença quando ele escalou os atores
Duane Jones, Ken Foree ou Terry Alexander.48 Contudo,
seus personagens não estão livres das histórias e
políticas que a pele deles traz de herança. Os
personagens negros de Romero são revolucionários no
que se refere à representação cinematográfica de raça
nos Estados Unidos, fossem heróis humanos ou zumbis. E
mais ainda: esses personagens negros são retratados
como pessoas diferentes dos brancos ao redor deles.
Ben, Peter, John e Big Daddy são autoconscientes de
suas identidades, e, enquanto buscam sobreviver entre
os demais, eles não passam necessariamente uma
mensagem de integração, mas de coexistência — uma
diferença sutil, mas importante. A diferença deles se
torna mais evidente quando, como Dyer insiste, a
negritude dos personagens é compreendida em
contraste com a branquitude. Através de tal análise, fica
óbvio que o heroísmo desses quatro personagens vem,
em parte, do fato de se elencarem enquanto alheios às
hierarquias raciais e outras normas dominantes. É por
meio de sua rejeição a essas limitações e de sua
resistência à dominação que se torna “possível ver que
os brancos [ou pelo menos aqueles investidos na
branquitude] são os mortos-vivos”.49
CONCLUSÃO
As décadas de 1950 e 1960 trouxeram um novo
significado para o velho ditado “um passo para frente,
dois para trás”. Hollywood não estava pronta para
desistir da fórmula insípida de situar o mal em lugares
negros ou entre os negros. Lembre-se, é a empregada
negra Eulabelle, em The Horror of Beach Party, que
pronuncia aleatoriamente que um monstro saído do lixo
tóxico deve ser um trabalho de vodu (negro). Assim, ao
continuar com o impulso de entender o mal e o
monstruoso como algo inspirado nos negros, Hollywood
voltou para a África, evitando os Estados Unidos da era
dos Direitos Civis para fazer seu terror. A África,
especialmente a África tribal, era um alvo
cinematográfico fácil, pois aparentava ser um lugar
diferente dos Estados Unidos por causa da ausência de
uma tradição cristã dominante e identificável, ou de
práticas capitalistas dominantes.50
Quando vistas — e é importante notar que os negros
raramente eram vistos durante essas décadas —, as
representações de negros e da negritude não lutavam
contra os limites impostos, já que empregados negros
carregavam o peso dessas representações. Performances
raras e inspiradas partiram de Joel Fluellen como o
inteligente e capaz Arobi em Monster from Green Hell
(1957), Estelle Hemsley (a velha Malla) e Kim Hamilton (a
jovem Malla) como a esperta e autoritária Malla em
Vaidade que mata (1960), e Duane Jones como Ben, o
líder obstinado em A noite dos mortos-vivos (1968).
Essas performances evidenciaram o que poderia ser feito
com o talento negro nos filmes de terror.
Ainda assim, o gênero do terror em si estava
progredindo. A recuperação do terror incluía abordar as
histórias e os problemas que já entravam nas casas
estadunidenses por meio dos jornais televisivos.
Narrativas que enfileiravam dominação patriarcal
capitalista, militarização e desigualdades sociais e medos
encontraram seu espaço, de maneira sofisticada, nos
cinemas. O tipo de metamorfose sociopolítica que o
gênero do terror estava empreendendo faria com que a
representação da diversidade racial se tornasse
praticamente obrigatória.
A noite dos mortos-vivos foi, sob qualquer ângulo, um
avanço, o grande filme de terror “com negros” que era
uma crítica ao status quo e que falava sobre revolta.
Certamente tivemos estrelas negras (significativamente,
homens e mulheres) nos filmes de terror das décadas
anteriores graças às contribuições de Spencer Williams,
Oscar Micheaux e outros. Contudo, a apresentação de
Ben foi inovadora, diferente e importante, apenas pela
novidade de seu encontro e tratamento dos brancos. Não
havia desejo pela mulher branca ou submissão e vacilo.
Ainda assim, Noite era um filme pessimista em todos os
níveis. Noite se tornou um lembrete ficcional da assertiva
de Norman Mailer em seu ensaio “White Negro”, de
1957, no qual ele afirma que

qualquer negro que deseje viver precisa viver


com o perigo desde o seu primeiro dia, e
nenhuma experiência pode ser casual para ele,
nenhum negro pode perambular por uma rua
com a certeza de que nenhum tipo de violência
irá acometelo em sua caminhada […]. De tal
maneira, que a paranoia é tão vital à
sobrevivência quanto o sangue […]. Sabendo
nas células de sua existência que a vida é
guerra, nada além de guerra.51

Pouco importa se os realizadores de Noite estavam


escrevendo propositalmente ou de forma velada uma
mensagem racial; o que se leva da história é o que
importa. Na verdade, em Noite, a alusão ao linchamento
com o assassinato do supostamente monstruoso Ben é
bem clara. Os espectadores do filme que viram o fim de
Ben foram lembrados do desamparo social, político e
econômico dos negros, e a vitimização violenta era uma
história terrível da qual era difícil escapar. Juntas, as
mortes de Emmett Till e do dr. King “expuseram os
limites da ideologia [estadunidense] de ordem
doméstica”,52 e o herói ficcional Ben foi incluído nesse
lembrete. A segunda coisa que podemos tirar daqui é
que havia uma verdadeira revolução acontecendo nos
Estados Unidos com o movimento dos Direitos Civis e o
subsequente movimento do Nacionalismo Negro, mas,
durante quase uma década e meia, um gênero
construído em cima de violência e atrocidades deu as
costas para essas mesmas coisas que aconteciam em
solo norte-americano. Foi só no fim da década de 1960
que uma revolução finalmente aconteceu, com tensões
em relação às diferenças sendo abordadas diretamente
em filmes como Noite.
Na década seguinte, os anos 1970, a revolução do
mundo real e a revolução do cinema se alinhariam
explicitamente com o terror passando a se concentrar
em temas de empoderamento negro. Contudo, o mais
notável foi que a realidade que o gênero tomou para si
foi abordada de uma forma radicalmente diferente
daquela oferecida por Noite. Enquanto A noite dos
mortos-vivos revelava os entraves em “apenas
conviver”, os anos 1970 focaram no movimento Black
Power, nacionalismo e autoconfiança, em lugar das
dificuldades de integração e cooperação inter-racial. Essa
seria uma década de “filmes negros” de terror em vez de
filmes de terror “com negros”. Os anos 1970 produziriam
até mesmo alguns fubu,* feitos por nós e para nós,
aclamados criticamente, como Ganja & Hess.
Heffernan elabora um forte argumento sobre a
influência “incalculável” de Noite nos filmes de terror da
década de 1970, notando que os elementos artísticos do
filme anteciparam as tendências que seriam comuns no
terror blaxploitation dos anos 1970. Mais do que isso, de
acordo com Heffernan, Noite revitalizou “a bilheteria dos
cinemas de bairro” de forma significativa, fornecendo um
lar para os filmes negros como Blácula: o vampiro negro
e Abby, até que os cinemas do tipo fechassem as portas
de uma vez por todas na metade da década de 1970.53
À medida que a década de 1970 foi ganhando forma,
alguns filmes brancos de terror persistiram no tema da
ameaça nuclear (por exemplo, Quadrilha de sádicos
[1977]) e em críticas sobre a unidade (burguesa) familiar
(Aniversário macabro [1972] e O massacre da serra
elétrica [1974]), o que serviu para continuar a exclusão
de pessoas negras. Contudo, os negros voltariam, com
ares de vendeta e em busca de vingança, na era do
terror blaxploitation, quando os “branquelos” passaram a
ser punidos pelas maldades discriminatórias do passado
e pela exploração continuada das comunidades negras.
* No original, Good ol’ boys, um termo usado para se referir ao
branco sulista conservador, intolerante e dotado de um forte (e
assassino) senso de companheirismo em relação aos seus pares.
[NT]
* O termo nabe é derivado de neighborhood, tendo o mesmo
significado, e também é utilizado para se referir aos cinemas de
bairro. [NT]
* Acrônimo para “for us, by us”, feitos para nós e por nós. [NT]
HORROR
NOIRE

1970
GRITE, BRANQUELO, GRITE —
RETRIBUIÇÃO, MULHERES DURONAS
E CARNALIDADE

Muitos filmes “negros” são negros apenas


no nome. […] Na maioria das vezes, o
material, além de não ser negro, não é
nem mesmo original, já que o material
branco destinado ao lixo é apenas
revestido de preto e enviado para sua
última rodada. […] Esses filmes são
negros? Eu não sei a resposta, mas acho
que já passou da hora de alguém fazer a
pergunta. — HOLLY (127)

Nos anos 1970, os cineastas tiraram vantagem das


portas abertas pelo tipo de terror de George Romero,
assim como pelo desaparecimento do Código Hays e do
sistema de classificação aparentemente sempre em
mudança e diluído da Associação Cinematográfica da
América (MPAA).2 Em apenas alguns anos, filmes repletos
de sustos, violência e destinados a maiores de dezoito
anos, como O exorcista (1973), O massacre da serra
elétrica (1974) e Halloween: a noite do terror (1978),
dominaram o gênero, transformando filmes como
Drácula (1931), O rei dos zumbis (1941) e O monstro da
lagoa negra (1954) em atenuações sem sangue. Embora
o gênero tenha sofrido mudanças rápidas e dramáticas
em estilo e forma, isso não quer dizer que filmes
clássicos de terror como o Drácula de 1931 e
Frankenstein não continuaram a influenciar
profundamente o gênero. Os velhos clássicos foram
modernizados com temas contemporâneos (e um bocado
de carnificina). Esse tipo de renovação, especialmente no
encalço de Romero com o sucesso de A noite dos mortos-
vivos, com a participação de atores negros, abriu espaço
narrativo para muitos outros personagens negros.
Reinventar o gênero a partir do ponto de vista vantajoso
da negritude geralmente significava reimaginar os
clássicos. Por exemplo, Drácula se tornou Blácula: o
vampiro negro (1972), apresentando o primeiro vampiro
negro do cinema norte-americano. Frankenstein se
tornou Blackenstein (1973),3 com o monstro sendo
transformado em um veterano negro ferido no Vietnã
que foi reconstituído por um médico branco. O médico e
o monstro virou Monstro sem alma (1976), em que o
monstro toma a forma de uma criatura assassina branca,
destruindo os esforços realizados por sua metade negra
superior. Um processo do estúdio Warner Bros. afirmava
que a história de O exorcista (1973), uma narrativa sobre
um demônio africano que possui uma menina branca, foi
plagiada pelos realizadores do filme Abby (1974). Abby
conta a história de uma mulher negra que é possuída por
um demônio sexual iorubá. Na verdade, essa foi uma
“década revisionista”4 para a indústria do cinema, na
qual, pela primeira vez, “os estúdios produziram filmes
orientados aos negros e feitos para agradar aos negros”.5
Realmente, ao longo da década, o “terror negro”
prosperaria, com os negros adentrando o gênero como
vilões monstruosos, anti-heróis e assassinos de
monstros. As mulheres negras apareceram
predominantemente como protagonistas fortes e
resilientes. Os brancos também foram representados,
mas nessa década eles seriam as vítimas, pagando caro
por suas tentativas de vitimizar os negros.
Para ser exata, os “filmes negros” de terror não foram
os primeiros a apresentar temas recorrentes em filmes.
Os filmes (de terror) mudos iniciais saquearam ao ponto
de plagiar “formatos preexistentes de histórias lucrativas
e estilos de apresentação que poderiam ser facilmente
adotados pelas câmeras em movimento”, enquanto com
frequência apenas alteravam minimamente as histórias
surrupiadas com novos detalhes.6 Ainda que cineastas
negros escavassem aqui e ali, o gênero deveria ser
creditado não apenas com a reformatação dramática das
narrativas, em alguns casos, mas também com a
reapropriação de “formas genéricas com um objetivo
mais claramente político para criticar [por exemplo] o
poder branco”.7
Os filmes foram encorajados pelas ideologias do
movimento Black Power — uma gama de sistemas de
crenças que pregavam um despertar do orgulho negro,
autossuficiência e empoderamento que eram
proeminentes na década. Os resultados imagéticos foram
“imagens em tela da vida negra refletindo a nova
confiança do povo negro”8 e uma “avalanche averiguável
de super-heróis negros e anti-heróis encontrando o
caminho até as telas”.9 Contudo, a enxurrada foi seguida
por uma série de novos problemas, como Gary Null, em
Black Hollywood, explica:
O que emerge, na verdade, é uma nova gama
de estereótipos negros. Talvez derivados do
movimento de poder negro, o herói negro
maneiro e eficiente parece ter mais em comum
com James Bond do que com as ideias políticas
de qualquer movimento negro. Alguns desses
filmes mencionam o separatismo negro, cultura
afro-estadunidense e controle local.10

OS HORRORES DO BLAXPLOITATION
Lamentando as representações e a qualidade dos filmes
dos anos 1970 que estrelavam atores negros, Ellen Holly,
do New York Times, escreveu em 1974: “um dos
problemas em ser negro e ter recursos limitados é que
raramente controlamos a nossa imagem. Nós raramente
aparecemos na mídia como dizemos que somos, mas
geralmente como os brancos dizem que somos”.11 As
condições econômicas sob as quais os filmes negros
eram feitos fizeram surgir o termo “blaxploitation” —
uma união entre os conceitos da palavra negro em inglês
(black) e “exploração”12 —, que é usado para definir os
filmes negros da década, fossem de terror ou não.
Blaxploitation descreve uma era de lançamentos de
filmes negros que frequentemente se inspiravam nas
ideologias do movimento Black Power enquanto
apresentavam temas de empoderamento,
autossuficiência (ainda que nem sempre pelos meios
legais) e tomada de consciência. Nos “filmes negros” de
terror, especialmente, monstros famosos ou brancos,
como Drácula ou o monstro de Frankenstein, foram
transformados de propósito em “agentes” do poder
negro.13 Os filmes blaxploitation geralmente tinham uma
mensagem contra o status quo, desafiando a exploração
“do Homem” ou “dos branquelos” em detrimento das
comunidades negras (por exemplo, importação de
drogas, círculos de prostituição e policiais corruptos),
embora raramente a crítica passasse de uma acusação
contra alguns indivíduos ruins.
A tentativa do blaxploitation de engajamento político
não passou incólume a críticas. Rhines explica:

Esses filmes foram lançados durante o auge dos


Direitos Civis/Movimento de liberação negra, e
ainda assim suas temáticas sexuais, de violência
e individualidade “super legal” eram a antítese
daquilo que organizações negras e políticas
contemporâneas como a SNCC, a NAACP ou a SCLC
defendiam para os negros.14

Os filmes foram “condenados por líderes de opinião


negros em todo o espectro político por causa de seus
estereótipos criminais e identificados, com razão, como
produtos de estúdios, escritores e diretores brancos”,
ainda que os filmes se mostrassem populares,
especialmente entre negros que apreciavam ver
personagens e comunidades negras nas telas.15 Além
disso, os filmes eram notoriamente exploradores de
mulheres, pois uma marca registrada dos filmes
blaxploitation era a sujeição de suas personagens
femininas ao tratamento misógino, abuso e estupro. O
blaxploitation veio a ser conhecido como um estilo de
filme em si mesmo, com clássicos de ação/drama como
Sweet Sweetback’s Baadasssss Song (1971), Shaft
(1971), Super Fly (1972), Coffy: em busca da vingança
(1973), Foxy Brown (1974), The Mack (1973) e Dolemite
(1975), além de “filmes negros” de terror como Blácula:
o vampiro negro (1972).
Blácula de 1972 foi o padrão para a recriação do terror
(branco) à imagem e semelhança dos negros, ao mesmo
tempo que abordava temas de orgulho e
empoderamento negro. Dirigido pelo cineasta negro
William Crain e estrelando William Marshall, esse “terror
negro” apresenta uma abordagem interessante da
história de vampiros enquanto explora os efeitos do
racismo e a perda da história e identidade negras.
Blácula começa sua história no ano de 1780 com
Mamuwalde (William Marshall), um príncipe africano em
viagem com sua esposa Luva (Vonetta McGee) para a
Transilvânia, onde têm um jantar marcado com o Conde
Drácula (Charles Macaulay). Durante a reunião, o
príncipe pressiona Drácula para que ele renuncie ao
tráfico de escravos, com o qual o imensamente rico
Drácula, ao que parece, tem se beneficiado
enormemente. Drácula não é apenas um vampiro, mas
acaba por se mostrar também um racista virulento (“É
você que vem da selva”). Blácula, de forma
autoconsciente, incluiu a retórica odiosa para expor seus
efeitos cada vez menores e para rebater ativamente tais
ofensas. Nesse filme, e em muitos grandes filmes de
terror da década, “tropos racistas duradouros […]
estavam sendo prontamente identificados e expostos”.16
Drácula morde Mamuwalde, infectando o príncipe com
o vampirismo. Mamuwalde é renomeado “Blácula” —
uma variação do nome de seu “mestre” vampiro branco,
o que o marca como um Outro, mesmo entre os
vampiros. Recebendo um nome de escravo, ele tem sua
identidade (africana) roubada. Drácula então enterra
Mamuwalde, deixando-o entregue ao sofrimento eterno,
como um morto-vivo, causado pela sede de sangue. Luva
não é manchada pelo vampirismo, embora seja provável
que tenha morrido imediatamente.17
Transformado em Blácula, Mamuwalde fica preso na
tumba por quase dois séculos, até 1972, quando o
castelo abandonado de Drácula na Transilvânia é
colocado à venda.18 Ainda em seu caixão, Mamuwalde
faz uma viagem diaspórica bem atrasada. Logo,
Mamuwalde finalmente aparece no novo mundo —
escravizado pelo vampirismo e leiloado.
Dois colecionadores de Los Angeles, um negro e um
branco, ambos gays, compram alguns conteúdos do
castelo, o que inclui, sem que saibam, Blácula. Os
homens, que estão em um relacionamento amoroso, são
mostrados como figuras afetadas, performando um
estereótipo de feminilidade no modo de vestir e em suas
maneiras. Quando Mamuwalde sai de seu caixão,
sedento por sangue, sua aparência imponente se
transforma numa monstruosidade peluda, e ele
rapidamente se alimenta dos dois homens, permitindo
lampejos de sensualidade por das implicações de um
encontro inter-racial/homossexual. Quando Mamuwalde
se alimenta de Billy (Rick Metzler), o colecionador
branco, ele se alimenta por meio de um corte em seu
braço ao mesmo tempo que afasta o rosto do homem
(pescoço e lábios) para longe de si. Quando Mamuwalde
se alimenta de Bobby (Ted Harris), o colecionador negro,
ele o estrangula até que perca a consciência e, então, o
morde violentamente, alimentando-se furiosamente de
seu corpo sem vida. A ceifa da vida dos homens por
Mamuwalde permite apenas uma pequeno vislumbre de
homoerotismo antes de dar lugar a uma perspectiva
homofóbica e heterossexista sinalizada por raiva e
violência.
Mamuwalde, de início, está satisfeito e notavelmente
não volta sua atenção para a vingança de sua própria
“morte” e a de sua amada Luva pelas mãos dos brancos.
Em vez disso, apesar do início politicamente inspirado de
sua narrativa, Blácula se torna uma história de amor
pavorosa, em que Mamuwalde inicia uma perseguição
implacável a uma mulher, Tina (também interpretada por
McGee), que o faz lembrar de Luva. As ações de
Mamuwalde, então, se alinham com aquilo que “sempre
[foi] explícito no reino de terror de Drácula na Inglaterra
[…] a busca pelo amor romântico e um desejo de
recuperar a normalidade”.19
O amor romântico em Blácula é estritamente definido
como heterossexual. No filme, o corajoso e experiente dr.
Gordon Thomas (Thalmus Rasulala), com a ajuda de sua
assistente médica/namorada Michelle (Denise Nicholas),
descobre o segredo de Mamuwalde. Juntos eles são um
bom time e também estão em uma relação amorosa.
Ainda assim, Bobby e Billy, que são igualmente
carinhosos um com o outro, e até mesmo parceiros iguais
em um negócio de sucesso, são reduzidos a “duas bichas
decoradoras de ambientes” no filme. Mais tarde, quando
o corpo de Bobby desaparece de uma funerária porque
ele se transformou em vampiro, a polícia se pergunta:
“Quem diabos iria querer uma bicha morta?”. E, em outra
cena, um estereótipo racista, “todos eles se parecem”, é
direcionado aos homens gays, aumentando ainda mais a
retórica violenta, heteronormativa e desdenhosa do
filme.
Sharret descreve filmes na pegada de Drácula como
uma paródia de Totem e tabu (1913) de Freud, uma
coleção de ensaios relacionados a temas como a
importância da figura paterna, obsessões relacionadas ao
reino mágico e a carnalidade ilícita.20 Sharret escreve:
“Drácula [é] o pai tirânico violando de forma incidental
todos os tabus sexuais, incluindo aqueles contra a
homossexualidade”.21 Embora os filmes negros da
década 1970 (tanto os de terror quanto os demais)
apresentassem personagens (como Billy e Bobby) fora
dos limites da sexualidade heteronormativa, sua
representação raramente era positiva e inovadora. Gays,
lésbicas, bissexuais, transgêneros e outros que violavam
os papéis de gênero “tradicionais” lembravam o público
de que as identidades sexuais nem sempre são estáveis.
Contudo, tal “instabilidade” era geralmente punida. Por
exemplo, um homem gay é sodomizado com um ferro em
brasa no filme blaxploitation Black Shampoo (1976) —
que não se encaixa no gênero terror. Wlodarz, em
“Beyond the Black Macho: Queer Blaxploitation”, afirma
acreditar que a heterossexualidade serve de âncora para
representações de negritude “autêntica” (e heroísmo),
enquanto o lado queer recebe um certo poder
representacional ameaçador. Isso significa que
sexualidades diversas não estão ausentes de filmes
negros. Pelo contrário, há muitos personagens queer.
Contudo, os “próprios filmes continuam admitidamente
aflitos e fóbicos ao lidar com esses personagens”.22
FIGURA 5.1 BLÁCULA CHEIO DE FÚRIA EM BLÁCULA: O VAMPIRO NEGRO.
AIP/Photofest
Apresentando uma masculinidade negra ideal e
“autêntica”, os sentimentos amorosos de Mamuwalde
por Tina, que ela rapidamente expressa de forma
recíproca, podem ser considerados como motivados de
uma nostalgia afrocentrada de negritude completa. “O
desejo de Tina de ficar com seu parceiro, de se tornar
uma vampira”, argumenta Gateward em “Daywalkin’
Night Stalkin’ Bloodsuckas: Black Vampires in
Contemporary Film”, é a sua tentativa de recuperar uma
nobreza africana, num período da cultura americana em
que a ideia da África como uma terra mítica foi
prevalecente tanto na política quanto nas culturas
expressas de norte-americanos negros e da diáspora
como um todo”.23 Da mesma forma, o nome de
Mamuwalde e sua nobreza “o conectam com as políticas
culturais afrocentradas adotadas por alguns ramos do
movimento Black Power”.24 Tina é persuadida por
Mamuwalde a acreditar que ela é a chave para a
recuperação, e para tanto ele usa a retórica da África-
terra-natal: “Nós somos a tribo Abani, você e eu.
Nordeste do delta do Níger. Nosso povo é formado por
renomados caçadores. […] Você é a minha Luva
recriada”. Até mesmo quando Mamuwalde precisa se
despedir de Tina, ele o faz em suaíle.
Contudo, no filme, a conexão entre nobreza africana e
afro-estadunidenses é (talvez de forma não intencional)
ilusória. Mamuwalde aterrissa em uma região
predominantemente negra de Los Angeles. Mas fica claro
que aquele não é o povo dele. Mamuwalde pertence a
uma casta e a um tempo diferentes. Como James Baldwin
escreveu de forma tão eloquente em Notes of a Native
Son acerca de relações africanas/americanas: “eles se
encaram, o negro e o africano, separados por um abismo
de trezentos anos — uma alienação grande demais para
ser remediada em uma tarde”.25 O fato de Mamuwalde
predar os norte-americanos negros que ele encontra
também não ajuda, mostrando-o como uma figura pouco
diferente daquelas pessoas, ou coisas, conhecidas por
vitimizar os negros e suas comunidades.
Apesar desses deslizes, Blácula tem sido creditado
como um filme revolucionário. Elizabeth Young, em Black
Frankenstein: The Making of an American Metaphor,
credita o filme por capitalizar na “liberdade para a
fantasia política que os filmes de terror permitiam”.26
Leerom Medovoi, em seu artigo “Theorizing Historicity, or
the Many Meanings of Blacula”, observa que “a figura de
Mamuwalde lembra, por exemplo, a adoração de Malcolm
x ao longo dos anos 1960 como o ‘belo príncipe negro’
dos afro-estadunidenses”.27 Enquanto Harry Benshoff,
em seu artigo “Blaxploitation Horror Films: Generic
Reappropriation or Reinscription?”, usa Blácula para
argumentar que os filmes da época comentam
criticamente o racismo branco (tanto o pessoal quanto o
institucionalizado) e são “embebidos da cultura afro-
estadunidense do início dos anos 1970; referências aos
Panteras Negras, estilo afrocentrado, [e] soul food”.28

AMERICAN INTERNATIONAL PICTURES


Blácula foi recebido com tanto sucesso de bilheteria —
arrecadando mais de 1 milhão de dólares até o fim do
seu período de exibição29 — que a empresa que produziu
o filme, a American International Pictures (AIP, 1954 até o
presente), desejou continuar a cortejar os filmes negros
de terror. A AIP era conhecida por suas produções de
baixo orçamento e apelativas que miravam o público
jovem, com filmes de monstros ou “praianos” como A
praia dos amores (1963) e Folias na praia (1965). A AIP
não podia ser creditada como uma pioneira do cinema.
Em vez disso, seus integrantes observavam com cuidado
e de longe, com sua política de “observar tendências em
gostos emergentes”.30 Somente então entravam na roda;
eles “sempre esperavam que alguém colocasse o pé na
água primeiro”.31 No caso de filmes negros, um primeiro
teste foi Sweet Sweetback’s Baadasssss Song (1971),
lançado pela produtora Cinemation, que teve uma ótima
bilheteria, acima dos 11 milhões de dólares.32 O outro
filme foi Shaft (1971, MGM), com seus 17 milhões em
renda doméstica.33 Juntos, o sucesso e a aclamação
desses filmes incentivaram a AIP, em 1972, a lançar
Blácula, assim como o filme de gângster O chefão de
Nova York.34 A estratégia de negócios da empresa era
sólida:

De início pode parecer difícil de imaginar dois


tipos de filmes mais diferentes em tom, estilo,
conteúdo e público do que os filmes praianos e
as produções blaxploitation da AIP; ainda assim, a
prioridade que o estúdio deu ao público negro
entre 1972 e 1975 rendeu uma lição valiosa de
como a mesma fórmula empregada nos filmes
praianos de uma década atrás poderia ser
modernizada e relocada a uma nova geografia
racial para produzir resultados similares com um
público completamente diferente. Com sua
torrente de filmes direcionados ao público negro,
a AIP [conquistou] os maiores lucros do estúdio.35

A AIP continuou com a sua decisão de explorar o nicho


com lançamentos de terror estrelando atores negros,
como O monstro de duas cabeças (1972), Os gritos de
Blácula (1973), A vingança dos mortos (1974), Abby
(1974) e A vingança de J.D. (1976). Todos foram filmes de
baixo orçamento, pois fazia parte da política da AIP
“produzir filmes com prudência, evitando despesas com
coisas que não aparecerão nas telas”.36 Aproveitando a
deixa da AIP, a Exclusive International lançou
Blackenstein, e a Dimension Films apresentou Monstro
sem alma.

LUTE CONTRA O PODER


Esperando capitalizar com o sucesso de Blácula: o
vampiro negro, o Blackenstein (1973) da Exclusive
International foi um “produto da Hollywood branca, feito
por um diretor branco, William Levey, e um escritor
branco, Frank Saletri; o filme é tosco e descuidado, um
erro até mesmo para os padrões de baixo orçamento”.37
Blackenstein mostrou uma coalescência de preocupações
sociopolíticas ao adotar uma postura contra a guerra (do
Vietnã), questionando a contribuição dos negros com o
que poderia ser percebido como um esforço de guerra
colonialista, e explorou as tensões raciais contínuas entre
negros e brancos. O filme é centrado em Eddie Turner
(Joe De Sue), um negro, que é severamente ferido por
uma mina durante a Guerra do Vietnã.
Desprovido de membros, Eddie é basicamente uma
cabeça sem corpo. Ao ser enviado de volta para os
Estados Unidos, ele é conduzido ao Hospital dos
Veteranos. Durante sua estadia por lá, o infortunado
Eddie sofre zombarias por parte de um cuidador branco,
numa conversa que serve para realçar as lutas
relacionadas à supremacia branca e intolerância.
Primeiro, o cuidador (Bob Brophy) importuna o homem
sem braços: “Por que você não se estica até aqui e bebe
um gole de água bem gelada?”. A cena dramatiza uma
hierarquia racial que é “inseparável da locação de um
hospital para veteranos durante a Guerra do Vietnã —
ativistas Black Power e de outros grupos frequentemente
criticavam a Guerra do Vietnã, apontando-a como um
conflito de homens brancos em que negros lutavam de
forma desproporcional”.38 Em seguida, o cuidador revela
que tentou se alistar, mas, para sua grande vergonha, foi
considerado inadequado. O cuidador então transfere a
sua falha para Eddie: “Grandes coisas você deitado aí,
sabe, são os meus impostos e os impostos dos meus
amigos que te sustentam aí. A gente vai cuidar de você.”
Eddie é sumariamente desprezado por ser um tolo ao ter
caído no “golpe” do patriotismo, enquanto era reduzido à
assistência governamental — os brancos precisam
“cuidar” dele.
A noiva de Eddie, a dra. Winifred Walker (Ivory Stone),
o transfere do hospital para os cuidados do gentil médico
branco dr. Stein (John Hart). O dr. Stein, como no clássico
Frankenstein (1931), trabalha em sua casa que mais
parece um castelo, contando até mesmo com um
laboratório no porão. Contudo, Eddie não se torna
monstruoso por causa do dr. Stein; seu destino é selado
por Malcomb (Roosevelt Jackson), um assistente negro
muito ciumento do dr. Stein, que sabota a relação de
Eddie e Winifred. Malcomb manipula as drogas de Eddie,
transformando-o em um monstro restaurado e capaz de
se mover, mas que é um perigoso psicopata. Aqui, assim
como a falha de Blácula em se engajar diretamente com
as opressões brancas, um país branco que o forçou a
lutar em primeiro lugar, Blackenstein “corrompe umas
das maiores contribuições da história de Frankenstein:
seu foco na origem da violência [difundindo assim] os
alvos da fúria do monstro”.39 O cuidador branco encontra
o seu esperado fim violento. Contudo, assim como
Mamuwalde, Eddie fica feliz em matar inocentes, pessoas
negras aleatórias. Quando Eddie opta por estripar uma
negra, ele só faz isso depois que o público recebe uma
longa e “valiosa” tomada dos seios expostos e
balançantes da mulher.
As cenas de matança são temperadas, contudo, com o
baixo orçamento do filme. Os ataques assassinos de
Eddie são filmados com pouca iluminação e encenados
no meio da escuridão cheia de sombras. Como resultado,
o filme ganha uma atmosfera inesperada, com um tom e
camadas taciturnas. O efeito é único, pois a violência em
tela, que é uma marca registrada dos filmes de terror,
fica em segundo plano em relação às coisas que podem
ser ouvidas — os gemidos angustiados de um monstro
impelido a matar quando não deseja fazer isso, talvez
porque ele (como homem) o fez durante a guerra. O
destino de Eddie não é muito diferente dos veteranos de
guerra aleijados dos Estados Unidos. Ele volta para o seu
país e não é aceito e nem adequado para se misturar aos
demais; enfraquecido pelas drogas (prescritas), ele se
volta para uma vida de crime e é morto por agentes da
lei (cães policiais destroçam Eddie até a morte). Embora
ele tenha sobrevivido a uma guerra em terra estrangeira,
é o seu retorno para a casa que o derrota.
FIGURA 5.2 O MONSTRO DE DUAS CABEÇAS.
American International/Photofest
O monstro de duas cabeças (1972) e Monstro sem
alma (1976) abordaram de forma mais explícita os temas
das relações raciais e experimentos médicos. Duas
cabeças, considerado um dos cinquenta piores filmes já
feitos, conta a história de uma réplica negra diante da
intolerância branca.40 O filme, mais farsesco do que de
terror, conta a história do dr. Maxwell Kirshner (Ray
Milland), um famoso cirurgião racista que está morrendo
e deseja viver ao transplantar sua cabeça para um corpo
(branco) saudável. O jogador da NFL Rosey Grier
interpreta “Big Jack” Moss, um presidiário à espera no
corredor da morte que, embora inocente, se oferece para
doar seu corpo para a ciência em vez de morrer em uma
cadeira elétrica. Sem que o inconsciente Kirshner saiba,
sua equipe cirúrgica coloca sua cabeça no corpo de Jack.
Ambos acordam surpresos ao ver a cabeça um do outro
no corpo de Jack — daí, o monstro de duas cabeças. A
premissa do filme tinha consequências (ridiculamente)
cômicas. “Colocaram a cabeça do branco racista no
corpo de um mano!”, anunciavam as propagandas do
filme e as artes dos pôsteres, que talvez não fossem
metáforas tão sutis para o tratamento dispensado à
negritude pelos criadores de imagens brancos.41
Monstro sem alma, com o diretor negro William Crain
no comando mais uma vez, levou a experimentação
médica e racial bem mais a sério, trazendo o dr. Pryde
(interpretado pelo ex-jogador da NFL Bernie Casey), um
carinhoso médico negro que trata dos pobres em Watts.
O nome do dr. Pryde é obviamente uma jogada de duplo
sentido com o termo pride, uma referência ao orgulho
negro (ele nunca é chamado de dr. Black). No filme —
originalmente lançado como Dr. Black, Mr. Hyde —, o dr.
Pryde faz experimentos para curar a hepatite e a cirrose.
O dr. Pryde desenvolve o que ele acredita ser um
tratamento para as doenças mortais que afligem os
membros da comunidade de Watts, especialmente as
prostitutas. As mulheres são apresentadas em cenas
gratuitas e apelativas. Aparecem frequentemente com os
seios à mostra e, de vez em quando, nuas. O filme revela
mais tarde que o dr. Pryde tem esse ímpeto pela busca
de uma cura porque a própria mãe dele (embora não
fosse uma prostituta) morreu por causa de danos no
fígado. Realmente, essa história é um conto interessante
sobre conquista e comprometimento. O dr. Pryde
alcançou o ápice da educação e, significativamente,
voltou para “casa” com o objetivo de fazer um bom
trabalho, apesar de sua criação problemática. Na
verdade, o filme mostra dois “lares” para o dr. Pryde. O
primeiro é onde ele trabalha, Watts, sua cidade natal.
Contudo, ele não mora em Watts. O doutor vive em um
subúrbio de alto nível, numa mansão gigantesca. É
revelado que a casa de juventude do dr. Pryde era um
bordel de “damas da noite” localizado em uma
comunidade predominantemente (imagina-se) branca.42
Sua mãe era uma faxineira que vivia no local, onde tinha
a responsabilidade de “limpar a podridão”. O trabalho
teve um peso físico e emocional, fazendo com que a mãe
do dr. Pryde começasse a beber e, por fim,
desenvolvesse “essa condição no fígado” que se provou
mortal. Logo, o fato de não morar em Watts não tem a
ver com fuga, mas se trata de um ato simbólico de
reparação.
O dr. Pryde aplica a droga em si mesmo, obtendo os
resultados desastrosos já esperados. A droga transforma
o dr. Pryde em um “cara branco” — um monstro
assassino branco, de olhos azuis e rosto pálido
(presumivelmente o sr. Hyde, embora ele nunca seja
referido dessa maneira no filme). O dr. Pryde vai (de Rolls
Royce) até a cidade, transformando Watts em seu lugar
de caça, onde ele libera o seu ódio reprimido por
prostitutas e cafetões.
Na lista de ódio do doppelgänger, está Linda (Marie
O’Henry), uma prostituta por quem o dr. Pryde se
apaixonou. Conforme a polícia procura pelo assassino,
Linda inicialmente desconfia dos oficiais, ficando em
dúvida se conduz ou não a polícia ao dr. Pryde. Aqui, o
filme expõe uma conhecida linha tênue presente nas
relações entre a polícia e a comunidade negra; o filme
discute abertamente o fato de que os negros se mantêm
longe da polícia: “Na comunidade negra ninguém sabe
de nada, ninguém vê nada e ninguém ouve nada”. O
filme também fala sobre as dificuldades reais que
mulheres negras enfrentam quando correm perigo em
um relacionamento violento — envolver a polícia nem
sempre é uma escolha fácil. A Associação Nacional dos
Assistentes Sociais Negros resume seus medos:

Mulheres de ancestralidade africana


frequentemente não chamam a polícia com
receio de haver brutalidade policial contra os
seus cônjuges ou elas mesmas. […] Mulheres de
ancestralidade africana geralmente não relatam
abusos de violência doméstica com medo de
que a denúncia possa significar uma traição da
raça ou a contribuição para estereótipos
negativos.43

Linda fica frente a frente com o seu atormentador. Ele a


ataca em seu estado monstruoso, mas não a mata,
libertando-a em determinado momento (talvez haja um
pouco do dr. Pryde nele). A polícia chega e, assim como
em Blackenstein, incita os cães policiais a atacarem o dr.
Pryde, uma referência às imagens televisivas da década
de 1960 em que cães policiais atacavam os ativistas do
movimento pelos Direitos Civis. Tentando fugir, o monstro
sobe até o topo da Watts Tower, com helicópteros
circundando acima, relembrando a cena culminante em
King Kong. A polícia atira no monstruoso dr. Pryde — ele
cai em direção à sua morte em meio a uma chuva de
balas. A alusão a negros e símios no fim do filme é
curiosa, pois ela não aparece no romance original de
Robert Louis Stevenson, O estranho caso do dr. Jekyll e sr.
Hyde (1886), nem na meia dúzia de adaptações
subsequentes da história. Contudo, o monstruoso gorila
negro aparece mais uma vez na versão de 2006, O
estranho caso do dr. Jekyll e Mr. Hyde, estrelando o ator
negro Tony Todd de O mistério de Candyman (1992). No
filme, o dr. Jekyll primeiro se transforma no monstruoso
Eddie Hyde. À medida que Eddie Hyde se torna mais
insano e letal, ele (estranhamente) se transforma em um
primata, tenta fugir por um telhado e é baleado como
Kong, mergulhando para encontrar sua morte.
O filme Fight for Your Life (1977) juntou as “piores”
coisas dos negros e dos filmes blaxpoitation. Um plágio
de baixo orçamento de Aniversário macabro, o filme
acompanha três condenados sádicos que estão
foragidos: um asiático, um mexicano e um branco que se
autodeclarou o chefe do trio. Fugindo da polícia, os
homens se escondem em uma cidade pequena
predominantemente branca. O lar que escolhem para se
esconder pertence a um ministro negro no estilo Martin
Luther King, chamado Ted Turner (Robert Judd), que
prega a passividade negra, paz, paciência, e diz que os
humildes herdarão a Terra.
Os Turners são a personificação de uma família
integracionista. Além de viverem em uma comunidade
amplamente branca, seu filho recém-falecido (resultado
de um acidente de carro) tinha uma noiva branca, Karen
(Bonnie Martin), que ainda visita a família. Karen é amiga
da filha dos Turners, uma jovem adulta chamada Corrie
(Yvonne Ross). O filho mais jovem da família, um pré-
adolescente chamado Floyd (Reggie Rock Bythewood),
tem um melhor amigo branco, Joey (David Dewlow), o
filho de um policial local. Uma linha central do filme tem
a ver com a questão do que é mais eficaz diante do
racismo cruel: a paz ou a resistência (armada). A
ideologia de Ted é abraçada por sua esposa, Louise
(Catherine Peppers), mas rejeitada pela “Vovó” (LeLa
Small), uma mulher mal-humorada numa cadeira de
rodas que cospe uma retórica própria do nacionalismo
negro: “É o poder negro que conta!”. No filme, Jesse
(William Sanderson), o condenado branco que se refere
aos parceiros como “china” e “cucaracha”, aterroriza a
família Turner. Ele força a família a participar de atos
degradantes — “Digam: ‘Todos nós, crioulos safados,
estamos com fome’” — e os cobre de xingamentos
racistas. O terror aumenta quando Karen e Joey são
mortos. Ted é espancado com sua própria Bíblia até
desmaiar. Corrie sofre um estupro grupal. Por fim, a
família se revolta pegando em armas e matando seus
atormentadores. Contudo, é Ted quem se encontra no
centro do clímax, quando ele não apenas duela com
Jesse, mas renuncia dramaticamente à sua ideologia de
paz e humildade com um ato de vingança. Ted provoca
Jesse de maneira cruel, chamando-o de “bicha” e
dizendo que ele é menos homem por ter aceitado o
estupro homossexual na cadeia. Ele então acaba com
Jesse, o último dos condenados, com uma arma. Fight for
Your Life foi escancarado em sua mensagem principal —
ideologias integralistas de “dar a outra face” não eram
mais sustentáveis. Contudo, também é um filme
apelativo no qual ideologias desse tipo, além do racismo,
sexismo e até reincidência criminal, eram diminuídas,
reduzidas a um momento na vida de uma família que
pode ser resolvido pelo vigilantismo.
O problema com essa década de exploração industrial
do mercado de filmes para negros era que,
ocasionalmente, um filme de terror de baixo orçamento
mas interessante era lançado, porém seria incapaz de
escapar da pior escória. Soul Vengeance (também
conhecido como Bem-vindo de volta, irmão Charles)
(1975) — dirigido pelo diretor negro Jamaa Fanaka —
apresentou uma das histórias mais chocantes já vistas no
terror: um homem negro faz o seu pênis crescer até um
tamanho descomunal através da força de vontade e une
uma força impossível a fim de usá-lo como arma para
matar brancos racistas. Ao mesmo tempo que o toque de
terror em Soul Vengeance pode provocar incredulidade, o
filme é a resposta mais provocante a: (1) medo do falo
negro; (2) performance do papel de gênero masculino; e
(3) brutalidade policial.
Soul Vengeance começa focando a atenção do público
em um assunto duradouro e divisor nas relações raciais
— brutalidade da polícia branca contra corpos negros.
Charles Murray (Marlo Monte), um traficante, é capturado
pelos “homens” — dois policiais do Departamento de
Polícia de Los Angeles (LAPD). Os policiais levam Charles
até um beco para baterem nele. Um dos policiais, Jim
(Stan Kamber), tenta fazer com que o seu parceiro, Harry
“Free” Freeman (Ben Bigelow), pare de machucar ainda
mais o algemado Charles, mas não consegue. Embora
estivesse aterrorizado e sendo espancado por Harry,
Charles não abaixa a cabeça e é punido severamente
pelo desrespeito — Harry castra Charles com uma
lâmina. Contudo, essa punição em particular foi motivada
por algo que Charles não sabe: a esposa de Harry está
tendo um caso com um negro porque Harry “não é
homem o suficiente” com seu “negócio enrugado”.
Assim, a castração é uma narrativa complexa que
envolve a intolerância, a inveja peniana e a proteção da
feminilidade branca.
Charles então é preso, e há pouca referência feita aos
danos que seu corpo sofreu. Enquanto está na prisão, ele
é consumido por pensamentos de vingança que são
encenados em sonhos e visões. A representação do
estado mental de Charles ecoa os escritos famosos (ou
infames) do nacionalista negro Eldridge Cleaver em Soul
on Ice. Cleaver descreve seu estado mental na cadeia:
“Eu, o Eunuco Negro, despojado das minhas Bolas, andei
pela terra com a minha mente presa em um
Congelador”.44 Charles é liberado depois de três anos na
prisão e volta para a sua casa em Watts, apenas para
descobrir que não pode recuperar boa parte de sua vida.
Charles é confrontado com o fato de que a reincidência
paira sobre ele, dada a diminuição dramática de seu
status social como ex-presidiário. Empregadores
legítimos não querem nada com ele — “Eu não posso
nem mesmo lavar um carro”.
Aqui, o filme coloca o seu terror de lado para
embarcar em uma longa exploração dramática da vida
desoladora que homens como Charles viviam na Watts
dos anos 1970. Charles luta para manter a sua
performance do gênero masculino. Ele inicia uma relação
amorosa com uma mulher, Carmen (Reatha Grey), mas a
união deles é difícil em grande parte porque Charles
lamenta sua incapacidade de apoiá-la financeiramente.
Charles assiste a uma reportagem na televisão sobre
Harry sendo reconhecido pelo trabalho policial altamente
eficiente. A raiva de Charles em relação ao sentimento
de negação da sua performance masculina nas frentes
econômicas e sociais, além da celebração de um policial
corrupto, se manifesta no retorno do filme aos tropos do
terror e por meio do foco no pênis mutilado de Charles.
Seu pênis, ao que parece, não foi completamente
desmembrado por Harry. Em vez disso, ele se cura com
uma musculatura aberrante.
Na conversa, Charles abre o seu caminho até a casa
do policial que o brutalizou e a do procurador que o
processou. Assim que chega na casa deles, Charles
abaixa sua calça, literalmente hipnotizando a esposa
branca de ambos com seu pênis enfeitiçado. Novamente,
a narrativa do filme se alinha com um tipo de discurso
controverso da época:

Muitos brancos se orgulham com a ideia de que


o desejo e a cobiça de homens negros pela
mulher branca dos sonhos se trata de uma
atração puramente estética, mas nada poderia
estar mais longe da verdade. Sua motivação é
sempre tão sangrenta, odiosa, amarga e de
natureza maligna, que os brancos dificilmente
considerariam motivo de orgulho.45

No primeiro ato da vingança de Charles, ele transa com


mulheres enquanto elas estão hipnotizadas. Enquanto
estão sob o feitiço de Charles, ele implanta uma
demanda em suas psiques: elas devem abrir as portas de
suas casas para ele mais tarde, quando os maridos
voltarem do trabalho. As mulheres fazem o que é pedido,
e Charles pega os homens desprevenidos e os mata.
Contudo, o espectador não sabe com certeza como os
assassinatos foram realizados, já que “aquilo que se
esconde fora do quadro ou imprecisamente dentro dele
gera incerteza sobre o que está sendo visto”.46
Finalmente, no assassinato do advogado, o poder de
Charles é revelado completamente. Charles consegue
usar a força de vontade para que o seu pênis cresça
vários metros, e então ele o enrola no pescoço do outro
personagem, estrangulando-o. Essa cena é fascinante,
pois o desejo de Charles de fazer com que o homem
branco “engula tudo” não pode ser realizado de forma
literal, o que iria requerer um encontro bem mais
homoerótico do que o apresentado. Ainda assim, ao
enrolar o pênis de um homem negro ao redor do pescoço
de homens brancos, uma referência ao linchamento —
ainda que altamente erótica — é estabelecida. Dessa
forma, enquanto o homem branco é mostrado como
impotente — por uma esposa infiel e por ter que pagar
por sexo —, o homem negro se torna um “super
garanhão”47 e o homem branco, “uma vítima de seu
próprio monstro de Frankenstein”.48
As ações assassinas de Charles são finalmente
descobertas, ele é perseguido pela polícia e, assim como
muitos monstros negros discutidos anteriormente, é
encurralado em um telhado. A polícia leva Carmen até o
lugar, pedindo para que ela o convença a descer. Na
cena final e dramática do filme, Carmen grita de forma
desafiadora para Charles: “PULA!”. O filme termina
abruptamente. Agora que Charles molestou, matou e foi
revelado que ele possui um atributo físico incomum, é de
se esperar que lhe reste pouco tempo de vida. Na época,
“ninguém queria ver um herói negro ser derrotado”,49
logo, uma morte em que o homem negro tem poder
sobre o próprio destino é melhor do que se entregar — e
a sua vida — aos brancos. O público é deixado com a
impressão de que Charles realmente pulou.50

MULHERES DURONAS
Ao longo das décadas, os papéis das mulheres se
tornaram mais centrais e inovadores no terror. Em filmes
não negros de terror, as mulheres lutaram de maneira
triunfante contra monstros (Laurie Strode em Halloween:
a noite do terror [1978]) e foram aterrorizadas pelo mal
(Pamela Voorhees em Sexta-feira 13 [1980]). Enquanto o
público já havia visto mulheres malvadas antes em forma
de vampiras, tentações, súcubos e rainhas vodu, a
heroína no terror estava apenas começando a fazer
incursões revolucionárias durante a década de 1970.
Carol Clover, em Men, Women and Chain Saws:
Gender in Modern Horror Film, teoriza acerca da forma e
função da heroína no terror, descrevendo-a como a
“Garota Final”. O apelido captura o sentido — ela é a
única que, no fim, não morre. Na verdade, a Garota Final
é a única sobrevivente — superando ao ataque do
monstro, e geralmente sendo a única (como Ripley em
Alien: o oitavo passageiro [1979]). Como Clover explica,
“ela encara a morte sozinha, [e] sozinha encontra a força
para enrolar o monstro por tempo suficiente para ser
resgatada (final A) ou matar o monstro sozinha (final
B)”.51 A Garota Final também é uma sobrevivente —
esperta, habilidosa e uma lutadora diante do mal.
Novamente, elabora Clover, os filmes da década de 1970
começaram a apresentar “Garotas Finais que não apenas
lutavam, mas faziam isso de maneira feroz e até mesmo
matavam o assassino sozinhas, sem a ajuda de
ninguém”.52
O que importa aqui, em parte, é a ausência de um
salvador masculino. Na falta de um salvador masculino, é
a mulher que assume e derrota o monstro. Como Clover
afirma, as qualidades mais importantes de uma Garota
Final são “a qualidade da luta e as qualidades que a
permitem sobreviver”.53 Em Halloween, por exemplo,
quando Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) está encurralada
em um closet pelo mortífero Michael, ela não chora e
entra em colapso, esperando a morte. Em vez disso, ela
entra em modo de luta, até mesmo improvisando uma
arma com um cabide (a única coisa por perto) para lutar
contra o mal. Da mesma forma, Ellen Ripley (Sigourney
Weaver) em Alien: o oitavo passageiro mostra sua
aguerrida capacidade de liderança quando a equipe se
depara com um monstro alienígena imbatível. Enquanto
um homem negro, Parker (Yaphet Kotto), quer atacar de
cara — “Você vai me deixar matar essa coisa, não vai?”
—, é Ripley quem entende que essa abordagem não
funcionaria, assumindo o controle ao gritar: “Cala a boca
e me deixe pensar!”. As Garotas Finais costumam ser
brancas. Quando sua luta com o monstro acaba, a vida
delas volta ao normal. Ripley dorme em paz depois de
ejetar o alien. A vida tranquila e suburbana de Laurie
Stode pode voltar ao normal.54
Contudo, os filmes de terror da década de 1970 com
mulheres negras lidavam com a Garota Final de maneiras
diferentes. As Garotas Finais brancas geralmente não
estavam disponíveis sexualmente e eram masculinizadas
em seus nomes (por exemplo, Ripley) e pelo uso de
armas (fálicas, como facas ou motosserras). Pelo
contrário, as mulheres negras eram altamente sexuais,
com a sedução servindo como uma das peças mais
importantes do seu arsenal. Assim como a Garota Final
branca, as mulheres negras encaram a morte. Contudo,
essas mulheres negras não estão lutando contra algum
bicho-papão; elas geralmente lutam contra o racismo e a
corrupção. Nesse quesito, não é possível dormir depois
que o “monstro” é derrotado, pois o monstro é codificado
amorfamente como “branquelo”, e a opressão dos
branquelos é persistente.
Sendo impossível derrotar o mal (os sistemas de
desigualdade) que as cerca, as mulheres negras em
filmes de terror podem ser descritas como “mulheres
duronas” resilientes. Elas são soldados em uma batalha
duradoura, na qual a vitória total é elusiva. A caminhada
triunfante da mulher negra em direção ao sol promete
levá-la não a uma vida de paz, mas de volta para o meio
da polícia corrupta, homens machistas e “o Homem” que
explora sua comunidade negra.
A Mulher Durona, diferente da Garota Final
(assexuada), geralmente luta não apenas por sua vida,
mas também pela sobrevivência dos homens. Por
exemplo, no filme blaxploitation não pertencente ao
terror chamado Foxy Brown (1974), a personagem Foxy
(Pam Grier) enfrenta o “Homem”, seduzindo seus
inimigos antes de matá-los, enquanto também se sujeita
a abusos físicos e estupro, tudo porque deseja vingar a
morte do namorado. O “filme negro” de terror com
zumbis A vingança dos mortos (1974) apresenta uma
motivação parecida para a sua Mulher Durona. A
personagem batizada provocativamente de “Sugar”
(Marki Bey) deseja vingar a morte de seu namorado
Langston, que foi assassinado por um chefe branco do
crime. Sugar usa sua bela aparência e sensualidade para
se aproximar de seus inimigos, já que não lhe é permitido
batalhar como as outras Garotas Finais. Ela não
abandona a sua sexualidade, nem tem um nome
“masculino” ou possui sua própria arma “masculina”,
tem lábios e quadris, mas nenhuma serra elétrica. Da
mesma forma, a Mulher Durona de Os gritos de Blácula
(1973), Lisa (Pam Grier), entra na luta para salvar não
um, mas dois homens — um deles do vampirismo que
percorre suas veias e o outro, um antigo amor, do ataque
de um vampiro.
O aclamado filme de arte Ganja & Hess (1973)
(vencedor do prêmio Escolha da Crítica no Festival de
Cannes),55 dirigido pelo diretor negro Bill Gunn,
apresenta a história de um homem atormentado e de
uma Mulher Durona malvada. O “filme negro” de terror é
centrado no dr. Hess Green (Duane Jones de A noite dos
mortos-vivos), um arqueólogo atraente e de sucesso. O
abastado Hess é “um homem elegante e sofisticado por
causa de suas roupas, seu Rolls Royce e uma grande
mansão, onde um empregado realiza todos os seus
desejos”.56 O status socioeconômico de Hess é
apropriado, já que a estratégia do diretor era fazer um
filme “contra estereótipos”, refletindo, dessa maneira,
“um desejo honesto de transcender os clichês
debilitantes dos filmes blaxploitation”.57 Assim, Hess foi
oferecido como a antítese das representações da
subclasse urbana e daqueles que recebiam lucros ilícitos
por meio de economias do submundo, como podia ser
visto em inúmeros filmes blaxploitation.
No filme, Hess é empregado pelo Instituto de
Arqueologia e tem um assistente, um negro mais velho,
George Meda (Gunn). Em um momento privado,
enquanto Meda está na recepção esperando para se
apresentar a Hess, ele passa o tempo apontando uma
pistola para o seu reflexo num espelho de parede. Esse é
o primeiro vislumbre que o público tem da insanidade de
Meda.
Hess convida Meda para acompanhá-lo até sua casa,
e, durante sua estadia por lá, ele revela um lado rude,
ofendendo o empertigado e educado Hess com piadas
vulgares. Meda então se esgueira para longe de Hess, faz
um nó de forca, sobe em uma árvore na propriedade e
ameaça se enforcar. Hess compreende que Meda é um
bêbado “neurótico”, uma combinação volátil de
instabilidade. Hess pede a Meda que não se mate na
propriedade dele, pois, argumenta o arqueólogo: “isso
vai dar às autoridades motivo suficiente para que
invadam a minha privacidade com todo tipo de
perguntas humilhantes. […] Eu sou a única pessoa de cor
no quarteirão […], e pode acreditar que a polícia vai me
levar para ser interrogado”.
Meda então ataca Hess, esfaqueando-o “em nome do
Pai, do Filho e do Espírito Santo”. A arma que Meda acaba
usando é uma adaga do povo Myrthia, uma casta antiga
de bebedores de sangue da Nigéria, que é parte da
extensa coleção privada de objetos valiosos de Hess.
Tendo “assassinado” Hess, Meda comete suicídio.
Contudo, a infecção da lâmina faz Hess acordar morto-
vivo e com sede de sangue. Hess guarda o corpo de
Meda em um freezer no porão em vez de chamar a
polícia, evidenciando que até mesmo as elites negras,
não apenas prostitutas como em Monstro sem alma,
continuam a temer a polícia (branca).
Hess então sai à caça de sangue, viajando de sua
gigantesca propriedade até um gueto para se alimentar
dos pobres. O abastado Hess rouba sangue de uma
clínica de doação de sangue. Ele mata uma prostituta e o
cafetão dela por causa de sangue. Outra prostituta, que
cuida do bebê recém-nascido, tem um destino igual,
porém ele deixa o bebê abandonado e intocado,
chorando perto do corpo da mãe. Nesse quesito, Ganja &
Hess se tornou um filme emblemático entre as produções
dos anos 1970 que estavam “desafiando constantemente
a legitimidade do capitalismo, do domínio patriarcal […],
o monstro se tornou um símbolo da revolta na civilização
burguesa”.58
Logo, a esposa de Meda, Ganja (Marlene Clark), chega
em busca do marido, que já havia “desaparecido antes”
durante seus surtos de psicose. Como prometido pelo
nome de Ganja (uma gíria em inglês para a maconha),
Hess fica completamente viciado naquela mulher bela,
mas grosseira. Ganja então encontra o corpo do marido e
pouco depois se casa com Hess. Seus motivos são
simples: ela prefere se casar com um louco
extremamente rico do que ser a viúva de um pobre.
Hess revela o seu segredo para Ganja, transformando-
a com a adaga para que eles possam viver juntos para
“sempre”. Juntos, eles representam personalidades
viciantes — com seu desejo de sangue e indulgências
carnais. Eles trabalham juntos com frequência —
matando e transando, às vezes ao mesmo tempo — até
que Hess conclui que tal existência é insustentável.
Hess procura por uma cura, e a encontra. Ele precisa
aceitar Jesus como seu único salvador e então ficar
diante de uma cruz, com a sombra da crucifixo sobre o
coração. Somente então Hess pode morrer e, quem sabe,
ir para o céu. O filme termina com Hess indo à igreja
para se curar. Ele então volta para Ganja para morrer,
implorando-lhe que se junte a ele em uma morte
pacífica. Contudo, Hess morre sozinho.
Ganja prefere continuar infectada, uma súcubo sexy, e
continua sozinha, fingindo ser de alta classe e educada.
Ela fica na casa de Hess, com sua riqueza, enquanto tem
sua cota de amantes e vítimas. Ganja não apenas
sobrevive ao seu encontro com o monstro, mas escolhe
alegremente se tornar um. Ganja também é uma Mulher
Durona sexy e sexual, que encontra a vitória na morte
dos seus dois maridos e agora, completamente
independente (livre dos maridos e cheia de dinheiro),
pode realizar todo e qualquer desejo. Ela não é mais
amarrada ou aterrorizada; mas ela mesma aterroriza
(homens) alegremente. Ela não espera que um príncipe
em seu cavalo branco vá ao seu resgate; assim, Ganja
desenvolveu maneiras de assegurar sua própria
sobrevivência e ter sucesso.
Ganja & Hess foi, inicialmente, “suprimido” pelos seus
produtores porque o filme se distanciava muito do
blaxploitation que havia se tornado tão popular naquela
década. “Os produtores”, escrevem Diawara e Klotman,
“queriam um filme para explorar o público negro — uma
versão negra dos filmes de vampiros brancos. Contudo,
eles se afastaram quando Gunn foi além do gênero
vampiresco para criar um produto original”.59
PAM GRIER: EXPLORANDO A MULHER
DURONA
Pam Grier se tornou um ícone da era blaxploitation,
estrelando em sete filmes só para a AIP.60 Ela se tornou,
como Dunn descreve em “Bad Bitches” and Sassy
Supermamas, uma musa da AIP e do cinema negro, o que
ajudou a “estabelecer a imagem de deusa sexual de
Grier”.61 Contudo, Grier não foi lançada pela AIP como
uma deusa sexual no estilo de atrizes brancas como Ava
Gardner, Elizabeth Taylor, Hedy Lamarr ou Lauren Bacall.
Em vez disso, ela foi confinada ao estereótipo da negra
gostosa — uma “imagem dominante”, como Hill Collins
descreve, da sexualidade feminina negra, em que as
mulheres negras se tornam um símbolo da sexualidade
feminina depravada, enquanto a heterossexualidade
feminina branca se torna o “culto” da verdadeira
feminilidade.62 Tais imagens relegavam as mulheres
negras à “categoria de mulheres sexualmente
agressivas”, o que logo justifica e abre espaço para
abusos sexuais.63 Por exemplo, em Foxy Brown (1974) a
personagem de Grier é drogada e sofre um estupro
coletivo (por racistas brancos). O terrível encontro é
apresentado como um desafio necessário, pois permite
que Foxy se vingue daqueles que maltrataram seu
namorado. Em Coffy: em busca de vingança (1973),
Grier, interpretando Coffy, se oferece para se disfarçar de
prostituta — o que requer que seu cafetão faça um
“teste” com ela.
FIGURA 5.3 HESS E GANJA EM GANJA & HESS.
Kelly/Jordan Ent./Photofest
A marca de Grier era sua nudez parcial. A câmera se
detia em seus seios redondos e em suas pernas longas
enquanto ela passava por todo tipo de exploração sexual.
Dunn escreve:

A exibição dos corpos sexuais de mulheres [era]


permitida pelo atenuação geral das tradicionais
regras de Hollywood em relação à violência,
conteúdo sexual e linguagem profana. Contudo,
no caso de Grier, essa exibição está
intrinsicamente ligada à […] insistência da AIP
em mostrar o empoderamento e a resistência
feminina negra por meio do tratamento
pornográfico de sua estrela.64

Embora a prontidão sexual não exclua imediatamente o


“apelo feminista”, o tratamento de Grier e de outras
estrelas do cinema blaxploitation era distintamente
sexual — elas estavam sempre disponíveis para o sexo,
independentemente de quão violento fosse.65
De maneira notável, Grier é desatrelada dessas
imagens misóginas no “filme negro” de terror Os gritos
de Blácula (1973). Os gritos é a continuação de Blácula:
o vampiro negro, que foi dirigido pelo diretor negro
William Crain e estrelado pelo aclamado ator de teatro
(Broadway) e cinema, diretor e cantor de ópera e jazz
William Marshall. Talvez o tratamento não pornográfico
de Grier possa ser atribuído à influência de Marshall e a
uma insistência antecipada de que Blácula deveria evitar
a estereotipação. Novotny Lawrence, em Fear of a
Blaxploitation Monster: Blacks as Generic Revision in AIP’s
Blacula, detalha a influência de Marshall:
Enquanto Blácula estava em desenvolvimento,
William Marshall colaborou com os produtores
para se certificar de que o primeiro monstro
negro do terror possuísse um nível de dignidade.
No roteiro original, o nome humano de Blácula
era Andrew Brown, que é o mesmo nome de
Andy na dupla Amos e Andy, comediantes que
usavam pintura blackface. Marshall criticou o
nome, comentando: “Eu queria que o filme
tivesse uma nova história ao redor dele. Uma
história que removesse completamente o
estereótipo de ignorância e estupidez conivente
que se desenvolveu nos Estados Unidos para
justificar a escravidão”. […] Marshall convenceu
os produtores a incorporarem suas sugestões, e
o primeiro vampiro negro emergiu como uma
figura da realeza.66

A conduta de Marshall, sua estatura e seus trabalhos,


tendiam a apresentar os negros fora dos tropos
exploradores (por exemplo, no palco ele interpretou
Otelo, Paul Robeson, Frederick Douglass, um cantor de
ópera e um médico). Parecia que ele não tomaria parte
em um papel que representasse um abusador (sexual).
Daí, dado o tratamento de Pam Grier em outros filmes, é
digno de nota que Lisa, sua personagem em Os gritos,
permaneça vestida e até de forma conservadora. A
maquiagem pesada está ausente, assim como roupas
despudoradas e grandes perucas que eram as
vestimentas usuais de Grier. Em vez disso, seu cabelo
natural — um afro curto — foi exibido em Os gritos. E ela
é vista constantemente de calças com camisas de
colarinho alto, negando ao público um olhar objetificador
em direção às suas pernas e ao decote. No filme, Lisa
tem uma pose séria e até mesmo profissional, trazendo
um ar de dignidade para a usualmente difamada religião
vodu. Confrontada por pessimistas, Lisa e outros definem
o vodu como “uma ciência muito complexa” e como
“uma religião baseada na fé”. Em uma cena, Lisa vai até
uma funerária para rezar por um amigo falecido. Ela
acende velas, monta um pequeno altar e começa sua
prece em silêncio — não há nenhum estereótipo, dança
frenética, batuques ou cantoria. Suas orações são mais
parecidas com uma meditação pensativa.
O ponto mais inovador de Os gritos de Blácula é a
inclusão de Lisa como uma Mulher Durona esperta e
heroica. No filme, o vampiro Blácula é ressuscitado por
meio de um ritual vodu praticado por Willis (Richard
Lawson), o irmão egoísta e irritado de Lisa, sua irmã
adotada. Willis deseja usar Blácula para se vingar de
Lisa, a quem ele se refere como “vadia inútil”, e de
outros membros do culto vodu que não o escolheram
como “Papa Loa”. Contudo, Blácula não está feliz com o
seu retorno forçado. Quando ele é chamado pelo nome
real e principesco, “Mamuwalde”, o vampiro angustiado
grita: “O nome é Blácula!”. Atormentado pelo seu
destino, Blácula pede a Lisa que use suas habilidades
vodu para livrá-lo da maldição vampírica e matá-lo, a fim
de que ele possa descansar em paz. Aqui, Lisa é
mostrada como heroína e salvadora. Contudo, existe
uma limitação crucial nessa representação, como Clover
explica: “Diante disso, o filme sobre o oculto faz parte do
mais ‘feminino’ dos gêneros do terror, contando
geralmente histórias de mulheres ou garotas nas mãos
do sobrenatural. Mas, por trás da ‘fachada’ feminina, há
sempre a história de um homem em crise”.67
Na verdade, a pressão em Lisa para que cure Blácula
é aumentada quando ele ameaça matar seu ex-
namorado, Justin (Don Mitchell), com quem ela ainda
mantém uma amizade. Lisa agora precisa salvar os dois
homens. Diferente de seus iguais do gênero masculino,
que “ficam com a garota”, Lisa não fica com nenhum dos
homens ao salvá-los. “Se isso indica alguma coisa”,
escreve Bogle, “é que essas heroínas exibiam a situação
triste dos relacionamentos de mulheres negras nos
filmes. Pouquíssimos filmes tentaram explorar as tensões
ou aspirações de uma mulher negra ou examinar as
dinâmicas das políticas sexuais dentro da comunidade
negra”.68 Após sobreviver ao seu encontro com um
vampiro, quando outros não conseguiram, protegendo o
seu ex da morte e salvando a alma de Mamuwalde, Lisa
possui a característica principal das Garotas Finais: “ela
encontra os corpos mutilados dos amigos e percebe a
ampla extensão do horror precedente[; ela mostrará]
mais coragem e calma do que [sua] contrapartida
chorona masculina”.69 O triunfo de Lisa não foi
simplesmente o fato de ter sobrevivido sem a ajuda de
um/seu homem. Mas o fato de também representar a
figura de uma Mulher Durona. A batalha dela não
acabou. Por exemplo, sua luta contra homens machistas
e contra estereótipos (vodu como um culto) vai
continuar. A Mulher Durona sabe que ainda restam
grandes desafios para ela e para a sua comunidade.
Abby (1974) também foi um dos “filmes negros” de
terror mais interessantes (independentemente da
acusação de quebra de direitos autorais feita pelos
criadores de O exorcista) por causa de seu foco na
diversidade sexual.70 O filme começa com um professor
de arqueologia e teólogo, Garnet Williams (William
Marshall), libertando acidentalmente um espírito maligno
durante uma escavação na Nigéria. O demônio do sexo
viaja até os Estados Unidos e se aloja no lar cristão de
Abby (Carol Speed), a nora de Garnet. Abby é casada
com o reverendo Emmett Williams (Terry Carter) e
trabalha na igreja do marido como conselheira de
casamentos. A novidade em Abby está no fato de que ela
é possuída por um demônio masculino, Exu (com a voz
de Bob Holt), um deus iorubá “impregnado de uma
ideologia cristã ocidental e contrária ao sexo”.71 Como o
pôster de cinema anunciava, “Abby não precisa mais de
um homem”, o filme apresenta uma intrigante narrativa
de múltiplas sexualidades: um espírito masculino busca
conquistas sexuais de dentro do corpo de uma mulher.
Por exemplo, através de Abby o demônio pergunta a um
homem: “Você quer foder a Abby, não quer?”. O demônio
transa com suas vítimas (homens) e, no auge do ato, os
mata. O filme desnuda e complica a
heteronormatividade, pois os homens são atraídos pela
aparência exterior e feminina de Abby, que exala
sexualidade e tem pouca dificuldade ao seduzir suas
vítimas.
FIGURA 5.4 A MONSTRUOSA ABBY EM ABBY
American International
Pictures/Photofest
Ao longo do caminho, o filme se aproveita da
caracterização de Garnet como um
professor/teólogo/ministro (e o porte de autoridade que
William Marshall traz aos seus papéis) ao inserir
comentários educativos sobre Exu: (1) ele toma a
responsabilidade por desastres naturais; (2) ele é uma
das divindades terrenas mais poderosas, mais do que os
poderosos orixás; e (3) Exu é o deus da sexualidade, um
pregador de peças, criador de turbilhões e caos. Por fim,
por meio de um exorcismo de origem iorubá, Abby é
libertada da possessão. O efeito é causado pela
apresentação de uma religião negra de uma maneira
marcadamente diferente dos, por exemplo, muitos filmes
de terror com temática vodu que mostram a religião
como singularmente estranha, desprovida de história e
ruim.
Com exceção desses pontos narrativos de interesse,
Abby era o típico filme de terror de baixo orçamento,
com o New York Times chamando-o de “bobo”.72 Abby
não é uma Garota Final ou uma Mulher Durona, já que é
salva de uma vida de sexo e festas (e assassinatos) pelo
sogro, marido e irmão policial enquanto volta à boa graça
do seu Deus (ocidental) masculino.
Por mais questionadores que os filmes (negros) de
terror sejam, eles não têm sido tão inovadores naquilo
que se refere à quebra de narrativas tradicionais acerca
do sexo e da sexualidade. Por exemplo, com poucas
exceções, os filmes centrados em monstros-gorilas ou
vampiros têm histórias de amor heteronormativas ao
fundo. Não é de surpreender, então, que a Abby-
predadora-sexual precise ser derrotada, não apenas por
causa da possessão e porque ela mata sua presa, mas
porque “a sexualidade transgressora é definida como
monstruosa”.73 Ainda assim, a performance de Abby é
(talvez de forma não intencional) independente, liberada
sexualmente e confiante. Enquanto está possuída, Abby
é sociável e forte tanto em personalidade quanto em
força física. Não fosse uma assassina, ela poderia ser um
forro interessante para leituras de uma pessoa livre das
amarras de gênero e sexuais.

IRMÃS SENSUAIS: COMO SEMPRE FOI


O vodu se tornou tão esperado em filmes de terror que
um periódico se mostrou desapontado quando essa
faceta da cultura negra deixou de estar presente nas
produções. A revista de cultura negra Jet questionou por
que os filmes negros de terror deveriam se basear na
lenda cristã do Drácula “quando havia o vodu na
experiência negra”.74 O “filme negro” de terror A
vingança dos mortos (1974) tentou recuperar o vodu. Se
a maior parte dos filmes blaxploitation celebrava um
“‘crioulo malvado’ que desafiava o opressivo sistema
branco e vencia”,75 então A vingança dos mortos
celebrava a “Vadia Durona”76 que fazia o mesmo,
embora usando o vodu. Em A vingança dos mortos, os
negros — especialmente os negros acorrentados da
Guiné que acabaram em Nova Orleans — são os zumbis
mortos-vivos. Os zumbis são convocados por Mama
Maltresse, uma rainha vodu (Zara Cully), em nome de
Sugar (Marki Bey), para realizar uma vingança contra
Morgan (Robert Quarry), o “branquelo” chefe do crime, e
seus capangas que mataram o namorado de Sugar.
O exército silencioso, mas mortal, de zumbis tem um
líder pensante e sagaz entre os seus membros — o Barão
Semedi (Don Pedro Colley).77 Semedi age como um líder
sindical, negociando os termos sob os quais ele e seus
zumbis trabalharão. Ele nota rapidamente que seus alvos
são maus e irrecuperáveis — assassinos, racistas e
mestres na arte da extorsão. Como resultado, ele e sua
horda irão matar alegremente Morgan e sua gangue. Os
zumbis são heróis. A identificação com os monstros em A
vingança dos mortos gera um “ato prazeroso e
potencialmente empoderador”,78 já que os zumbis
representam uma estrutura pró-negros de homens
negros acabando com os “branquelos” — realmente, “os
heróis negros estavam vencendo e a identificação da
comunidade foi intensa”.79 Os zumbis matam de forma
particularmente grotesca um homem negro “vira-
casaca”, Fabulous (Charles Robinson), que deixa Morgan
chamá-lo de “crioulo” e engraxa os sapatos do chefe.
Sugar está presente durante quase todo o caminho,
conforme seu exército de zumbis derruba seus inimigos:
“Ei, branquelo, você e os seus amigos idiotas mataram o
meu homem […]. Eu não estou te acusando, babaca,
estou passando a sentença, e a sentença é de morte”.
Contudo, a imagem dela está longe de ser a de uma líder
focada e competente. Sugar é apresentada como a
“Gostosa Vodu”80 que atenta e provoca sua presa vestida
com roupas decotadas e apertadas. A representação da
personagem apresenta a aderência do filme aos papéis
tradicionais de gênero. Pouco depois da morte de seu
namorado, Sugar flerta com seu ex-namorado, um
policial chamado Valentine (Richard Lawson). A
mensagem paira — Sugar não consegue ficar sem um
homem. Ela sugere disponibilidade sexual tanto para
amigos quanto para inimigos. Ela até mesmo participa da
obrigatória briga entre mulheres contra outra gostosa
(branca), Celeste (Betty Ann Rees), a namorada de
Morgan. A representação de Sugar “nega qualquer
mudança na representação narrativa de mulheres
negras”; ela não toma o poder dos homens de verdade.81
Esse equívoco se mostra de maneira objetiva quando
Sugar oferece sua alma a Semedi em troca de seus
serviços, o que ele rejeita, proclamando de maneira
lasciva: “Não estou interessado em almas”. Fica
subentendido que ela deve entrar para o harém de
“esposas” dele.
FIGURA 5.5 O DECOTE DE SUGAR CONVIDA MAIS OLHARES DO QUE SEUS
ZUMBIS EM A VINGANÇA DOS MORTOS.
American International Pictures/Photofest
Em A vingança dos mortos, os zumbis cumprem o seu
contrato e, quando chega a hora de Sugar pagar com o
próprio corpo, ela oferece uma barganha. Semedi, que é
descrito como sexualmente faminto, recebe Celeste
como oferenda. A aceitação da mulher branca por
Semedi — que “preferia” Sugar, mas diz que Celeste “dá
pro gasto” — deve ser lida de maneira política: a punição
apropriada para uma mulher branca “protegida”. Por
outro lado, a prática de negociar mulheres é machista e
objetificante; ainda que a “escravidão branca” de Celeste
brinque com um tabu importante.
Embora as Mulheres Duronas estivessem se tornando
raras nesse ciclo cinematográfico, as mulheres negras
continuaram a aparecer de maneira proeminente em
filmes como Vampira (1974) e A fera deve morrer (1974).
Vampira é uma comédia de terror “com negros” que
conta a história de um “Velho Drácula” (David Niven)
que, velho demais para caçar vítimas jovens, atrai suas
presas para o seu castelo, que ele abriu para turistas. A
esposa de Drácula, Vampira, também está aposentada,
por isso ele faz uma transfusão nela usando o sangue de
uma de suas vítimas para revitalizá-la. Mas, por acaso,
esse sangue pertence a uma mulher negra, o que, em
Vampira, a deixa mais jovem e negra — justificando (e
extrapolando) a mítica “regra da única gota de sangue”.
Vampira (Teresa Graves) agora é considerada uma figura
sexy, fazendo valer o mantra black is beautiful. Como
Null observou na época, “se filmes negros mal
começaram a elevar as mulheres a papéis de
personagens reais, pelo menos as ideias brancas de
beleza se foram”.82 Incapaz de “curar” a esposa, cuja cor
da pele faz com que ela fale com o linguajar negro,
Drácula se junta a ela de má vontade, com Niven
aparecendo na cena final do filme com pintura blackface.
No filme A fera deve morrer, que também é um
produção de terror “com negros”, Marlene Clark
interpreta Caroline, a bela esposa de Tom (Calvin
Lockhart), um rico caçador de grandes animais.83 Esse
casal negro de elite, Tom e Caroline, juntamente com
Pavel (Anton Diffring), seu assistente branco, recebem
cinco convidados brancos em uma residência numa ilha
com a esperança de descobrir qual deles é um
lobisomem. Tom fica devastado quando sua amada
Caroline é acidentalmente infectada por um dos
convidados, que é o verdadeiro monstro. Em uma cena
desesperadora, ele precisa matar a esposa com uma bala
de prata para que ela não inicie seu próprio surto
assassino de licantropia. Embora sejam filmes bem
diferentes, Vampira e A fera compartilham o tema de
mulheres negras como desejáveis e valiosas, mas que
também são atingidas por uma mácula que ameaça seus
homens.
A vingança de J.D. (1976) ecoa A vingança dos mortos
por suas semelhanças no que diz respeito à possessão e
ao amor negado. No entanto, A vingança é um filme
incrivelmente machista, exaltando Sugar por meio de um
subtexto misógino e antifeminista que correlaciona
independência e revolução sexual das mulheres à
arrogância.
A vingança de J.D. (1976) conta a história de Isaac, um
residente de Nova Orleans, também conhecido como
“Ike” (Glynn Turman), um jovem certinho e estudante de
direito que está se preparando para a prova da ordem
dos advogados. Sua namorada, Christella, ou “Chris”
(Joan Pringle), convence Ike a fazer uma pausa nos
estudos para um encontro com os amigos na cidade. O
grupo visita um clube noturno onde um hipnotista está se
apresentando. Ike está entre os vários que se oferecem
para serem hipnotizados. Algo dá errado enquanto ele,
“hipnotizado”, fica possuído pelo espírito furioso de J.D.
Walker, um mafioso da década de 1940. Walker quer
vingança para ele e para sua irmã Betty Jo (Alice Jubert),
por seu assassinato há mais de três décadas, em 1942.
J.D. possui o corpo de Ike numa tentativa de revelar as
verdadeiras circunstâncias que envolveram os
assassinatos. À medida que o violento criminoso se
mostra mais dominante no corpo de Ike, Chris se torna
uma vítima. Chris é visto em pé de igualdade com Isaac.
Ela habilmente questiona Ike em relação a conceitos
jurídicos e o ajuda a se preparar para o teste. Ela é
sincera, tem uma rede de amigos e fica implícito que
vive do seu próprio dinheiro. Em uma cena, numa
inversão de papéis de gênero, Chris investe no sexo
enquanto Ike recusa, dizendo: “Hoje não, estou com
coisas demais na cabeça esta noite”. O público descobre
que o gentil Ike nem é considerado homem pelo seu
amigo Tony (Carl Crudup) por tratar a sua namorada com
respeito. Quando Ike (possuído por J.D.) estapeia Chris, o
colega o elogia por finalmente ter virado macho:

Eu acho que é uma coisa boa acertar a cabeça


de uma mulher quando ela começa a falar
demais. Quer dizer, acredite ou não, elas gostam
disso. É, cara, juro por Deus, você precisa agir
feito um crioulo doido de vez em quando. Elas
vão te irritar até que você faça isso. Elas querem
que você imponha limites. Quer saber, mano? É
animador ver que você fez o que fez. Desde que
eu te conheço você sempre pareceu… você era
meio reprimido […] Isso é fantástico, mano.

Colocar Chris no lugar dela por meio de pancadas é


particularmente importante porque — o público acaba
notando — ela gosta e entende de futebol, não permite
que Ike guarde seus tênis fedidos no apartamento deles,
e é uma mulher divorciada que largou o marido.
Um ponto narrativo interessante é que, com exceção
de uma mudança no estilo — um chapéu fedora, o cabelo
conk e um terno estilo anos 1940 —, a nova
personalidade masculina brutal de Ike não parece fora de
lugar na década de 1970 (o contexto da segunda onda
do movimento feminista); ao contrário, sua atitude é
recompensada. Como J.D., Ike é ríspido e perigoso —
traços que as mulheres (certamente) acham sedutor. Ike
escolhe uma mulher atraente em um bar e a acompanha
até a casa dela, dando-lhe “a melhor trepada que já tive
na vida”. Quando o “coroa” da mulher os flagra, J.D. se
delicia em cortar o homem com uma lâmina, o auge de
sua bravata hiper-masculina.
Quando Chris vê Ike chegar em casa bêbado, ela fica
furiosa. J.D./Ike, então, revela o que há de errado com
mulheres como ela (diferente daquelas que ele
atualmente encontra nos bares) ao chamá-la de “vadia”
e “puta” enquanto grita: “Como você ousa falar comigo
como se eu fosse um crioulinho veado qualquer?”. Em
determinado momento, Chris é completamente
silenciada quando J.D. a espanca cruelmente e a estupra,
colocando um fim nas estripulias da mulher.

O filme, Benshoff observa,

sugere um homem capturado entre duas


construções diferentes da masculinidade afro-
americana, quando Ike […] trata a sua
namorada como um cafetão trataria sua
prostituta. O filme aponta que o estilo e a
brutalidade masculina de J.D. ainda são
problemas contínuos na cultura negra masculina
dos anos 1970.84
Além disso, o filme comunica, por meio de J.D./Ike, que a
performance feminina independente de Chris deve ser
rejeitada. Chris não é uma Garota Final nem uma Mulher
Durona; seu ex-marido surge para ajudá-la, e no fim ela
retorna alegremente para Ike.

SÓ PODIA DAR NISSO


Eu andei pelo cemitério como um raio.
Fiz as lápides saltarem e deslumbrei os mortos.

— Rudy Ray Moore85

O fim dos “filmes negros” de terror foi marcado por uma


comédia do gênero que entreteve alguns, mas que
deixou muitos outros confusos enquanto especulavam se
o declínio inevitável do gênero blaxploitation não havia
chegado tarde demais. A epítome da era blaxploitation, o
comediante Rudy Ray Moore, lançou o filme Petey
Wheatstraw (1977). Esse filme estarrecedor começa com
a Mãe Wheatstraw (Rose Williams) deitada em uma cama
dentro de uma cabana, em trabalho de parto, cercada de
parteiras vestidas como “mães pretas”. Ela está tendo
um parto difícil, e um médico branco é chamado para
auxiliar no nascimento. O médico primeiro faz o parto de
uma grande melancia e, por fim (como se fosse uma
placenta), sai um garoto brigão de sete anos de idade
completamente formado e cuspindo palavrões. O garoto,
Petey Wheatstraw (Clifford Roquemore II), nasce ao som
de tambores e com os gritos de “Ele está vivo! Ele está
vivo!” do médico, uma frase roubada de Frankenstein.
A história desse filme com orçamento dos mais baixos
é bem indecifrável (uma “bengala de cafetão” figura de
maneira proeminente); contudo, o motor da narrativa é o
fato de que o adulto Petey Wheatstraw (Rudy Ray
Moore), um comediante, é assassinado por rivais. Petey
recebe uma nova vida pelas mãos do Diabo, com a
condição de se casar com a mulher mais feia da terra —
a filha do Diabo. Ao longo da história, Moore faz rimas e
raps cômicos.
Petey Wheatstraw foi um olhar reflexivo para os filmes
dos anos 1970, já que Moore se apropriou e parodiou os
aspectos mais clichês das artes marciais, de conteúdos
apelativos e de filmes B e colocou em seus filmes. Por
exemplo, quando garoto, Petey é treinado como Caine do
seriado Kung Fu86 por um misterioso mestre ancião das
artes marciais. Mais tarde, já adulto, Petey usaria (mal)
seus golpes de caratê contra assaltantes, incluindo
“demônios” vestidos de colã roxos e capas, trazendo
chifres vermelhos na cabeça. Entre lutas e escapadas, o
corpulento Wheatstraw também é apresentado como
símbolo sexual, um amante insaciável que possui uma
horda de mulheres. Moore, alinhando-se aos temas do
blaxploitation que ele aperfeiçoou em seus filmes
anteriores (como Dolemite [1975]), incluiu até mesmo
uma linha narrativa de vingança-contra-o-branquelo. Para
Moore, suas contribuições estavam longe de ser
apelativas: “Quando a gente não estava apanhando e
levando na cabeça, eles chamavam de ‘blaxploitation’, e
eu acho que isso foi extremamente rude para nós como
pessoas”.87 Thomas Cripps resumiu o fim do
blaxploitation indicando o filme de Moore:
“Previsivelmente, tais filmes ‘blaxploitation’ logo
perderam a graça e enfrentaram a rivalidade dos filmes
asiáticos de artes marciais, uma nova geração de filmes
de monstros da ficção científica e outras criaturas”.88
Sem nenhuma surpresa, o gênero não conseguiu se
manter, já que a natureza apelativa dos filmes —
conteúdo, investimento, qualidade — perdeu a graça. Em
1977, o mesmo ano em que Petey Wheatstraw foi
lançado, uma universidade historicamente negra “abriu
sua temporada de filmes de primavera não com um dos
efêmeros heróis negros como Shaft, mas com O
massacre da serra elétrica”.89

CONCLUSÃO
Embora muitos dos filmes de terror dos anos 1970
tivessem sido apelativos de várias maneiras — em
orçamento, em qualidade, em seu tratamento do corpo
feminino e em sua representação dos desfavorecidos —,
eles não deveriam ser prontamente deixados de lado
como filmes esvaziados de um discurso relevante. Os
“filmes negros” de terror e os filmes de terror “com
negros” da década deixaram o público com uma
indicação clara da função e do papel de raça, gênero,
sexualidade, cultura e classe na cultura popular, e de que
maneira essas identidades podem, de forma certa ou
errada, ser refletidas no mundo social. Nos filmes, as
lutas contra essas opressões, e temas de levante
(intra)racial diante de tais opressões, dialogavam com a
retórica da não violência e integração, assim como
resistência armada e autoconfiança negra, se não
supremacia. Os filmes se esforçaram para revelar ao
público que, para os negros, o horror (ou o monstro)
estava localizado dentro da branquitude — o branquelo,
o sistema, o Homem. Diferente dos filmes de terror dos
grandes estúdios, em que Garotas Finais enfrentam um
mal individual (como um alienígena com uma sede
mordaz de sangue) e lutam para derrotá-lo, os filmes
negros revelaram que o mal que circundava a negritude
era duradouro.
Enquanto “o público negro sempre foi uma parte
substancial do público de terror”, esses filmes dos anos
1970, que saudavam especificamente o público negro,
encorajaram os negros a enxergarem para além do
monstro, identificando-se com as mensagens de
igualdade negra por meio da união metafórica (exércitos
de zumbis) ou por meio de um projétil metafórico
(poções vodu ou o pênis).90 Com estrelas negras nesses
papéis, ainda que apelativos em determinados
momentos, sua presença e performance superaram o
tratamento que negros recebiam em filmes de terror
antigos, em que eram retratados como figuras
assustadas, que tremiam de medo e arregalavam os
olhos. Os negros, nessa época, eram orgulhosos.
O período nem sempre foi puramente reacionário em
relação aos tipos de racismo e classismo que os negros
enfrentavam na época. Ganja & Hess, por exemplo,
excluiu amplamente a branquitude numa tentativa de
privilegiar histórias saídas da negritude. Aqui, não
haviam “figuras de papelão” e personagens
“simplificados” que faziam sua reputação “ao matar
vilões brancos em tela”.91 Filmes negros de terror que se
esforçavam para fugir dos tropos do blaxploitation
tradicional encontraram uma resposta morna entre
alguns frequentadores de cinema, como explica o
produtor Rob Cohen: “Eles querem um tubarão atacando
uma praia de veraneio ou tramoias nível Um Golpe de
Mestre. Se existe uma coisa que a audiência não quer é
uma mensagem. E se há algo além disso, esse algo é
uma mensagem negra”.92 Em resumo, os filmes da era
blaxploitation enfrentavam um dilema multifacetado de
ser cultural e politicamente negro em demasia, de não
ser negro o suficiente ou de não ser puro entretenimento.
Os filmes blaxploitation de terror mostravam
personagens bem homogêneos e limitados — em classe,
gênero, políticas e interações com os brancos. O jornal
Washington Post previu que a tendência cinematográfica
se voltaria para “negros interagindo entre eles mesmos
ou com brancos”.93 Além disso, o jornal expressava
otimismo em relação ao tratamento representacional dos
negros, que eram “mostrados como humanos completos
— bons e maus, ricos e pobres, espertos e burros”.94
Qualquer previsão de interação mais substantiva para a
década seguinte não se concretizou. Na década de 1980,
os negros foram associados aos temíveis espaços
urbanos, fazendo com que os brancos fugissem para os
subúrbios. Os negros e seus filmes de terror foram
colocados na geladeira à medida que o gênero voltava
suas atenções mais exclusivamente para os medos da
classe média branca.
HORROR
NOIRE

1980
NÓS SEMPRE MORREMOS PRIMEIRO
— INVISIBILIDADE, SEGREGAÇÃO
RACIAL ECONÔMICA E O SACRIFÍCIO
VOLUNTÁRIO

E, toda noite, faça uma oração ao santo


padroeiro da morte negra, Scatman
Crothers, que levou uma machadada por
causa daquele moleque maluco em O
iluminado para que outros seguissem o
seu caminho. — HARRIS1

Durante os anos 1980 o mundo urbano (também


chamado de interior urbano, a “quebrada” ou gueto na
cultura popular) foi mostrado como um ambiente
amplamente habitado por negros e outros não brancos, o
lar de problemas exclusivos dos “Outros”. A paisagem
urbana, escreve Nama em Black Space, “se tornou um
atalho político para se discutir uma miríade de mazelas
sociais que afetam os negros de maneira desproporcional
— como a pobreza, crime, abuso de drogas, alto
desemprego e abuso de políticas do bem-estar social —
sem focar na raça como a fonte específica do problema.
Em vez disso, as localizações espaciais e geográficas
definiram o escopo do problema”.1 Espaços urbanos
foram mostrados como lugares em que as escolas eram
mal equipadas (Meu mestre, minha vida [1989]) e onde
os alunos se comportavam de maneira insolente (O preço
do desafio [1989]). As vizinhanças urbanas abrigavam
gangues (As cores da violência [1988]). Eram lugares
onde o assassinato e o tráfico de drogas encontravam-se
desenfreados e sem limites (Scarface [1983]), e onde os
criminosos comandavam a polícia (Robocop: o policial do
futuro [1987]. Esses lugares também eram palco de
violência brutal, repletos de abusos sexuais e
assassinatos (Desejo de matar 2 [1982]).
Uma mensagem dominante presente nos filmes da
década de 1980 era de que as cidades eram selvagens,
terras sem lei onde os mais irrecuperáveis membros da
nossa sociedade — os de classe baixa e as pessoas de
raças diferentes, dois grupos geralmente considerados
como um só — deveriam ser confinados. No fim, essas
eram imagens de cidades “mortas” ou decadentes,2
refletindo os Estados Unidos após um êxodo branco, em
que os brancos “viraram as costas para as velhas áreas
centrais e fugiram para os subúrbios”.3 O êxodo branco
representava uma nova variação da segregação racial e
cultural (por exemplo, as leis Jim Crow e a segregação
racial econômica). Avila explica esse processo em seu
ensaio “Dark City: White Flight and the Urban Science
Fiction Film in Postwar America”:

à medida que minorias raciais se concentravam


nos interiores urbanos das cidades americanas
ao longo das décadas de 1940 e 1950, milhões
de norte-americanos “brancos” rumaram para
novas comunidades suburbanas para preservar
sua brancura [com a] ajuda de políticas federais,
estratégias locais de desenvolvimento de terras
e o desejo popular de viver em bairros
racialmente exclusivos e homogêneos.4

Para muitos brancos, comunidades urbanas eram favelas


arruinadas que geravam “uma cultura de pobreza”,
enquanto os subúrbios mantinham uma promessa de
“progresso cultural”.5
Enquanto os negros tinham um papel imagístico
central em instigar medos raciais, espaciais e de classe,
nos filmes de terror dos anos 1980 a participação dos
negros era bem insípida ou inexistente. Isto é, o medo do
mundo negro urbano se baseava em mitos; a negritude
se tornou um tipo de história assustadora ou um bicho-
papão invisível. De maneira mais notável, os negros não
eram vistos em nenhum dos filmes de terror populares
que se passavam fora do espaço urbano, como:

• Horror em Amityville (1979), que se passa em uma


pequena vila no condado de Suffolk (NY);
• Sexta-feira 13 (1980), que se passa em um
acampamento chamado Crystal Lake;
• Uma noite alucinante: a morte do demônio (1981),
que se passa numa floresta rural;
• Halloween 2: o pesadelo continua! (1981), que se
passa no subúrbio de Haddonfield, Illinois;
• Poltergeist: o fenômeno (1982), que se passa numa
Califórnia suburbana;
• Criaturas (1986), que se passa na parte rural do
Kansas.

Isso não quer dizer que os negros estiveram


completamente ausentes das grandes telas. Pelo
contrário, os negros tiveram um papel importante
naquilo que ficou conhecido como o subgênero do
“parceiro” — um ciclo de filmes de comédia/drama que
pareavam de maneira problemática atores negros e
brancos em aventuras. Esses filmes incluíam: Loucos de
dar nó (1980), com Richard Pryor e Gene Wilder (que
aparece brevemente usando pintura blackface); 48 horas
(1982), com Eddie Murphy e Nick Nolte; Um tira da
pesada I e II (1984 e 1987), com Eddie Murphy, John
Ashton e Judge Reinhold; Dois policiais em apuros (1986),
com Gregory Hines e Billy Crystal; e Máquina mortífera I
e II (1987 e 1989), com Danny Glover e Mel Gibson.6 O
efeito de duplas assim não era exatamente a harmonia
racial que os filmes prometiam; mas, como Guerrero
explica, os negros eram “completamente isolados de
outros negros ou de qualquer referência ao mundo negro.
Nessa situação, o que existe de cultura negra é
personificado em uma estrela negra individual cercada e
apropriada pelo contexto branco e pela narrativa para o
prazer do público consumidor dominante”.7
Com exceção dessas uniões negro-branco, um número
significativo de grandes filmes dos anos 1980, muitos
com locações distantes dos subúrbios, mostravam os
negros e sua cultura bem afastados do olhar, como esses
vinte filmes populares, que não pertencem ao gênero
terror, ilustram: E.T.: o extraterrestre (1982), Batman
(1989), Indiana Jones e os caçadores da arca perdida
(1981), Indiana Jones e o templo da perdição (1984),
Indiana Jones e a última cruzada (1989), De Volta para o
futuro (1985), Tootsie (1982), Rain Man (1988), O
exterminador do futuro (1984), Uma cilada para Roger
Rabbit (1988), Gremlins (1984), Top Gun: ases
indomáveis (1986), Amadeus (1984), Clube dos cinco
(1985), O reencontro (1983), Curtindo a vida adoidado
(1986), Atração fatal (1987), Uma secretária de futuro
(1988), Num lago dourado (1981) e Como eliminar seu
chefe (1980). O resultado foi uma construção afirmativa
da branquitude por meio da segregação racial ou
exclusão. Omissões desse tipo eram, certamente, “uma
forma de estereotipação que reforçava a ideia de que os
negros e outros grupos não brancos eram obscuros,
marginais e dependentes”.8
Isolamento e invisibilidade eram apenas dois dos
ataques representacionais que a cultura negra recebia. A
infame propaganda política sobre Willie Horton,
produzida pela equipe do candidato republicano George
H.W. Bush durante a disputada presidencial de 1988
contra o candidato democrata Michael Dukakis, também
serviu de pano de fundo para construções populares
acerca do que acontecia quando negros entravam em
espaços brancos. A mensagem do comercial, divulgada
pelo Comitê de Ação Política da Segurança Nacional, não
era muito diferente dos filmes da série Desejo de matar
dos anos 1980 — sem uma figura de autoridade (branca)
no poder, os homens negros iriam estuprar e assassinar
as mulheres brancas da América. A propaganda
mostrava duas fotos — uma de Willie Horton, um homem
negro, e a outra do governador Dukakis. Uma voz
proclamava: “Bush apoia a pena de morte para
assassinatos em primeiro grau. Dukakis não só é contra a
pena de morte, como permitiu que assassinos de
primeiro grau saíssem da cadeia nos fins de semana”.
Essa narrativa é acompanhada pelas palavras
“sequestro”, “punhalada”, e “estupro” sendo exibidas na
tela. Da mesma maneira, o Partido Republicano de
Maryland distribuiu uma carta em que se lia “Time
Dukakis/Willie Horton” e “Você, sua esposa, seus filhos e
seus amigos podem receber a visita de alguém como
Willie Horton se Dukakis virar presidente”.9
CIDADES DE CHOCOLATE E SUBÚRBIOS DE
BAUNILHA
“Main Street e Elm Street, Estados Unidos”, escreve
Crane, “era nessas ruas, comuns a todo mundo, que o
terror atacava de maneira implacável. O laboratório do
grande homem, o castelo gótico, a mansão arruinada e a
tumba sagrada do faraó sumiram das telas”.10 Enquanto
a Main Street e a Elm eram “comuns” agora, o terror
ditava que essas ruas não eram acessíveis a qualquer
membro do público. De maneira implícita, nenhum negro
(ou qualquer minoria racial na verdade) tinha permissão
de entrar. Essas “utopias brancas”, como Rich Benjamin,
em Searching for Whitopia: An Improbable Journey to the
Heart of White America, as nomeia,11 se orgulham da
mundanidade, amizade, ordem, segurança e conforto
aparentes. Traços que, na superfície, parecem neutros
em relação à cor e classe social, são primordiais para
distinguir negros e brancos, a classe média da classe
baixa, o suburbano (dentro dos conceitos norte-
americanos) do urbano.
Ainda assim, o terror precisava de monstros, e nessa
época eles vieram de modo infame na forma de homens
brancos suburbanos sobrenaturais como a personificação
do mal, tomando uma “estética masoquista” por meio do
uso de facões e ferramentas elétricas.12 Se os brancos
quisessem sobreviver nos subúrbios, eles precisavam
descobrir como separar o vizinho ruim do monstro, já que
a separação por cores não funcionava. Esses monstros
brancos tinham o objetivo particular de punir aqueles
mais próximos: famílias brancas e não urbanas (rurais ou
suburbanas). Os pais brancos eram julgados por não
cuidarem de suas crianças, deixando suas crias sob o
cuidado de babás ou dos aparelhos de TV. Crianças
brancas, cujos pais aparentemente falharam em instigar
padrões altos de religiosidade ou moral, tinham fins
particularmente brutais por manter relações sexuais fora
do casamento ou abusar de substâncias. Por exemplo,
nos filmes de terror Halloween: a noite do terror (1978) e
Halloween 2: o pesadelo continua! (1981), Michael “the
Shape” Myers (Nick Castle) abre o seu caminho a facadas
pelo vilarejo de Haddonville. Esses filmes inverteram o
roteiro naquilo que se referia ao lugar em que os brancos
acreditavam que poderiam encontrar conforto e
segurança. Esses filmes diziam “peguei você” para
aqueles que achavam que o êxodo branco, para longe
dos negros e pobres urbanos e para os braços abertos de
comunidades suburbanas brancas e de classe média,
traria paz. Os filmes da série Halloween,
especificamente, se mostraram enganadores quando
brincavam com ideais de homogeneidade racial e de
classe, destruindo esse mesmo sentimento de
comunidade ao desafiar a “habilidade dos suburbanos
em reconhecer estranhos e predadores”.13 Mais
acertadamente, esses monstros não estavam vindo de
fora dos subúrbios para causar destruição na
domesticidade suburbana; mas os brancos perceberam
que “eles são a gente, e a gente nunca sabe quando vai
agir como monstros”.14 Ainda assim, talvez o momento
mais deliberadamente “peguei você” do cinema se
encontre no filme de terror não negro e com traços de
comédia A hora do pesadelo (1984). Aqui, pais
embriagados e desatentos descobrem que as
“McMansões” deles serviram apenas para fornecer ao
assassino pedófilo Fred Krueger (Robert Englund) mais
espaço para praticar o seu sadismo. Ainda assim,
Krueger é associado a um “defeito moral” numa
confortável comunidade suburbana.15
Assim como os brancos nos filmes dos anos 1980
eram alertados para ficarem longe dos espaços urbanos,
os negros eram advertidos a não se meterem nos
subúrbios. O filme de terror “com negros” A dama de
branco (1988) se passa em 1962, numa “pequena
cidade” de Willowpoint Falls, “a 40 km a sudoeste” da
“cidade”, onde vive uma rara família negra. O patriarca
da família é um zelador de escola beberrão, Harold
Williams (Henry Harris), que é falsamente acusado pelo
estupro e assassinato de uma garota branca. Harold é
chamado de “preto filho da puta” e descrito pelo xerife
da cidade como “o bode expiatório perfeito” porque “ele
é preto”. Depois é revelado que Harold foi acusado
falsamente e que um membro branco da comunidade era
o culpado. Ainda assim, o filme trouxe outra mensagem
consigo: cidades pequenas de brancos são cruéis com
negros. Williams é baleado e morto por um vigilante que
não acredita em sua inocência.
Ainda assim, invisibilidade relativa não significava que
os Outros racializados recebiam um indulto por sua
aniquilação simbólica. Uma possível implicação da
ausência representacional podia ser um questionamento
por parte do público: se todo esse terror está
acontecendo no subúrbio com aqueles que conhecemos
e que se parecem conosco, o que estaria acontecendo
com aquelas pessoas cultural e racialmente diferente nos
guetos?
Em algumas circunstâncias, embora os Outros não
fossem representados nas telas, os filmes de terror
serviam para sanar a curiosidade dos espectadores a
respeito do que acontecia com aqueles estranhos de
aparência diferente que estavam ausentes. Os nativos
norte-americanos tiveram que aguentar o peso de muitos
ataques simbólicos. Eles eram ao mesmo tempo
representados como (muito) espirituais, (muito) voláteis
e (muito) primitivos. Essa tríplice de virtudes
equivocadas estava acondicionada a um “campo de
nostalgia romântica” em torno de símbolos de estoicismo
diante de massacres e das perdas de seus lares e terras
ancestrais.16 A cultura dos nativos norte-americanos era
tão excepcional que não poderia ser adequadamente
contida ou completamente destruída, para sempre
surgindo a fim de atormentar os domínios e corpos dos
brancos. Brancos suburbanos ficavam horrorizados
sempre que descobriam que suas casas eram
construídas sobre “terras sagradas” na forma de
“cemitérios indígenas” e por isso seriam assombradas.
Brancos eram representados como intrusos
inconscientes, sem capacidade de interagir
racionalmente ou coexistir com os intempestivos
habitantes do outro mundo. Por exemplo, em Horror em
Amityville, de 1979, há uma casa mal-assombrada que
foi construída em cima de um esquecido cemitério nativo
de Long Island. Os mortos irrequietos são implacáveis em
seu terror, primeiro com um grupo de residentes que se
tornam suscetíveis à possessão demoníaca e que
acabam se tornando vítimas de um assassinato em
massa na casa, e depois com a família Lutz, que é
expulsa da casa apenas algumas semanas após sua
mudança. É exigido do público que lamente a tentativa
falha dos Lutz em conquistar o sonho norte-americano
suburbano (eles vivem na casa por apenas 28 dias), e
toda a grande dificuldade financeira na qual a triste
situação os colocou — isso em lugar de lamentar pela
morte de qualquer nativo norte-americano.17
Em O iluminado (1980), o Hotel Overlook, localizado
no topo da montanha, também foi construído em cima
das covas de nativos norte-americanos. Além disso, sua
terra foi ensopada de sangue ao longo de um período de
dois anos, entre 1907 e 1909, pelos corpos de nativos
norte-americanos que buscavam preservar seu território,
conforme explicado no filme: “Parece que o lugar fica em
cima de um cemitério indígena. Foi preciso repelir alguns
ataques indígenas enquanto o prédio era construído”. O
resultado dessa incursão foi igualmente mortal —
exposição a ataques malignos, possessão e assassinato.
O mesmo descuido em relação às terras sagradas dos
nativos norte-americanos é o gatilho para o terror no
domicílio suburbano em Poltergeist: o fenômeno (1982).
Aqui, uma construtora ergue uma grande casa em cima
de um cemitério sem antes realocar os corpos. Logo,
aqueles que procuram o sonho norte-americano livre de
pessoas negras ainda podem encontrar “esqueletos no
armário (sem mencionar a piscina)”.18 Assim como os
Lutz, o público é encorajado a sentir pena de uma família
particularmente atormentada cujos sonhos de “utopia
branca” chegam ao fim de forma abrupta quando eles
são forçados a entregar sua valiosa moradia aos
espíritos, trocando-a por um quartinho em um hotel de
beira de estrada.
O filme Lobos (1981) é a história de um conto sobre
gentrificação, mas com uma surpresa. Metamorfos
nativos norte-americanos e lobos vivem e espreitam nas
sombras escuras de uma desolada cidade de Nova York.
Um membro corporativo branco de uma construtora
deseja reclamar o espaço, subvertendo, assim, a
tendência do êxodo branco, mas com o objetivo de
desalojar os nativos feiticeiros — uma pequena variação
do já conhecido coloquialismo “renovação urbana-
remoção de pretos”.19 No fim, muitos precisam morrer
antes que o projeto seja abandonado e os construtores
brancos mantenham distância. E, de alguma forma, os
nativos norte-americanos são mostrados como “os
vencedores” da batalha contra a gentrificação e a
corporação ao serem deixados sozinhos na cidade morta
enquanto os brancos, imagina-se, voltaram para os seus
desenvolvidos subúrbios de “baunilha”.20
Mas quais eram os papéis negros nos filmes de terror
dessa década? As produções do gênero falharam na
tentativa de construir uma narrativa plausível acerca de
sua presença suburbana, assim como fizeram com os
nativos norte-americanos. Essa limitação tem a ver com
o fato de que os filmes de terror haviam confinado o
horror negro a locações urbanas (por exemplo, Nova
Orleans, Chicago, Nova York, Los Angeles) ou ao Caribe e
à África. Por exemplo, no filme de terror “com negros” A
terceira porta do inferno (1988), os brancos precisam
viajar para encontrar o horror negro. No filme, os negros
são confinados a uma ilha remota (longe de qualquer
subúrbio), onde um sacerdote vodu se vinga dos intrusos
brancos ao permitir que seus zumbis se alimentem deles.
Em resumo, era pouco provável que zumbis e o vodu
pudessem, de maneira verossímil, encontrar o caminho
para a Main Street ou para a Elm Street.

SALVADORES NEGROS E
SACRIFÍCIO VOLUNTÁRIO
Em um grande contraste com os temas nacionalistas e
revolucionários dos filmes de terror da década de 1970,
nos anos 1980, se os negros apareciam para contribuir
com o gênero, sua participação era amplamente vista em
filmes de terror “com negros”, sendo marcada por um
apoio afirmativo aos brancos. O pouco que os negros
ofereciam ao terror não era apenas desalentador, mas
poderia ser descrito como uma nova forma de exploração
negra. Tony Williams, em seu ensaio “Trying to Survive on
the Darker Side”, descreve o pessimismo geral em
relação ao conteúdo da década:

A década de 1980 foi extremamente


decepcionante para os críticos que ficaram
impressionados com a breve renascença do
gênero nos anos 1970. Enquanto a década de
1970 assistiu ao surgimento de trabalhos raciais
de diretores como […] George Romero, a década
seguinte pareceu ofertar filmes tolos apelativos
como Sexta-feira 13, Halloween: a noite do
terror e a série A hora do pesadelo — todos
dependendo bastante de efeitos visuais
espetaculares e banhos de sangue de
adolescentes promíscuos (a maioria do sexo
feminino).21

Então, enquanto o terror se focava nas valiosas cenas de


adolescentes brancos empunhando uma picareta, o valor
dos personagens negros era confinado à sua habilidade
em exibir um ar assimilável em encontros interpessoais e
inter-raciais. Nos filmes da década de 1980, os negros
eram pressionados a valorizar um sistema de lealdade e
confiança geralmente unilateral. Ou seja, não era
esperado que a lealdade emanada dos negros fosse
correspondida pelos brancos. E o mais alarmante: nessa
década de filmes de terror, a lealdade de um
personagem negro para com os brancos era
frequentemente evidenciada não apenas por uma
vontade de ajudar, mas também pelo desejo de ter uma
morte horrível para salvar o branco — a versão terror do
filme de parceiro.22
O filme O iluminado (1980), de Stanley Kubrick, é
especialmente poderoso em sua abordagem dupla da
aniquilação negra. Primeiro, O iluminado representa a
(re)virada definitiva em direção ao personagem negro
que se sacrifica voluntariamente — um personagem que
morre enquanto salva um branco. Em segundo lugar, o
filme invoca o estereótipo do “negro mágico”, em que um
personagem negro tem poderes sobrenaturais que são
usados, notavelmente, não em seu benefício próprio, em
prol de sua família ou para a proteção e desenvolvimento
de sua comunidade; pelo contrário, seus poderes são
usados totalmente a serviço de pessoas brancas.
Em O iluminado, a família branca Torrance — o pai
Jack (Jack Nicholson), a mãe Wendy (Shelley Duvall) e o
jovem filho Danny (Danny Lloyd) — se muda
temporariamente para o Hotel Overlook, um resort
isolado no topo de uma montanha no Colorado, que, por
acaso, foi construído sobre um cemitério de nativos
norte-americanos. Jack aceitou o trabalho de zelador
durante o período de fechamento do hotel no inverno,
quando a equipe se encontra de férias. Antes de sair
para as suas férias de inverno, o cozinheiro negro do
hotel, Dick Hallorann (Scatman Crothers), passa o dia
orientando a família em relação às responsabilidades que
envolvem a manutenção do hotel. Antes de sair de férias,
contudo, Dick revela ao jovem Danny que possui poderes
telepáticos secretos. Dick chama sua telepatia mental de
“brilho”. Em Dick o brilho é amavelmente folclórico.
Especificamente, o brilho é uma condição não
problemática que ele herdou de sua avó, que há muito
lhe explicou que se tratava de uma dádiva mágica. Dick
de imediato se afeiçoa a Danny — oferecendo sorvete
para ele —, pois nota assertivamente que Danny também
é um telepata.
Dick é interpretado por Scatman Crothers, que na
época tinha 69 anos, um artista (cantor, dançarino,
músico e comediante) e antigo artista de vaudeville. Com
o idoso Crothers no papel, Dick se apresenta como uma
figura amável e segura. Dessa forma, o afeto que Dick
expressa em relação a Danny não é mostrado como
pedofilia ou num sentido predatório. Para se certificar de
que não há confusão, mulheres negras são objetificadas.
Em uma cena Dick está em sua casa de férias na Flórida.
Ele decorou o seu quarto com duas grandes imagens de
mulheres negras, uma nua e peituda e a outra
seminua.23 Ainda assim, Crothers, que já havia
interpretado papéis de ajudantes como bagageiros de
trem, jardineiros, garçons e engraxates no passado,
relembra antigas relações assexuais presentes na cultura
popular entre o negro adulto e a criança branca, como
em Huckleberry Finn (Junior Durkin) e Jim (Clarence
Muse) em Mocidade feliz (1931), ou Virgie (Shirley
Temple) e Tio Billy (Bill “Bojangles” Robinson) em A
pequena rebelde (1935). Em cada um desses casos não é
questionado o motivo de homens negros encontrarem
satisfação na companhia de crianças brancas.
Embora seja mostrado como algo natural e aceito em
famílias negras como a de Dick, para a família de Danny
o brilho é algo abjeto, o que mostra o brilho no garoto
como algo danoso. O brilho de Danny é apelidado de
“Tony, o garotinho que vive na minha boca” e é
considerado negativo. Jack e Wendy já até procuraram
ajuda médica para tratar a condição de Danny. Logo, o
brilho e outros eventos sobrenaturais em corpos negros e
entre famílias negras não são completamente
inesperados ou condenados, mas em um (jovem) corpo
branco, e entre famílias brancas, tais coisas são tomadas
como assustadoramente fora de lugar.
Uma parte central da narrativa é o fato de que o poder
de Danny se torna mais forte e perigoso à medida que o
menino passa mais tempo dentro daquilo que se
descobre ser um hotel assombrado. Em contraste, Dick
não é afetado pelo hotel, embora saiba que se trata de
um lugar infeliz por causa de um assassinato cometido
com um machado pelo zelador anterior. Ainda assim,
Dick não se preocupa com essas presenças
conspiradoras ou “ecos abafados”24 a ponto de se sentir
ameaçado: “Não tenho medo de nada aqui”.
Em O iluminado, Danny enfrenta um perigo mortal
quando se vê aprisionado no hotel cercado de neve
enquanto seu pai, possuído pelo mal e carregando um
machado, tenta matar Wendy, sua mãe, e ele. Danny
pede ajuda telepaticamente a Dick, que está de férias, e
Dick responde prontamente e sem hesitação, largando
tudo para voltar ao Colorado e salvar o garoto. Num
esforço tremendo e incansável, Dick compra uma
passagem de avião de última hora, aluga um carro, pega
uma niveladora de neve emprestada e dirige pela
nevasca em uma tentativa de chegar ao hotel isolado.
Nenhuma despesa parece ser alta demais. Intrépido
apesar da solidão, da temperatura mortal e das estradas
intransponíveis, o idoso Dick segue adiante para subir a
montanha até o hotel.
Os esforços de Dick para ajudar Danny se mostram
ameaçadores para o hotel, que expressa sua grande
insatisfação pela interferência de Dick por meio do
fantasma do antigo zelador assassino, Grady (Philip
Stone). Embora Dick tenha sido apontado como o
“cozinheiro-chefe” pelo gerente do hotel, Grady diminui
Dick quando avisa Jack que “o cozinheiro crioulo” está
vindo.
De maneira notável e estranha, toda a angustiante
experiência de Dick acaba não valendo nada. Ele nunca
alcança Danny. Em vez disso, assim que chega no hotel
— ele dá alguns passos além da porta principal do
estabelecimento, mas nem chega a tirar a neve do
casaco e das botas —, Dick é cortado ao meio por Jack
com um machado. Danny e Wendy escapam na
niveladora de neve de Dick, enquanto seu corpo é
deixado no saguão do hotel, em uma piscina de sangue
que fica cada vez maior. Certamente, a morte chocante
de Dick faz do terror aquilo que o gênero é; contudo,
como o único personagem morto em tempo real no filme,
a função primária de Dick é ser o negro mágico e a
oferenda sacrificial da família Torrance. Por sua atuação,
Crothers recebeu um prêmio Saturn de melhor ator
coadjuvante.

PUF! MAIS NEGROS MÁGICOS


O iluminado serve para indicar que, nos Estados Unidos
atual, tudo o que resta do legado de feiticeiros africanos
selvagens e primitivos ou das sacerdotisas vodus em
transe é o sutil negro mágico. Como escreve Matthew
Hughey em seu ensaio “Cinethetic Racism: White
Redemption and Black Stereotypes in ‘Magical Negro’
Films”, o negro mágico

se tornou um personagem que geralmente


aparece como um negro de classe baixa e pouca
educação que tem poderes sobrenaturais ou
mágicos. Esses poderes são usados para salvar
homens desgrenhados, sem cultura, perdidos ou
quebrados (quase sempre homens brancos) e
transformá-los em pessoas contentes,
competentes e de sucesso dentro do contexto
do mito norte-americano de redenção e
salvação.25

O negro mágico contemporâneo, seja no terror, na ficção


científica ou no drama, continua a capturar a imaginação
de Hollywood. Por exemplo, no filme À espera de um
milagre (1999), que se passa na década de 1930, o
personagem negro John Coffey (Michael Clarke Duncan) é
mostrado como um grandalhão mágico e burro que está
no corredor da morte por um crime que não cometeu — o
estupro e assassinato de duas meninas brancas. Coffey
cura a hérnia de seu executor com um toque de mão,
libertando o homem da dor e permitindo-lhe que restaure
sua vida sexual. Coffey remove o câncer da esposa do
diretor da prisão, salvando a vida dela. Coffey até mesmo
reduz dramaticamente o processo de envelhecimento de
um rato. Contudo, Coffey não usa seus poderes para
salvar a si mesmo e é executado por aqueles a quem
ajudou, embora estejam cientes de sua inocência. No
filme Lendas da vida, de 2000, que também se passa nos
anos 1930, um fantasma negro chamado Vance (Will
Smith) aparece para servir de carregador de tacos para
Rannulph Junuh (Matt Damon), um veterano deprimido
da Primeira Guerra Mundial e antiga estrela do golfe.
Vance restaura Junuh emocionalmente, ajudando-o a ter
sucesso no golfe e a arrumar uma namorada, e então
Vance desaparece. À espera de um milagre e Lendas da
vida não apenas apresentam um papel e uma função
muito específicos para a negritude; esses filmes também
valorizam um período em particular da história
americana e das relações raciais, anterior ao movimento
pelos Direitos Civis.
Heather Hicks especula sobre o ímpeto por trás de tais
representações de negros mágicos.26 Ela escreve que
personagens negros recebem qualidades santificadas e
até mesmo mágicas numa tentativa errônea dos
cineastas de rebater estereótipos racistas. Contudo,
caracterizações desse tipo servem ao público branco, na
verdade, pois é necessário santificar um negro para que
ele adquira o equivalente moral de um branco “normal”.
Além disso, Hicks observa que há uma fantasia de
igualdade quando o oprimido, o desalentado, ou aqueles
que estão na base da pirâmide social (como John Coffey)
são presenteados com poderes mágicos para compensar
o que falta a eles. Contudo, negros mágicos têm limites
necessários, caso contrário eles se tornariam super-
heróis (brancos) como o Super-Homem ou o Capitão
América.27
No filme de terror “com negros” Olhos famintos
(2001), uma mulher negra, Jezelle Gay Hartman
(interpretada pela talentosa atriz de teatro Patricia
Belcher), tem uma habilidade psíquica e sente que o
perigo ronda dois jovens irmãos brancos — Patricia (Gina
Philips) e Darry Jenner (Justin Long) — que, de férias da
faculdade, estão voltando para casa, dirigindo por uma
estrada localizada numa área rural. Por sua própria
vontade, Jezelle localiza os jovens para ajudá-los a
sobreviver a um encontro com um canibal de outro
mundo que devora vítimas humanas num ato ritualístico.
Assim como Dick em O iluminado, Jezelle se mantém
perto dos Jenner, embora ela seja uma estranha para a
dupla, permanecendo ao lado dos irmãos mesmo depois
de ter sido rudemente rejeitada por eles, que a
consideraram uma mulher louca. Jezelle fica frente a
frente com o monstro e cai de joelhos orando enquanto
se prepara para o autossacrifício. Contudo, em uma
interessante reviravolta, Jezelle é poupada quando o
monstro devora Darry. Com a vida preservada, Jezelle
continua a apoiar os Jenner, confortando a irmã
sobrevivente e agindo como uma mãe substituta até que
os pais de Patricia cheguem para levá-la para casa.
De uma maneira perspicaz, “vendo” pessoas que
usam seus poderes para o bem, a bondade do negro
mágico é tornada ainda mais óbvia por meio de seu
sacrifício voluntário. Seu heroísmo, além de não
considerar a si mesmo, também não leva em conta seus
entes queridos (que estão ausentes em todos esses
filmes). Isto é, embora seja um objetivo nobre tentar
manter a unidade familiar dos brancos, os negros
mágicos não parecem ter famílias que lamentariam por
eles e sofreriam pela sua morte.
No filme de terror “com negros” Coração satânico
(1987), a personagem Epiphany Proudfoot (Lisa Bonet) é
um caso raro de uma negra que se sacrifica e tem uma
família. Ela é a filha birracial de uma negra praticante de
vodu de Nova Orleans. Seu pai branco desapareceu
muitos anos atrás. Epiphany é mostrada cuidando de seu
filho bebê, que não tem mais do que dois anos de idade.
Eles parecem ter apenas um ao outro, já que visitam o
túmulo da mãe dela juntos. Sem nenhuma família por
perto, o único suporte que Epiphany tem é a babá que
ela contratou — uma mulher com quatorze filhos próprios
que cuida do menino enquanto Epiphany se ocupa com
os seus afazeres, o que inclui dançar de forma sensual
em um ritual sangrento de vodu ou dormir com um
estranho branco que chegou em Nova Orleans. Embora
seja uma sacerdotisa “mambo” altamente intuitiva, que
controla seus seguidores por meio do medo e punições,
Epiphany não é intuitiva o suficiente para notar que
estava transando (pornografia leve) com um parente
possuído (que tomou o corpo e a alma de outra pessoa).
Epiphany sofre uma aniquilação particularmente brutal e
misógina depois de dormir com o homem, Harold Angel.
Seu corpo, nu e ensanguentado, é encontrado com as
pernas abertas, revelando que ela encontrou a morte por
meio de um “tiro na perseguida”. O filho de Epiphany se
torna órfão.
O personagem Harold Angel (Mickey Rourke) revela ter
uma relação problemática com a negritude que percorre
o filme de maneira profunda. Nas cenas iniciais, em
1955, ele é convocado para uma reunião no Harlem por
um homem misterioso chamado Louis Cyphre (leia-se:
Lúcifer). Cyphre (Robert De Niro) se encontra com Angel
em uma igreja de negros, aparentemente pentecostal,
onde Cyphre é bem recebido, acolhido e protegido pelos
paroquianos. Logo, a relação simbiótica e simbólica entre
os negros, religiões negras e o mal fica evidente no filme
desde o começo. A parada seguinte de Angel é
(obviamente) Nova Orleans, onde ele encontra mais
negros e mais religião negra — nesse caso, o vodu. Ele
descobre que os negros estão dispostos a dividir os
segredos mais valiosos de suas religiões com os brancos,
e que os brancos se tornaram particularmente adeptos
do uso da magia negra do vodu. Especificamente, eles
têm uma comunicação direta com o diabo. No filme, um
branco chamado Johnny Favorite dominou a magia negra
com tanta habilidade que ninguém é páreo para ele, nem
mesmo os negros que o ensinaram, e ele faz um pacto
com o diabo, no qual entregaria sua alma em troca de
ser um cantor famoso. Quando chega a hora de pagar
sua parte e se entregar ao diabo, Johnny tenta fugir do
acordo ao se alojar no corpo de outro homem.
O encontro-que-virou-estupro de Angel e Epiphany o
deixa mais próximo de descobrir a verdade relacionada
ao destino de Johnny — Angel na verdade é Johnny
Favorite. Johnny, assim como Angel, teve amnésia e não
se lembra da possessão. A punição de Epiphany (sem
que ela saiba) por seu encontro incestuoso com o pai,
Johnny/Angel, é muito maior do que aquela
experimentada por Angel em consequência de sua
oposição a Lúcifer. O destino de Angel é simplesmente
pegar um elevador lento até o inferno para se juntar ao
diabo. Se os abusos virão, e não fica claro se virão, não
há a menor pista.
A maldição dos mortos-vivos (1988) apresenta vários
negros que se sacrificam voluntariamente. Nesse filme
de terror “com negros”, um antropólogo norte-americano
branco, Dennis Alan (Bill Pullman), viaja até o Haiti para
buscar, junto a praticantes de vodu, uma mistura de
drogas em pó que transforma as pessoas em zumbis.
Dennis planeja adquirir a droga para a Bio Corp, uma
empresa farmacêutica americana, que pretende utilizá-la
como anestésico. Dessa forma, esse é um filme que
“elabora repetidamente a distinção entre ciência branca
[empresas farmacêuticas americanas] e magia negra”.28
Os negros que ajudam Dennis em seus esforços de
apropriação morrem de forma grotesca e violenta. Por
exemplo, Dennis consegue a ajuda de um sacerdote
vodu/dono de clube noturno, Lucien Celine. Oficiais
haitianos corruptos — membros da infame polícia secreta
Tonton Macoute — deixam claro para Lucien que Dennis
não deveria receber nenhuma ajuda em seu saque de
práticas culturais/drogas. Quando Lucien não para de
ajudar Dennis, ele é sacrificado ao ser picado por um
escorpião venenoso que aparece magicamente em sua
boca. Não é de surpreender, então, que Louis Mozart, um
haitiano pobre que sabe como fazer a droga zumbi, seja
decapitado porque ensinou Dennis a preparar a droga e o
ajudou a levar a fórmula em segredo para os Estados
Unidos. As motivações de Louis para ajudar Dennis foram
a promessa de um pequeno pagamento — mil dólares —
e a esperança de que Dennis contasse ao mundo sobre
sua ajuda, enaltecendo Louis e seu “pó mágico”. Dennis
não cumpre nenhuma das promessas.
FIGURA 6.1 EPIPHANY PROUDFOOT NUM RITUAL VODU EM CORAÇÃO
SATÂNICO,
Tri-Star/Photofest
Embora o pano de fundo de A maldição dos mortos-
vivos seja a revolução contra a presidência opressiva e
violenta de Jean-Claude “Baby Doc” Duvalier, nenhum
membro do governo ou da polícia que se opõe aos
esforços de Dennis pensa em acabar com ele usando os
métodos tradicionais de assassinato, com um facão ou
armas de fogo — destinos que, no filme, vitimam
cidadãos negros do Haiti com bastante regularidade. Em
vez disso, Dennis é monitorado de perto, assediado (ele
é magicamente induzido a ter sonhos ruins) e torturado,
antes de finalmente ser persuadido a voar de volta para
os Estados Unidos. Dennis retorna ao Haiti de maneira
desafiadora, reunindo-se com outra de suas ajudantes
haitianas, Marielle (Cathy Tyson), com quem ele tem
relações sexuais. Marielle deseja deter o corrupto
governo haitiano, mas não fica claro como ela vai fazer
isso ajudando Dennis. Em seu retorno, Dennis é
zumbificado e enterrado vivo. Ele é resgatado por um
outro ajudante negro, Christophe (Conrad Roberts), um
zumbi que não consegue se salvar do sofrimento.
Obviamente, é a nêmesis de Dennis, o cruel chefe de
polícia Dargent Peytraud (Zakes Mokae), que encontra o
fim mais brutal. O próprio Peytraud, um mestre
praticante de magia negra, usa de várias táticas
sobrenaturais para tirar Dennis de seu caminho para a
aquisição da valiosa mistura. Contudo, Dennis consegue
uma última ajuda inestimável das almas negras que
Peytraud matou. Dennis enfrenta Peytraud de frente,
obtendo uma vitória jamais alcançada por ninguém antes
dele. Dennis conquista o dom da telepatia e tortura
Peytraud com uma dramática mutilação genital antes de
enviá-lo para o inferno.
A MUDANÇA NA EXPERIÊNCIA
CINEMATOGRÁFICA
Nos anos 1970, cinemas urbanos socialmente vibrantes e
independentes, como o Elgin de Nova York, o Orson
Welles Cinema de Boston e o Pagoda Palace Theater de
São Francisco, ofereciam “filmes da meia-noite” (assim
como muitos cinemas drive-in pelo país). Esses filmes
eram definidos tanto pela independência, produção com
orçamento limitado e temas sociopolíticos de
oposição/resistência quanto pelos horários tardios em
que eram exibidos. O resultado foi uma evolução
cinematográfica em que filmes de terror como The Rocky
Horror Picture Show (1975), Eraserhead (1977) e A noite
dos demônios (1988), assim como filmes de outros
gêneros como Pink Flamingos (1972) e Balada sangrenta
(1972), abraçaram seu status underground e, por causa
disso, foram saudados como os clássicos cult favoritos
entre os jovens adultos descolados que frequentavam os
cinemas. “Havia um movimento”, escreve Heffernan,

“de filmes apelativos para cinemas de arte”, nas


palavras de John Waters [um cineasta]. Muitos
cinemas de arte permaneceram abertos ao
longo dos anos 1970, contando com a bilheteria
de híbridos excêntricos como Waters e seu Pink
Flamingos [ou] O massacre da serra elétrica, que
combinavam o horror visceral com floreios
estilísticos excêntricos e segmentos non
sequiturs dos filmes de arte.29

Os filmes da meia-noite de maior sucesso geralmente


ficavam em cartaz por muito tempo, não apenas as
poucas semanas típicas dos filmes de grandes estúdios,
mas vários meses ou anos. Por exemplo, o musical
britânico The Rocky Horror Show (1973), apesar de seu
fracasso como uma peça da Broadway, experimentou um
reavivamento inesperado nos Estados Unidos como um
filme musical de terror. Rebatizado de The Rocky Horror
Picture Show, a produção “chegou à meia-noite” e se
tornou um fenômeno cultural, já que assistir ao filme
repetidas vezes, assim como cantar junto, geralmente
vestindo uma fantasia completa, se tornou um ritual
comum para as legiões de fãs do filme. O filme tem sido
exibido há décadas em cinemas como o Oriental Theatre
em Milwaukee, Wisconsin, e o Clinton Street Theater em
Portland, Oregon, e notavelmente o Museu Lichtspiele
em Munique, Alemanha, exibe o filme diariamente, sem
interrupções, há trinta anos.
A experiência de ir ao cinema nos anos 1980 assistiu
ao fim de cinemas drive-in e independentes, assim como
o desaparecimento dos baderneiros escandalosos,
geralmente usuários de maconha, que alimentavam
esses lugares. O fim do fenômeno de filmes cult/de arte
no início dos anos 1980 coincidiu com duas tendências:
“primeiro, a elevação do terror e da ficção científica em
filmes como Alien: o oitavo passageiro, e em segundo
lugar, o sucesso das tecnologias que permitiram ver
filmes em casa, as quais fecharam a tampa do caixão
dos cinemas drive-in, dos filmes dois por um e dos
cinemas de arte”.30 No lugar dos pequenos cinemas e
drive-ins, grandes cadeias de cinemas multiplex (como a
AMC e a Showcase Cinemas) assumiram uma posição
dominante. Em resposta, no início dos anos 1980,
empresas de “arquitetura de entretenimento” como a
Mesbur e Smith Architects (Canadá) emergiram
oferecendo “conhecimento substancial em design de
cinemas multiplex”, incorporando “as últimas
tecnologias, incluindo assentos de estádio com linha de
visão uniforme”.31 Os planos de negócios multiplex
giravam em torno da apresentação de filmes mainstream
e sucessos de bilheteria em várias telas. Curiosamente, à
medida que os cinemas cresciam, as ofertas diminuíam
em diversidade. A variedade de filmes que era exibida
em cinemas menores foi sacrificada a fim de
proporcionar um número maior de assentos para
exibições simultâneas de um único filme.
Os diretores de terror, em seu esforço para encher os
grandes cinemas de arquitetura modernista, buscavam
atrair uma massa lucrativa do mercado de jovens adultos
brancos. Estrelas jovens foram escaladas e temas jovens
foram adotados. Tecnologias melhoradas de efeitos
visuais permitiam maneiras grotescamente inovadoras
de se matar jovens, e foram bastante utilizadas enquanto
o medo do mal-dentro-de-comunidades-brancas era
explorado. Essas produções incluíam filmes de terror que
se utilizavam de datas/eventos especiais, como Baile de
formatura (1980), O dia dos namorados macabro (1981)
e o natalino Natal sangrento (1984).
Esses filmes sangrentos com assassinos eram, além
de extraordinariamente macabros, muito brancos. O
público era questionado a respeito de sua capacidade de
julgar se a pessoa por trás da máscara de halloween ou
barba de Papai Noel era um amigo branco ou inimigo.32
No pior dos casos, ao assistir esses filmes, os
espectadores eram desafiados a descobrir se eles
mesmos seriam os monstros ou as monstruosidades: “ou
você se identifica com o assassino — e gostaria de sair
por aí carregando um facão enorme e bem afiado
também — ou você se identifica com a vítima inútil cujo
desmembramento espetacular se torna a morte que você
também merece”.33
Juntamente com os filmes de terror hiperviolentos, o
gênero do horror se encaminhava para o centro da
cultura popular de maneiras interessantes, a partir de
uma fonte completamente inesperada — o cantor
Michael Jackson, o Rei do Pop.

MICHAEL JACKSON, O EMPRESÁRIO DO


TERROR
O disco Thriller (1982) transformou Michael Jackson, que
passou de uma estrela da música pop para um fenômeno
musical e um ícone global. O crescimento da
popularidade de Jackson coincidiu com o surgimento de
programas de videoclipes musicais (como o Video
Concert Hall) e redes de TV a cabo (como a MTV). A faixa-
título de Thriller (escrita por Rod Temperton) foi lançada
em 1983 e homenageia o gênero do filme de terror.
Jackson canta sobre o mal, bestas que saem em
perseguição no escuro, e vítimas que, paralisadas de
medo, não têm para onde correr e nenhum lugar em que
se esconder. Vincent Price, um ícone dos filmes de terror
(por exemplo, A mosca da cabeça branca [1958], O poço
e o pêndulo [1961] e O abominável dr. Phibes [1971]),
também participa da canção com um “rap”
acompanhado de efeitos sonoros comuns no terror, como
rangidos e uivos: “Darkness falls across the land/ The
midnight hour is close at hand/ Creatures crawl in search
of blood/ To terrorize y’awl’s neighborhood”.* A letra de
“Thriller”, observa Mercer (31), “evoca alusões e
referências à cultura cinematográfica do ‘terror’ e ‘horror’
[…]. A composição tece uma historinha”.34
Numa tentativa de alinhar ainda mais Thriller com o
gênero do terror, Jackson contratou o diretor de cinema
John Landis para dirigir o clipe e o técnico de efeitos
especiais Rick Baker para criar o terror. Landis e Baker
também fizeram o clássico cult de terror Um lobisomem
americano em Londres (1981), com a história previsível
do “homem que se torna monstro”, a qual pode ser
perdoada graças aos seus efeitos especiais. A maneira
como Landis filmou a transformação do homem em lobo
forneceu ao público uma revelação gráfica, em plena luz,
e não no escuro, de como o delicado corpo humano deve
passar por uma alteração extremamente dolorosa para
se tornar uma criatura diferente e biologicamente
distinta. Por causa do trabalho de Landis e Baker, Um
lobisomem americano em Londres ganhou um Oscar e
dois prêmios Saturn, de melhor maquiagem e melhor
filme de terror.35
Jackson queria que Landis e Baker produzissem um
vídeo de terror de qualidade similarmente alta. “Jackson
disse a Landis que tinha assistido Lobisomem ‘centenas
de vezes’ e queria que ele o transformasse em um
monstro. ‘Foi o que ele disse’, Landis se lembra. ‘Era o
que ele queria. Ele era claramente fascinado pela
metamorfose.’”36 O resultado foi um vídeo musical de
quatorze minutos — o primeiro do tipo — ao custo de
quase 1 milhão de dólares.
No vídeo, Jackson interpreta um adolescente chamado
Michael que está em um encontro com a sua “garota”
(Ola Ray). Ele usa roupas dos anos 1950 e dirige um
conversível da época, saudando um período
presumidamente mais inocente na história (branca)
americana.37 A gasolina de Jackson acaba em uma área
florestal remota. O público tem um vislumbre da lua
cheia no momento em que Jackson se vira para sua
acompanhante e, timidamente, revela que é “diferente”,
mostrando o quão distinto ele é dos “outros caras” ao se
transformar em um lobisomem, numa referência óbvia ao
filme de terror O lobisomem adolescente (1957).
Evidentemente, o aviso de Jackson sobre ser “diferente”
também pode conter um triplo sentido, fazendo
referência ao corpo transgressor de Jackson e a sua
sexualidade, às histórias estranhas que rondavam a
estrela do pop (como uma tentativa de comprar os ossos
do “Homem Elefante”) e ao seu então estado
monstruoso.38
Conforme o videoclipe prossegue, o público fica
sabendo que estava assistindo a um filme dentro do
filme, já que a cena é transposta para a época moderna
e mostra Jackson e seu par em um cinema assistindo ao
casal dos anos 1950 em um filme. Jackson e a garota
saem do cinema e tomam o caminho de casa; de
repente, sozinhos, eles estão passando na frente de um
cemitério, onde, em determinado momento, Jackson se
transforma em um zumbi ao estilo de A noite dos mortos-
vivos (1968). Thriller apresenta mortos-vivos mutilados e
ensanguentados se erguendo das tumbas. Esses
monstros se juntam ao Jackson zumbi (com toques de
Frankenstein) para fazer uma das sequências de dança
mais icônicas na história da mídia moderna. O vídeo
termina com Jackson fazendo uma pose lupina e com um
sorriso carinhoso, deixando o final em aberto como
muitos filmes de terror populares dos anos 1980.
Landis esperava que o vídeo musical trouxesse o curta
cinematográfico de volta; contudo, a gravadora CBS, o
selo de Jackson, não respondeu bem: “‘A CBS mandou a
gente ir se foder,’ relembra Landis. ‘Walter Yetnikoff,
essas foram as palavras exatas dele: Vai se foder; foi o
que ele me disse ao telefone’.”39 Embora o clipe não
tenha ressuscitado os curtas, o vídeo rendeu a Jackson
três prêmios concedidos pela MTV: melhor vídeo, escolha
do público e coreografia.40 A produção também
inaugurou o mercado direto para VHS ou as “vendas
diretas”, nas quais as locadoras eram cortadas da cadeia
com as vendas sendo realizadas diretamente para o
consumidor — o Thriller de Michael Jackson, juntamente
com o documentário dos bastidores Making Michael
Jackson’s Thriller, venderam milhões de cópias, embora
ambos pudessem ser vistos de graça, e regularmente, na
televisão.
O sucesso e o lucro do vídeo domiciliar
“pavimentaram o caminho para a venda direta de VHSS e
DVDS, uma pedra fundamental no modelo de negócios de
Hollywood nas últimas duas décadas”41 que beneficiou
enormemente o terror, em especial. Ironicamente, o
êxodo branco também afetou os locais urbanos de
exibição da indústria cinematográfica, e o mercado de
vídeos caseiros se esforçou para aliviar o trauma à
medida que a “suburbanização realocou a localização da
cultura popular americana durante o pós-guerra e
esvaziou os cinemas urbanos nas cidades do país”.42
Jackson, Landis e Baker efetivamente tiraram o filme de
terror do multiplex, e até mesmo das exibições
televisivas durante a madrugada e de cinemas que ainda
tinham as sessões da meia-noite, e o colocaram na TV a
cabo no meio do dia (e, mais tarde, na reprodução
doméstica). Thriller também cortejou um público
demográfico a partir dos doze anos de idade.43
Em 1997 Jackson revisitaria o filme de terror, mas
dessa vez sob a direção do mago da maquiagem e dos
efeitos visuais Stan Winston, que trabalhou com o cantor
pela primeira vez em O mágico inesquecível (1978) e
cujos méritos famosos incluem os filmes de terror:
Monstro sem alma (1976), O enigma de outro mundo
(1982), Aliens, o resgate (1986), O predador (1987), O
predador 2: a caçada continua (1990) e O exterminador
do futuro 2: o julgamento final (1991). Com uma história
concebida pelo escritor e roteirista de terror Stephen
King, o filme de terror/videoclipe musical Ghosts, de
quarenta minutos, se concentra no estranho “Maestro”,
que é adorado pelas crianças, mas incompreendido pelos
adultos, que querem vê-lo expulso da comunidade. Em
uma cena em preto e branco (antes do filme ganhar cor),
os adultos, com crianças em seu encalço, marcham até o
castelo do Maestro com tochas acessas ao estilo de
Frankenstein. Em um relato aparentemente
autobiográfico, o Maestro, em seguida, se transforma em
várias figuras demoníacas para amedrontar os adultos e
fazê-los ir embora, deixando-o sozinho com as crianças,
que passam a brincar em seu castelo. Jackson usou de
maquiagem e efeitos visuais para explorar o seu rosto —
que já estava dramaticamente alterado pelas cirurgias
plásticas e, a essa altura, já lembrava um esqueleto — ao
se mostrar como um demônio esquelético descarnado.
Jackson, em um papel duplo, também usaria de efeitos
especiais para se transformar no “Prefeito”, um homem
branco intolerante e gordo que é especialmente contra a
presença do Maestro na comunidade.
Embora Thriller e Ghosts pegassem mais leve em seu
objetivo de assustar o público, os videoclipes mostraram
de relance algo muito mais insidioso do que acontecia no
íntimo do próprio cantor, especificamente seu desejo de
uma transformação corporal na vida real que tornaria o
próprio Jackson uma figura monstruosa. Os temas do
terror e das alterações corporais (monstruosas)
apareceriam repetidamente para Jackson em seus
clipes/filmes Captain EO (1986), Moonwalker (1988) e
Black and White (1991).
Contudo, a metamorfose da vida real de Jackson era
mais alarmante. Embora ele sempre negasse a extensão
de suas cirurgias, as evidências físicas eram óbvias:
Jackson fez uma reconstrução obsessiva dos seus traços
faciais (queixo, nariz, olhos etc.). Ele se comparava a
Peter Pan, um personagem fantástico associado ao
rejuvenescimento e à fantasia da juventude eterna;44
contudo, a busca de Jackson para tornar essa fantasia
realidade por meio de alterações estéticas era mais
chocante e provocadora do que qualquer transformação
vista em Thriller ou Ghosts. Skal, em seu livro The
Monster Show, resume o “horroroso” caso de Jackson,
conectando seu corpo real e material ao gênero do
terror:

Talvez não seja de surpreender que a estrela de


“Thriller” tenha a intenção de transformar o seu
rosto em algo parecido com uma caveira viva.
De alguns ângulos, a pele branca como osso, o
nariz aquilino e o cabelo cacheado remetiam a
Lon Chaney em O fantasma da ópera. A
comparação é válida, pois sublinha as funções
culturais paralelas de Jackson e Chaney: a
personificação de uma poderosa metáfora de
transformação para um público basicamente
incerto e temeroso em relação às reais
possibilidades de mudança numa sociedade
supostamente sem classes e passível de
mobilidade.45

Dessa forma, os filmes de Jackson, ao apresentarem


temas raciais para o público mainstream, são
frequentemente complicados e matizados. Às vezes,
monstros negros são estranhamente adoráveis (Thriller)
ou servem para desafiar “a exclusão do Outro” (Ghosts).
As contribuições de Jackson para os discursos da
negritude no terror se confundem com sua aparente
busca pela brancura fenotípica e com o desejo
conservador do público mainstream dos anos 1980 de ter
uma imagem da cultura pop que não suscitasse
comentários (raciais) de qualquer tipo. Kobena Mercer,
em “Monster Metaphors: Notes on Michael Jackson’s
Thriller”, descreve a indeterminação racial e sexual de
Jackson como um hieróglifo social — alguém que “exige,
mas que desafia a decodificação”.46
NEGROS TAGARELAS E NEGRAS MUDAS
Como o pôster no cinema anunciava, o “filme mais
controverso do ano!”, Cão branco (1982), conta a história
de uma jovem atriz solteira, Julie Sawyer (Kristy
McNichol), que vive nas colinas de Hollywood. Ela
encontra um grande pastor-alemão na rua e decide
adotá-lo para ter segurança e companhia. Contudo, logo
se descobre que o cão tem um lado sombrio: ele gosta
de fugir da casa de Julie para matar qualquer pessoa
negra que encontre pela rua; brancos não são
incomodados. Ele assassina a mordidas um trabalhador
negro da prefeitura e quase mata uma atriz negra no
local onde Julie trabalha. Acreditando que o animal havia
apenas sido treinado como um cão de ataque, Julie o leva
até um local de adestramento de animais — Noah’s Ark.
Lá, o cão ataca um cuidador negro. O branco idoso que é
dono do lugar, o sr. Carruthers (Burl Ives), revela a Julie
que ela não tem apenas um cão de ataque, mas um “cão
branco”.47 É explicado que “cão branco” é um
coloquialismo usado para se referir a cães treinados para
matar pessoas negras. O filme afirma que os “cães
brancos” possuem uma história: originalmente, eles
eram usados para caçar escravizados fugitivos, e, mais
tarde, negros condenados.48 Mais recentemente, “cães
brancos” são usados para atacar qualquer pessoa negra
que apareça. Carruthers recomenda a eutanásia imediata
do cão de Julie. Contudo, um adestrador de animais
negro, Keys (Paul Winfield), intervém, voluntariando-se
para fazer da reabilitação do cachorro a sua missão
pessoal: “Eu vou fazer você aprender que é inútil atacar
pele negra”. Contudo, em uma cena particularmente
violenta, o cão foge dos cuidados de Keys e acaba
perseguindo um negro. Seguindo o homem até o interior
de uma igreja, o cachorro o abocanha até a morte,
deixando seu corpo no altar. Estranhamente, Keys pega o
cachorro para continuar a adestrá-lo em vez de matar o
animal, apesar dos pedidos de Julie e Carruthers para
que ele coloque o cachorro para dormir antes que ele
mate novamente.
FIGURA 6.2 CÃO BRANCO.
Paramount Pictures/Photofest
Julie, em certo momento, encontra o primeiro dono do
cachorro, um (estereotípico) branco pobre e racista que
“mora em um estacionamento de trailers”. O dono
confirma que treinou o cachorro para ser “o melhor” cão
branco de todos. Cão branco incentiva o seu público a
desprezar, assim como considerar anômalo, o antigo
dono do cachorro, que parece ter saído do interior do
Mississippi dos anos 1930, tendo até mesmo um sotaque
sulista. O filme tenta apresentar debates provocantes
sobre o racismo: seria algo natural ou uma criação? Até
mesmo os racistas poderiam ser vistos como membros
da sociedade passíveis de redenção? Contudo, essas
discussões não conseguem ficar à altura de um grande
embate discursivo — questionar os dilemas raciais mais
sutis, surgidos após a era das leis Jim Crow, que infestam
a sociedade estadunidense. Como Keys continua a
insistir na tentativa de reabilitar o cão, tentando fazer
com que ele voltasse a ser o “dr. Jekyll”, sua ideologia de
assimilação é codificada como heroica enquanto continua
a tentar se reconciliar com o cachorro. Dessa forma, o
cão e seu apoiador negro servem como metáforas de
esperança na melhora das relações raciais, mas essa
esperança tem seus custos para a negritude. De certa
forma, Keys se une a Dick Hallorran e Jezelle, sacrificando
a sua segurança (e a de outros) em nome da
branquitude.
O filme termina de forma perturbadora. Embora o cão
tenha feito o seu melhor para acabar com os negros da
Califórnia sozinho, Keys forçou o animal a tolerá-los. Nas
cenas finais do filme, o cachorro se volta contra o branco
sr. Carruthers. Apenas então Keys conclui que não é
possível salvar o cachorro e atira nele.
Cão branco, desde o início, foi envolto de
controvérsias. A NAACP se opôs ao filme antes mesmo do
início das filmagens,49 e durante as filmagens a
organização pediu mudanças no roteiro.50 O jornal Village
Voice relatou:
na época em que o filme estava sendo feito, em
meio à conscientização acerca da necessidade
de imagens negras fortes, as atividades da Ku
Klux Klan aumentavam. Nesse clima, a NAACP
alertou a Paramount de que o filme, em que três
negros são terrivelmente atacados pelo “cão
branco”, poderia ser uma incitação perigosa ao
racismo.51

Assim que o filme ficou pronto, o Paramount Pictures,


estúdio que produziu o filme, engavetou Cão branco,
optando por não lançá-lo nos Estados Unidos. A
Paramount declarou que Cão branco não teve uma boa
resposta nos testes em Detroit.52 Por outro lado, seus
realizadores afirmaram que o estúdio queria um filme
mais parecido com Tubarão, mas com patas — coisa que
o mais cerebral Cão branco não era.53 Foi apenas em
1991 que o filme teve um lançamento limitado nos
Estados Unidos, principalmente em pequenos festivais de
cinema.54
O enigma de outro mundo (1982), de John Carpenter,
deu ao público um anti-herói de terror inesperado — um
homem negro aguerrido e ferozmente independente que
(presumidamente) sobrevive ao monstro. Nesse filme de
terror “com negros”, um grupo de pesquisadores
alocados em uma estação científica remota na Antártica
recebe por engano um alienígena recém-descongelado
dentro do acampamento. O alienígena tem o único
objetivo de sobreviver à custa de outros seres vivos. “A
coisa” não apenas tem a habilidade de assumir a
aparência de qualquer espécie viva (humano, cão, outras
formas alienígenas etc.), mas também pode assimilar
completamente aquilo que consumiu, apropriando-se de
seu comportamento e memória. O filme funciona,
observa Guerrero, por causa da sua “habilidade
tecnológica em construir o monstro não como um vegetal
humanoide ao estilo dos anos 1950, mas como um
xenomorfo muito mais potente e patológico, um ser
alienígena que tem o poder de invadir, absorver e imitar
nos mínimos detalhes qualquer criatura com a qual tenha
contato”.55
À medida que o grupo começa a perecer nas mãos do
monstro doppelgänger, os homens vão ficando mais
consumidos pela paranoia e medo (uns dos outros).
Contudo, dois homens se mantêm firmes sob pressão. O
primeiro é MacReady (Kurt Russell), um branco piloto de
helicóptero cujas ações e pensamentos rápidos o
colocam em um papel de liderança. O segundo homem é
o corajoso e focado Childs (Keith David), um mecânico e
um dos dois negros do grupo. Diferente de MacReady,
que é cerebral e firme, Childs parece ser um esquentado
que não confia em ninguém. Conforme a contagem de
corpos aumenta e a tensão sobe, o grupo decide que
precisa de um líder para organizá-los durante a luta pela
vida. Childs se voluntaria como líder e automaticamente
busca os armamentos que vêm junto com o posto.
Contudo, a tentativa de Childs de assumir o poder é
rejeitada sumariamente por MacReady — “Precisa ser
alguém com o temperamento mais ameno, Childs” —, e
o grupo concorda.
Doherty enxerga os membros do grupo isolado como
homens “irritados, desagradáveis e egoístas, tão frios
quanto a dura paisagem antártica que habitam. O fato de
esses homens viverem de tal forma em um lugar
apertado — em isolamento total, dependendo um do
outro para a sobrevivência e auxílio — e ainda assim não
desenvolverem um laço fraternal desafia a realidade
social e a lógica dramática”.56 Contudo, existe uma outra
leitura que pode explicar o motivo de eles serem
“desagradáveis”, e não fraternos. É uma interpretação
que leva em conta relações de poder, assim como
classes, educação e diferença racial. O acampamento é
majoritariamente branco. Entre o grupo, há hierarquias
sociais óbvias. A maior parte do grupo é composta por
homens educados, habilidosos e treinados — médicos,
cientistas pesquisadores (biólogos, geólogos,
meteorologistas) e técnicos, como pilotos, todos eles
brancos. Uma minoria de brancos possui status mais
“baixo”, trabalhando em funções como operadores de
rádio, cuidadores de cães e mecânicos. Dois negros,
Nauls (T.K. Carter), um cozinheiro, e Childs, um
mecânico, não possuem uma “patente”, por assim dizer.
Em uma cena, um membro branco da equipe, que está
machucado e tentando descansar, pede a Nauls que ele
abaixe o volume de sua música. Nauls, que trabalha na
cozinha, tenta encenar um pequeno ato de retribuição ao
ignorar a ordem de maneira desafiadora. Igualmente,
Childs se esforça para exercer algum poder ao desafiar a
liderança de MacReady, e também questionando se
MacReady pode ser uma “coisa”. De maneira alguma
Childs exibe a performance do negro assustado ou do
sacrifício voluntário.
O clímax da narrativa se constrói quando Childs deixa
o acampamento, desaparecendo no ambiente hostil.
MacReady, que também estava fora de vista durante
determinado momento, e possivelmente incorporado,
explode o acampamento. Tal ato de destruição se torna
um clássico do terror quando os personagens concluem
que “a casa ou túnel poderia parecer um local seguro no
início, mas as paredes que prometiam manter o
assassino para fora rapidamente se transformaram nas
paredes que prendem as vítimas no momento em que o
assassino invade”.57
O enigma de outro mundo conta com um final
surpreendente. MacReady se prepara para morrer no frio
congelante como o único sobrevivente. Se o alienígena
não estiver em seu corpo, sem o acampamento para
providenciar abrigo, ele seria congelado novamente. Se o
alienígena estiver em seu corpo, MacReady será
congelado até a morte juntamente com a criatura dentro
dele. Contudo, no momento que MacReady está
aceitando o seu destino, Childs reaparece de repente.
MacReady e Childs não sabem com certeza se um ou o
outro é o alienígena. O filme termina com os dois se
encarando com ceticismo, mas também estabelecendo
uma amizade — já que são iguais agora. Eles
compartilham uma garrafa de bebida enquanto esperam
para ver o que acontece em seguida. O enigma de outro
mundo, então, apresenta um final bem aberto em que o
destino do monstro e dos homens não fica explícito. E
essa abertura narrativa, escreve Hutchings, pode ser
vista como “uma expressão da ambivalência, ou até
mesmo uma crítica, em relação aos valores sociais
dominantes”.58 Poderia tal final, em que o monstro, o
negro e o branco sobrevivem, ser uma crítica dos valores
dominantes no que diz respeito ao poder ou apresentar
uma ambivalência racial? Guerrero, de forma pessimista,
acha que não:

à medida que a câmera enquadra os


sobreviventes em planos médios reversos de
suspeita mútua, é possível discernir que a
respiração do branco é pesadamente enevoada
no ar antártico, enquanto a do homem negro,
não. A implicação é sutil, mas clara: a Coisa vive
e, de maneira significativa, seu portador é outra
forma socialmente marginalizada, o homem
negro.59
Se Guerrero está ou não perto de uma conclusão
acerca de quem é a coisa não é tão importante quanto o
fato de que Childs faz parte desta discussão desde o
início. Ele desafia o estereótipo do parceiro que se
sacrifica e papéis em que negros morrem primeiro. O
personagem de Childs — que encara MacReady como
Ben em A noite dos mortos-vivos olha para Harry — pode
ser lido como o triunfo de sobrevivência que Ben não
teve em Noite. Mais do que isso, Childs não trabalha para
ajudar a branquitude, como vemos em A maldição dos
mortos-vivos. Childs pode ser visto como uma pessoa
cabeça-dura e até mesmo desagradável — qualquer uma
dessas coisas representa uma sentença de morte para
negros em filmes de terror. Seu heroísmo e suas falhas
são o que são: “reais”. Ele também não precisa carregar
as pesadas expectativas das hierarquias sozinho. Na
verdade, a “dimensão apocalíptica”60 de O enigma de
outro mundo permite que o monstro assuma parte do
fardo, uma vez que ele representava um novo Outro
adentrando na sociedade.
As mulheres negras não tiveram muita inclusão no
gênero durante esse ciclo dos filmes de terror. Uma
exceção notável foi o filme de terror “com negros” Vamp:
a noite dos vampiros (1986), estrelado pela
artista/modelo/cantora Grace Jones. O filme se aproveita
ao máximo da aparência chamativa de Jones — uma
figura ligeira e andrógina de 1,8 m de altura com roupas
de alta costura —, colocando-a no papel da vampira
Katrina, dona de um clube de striptease. O clube
Afterdark, localizado no centro da cidade, fica numa
região desolada e imunda de Los Angeles, longe da vida
agitada da cidade ao redor. O clube serve como disfarce
para as caçadas vampíricas de Katrina. Seus servos
trazem homens para Katrina se alimentar (embora ela
seja uma “bi-vampira” e aceite mulheres com prazer). O
problema começa quando três estudantes universitários,
Keith (Chris Makepeace), A.J. (Robert Rusler) e Duncan
(Gedde Watanabe), alunos de um campus fora da cidade,
a “300 km da civilização”, vão até o Afterdark com o
objetivo de levar algumas strippers para uma festa na
universidade. A.J. vira alimento para Katrina. Keith (que é
branco), Duncan (que é amarelo) e “Amaretto” (Dedee
Pfeiffer), uma jovem branca que eles resgatam do clube,
lutam para sobreviver até o nascer do dia. Notavelmente,
entre os heróis, apenas Duncan, o asiático amarelo,
morre, sendo transformado em vampiro e então
destruído pelo fogo. Até mesmo A.J., vítima de Katrina,
sobrevive inesperadamente, mas como um vampiro que
se resigna alegremente à vida como uma criatura
noturna. Keith e Amaretto matam Katrina e caminham na
direção do sol, aproveitando o dia.
Katrina é, ao mesmo tempo, bela e horrivelmente
grotesca, cruelmente mortal e sexy. Seu exotismo se
evidencia quando a vemos cercada de símbolos que lhe
dão uma conotação de alteridade estrangeira — suas
roupas, a cripta e outros apetrechos são oriundos do
continente africano. Seu corpo é pintado com emblemas
que parecem hieróglifos. Katrina se conforma ao exótico,
literalmente; embora ela seja a dona do clube, e uma
líder vampira, ela também atua como uma dançarina
exótica, fazendo uma número altamente sexualizado, no
qual simula uma relação sexual com uma cadeira.
Katrina, na verdade, é mais obcecada por sexo do que
por sangue. De maneira notável, há pouco mais para se
dizer sobre Katrina, pois ela quase não tem falas no
filme. Katrina é silenciosa, com exceção dos barulhos de
sucção e gemidos, grunhidos e silvos. Hudson resume
sucintamente a função de Katrina: “Ela é associada à
hipersexualidade e violência. Seu comportamento é
retratado como animalesco: ela rosna e uiva ao lamber o
corpo de A.J. […] Porque os protagonistas de Vamp são
brancos, Jones se destaca como o outro (mudo ou
silenciado) cultural”.61
FIGURA 6.3 A SILENCIOSA E MORTAL KATRINA EM VAMP.
New World Pictures/Photofest
A ausência de falas de Katrina talvez acrescente algo
ao apelo de sua monstruosidade, mas também a limita.
Essa falta de diálogos, juntamente como foco em seu
corpo, significa que o papel dela é única e
exclusivamente ser um colírio para os olhos. Há pouco
mais do que isso em relação a Katrina.

CONCLUSÃO
Os monstros dos anos 1980 geralmente desafiavam os
modelos estabelecidos. Eles não eram racializados como
negros, como em King Kong ou O monstro da lagoa
negra. Ao contrário, os monstros dos anos 1980 eram
brancos, masculinos e suburbanos. Dessa forma, em
filmes brancos e suburbanos de terror, a “raça [se
tornou] uma ausência estruturante nos arredores do
terror contemporâneo, em que monstros, vítimas e heróis
são predominantemente brancos, uma categoria não
marcada racialmente”.62 Os monstros dos anos 1980
tinham acesso a recursos como fantasias de Papai Noel
ou equipamentos de mineração, dirigiam carros e
fabricavam as suas próprias armas. Esses “monstros
brancos cujas faces emergem de um agrupamento
aleatório de anuários escolares, carteiras de motoristas e
espelhos de banheiros” podiam passar despercebidos,
pois a maldade deles não era imediatamente
identificável por causa da ausência de codificação de
cor.63 Se eles não chamassem suas vítimas, entrando nos
sonhos delas, por exemplo, os monstros poderiam ser
amplamente invisíveis, porque se encaixavam muito
bem.
Os negros não tinham tanta sorte. Eles ficavam presos
em ilhas ou eram deixados para trás em cidades
moribundas. Personagens negros só enxergavam algum
tipo de reparação imagética quando se tornavam o
símbolo de uma devoção inter-racial unilateral. Embora
não recebessem nenhum gesto de bondade por parte
dos brancos, eles queriam ajudar, e sua recompensa era
encontrar a morte enquanto contribuíam com a
continuidade da branquitude. Obviamente, isso era o
suficiente para que eles fossem para o céu, e não para o
inferno. Esse tipo de sacrifício voluntário teria que servir
para os negros (ou para os negros supimpas mágicos e
místicos, como o cineasta Spike Lee os apelidou),64 já
que nem a própria magia podia ser usada para sua
salvação.
Alguns acadêmicos refletiram que o terror desse
período parecia entender “o Outro como um bode
expiatório”, recusando-se a “ver o monstro como uma
aberração que precisa ser abatida para assegurar a
normalidade da burguesia”.65 No entanto, tal conclusão
não pode ser alcançada no contexto de análise da
presença dos negros no terror ou da ausência de um
“terror negro”. James Snead argumenta que a omissão,
ou exclusão, é a forma mais comum de estereotipação,
mas também é a mais difícil de identificar porque sua
manifestação é a própria ausência.66 Na verdade, o Outro
Nativo Americano se tornou o bode expiatório do mal, e a
década como um todo foi um comentário sobre como
reassegurar a normalidade da burguesia branca. Uma
maneira, de fato, era ficar longe de cemitérios e das
áreas urbanas centrais.
Se Michael Jackson não tivesse inserido uma tirada
autodepreciativa acerca da sua identidade em Thriller, a
heterossexualidade masculina não teria sido examinada
e seria considerada a norma. As mulheres, como a sexy e
silenciosa Katrina, que deveriam ser vistas, mas não
ouvidas, é que eram consideradas “um problema, uma
fonte de ansiedade, de questionamentos obsessivos”, ao
contrário dos homens.67
Contudo, enquanto as comunidades brancas e negras
ocupavam uma existência “onde nunca haveriam de se
encontrar” nos anos 1980, as coisas começaram a mudar
dramaticamente na década seguinte — os anos 1990 —,
quando a condição do mundo urbano tomaria o palco
central. Os negros que foram deixados para trás
finalmente seriam inseridos em histórias sérias de
redenção moral — com mulheres negras, em alguns
casos, atuando como salvadoras vocais e poderosas.
* Em tradução livre: A escuridão cai sobre a terra/ A meia-noite se
aproxima/Criaturas rastejam à procura de sangue/ Para aterrorizar a
vizinhança [NT]
HORROR
NOIRE

1990
ESTAMOS DE VOLTA! A VINGANÇA E
O TERRENO URBANO

Mas não seria cada centímetro de nossas


cidades uma cena de crime? Cada
transeunte, um culpado?— BENJAMIN
(256)1

O gênero do filme de terror celebrou o seu primeiro


século em estilo altamente cinematográfico com a
chegada daqueles que podem ser chamados de filmes de
terror de “prestígio”.1 O silêncio dos inocentes (1991),
dirigido por Jonathan Demme, levou o seu terror a sério,
escalando Jodie Foster, vencedora do Oscar, e Anthony
Hopkins, indicado ao Oscar, para oferecer calafrios
psicológicos nauseantes. Respeitar o gênero deu
resultados, com O silêncio dos inocentes recebendo
surpreendentes cinco Oscars — melhor ator, melhor atriz,
melhor diretor, melhor filme e melhor roteiro. O filme
abre uma década excitante e cheia de terror. Entrevista
com o vampiro (1994), de Neil Jordan, devolveu o apelo
sexy ao gênero, com três ídolos das matinês, Antonio
Banderas, Tom Cruise e Brad Pitt. Essa estratégia
funcionou bem, rendendo ao filme duas indicações ao
Oscar e vários outros prêmios. Como Abbot nota, os anos
1990 representaram o amor dos Estados Unidos pelo
terror, com Hollywood investindo forte em estrelas
notáveis e grandes orçamentos para os filmes do
gênero.2 Francis Ford Coppola, vencedor do Oscar e
famoso pela trilogia O poderoso chefão (1972, 1974,
1990), assumiu a tarefa de dirigir Drácula (1992). O ator
Jack Nicholson, vencedor de dois Oscars e estrela do
filme O iluminado (1980), voltou ao terror em Lobo
(1994). Assim como Robert De Niro, também vencedor
de dois Oscars (O poderoso chefão II [1974]; Touro
indomável [1980]) e estrela do filme de terror Coração
satânico (1987), revisita o gênero como a Criatura em
Frankenstein de Mary Shelley (1994). Mas tivemos outros
— muitos, muitos outros — filmes nos anos 1990, como o
sucesso de bilheteria A múmia (1999), que unia ação e
monstros, e o aterrorizante e melancólico O sexto sentido
(1999). E também os sucessos inesperados da década,
como A bruxa de Blair (1999), produzido com menos de
100 mil dólares, mas que foi um estouro de bilheteria
(faturando mais de 130 milhões de dólares em suas
primeiras semanas de lançamento) ao fazer barulho na
internet. O terror havia se tornado tão movimentado que,
em 2004, aproveitando a popularidade gerada por A
múmia e O retorno da múmia (2001), o parque de
diversões Universal Studios Hollywood inaugurou uma
montanha-russa com a temática do filme, a “Revenge of
the Mummy”.3
A participação negra nesses filmes de terror de
prestígio foi notadamente limitada, o que nos leva à
pergunta: o que o gênero do terror significou para os
negros na década de 1990? A boa notícia é que o “terror
negro” estava de volta nessa década e com sede de
vingança, chegando com uma força que não era vista
desde o ciclo de terror dos anos 1970 da era
blaxploitation. Um filme em particular, Def by Temptation
(1990), foi uma reminiscência dos filmes de terror
religiosos de Spencer Williams dos anos 1940, como O
sangue de Jesus (1941) e Go Down, Death (1944), dando
um novo — e assustador — sopro de vida às histórias
moralizantes. Da mesma forma, “filmes negros” de terror
como Contos macabros (1995) modernizaram a
mensagem Black Power presente em filmes como A
vingança dos mortos (1974), tratando sobre a onda de
gangues e violência oriunda das drogas que assolavam
algumas comunidades negras. E finalmente o mais
importante: nos anos de 1990, foram produzidos “filmes
negros” de monstros, como The Embalmer (1996), em
que os negros retalham e gritam, vivem e morrem, assim
como as demais pessoas nos filmes do gênero.
Também tivemos alguns dos chamados filmes de
prestígio no “terror negro”, e se houve alguém por trás
de um projeto desse tipo esse alguém só poderia ter sido
Oprah Winfrey, com Bem-amada (1998). De outra
maneira, os “filmes negros” de terror teriam sorte se
conseguissem qualquer financiamento (como Bugged
[1997]). Felizmente, ou talvez não, dada a qualidade
oscilante, vários “filmes negros” de terror foram feitos,
alimentando a explosão do mercado de vídeos caseiros.
Resumindo, embora o “terror negro” não estivesse
acumulando prêmios ou quebrando recordes de
bilheteria, o gênero estava abrindo caminho ao colocar
negros em papéis substanciais, e não apenas em pontas,
como em Um vampiro no Brooklyn (1995).
Da mesma forma, os filmes de terror “com negros”
foram abundantes. O mistério de Candyman (1992)
brincou com velhos estereótipos, colocando novamente
uma bela loira em perigo nas mãos de um bicho-papão
negro. Notavelmente, os filmes de terror “com negros”
também apresentaram super-heróis negro, como Blade e
Spawn, homens em busca de vingança contra os vilões
brancos que destruíram suas vidas.
Havia uma linha que atravessava muitos dos “filmes
negros” de terror e dos filmes de terror “com negros”. Os
anos 1990 foram unidos pela temática da área urbana,
especificamente as áreas majoritariamente negras nos
guetos, investimentos imobiliários mortais. Em vários
“filmes negros” de terror, a área urbana era retratada
como um lugar perigoso e problemático, mas que valia o
esforço e mesmo uma tentativa de limpeza (como em
Ameaça urbana [1999]). Ao contrário, o filme de terror
“com negros” O predador 2: a caçada continua (1990)
retratou a área urbana como os filmes das décadas de
1920 e 1930 mostravam as florestas da África — sedenta
por sangue. As únicas diferenças entre as selvas e as
cidades eram que os negros norte-americanos apareciam
um pouco mais vestidos que os nativos africanos e que
suas armas preferidas eram pistolas em vez de lanças.
Ainda assim, o negro estava de volta, e voltou
arrebentando as portas do terror moderno.

CEDENDO À TENTAÇÃO
Os anos 1990 começaram com Def by Temptation (1990),
um “filme negro” sério e independente que lembra muito
o trabalho de Spencer Williams em O sangue de Jesus
(1941). Distribuído pela Troma Entertainment, uma
empresa infame por causa de seu extenso catálogo de
filmes bregas e apelativos, além de filmes de terror como
O vingador tóxico (1984) e A camisinha assassina (1996),
Temptation acabou se destacando por sua qualidade e foi
saudado pelo presidente da Troma, Lloyd Kaufman, como
o “melhor” filme do catálogo da empresa.4 Assim como O
sangue, Temptation era limitado pelo orçamento, mas,
assim como O sangue, Temptation compensava as
dificuldades por meio da imaginação e de sequências
altamente estilizadas.
Temptation foi escrito, dirigido e produzido pelo ator
negro James Bond III, diretor estreante que também atua
no filme. O filme apresenta um talentoso elenco negro,
com Samuel L. Jackson, Kadeem Hardison, Bill Nunn e
Bond (todos tinham aparecido juntos no filme Lute pela
coisa certa [1988], de Spike Lee), e conta com uma
pequena participação da cantora/atriz de teatro e TV
Melba Moore e o saxofonista de jazz Najee. O filme foi o
primeiro trabalho de produção do renomado produtor de
televisão e cinema, autor, ator e diretor Nelson George.
Além disso, o premiado diretor de fotografia e diretor
Ernest K. Dickerson (Dexter, temporadas 2008 e 2009;
Dia dos mortos, 1985; Malcolm X, 1992; A escuta,
temporadas 2004-2006) é o diretor de fotografia do
filme.
O filme se concentra em Joel (Bond III), um seminarista
de vinte anos que está visitando o irmão mais velho “K”
(Kadeem Hardison), um ator que mora no Brooklyn. É a
primeira viagem de Joel para Nova York, que vive em
uma cidadezinha na Carolina do Norte. Ele deixa para
trás a sua “Vovó” (Minnie Gentry), que o criou após a
morte dos pais, falecidos em um acidente de carro. A
história gira em torno da busca de Joel, que deseja ter
certeza a respeito de sua decisão de seguir os passos do
pai e se tornar pastor. O Brooklyn, como uma grande
cidade do norte, é apresentado como o lar de influências
corruptoras — escapadas sexuais, infidelidade, bebidas,
e em uma cena dramática até mesmo a TV se mostra
literalmente mortal. Ao contrário, a cidadezinha do sul é
mostrada como um lugar que irradia retidão. O sul é “lá
em casa”, a utopia negra fantástica da boa criação,
piedade e história. Os sulistas se encontram em igrejas, e
não em bares. As mulheres sulistas usam cruzes, e não
maquiagem pesada. Temptation apresenta aquilo que
Reid chama de “dualismo moralista regional”, em que a
cultura sulista é associada às responsividades decentes e
honestas, em oposição direta ao norte.5
No filme, um espírito demoníaco chamado Temptation
(Cynthia Bond) é, de acordo com o enredo, uma “coisa”
que usa da sexualidade para tornar a moralidade sua
refém. O espírito, ao longo dos séculos, ganhou forma
carnal e passou a seduzir os pecadores, considerando
uma vitória particular quando um verdadeiro inocente —
como um pastor temente a Deus — sucumbe à tentação.
Temptation assume uma forma feminina no filme e, de
modo similar a Abby (1974), preda os homens que
apanha, ou que a apanham, para matá-los durante o
sexo. As vítimas da viúva negra representam pecados
bem específicos e significativos, e assim temos uma
visão social bem conservadora. Há um homem que
encoraja uma de suas namoradas a fazer um aborto. E
também há um que tira a sua aliança antes de se
relacionar com Temptation. Aqui, depois do sexo,
Temptation provoca o homem: “Querido, eu te passei
uma coisa que não tem cura. Vai crescer e crescer até te
consumir”. A resposta do homem sobre a aparência
saudável de Temptation — “Você não parece ter nada” —
configura um sermão óbvio a respeito do sexo sem
proteção. O homem, presumidamente infectado com
uma doença sexualmente transmissível, começa a se
deteriorar imediatamente, tornando o seu pecado visível
para a esposa, que, por causa da infidelidade do marido,
atira nele. Contudo, o filme reserva sua violência mais
gráfica (punição) a um homem gay. Ele é atraído por
Temptation, e ela o encoraja a experimentá-la só uma
vez porque “uma mulher é muito melhor”. No quarto de
Temptation, à medida que o homem se prepara para o
que acredita ser sexo consensual, ela parece mais
maliciosa do que sedutora, como foi com suas outras
vítimas masculinas. Quando o homem pergunta se fez
alguma coisa errada, ela responde “sim” de maneira
desdenhosa antes de estuprá-lo violentamente. Aqui,
Temptation se torna uma “coisa”, inserindo um objeto
não mostrado, ou parte do corpo, no reto do homem,
enquanto ele pergunta “De onde você tirou isso?” antes
de implorar a Temptation que pare e retire aquilo. Ele
recebe toda a fúria dela, com os rosnados de Temptation
abafando os gritos do homem enquanto ela o penetra e o
retalha, para então sair do quarto ensopada com o
sangue dele. A cena mais feroz do filme é uma
representação alarmante da violência homofóbica,
alinhando-se com — e aprovando de maneira velada — a
violência real que a comunidade LGBTQI+ experimenta. Por
exemplo, um relatório de 1989, divulgado um ano antes
do lançamento Temptation, revelou que 5% dos gays e
10% das lésbicas entrevistados afirmaram ter sido
vítimas de algum tipo de violência homofóbica, enquanto
47% de todos os entrevistados afirmaram já ter sido
vítimas de algum tipo de discriminação baseada em sua
orientação sexual.6
Temptation mira em Joel, que é mostrado como uma
figura claramente destoante em Nova York, tanto nas
roupas quanto em seus maneirismos. K, que é “afiado
como uma lâmina”, usa as roupas urbanas da moda —
moletons caros e tênis. Sua fala é moderna e pincelada
com gírias e palavrões. Contudo, Joel chega usando
roupas cáqui, uma camisa abotoada e sapatos marrons
“feios”. Ele tem a fala refinada e não conhece
coloquialismos, respondendo “Fornicar é pecado” quando
K pergunta se ele “cairia de boca” se conhecesse uma
mulher atraente. Joel, da “cidadezinha”, onde ele
provavelmente “espantava mosquitos, tirava leite de
vaca e merdas do tipo”, precisa ter uma aula sobre como
se vestir e sobre o dialeto urbano.7 K começa a suspeitar
de Temptation e, com a ajuda de um agente federal à
paisana, Dougy (Bill Nunn), que também investiga crimes
paranormais, tenta matar Temptation.
FIGURA 7.1 JOEL E K EM DEF BY TEMPTATION.
Troma Films/Photofest
A história de Temptation se volta para o heroísmo de
uma mulher. K e Dougy são mortos, deixando Joel
vulnerável. De repente, Vovó aparece em cena para
salvar o neto. Armada com a bíblia de Joel (que ele
deixou em casa) e uma cruz de madeira, Vovó chuta a
porta de Temptation, pronta para travar uma batalha
espiritual ao apoiar Joel com algumas palavras de
pregação. Juntos, Vovó e Joel lutam contra Temptation.
Vovó personifica certo tipo de teologia mulherista — uma
preocupação com a comunidade negra e sua salvação
como um todo — enquanto mostra a “resiliência das
famílias centradas em uma mulher e seu desejo de
cuidar das crianças negras”.8 Temptation celebra e se
agarra a uma noção de uma avó ou parente que assume
tal posição, ainda que essa conexão comunitária seja
cada vez mais elusiva.
A representação desse tipo de figura materna
evidencia um rompimento importante com os filmes não
negros de terror. A “mãe como figura devoradora e
venenosa” é estranha ao “terror negro”, onde as
mulheres negras, quando mostradas, são reverenciadas.9
No “terror negro”, a narrativa central geralmente não se
foca em mães negras produzindo “sementes do mal”, ou
“psicopatas”, e nem deforma a religião com crueldade
abusiva para criar uma criança sobrenatural e
monstruosa (como em Carrie, a estranha [1976]).
No clímax do filme Joel escolhe Deus, proclamando:
“Demônio, eu te esconjuro!”. Graças ao poder da cruz
que Vovó trouxe com ela, Joel destrói Temptation ao
erguer o objeto diante dela, fazendo-a revelar sua
verdadeira forma demoníaca e grotesca antes de
explodir. Joel e Vovó, então, representam a família e a fé
restauradas. O filme termina com um aviso de perigo,
pois K e Dougy foram ressuscitados como criaturas do
mal e andam atraindo mulheres. Contudo, de volta ao
caminho direito, Joel afirma ao público que está pronto
para lutar pelas coisas certas. Dessa forma, o filme
afirma, “a única resposta para o sofrimento e a
decadência urbana é Jesus”.10
Temptation foi saudado pelo jornal Washington Post
como um filme “anos luz à frente de Blácula”, tendo
“profundidade e detalhamento emocional que
geralmente faltam em filmes do tipo”, e evitando alguns
do estereótipos geralmente oferecidos pelo “sistema de
filmes brancos”.11 O filme foi citado como uma produção
de baixo orçamento. Contudo, se o filme for avaliado fora
dos padrões hollywoodianos (como fez o presidente da
Troma), ele não pode ser simplesmente ignorado como
um filme B. Em vez disso, como revela a crítica do Post,
trata-se de um filme negro com convenções narrativas
únicas, que não deveriam ser “ignoradas como defeitos
artísticos ou técnicos”.12 Pelo contrário, o filme contribui
para a tradição cinematográfica negra que não trabalha
para replicar as sensibilidades ou inclinações estéticas,
ou, no caso do terror, a obsessão pelos efeitos especiais,
de Hollywood.
Temptation se juntou a outros dois filmes negros
dramáticos e misteriosos, Não durma nervoso (1990) e
Amores divididos (1997), logo, marcando os anos 1990
como uma década focada na cultura e famílias negras,
especialmente aquelas fora do gueto. Nervoso, dirigido
pelo aclamado diretor negro Charles Burnett, é inspirado
no terror e se concentra em um vigarista malvado, Harry
(Danny Glover), que entrou na casa de uma família
temente a Deus num bairro negro de classe média em
Los Angeles. Harry traz consigo uma gama de rituais
supersticiosos (jogar sal para afastar o azar) e folclóricos
(medicina popular, encantamentos) da sua “casa” — o
sul — e que aparentemente não se enquadram mais em
um lar cristão nortenho, criando, dessa forma, “tensões
entre os valores latentes do sul rural e aqueles
expressados pela cultura negra urbana e
13
contemporânea”. Depois que Harry se torna vítima de
uma das suas superstições e morre, a família se vê livre
do seu mal, evitando que matem uns aos outros. O
igualmente enigmático Amores divididos (1997), dirigido
pela premiada diretora negra Kasi Lemmons, coloca a
religião do povo negro como peça central de sua
narrativa. O filme, situado em uma cidadezinha da
Louisiana nos anos 1960, conta a história da família
Baptiste, descendente de um escravagista branco e uma
escravizada negra. A família lida com uma série de
traumas. A jovem Eve (Jurnee Smollett) compõe esse
núcleo familiar, e, assim como sua tia Mozelle (Debbie
Morgan), ela possui o dom da “visão”. Sendo uma
“conselheira psíquica”, Mozelle reza para Jesus antes de
“ver” algo para seus clientes. Contudo, não se trata de
vodu, e Mozelle nega saber como praticar vodu, isto é,
até que uma mulher desesperada por ajuda não deixa
outra opção para Mozelle, e ela acaba precisando usar o
seu poder. Da mesma forma, há uma bruxa, Elzora
(Diahann Carroll), cujo poder é ambíguo, mas alimentado
por sistemas tradicionais de crença e conhecimentos de
antigas práticas religiosas negras. Amores se torna um
“bom filme negro” à medida que demonstra
“conhecimento íntimo e especializado da experiência
negra”.14

REINVENTANDO A IMAGEM NEGRA URBANA


Brancos dizem, fuja!
Ainda — cá estou
Brancos dizem, voe!
Cá estou!
— Langston Hughes15

Filmes de terror e ficção científica como A guerra dos


mundos (1953) e O mundo em perigo (1954)
asseguraram aos brancos suburbanos que eles haviam
feito a escolha certa ao rejeitar a vida urbana, já que
marcianos e formigas gigantes — “representações
espetaculares do Outro e da sua violência” — destruíam
cidades.16 Mas o horror tinha tudo a ver com o medo e o
caos causados pela perturbação, e ao longo dos anos o
gênero levou o terror para esses enclaves supostamente
idílicos ao mostrar que monstros brancos (não é
permitida a presença de negros!) poderiam se mudar
para esses lugares também.
Com monstros como Freddy Krueger e Michael Myers
ocupados em transformar brancos suburbanos em purê,
os “filmes negros” de terror se aproveitaram do vazio
representacional que restou quando o terror branco
também se mudou para os subúrbios. Esses filmes de
terror em cenários urbanos apresentavam narrativas
centradas em negros, isto é, se utilizavam das crenças,
da história e da cultura negra. A estética era negra, com
expressões de estilo, música, linguagem e cadência em
geral — referências culturalmente específicas e
informações que vinham de dentro —, e também
conversava com a negritude. Os filmes trouxeram um
realismo social, revelando o que havia de mais
ameaçador para os negros urbanos, aquilo que mais os
assombrava enquanto estavam despertos ou em seus
sonhos, o racismo contínuo, a disparidade econômica,
crises de saúde e formas específicas de criminalidade,
como armas, violência de gangues e corrupção policial.
Os negros foram mostrados não apenas como figuras
urbanas, mas também como moradores dos guetos, que
não devem ser confundidos com os centros das cidades,
os quais ainda estavam abertos para negócios. Em vez
disso, os negros ficavam em regiões desoladas da
cidade, no centro dos guetos, o oposto dos subúrbios e
outros locais não urbanos (como a área rural). Os guetos
ficaram associados a uma imagem racializada e de
classe baixa, onde os negros eram retratados como
pessoas pobres ou tomando parte em economias ilegais
do submundo, como a venda de drogas. Apenas os
violentos, perigosos e depravados sobreviviam nas áreas
urbanas, enquanto os inocentes, aqueles que não
conseguiam sair, eram transformados em reféns.
Também ocorreram movimentos nos filmes de terror
cujo objetivo era refazer a imagem apresentada dos
bairros negros. Esses lugares nem sempre eram apenas
comunidades urbanas empobrecidas ou, como foram
descritos nos anos 1970, “o gueto”. Agora, “a quebrada”
era o apelido da vez, e a quebrada por vezes acomodava
a imagem espacial do gueto, mas ao mesmo tempo
permitia “maior flexibilidade […] para descrever e
delinear localidade — literalmente, o bairro de alguém e
o espaço que esse alguém relaciona a um ambiente
familiar”.17 A quebrada, então, também era um lugar que
possuía um significado real, pois pertencia a uma
construção identitária e de entendimento da
comunidade. Por exemplo, na quebrada os negros eram
“reais”, autenticamente negros. Enquanto alguns negros
“caíam fora” por alguma oportunidade de trabalho ou
educação, os negros “vendidos” eram aqueles que
viravam as costas para sua relação com a quebrada e
para as memórias relacionadas ao lugar. Embora tendo
uma reputação difícil, a quebrada ainda era o lar e tinha
muito a oferecer, incluindo contribuições seminais para
todas as facetas da cultura negra. Por causa dessa
liberdade cultural e retórica, a geração do hip-hop pode
ser especificamente agradecida por ter lembrado aos
negros que o relacionamento de uma pessoa com a sua
comunidade é algo profundo e complexo, e não pode ser
reduzido a convenções banais.

LUTANDO PELA QUEBRADA


O “filme negro” de terror Contos macabros (1995), do
diretor negro Rusty Cundieff, não era muito
hollywoodiano, mas teve um grande apoio da produtora
de Spike Lee, a 40 Acres and a Mule. O filme tomou
emprestado das revistas em quadrinhos Contos da cripta
da década de 1950, do filme (1972) e do seriado da HBO
(1989-1996), em que são apresentadas vinhetas cômicas
de terror que mostram como alguém encontrou o seu fim
prematuro. Contos macabros se esforçava para mostrar
que era diferente de Contos da cripta ao focar em
histórias negras e apresentar sua própria versão do
Guardião da Cripta, mascote e narrador de Contos da
cripta (um esqueleto em decomposição). Contos
macabros apresentou um esqueleto negro com uma
bandana amarrada na cabeça ao estilo dos gângsteres,
de óculos escuros e que levava uma arma na mão.
Contos macabros apresenta quatro vinhetas introduzidas
por um diretor de funerária assustador, Mr. Simms
(Clarence Williams III), que também revela a história por
trás da morte daqueles que repousam em seu
estabelecimento. No filme, seu público é composto por
três jovens vendedores de drogas que fazem parte de
uma gangue.
Na primeira história, um distinto ativista negro, Martin
Moorehouse (Tom Wright), que está tentando se livrar
dos policiais brancos corruptos e racistas no gueto, é
assassinado por três policiais. Entre o trio está um racista
virulento chamado “Strom”, uma provável referência ao
segregacionista Strom Thurmond, governador da Carolina
do Sul (1947-1951) e senador (1954-2003), que, de
maneira infame, proclamou em 1948: “E eu quero dizer a
vocês, senhoras e senhores, que não há tropas
suficientes no exército para forçar os sulistas a acabarem
com a segregação e permitir a entrada da raça crioula
em nossos teatros, em nossas piscinas, em nossas casas
e igrejas”.18 Thurmond também foi contra o Ato dos
Direitos Civis de 1957. Os policiais matam Moorehouse e
plantam drogas nele, arruinando também sua reputação.
O caso inteiro é testemunhado por um policial negro
novato, Clarence (Anthony Griffith), que não intervém.
Enlouquecido pela culpa, Clarence larga a polícia e se
torna um beberrão. No aniversário de um ano do
assassinato, o fantasma de Moorehouse executa uma
série de atos brutais de vingança contra os policiais.
Contudo, Moorehouse reserva o seu maior desdém para
Clarence, perguntando: “Onde estava você quando eu
precisei, irmão?”.
Na segunda vinheta, uma criança chamada Walter
(Brandon Hammond) é vítima de abusos físicos por parte
do namorado da mãe, que ele chama de Monstro (David
Alan Grier). A surpresa aterrorizante é que, quando
Walter desenha o Monstro (como uma besta verde) em
pedaços de papel, ele pode rasgar os desenhos e
machucar o homem. Walter queima o desenho de
Monstro, queimando também o abusador. A história
apresenta um professor carinhoso e dedicado, Richard
(Rusty Cundieff), que se esforça para ajudar o garoto.
Richard é saudado como o tipo de pessoa de que as
comunidades negras precisam.
A terceira história é centrada em um político sulista
branco, Duke Metger (Corbin Bernsen), um nome que
lembra Tom Metzger, o fundador da Resistência Ariana
Branca, e David Duke,* um político membro da Ku Klux
Klan. Metger é mostrado como um candidato às eleições
com uma plataforma contra ações afirmativas e
reparações, apoiado por um comercial que mostra “mãos
brancas” amassando uma carta de rejeição após a perda
de uma oportunidade de emprego por causa das cotas
raciais. Aqui, o filme reproduz uma propaganda política
verdadeira de 1990 chamada “Mãos”, que apoiava a
candidatura de Jesse Helms, senador da Carolina do
Norte.19 No filme, Metger contrata um gerenciador de
imagens negro que contra piadas racistas e é
prontamente assassinado numa queda aparentemente
acidental nas escadas da casa de Metger. Metger
adquiriu sua casa de fazenda onde um massacre de
escravizados aconteceu quase duzentos anos atrás.
Pouco depois dos assassinatos, uma negra praticante de
vodu, Miss Cobb (Christina Cundieff), compra a
propriedade, desejando prover descanso aos espíritos
dos escravizados ao colocar suas almas em bonecos. A
casa se torna um tributo aos escravizados, e depois da
morte de Miss Cobb, o local permanece intocada até que
Metger compra a propriedade, contrariando os desejos
da comunidade negra. Os bonecos e Metger lutam, com
Metger morrendo nas mãos dos bonecos enquanto
questiona por que ele deve morrer, uma vez que não foi
o responsável pela escravização e a morte de nenhum
deles. A falha em compreender os efeitos duradouros da
escravidão sofridos pela comunidade negra é um tema
que será explorado de maneira mais profunda em Bem-
amada (discutido nas páginas 301-305), em que o
público é levado a se perguntar se os negros realmente
conseguiram se libertar psicologicamente e se aqueles
que não participaram diretamente da venda de pessoas
escravizadas, mas que se beneficiaram de seu legado,
ainda são culpados.
A vinheta final fecha o círculo do filme, quando os
jovens, com quem o diretor da funerária está
conversando, escutam a história de alguém que eles
mataram. Eles ficam sabendo que depois do tiroteio com
um rival chamado Jerome (Lamont Bentley), Jerome
entrou em um estágio limítrofe entre a vida e a morte,
recebendo a oportunidade de modificar seu
comportamento criminoso sob a supervisão da cientista
dra. Cushing (Rosalind Cash). Jerome é entregue
acorrentado e engaiolado ao lado de um supremacista
branco, que o agradece por matar “crioulos”, dizendo a
Jerome: “Você tá de boa comigo”. Eles mostram a Jerome
uma série de imagens que alinham a violência das
gangues com o terrorismo da Klan. O filme também
evoca metáforas religiosas ao ligar Jerome a Caim, um
homem que matou seu irmão, ao perguntar a ele:
“Quantos irmãos você matou?”. De maneira interessante,
Jerome é atendido por mulheres vestidas de enfermeiras
ao estilo dominatrix, as quais ele devora com os olhos.
Presumidamente, as mulheres servem para dissipar
qualquer noção de que a masculinidade heterossexual de
Jerome esteja sendo comprometida nas mãos de uma
cientista que o despe tanto de roupas quanto de
emoções. Por fim, Cushing exige que Jerome assuma a
responsabilidade por suas ações, explicando que ele não
pode culpar seus pais, professores ou o mundo por seu
comportamento aberrante. Jerome não consegue aceitar
a mudança e morre. É revelado aos três jovens na
funerária que eles também morreram em uma vingança
por parte de um amigo de Jerome, Crazy K. Todos eles
estão no inferno com o diabo, que se revela como o
diretor da funerária.
O filme estava longe de ser um comentário sutil
acerca da união e do comprometimento negro. Enquanto
Temptation identificava uma gama de pecados, em
Contos macabros só havia um pecado capital — se
vender —, que tinha a morte como punição. Aqueles que
vendiam os negros eram representados como um
triunvirato de monstros em Contos: o racista branco, o
negro que permitia o racismo dos brancos e o vendido,
que de uma forma ou de outra abusava dos negros e da
comunidade. Em contrapartida, notavelmente, é a
mulher vodu que se levanta como uma agente heroica da
justiça.20 Contos macabros, então, também tinha uma
mensagem para o gênero do terror — vender a religião
negra não seria mais algo tolerado.
Temptation e Contos macabros são filmes sobre
problemas sociais pós-Direitos Civis, que mostravam, de
maneira simultânea, as comunidades negras como
lugares repletos de armadilhas perigosas, mas também
cheios de orgulho e talento. Para Denzin, filmes do tipo
alocavam a responsabilidade pelos problemas do gueto
“na mídia, na polícia e em outros aparatos do estado.
Esses filmes tornam tais estruturas parcialmente
responsáveis”.21 Na verdade, filmes do tipo afirmam que
os problemas dos negros vêm de fora, como as drogas e
armas que são entregues nas comunidades negras ou a
pobreza como resultado de políticas econômicas
equivocadas. Os filmes alertam que, embora as
comunidades negras sejam vitimadas por esses
fenômenos, elas não precisam sucumbir.
Os filmes dessa década também apresentam a ideia
de que aqueles mais suscetíveis aos perigos encontrados
no gueto são os jovens negros, especialmente os
investidos na cultura do gangsta rap. Os filmes
evidenciam uma preocupação com a glamorização do
estilo de vida “gangsta” enquanto a violência real e
imaginária associada dominava as manchetes nos anos
1990. Por exemplo, os membros do fenomenalmente
popular e explosivo grupo NWA, ou Niggaz With Attitude,
se apresentavam como uma “gangue”, e não um
“grupo”, vestidos com cores de “gangues”, como preto e
prateado, e falando sobre iniciar a violência na quebrada,
tudo parte de uma construção de imagem.22 Os filmes
revelaram a preocupação profunda de alguns negros em
relação ao embotamento das violências míticas e reais,
com negros mirando uns nos outros. Por exemplo, em
1991, o rapper Dr. Dre atirou em um outro rapper, Dee
Barnes, através de uma porta. Entre 1992 e 1995, o
rapper “vida louca” Tupac foi associado a uma série de
crimes, incluindo o abuso sexual de uma mulher, e foi
preso em 1995. Suge Knight, cofundador da gravadora
Death Row, foi preso e, mais tarde, estaria presente na
morte por tiros de Tupac em 1996. Em 1997, Biggie
Smalls, um rapper gangsta de Nova York, também foi
morto a tiros. A década terminou com Puff Daddy, da
gravadora Bad Body, sendo preso duas vezes, uma por
agressão e a outra por efetuar disparos em um clube
noturno.
Contos macabros tenta reagir contra a cultura gangsta
com formas mais tradicionais de narrativas folclóricas,
enquanto reescrevia as histórias mais comuns dos filmes
de terror, conectando-as com a desigualdade e o
preconceito: “filmes de zumbis e brutalidade policial;
filmes de monstros e violência doméstica; filmes de
maldições antigas e supremacia branca acompanhada de
cooptação; filmes de cientistas loucos e violência de
gangue como resultado de um ódio a si mesmo” — foi
uma forma inovadora de atrair a atenção dos jovens.23
Além disso, Contos popularizou a tendência de
apresentar narrativas morais focadas na negritude, no
estilo das antologias de contos curtos. Por exemplo,
Street Tales of Terror (2004) apresenta três histórias
sanguinolentas que alertam sobre a violência contra
mulheres ou exercida por mulheres, enquanto Urban Evil:
A Trilogy of Fear (2005) mostra como a quebrada “tinha
ido para o inferno”, e Hood of Horror (2006) também se
esforçou para explicar por que “não está tudo bem no
gueto”.
A franquia da Cripta, que serviu de inspiração para os
Contos macabros, também apresentou negros em Os
demônios da noite (1995), dirigido por Ernest Dickerson.
No filme, uma mulher negra, Jeryline (Jada Pinkett), é
elevada ao status de heroína para manter longe das
mãos do diabo uma antiga e poderosa relíquia que
contém o sangue de Jesus. Jeryline, uma ladra de
Wormwood, Novo México, sobrevive a uma noite de
ataques demoníacos, em grande parte por causa da
ajuda de Irene (C.C.H. Pounder), uma mulher negra que
se sacrifica. Jeryline é escolhida para continuar como
anjo da guarda porque é muito parecida com Sirach, um
ladrão que estava presente na noite da crucificação de
Jesus e que foi o primeiro a roubar a relíquia, mas ao
descobrir o seu poder (manter o diabo longe), acabou por
protegê-la. No filme, um dos demônios que está atrás do
artefato muda de aparência para se encaixar no
ambiente da caça. Por exemplo, quando o demônio
chega no Novo México, ele aparece como um homem
branco vestido de caubói. Assim que Jeryline sai do Novo
México de ônibus, dando início à sua jornada de fuga dos
demônios, o demônio aparece como um jovem negro. O
filme deixa o público adivinhar até onde os dois
guerreiros negros irão para tentar se encaixar.

VOCÊ NEM SEMPRE LEVA AQUILO PELO QUE


PAGA
O dinheiro certamente não é tudo, mas, no cinema, a
bilheteria é extremamente importante, e os filmes de
terror com elenco negro atraíam o público. Os demônios
da noite estreou em 1.729 salas e lucrou 10.019.555
milhões de dólares no seu primeiro fim de semana.24
Embora o orçamento exato de Temptation seja
desconhecido, e tenha lucrado apenas 54.582 mil dólares
em lançamentos limitados a onze cinemas, o filme
recebeu um respaldo crítico importante, lucrando
2.218.579 milhões de dólares (nada mal para um filme
independente que não foi exibido continuamente nos
cinemas), e é uma obra popular para a Troma.25 Por outro
lado, Um vampiro no Brooklyn (1995), um “filme negro”
de terror com pinceladas de comédia, teve um
orçamento de 14 milhões de dólares, foi lançado em mais
de 2 mil salas, lucrando 7.045.379 milhões em seu
primeiro fim de semana, e foi extremamente criticado,
com Roger Ebert do Chicago Sun-Times resumindo de
forma sucinta as resenhas ao descrever o filme como
uma “bagunça caótica”.26 Isso tudo apesar de Wes
Craven, o veterano (branco) dos filmes de terror, que fez
vários filmes focados em personagens negros. Por
exemplo, Craven dirigiu O monstro do pântano (1982),
que apresentava um garoto negro, Jude (Reggie Batts),
como um ajudante relutante (com uma esperteza sutil e
desapegada) de uma outra personagem, Alice (Adrienne
Barbeau), depois que ela se envolve por engano em um
caso de assassinato. O diretor iria apresentar um garoto
negro novamente, “Fool” (Brandon Adams), como um
salvador no filme de terror “com negros” As criaturas
atrás das paredes (1991, que será discutido nas páginas
311-314). Craven também dirigiu o filme de terror “com
negros” A maldição dos mortos-vivos (1988, discutido
nas páginas 256-262), sobre haitianos negros, vodu e
pessoas brancas que desejam se apropriar do poder de
zumbificação.
Um vampiro no Brooklyn foi um negócio amplamente
negro, estrelando o comediante/ator negro Eddie
Murphy, escrito por membros do clã Murphy — Eddie,
Charles Murphy e Vernon Lynch — e coproduzido por Ray
Murphy Jr. O filme tinha um elenco amplamente negro,
com Eddie Murphy usando até mesmo um pouco de
pintura whiteface para representar um personagem
branco. O filme modernizou Blácula: o vampiro negro
(1972), compartilhando temas de amor perdido e
mostrando um vampiro negro que leva o caos a uma
comunidade urbana negra. Enquanto Blácula era
inspirado pela onda de interesse no nacionalismo negro e
na conexão com a “pátria mãe” africana, Vampiro não
tomava parte de movimentos políticos negros, preferindo
sinalizar sua conexão com a cultura negra por meio de
sua locação urbana.
Vampiro estrela Eddie Murphy como Maximillian, ou
“Max”, um “nosferatu” em busca pela “última do seu
tipo”, uma vampira e policial, Rita (Angela Bassett), que
não sabe que é oriunda “de raças misturadas”, meio
humana, meio vampira. Max viaja pelo mundo inteiro
procurando Rita, encontrando-a no Brooklyn, onde
espera atrai-la para o vampirismo e, por fim, para si.
Vampiro fez pouca coisa para desafiar a noção de que
a vizinhança urbana, especificamente a vizinhança negra
do Brooklyn, é um lugar horrível. O Brooklyn negro é
nojento, coberto de pichações e de lixo. É uma favela em
que apostas (jogos de azar) e assassinatos executados
por gangues italianas não são incomuns. A polícia tem a
sua própria cota de crimes e demora vários dias para
encontrar uma das vítimas de Max, pendurada no alto de
uma ponte numa pose parecida com a de Cristo na cruz.
Na verdade, o Brooklyn é mostrado como um lugar tão
deplorável que Max é forçado a usar feitiços para criar a
ilusão de um espaço habitável para ele, camuflando,
assim, a triste e sombria condição dos cortiços.
Como em muitos “filmes negros” de terror, a história
de Vampiro depende das ações de uma negra, que dessa
vez é Rita. No filme, Rita é uma policial durona e esperta,
cuja vulnerabilidade é representada por meio de uma
nova reviravolta no estereótipo da mulata trágica. Rita é
uma alma irritada e cheia de tristeza, dividida entre dois
mundos raciais — a raça humana e a “raça” vampírica. Já
descompassada emocionalmente, Rita é enlouquecida
ainda mais por um triângulo amoroso que a força a
escolher entre seu parceiro de trabalho humano,
nomeado de forma pouco sutil, Justice (Allen Payne), e
Max. Presa entre os limites abjetos da insanidade e da
possessão (amorosa e vampírica), Rita precisa descobrir
como se purificar e se restaurar. Para lutar contra a sua
miséria, ela escolhe primeiramente apenas o mundo
vampiresco, esperando se livrar do lado humano com o
fim de encontrar estabilidade.
Quando o dilema racial de Rita é resolvido
momentaneamente, o filme se volta contra uma mulher
branca. Em uma cena breve, uma mulher rica e egoísta
(Jerry Hall), durante um passeio no parque, reclama que
o filho doente de sua empregada cubana é um incômodo.
Em uma cena cômica, quando Rita e Max aparecem
prontos para se alimentar, a mulher em pânico tenta
explicar que tem empatia pelo sofrimento dos negros
vítimas de um sistema racista. A cena, embora seja
pouco mais do que uma repreensão cômica, é importante
quando consideramos a história da dinâmica do
Negro/Monstro e da Branca/Vítima na história do terror.
Hutchings nota que, embora a vítima seja uma
caricatura, o ataque é violento do mesmo jeito.27 Para
Hutchings, embora se trate de um filme de terror, o
ataque é ainda mais perturbador porque parte de um
homem negro. A ironia e as inflexões cômicas não são
suficientes. Contudo, a cena também apoia uma outra
função importante: assegurar alguma reparação por
todos os filmes de terror que vieram antes (e depois),
nos quais a mulher branca é tão valorizada. O ataque
violento de Max (contra a mulher branca sem nome) é
um momento de réplica altamente político, por exemplo,
para o cocheiro sem nome em A morta-viva (1943), que
aguenta em silêncio o pouco caso de uma mulher branca
em relação às brutalidades da escravidão. Realmente,
Max é um monstro, mas com Rita, sua verdadeira dama
em um pedestal, presenciando o ataque, ele lembra ao
público que mulheres brancas não são tão especiais
(para os negros) quanto os filmes de terror dizem. Na
verdade, a maioria das vítimas de Max no filme são, em
uma inversão racial interessante, pessoas brancas (que
não possuem nome nem são creditadas), e suas mortes
não têm grandes consequências.
No fim, Justice chega para bancar o salvador e, assim
como Joel em Temptation, é repelido pelo monstro. Rita
rejeita o vampirismo e, ao usar um colar com um
crucifixo, abraça a religiosidade cristã. Ela destrói Max,
salvando tanto Justice quanto ela mesma. Juntos, como
um casal e parceiros na polícia, Rita e Justice são os vivos
de que o Brooklyn precisa quando um novo vampiro é
criado para aterrorizar o gueto.

TERROR DE VERDADE, SEM FIRULAS


S. Torriano Berry é um professor de estudos do cinema na
Universidade Howard, em Washington, D.C. Seus
trabalhos publicados focam em filmes negros de todos os
gêneros. Ele tem um relacionamento especial com o
terror, já que passou a última década pesquisando e
restaurando os filmes dos anos 1930 de James e Eloyce
Gist, o que inclui o “filme negro” de terror Trem para o
inferno. Ele também trabalhou como diretor de fotografia
no filme Bugged (1997) da Troma. No filme, cientistas
negros (raramente vistos desde a dra. Jackson em Son of
Ingagi [1940] e o dr. Pryde em Monstro sem alma [1976])
inventam uma fórmula para criar um super-humano, a
qual acidentalmente cai em uma provisão de inseticidas.
A fórmula transforma os insetos e uma equipe de
dedetizadores negros, que usam uniformes com pedaços
costurados de tecido kente, em monstros. De maneira
notável (para o propósito necessário aqui), Berry
escreveu, dirigiu e produziu o “filme negro” de terror
independente The Embalmer (1996). Embalmer é um
terror sanguinolento sem firulas em que Zach (Dexter
Tennie), um agente funerário, em um acesso de fúria,
mata a sua amorosa esposa e os filhos. Enlouquecido
pela culpa, Zach persegue e preda sua comunidade para
conseguir as partes de corpos de que ele precisa para
reconstruir sua família e reanimá-la (o que ele faz com
sucesso). O agente recebe uma ajuda inesperada de seu
último alvo, Chiffon (Jennifer Kelly), que, em um pacto
com esse diabo, entrega duas vítimas ao homem — um
casal — para que, em troca, ela possa viver.
The Embalmer, embora seja de baixo orçamento e
direcionado ao mercado de vídeos caseiros, não é muito
diferente das franquias de terror como Halloween, com
Michael Myers, ou A hora do pesadelo, com seu Freddy
Krueger, em que o monstro ataca uma vizinhança em
busca da próxima vítima. Embalmer está longe de ser um
filme A, e não tem a mesma qualidade de elenco que
Temptation, mas é importante por colocar negros no
centro de uma história comum de terror. A estrela do
filme, Chiffon, é um pouco parecida com a Laurie Strode
de Halloween, pois aprecia a companhia dos amigos, que
gostam dela, é uma órfã e há um louco que a persegue.
Além disso, assim como Laurie, Chiffon é uma Garota
Final habilidosa e de pensamento ágil, que enfrenta o
monstro usando a cabeça em lugar de facas,
assegurando a própria sobrevivência. Ela permite que o
cientista acabe com a sua busca ao entregar os últimos
dois corpos de que ele precisa: seus pais adotivos
abusivos. Além disso, com a tentativa dos pais de adotar
uma nova criança de quem possam abusar, Chiffon é
uma heroína, protegendo a sua comunidade de
predadores. Dessa forma, ela também se torna uma
Mulher Durona; compreendendo que os monstros podem
ter qualquer forma, ela se torna resiliente, ajudando um
monstro a eliminar dois. A comunidade que Chiffon
protege por fim, Washington, D.C., é apresentada de
maneira bem diferente das outras representações de
bairros negros da capital. Essa capital negra é o lar de
uma arquitetura maravilhosa, ruas limpas e proprietários
de casas. A funerária, que não se encontra em boas
condições, chama a atenção por seu estado. A casa é tão
anômala que no filme é explicado explicitamente por que
o imóvel ainda não havia sido demolido, restaurando,
assim, a união da vizinhança — a propriedade fazia parte
da rota secreta de fuga das pessoas escravizadas e, por
isso, tem valor histórico. De maneira significativa, a
funerária é digna de nota pela ausência de desabrigados,
bandidos, lixo ou grafites em seu interior, uma
representação dramaticamente diferente de
propriedades abandonadas apresentadas em filmes
como Um vampiro no Brooklyn e Candyman, que
mostram estruturas do tipo como lugares imundos e
esquálidos, culpando a vizinhança ao redor por permitir a
decadência urbana.

O LAR É ONDE O CORAÇÃO ESTÁ:


FORA DO ESPAÇO URBANO
Spirit Lost (1997), assim como Embalmer, não foi
nenhum sucesso de bilheteria. Contudo, é o tipo raro de
filme de terror em que as mulheres cuidam de tudo.
Spirit Lost é baseado em um livro homônimo de Nancy
Thayer. No livro, um casal, Willy e John, larga a vida
agitada em Chicago para viver em paz numa casa em
Nantucket. Sua paz é perturbada quando uma fantasma
sexy seduz John. O roteiro foi escrito por Joyce Lewis, que
trocou a locação em New England por Catch Hook Island,
presumidamente muito mais ao sul. O “filme negro” de
terror independente foi dirigido por Neema Barnette,
uma das poucas diretoras (negras) de terror, que tem um
extenso currículo de direção na televisão. Spirit é
interessante porque tira o “terror negro” da área urbana
e o leva para a beira do mar, enquanto recupera os mitos
do vodu caribenho. No filme, Willy (Regina Taylor) deseja
um bebê desesperadamente, mas não consegue
engravidar até que ela e o marido, John (Leon), chegam
na pacífica e racialmente diversa Catch Hook Island. Lá,
Willy encontra uma gama de mulheres prestativas —
uma branca dona de uma loja de antiguidades, suas
freguesas negras, uma médica branca, e Vera (Juanita
Jennings), uma jamaicana negra que percebe
imediatamente que a casa de Willy e John é assombrada
e fala com os fantasmas que lá residem. Spirit é uma
história de amor sobre uma escravizada, Arabella (Cynda
Williams), que, duzentos anos antes, foi levada como
prêmio de um jogo de pôquer por um mercador de
escravos e capitão marítimo, John Wright (Christopher
Northrup). Wright promete se casar com Arabella, e
chega a construir uma casa para ela, onde Willy e John
morariam gerações mais tarde. Contudo, Wright
abandona Arabella para poder se casar com uma
“inglesa digna”. De coração partido, Arabella assombra a
casa, à espera do retorno de John. Ela aterroriza Willy,
fazendo com que perca o bebê, e confunde o John de
Willy com o próprio, seduzindo-o ao mesmo tempo que o
enlouquece. O mais interessante é que Arabella é
despachada para sua morte (pacífica) por Vera e duas
ajudantes que realizam uma cerimônia religiosa negra.
Vera entra na casa com duas sacerdotisas28 que desejam
dar um jeito na “alma perdida”. As mulheres se
apresentam como puras em suas motivações e
religiosidade, e até mesmo aparecem vestidas de branco
com a cabeça coberta por um lenço branco. As três
realizam um ritual (ao som de uma batida ritmada de
tambor), purificando John ao passar sal em suas mãos e
aspergindo água benta nele; elas jogam fumaça de
tabaco no ar para que possam ver Arabella. Por fim,
montam um altar com água limpa e velas brancas no
centro, rezando em cima delas. Arabella desaparece. É a
religião negra que salva o casal negro.

O TOQUE DE MIDAS
O “terror negro” ganhou proporções épicas quando, em
1998, o gênero foi tocado por Oprah Winfrey e seu filme
Bem-amada. Um dos poucos “filmes negros” de terror
com uma origem literária negra, Bem-amada foi baseado
em um romance de Toni Morrison, vencedora do Prêmio
Nobel e do Prêmio Pulitzer. O roteiro do filme foi escrito
pela atriz negra Akosua Busia, e coproduzido pela Harpo
Films, de Winfrey. O filme apresentou um elenco
predominantemente negro, premiado e cheio de estrelas,
liderado pela própria Oprah. A direção ficou por conta de
Jonathan Demme, um diretor branco que recebeu um
Oscar pelo filme de terror O silêncio dos inocentes
(1991). Juntos, Um vampiro no Brooklyn e Bem-amada
serviram para lembrar uma das maiores contribuições
que um filme pode fazer para as discussões a respeito da
negritude, ainda que não seja totalmente feito por
negros. Os dois filmes têm diretores brancos, mas são
“filmes negros” de terror pela atenção que dedicam à
negritude. Como observa Yearwood, não existem regras
definitivas sobre o que é um filme negro, apenas o fato
de que o público negro é capaz de enxergar a
diferença.29 Em Bem-amada, a fantasma cruel acaba se
revelando uma vítima. O assassino acaba se mostrando
um protetor. O pedófilo acaba se mostrando uma vítima
da fantasma e o amante da assassina. E o verdadeiro
mal acaba por ser a escravidão. Scott escreve: “a
narrativa da história (com suas assombrações, mortos-
vivos, ar de mistério, violência nauseante e exorcismos)
é horrenda o bastante para substanciar sua conexão com
o gênero do terror”.30 Tudo acontece em uma casa em
que as coisas (até mesmo um cão) voam, batem e se
quebram. Mas, como Anissa J. Wardi nota, Bem-amada
não tinha a intenção de ser um Poltergeist do século XIX.
Na verdade, a tradução do romance para a tela grande,
nas mãos de um diretor de filmes de terror, “reduziu a
complexidade do texto, criando nada além de um
espetáculo”.31
O filme começa em 1865 — o ano em que a
escravidão é abolida por meio da 13a emenda incluída na
Constituição dos Estados Unidos —, na modesta casa de
Sethe (Oprah Winfrey), localizada nos arredores de
Cincinnati, Ohio. Na casa vivem Sethe, sua sogra, Baby
Suggs/Vovó Baby (Beah Richards), e uma velha acamada,
que era a dona da casa e a entregou para Sethe. Sethe
tem três filhos, uma menina, Denver (Kimberly Elise), e
dois meninos adolescentes, Howard (Emil Pinnock) e
Buglar (Calen Johnson). Uma fantasma está destruindo
tudo em que consegue encostar. Howard e Buglar fogem
de casa e nunca voltam. O filme dá um salto de oito
anos, com Baby Suggs já morta e Denver já uma jovem
mulher. Um velho amigo, Paul D (Danny Glover) chega
para se reconectar com Sethe e os dois se tornam
amantes. Os dois compartilham uma história trágica de
escravidão numa plantação no Kentucky chamada Doce
Lar, guardada por um dono sádico conhecido como
Professor (Jude Ciccolella).
Em resposta à chegada de Paul D (que imediatamente
compreende que a casa é assombrada), a aparição
invisível ganha uma forma humana física, surgindo como
Amada (Thandi Newton) para competir pela atenção e
afeição de Sethe. Amada é uma criança no corpo de uma
mulher jovem. Amada mal consegue falar, preferindo
grunhir até ser ensinada como balbuciar algumas
palavras. Ela baba, sacode a cabeça e se desequilibra
nas pernas que acabou de descobrir. Sua novidade é
marcada pela pele macia e delicada de seus pés (nunca
usados). Ela não conhece a decência. Quanto maior o
tempo de permanência de Amada, mais Sethe
enlouquece com sua preocupação alucinada em relação
a Amada, e nem Paul D nem sua filha, Denver,
conseguem ajudá-la. A fantasma é igualmente obcecada
por Sethe e se esforça para aliená-la das pessoas que a
amam. Amada atenta Paul D, e ele sucumbe, transando
com ela. Pouco depois, Paul D sai da casa de Sethe. À
medida que Amada consome todo o amor e os recursos
de Sethe, a jovem Denver precisa se virar para sustentar
a si mesma e a família, e então sai de casa para arrumar
emprego na cidade.
A história é centrada na identidade de Amada e nas
razões pelas quais ela assombra Sethe. A conexão delas
é revelada em um flashback. Em sua época de
escravizada e com uma gravidez muito adiantada, Sethe
foi estuprada pelo escravizador e seus filhos. Ela e o
marido, Halle (Hill Harper), planejam fugir de Doce Lar, e
pensam na casa da mãe dele, Baby Suggs, uma velha
escravizada liberta. Eles mandam as crianças na frente,
mas Halle não consegue fugir, deixando Sethe para
encontrar a liberdade sozinha. Pouco depois de chegar
na casa de Baby Suggs, os caçadores de escravos vão
até lá para reclamar Sethe e os filhos dela. Não
suportando vê-los a caminho de tamanha brutalidade,
ela decide matar as crianças. Sethe consegue cortar a
garganta do bebê, Amada, antes de ser impedida. Ao vê-
la com a criança e uma serra velha, os caçadores a
abandonam, acreditando que Sethe é louca demais para
ser levada de volta. Amada, então, é a manifestação
física de várias crueldades: a primeira é o ato de Sethe, o
motivo pelo qual Amada volta para representar a culpa
de Sethe; a segunda é a crueldade da escravidão que
levou ao infanticídio em primeiro lugar. Bem-amada nos
pergunta quem deve carregar a responsabilidade e a
memória dessa instituição cruel.
Ellen Scott, em seu ensaio The Horrors of
Remembrance, observa que o filme recupera a narrativa
de uma dor emocional, física e política, que é
efetivamente apagada em grande parte dos demais
tratamentos populares acerca da escravidão:

Bem-amada começa a enunciar uma pergunta


difícil e profunda, reprimida pelas
representações tradicionais da escravidão, uma
pergunta particularmente importante para os
afro-americanos depois dos movimentos pelos
Direitos Civis e da era Black Power: o que
(momento, lugar, sentimento) define a liberdade
para os afro-americanos?32

O filme desafia o público a ponderar o que significa


declarar que o legado da escravidão acabou, e
especialmente se é possível alegar uma distância
histórica dessa época. Bem-amada mostra que a
destruição (fim) do monstro que foi a escravidão não
significa liberdade, ou, como argumenta Scott, cura. A
verdadeira contribuição de Bem-amada, dada a história
do gênero de terror, é sua tocante atenção aos efeitos da
escravidão. O terror, durante muito tempo, foi construído
em cima de fantasias coloniais de servidão negra, em
que os brancos simplesmente, e de forma heroica,
lidavam com o fardo do homem branco, arrastando os
negros para a civilidade. Como o terror se focou de
maneira obsessiva no vodu e em outros rituais
“selvagens” da África/Caribe que ameaçavam os brancos
norte-americanos e europeus, os filmes invocavam uma
história distorcida da escravidão ao mesmo tempo que
encobriam seus efeitos. Além disso, ao acrescentar o
mito dos zumbis, a escravidão foi negada, substituída por
desejos de autômatos descerebrados, silenciosos e
obedientes que trabalhavam incansavelmente. Bem-
amada freou essas ilusões, forçando o público de terror a
julgar se poderia suportar as atrocidades reais ao mesmo
tempo que a história negra era restaurada.
O filme chega ao clímax quando, à medida que Sethe
entra em um estágio mais profundo de desarranjo
mental, um grande grupo de mulheres — “as Trinta
Mulheres”, como são chamadas nos créditos dos filmes
— chega na casa dela, com bíblias e cruzes nas mãos,
para rezar em seu nome. Elas estão ali por causa de
Denver, que está cedendo sob o peso de sua vida
doméstica. As mulheres se tornam a família estendida de
Denver, alimentando-a e lhe ajudando a encontrar
trabalho, uma comunidade de parentes que chega para
ajudar. O filme invoca o poder da união e do círculo de
oração liderado por mulheres de maneira notável. Em
Temptation havia apenas Joel e Vovó unidos em oração, e
Spirit trouxe três sacerdotisas. Bem-amada chamou
trinta. Orando e cantando, as mulheres permaneceram
firmes até mesmo quando Amada surge de dentro da
casa, em plena luz do dia e na frente de toda a multidão,
completamente nua e grávida. A falta de vergonha e sua
chocante aparência (ela está suando por causa do calor e
babando) são recebidas com espanto, fazendo com que
as mulheres rezem com mais força. Amada desaparece
sob o poder da oração e Sethe conclui que usou a serra
na pessoa errada — ela deveria ter tentado lutar contra
os caçadores de escravos, e não com a criança.
FIGURA 7.2 SETHE E AMADA EM BEM-AMADA.
Touchstone Pictures/Photofest
Essa visão final de Amada, que revela o seu corpo e
exibe seus pelos pubianos, juntamente com as imagens
anteriores em que ela vomita e molha a cama, além de
sua fome animal, transformam Amada não apenas em
uma figura monstruosa, mas em uma criatura bizarra,
exótica e grotesca.33 O problema aqui é que, no livro de
Morrison, Amada não é descrita como uma figura
monstruosa ou bizarra, mas como uma metáfora para a
história, memória e trauma. A história de Morrison não é
terror nem espetáculo.

ELES VOLTAAAARAM! MONSTROS NA


QUEBRADA
O predador 2: a caçada continua (1990), um filme de
terror “com negros”, causou danos em dobro, mostrando
a área urbana como um lugar desprezível, repleta de
crimes e hiperviolento, enquanto ressuscitava o
estereótipo de terras negras como locais selvagens, para
onde uma pessoa se dirige a fim de caçar, matar e
conquistar. Nessa sangrenta “história de formação”, o
monstro Predador é enviado pelos seus anciões para se
provar como um guerreiro intergaláctico invencível ao
destruir a criatura mais durona e malvada do cosmos.34
No filme, o Predador localiza seu desafio na Terra em um
“bando” de traficantes jamaicanos hiperviolentos que
emergem dos becos do gueto para agir de maneira
selvagem na movimentada Los Angeles. É explicado no
filme que o Predador realmente está em um safári; suas
presas são descritas em termos animais: “Leões e tigres
e ursos, uau!”. A estratégia do filme é primeiro revelar
quão brutal é o bando para então mostrar que seus
membros representam o tipo certo de desafio para o
Predador. No primeiro vislumbre do bando, os jamaicanos
levam vantagem em cima de seus rivais, os colombianos.
O líder colombiano é visto pendurado pelo calcanhar em
seu apartamento. Depois de tirar as roupas dele, o bando
jamaicano se preparar para esfolá-lo vivo. Embora o
bando pareça ser a coisa mais barra-pesada, o filme
aumenta sua aura assustadora quando é revelado que
eles também praticam uma forma maligna de vodu, o
que os deixa ainda mais distantes dos limites civilizados.
Essa cena explora o estrangeirismo, já que os homens
possuem sotaques pesados, como se tivessem acabado
de chegar de seus países para causar destruição nos
Estados Unidos. O confronto se torna sanguinolento
quando um terceiro imigrante (alienígena) ilegal entra
em cena; seu sotaque é um rosnado. Os jamaicanos e o
Predador são mostrados como imagens espelhadas um
do outro. Ambos estão armados com facas e armas de
fogo, ambos penduram suas presas para esfolá-las vivas,
e ambos têm a mesma aparência, com longos
dreadlocks. Claramente, eles foram feitos para lutar.
O Predador começa uma batalha com o assustador
líder da gangue, King Willie (Calvin Lockhart), e os dois
aparecem novamente alinhados imageticamente nos
cabelos, lanças e acessórios feitos de ossos. Os dois
monstros se encontram na parte mais profunda e isolada
do gueto, em um beco fétido, escuro e cheio de lixo.
Embora o Predador mate ao longo do filme, a morte do
líder jamaicano, em seu próprio território, é que serviria
para evidenciar seu poder. Em um único movimento
rápido, o Predador alcança o interior do corpo do chefe,
arrancando a sua espinha e decepando sua cabeça. O
resultado é um troféu brutal — a cabeça do líder, com
sua face congelada em um grito de horror, pendurada
em sua espinha à mostra. Logo, o Predador conquistou o
gueto de Willie.
Notavelmente, O predador 2 estrela um ator negro,
Danny Glover, como o habilidoso, ainda que cabeça
quente, tenente Mike Harrigan. Harrigan é apresentado
por meio de seu arquivo pessoal, que lista dezenas de
reclamações por brutalidade policial. Ele é o policial
corrupto que, em outros filmes, representa um terror
para o gueto. Nesse filme, ele é heroico por causa de
suas táticas policiais. O filme, então, se torna uma
batalha de três vias entre os traficantes negros, um
policial negro e um alienígena que parece negro.
Harrigan persegue o monstro implacavelmente, e, uma
vez que o perímetro urbano é (de fato) seu território, ele
consegue se movimento de maneira eficiente pelo
terreno. Harrigan prova que é o maior desafio do
Predador, e o filme termina com o monstro sendo
destruído nas mãos dele. As cenas finais do filme eram
para ser consideradas moderadamente cômicas, mas
acabam se mostrando dolorosamente racistas. Assim que
os aliens vão embora em suas naves, Harrigan é coberto
pela poeira de seus exaustores, embranquecendo-o. Sua
pele branca/olhos arregalados lembram Ernest “Sammy
Sunshine” Morrison em Haunted Spooks (1920), com a
criança assustada mergulhada em farinha.

CANDYMAN, CANDYMAN, CANDYMAN,


CANDYMAN, CANDYMAN
O que significa quando o gênero viola as
convenções ao localizar a violência na cidade,
onde é mais esperada, e, além disso, brinca
abertamente com as ansiedades culturais ao
marcar o monstro como um Outro racial?

— Pinedo (112-113)35

O mistério de Candyman (1992), um filme de terror “com


negros” de Bernard Rose, adaptação de uma história de
Clive Barker, continua a explorar os medos do gueto ao
fazer de um conjunto habitacional o lar da violência entre
gangues e da imundície, abrigando também um monstro
mais violento.36 O filme é centrado em Daniel
“Candyman” Robitaille, o filho de um antigo escravizado.
O pai de Robitaille fez dinheiro depois de criar um
equipamento que permitia a produção em massa de
calçados. Como resultado, Robitaille frequentou as
melhores escolas, onde se tornou um artista de talento.
Robittaile é sofisticado, elegante, educado e culto. Em
1890, ele é contratado por um branco rico dono de terras
no Illinois para pintar um retrato da filha dele. Os dois se
apaixonam, e ela engravida. Enfurecido com o
relacionamento inter-racial, o pai da mulher junta um
grupo de linchamento, cujos membros perseguem
Robitaille. Depois que o capturam, eles executam a mais
cruel das torturas. Eles decepam a sua mão direita com
uma serra enferrujada. Eles o despem, cobrindo seu
corpo com o mel de uma colmeia próxima, e Robitaille é
ferroado até a morte por centenas de abelhas
enfurecidas. Então ele é queimado e suas cinzas são
espalhadas em cima daquilo que nos tempos modernos é
o conjunto habitacional Cabrini-Green. Um século mais
tarde, a história de Candyman ganha proporções
místicas, especialmente entre os negros, e gera uma
lenda urbana: olhar para um espelho e chamar o nome
de Candyman cinco vezes irá conjurar Robitaille como o
monstro vingador Candyman, que irá te rasgar com seu
gancho desde os testículos até a garganta. As
universitárias Helen (Virginia Madsen), uma branca, e sua
amiga Bernadette (Kasi Lemmons), uma negra, estão
pesquisando lendas urbanas e decidem fazer uma visita
(ou um safári) ao conjunto Cabrini-Green para investigar
os rumores de que um monstro habita o lugar. Cabrini é
um local repleto de violência de gangues. Bernadette fica
petrificada quando elas adentram o gigantesco complexo
de apartamentos, que é controlado por gângsteres e
imundo — de lixo até fezes, além de pichações em todos
os cantos. Helen está confiante, guiando Bernadette de
mão dadas por aquele labirinto em busca da informação
que procuram. Elas encontram uma das poucas negras
no prédio, Anne-Marie (Vanessa Williams), uma jovem
mãe solo que tem um bebê pequeno e um cão de guarda
enorme. Anne-Marie se refere várias vezes a Helen e
Bernadette, que é negra, como “brancas” enquanto as
acusa de xeretar em um espaço negro que consideram
ruim e que merece mais uma história sensacionalista. As
duas mulheres são embranquecidas pela classe e nível
educacional por Anne-Marie, que enxerga esse tipo de
status como a raiz da exploração negra.
Aqui, o filme lida com os tipos de racismo que os
negros enfrentam de cabeça erguida. A narrativa deixa
claro que Robitaille foi linchado por causa do racismo.
Embora os moradores de Cabrini peçam proteção policial,
o filme deixa explícito que, quando Helen volta sozinha
ao conjunto e é (obviamente) atacada, a polícia corre
para socorrê-la porque ela é branca. É até mesmo
mostrado que Helen vive em um prédio parecido com
Cabrini, mas na parte rica da cidade, e o condomínio de
apartamentos de luxo contou inclusive com a construção
de uma rodovia que o separaria de Cabrini. Para associar
os dois lugares, a cidade de Helen e o gueto de Anne-
Marie, Candyman se volta para o “paradigma sempre
elástico da história de detetive, com seu investigador à
espreita, desvendando as pistas contidas no folclore da
cidade”.37 O problema, no entanto, é que as duas
localidades são vistas e comentadas através da lente da
branquitude.
Embora a dúvida de Helen em relação à existência de
Candyman desafie o mito, e, dessa forma, seu controle
por meio do medo, ele não a mata (ainda que ela chame
o seu nome cinco vezes, conjurando-o). Em vez disso, ele
pune os negros primeiro, decapitando o cachorro de
Anne-Marie e então sequestrando seu filho, Anthony
(Lanesha Martin/Latesha Martin). Em relação à Helen, ele
a corteja, a hipnotiza e pede que se junte a ele — “seja
minha vítima”; ele a ama. À medida que Helen continua
a perturbar o mundo de Candyman, ele continua a dar
novas chances a ela. Existem muitos outros brancos a
quem Candyman também dá outras chances. Ele não
entra no prédio de Helen, por exemplo, para acabar com
o marido infiel de sua amada, Trevor (Xander Berkeley).
Em vez disso, ele vai até lá para matar Bernadette, que
estava de visita, e vai embora. Até mesmo o local de seu
assassinato (diferente do lugar onde suas cinzas foram
espalhadas) está ao alcance. Ainda assim, Candyman
não busca vingança de verdade, ele quer amor… mas
não o amor de mulheres negras. Ele só quer matá-las.
Candyman é retratado como uma figura trágica, um
monstro ferido, talvez como Frankenstein, pelo fato de
ter sido criado por pessoas muito piores do que ele.
Contudo, o filme foge do tema do monstro-com-coração-
de-ouro ao brincar com o medo do bicho-papão negro
que chega para levar as mulheres brancas embora. O
produtor do filme, Alan Poul, reconhece que os
realizadores de filmes “estavam usando uma imagem
muito carregada”, como aquela vista em O nascimento
de uma nação, ao mostrar um monstro negro tentando
seduzir uma mulher branca, ainda que tivessem se
esforçado para não “explorar o mesmo tipo de visão
estereotipada”.38 Candyman não é um monstro pelo qual
se deve apaixonar. Ele não é um vampiro charmoso. Na
verdade, quando Candyman e Helen (que está apenas
parcialmente consciente) finalmente consumam um
beijo, o momento de miscigenação é punido com
“abelhas saindo de sua boca. Logo […] o terror opera
aqui para negar a aceitabilidade de um romance inter-
racial”.39
No fim, trata-se de um filme que celebra a
feminilidade branca. Helen rejeita o amor de Candyman,
e o monstro vingativo se prepara para acrescentar outra
vítima negra em sua cota — o infante Anthony, que é
queimado vivo em uma caçamba de lixo. Mas Helen
salva o garoto, sacrificando-se ao fazê-lo. Embora Helen
seja culpada pelas mortes, a comunidade negra é
mostrada como se soubesse que não era bem assim. No
funeral de Helen, presenciado por cinco brancos,
incluindo Trevor, sua nova namorada e um professor que
antagonizava Helen, há um pequeno velório até que uma
grande procissão de pessoas negras, liderada por Anne-
Marie, chegue de Cabrini. Eles encontraram o gancho de
Candyman e o enterram com Helen, enquanto lamentam
sua morte. No fim, Candyman desaparece junto com a
história de racismo que ele trouxe. Tudo passa a ser
apenas sobre Helen quando ela se torna monstruosa. Por
ser uma mulher branca, ela pode fazer aquilo que
Candyman não pôde: aterrorizar as pessoas que moram
no outro lado da estrada. Ela é uma mulher desprezada e
exige se vingar de Trevor.40
FIGURA 7.3 CANDYMAN CONVIDA “SEJA MINHA VÍTIMA”, EM O MISTÉRIO DE
CANDYMAN.
Tri-Star/Photofest
O GUETO CHEGA NO SUBÚRBIO
As criaturas atrás das paredes (1991) foi um dos poucos
filmes da época em que o gueto e o subúrbio se
confrontaram… com o gueto saindo vitorioso — apesar
de um grande custo. Nesse filme de terror “com negros”
de Wes Craven, “Mamãe” e “Papai” (Wendi Robie e
Everett McGill), um casal rico e suburbano de senhorios
exploradores, vivem em uma mansão cavernosa lotada
de dinheiro e bens preciosos (baús cheios de moedas de
ouro e prata). Três ladrões invadem a casa suburbana de
Mamãe e Papai, localizada “perto o suficiente do gueto,
mas não o bastante para ofender as vistas”: Spenser
(Jeremy Roberts), um ladrão branco profissional; Leroy
(Ving Rhames), um negro ladrão e cafetão; e um garoto
negro que, infelizmente, foi batizado de “Fool” (Brandon
Adams), cuja irmã, uma leitora de cartas de tarô e
prostituta, está sendo explorada por Leroy. Para os
homens, o objetivo é meramente o roubo. A motivação
de Fool, no entanto, é o altruísmo de Robin Hood. Ele
espera roubar dos ricos e ajudar sua pobre irmã, os
bebês dela e sua mãe com câncer que não pode bancar o
tratamento e, ainda por cima, encara uma ordem de
despejo do seu decrépito apartamento no gueto
(propriedade de Mamãe e Papai). Fool e sua família estão
no caminho de Mamãe e Papai, atrapalhando os planos
deles de transformar o prédio em um condomínio de
luxo.
Mamãe e Papai, vivendo como marido e mulher,
estão, na verdade, em um relacionamento incestuoso;
eles são irmãos. Enquanto o gueto é mostrado como o lar
de elementos criminosos e pobres, o subúrbio é
representado como um lugar ideal para acobertar o mal
verdadeiramente grotesco. Além do desvio sexual, o par
é sadomasoquista e é sugerido que Papai molesta
garotinhas. E, mais do que isso, o casal raptou dezenas
de crianças brancas em busca do filho perfeito. Quando
uma criança decepciona o casal, eles invocam a regra
“não ouça, não veja, não fale” e cortam fora a língua, as
orelhas ou os olhos da criança e dão as partes para o
cachorro comer. Eles então descartam a criança, suja e
faminta, no porão — daí o título “as criaturas atrás das
paredes”. O casal representa uma porção de tabus
horríveis: (1) comida (canibalismo forçado); (2) morte
(eles assassinam os dois ladrões); e (3) incesto (entre
eles e com suas “filhas”).41 Algo central na narrativa de
seus tabus é que tais horrores podem ser facilmente
escondidos atrás da riqueza e da branquitude; duas
posições de poder que, juntas, significam que ninguém
desconfiaria deles ou que eles teriam passabilidade para
cometer o mal.
Depois que os homens são mortos em armadilhas ao
tentar roubar a casa, Fool acaba ficando preso lá dentro.
Ele descobre uma garota branca sequestrada, Alice (A.J.
Langer), que o ajuda a se esconder do casal, e, em troca,
ele assume a missão de salvá-la. A preocupação de
Mamãe e Papai é a de que um homem negro entrou no
lar deles — um garoto “imundo” que pode corromper a
garota branca. Ele não faz isso, mas é culpado de entrar
no quarto feminino e, por isso, Papai anuncia: “Não será
a orelha dele que vou cortar fora!”. Depois de vários
encontros dramáticos com a morte, Fool consegue
escapar da casa, mas é forçado a deixar Alice para trás.
Fool liga para a polícia numa tentativa de salvar a garota,
mas os policiais apenas olham em volta, julgando a
vizinhança e a casa de Mamãe e Papai como símbolos de
normalidade. Dessa forma, o filme destaca que a
maldade do branco, jamais esperada, é difícil de ser vista
e nunca é presumida.
JEFFREY DAHMER:
ASSASSINO EM SÉRIE, CRIADOR
DE ZUMBIS, UM HOMEM BRANCO
SUPOSTAMENTE INOFENSIVO
As criaturas atrás das paredes foi lançado nos cinemas
quatro meses depois da prisão do assassino em série
Jeffrey Dahmer, em julho de 1991, antecipando todos os
tipos de passes sociais que os brancos recebem. Dahmer
viveu e caçou suas vítimas em um bairro pobre de
Milwaukee, Wisconsin, lar de uma comunidade não
branca (negros e laocianos) diversa e de baixo poder
socioeconômico. Duas mulheres negras viram seu vizinho
de quatorze anos, Konerak Sinthasomphone, drogado,
espancado e nu cambaleando pelas ruas. As mulheres
ligaram para a polícia, que chegou na cena na mesma
hora em que Dahmer, que já era um criminoso sexual
condenado, chegava no local para pegar o garoto de
volta. Foi relatado que Dahmer, um homem branco, se
apresentou de forma calma e racional para os policiais
brancos. Ele explicou que Konerak era, na verdade, seu
jovem amante e que eles haviam brigado, mas que
Dahmer estava lá para levar seu namorado de volta para
casa. As mulheres protestaram e tentaram impedir
Dahmer de pegar o garoto. Os policiais relataram que as
mulheres, de alguma forma, simplesmente não pareciam
críveis e escoltaram Sinthasomphone pessoalmente até a
casa de Dahmer. Eles nem mesmo conferiram os
documentos de Dahmer, o que teria revelado seu
passado violento, e ignoraram o cheiro de corpos em
decomposição que vinha da propriedade. Mas, afinal,
Dahmer parecia tão respeitável… Depois que a polícia foi
embora, Dahmer matou, desmembrou e comeu
parcialmente o corpo do garoto — fazendo dele uma de
suas dezessete vítimas conhecidas. As ligações seguintes
que as mulheres fizeram para a polícia como objetivo de
falar sobre o garoto, depois que ele foi reportado como
desaparecido pela família, foram bruscamente
descartadas, e suas ligações para o FBI, ignoradas. Após
esse acontecimento, o cenário se repetiu quando um
homem negro, Tracy Edwards, lutou e conseguiu escapar
de Dahmer enquanto o assassino tentava prendê-lo com
algemas. Agredido e com algemas penduradas em um
dos punhos, Edwards chamou a atenção das autoridades,
levando-os para a residência de Dahmer. Novamente,
Dahmer se mostrou respeitável, e a polícia já estava de
partida quando Edwards apontou aos policiais algumas
fotos de corpos reais e mutilados que estavam
espalhadas pela casa, assim como a faca que Dahmer
usou para ameaçá-lo. Além de tudo, ainda havia partes
de corpos à vista e na geladeira… e, claro, o cheiro.42 O
processo aberto pela família de Sinthasomphone contra a
cidade argumenta que a polícia deveria ser
extremamente homofóbica e racista por falhar em
enxergar Dahmer como o monstro que era. Quanto a
Dahmer, ele explicou que pegava homens, os drogava e
estuprava antes de abrir buracos em seus lobos frontais
e despejar ácidos para criar zumbis escravos (sexuais).
Quando suas vítimas morriam, ele deixava partes
variadas dos corpos espalhadas pela casa, praticava
necrofilia ou as comia. Suas “aventuras” foram
transformadas em um livro chamado Zombie, escrito por
Joyce Oates.43
As criaturas atrás das paredes fez uma conexão com o
caso real de Dahmer, expondo o privilégio branco, a
opressão dos negros e uma porção de tabus. O filme
também lembra que crianças podem ser vitimadas e que
nem sempre podem ser protegidas. “Nunca mais”, Crane
escreve, “os jovens seriam tratados com delicadeza,
postos em segurança por braços amorosos antes que
algo horrível acontecesse […]. A criança inocente em
perigo oferecia uma lição sombria: a inocência relativa
não é uma benção. Os puros irão sofrer inadvertidamente
junto com aqueles que parecem merecer maior
punição”.44 Enquanto as más influências, adolescentes
sexualizadas e garotas possuídas por demônios
passaram por maus bocados no terror não negro, os
“filmes negros” de terror tendiam a evitar a destruição
frequente de sua juventude inocente. As criaturas segue
o caminho do meio; quando a polícia falha em agir, Fool
se torna o salvador heroico, invadindo a casa novamente,
dessa vez sozinho, para lutar contra Mamãe e Papai e
salvar Alice. Ele também acaba libertando as outras
crianças sobreviventes e coloca a riqueza escondida que
pegou do casal nas mãos de sua comunidade.

SUPER-HERÓIS NEGROS URBANOS:


DESASTRES EMOCIONAIS
Al Simmons (Michael Jai White), um militar assassino
negro em Spawn, o soldado do inferno (1997), procuraria
proteção na área pobre da cidade depois de ser morto e
ressuscitado como Hell Spawn, ou apenas Spawn, para
abreviar. Baseado na famosa história em quadrinhos
homônima de Todd McFarlane, Spawn conta a história de
Simmons, um fuzileiro naval e mercenário mortal que
trabalha para uma agência governamental secreta. Jason
Wynn (Martin Sheen), o chefe de Simmons, fez um pacto
com o Diabo e, obedecendo as ordens do demônio, mata
Simmons, queimando-o vivo. O Diabo quer que Simmons
lidere um exército de almas malvadas para conquistar o
céu e começar o Armagedom. Enviado ao inferno
imediatamente, Simmons se transforma em Spawn e é
convidado a fazer seu próprio pacto faustiano: ele pode
retornar para a Terra, e até mesmo ver sua esposa e
filha, se liderar o exército infernal.
Spawn tem muito em comum com Candyman,
voltando à Terra desesperado para ver aqueles que
amava e que um dia o amaram. No entanto, ele descobre
que uma reunião verdadeira com sua família suburbana é
impossível. Em uma primeira tentativa de conexão, ele
aparece do outro lado da alegre cerca branca da casa.
Mas agora Spawn tem um corpo enegrecido e sua
aparência queimada e monstruosa o impede de andar
pela vizinhança. Observando sua antiga casa escondido
atrás de arbustos no quintal, Spawn descobre que cinco
anos se passaram e que sua esposa negra, Wanda
(Theresa Randle), se casou novamente, com o melhor
amigo branco dele, Terry (D.B. Sweeney). Essa família
suburbana passa a representar a felicidade, inexistência
de classes e divisões raciais e ausência de hostilidade.
Claro, Terry não é um soldado, mas um conselheiro.
Spawn é infeliz, indigente e uma figura envolvida em
maldade e violência. Logo, Spawn sai do subúrbio,
procurando refúgio em becos sujos e esquecidos de
bairros mais pobres — “A Cidade dos Ratos”. Ele vive de
forma miserável, assim como Candyman, junto de
mendigos bêbados, pessoas sofrendo de problemas
mentais, roedores e lixo. No final, Spawn consegue salvar
sua família, seu velho amigo Terry e a Terra ao afastar o
Diabo. Embora sua verdadeira identidade tenha sido
revelada para os seus entes queridos, e apesar de ter
salvado o mundo, Spawn não pode conviver no mundo
daqueles que ama. O gueto é onde seu tipo é segregado
e invisível.45

MEIO-HUMANO, MEIO-VAMPIRO
Blade: o caçador de vampiros (1998), um filme de terror
“com negros” baseado no personagem da Marvel Comics
de mesmo nome, assim como Um vampiro no Brooklyn,
faz uso do estereotipo do mulato trágico, mas triplica o
problema, apresentando uma figura meio-humana, meio-
vampira e não exatamente negra. O vampiro negro,
Blade (Wesley Snipes), é atormentado e vingativo,
buscando retaliação contra a raça de monstros que o
criou. O filme mostra, com o uso de flashbacks, que a
mãe de Blade, Vanessa (Sanaa Lathan), foi atacada e
mordida por um vampiro quando estava grávida de
Blade. Apesar de não ter sido mordido diretamente, ele
foi infectado com vampirismo ainda no útero. Ele saiu de
sua mãe quando ela estava morrendo, fazendo dele um
espécime único, meio-humano, meio-vampiro. Ele é um
“caminhante diurno”, imune ao poder destrutivo do sol, e
não é afetado pelo alho. Blade também é extremamente
forte, cheio de ódio pelos vampiros e se vê numa guerra
constante com sua sede por sangue.
No filme, já no presente, cerca de trinta anos depois,
no que parece ser uma cena muito dolorosa para Blade,
ele descobre que sua vida de órfão — ao que tudo indica,
Vanessa seria uma mãe solo — era uma mentira.
Vanessa não morreu completamente durante o
nascimento dele e retornou como vampira, escolhendo
seguir a vida junto com os vampiros, e não com o filho.
Para piorar, o homem com quem ela forma par, Deacon
Frost (Stephen Dorff), não é apenas (muito) branco e o
principal adversário de Blade, mas também é revelado
por Frost, de maneira cruel e zombeteira, o segredo por
trás da identidade de Blade — Frost é, em essência, seu
pai branco, pois foi ele quem o transformou em vampiro,
substituindo o pai negro e desconhecido de Blade.
Embora Blade seja um adulto, o filme pede que o
público lamente por essa criança órfã de mãe, uma
criança não natural, que se torna uma vítima por causa
da ausência de amor e autoridade parental, cujos
“poderes especiais são justificadamente provocados”, ao
mesmo tempo que sua raiva se faz entendida.46 De
assassino Blade rapidamente se transforma em anti-herói
e então em um super-herói, quando sua história se torna
parte de sua motivação. Vanessa, não Blade, é
representada como aquela que é verdadeiramente
impura e monstruosa. Uma mulher bonita que nunca
envelhece e que aparenta ter a idade de Blade, ela o
acaricia de forma sedutora, os lábios dela roçando nos
dele enquanto o prepara para a morte. Ela, novamente,
sacrifica o filho para Frost. Quando Blade sobrevive e
mata a própria mãe, ela sofre por sua monstruosidade e
pelas tragédias raciais do filho.
Ao longo do filme, surge a rara representação da mãe
negra tóxica e destrutiva. No entanto, Blade encontra em
Whistler (Kris Kristofferson) um pai branco substituto,
com quem luta lado a lado em uma guerra contra os
vampiros. Talvez o relacionamento de Blade e Whistler
“sugira uma relação servil ao paternalismo branco”, mas
o filme não explora essa conexão da forma como o
gênero fez no passado, por exemplo, com o estereotipo
do ajudante/servo leal.47 Em vez disso, Blade mostra
uma relação complexa de amizade e amor, primeiro
nascida da tragédia e de objetivos comuns de vingança
(a família de Whistler foi morta por vampiros), e, então,
evoluindo durante os anos da vida isolada que eles
compartilharam.
Blade acaba não explorando os anos de parceria
profissional e doméstica dos homens, optando por colorir
o filme com estereótipos de hipermasculinidade e
hipersexualidade tradicionais. Por exemplo, Blade, à
beira da morte, é trazido de volta pela dra. Karen Jenson
(N’Bushe Wright) — uma hematologista negra que deixa
Blade beber seu sangue para que sobreviva. A cena em
que Blade chupa o sangue dela é uma exibição violenta e
extraordinariamente erótica, já que Blade se sacia e,
quando satisfeito, solta um grito orgástico que reverbera.
Blade, assim como Max de Um vampiro no Brooklyn,
não tem nenhum encontro desse tipo com um homem.
Max transforma homens ao gotejar um pouco de sangue
na língua deles, com o filme dizendo explicitamente que
ele “não precisa fazer aquela merda que o Blácula faz”.
Apesar de Max transformar suas vítimas em vampiros,
ele não o faz no estilo de Blácula, mordendo o pescoço
delas ou outra parte do corpo. Max reserva esse tipo de
encontro apenas para as mulheres, assim como Blade.
Blade e Max servem para lembrar ao público da “lascívia,
do desejo sexual feminino”, assim como a habilidade
deles — da qual, supostamente, apenas homens são
capazes — de satisfazer esse desejo enquanto unem
“sexualidade e apocalipse”.48 No entanto, esse tipo de
junção não fica confinada aos vampiros, afinal, monstros
masculinos (como Candyman) são masculinizados
quando prometem experiências sexuais tão fora deste
mundo às mulheres que elas morrem — a mais
derradeira fantasia de sadomasoquismo e sexo
brutal/estupro.
No final, Blade, assim como Spawn, decide manter um
olhar atento sobre a raça humana, mantendo-a a salvo
dos monstros. Juntos, eles são a “super-polícia”; o tipo de
reguladores sociais que se esperaria encontrar
patrulhando ambientes hostis. Demônios infernais e
vampiros não são desafios para qualquer tipo de
salvador. Eles são um trabalho para monstros dispostos a
policiar suas próprias espécies. Os dois super-heróis
deram um novo significado para a violência cruel de
negros contra negros. No caso de Blade, a representação
foi extraordinariamente popular. O filme ficou em
primeiro lugar em sua semana de lançamento,
angariando 17.073.856 milhões de dólares e lucrando
mais de 70 milhões com exibições caseiras. Esse filme
daria origem a mais dois outros.49

CONCLUSÃO: O TERROR É O NOVO PRETO


Depois de cem anos de participação desigual no gênero
de terror, o negro estava de volta nos anos 1990,
desempenhando um papel central no despertar de
“calafrios e sustos”. O negro estava em todos os lugares
— em “filmes negros” de terror e em filmes de terror
“com negros”, filmes independentes e filmes
hollywoodianos, em sucessos de bilheteria de alto
orçamento e até em esforçados filmes de baixo
orçamento que não passariam nos cinemas. Personagens
negros como Blade e Spawn eram monstros “super-
heróis”, retirados das páginas de gibis e transformados
em franquias lucrativas. O mal negro que corrompe as
mulheres brancas já havia sido visto, mas em Candyman
o público fica do lado do monstro, torcendo para que a
besta entrasse no quarto e convencesse a mulher branca
a ser sua vítima. Não parecia importar que o sofrimento
de Candyman fosse resultado de dormir com uma
branca, para começo de conversa.50 De maneira
significativa, os negros não apenas deixaram de ser os
primeiros a morrer nos filmes de terror: com frequência,
eles sequer morriam ou eram aqueles que matavam.
Negros invadiram os subúrbios e os monstros
(brancos) se encaminharam de volta para a área urbana.
Em 1995, a franquia Colheita maldita saiu das fazendas
rurais do Nebraska e passou a residir em Chicago. Em
Colheita maldita 3: a colheita urbana, as crianças e suas
foices acabaram com as pessoas que perambulavam em
volta de um parque industrial no gueto. As crianças
adoradoras de milho não devem ser confundidas com
aqueles brancos que saíram dos subúrbios. Em vez disso,
essas crianças são os brancos da zona rural, as “classes
menosprezadas”51 ou mais baixas, representando um
monstruoso clã, ou família, alocado em um campo bem
longe dos negros.
Da mesma maneira, os bairros pobres das cidades
ressuscitariam a série de filmes O duende, com o
monstro mítico irlandês em O duende 5 (2000) à procura
de sua flauta encantada no gueto, em meio a rappers
pretensiosos armados que ele destrói da forma mais
grotesca possível. A coisa toda foi tão bem que o Duende
retornou em O duende perverso (2003) para fumar
maconha e roubar dentes de ouro.
Como um todo, a participação dos negros em filmes
de terror no ciclo de 1990 se tornou cada vez mais
onipresente. O próprio gênero de terror estava
começando a mofar, como pode ser observado com a
moda de relançar filmes (por exemplo, A noite dos
mortos-vivos [1968], A noite dos mortos-vivos [1990], A
noite dos mortos-vivos 3D [2006]). Para os negros, o
terror ainda estava fresco. Mudanças no mercado e na
tecnologia abriram espaço para intervenções
representativas. O mercado direto-para-vídeo deu origem
ao espectador habitual — alguém que alugaria um monte
de filmes de uma vez só, alguns específicos, mas a
maioria escolhida aleatoriamente. O terror foi novamente
confrontado com a proposta de atender a uma
necessidade, e, em uma repetição das décadas de 1940
e 1970, todos os tipos de “filmes negros” de terror
entraram num sistema de produção rápido e barato. Os
filmes não eram todos novos, já que a indústria saqueava
catálogos inteiros, forçando centenas de filmes para
dentro de um mercado prestes a estourar.52 O público
teria muito a escolher, pois o acesso às tecnologias
digitais (de câmeras a softwares) tornou o cinema —
apesar de apresentar uma ampla gama de habilidades e
qualidades — acessível de uma maneira nunca antes
imaginada.
O excesso de filmes, oferecidos por profissionais e
amadores, significou que, com a entrada do século XXI, já
não seria mais possível simplesmente listar os filmes em
que os negros apareciam. Ainda assim, divisões raciais e
espaciais permaneciam. Manter os negros, em grande
parte, confinados aos guetos fez com que o terror
apresentasse uma estética negra para combinar. O terror
e o hip-hop se uniram de maneira intrínseca, e graças a
rappers como Snoop Dogg e suas várias contribuições
aos filmes do terror, o gênero acabou refletindo essas
influências culturais. Hoje, filmes de terror dão o seu
melhor para sinalizar sua relação com o hip-hop,
frequentemente modificando a escrita tradicional das
palavras para refletir o estilo desconstruído da linguagem
hip-hop: Zombiez (2005), Vampiyaz (2004), Bloodz vs.
Wolvez (2006), Kracker Jack’d (2003).
O “terror negro” tão em evidência mais atualmente
também possui seus pontos fracos. Há muito lixo
apelativo, e filmes como Chop Shop (2007), com meia
dúzia de cenas vis de estupro em que a mesma mulher é
violentada (e sem propósito algum para a narrativa),
mostram que filmes negros nem sempre serão
revolucionários e estão suscetíveis aos mesmo
problemas que flagelam os demais gêneros.
Podemos apenas esperar para ver se a participação
dos negros no terror continuará a prosperar e evoluir, ou
decair e possivelmente se autodestruir.

* Em 2018, Spike Lee escreveu, produziu e dirigiu o filme Infiltrado na


Klan, baseado na vida de Ron Stallworth, um policial negro do
Colorado que conseguiu se infiltrar na Ku Klux Klan na década de
1970 para se aproximar do líder da seita, David Duke (interpretado
por Topher Grace) e investigar os movimentos do grupo. O filme
ganhou o Oscar de melhor roteiro adaptado e foi indicado também
às categorias de melhor filme, melhor diretor, ator coadjuvante,
trilha sonora original e montagem. [NE]
HORROR
NOIRE

CONCLUSÃO
CAPTURANDO ALGUNS ZZZZZS —
OS NEGROZ E O TERROR NO SÉCULO
XXI

Eles dizem que somos produtos das


profundezas do inferno porque o preto
voltou e está pronto pra vender.— PUBLIC
ENEMY1

O século XX terminou bem para o terror. O Oscar, que


geralmente não reconhece a importância do gênero,
acabou dando atenção ao terror quando filmes como O
sexto sentido (1999) recebeu seis indicações e quando O
silêncio dos inocentes (1991) conquistou as estatuetas
mais importantes, incluindo o prêmio de melhor filme.
Todos estavam de olho no gênero e, logo, uma pergunta
surgiu: que novas voos o terror alçaria? Por exemplo,
poderia a vencedora do Oscar, Halle Berry, contribuir
com o seu potencial de estrela para o filme de terror
“com negros” Na companhia do medo (2003), que conta
a história de uma mulher e um fantasma que se unem
para expor sadistas sexuais que assassinavam garotas?
Ou, seguindo a tradição de A bruxa de Blair (1999),
poderia o filme de terror “com negros” Serpentes a bordo
(2006), estrelando Samuel L. Jackson, fazer barulho o
suficiente na internet para transformá-lo em um hit?1 Até
agora, o século XXI tem dado uma resposta clara para a
pergunta: o gênero de terror não está tentando inovar;
em vez disso, está requentando terrores antigos de seu
catálogo para reapresentá-los ao público. Em lugar de
seguir a tendência da inovação, cineastas millennials
estão preferindo fazer remakes. Por exemplo, o clássico
de terror de John Carpenter, Halloween: a noite do terror
(1978), foi “reimaginado” no filme de Rob Zombie,
Halloween: o início (2007). Alguns filmes de terror sequer
receberam esse tratamento de repaginação, sendo
meramente refeitos: Aniversário macabro, de 1972, foi
refeito em 2009; O massacre da serra elétrica, de 1974,
foi refeito em 2003; A profecia, de 1976, foi refeito em
2006; Madrugada dos mortos, de 1978, foi refeito em
2004; e Quadrilha de sádicos, de 1977, refeito em 2006.2
Críticos reclamaram de um excesso de filmes de terror
(por exemplo, 39 filmes estavam em produção em 2007),
pois os estúdios estavam fazendo remakes de terror um
atrás do outro.3
Embora todos os gêneros cinematográficos estejam
propensos a algum tipo de duplicação, no terror a prática
parece ser “mais nítida e extrema do que em outros
lugares”.4 Os estúdios já perceberam há muito tempo
que existe um método por trás da loucura. Aqueles que
tinham idade o bastante para assistir os filmes originais
estão agora com seus quarenta, cinquenta anos,
maduros demais para novos sustos. De acordo com
Fischoff et al., o público de 25 anos de idade para baixo
gosta de violência, efeitos especiais e histórias simples.
Já o público de idade mais avançada permanece em uma
“cápsula do tempo estética”, evidenciando uma
preferência por suas antigas experiências
cinematográficas.5 Resumindo, os remakes são feitos
para a nova geração de frequentadores de cinema.
Simplesmente relançar filmes clássicos de terror não é o
bastante, já que esta nova geração cresceu com uma
saudável dieta de violência midiática.6 O próximo ciclo de
filmes de terror precisará pensar a respeito de três
problemas — como visar o público jovem, como fazer
parte de um mercado onde a violência é onipresente na
mídia e de que forma competir com a popularidade dos
jogos eletrônicos violentos. Cineastas de terror reagiram
a essa tendência testando em pré-adolescentes trechos
de seus filmes a serem lançados. Por exemplo, partes do
filme de terror Eu sei o que vocês fizeram no verão
passado (1997) foram exibidas para crianças de apenas
nove anos de idade.7 Entretanto, dessa pesquisa feita
pelos cineastas, surge uma compreensão importante: o
terror precisa evoluir se quiser competir com jogos
eletrônicos de terror com “violência hiper-realista”,8
como Resident Evil (1996) e Bioshock (2007), oferecidos
ao público jovem (embora supostamente não sejam
recomendados para as crianças). O gênero do terror tem
respondido: (1) inclinando-se na direção dos jovens; (2)
adotando a estética dos videogames (pontos de vista em
primeira pessoa, efeitos criados em computador e uma
ambientação frenética); e (3) além de reformatar o velho,
a nova safra de terror explora os videogames (por
exemplo, House of the Dead: o filme [2003]; BloodRayne
[2006]).

UMA LIÇÃO FINAL SOBRE NEGROS E FILMES


DE TERROR
Este resumo do último século do terror serviu para
mapear a contribuição dos negros no gênero. Ele
demonstra a grande resiliência dos negros em reivindicar
uma participação, tanto na frente quanto atrás das
câmeras. A participação dos negros nos filmes sempre foi
e sempre irá além da comercialização cultural; ao
contrário, foi postulado aqui que o envolvimento dos
negros no gênero configura um interessante estudo a
respeito de ideias sociais e valores culturais, reinserção
nas — ou resistência contra as — ideologias dominantes
e negociações de representatividade, por exemplo, exibir
corpos e culturas negras, com algum realismo ou na
forma de espetáculo.
No século XXI, os negros também tiveram de aceitar a
mudança no mercado. Assim como o gênero de terror
como um todo, filmes que estrelavam negros (não
necessariamente escritos, dirigidos ou produzidos por
negros) têm se inclinado na direção dos jovens,
saudando propositalmente a juventude de todas as
faixas da geração hip-hop ao saturar o terror com
rappers e música rap em “filmes negros” de terror. Por
exemplo, Ameaça urbana (1999), com fantasmas que
matam os criminosos que predam as áreas urbanas da
cidade, estrela os rappers Snoop Dogg, Big Pun, Ice-T e
Fat Joe. Numa espécie de autocrítica, admitindo a própria
falta de qualidade, o DVD permite que o público pule o
filme inteiro e apenas ouça o rap de Ice-T. Da Hip Hop
Witch (2000) — uma versão de A bruxa de Blair (1999)
do gueto — eleva o quociente rapper ao apresentar a
absurda quantidade de 24 rappers, incluindo Eminem,
Charli Baltimore, Professor x, Ja Rule, Pras, Vanilla Ice,
Rah Digga, e Mobb Deep. Mais de cem “filmes negros” de
terror foram lançados só na primeira década do século
XXI.9 Para deixar óbvia a conexão com o hip-hop, os filmes
rompem com a linguagem tradicional, adotando o jargão
quebrado e pós-moderno do hip-hop, com frequência
acrescentando um “z” nos títulos de filmes: Cryptz
(2002), Vampz (2004), Vampiyaz (2004), Zombiez (2005),
Bloodz v. Wolvez (2006). Graças, em grande parte, ao
mercado direto-para-DVD, que torna a produção e
distribuição de filmes acessíveis para praticamente
qualquer um com acesso a equipamento digital,
estreantes, como H.M. Coakley com Holla (2006), e os já
bem estabelecidos, como Eriq La Salle com Crazy as Hell
(2002), estão fazendo “filmes negros” de terror. De uma
maneira simples, o “terror negro” aprendeu lições
importantes de sobrevivência, esculpindo um nicho
rentável e popular, misturando juventude, hip-hop e o
mercado de filmes caseiros.

CONTOS DO HIP-HOP
Os anos 1980 marcaram uma explosão no
desenvolvimento do rap. Os estilos de rap se tornavam
cada vez mais diversos, desde o som fácil do grupo
Sugar Hill Gang, influenciado pela música disco, e as
letras machistas de LL Cool J, até os pronunciamentos
políticos de Grandmaster Flash and The Furious Five e os
sermões da bandidagem de Ice-T. Em meio a essa
enxurrada de atividade musical, o terror está presente, e
as duas formas de cultura popular se sincronizam
facilmente. Em 1988, o duo de rap DJ Jazzy Jeff (Jeff
Townes) e Fresh Prince (Will Smith) lançou o álbum He’s
the DJ, I’m the Rapper, com a música “Nightmare on My
Street”. O lançamento do álbum coincidiu com o
lançamento de A hora do pesadelo 4: o mestre dos
sonhos, com a música de Fresh Prince servindo como um
tributo não oficial à popularidade da franquia de filmes:10
I walked in the house, the Big Bad Fresh Prince/
But Freddy killed all that noise real quick/ He
grabbed me by my neck and said: “Here’s what
we’ll do. We gotta lotta work here, me and you.
The souls of your friends you and I will claim.
You’ve got the body and I’ve got the brain.”*

A música, escrita em parceria com Will Smith, antecipou


a eventual aproximação de Smith do terror, como um
novo (super-)herói negro para o século XXI. A chegada de
Smith marca a dramática despedida dos trágicos e
desafeiçoados super-heróis negros de terror, como
Spawn e Blade, em batalhas com criaturas de outros
mundos e outras raças.11 Spawn e Blade são, eles
mesmos, monstruosos, anti-heróis guerreando com seus
iguais, também aberrantes. Smith foi para um lado
totalmente diferente, atuando como um salvador negro,
livrando o mundo de todos os tipos de invasões
alienígenas. Nos filmes de ficção científica Independence
Day (1996) e MIB: homens de preto I e II (1997, 2002), o
status icônico de Smith fica em evidência enquanto ele
se apresenta impecavelmente bem-vestido (apesar de
sua noiva stripper em Independence Day), bonito, afável
e como um perspicaz assassino de monstros. A presença
de Smith serve para perturbar (mas não expelir
totalmente) a insistência obsessiva do terror em conectar
a ameaça alienígena à negritude, real ou metafórica,
como visto de O monstro da lagoa negra (1954) e em O
predador 2: a caçada continua (1990). Seu fantástico
estrelato e raça “funcionam muito bem juntos”, levando
a alegações de que Smith transcende raça.12
Presumidamente, seus monstros — polvos fedorentos e
insetos gigantes — transcendem raça também.
A atuação de Smith no filme de terror “com negros”
Eu sou a lenda (2007) representa, de certa forma,
absolutamente nada, nem progresso e nem regresso
para os negros no terror. O filme é baseado no livro
homônimo de 1954, de Richard Matheson, que conta a
história do último humano vivo em um mundo de
vampiros. O livro serviu de base para diversos filmes.13
Por exemplo, Mortos que matam (1964) estrela Vincent
Price como o dr. Robert Morgan, que é imune à praga
vampira. O filme retrata uma solidão cinzenta e dolorosa
enquanto Morgan assiste sua família e o mundo a sua
volta morrerem. Embora ele tenha a cura em seu próprio
sangue, no final trágico do filme, Morgan representa uma
minoria em um mundo dominado por vampiros,
resultando em sua exterminação — ele é morto no altar
de uma igreja, na posição de Jesus Cristo na cruz. Em A
última esperança da terra (1971), Charlton Heston
retrata Robert Neville, cuja solidão enlouquecedora é
interrompida de repente quando ele descobre que
existem alguns outros sobreviventes de uma praga que
transformou a população da Terra em mutantes avessos
ao sol. Neville se envolve romanticamente com uma
mulher negra, Lisa (Rosalind Cash), que sucumbe à praga
e o trai em prol dos mutantes. Neville é morto, e seu
corpo também aparece numa pose de Cristo crucificado.
Assim como Morgan, o sangue de Neville também é um
antídoto para a praga. Logo antes de sua execução,
Neville salva o dia, já que ele conseguiu extrair seu
sangue e entregar nas mãos de humanos que começarão
o processo de restaurar a humanidade.
No Eu sou a lenda de Smith, ele também retrata o dr.
Robert Neville, um sobrevivente solitário de uma praga
que desenvolveu monstros sedentos de sangue. Sua
solidão é interrompida por um monstro fêmea que ele
capturou para estudar, além de uma mulher e uma
criança não infectadas que estão em busca de outros
sobreviventes. Entretanto, ao Neville de Smith, é
recusado o comentário racial dispensado ao Morgan de
Price e ao Neville de Heston, assim como a iconografia de
salvação por meio do “sangue de Jesus” que eles
compartilharam. O Neville de Smith, notavelmente, não
tira a cura para a humanidade de suas veias — de seu
sangue negro. Em vez disso, a cura vem do sangue do
monstro, quando o doutor injeta nela um soro composto
pelo sangue dele e algumas substâncias químicas. A ele,
que morre numa explosão, é negada até mesmo a pose
de Jesus.
Aqui, o estrelato, a persona de filmes de ação e a raça
de Smith são tornados mais palatáveis à custa dos
significados mais profundos que as representações
anteriores e o romance original forneciam. Embora o
público saiba um pouco sobre o Neville de Smith — os
espectadores veem sua esposa e filha antes da tragédia,
ficam sabendo que ele gosta de bacon e ama a música
de Bob Marley —, ele é social e culturalmente neutro. Isto
é, não há muita complexidade nele. Ele pode ser
apropriadamente comparado ao Ben (Duane Jones) de A
noite dos mortos-vivos (1968), sobre o qual não é dada
praticamente nenhuma informação. Apesar de a cor de
Ben nunca ser mencionada, ele ainda é complexo, um
símbolo da história racial e da relação entre raças, já que
ele, o único homem negro, luta para sobreviver aos
ataques dos zumbis e dos brancos — igualmente
sedentos de sangue. A comparação entre as duas
representações — Neville e Ben — não é forçada. O
próprio George Romero, diretor de A noite dos mortos-
vivos, foi inspirado pelo livro de Matheson, de onde
pegou emprestados os mortos cambaleantes que enfiam
as mãos por entre as tábuas de janelas fechadas para
agarrar o último humano, assim como a criança
moribunda, a queima de vítimas em uma pira e a morte
do protagonista da história.14 Da mesma forma, em uma
cópia de A noite dos mortos-vivos (1968) e Dia dos
mortos (1985), Day X (2006), que foi lançado em DVD,
coloca Frank (Ken Edwards) em uma siderúrgica
abandonada quando um vírus de zumbificação é liberado
por acidente. Ele é o único negro e assume o controle de
dez brancos (alguns deles, hostis) que foram até lá em
busca de proteção. A tensão do filme carrega um
sobretom racial, que é abordado de forma cômica nessa
produção tão séria: “Você já viu aquele filme com o cara
negro naquela casa?”. Acrescente a isso a evidente
racialização do personagem Riddick em Eclipse mortal
(2000), que é tirado do armário, racialmente falando,
com a fala sarcástica de que ele seria levado como um
prisioneiro “no fundão do ônibus”. Contudo, ao Neville de
Smith não é concedido um comentário desse tipo, ainda
que esteja envolvido em um trauma nacional, senão
global, como um oficial militar, mudando sua atenção,
presumivelmente, da guerra (do Afeganistão, por
exemplo) para a praga, precisando lidar com a sua
América, simbolizada por uma Nova York pós-11 de
setembro, sem sistemas políticos, culturais ou sistema de
valores (por exemplo, seria assassinato matar os
monstros?).

O LADO MAIS ESCURO DO HIP-HOP


Para cada metrópole, há uma necrópole.
— Adam Simon, produtor, Bones15

Se alguém estiver procurando por uma reflexão


sociopolítica, o terror infundido de hip-hop raramente
desaponta, dando marretadas na cabeça do público com
contos de moralidade e responsabilidade social. O rapper
Snoop Dogg tomou a dianteira com, até esta data, três
filmes de terror-moral. O direto-para-DVD Ameaça urbana
(1999), mostra Snoop estrelando no papel de alguém que
lamenta a violência que permeia sua comunidade e,
ironicamente, mata o maior número possível de
gângsteres. O próximo filme de Snoop, Bones, o anjo das
trevas (2001), ostentou um moderado orçamento de 16
milhões de dólares, o apoio da New Line Cinema e o
talentoso diretor Ernest Dickerson.16 No filme, Jimmy
Bones (Snoop Dogg) é uma lenda vida dos anos 1970,
um “cavalheiro gângster” que trabalha com apostas e é
bem respeitado pelos membros da sua comunidade
negra.17 Seu bairro prospera até as drogas pesadas
serem introduzidas por lá. Quando recusa a se juntar aos
outros traficantes, Jimmy é morto. Os traficantes enfiam
facas em seu corpo, lembrando Cristo ao ser pregado na
cruz. Jimmy se torna uma lenda popular, sendo lembrado
ao longo dos anos, apenas para retornar duas décadas
mais tarde como um fantasma violento em busca de
retaliação. Ele reivindica uma vingança sangrenta contra
seus assassinos, que também contribuíram para a morte
do bairro, e aqueles que continuam a impedir a
vizinhança de prosperar, mantendo-a vítima da praga
das drogas. Até o retorno de Jimmy, as drogas se
tornaram um “capitalismo incontrolável”, intocadas pela
polícia corrupta, líderes invisíveis e ativistas da
comunidade. Apenas algo vindo diretamente da cultura
gângster, transformado em um espírito raivoso, poderia
refrear o terror.18
Em um movimento intertextual, Bones estrela Pam
Grier como Pearl, a namorada de Jimmy, mostrando-os
como um casal no auge do poder dele em 1979. Aqui,
Grier deve ser imaginada como uma de suas
personagens icônicas do blaxploitation da década de
1970, Coffy, Foxy ou Sheba, a vadia malvada e gostosa
que fornecia cenas apelativas para pessoas como o
rapper Snoop Dogg, que afirma ter crescido assistindo
aos filmes dela. Sua presença aqui não pode ser
separada das frequentes aparições de Snoop, seja em
seus clipes ou em cerimônias de prêmios, vestido como
um cafetão dos anos 1970, contando até mesmo com um
“cálice de cafetão” e com a companhia de Don “Magic”
Juan, um cafetão de Chicago que aparece nos
documentários Pimps Up, Hos Down (1999) e Cafetão
americano (1999). A inclusão de Grier é uma fantasia
misógina de prostituição e estupro. Denzin afirma que
seria inapropriado interpretar tal machismo como um
traço marcante apenas da cultura jovem negra. Em vez
disso, essas práticas preocupantes de gênero estão
implicadas em uma supremacia branca que escala atores
negros como traficantes e cafetões e mulheres como
prostitutas.19 A Pearl dos dias modernos, vinte anos após
a morte de Jimmy, é desenvolvida. Ela é agora uma
vidente e se conecta com Jimmy no mundo espiritual. No
entanto, o filme não conecta essa Pearl mais velha com
uma pessoa tipo a personagem Lisa, de Os gritos de
Blácula (1973), que se esquiva do erotismo com o
vampiro Blácula e usa seus poderes de vidente/vodu
como uma super-heroína para salvar sua comunidade
negra. Como um todo, o conto de terror de Snoop revela
uma nostalgia da vida antes dos tiroteios e do crack,
quando os gângsteres eram tranquilos e seu negócio era
o tráfico de mulheres.
Apesar de seu orçamento e poder de estrelato,
incluindo um CD com uma trilha sonora de Snoop Dogg
que alcançou a posição 39 na Billboard 200 em outubro
de 2001, Bones: o anjo das trevas é um exemplo primário
de como “filmes negros” de terror ainda lutam para
conquistar um lugar em Hollywood. Arrecadando pouco
mais de 7 milhões de dólares, o diretor Ernest Dickerson
é cético em relação ao comprometimento da indústria
com o cinema negro:
Então, sim, e às vezes eu realmente acho que
existe uma força que não quer que afro-
americanos ganhem um local de
reconhecimento na arte de fazer filmes,
decidindo quais filmes serão feitos, delimitando
o gênero e colocando limites naquilo que filmes
negros podem fazer. […] Bones conseguiu
ótimas resenhas no The New York Times, The L.
A. Times e Variety, mas o estúdio se recusou a
capitalizar com essas boas resenhas. Uma
prática comum na indústria é colocar citações
de boas resenhas em anúncios, mas eles se
recusaram a fazer isso e gastaram só um terço
do que todos estavam gastando com divulgação.
Então, o filme saiu e teve uma ótima trilha
sonora que nunca chegou nas rádios. Como você
recusa um álbum do Snoop Dogg?20

Snoop continuaria sua pregação, apropriando-se de


Contos do além (1972) e do “filme negro” de terror
Contos macabros (1995), de Rusty Condieff, para lançar
Snoop Dogg’s Hood of Horror (2006), em que Snoop
aparece como o “Guardião do Berço”, enviando almas
para o inferno.21 Hood é uma antologia, apresentando
três vinhetas sobre limpar os grafites de gangues da
comunidade e livrá-la de senhorios inescrupulosos e
rappers assassinos que esqueceram suas origens.
O link entre terror e hip-hop continua com o
horrorcore, um subgênero do rap fortemente influenciado
pelo terror, utilizando-se de histórias de zumbis e
canibalismo, com os artistas, algumas vezes, se
apresentando com fantasias grotescas. As raízes do
horrorcore são debatidas, e alguns consideram o grupo
de rap Geto Boys como a inspiração para o gênero, com
seu álbum de 1991, We Can’t Be Stopped, que contém
duas músicas inspiradas no terror: “My Mind Is Playing
Tricks on Me”, sobre um pesadelo baseado no halloween,
e “Chuckie”, uma música que apresenta um personagem
que conta ter comido o “cérebro de um cachorro”,
inspirada na franquia de filmes Brinquedo assassino. Já
outros apontam os rappers Prince Paul, do grupo
Stetsasonic, e RZA, do conjunto Wu-Tang Clan, como os
inovadores, com a formação do grupo Gravediggaz e o
lançamento de seu primeiro álbum, 6 Feet Deep. O
álbum foi descrito como “um fracasso comercial mórbido
e brega”.22 No entanto, o objetivo do horrorcore não é
alcançar uma recepção comercial e mainstream, mas o
underground e o periférico. Desde o início dos esforços
do Gravediggaz, artistas como Insane Clown Posse, D12
e Eminem — todos de Detroit — foram creditados por
manter o horrorcore (ocasionalmente) longe da mídia
tradicional. Esse trabalho inclui o festival anual do Insane
Clown Posse, Gathering of the Juggalos, assim como as
ocasionais letras de terror de D12 e Eminem. Brotha
Lynch Hung, um rapper de Sacramento, que afirma ser o
fundador do horrorcore, foi o primeiro rapper a estrelar
seu próprio “filme negro” de terror horrorcore, Now Eat:
The Movie (2000). O filme apresenta a letra medonha de
Lynch: “I don’t wanna brag/ Fuck Jeffery Dahmer he’s a
mothafuck’n fag/ I got nigga nuts and guts in a bag,
draggin them to the pad”.23* O enredo do filme se
concentra no costume que ele e seus amigos rappers
têm de jantar seus rivais depois de salpicar amaciante de
carne sobre eles. O horrorcore, que não consegue muito
espaço na rádio por causa de seu conteúdo
profundamente violento, machista, homofóbico e pró-
suicídio, continua a ter seguidores undergrounds, com a
área metropolitana de Detroit hospedando a subcultura.
Por exemplo, em 12 de setembro de 2009, o festival de
música horrorcore Strictly for the Wicked, foi realizado
em Southgate, Michigan, com organização da Serial Killin
Records. Promovido em grande parte na internet, o
festival “para todas as idades” apresentou cerca de 25
artistas e atraiu uma média de 250 pessoas. O horrorcore
recebeu atenção inesperada da imprensa mainstream
quando um rapper do horrorcore, Richard “Syko Sam”
McCroskey, de vinte anos de idade, espancou quatro
pessoas até a morte em suas casas depois de participar
do festival Strictly for the Wicked. A conexão entre a
violência do horrorcore e os assassinatos foi explicitada
pelo rapper horrorcore Mario “Mars” Delgado:
FIGURA C1 SNOOP EM HOOD OF HORROR.
Arclight Films/Photofest
o ponto é ir cada vez mais longe e chocar e
ofender pessoas […]. É marketing — é tão
chocante e tão na cara que os garotos querem
isso, eles precisam disso. […] Se seus filhos
curtem esse tipo de coisa, você precisa sentar e
conversar com eles e perguntar: “Você está
bem?”. […] É um pedido de ajuda que muitos
pais não percebem.24

“FILME NEGROS” DE TERROR NÃO SERVEM


MAIS PARA OS CINEMAS
Houve um tempo na história do gênero de terror quando
uma contagem dos “filmes negros” de terror poderia ser
feita facilmente. Em algumas décadas, seja em filmes de
terror “com negros” ou em “filmes negros” de terror, a
imagem dos negros foi escassa e espaçada. Contudo, a
presença de negros no gênero experimentou uma
explosão, grande parte em virtude do mercado direto-
para-DVD, uma forma de distribuir os filmes com ou sem a
ajuda de um estúdio, oferecendo possibilidades de
compra ou locação aos consumidores. Nos anos 1980 o
mercado audiovisual emergente foi marcado com a
reputação de ser um local de despejo para filmes
inferiores. Então, uma rota viável era produzir filmes que
custavam significativamente menos do que uma
produção feita para o cinema, permitindo que a obra
fosse gravada com um orçamento baixo, porém com um
potencial para lucros altos. Até mesmo os grandes
estúdios perceberam rapidamente que há um enorme
potencial de lucro no mercado de vídeos, lançando
franquias direto-para-DVD, como a Lions Gate fez com
seus filmes da franquia “Barbie”, que já tem mais de
quinze títulos em sua série, sem previsão de acabar. Não
foi apenas o mercado de filmes infantis que se
aproveitou do mercado direto-para-DVD. Sequências de
terror também encontraram um cantinho no nicho dos
vídeos. Por exemplo, Candyman: dia dos mortos (1999)
foi lançado em vídeo. Candyman: dia dos mortos é um
daqueles filmes que não merecem o investimento de um
filme de cinema, que pode custar mais de 35 milhões em
propaganda e mídia impressa para divulgação.25 Lançar
uma franquia de filmes em vídeo se provou um ótimo
negócio:

O [distribuidor de filmes] Mike Elliott viu o


desastre em celulose [Turbulência, 1997] e
pensou em uma coisa: Turbulência 2 (1999).
Uma sequência de baixo orçamento em que uma
classe “com medo de voar” faz o passeio de
suas vidas. E, então, de forma improvável e
inevitável, Turbulência 3 (2001) apresentou uma
banda de heavy-metal tocando ao vivo num 747.
E, no final de tudo, aqui está a surpresa: as
sequências fizeram dinheiro. Muito dinheiro, na
verdade. […] e Turbulência 2 acabou angariando
10 milhões em aluguéis com um investimento
de 4 milhões.26

Até a TV a cabo quis participar desse mercado. A


Showtime Entertainment, por exemplo, levou seus curtas
de terror de baixo orçamento, dirigidos por alguns dos
maiores nomes do gênero — John Carpenter, Tobe
Hooper, John Landis e Ernest Dickerson — ao mercado de
DVD. Da mesma forma, o canal de televisão SyFy com
frequência lança em vídeo os filmes de terror produzidos
pela própria empresa. Netflix e RedBox estão expandido
e distribuindo filmes independentes. E, além disso,
alguns cineastas têm vendido DVDS diretamente pela
internet, fornecendo teasers por meio de uma variedade
de formatos on-line (por exemplo, páginas pessoais de
vídeos no estilo do YouTube).27 Doug Schwab, um ex-
comprador da Blockbuster, além de fundador e
presidente da Maverick Entertainment Group, relata que
pressionou os grandes estúdios no início dos anos 1990
para que oferecessem mais “produtos urbanos”, do terror
ao gospel, porque esse tipo de filmes tinha grande
demanda. Hoje, por meio da Maverick, Schwab vasculha
“escolas de cinema, pequenas produtoras e cineastas
independentes” atrás de filmes.28 Um dos seus achados
foi Amir Valinia, diretor de Dream House (2006), que
conta a história de um casal de negros que descobre um
mistério por trás da nova casa que compraram, a qual se
revela inesperadamente assombrada. Valinia continua a
pressionar os limites da produção de filmes de baixo
orçamento e alta qualidade, sendo o primeiro a gravar
um clipe musical com iPhones para o rapper Paul Wall.29

O TERROR NEGRO SE TORNA ECOLÓGICO:


RECICLANDO VÁRIAS HISTÓRIAS DE TERROR
Schwab, da Maverick Entertainment, está certo ao dizer
que o mercado de vídeo “urbano” — filmes com
temáticas de dança até peças religiosas e rappers
caçadores de zumbis (por exemplo, o rapper Big Daddy
Kane em Noite infernal [2007]) — está prosperando.
“Filmes negros” de terror, em particular, estão
fornecendo centenas de títulos, entregando algo para
todo mundo, ainda que não sejam imunes a reciclagens
de temas populares do terror. As comunidades, locais
que deveriam ser protegidos da exploração, são
constantes nos “filmes negros” de terror. Por exemplo,
Ratos assassinos (2001) faz uso do tema, apresentando
os residentes de um cortiço em uma batalha contra o
senhorio inescrupuloso. Esse filme-de-rato, uma espécie
de Willard-do-gueto, é uma lição sobre a limpeza social
da comunidade e advoga pelos menos privilegiados. Dois
filmes de terror “com negros”, O duende 5 (2000) e O
duende perverso (2003), não ajudaram em nada a
imagem da periferia. Esses filmes de Duendes se unem a
outros, como O predador 2: a caçada continua (1990),
em que monstros invadem o espaço urbano para atacar
negros, ao mesmo tempo que exploram as periferias
como locais em que até o mal olha duas vezes para o
estado de negligência do lugar. Os dois filmes enviam a
mensagem danosa de que a única coisa a se fazer com
os habitantes do gueto é matá-los, pois eles já estão
destruindo suas casas, fumando maconha, vendendo
drogas e esperando ser, no máximo, rappers bandidos
armados, e desse modo prejudicando ainda mais suas
próprias comunidades. Os filmes tiveram a capacidade
de fazer os duendes parecerem os sensatos entre os
tolos. O cenário, unido aos temas do hip-hop, serviu para
reviver a série Duendes por meio do mercado direto-
para-DVD.
O filme This Evil One (2005) segue a linha de
Candyman (1992), revisitando “o bairro mais perigoso de
Chicago” com um monstro que rapta crianças para se
vingar de uma comunidade. No filme, uma comunidade
negra que está cansada de “pervertidos predando nosso
povo” é aterrorizada por um bicho-papão branco do ano
de 1896 que tem uma paixão — digna de Candyman —
por sequestrar crianças negras para reafirmar seu status
mítico. Bloodz vs. Wolvez (2006) pega emprestada a
guerra entre monstros de Anjos da noite (2003),
reformulando o conflito como uma batalha de negros
contra negros, uma guerra de territórios entre os
vampiros sofisticados, Bloodz, donos das instituições
financeiras e imobiliárias do centro da cidade, e os rudes
lobisomens, ou Wolvez, que controlam e aterrorizam os
guetos com assaltos. O filme Killjoy (2000), apresentando
um palhaço parecido com Michael Jackson, se apropria do
brega Palhaços assassinos do espaço sideral (1988), no
qual palhaços assassinos e caminhões de sorvete tomam
conta da tela.
Há também uma porção de filmes de narrativas
simples e de baixo orçamento em que monstros negros
atacam o bairro, sem uma mensagem significativa sobre
a violência que está sendo travada em suas ruas e
armazéns abandonados e negligenciados. O “filme
negro” de terror Holla é inovador, rejeitando o gueto
como cenário em favor de uma cabana rural. Aqui,
habitantes desafortunados se tornam vítimas de uma
mulher com uma faca de açougueiro que escapou de um
hospital psiquiátrico. O filme quase fracassou em se
concretizar, já que, como seu escritor e diretor, H.M.
Coakley, explica, “ninguém entendia o que estávamos
tentando fazer”. Como resultado disso, o orçamento do
filme, que já eram modestos 3 milhões, despencaram
para 10 mil antes que investidores aparecessem no
último minuto com um adicional de 140 mil — um valor
ainda escasso, levando em conta os padrões de produção
cinematográficos.30

AS DAMAS PRIMEIRO
“Filmes negros” de terror com frequência trazem consigo
mensagens sociopolíticas poderosas para comunidades
negras. Street Tales of Terror (2004) é uma antologia
premiada de terror que segue a linha de Contos
macabros (1995) ou Snoop Dogg’s Hood of Horror (1995),
porém sem o humor.31 Ele apresenta uma trilogia de
contos morais centrados em mulheres, como “A clínica”,
em que Jalissa (Nicole Ford) está contemplando o seu
segundo aborto. Ela é aterrorizada por uma criatura
sangrenta em seus sonhos, que, obviamente, acaba se
revelando como o seu primeiro feto abortado (na idade
que teria se estivesse vivo). Aqui, o filme termina com
Jalissa fazendo pré-natal, e seu feto está intacto. Talvez
“A clínica” seja uma mensagem pró-vida e
fundamentalista, ou talvez uma mensagem sobre manter
a comunidade negra intacta ao comparar crianças negras
com pureza, esperança e promessas para comunidades e
culturas negras. Sobchack elabora: “o bebê é
culturalmente visto como uma figura de doçura
pungente, desamparado, vulnerável e dependente”,
ainda não foi corrompido e ao mesmo tempo afirma a
criação de novas experiências sociais, encenando
histórias novas e promissoras.32 Fica evidente que “A
clínica”, como muito dos “filmes negros” de terror,
resiste ao impulso O bebê de Rosemary (1968), em que
“o útero [é] o novo cemitério”, já que a gravidez não é
tipicamente associada a algo monstruoso ou o
demoníaco.33 A antologia também conta com “A
vingança”, a história de uma mocinha bem-comportada,
Jessica (Tenia Yarbrough), que é provocada e sofre
bullying antes de ser afogada em uma piscina por três de
seus colegas de sala. No seu vigésimo aniversário, o
fantasma de Jessica retorna, então, ela e sua mãe, Mama
(Shirley Whitmore), conseguem se vingar dos jovens que
a mataram. No conto, temos a mãe negra monstruosa
retratada, mas o público é convidado a entender sua
loucura, transformada em maldade, pois ela é consumida
por uma dor insuportável. É explicado que Jessica foi
morta no mesmo dia em que Mama enterrou seu jovem
sobrinho. Por isso, Mama luta contra a inocência e a
possibilidade de futuro perdidas. Por fim, em “Noite de
formatura”, Bernice (Mykei Gray), uma estudante
universitária puritana, é estuprada por um atleta popular
em uma festa, e nenhum de seus colegas universitários
intervêm. No fim das contas, ela descobre que está
grávida e é expulsa da escola por causa da quebra de
conduta (culpabilização da vítima). Bernice então se
enforca e, como fantasma, executa sua vingança
sangrenta. Aqui se apresenta a dificuldade que vítimas
de estupro enfrentam quando tentam denunciar o crime,
bem como o que acontece quando uma vítima “menos
importante” luta contra um criminoso “famoso”.
Em “filmes negros” de terror, mulheres não são meras
vítimas. Em vez disso, continuam a prosperar como
heroínas conquistadoras, capazes de batalhar contra
zumbis, ou melhor: “zumbiz”, como Josephine (Jenicia
Garcia) faz em Zombiez (2005), lutando contra monstros
canibais e colegas de trabalho machistas. Josephine nos
faz lembrar da força de Sugar em A vingança dos mortos
(1974), da engenhosidade de Lisa em Os gritos de
Blácula (1973) e de Vovó em Def by Temptation (1990)
enquanto ela luta contra o mal. De forma louvável, filmes
de terror “com negros” também incluem mulheres
negras. Alien vs. predador (2004) apresenta um
dramático afastamento de antigos filmes da série
Predador, que punham a violência nas selvas da África do
Sul ou nos guetos de Los Angeles, com homens brancos
salvadores. Em Alien vs. predador, a batalha é
transportada para o Oceano Antártico, dando a Alexa
Woods (Sanaa Lathan), uma arqueóloga/cientista
habilmente treinada e intelectualmente sofisticada, a
oportunidade de salvar o mundo da ameaça alienígena.
De forma notável, Alexa se junta a um predador (“o
inimigo do meu inimigo é meu amigo”). Os dois formam
uma equipe impressionante, com Alexa até mesmo
permitindo que o predador a marque.34 A vampira
Akasha, do filme de terror “com negros” A rainha dos
condenados (2002), retratada pela cantora de hip-hop
Aaliyah, não é a heroína, mas o interesse amoroso do
vampiro branco Lestat (que, estranhamente, é o
vocalista de uma banda de rock).
Por contraste, os “filmes negros” de terror
praticamente idênticos Cryptz (2002) e Vampz (2004)
chegam a compartilhar o ator Rick Irvin como uma vítima
de ataque vampiro, providenciando, infelizmente,
imagens misóginas de abusos contra mulheres.
Certamente o terror não é o gênero certo para carregar a
bandeira do chamado politicamente correto; entretanto,
esses filmes prejudicam bastante a compreensão da
feminilidade negra. Ambos os filmes convidam,
primariamente, olhares masculinos objetificantes na
direção de — no caso de Criptz — vampiras strippers que
fazem pole dance com os seios à mostra por um tempo
excessivamente longo antes de darem seguimento ao
que interessa, que é sugar o sangue das vítimas. A
sedução de Drácula é negada às vampiras, pois suas
vítimas menosprezam mulheres e fazem comentários
machistas até mesmo enquanto elas os enviam para a
(des)morte.
No fim, as mulheres são derrotadas, com suas roupas
de stripper providenciando uma bela visão das estacas,
por um grupo de homens que empalaram seus seios para
atingir os corações. Vampz trabalha ainda mais essa
visão de mulheres como objetos sexuais, com cenas das
vampiras se beijando e transando umas com as outras.
Entretanto, o objetivo não foi providenciar um momento
feminista, mas apenas exibir uma lésbica com uma
performance estereotípica de feminilidade para
apimentar o filme. Nas suas produções, os homens se
gabam de suas proezas sexuais, ainda mais nas cenas de
beijo em que as mulheres os encaram de maneira
provocativa enquanto se agarram. Não há dúvidas de
que essas mulheres vão morrer, já que usurpam e
atacam o poder masculino ao se envolverem em
conquistas sexuais com outras mulheres.35 Essas cenas
falham ao representar a lesbianidade como uma
performance feita para o público masculino — tanto para
aqueles que assistem à ação dentro dos covis
vampirescos quanto para aqueles que assistem na tela.
FIGURA C2 ALEXA WOODS E O MONSTRO ALIEN EM ALIEN VS. PREDADOR
20th Century-Fox/Photofest
ALGO NOVO
O gênero de terror não é inteiramente derivativo. Kracker
Jack’d (2003) é um filme cômico de assassino em que
estudantes negros e grosseiros agridem de forma
selvagem um estudante branco que se apropriou
completamente da cultura negra do hip-hop, ao ponto de
chamar os negros de nigger.* Esse “filme negro” de
terror deixa claro que apenas negros podem usar a
palavra nigger, o que eles fazem com frequência. No
filme, quando os estudantes começam a morrer, o
“branquelo” vira um suspeito. Entretanto, há uma
reviravolta no filme, e descobrimos que o assassino é, na
verdade, LaShawn (Mark Anthony Riveria), um estudante
negro inteligente que recebeu de forma pejorativa o
apelido de Carlton (o personagem nerd Carlton, da série
Um maluco no pedaço).36 LaShawn, ao explicar o motivo
de ter cometido os assassinatos, responde de forma
agressiva: “Um irmão não pode ter a pele mais clara e
ser educado sem que um filho da puta cheio de joias
brilhantes, saído do gueto de West Side, que fica
agarrando o pinto enquanto fala aquelas merdas sobre
pretos com dinheiro”.
Três filmes de terror igualmente inovadores
compartilham o tema médico. No “filme negro” de terror
Crazy as Hell (2002), Man (Eriq La-Salle), um misterioso
paciente de hospital psiquiátrico seguro de si e
charmoso, acredita ser Satã, e, com a chegada de um
médico metido, o dr. Ty Adams (Michael Beach), Man
começa a ensiná-lo uma coisa ou outra sobre humildade.
Porém, Man é um trapaceiro, um demônio da vida real,
forçando o dr. Adams a confrontar seus fracassos, ou o
que Fulmer descreve como “os limites da moralidade”.37
Uma dessas falhas inclui a insistência obstinada de que
ele é um médico infalí-vel.38 Pouco disposto a ouvir, o dr.
Adams se envolve com o suicídio de um paciente e
fracassa em aceitar a morte de sua jovem filha, que ele
poderia ter impedido. O dr. Adams é confrontado por
seus demônios, incluindo Satã, que assume sua forma
verdadeira: um homem branco, Delazo (Ronny Cox), que
se apresenta como o bondoso administrador do hospital.
É Delazo quem dá as boas-vindas ao dr. Adams no
inferno. O filme de terror “com negros”, Sublime (2007),
apresenta um homem branco, George (Tom Cavanaugh),
que vai ao hospital para um procedimento de rotina, mas
sai da anestesia semicomatoso, tendo sofrido várias
amputações. A enfermeira, uma mulher branca, o seduz,
testando a fidelidade dele para com a esposa. Seu
cuidador, Mandingo (Lawrence Hilton-Jacobs), é um
homem negro que figura proeminentemente na vida de
George no hospital. Mandingo é um sádico que
atormenta George, sobe em cima dele na cama, o
provoca e xinga antes de usar tesouras de poda para
cortar o corpo já danificado de George. Sublime fala
sobre estereótipos e medos, e o homem descobre que
está preso em sua mente inconsciente, que manifestou
seus machismos e racismos latentes na forma de figuras
estereotipadas que o atormentam. Finalmente, o
premiado O último paciente (2005) apresenta um elenco
inovador, com o ator septuagenário Bill Cobbs no papel
de dr. Green, um médico/pesquisador aposentado do
interior que encontrou a fonte da juventude no veneno
da cobra cascavel e ervas chinesas.39 Exposto como
extraordinariamente poderoso depois de tirar um trator
de cima de uma criança que se envolveu em um
acidente, o segredo de Green se torna alvo de ladrões.
Os bandidos morrem na fazenda de Green por meio das
mãos ocultas, porém igualmente poderosas, da esposa
de Green, que é parcialmente transfigurada em um
monstro assassino por causa do veneno da cobra.

ZUMBIS PARA OBAMA: TERROR NEGRO PARA


SEMPRE
Eu nunca poderia ser Barackula.
— Barackula: The Musical40

Um homem saído de uma terra “exótica” é em parte


encantador e em parte misteriosamente poderoso. Ele é
um hipnotizador que transforma pessoas em autômatos
— enganando até mesmo os mais espertos e fortes para
que façam as vontades dele. Em Zumbi branco (1932), a
ameaça foi Murder Legendre, que, contaminado pelo
Haiti, explorou seus poderes vodu ao criar uma legião de
trabalhadores descerebrados que nunca se cansam para
que labutem por ele. Hoje, parece que é Barack Obama,
oriundo do exótico Havaí, ou da Indonésia, ou,
genericamente, da África, quem, de acordo com Klen e
Elliott em The Manchurian President: Barack Obama’s
Ties to Communists, Socialists and Other Anti-American
Extremists, é “eloquente, cativante e carismático”, “o
homem mais poderoso do mundo”, e o mais importante:
“ELE NÃO É O QUE PARECE”.41 Supostamente, Obama possui
um poder sedutor sobre o produto mais precioso dos
Estados Unidos, a geração iPod. Jason Mattera, em seu
livro Obama Zombies: How the Liberal Machine
Brainwashed My Generation, retrata jovens adultos
abaixo dos trinta anos como decepções monstruosas —
zumbis — para a causa da liberdade norte-americana,
pois eles se esforçam para propagar a mensagem de
esperança e mudança de Obama como se isso fosse
fazer iPods caírem do céu.42 Obama e seus gerentes de
campanha, principalmente sua equipe de coordenação
digital (por exemplo, aqueles que providenciam materiais
para o Facebook, MySpace, Twitter e YouTube), são, em
essência, os equivalentes do século XXI de Murder
Legendre, pois continuam a enganar a massa da
juventude, fazendo com que os jovens se concentrem
apenas no brilho de tudo, como se Obama fosse um
hipnotizador. Klein, Elliot e Mattera estão longe de ser os
primeiros a criar uma conexão entre Obama e o terror.
Há, inclusive, uma assustadora máscara de halloween de
Obama versão vampiro.43 Adicione isso à imagem
manipulada digitalmente de Firas Alkhateeb, uma foto de
Obama como o Coringa de Batman: o cavaleiro das
trevas (2008) que foi amplamente distribuída. O
cartunista do New York Post, Sean Delonas, criou até
mesmo uma ligação entre Obama e um chimpanzé
furioso que foi morto a tiros, estilo King Kong, pela polícia
de Connecticut. Os policiais pairam sobre o corpo
ensanguentado do macaco com duas balas no peito e
concluem: “Eles terão de encontrar outra pessoa para
escrever o próximo plano de estímulo econômico”.44 O
tema seguinte do terror, que já foi apresentado ao
público graças aos gêneros de ficção científica e ação, é
o do presidente negro na liderança,* enquanto os Estados
Unidos (e, portanto, o mundo) enfrentam a aniquilação,
como os seguintes filmes já fizeram: O quinto elemento
(1997), Impacto profundo (1998), o seriado 24 horas
(Fox, 2001-2010) e 2012 (2009). Felizmente, sempre há
um herói branco (com Bruce Willis salvando o mundo
duas vezes para o seu presidente) vindo para o resgate.
Apenas o John F. Kennedy de Bubba Ho-Tep (2002), no
corpo de um homem negro (Ossie Davis), não permitiu
que alienígenas, meteoros, terroristas ou um apocalipse
Maia prejudicassem a estabilidade do mundo.
VETERANOS DO TERROR FALAM! MIGUEL
NUNEZ, TERRY ALEXANDER, KEN FOREE
Três estrelas do terror, Miguel Nunez (A volta dos mortos-
vivos [1985]), Terry Alexander (Dia dos mortos [1985]), e
Ken Foree (Despertar dos mortos [1978]) (de forma
independente) usaram Obama como inspiração até
mesmo no gênero de terror.45 Nunez acredita que o
terror, especificamente os “filmes negros” de terror, está
apenas começando a se destacar entre o público negro.
O desafio do terror está em competir de forma
competente com filmes de comédia e seriados de humor
(mais amigáveis para o público em geral), que, ele
acredita, são mais populares entre o público negro em
particular. Entretanto, Nunez vê as oportunidades para o
gênero se diversificando, principalmente agora que o
público jovem está mais acostumado a “ver uns aos
outros”, por exemplo, misturando-se em eventos de
terror predominantemente (por enquanto) brancos, como
festivais de filmes e convenções. Essa possibilidade de
uma melhor comunicação entre raças é inspirada, em
grande parte, pela eleição de Obama, que deu esperança
a Nunez e revelou que “tudo é possível” para a
participação negra em áreas que parecem limitadas ou
fora dos limites. De forma similar, Alexander identificou
que o terror e a comédia competem pela atenção da
audiência negra. No entanto, argumenta que George
Romero nivelou o meio de campo do terror entre o
público negro — sobre o qual pouco se sabe — ao “abrir
as portas para personagens negros”. Alexander está
ciente de quem veio primeiro, como a novela As the
World Turns, que apresentou a primeira família negra do
gênero. Desde Romero, o gênero tem estado aberto para
a participação de negros, com rappers-atores liderando o
caminho ao aumentar o alcance do gênero. Para
Alexander, a evolução do terror trouxe mudanças
significativas, superando o antigo “melhor amigo negro”,
em que um personagem secundário negro é morto e
seus colegas brancos buscam vingança enquanto salvam
o mundo. Novamente, aqui Obama se torna importante,
já que sua presença representa esperança — lembrando
a atores e cineastas que “qualquer um de nós pode ser
presidente”, tanto metaforicamente quanto, como a
eleição provou, na vida real. De acordo com S. Craig
Watkins, em seu livro Representing: Hip Hop Culture and
the Production of Black Cinema, “grupos dominantes
lutam vigorosamente para manter o controle das
mesmas esferas políticas e ideológicas pelas quais as
populações menos privilegiadas lutam”; dessa forma, a
eleição de Obama deve desafiar criadores de imagens a
confrontar as realidades do século XXI, em que negros
podem ser vistos habitando uma variedade de posições
sociais e ideológicas.46 Assim como Alexander, Foree
considera que os filmes de Romero “pavimentaram a
estrada para mais atores negros no terror”, e, como
Nunez, vê o universo dos fãs negros de terror —
participação em convenções de terror, por exemplo —
como um lugar onde a inclusão e a participação podem
melhorar. Entretanto, embora os negros ainda não
tenham abraçado completamente as comunidades de fãs
do terror, de acordo com Foree eles entraram de cabeça
na contribuição para o gênero, encontrando
oportunidades, “inspiração e dinheiro por meio do
mercado de vídeos caseiros”. Aqui, novamente, de
acordo com Foree, Obama é um símbolo, oferecendo a
mensagem de que Hollywood… ou qualquer um… pode
aprender com “Inclusão! INCLUSÃO!!!”.47

CONTOS NEGROS DE TERROR: O FIM


O terror continua sendo um estudo sobre racismo,
exoticismo e neocolonialismo para as pessoas negras,
que são excluídas das imagens ocidentais de iluminação
e ao mesmo tempo subordinadas a um sistema primitivo
de imagens — políticas, econômicas, culturais, religiosas
e sociais. Filmes de terror saíram da imaginação de um
quadro diversificado de criadores de imagens. E
evidentemente é difícil criar representações que se
libertem da dieta constante de representações limitadas
com as quais os criadores de imagem foram alimentados.
O terror continua a propagar um entendimento das
relações raciais entre “nós” e “eles”, bem como “nós
contra eles”, em que a comunicação intercultural é
exibida como algo difícil de se negociar. Como resultado,
o terror é, muitas vezes, excessivamente segregado ou
fala apenas de “nós”. O terror não negro tem sido muito
difícil nesse ponto, excluindo negros de forma
desconfortável, assim como todo tipo de diversidade de
gênero, sexual e racial. A resposta para essa exclusão
tem sido a produção de ainda mais filmes de terror sobre
“nós”. O terror negro, por exemplo, nasceu, em parte,
por causa da exclusão. O terror também adotou a tática
de escalar atores sem levar (muito) a cor em
consideração, reunindo uma equipe multicultural de
jovens vítimas do terror, “um de cada cor”. Abismo do
medo (2005) e Drácula 2000 (2000) pediram que a
audiência contemplasse, embora sem se importar muito
com isso, raça ou investimentos raciais culturais. Tal
apagamento também é uma abordagem não satisfatória,
pelo menos para aqueles que não enxergam
invisibilidade cultural e identitária como uma solução
viável para a inclusão. Ainda assim, a atual narrativa
sobre raça gira em torno da insustentabilidade de raça e
de uma era “pós-racial”. Declarações de que “não existe
raça” (Gilroy) são reforçadas por reinvindicações da
mesmice interna, diferenças externas superficiais, e o
árduo trabalho de tentar manter o que Louis chama de
“raciologia” em um mundo que também abraça o
antirracismo.48 De qualquer forma, “filmes negros” de
terror e terror sem cor não estão empatados. É válido dar
continuidade a uma cuidadosa consideração a respeito
das identidades raciais privilegiadas e práticas culturais,
estilos e estéticas codificados racialmente enquanto
desmanchamos as hierarquias raciais. De forma
significativa, produções racialmente codificadas podem
servir a um público-alvo sem impedir outro público de
compartilhar a experiência.49
É defendido aqui que o “terror negro” (ou “terror gay”,
“terror latino”, “terror religioso”, “terror urbano” etc.)
tem um papel importante no gênero. Fora daquilo que é
especificamente cultural, surgem algumas das visões
mais interessantes a respeito de temas comuns, além de
inovações — os cineastas Oscar Micheaux e Eloyce Gist
são ótimos exemplos desse tipo de contribuição. Contos
morais são comuns no terror; as viradas espirituais de
alguns contos, como vemos em Go Down, Death (1944) e
Def by Temptation (1990), são inovadoras. Nollywood (A
“Hollywood nigeriana”), com seus filmes de terror
baseados nos aspectos ocultos e sobrenaturais da
religião (exemplo, possessão demoníaca) misturados
com doses saudáveis de práticas religiosas palpáveis,
cantorias, efeitos especiais incríveis e mensagens a
respeito de ser uma pessoa alienada de sua própria
comunidade, está começando a se unir ao terror norte-
americano negro — provavelmente, uma interessante
explosão de contos morais está no horizonte. Negros
trazem interpretações únicas de vampiros e bichos-
papões como símbolos do racismo (como o Blácula e
Candyman), e atrelaram o lobisomem, controlando seus
ciclos de lua e de mudança, enquanto transformam a
criatura em um guerreiro engajado com a luta de classe
(como em Bloodz vs. Wolvez). A Garota Final, aniquilando
seu irmão mais velho e insano ou acabando com aliens
de sangue ácido, revolucionou o terror. Entretanto, a
Mulher Durona negra, cuja luta não termina com a morte
do monstro, permanece como um importante símbolo
feminista e político. Negros até mesmo se provam
zumbis únicos, recusando-se a servir a uma fantasia de
neo-escravidão. Em quase todos os filmes de terror, o
zumbi pega um policial, como se estivesse se vingando
da morte de Ben (A noite dos mortos-vivos).
No passado, os negros foram a fonte de humor em
comédias de terror, colocando em exibição seus incríveis
talentos de serem ao mesmo tempo hilários e
assustados. Infelizmente, essas performances se deram
em detrimento da humanidade de pessoas negras. Hoje,
“filmes negros” de terror garantem que negros não
precisam mais ser agraciados com uma “bondade divina
para combater o racismo […] automaticamente
direcionado a um personagem negro em tela”. O negro
fiel, santo ou comicamente inofensivo não precisa ser o
equivalente de um personagem branco “normal”.50 Todo
mundo em pânico (2001), de Wayans, que arrecadou
incríveis 157.019.771 milhões de dólares em vídeos
caseiros e 278.019.771 milhões mundialmente, trouxe o
humor de volta para o terror.51 O filme e suas sequências
incluem paródias do tratamento clichê dado aos negros
no terror, expondo essas práticas. Ao voltar a atenção
para si mesmos, os negros se esforçaram para subverter
tratamentos do tipo por meio de suas próprias
comédias.52
Reunida, a história dos negros no terror é uma história
convincente e um exame contemporâneo do
entendimento a respeito das pessoas negras, mostrada
por meio de uma forma de cultura popular ao longo do
último século. Há várias lições sobre estereótipo e
opressão aqui — particularmente no que diz respeito ao
continente africano, nativos e vodu. No entanto, trata-se
também de uma aula de subversão — sim, os servos
ridicularizaram seu mestre branco (e daí se ele era
alemão?) em A vingança dos zumbis (1943). Essa história
também revela uma consciência e resistência crescentes,
com os atores Clarence Muse e Spencer Williams dizendo
“Chega” para os estereótipos hollywoodianos.53 Filmes
como A chave mestra (2005) e até mesmo A princesa e o
sapo (2009) da Disney continuam a associar o vodu (e
outras religiões negras) com maldade. Desde 1934, com
Drums o’ Voodoo, e ao longo das décadas com Os gritos
de Blácula (1973) e Contos macabros (1995), a luta para
recuperar o vodu esteve sempre presente. Os guetos ou
quebradas permanecem como uma presença
contraditória no terror, ambos celebrados e insultados;
apesar disso, no entanto, pessoas negras estão sendo
cada vez mais representadas fora de seus confins.
Embora os negros tenham conseguido sair dos guetos,
indo para o subúrbio ou para a área rural, por exemplo,
seus encontros com lugares do além, como realidades e
espaços alternativos, têm sido menos frequentes e, como
Janell Hobson descreveria, “digitalmente primitivos”.
Esses novos primitivos ainda não são totalmente capazes
— ou não estão dispostos — a explorar a tecnologia de
Parker (Yaphet Kotto) de Alien: o oitavo passageiro (1979)
ou Humvee (Tiny Lister) de Drácula 3000: escuridão
infinita (2004), viajantes espaciais que simplesmente
desejam bater em algo, até Lornette de Estranhos
prazeres (1995), um piloto de nave espacial tecnófobo.54
E trata-se também de uma consideração a respeito
das dificuldades financeiras que continuam
atormentando os cineastas negros. Charles Burnett
lamenta as práticas da indústria que falham em
promover filmes de negros, como estúdios que compram
um filme da Sundance apenas para engavetá-lo, ou que
não cumprem suas promessas falsas de divulgação,
falhando até mesmo em pagar cinquenta dólares em
publicidade nos jornais.55 De fato, o diretor H.M. Coakley
exibiu seu filme Holla (2006) de graça por oito semanas
até que a produção fosse alocada em dois cinemas em
Atlanta e Houston por uma noite no dia 1° de dezembro
de 2006. Depois disso, a distribuidora do filme, Lions
Gate, divulgou Holla como um filme em DVD.56 Por fim,
uma grande parte da história do terror teve a ver com a
exclusão dos negros do gênero. A negritude foi
invisibilizada com brancos usando pintura blackface, por
meio de uma desvalorização cultural (sem resposta
contrária) e uma exclusão total. Apesar disso, o ponto a
se levar em conta é que “filmes negros” de terror hoje
em dia são muito progressistas, enchendo o gênero com
tudo, desde exterminadores intelectuais e (úteis)
feiticeiras até rappers canibais. Já foi dito antes e é digno
dizer isso novamente: estamos de volta.
* Em tradução livre: Entrei na casa, o Fresh Prince malvadão/ Mas o
Freddy acabou com a bagunça bem rápido/ Ele me agarrou pelo
pescoço e falou: “Olha só o que a gente vai fazer. Temos muito
trabalho aqui, eu e você. Eu e você vamos chamar as almas dos
seus amigos. Você pega o corpo e eu pego o cérebro” [NT]
* Em tradução livre: Eu não quero contar vantagem/ Foda-se Jeffery
Dahmer, ele é um veadinho/Eu carrego as bolas e os intestinos de
crioulos numa bolsa e arrasto até a quebrada [NT]
* Muitos termos que são atualmente usados por grupos minorizados
foram reivindicações que buscam ressignificar termos ofensivos. Os
exemplos mais conhecidos estão ligados aos LGBTQIA+ como
“viado” ou “sapatão” que devem ser usados apenas por quem é gay
ou lésbica, se assim quiserem. O termo nigger é pensado por uma
parcela negra estadunidense neste sentido, o que é bastante
perceptível no rap e hip-hop. Outra forma de analisar o uso desta
palavra é olhando a raiz colonial pejorativa que se estendeu pelo
século XX cada vez mais marcada, a ponto de ser amenizada como
um termo interditado, “a palavra com n” (“the n word”), em especial,
para pessoas não-negras; por remeter a uma história de violência
(sempre presente nas experiências de racismo diário). Para muitas
pessoas, o termo deveria ser retirado do léxico definitivamente. [NE]
* Em 1926, Monteiro Lobato publicou O Presidente Negro, uma ficção
científica que pretendia usar como cartão de visitas no mercado
literário estadunidense. Através das lentes do ‘porviroscópio’,
aparelho capaz de prever o futuro, Lobato leva os leitores para 2228,
ano em que a divisão do eleitorado branco entre homens e mulheres
faz Jim Roy, um homem negro, se eleger presidente dos Estados
Unidos. Insatisfeitos com o rumo dos acontecimentos, no entanto, os
brancos, agora unidos, elaboram um plano definitivo para não serem
governados por Roy. [NE]
HORROR
NOIRE
NOTAS

PREFÁCIO
1. Worland, Rick. The Horror Film: An Introduction. Malden, MA:
Blackwell, 2007. xi. Impresso.
2. Wordland (xi).
3. Ele gerencia um curso de efeitos visuais, “Tom Savini’s Special
Make-up Effects Program”, e um de cinema digital, “Tom Savini’s
Digital Film Production Program”.
4. White Boyz. Dir.: Marc Levin. Atuação: Danny Hoch. Fox Search
Light, 2004. DVD.
5. Heffernan, Kevin. Ghouls, Gimmicks, and Gold: Horror Films and
the American Movie Business, 1953-1968. Durham, NC: Duke
University Press, 2004. 204. Impresso.
6. Johnson, Ben. “Some Say Police Dog Is Racist”. New Pittsburgh
Courier, 14 maio 2003: A1. Impresso.
7. Machosky, Michael. “Seeking the Paranormal”. Pittsburgh Tribune
Review, 18 out. 2005. Pittsburgh Tribune. Web. 2 ago. 2010.
https://archive.triblive.com/news/seeking-the-paranormal-2/.
8. Crane, Jonathan. Terror and Everyday Life. Thousand Oaks, CA:
Sage Publications, 1994. Impresso.
9. Hutchings, Peter. The Horror Film. Londres: Pearson, 2004. 83.
Impresso.

INTRODUÇÃO
1. Kozol, Wendy. “Relocating Citzenship in Photographs of Japanese
Americans during World War II”. Haunting Violations: Feminist
Criticism and the Crisis of the ‘Real’. Eds. Wendy Hesford e Wendy
Kozol. Champaign: University of Illinois Press, 2001. 235.
Impresso.
2. Retirado do artigo Window Dressing on the Set: Women and
Minorities. Comissão dos Direitos Civis, Washington, D.C.
3. www.noiredigerati.com.
4. Penzler, Otto. Black Noir: Mystery, Crime, and Suspense Fiction
by African-American Writers. Nova York: Pegasus, 2009. Impresso.
5. www.noiredigerati.com.
6. Reid, Mark A. Black Lenses, Black Voices: African American Film
Now. Lanham, MD: Rowman & Littlefield, 2005. 61. Impresso.
7. King, Stephen. “Acceptance Speech: The 2003 National Book
Award for Distinguished Contribution to American Letters”. On
Writing Horror. Ed. Mort Castle. Edição Revisada. Cincinnati, OH:
Writer’s Digest Books, 2007. 10. Impresso.
8. Hutchings, Peter. The Horror Film. Londres: Pearson, 2004. 115.
Impresso.
9. Clover, Carol J. Men, Women, and Chainsaws: Gender in the
Modern Horror Film. Princeton, NJ: Princeton University Press,
1992. 229. Impresso.
10. Crane, Jonathan. Terror and Everyday Life. Thousand Oaks, CA:
Sage Publications, 1994. 23. Impresso.
11. Brown, Sterling A. The Negro in American Fiction. Nova York:
Atheneum, 1933/1972. Impresso.
12. Clark, Cedric. “Television and Social Controls: Some
Observations on the Portrayals of Ethnic Minorities”. Television
Quarterly 8 (1969): 18-22. Impresso.
13. Nelson, Angela. “From Beulah to the Fresh Prince of Bel-Air: A
Brief History of Black Stereotypes in Television Comedy”.
Manuscrito não publicado, 1991.
14. Coleman, Robin Means. African American Viewers and the Black
Situation Comedy: Situating Racial Humor. Nova York: Garland,
2000. Impresso.
15. Hutchings (7, 9).
16. Vares, Tina. “Framing ‘Killer Women’ in Films: Audience Use of
Genre”. Feminist Media Studies 2.2 (2002): 213. Impresso.
17. Aristóteles (350 BCE). [Trad. S. H. Butcher.] Poetics.
18. Gateward, Frances. “Daywalkin’ Night Stalkin’ Bloodsuckas:
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20. Leonard, David J. Screens Fade to Black: Contemporary African
American Cinema. Westport, CT: Praeger, 2006. 3. Impresso.
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Gender and the Horror Film. Ed. Barry Keith Grant. Austin:
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Cinema, Narration and the African-American Aesthetic Tradition.
Trenton, NJ: Africa World Press, Inc., 2000. 119, 121. Impresso.
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Family Horror”. The Dread of Difference: Gender and the Horror
Film. Ed. Barry Keith Grant. Austin: University of Texas Press,
1996. 173. Impresso.
33. Guerrero, Edward. Framing Blackness: The African American
Image in Film. Filadélfia, PA: Temple University Press, 1993.
Impresso.
34. Grant (8).
35. Du Bois, W. E. B. Darkwater: Voices From Within the Veil. Nova
York: Harcourt, Brace, and Howe, 1920. VII. Impresso.
36. Du Bois, W. E. B. The Souls of Black Folks. Nova York: NAL
Penguin, 1903/1969. 45. Impresso.
37. Cripps, Thomas. Slow Fade to Black: The Negro in American Film,
1900-1942. Nova York: Oxford University Press, 1993. Impresso.
38. Ver: Hill Collins, Patricia. Black Feminist Thought. Nova York:
Routledge, 2009. Impresso; hooks, bell. Reel to Real: Race, Sex,
and Class at the Movies. Nova York: Routledge, 1996. Impresso.
39. Clover, Carol J. “Her Body, Himself: Gender in the Slasher Film”.
The Dread of Difference: Gender and the Horror Film. Ed. Barry
Keith Grant. Austin: University of Texas Press, 1996. Impresso.
40. Pinedo.
41. Zimmerman, Bonnie. “Daughters of Darkness: The Lesbian
Vampire on Film”. The Dread of Difference: Gender and the Horror
Film. Ed. Barry Keith Grant. Austin: University of Texas Press,
1996. 382. Impresso.
42. Ver: Winokur, Mark. “Technologies of Race: Special Effects,
Fetish, Film and the Fifteenth Century”. Genders OnLine Journal
40 (2004). Web. 20 jan. 2006.
www.genders.org/g40/g40_winokur.html.

1 O NASCIMENTO DO BICHO-PAPÃO NEGRO:


PRÉ-1930
1. Lively, Adam. Masks: Blackness, Race, and the Imagination. Nova
York: Oxford University Press, 1998. 14. Impresso.
2. Negros e mulheres têm sido amplamente excluídos da história
da invenção do cinema e seu desenvolvimento.
3. Jones, Alan. The Rough Guide to Horror Movies. Londres: Rough
Guides, 2005. 13. Impresso.
4. A tecnologia do zootropo movia imagens estáticas de uma ação,
organizadas sequencialmente, a uma velocidade tão rápida que
as imagens pareciam se mover. Por exemplo, fotos de um cavalo
galopante poderiam ser giradas a tal velocidade que o cavalo nas
imagens pareceria estar se movendo. Uma “lanterna mágica” foi
a antecessora do projetor moderno.
5. A Warner Bros. Lançou o filme Don Juan com uma trilha sonora
musical. No entanto, em 1894, A WKL Dickson, com a Edison
Manufacturing Company, tentou sincronizar o som. Em um filme
experimental e não comercial, Dickson é visto e ouvido tocando
violino durante alguns segundos enquanto dois homens dançam
ao som de sua música. Edison: The Invention of the Movies. Disco
2. Prod.: Brent Wood. Kino on Video, 2005. DVD.
6. O cantor de jazz (1928) foi o grande avanço dos filmes “falados”
nos Estados Unidos. Era um filme mudo, mas também incluía
alguns cantos e diálogos. Também contou com brancos usando
pintura blackface.
7. A linguagem do “filme de terror” ainda não fazia parte do léxico
norte-americano. Isso não aconteceria até a década de 1930, com
os filmes da Universal Studios, como Drácula. Em vez disso, os
filmes de terror eram descritos como “arrepiantes”, “chocantes”,
“misteriosos” e “assustadores”. Mas esses adjetivos anunciavam
uma resposta emocional, não criavam uma associação de gênero.
8. Noble, Peter. The Negro in Films. Nova York: Arno Press & The
New York Times, 1970. 27. Impresso.
9. Butters, Jr., Gerald R. Black Manhood on the Silent Screen.
Lawrence: University of Kansas Press, 2002. 34. Impresso.
10. Butters (20).
11. Butters (20).
12. Jones, G. William. Black Cinema Treasures: Lost and Found.
Denton: University of North Texas Press, 1991. 14-15. Impresso.
13. Butters (32).
14. Musser, Charles. Before the Nickelodeon: Edwin S. Porter and the
Edison Manufacturing Company. Berkeley: University of California
Press, 1991. 530. Impresso.
15. Butters (22).
16. Richards, Larry. African American Films through 1959: A
Comprehensive, Illustrated Filmography. Jefferson, NC: McFarland
& Company, Inc. Publishers, 1998. 90. Impresso.
17. Cripps, Thomas. Slow Fade to Black: The Negro in American Film,
1900-1942. Nova York: Oxford University Press, 1993. 135.
Impresso.
18. Butters (31).
19. Stewart, Jacqueline Najuma. Migrating to the Movies: Cinema
and Black Urban Modernity. Berkeley: University of California
Press, 2005. Ver 4-43. Impresso.
20. Citado por Richards, Larry (177).
21. Leab, Daniel J. From Sambo to Superspade: The Black
Experience in Motion Pictures. Boston, MA: Houghton Mifflin
Company, 1975. 13. Impresso.
22. Fanon, Frantz. Black Skin, White Masks. Londres: Pluto Press,
1986. 93. Impresso.
23. Leab (From Sambo 26).
24. Robinson, Cedric J. Forgeries of Memory & Meaning: Blacks & the
Regimes of Race in American Theater & Film before World War II.
Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2007. 108.
Impresso.
25. Snead, James. White Screens, Black Images: Hollywood from the
Dark Side. Nova York: Routledge, 1994. 39. Impresso.
26. Guerrero, Edward. Framing Blackness: The African American
Image in Film. Filadélfia, PA: Temple University Press, 1993. 17.
Impresso.
27. Butters (71, ênfase nossa).
28. Carter, Everett. “Cultural History Written with Lightening: The
Significance of the Birth of a Nation (1915)”. Hollywood as
Historian: American Film in a Cultural Context. Ed. Peter C. Rollins.
Lexington: University of Kentucky Press, 1998. 304. Impresso.
29. Bogle, Donald. Toms, Coons, Mulattoes, Mammies, & Bucks.
Nova York: The Continuum Publishing Company, 1993. 13-14.
Impresso.
30. Bogle (Toms, Coons 13-14).
31. Guerrero (Framing Blackness 13).
32. Snead (41).
33. Carter (vii).
34. Cripps, Thomas. Black Film as Genre. Bloomington: Indiana
University Press, 1978. 22. Impresso.
35. Noble (43).
36. Cripps (Slow Fade 64).
37. Clover, Carol J. Men, Women, and Chainsaws: Gender in the
Modern Horror Film. Princeton, NJ: Princeton University Press,
1992. 34. Impresso.
38. O Frankenstein de 1931 do estúdio Universal é considerado um
clássico seminal. Um curta mais antigo, de 1910, com duração de
dezesseis minutos e dirigido por J. Searle Dawley para os Edison
Studios, precede esse trabalho e pode ser a primeira adaptação
cinematográfica do romance Frankenstein, de Mary Shelley
(1818).
39. Crane, Jonathan. Terror and Everyday Life. Thousand Oaks, CA:
Sage Publications, 1994. 91. Impresso.
40. Crane (72-73).
41. Pinedo, Isabel Cristina. Recreational Terror: Women and the
Pleasure of Horror Film Viewing. Albany, Nova York: SUNY Press,
1997. 54. Impresso.
42. Pinedo (55).
43. Butters (73).
44. Williams, Linda. “When the Woman Looks”. The Dread of
Difference: Gender and the Horror Film. Ed. Barry Keith Grant.
Austin: University of Texas Press, 1996. 20. Impresso.
45. Goldberg, D. J. Discontented America: The United States in the
1920s. Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press, 1999. 117.
Impresso.
46. Southern Poverty Law Center. 2010. Southern Poverty Law
Center. Web. 8 jun. 2009. www.splcenter.org. Ver também: Stokes,
M. D. W. Griffith’s the Birth of a Nation: A History of the most
Controversial Film of All Time. Nova York: Oxford University Press,
2007. 9. Impresso.
47. Bogle (Toms, Coons 13-14).
48. Cripps (Genre 15).
49. No filme, a mulher, Sylvia, é birracial (negra e branca), adotada
e criada por uma família negra. Neste interim, é considerada
negra.
50. Richards (152).
51. Butters (105).
52. Butters (105).
53. Butters (xvi).
54. Bowser, P. e L. Spence. Writing Himself into History: Oscar
Micheaux, His Silent Films, and His Audiences. New Brunswick, NJ:
Rutgers University Press, 2000. 115. Impresso.
55. “Carey Theater, The Crimson Skull”. Afro-American, 19 maio
1922: 4. Impresso.
56. Muitos dos filmes da Ebony, como a maioria dos filmes dos anos
1800 e 1900, estão perdidos.
57. Bowser e Spence (92).
58. “Ebony Films” [Carta ao editor]. Chicago Defender, 1 jul. 1916
(4).
59. Bowser e Spence (92).
60. Bowser e Spence (10).
61. Bowser e Spence (10).
62. Davis, T. “Foreword”. Writing Himself into History: Oscar
Micheaux, His Silent Films, and His Audiences. Eds. Pearl Bowser e
Louise Spence. New Brunswick, NJ: Rutgers University Press,
2000. Ix. Impresso.
63. Bowser e Spence (16).
64. Bowser e Spence (16).
65. Bowser e Spence (17).
66. Bowser e Spence (17, 144).
67. Alguns pôsteres de divulgação de A Son of Satan escreveram o
título da história erroneamente, usando “Tolson” em vez de
“Tolston”. Também houve ocasiões em que A omple Satan foi
vendido com o título de The Ghost of Tolston’s Manor, logo,
causando confusão no público, que não sabia se eram dois filmes
diferentes. Estudos confiáveis, como aqueles de Pearl Bowser,
Louise Spence, Jane Gaines e Charles Musser, levam a crer que A
omple Satan é o filme e The Ghost of Tolston’s Manor é a história.
68. omplex, Charlene. “The African-American Press and Race
Movies, 1909-1929”. Oscar Micheaux & His Circle: African-
American Filmmaking and Race Cinema of the Silent Era. Eds.
Pearl Bowser, Jane Gaines e Charles Musser. Bloomington and
Indianápolis: Indiana University Press, 2001. 47. Impresso.
69. Musser, Charles, Corey K. Creekmur, Pearl Bowser, J. Ronald
Green, Charlene omplex e Louise Spence. “Appendix B: An Oscar
Micheaux Filmography: From the Silents Through His Transition to
Sound, 1919-1931”. Oscar Micheaux & His Circle: African-
American Filmmaking and Race Cinema of the Silent Era. Eds.
Pearl Bowser, Jane Gaines e Charles Musser. Bloomington e
Indianápolis: Indiana University Press, 2001. 252. Impresso.
70. Butters (139).
71. Musser, Creekmur, Bowser, Green, omplex e Spence (251).
72. Musser, Creekmur, Bowser, Green, omplex e Spence (256).
73. De acordo com Zora Hurston, o “hoodoo” é um afro-
americanismo para o termo “juju” da África Ocidental. Conjurar,
uma espécie de magia popular, através do uso de raízes e/ou a
mistura de ervas faz parte da tradição, assim como a oração
associada. Ver: Hurston, Zora. “Hoodoo in America”. Journal of
American Folklore 44 (out.-dez., 1931): 174. 317-417. Impresso.
74. Musser, Creekmur, Bowser, Green, omplex e Spence (260-261).
75. Musser, Creekmur, Bowser, Green, omplex e Spence (261).
76. Du Bois, W. E. B. The Souls of Black Folks. Nova York: NAL
Penguin, 1903/1969. 45. Impresso.
77. Nesteby, James R. Black Images in American Films, 1896-1954.
Lanham, MD: University Press of America, 1982. 79. Impresso.

2 FEBRE DA SELVA — UM ROMANCE DE HORROR:


OS ANOS 1930
1. Golden, Nathan D. Brief History and Statistics of the American
Motion Picture Industry. Washington, DC: GPO, 14 ago. 1936.
Impresso.
2. Hutchings, Peter. The Horror Film. Londres: Pearson, 2004. P. vi,
3. Impresso.
3. Quando Drácula (1931) se mostrou popular, é relatado que o
Universal Studios anunciou que faria “outro filme de terror”,
marcando o primeiro uso do termo “filme de terror”. Ver: Jones,
Alan. The Rough Guide to Horror Movies. Nova York: Rough
Guides, 2005. P. 21. Impresso.
4. De acordo com um artigo do Pittsburgh Courier de 1934, quando
o Universal Studios estreou o drama sobre relações inter-raciais
Imitação da vida, estrelando a atriz Louise Beavers, o estúdio se
recusou a fornecer passes para os repórteres negros, uma prática
comum no caso de filmes raciais. O jornal proclamava que a
mensagem da Universal era “a imprensa negra não significa nada
para nós”. Ver: “Race Press Ignored by Big Film Interests: Louise
Beavers ‘On Spot’”. Pittsburgh Courier, 15 dez. 1934: A9.
Impresso.
5. Roosevelt, Theodore. African Game Trails: An Account of the
African Wanderings of an American Hunter-Naturalist. Nova York:
Charles Schribner’s Sons, 1910. 280. Impresso.
6. Hendricks, Bill e Howard Waugh. The Encyclopedia of
Exploitation. Nova York: Showmen’s Trade Review, 1937. 138.
Impresso.
7. Hill Collins, Patricia. Black Sexual Politics: African Americans,
Gender, and the New Racism. Nova York: Routledge, 2004. 27, 29.
Impresso.
8. Erish, Andrew. “Illegitimate Dad of ‘Kong’”. Los Angeles Times, 8
jan. 2006. Web. 20 jun. 2010.
http://articles.latimes.com/2006/jan/08/entertainment/ca-ingagi8.
Uma das maiores bilheterias da era da Grande Depressão, o épico
sobre gorilas era uma fabricação escandalosa, abjeta e sugestiva
que fez barulho em cinemas pelo país inteiro.
9. Berenstein, Rhona J. “White Heroines and Hearts of Darkness:
Race, Gender and Disguise in 1930s Jungle Films”. Film History 6
(1994): 316. Impresso.
10. Berenstein (317).
11. Berenstein (318).
12. Ingagi foi apenas mais um trote feito para os frequentadores do
cinema e à custa dos negros da época. Um ator negro, Firpo
Jacko, em março de 1930, processou o “doutor” Daniel
Davenport, um cineasta branco e supostamente explorador da
África, por salários não pagos. No caso, Jacko afirmou que o
“documentário” Jango (1929), ambientado no Congo, era uma
farsa, e que os “canibais reais”, capturados e levados aos Estados
Unidos para promover o filme eram, na verdade, do Harlem. O
processo revelou que Jango não foi filmado no Congo, mas no
Bronx, Nova York, e que Jacko, o canibal — que gritava “uga-
buga” para o público, era realmente Jacko, um zelador do Harlem.
O processo também desafiava a afirmação de que Davenport já
havia estado na África. A principal testemunha de Jacko era sua
senhoria, a sra. Montgomery, que foi chamada para oferecer
provas de que Jacko não poderia ser canibal, pois frequentava a
“igreja todos os domingos”. Jacko recebeu seu pagamento de
setecentos dólares. Ver: “‘Jango’ Filmed in Wilds’ of Bronx,
‘Cannibal’ Says”. Pittsburgh Press, 9 mar. 1930: 15 News-Section-
Editorial. Impresso. “Wild Cannibal Turns Out to Be Ex-Janitor:
Salary Suit Reveals Harlem as Scene of Fake Movie”. Chicago
Defender, 15 mar. 1930: 3. Impresso.
13. Erish.
14. Everett, Anna. Returning the Gaze: A Genealogy of Black Film
Criticism, 1909-1949. Durham, NC: Duke University Press, 2001.
243-244. Impresso.
15. “Ingagi Review Summary”. New York Times. NYTimes.com. Web.
18 jun. 2010. Esta era a única fotografia do Congo.
16. Erish; Erb, Cynthia. Tracking King Kong: A Hollywood Icon in
World Cinema. 2. ed. Detroit, MI: Wayne State University Press,
2009, para discussões sobre a violação de direitos autorais em
torno dos filmes de símios.
17. Snead, James. White Screens, Black Images: Hollywood from the
Dark Side. Nova York: Routledge: 1994. 8. Impresso.
18. Tambores nativos, da selva ou de vodu, não eram pequenos,
mas altamente ressoantes. Era o som grave e “assustador”
associado à negritude. O atabaque e os negros na cultura popular
têm uma tradição longa, datando desde, pelo menos, 1887, em
Othello de Verdi, quando o maestro especifica nas partituras que
apenas as cordas baixas em mi sejam ouvidas na cena com o
Mouro. Ver: Andre, Naomi. “Race and Opera”. University of
Michigan. Março, 2009. Apresentação.
19. Snead (17).
20. Bogle, Donald. Bright Boulevards, Bold Dreams: The Story of
Black Hollywood. Nova York: Ballantine One World, 2005. 62.
Impresso.
21. Rony, Fatimah Tobing. The Third Eye: Race, Cinema, and
Ethnographic Spectacle. Durham, NC: Duke University Press,
1996. 177. Impresso.
22. Etta McDaniel faz o papel da silenciosa e desleixada noiva do
macaco. Ela é uma de uma fila de muitas das que serão
necessárias para aplacar Kong. Ver: King Kong. Dir.: Doran Cox.
Atuação: Fay Wray, Robert Armstrong, Bruce Cabot. RKO Radio
Pictures Inc., 1933. Filme.
23. Greenberg, Harvey Roy. “King Kong: The Beast in the Boudoir —
Or, ‘You Can’t Marry that Girl, You’re a Gorilla!’”. The Dread of
Difference: Gender and the Horror Film. Ed. Barry Keith Grant.
Austin: University of Texas Press, 1996. 344. Impresso.
24. Greenberg (340).
25. Humphries nota que existem paralelos entre o (não visto) falo de
Kong e a imagem muito fálica do grande e preto ferrolho que
prende a porta do símio. Ver: Humphries, Reynold. The Hollywood
Horror Film 1931-1941: Madness in a Social Landscape. Lanham,
MD: The Scarecrow Press, 2006. 82. Impresso.
26. Sontag, Susan. “The Imagination of Disaster”. Commentary
(out., 1965): 44. Impresso.
27. Greenberg (338).
28. Skal, David J. The Monster Show: A Cultural History of Horror. Ed.
revisada. Nova York: Faber and Faber, Inc., 2001. 175. Impresso.
29. Young, Elizabeth. “Here Comes the Bride: Wedding Gender and
Race in Bride of Frankenstein”. The Dread of Difference: Gender
and the Horror Film. Barry Keith Grant. Austin: University of Texas
Press: 1996. 325. Impresso.
30. Tyler, Bruce M. “Racial Imagery in King Kong”. King Kong
Cometh!: The Evolution of the Great Ape. Ed. Paula A. Woods.
Londres: Plexus Publishing, 2005. 175. Impresso.
31. Behind the Planet of the Apes. Dirs.: David Comtois e Kevin
Burns. Atuação: Roddy McDowell. Image Entertainment, 1998.
Filme.
32. Behind the Planet of the Apes. Dir.: David Comtois e Kevin Burns.
Atuação: Roddy McDowell. Image Entertainment, 1998. Filme.
33. Greene, Eric. Planet of the Apes as American Myth: Race and
Politics in the Films and Television Series. Jefferson, NC: McFarland
& Co., Inc., 1996. 84. Impresso.
34. Hurston, Zora Neale. Tell My Horse. Nova York: Harper Perennial,
1938/1990. 179. Impresso.
35. “Haiti Country Profile”. BBC, 2010. Web. 11 ago. 11 2010.
http://news.bbc.co.uk/2/hi/americas/country_profiles/1202772.stm
.
36. “Living Vodou”. Speaking of Faith with Krista Tippett. American
Public Media, 28 jun. 2007. Rádio.
37. Thomson, Ian. “The Black Spartacus”. Guardian News and Media,
31 jan. 2004. Web. 23 jun. 2010. Thomson acrescenta: “A maioria
dos historiadores concorda que os escravos do Haiti primeiro se
rebelaram com a ajuda de um sacerdote vodu jamaicano
chamado Boukman. Na noite de 15 de agosto de 1791, Boukman
convocou os espíritos da África ancestral para punir
escravocratas. Acredita-se que L’Ouverture tenha participado
dessa cerimônia e que dentro de seis semanas os exércitos de
escravos rebeldes da ilha começaram uma luta de doze anos pela
liberdade; naquela noite, mil franceses brancos teriam sido
massacrados e suas plantações, incendiadas”. Ver também:
Steward, Theophilus Gould. The Haitian Revolution, 1791 to 1804:
Or, Side Lights on the French Revolution. 2. ed. Nova York:
Thomas Y. Crowell Publishers, 1914. Impresso. Steward, um
historiador, ministro da AME e capelão do exército dos Estados
Unidos, escreve sobre Boukman, L’Ouverture e outros reunidos
sob o “véu das pretensas cerimônias de vodu” para organizar a
revolução. O papel do Voodoo na rebelião pode ter adquirido ares
míticos ao longo dos anos; no entanto, acredita-se que Boukman,
nascido na Jamaica, era um sacerdote vodu.
38. Gelder, Ken. “Postcolonial Voodoo”. Postcolonial Studies 3
(2000): 95-96. Impresso.
39. Lawless Robert. Haiti’s Bad Press. Rochester, vt: Schenkman
Books, 1992. 73. Impresso. Mostra que vodu, também escrito
como vaudou, vaudoun, vudu, vodun, vodoun, na verdade
descreve um tipo de dança oriunda da África. Mais ainda, o nome
e a descrição dessa dança, de Daomé (Benin), foram registrados
por um estrangeiro branco. Por isso, a origem do termo pode ser
uma construção não nativa desde o princípio.
40. Lawless (56).
41. Lawless (109).
42. Eu uso a escrita “vodu” assim como os filmes discutidos neste
livro, de forma a distinguir os rituais macabros na ficção e
entretenimento da discução sobre a religião do Haiti, vodou, ou a
religião vodun da África Ocidental. Filmes de terror americanos já
aplamente demonstraram a versão da religião na Louisiana,
“vodu”.
43. Rhodes, Gary D. White Zombie: Anatomy of a Horror Film.
Jefferson, NC: McFarland & Company, Inc., 2001. 78. Impresso.
44. Seabrook, W. B. The Magic Island. Nova York: Harcourt, Brace
and Company, 1929. 42. Impresso.
45. Seabrook (310).
46. Seabrook (324).
47. Seabrook (93).
48. Rhodes (15-16).
49. L. N. “The Screen. Beyond the Pale”. New York Times, 29 jul.
1932: 8. Impresso.
50. Citado em Rhodes (46). Mais tarde, a fala foi alterada para
“zumbis roubaram uma garota branca […] a fúria do inferno está
à solta”.
51. Em outra cena, perto do final do filme, Neil visita um
doutor/ministro branco, dr. Bruner (Joseph Cawthorn), a fim de
conseguir ajuda para Madeline, que está em transe. O dr. Bruner
recomenda que visitem um amigo dele, um curandeiro e “velho
companheiro” chamado Pierre (Dan Crimmins), para conseguir
ajuda. A introdução de Pierre ao público o estabelece como um
homem bom, em vez do (estereotípico) curandeiro perverso. Ele é
visto viajando pela estrada montado numa mula, aproximando-se
de um negro arrebanhando um boi. Pierre sente um perigo ao
redor da área (devido aos recentes delitos de Murder) e detém o
homem para dar a ele um amuleto de proteção. Pierre então lhe
dá outro amuleto para proteger o boi. O curandeiro, infelizmente,
é representado por um branco, Dan Crimmins, que é maquiado
para parecer haitiano. Tal apagamento racista é devastador para
as possibilidades do personagem. Ver: Zumbi branco. Dir.: Victor
Halperin. Atuação: Bela Lugosi. United Artists Corp., 1932. Filme.
52. Seabrook (94).
53. Tony Williams vê a performance de Muse como estereotípica do
negro medroso. Ver: Williams, Tony. “White Zombie Haitian
Horror”. Jump Cut 28 (abr., 1983): 18-20. Impresso. Rhodes (321)
foi alvo de críticas de Johanne Tournier nas notas que
acompanharam o lançamento do ld de Zumbi branco, por ser
muito veemente em relação à atuação de Muse. O personagem
de Muse é medroso e negro, e juntos os dois carregam uma
bagagem estereotipada. Entretanto, nessa representação em
particular, ele representa o medo de forma bastante honesta e
bem distante das populares performances do negro medroso que
dominaram o cinema anteriormente e que receberão atenção no
capítulo 3, com a performance de Stepin Fetchit e Sleep ’n’ Eat.
54. Como citado em: Noble, Peter. The Negro in Films. Nova York:
Arno Press & the New York Times, 1970. 8. Impresso.
55. Rhodes (178).
56. Dayan, Joan. Haiti, History, and the Gods. Berkeley: University of
California Press, 1988. 175, 178. Impresso.
57. Soister, John T. Up From the Vault: Rare Thrillers of the 1920s
and 1930s. Jefferson, NC: McFarland and Company, 2004. 183.
Impresso.
58. Muse, Clarence. “When a Negro Sings a Song”. Celebrity Articles
from the Screen Guild Magazine. Ed. Anna Kate Sterling. Lanham,
MD: Rowman & Littlefield, 1987. 13. Impresso.
59. Bogle, Donald. Toms, Coons, Mulattoes, Mammies, & Bucks: An
Interpretative History of Blacks in American Films. Nova York:
Continuum, 1993. 54. Impresso. A astúcia de Muse foi
frequentemente atribuída a sua inteligência. Ele graduou-se na
Dickinson School of Law (PA).
60. Bogle (Toons Coons 54).
61. Schroeder, Caroline T. “Ancient Egyptian Religion on the Silver
Screen: Modern Anxieties about Race, Ethnicity, and Religion”.
Journal of Religion and Film 2.3 (out., 2003). Web. 8 nov. 2009.
https://digitalcommons.unomaha.edu/jrf/vol7/iss2/1/.
62. O filme foi lançado com uma série de títulos diferentes nos
Estados Unidos e no exterior: Drums of the Jungle, Love Wanga,
The Love Wanga e Ouanga. A versão Canadense, The Love
Wanga, está disponível para compra hoje em dia e tem a mesma
duração que a versão dos Estados Unidos. Logo, há poucas
diferenças entre os dois filmes. Assisti a ambas as versões, mas
num intervalo de algund anos, e não consegui a versão norte-
americana para comparar com a canadense. Minhas notas e
memórias tomam as duas versões como apenas uma. Os créditos
iniciais do filme dizem que The Love Wanga foi gravado
inteiramente nas Índias Ocidentais.
63. Orbe, Mark E Karen Strother. “Signifying the Tragic Mulatto: A
Semiotic Analysis of Alex Haley’s Queen”. Howard Journal of
Communications 7 (abr., 1996): 113-126. Impresso.
64. The Love Wanga foi o segundo filme de zumbi no que
rapidamente se tranformou em um montão deles.
65. Dayan (37-38).
66. O conteúdo da indústria cinematográfica era regulado pelo
Hay’s Office, que esbelecia “o Código”, ou regras para Hollywood
em questões de moralidade em filmes. Proibidos pelo Código em
1930: “Miscigenação (relações sexuais entre brancos e negros)”.
Perversão sexual, seminudez, danças que representavam atos
sexuais e “preconceitos raciais e religiosos” também eram
“imorais”, mas nenhum desses problemas parecia se aplicar no
caso da representação de negros. Ver: Hays, Will H. Annual Report
of the President. Nova York: Motion Picture Producers and
Distributors of America, 1936. Impresso.
67. Dayan (174).
68. Guerrero, Edward. Framing Blackness: The African American
Image in Film. Filadélfia, PA: Temple University Press, 1993. 23.
Impresso. Guerrero também observa que a Casa Grande forneceu
ao público da era da Depressão uma visão privilegiada da
aristocracia.
69. Conforme citado em: Everett (246).
70. Bishop, Kyle William. American Zombie Gothic: The Rise and Fall
(and Rise) of the Walking Dead in Popular Culture. Jefferson, NC:
McFarland & Co, 2010. 60. Impresso.
71. Lawless (10).

1. O’Reilly, Bill. “Inside Edition”. Haiti’s Bad Press. Ed. Robert


Lawless. Rochester, VT: Schenkman Books, 1992. 20. Impresso.

3 BANDIDOS ATERRORIZANTES E MISERÁVEIS


MENESTRÉIS: OS ANOS 1940
1. Jones, Alan. The Rough Guide to Horror Movies. Nova York: Rough
Guides/Penguin, 2005. 24. Impresso.
2. De acordo com Jones (24). O terror recebeu um golpe
particularmente devastador na Grã-Bretanha, com apenas quatro
filmes chegando nas telas entre 1940 e 1945.
3. O filme é ligeiramente baseado em Jane Eyre (1847), de
Charlotte Brontë, e enquanto filme de terror com uma herança
literária que não era do terror (por exemplo, comparado ao
Frankenstein de Shelley), atraiu uma boa dose de atenção da
crítica.
4. Humphries, Reynold. The American Horror Film. Edimburgo:
Edinburgh University Press, 2002. 48-49. Impresso. Mais tarde,
em 2009, Humphries saudaria A morta-viva como uma das
contribuições mais significativas ao gênero do terror. O filme é
considerado denso, complexo e com várias camadas graças a um
“roteiro brilhante” que também oferece uma “análise
excepcionalmente sutil da repressão em todos os sentidos”. Ver:
Humphries, Reynold. “I Walked With a Zombie”. 101 Horror
Movies You Must See Before You Die. Ed. Steven Jay Schneider.
Londres: Quintessence, 2009. 85-86. Impresso.
5. Hutchings, Peter. The Horror Film. Harlow, Inglaterra: Pearson,
2004. 111. Impresso.
6. No vodu, o espírito Carrefour controla a “encruzilhada”, ou
caminho para a morte.
7. Frequentemente, há pouco aprofun damento nas histórias dos
negros. Eles costumam ser apenas nativos ou serventes e com
frequência sequer recebem nomes nos filmes. Ou, ainda pior, os
atores que os representam nem são creditados. Até 1968, com
Ben de A noite dos mortos-vivos, pouco se sabia sobre as vidas
dos negros estrelados nos filmes. Isso mudaria com Blácula, o
vampiro negro (1972), em que a história de vida do personagem
negro Mamuwalde é cuidadosamente contada. Mais tarde, ao
longo de dois filmes O mistério de Candyman (1992) e Candyman
2: a vingança (1995), a história de Candyman/Daniel Robitaille
emerge.
8. Hutchings (111).
9. Crowther, Bosley. “Old Black Magic”. New York Times, 13 jun.
1943: seção X3. Impresso.
10. Nos últimos minutos de filme, quando Mumbo Jumbo precisa
explicar ao homem branco que ele viu Pongo levar uma mulher
branca embora, seu personagem fica instantaneamente fluente
em inglês e perde o sotaque (nada de “Eu garoto, você Bwana”).
Em referência ao símio, Mumbo Jumbo observa de forma séria:
“Eu certamente espero que sua disposição melhore”. É uma boa
espiadela no que Fluellen poderia ter feito com seu personagem.
Entretanto, nesse filme de baixo orçamento, a inexplicável
fluência de Mumbo Jumbo parece ser devida ao diretor, Sam
Newfield, que simplesmente esqueceu que Mumbo Jumbo iniciou
o filme falando um inglês muito quebrado e limitado.
11. O filme estrelou o famoso ator homem-com-roupa-de-macaco
Ray Corrigan, dos filmes de terror Pongo, o gorila branco e
Nabonga, o gorila, como o gorila branco.
12. “Uma batalha pela supremacia da selva” foi o mote do trailer do
filme. Ver: “The White Gorilla”. You-Tube . YouTube, LLC. 2010.
Web. 26 jul. 2010. www.youtube.com/watch?v=n_c47ZGZ5I8.
13. Cripps, Thomas. Slow Fade to Black: The Negro in American Film,
1900-1942. Nova York: Oxford University Press, 1993. 374.
Impresso.
14. Cripps (Slow Fade 374).
15. Bogle, Donald. Bright Boulevards, Bold Dream: The Story of
Black Hollywood. Nova York: Ballantine One World, 2005. 126.
Impresso.
16. Muse, Clarence. “What’s Going on in Hollywood”. Chicago
Defender, 28 dez. 28 1940: 21. Impresso.
17. Cripps (Slow Fade 376-378).
18. Leab, Daniel J. From Sambo to Superspade: The Black
Experience in Motion Pictures. Boston, MA: Houghton Mifflin
Company, 1973. 130. Impresso.
19. Cripps (Slow Fade 376).
20. Em relação ao tratamento, Reddick identificou dezenove
estereótipos que queria enterrar: o africano selvagem, o escravo
feliz, o empregado devotado, o político corrupto, o ladrãozinho, o
delinquente social, o criminoso cruel, o super-homem sexual, o
atleta superior, o infeliz não branco, o cozinheiro nato, o
musicista nato, o artista perfeito, o frequentador supersticioso da
igreja, o comedor de frango e melancia, o “carregador” de facas e
navalhas, o expressionista desinibido e a mente inferior.
21. Reddick, Lawrence D. “Educational Programs for the
Improvement of Race Relations: Motion Pictures, Radio, the Press,
and Libraries”. Journal of Negro Education 13.3 (1944): 369, 382.
Impresso.
22. Cinquenta anos depois de Son of Ingagi, os filmes que enfocam
casamento de pessoas negras permanecem novidade e são
frequentemente aclamados como positivos, como as comédias
românticas Noivo em pânico (1999) e Amigos indiscretos (1999).
23. hooks, bell. Reel to Real: Race, Sex, and Class at the Movies.
Nova York: Routledge, 1996. 167. Impresso.
24. Cripps, Thomas. Making Movies Black: The Hollywood Message
Movie from World War II to the Civil Rights Era. Nova York: Oxford
University Press, 1993. 133. Impresso.
25. Sobchack, Vivian. Screening Space: The American Science
Fiction Film. New Brunswick, NJ: Rutgers University Press, 2001.
30. Impresso.
26. Cripps, Thomas. Black Film as Genre. Bloomington: Indiana
University Press, 1978. 90. Impresso.
27. Cripps (Genre 90).
28. Manatu, Norma. African American Women and Sexuality in the
Cinema. Jefferson, NC: McFarland & Company, Inc., 2003. 53.
Impresso.
29. Cripps, Thomas. “The Films of Spencer Williams”. Black
American Literature Forum 12 (1978): 131. Impresso.
30. Creed, Barbara. The Monstrous-Feminine: Film, Feminism,
Psychoanalysis. Londres: Routledge, 1993. 37. Impresso.
31. Ver: Gibson, Gloria J. “Cinematic Foremothers: Zora Neale
Hurston and Eloyce King Patrick Gist”. Oscar Micheaux & His
Circle: African-American Filmmaking and Race Cinema of the
Silent Era. Eds. Pearl Bowser, Jane Gaines e Charles Musser.
Bloomington: Indiana University Press, 2001. 195-209. Impresso.
Ver também: Gibson-Hudson, Gloria. “Recall and Recollect:
Excavating the Life History of Eloyce King Patrick Gist”. Black Film
Review 8 (1994): 20-21. Impresso.
32. Gibson-Hudson (20-21).
33. Gibson (200).
34. Gibson-Hudson (20-21).
35. Gibson (203).
36. Gibson (203).
37. Gibson (203-204).
38. Gibson-Hudson (20-21).
39. The Library of Congress: American Memory, Library of Congress.
2010. Web. 26 jul. 2010. Fragmentos fora de sequência de Trem
para o inferno estão com a Biblioteca do Congresso; um incêndio
destruiu o restante dos materiais e documentos relacionados à
vida e carreira de Gists. Gloria J. Gibson (Hudson) se esforçou
para decifrar a ordem dos fragmentos, como ela descreve em
detalhes. Ver: Gibson (195—209).
40. O resumo desse filme vem em grande parte de: Senn, Bryan.
Golden Horrors: An Illustrated Critical Filmography 1931-1939.
Jefferson, NC: McFarland & Company, Inc., 1996. Impresso.
41. Cripps (Films of Spencer Williams 132).
42. Holland, Sharon Patricia. Raising the Dead: Readings of Death
and (Black) Subjectivity. Durham, NC: Duke University Press,
2000. 33. Impresso.
43. O cineasta negro Charles Burnett construiria um filme inteiro em
torno dos rituais modernos de vigiar os moribundos em seus
leitos no seu assombroso filme de bem e mal Não durma nervoso
(1990). No filme, o quase morto Gideon (Paul Butler) luta para
retornar aos vivos enquanto um mal prospera, distraindo e
causando caos entre aqueles que deveriam estar reunidos em
oração em sua cabeceira.
44. Clover, Carol. “Her Body, Himself: Gender in the Slasher Film”.
The Dread of Difference: Gender and the Horror Film. Ed. Barry
Keith Grant. Austin: University of Texas Press, 1996. 78. Impresso.
45. Cripps (Making 141).
46. Cripps (Making 134, 330).
47. Razaf, Andy. “A Colored Movie Fan”. New York Amsterdam News,
6 jan. 1940: 16. Impresso.
48. Coleman, Robin Means. African American Viewers and the Black
Situation Comedy: Situating Racial Humor. Nova York: Garland,
2000. 35. Impresso.
49. Coleman (45).
50. McCaffrey, Donald W. “The Golden Age of Sound Comedy”.
Screen 11 (1970): 27-40. 33. Impresso.
51. Reid, Mark A. Redefining Black Film. Berkeley: University of
California Press, 1993. 23, 25. Impresso.
52. Denzin, Norman K. Reading Race. Londres: Sage, 2002. 18.
Impresso.
53. Koppes, Clayton R. and Gregory D. Blacks. “What to Show the
World: The Office of War Information and Hollywood, 1942-1945”.
Journal of American History (1977): 87-105. Impresso.
54. Cripps, Thomas R. “The Death of Rastus: Negroes in American
Films since 1945”. Phylon 28 (1967): 269. Impresso.
55. Nesteby, James R. Black Images in American Films, 1896-1954:
The Interplay Between Civil Rights and Film Culture. Lanham, MD:
University Press of America, 1982. 222. Impresso.
56. Noble, Peter. The Negro in Film. Nova York: Arno Press & the New
York Times, 1970. 181-182. Impresso.
57. Bogle, Donald. Toms, Coon, Mulattoes, Mammies, and Bucks: An
Interpretive History of Blacks in American Films. Nova York:
Continuum, 1993. 74. Impresso.
58. Guerrero, Ed. Framing Blackness: The African American Image in
Film. Filadélfia, PA: University of Temple Press, 1993. 123.
Impresso.
59. Revolta dos Zumbis (1936), por exemplo, reformulou a mitologia
zumbi ao afastá-la do vodu negro, colocando-a mais perto de um
sacerdote “oriental” fanático de Angkor Wat, no Camboja, cujo
poder poderia ser usado para levantar um exército de zumbis,
desequilibrando o poderio militar e assim causando “a destruição
da raça branca”.
60. Leab, Daniel J. “The Gamut from A to B: The Image of the Black
in Pre-1915 Movies”. Political Science Quarterly 88 (1973): 63.
Impresso.
61. Nesteby (222).
62. The Scarlet Clue (1945).
63. Robinson, Cedric J. Forgeries of Memory & Meaning: Blacks & the
Regimes of Race in American Theater & Film before World War II.
Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2007. 376-378.
Impresso.
64. Robinson (376-378).
65. Kliman, Bernice W. “The Biscuit Eater: Racial Stereotypes: 1939-
1972”. Phylon 39 (1978): 92. Impresso.
66. Noble (181).
67. Bogle (Toms, Coons 72); Bogle (Bright 118).
68. Spooks on the Loose apresenta um dos finais mais estrahos de
um filme. O personagem Glimpy (Huntz Hall), após lutar com
nazistas, pega um tipo de sarampo alemão, que é representado,
de forma cômica, como dezenas de pequenas suásticas por todo
seu rosto.
69. Neuert, Richard. “Trouble in Watermelon Land: George Pal and
the Little Jasper Cartoons”. Film Quarterly 55 (2001): 18.
Impresso.
70. Neuert (18).
71. A cena lembra muito o curta de 1929 com Mickey Mouse,
Haunted House, em que Mickey chama por sua “mammy”, com
pintura blackface, num tributo à performance de 1927 de Al
Jolson em O cantor de jazz. Mickey, então, é forçado a tocar piano
enquanto esqueletos dançam.
72. Neuert (16, 21).
73. Neuert (16, 21).
74. “Little Jasper Series Draws Protest from Negro Groups”. Ebony,
jan. 1947: 27. Impresso.
75. Neuert (23).
76. Cripps (Films of Spencer Williams 133).
77. “Oregon Station Drops ‘Little Jasper’ Series”. Los Angeles
Sentinel, 4 jun. 1959: C1. impresso.
78. Bogle (Bright 278).
79. “Boris Karloff Joins Fight For Race Equality”. Atlanta Daily World,
30 set. 1947: 1. Impresso.
80. Coleman (81).

1. O’Reilly, Bill. “Inside Edition”. Haiti’s Bad Press. Ed. Robert


Lawless. Rochester, VT: Schenkman Books, 1992. 20. Impresso.

4 INVISIBILIDADE NEGRA, CIÊNCIA BRANCA E UMA


NOITE COM BEN: OS ANOS 1950-1960
1. Homem invisível foi publicado integralmente em 1952 e já foi
reimpresso diversas vezes. Aqui eu cito a edição de março de
1995: Ellison, Ralph. Invisible Man. Nova York: Vintage
International, 1995. 3. Impresso.
2. Metress, Christopher. The Lynching of Emmett Till: A
Documentary Narrative. Charlottesville: University of Virginia
Press, 2002. 227. Impresso.
3. Ellison, Ralph. 1952. Invisible Man. Nova York: Vintage
International, 1995. 94. Impresso.
4. Phillips, Kendall R. Projected Fears: Horror Films and American
Culture. Westport, CT: Praeger, 2005. 7. Impresso.
5. Por sua inovação cinematográfica, Vampiros de almas foi incluído
no Registro Nacional de Filmes dos Estados Unidos pela National
Film Preservation Board. Biblioteca do Congresso, 25 jan. 2010.
Web. 17 jun. 2010. Ficou no 47° lugar de 100 na lista de filmes
mais assustadores do American Film Institute (AFI).
6. O termo vagem é usado para descrever os enclaves suburbanos
habitados por indivíduos entediados. (Ver: Duany, Andres,
Elizabeth Plater-Zyberk e Jeff Speck. Suburban Nation: The Rise of
Sprawl and the Decline of the American Dream. Nova York: North
Point Press, 2000. Impresso.)
7. Wood, Robin. “An Introduction to the American Horror Film”.
Movies and Methods: Volume II. Ed. Bill Nichols. Berkeley:
University of California Press, 1985. 195-220, 198-199. Impresso.
8. Cripps, Thomas. Making Movies Black: The Hollywood Message
Movie from World War II to the Civil Rights Era. Nova York: Oxford
University Press, 1993. 257. Impresso.
9. Roth também retrata os gorilas no filme. Presume-se que Taro é
outro troféu exótico de Dan.
10. Sontag, Susan. “The Imagination of Disaster”. Commentary
(out., 1965): 45. Impresso.
11. Na paródia de filmes policiais The Gristle (2001), o personagem
negro “Tar” (Michael Dorn) zomba da preocupação contínua e
obsessiva em relação a ameaças à feminilidade branca por parte
de negros (sexualmente atraentes) ao dizer essa frase, em um
falso tom racista, a um grupo de homens brancos.
12. Gonder, Patrick. “Like a Monstrous Jigsaw Puzzle: Genetics and
Race in Horror Films of the 1950s”. The Velvet Light Trap 52
(2003): 39. Impresso.
13. Humphries, Reynold. The American Horror Film: An Introduction.
Edimburgo, UK: Edinburgh University Press, 2002. 63. Impresso.
14. Gonder (Monstrous 39).
15. Gonder, Patrick. “Race, Gender and Terror: The Primitive in
1950s Horror Films”. Genders 40 (2004). Web. June 18, 2010.
www.genders/org/.
16. Goldsby, Jacqueline. “The High and Low Tech of It: The Meaning
of Lynching and the Death of Emmett Till”. Yale Journal of
Criticism 9 (1996): 250. Impresso.
17. Butters, Jr., Gerald R. Black Manhood on the Silent Screen.
Lawrence: University of Kansas Press, 2002. xvii. Impresso.
18. Schneider, Steven Jay. “Mixed Blood Couples: Monsters and
Miscegenation in U.S. Horror Cinema”. The Gothic Other: Racial
and Social Constructions in the Literary Imagination. Ed. R.
Bienstock Anolik e D. L. Howard. Jefferson, NC: McFarland &
Company, Inc., 2004. 78. Impresso.
19. Romero dirigiu A noite dos mortos-vivos e escreveu o roteiro ao
lado de John Russo. O filme foi produzido pela Image Ten, um
grupo de cineastas que incluía Romero e Russo, que, além de
contribuir para o roteiro, atuaram no filme e trabalharam na
iluminação e na maquiagem.
20. Hervey, Ben. Night of the Living Dead. Nova York: Palgrave
Macmillan, 2008. 63. Impresso.
21. Stein, Elliott. “Night of the Living Dead”. Sight and Sound 39
(1970): 105. Impresso.
22. Wood, Robin. Hollywood from Vietnam to Reagan. Nova York:
Columbia University Press, 1986. 114. Impresso.
23. Becker, Matt. “A Point of Little Hope: Hippie Horror Films and the
Politics of Ambivalence”. The Velvet Light Trap 57 (2006): 58.
Impresso.
24. Becker (42, 51, 58).
25. Stein (105).
26. Hervey (110). De acordo com Hervey, essas cenas fizeram
Romero e seu filme parecerem ainda mais radicais e rebeldes, já
que ele usou a própria polícia para denunciar o sistema.
27. Becker, Michael e Mike Carbone. “Tony Todd”. Reel Horror.
Epsódio 25, 2. jun. 2010. http://legacy-
content.libsyn.com/vidhack/reel_horror-ep25-070306.mp3. Rádio.
28. Hervey (112).
29. Hervey (113-114).
30. Hervey (118).
31. Dyer, Richard. “White”. Screen 29 (1988): 45. Impresso.
32. Heffernan, Kevin. “Inner-City Exhibition and the Genre Film:
Distributing Night of the Living Dead”. Cinema Journal 41 (2002):
59-77. 59. Impresso.
33. Humphries (The American Horror Film 115).
34. Como Noite, devido a um erro no copyright, está em domínio
público, é difícil de mensurar seu lucro. Apesar disso, de acordo
com o IMDb.com e BoxOfficeMojo.com, os lucros que chegaram a
ser registrados ultrapassaram a margem de 30 milhões.
35. Heffernan (Inner-City 59); Heffernan, Kevin. Ghouls, Gimmicks,
and Gold: Horror Films and the American Movie Business 1953-
1968. Durham, NC: Duke University Press. 2004. 207. Impresso.
36. “Horror Films Debut Soon”. Daily Defender, 12 nov. 1957: B10.
Col. 5. Impresso.
37. “Triple Horror Films Electrify Fans at Regal”. Daily Defender, 4
maio 1960: 16. 5. Impresso.
38. “‘Paranoia’ Horror Film Debuts at the Oriental”. Chicago Daily
Defender, 16-22 ago. 1960: 1+. Impresso.
39. “Two Horror Films Bow at Drive-Ins”. Chicago Defender, 18 abr.
1970: 28. 6. Impresso.
40. Heffernan (Inner-City 60).
41. Heffernan (Inner-City 74).
42. Hervey (7).
43. Dyer (62).
44. Heffernan (Inner-City 9).
45. Ernest Dickerson foi o segundo operador de câmera nesse filme,
de acordo com Mark Reid em Black Lenses, Black Voices: African
American Film Now. Lanham, MD: Rowman & Littlefield, 2005. 76.
Impresso. Dickerson, um afro-estadunidense iria ser aclamado
como cinematógrafo e/ou diretor de fotografia e diretor pelos
filmes O irmão que veio de outro planeta, Contos da escuridão,
Contos do além, Def by Temptation, Bones e Mestres do terror,
para nomear alguns.
46. Horror Hound Weekend, 26-28 mar. 2010. 7202 East 21st Street,
Indianápolis, in, 46219.
47. Dyer (62-63).
48. Não encontrei nenhuma indicação de que as escalações de
Eugene Clark eram feitas sem considerar as cores dos atores.
49. Dyer (59, 62-63). Em Terra dos mortos, o elenco é
particularmente diverso. Embora existam negros vivendo na
restrita comunidade de condomínios fechados, uma comunidade
em que “latinos” não são permitidos, o investimento em
classismo e em branquitude com afetação e iluminação é deixado
bem claro.
50. Winokur, Mark. “Technologies of Race: Special Effects, Fetish,
Film and the Fifteenth Century”. Genders OnLine Journal 40
(2004): 6. Web. 20 jan. 2006.
www.genders.org/g40/g40_winokur.html.
51. Mailer, Norman. “The White Negro” (outono, 1957).
LearnToQuestion.com: Resource Base 2008, n.p. Web. 20 jun.
2010. www.learntoquestion.com/resources/database/archives/0.
52. Goldsby (247).
53. Heffernan (Inner-City 75).

5 GRITE, BRANQUELO, GRITE — RETRIBUIÇÃO,


MULHERES DURONAS E CARNALIDADE: OS ANOS
1970
1. Holly, Ellen. “Where Are the Films about Real Black Men and
Women?”. New York Times, 2 jun. 1974: 127. Impresso.
2. Site da Motion Picture Association of America. Motion Picture
Association, 2005. Web. 2 abr. 2010. O Código Hays (1930-66),
que apresentava princípios organizativos para cineastas dos
Estados Unidos associados a grandes estúdios, advertia contra
coisas como: criticar religiões, exibir partos, exibir beijos
“lascivos” ou dança “sugestiva”. Esses princípios foram
substituídos por um sistema de classificação voluntário em 1968,
que mudou três vezes entre o ano de sua implementação e 1983:
G, M, R, X; G, GP, R, X; E G, PG, R, X. Houve ainda mais revisões
desde o início dos anos 1980.
3. Young, Elizabeth. Black Frankenstein: The Making of an American
Metaphor. Nova York: Routledge, 2008. 219. Impresso. Em 1977,
uma história em quadrinhos chamada Blackenstein “apresentou
um branco dono de escravos do Kentucky, o coronel Victah
Black’nstein, que monta um escravo-negro-monstro”; o livro de
1976, The Slave of Frankenstein, “apresenta o filho de Victor
Frankenstein como um abolicionista branco que desafia um
monstro perverso pró-escravidão”; George Clinton/Parliament
lançou, em 1977, “The Clones of Dr. Funkenstein,” com foco na
criação de um doutor negro do funk.
4. Denzin, Norman K. Reading Race. Londres: Sage, 2002. 27.
Impresso.
5. Bogle, Donald. Toms, Coons, Mulattoes, Mammies, & Bucks. Nova
York: The Continuum Publishing Company, 1993. 232. Impresso.
6. Crane, Jonathan. Terror and Everyday Life. Thousand Oaks, CA:
Sage Publications, 1994. 48. Impresso.
7. Benshoff, Harry M. “Blaxploitation Horror Films: Generic
Reappropriation or Reinscription?”. Cinema Journal 39(2) (2000):
34. jstor. Web. 20 jan. 2005. http://www.jstor.org/pss/1225551.
8. Null, Gary. Black Hollywood: The Negro in Motion Pictures.
Secaucus, NJ: Citadel Press, 1975. 209. Impresso.
9. Leab, Daniel J. From Sambo to Superspade: The Black Experience
in Motion Pictures. Boston, MA: Houghton Mifflin Company, 1975.
254. Impresso.
10. Null (209).
11. Holly (127).
12. De acordo com Eric Shaefer em sua dissertação Bold! Daring!
Shocking! True!: A History of Exploitation Films, 1919-1959, os
filmes apelativos surgiram durante a “era clássica”, 1919 a 1959,
em paralelo ao cinema de Hollywood, mas também eram feitos
por fora, por produtores independentes. Os filmes, escreve
Schaefer, estavam “enraizados em ‘atrações de cinema’
exibicionistas e dependiam do espetáculo proibido à custa do
sistema mais caro de continuidade narrativa e coerência
favorecido pelos filmes mainstream”. Shaefer, Eric. Bold! Daring!
Shocking! True!: A History of Exploitation Films, 1919-1959.
Austin: University of Texas, 1995. Dissertação. Impresso.
13. Benshoff (37).
14. Rhines, Jesse Algeron. Black Film/White Money. New Brunswick,
NJ: Rutgers University Press, 1996. 46. Impresso.
15. Worland, Rick. The Horror Film: An Introduction. Malden, MA:
Blackwell, 2007. 97. Impresso.
16. Benshoff (34).
17. No filme, Luva é sepultada com seu príncipe. Sua morte não é
mostrada.
18. No filme, é explicado que Drácula foi morto por seu nêmesis, dr.
Van Helsing.
19. Sharrett, C. “The Horror Film in Neoconservative Culture”.
Journal of Popular Film and Television 21:3 (outono, 1993): 107.
Impresso.
20. Sharrett (“Neoconservative” 107).
21. Sharrett (“Neoconservative” 100-110).
22. Wlodarz, Joe. “Beyond the Black Macho: Queer blaxploitation”.
The Velvet Light Trap 53 (primavera, 2004): 11. Web. 20 jan.
2006. http://muse.jhu.edu/login?
uri=/journals/the_velvet_light_trap/v053/53.1wlodarz.html.
23. Gateward, Frances. “Daywalkin’ Night Stalkin’ Bloodsuckas:
Black Vampires in Contemporary Film”. Genders OnLine Journal 40
(2004): 10. Web. 20 jun. 2005.
www.genders.org/g40/g40_gateward.html.
24. Medovoi, L. “Theorizing Historicity, or the Many Meanings of
Blacula”. Screen 39 (1998): 14. Impresso.
25. Baldwin, J. Notes of a Native Son. Boston: Beacon Press,
1955/1984. 115, 122. Impresso.
26. Young (Black Frankenstein 189).
27. Medovoi (14).
28. Benshoff (36).
29. Lawrence, N. “Fear of a blaxploitation Monster: Blackness as
Generic Revision in AIP’s Blacula”. Film International 39 (2009):
24. Impresso.
30. Lawrence (18).
31. Stenger, Josh. “Mapping the Beach: Beach Movies, Exploitation
Film and Geographies of Whiteness”. Classic Hollywood, Classic
Whiteness. Ed. Daniel Bernardi. Mineápolis: University of
Minnesota Press, 1996. 31. Impresso.
32. Gent, G. “Black Films Are In, So Are Profits”. New York Times, 28
jul. 1972: 22. Impresso.
33. Gent (22).
34. Stenger (31). A AIP também é responsável pela distribuição de
muitos outros filmes da “era blaxploitation”, como Black Mama,
White Mama (1973), The Mack (1973), Coffy: em busca de
vingança (1973), Inferno no Harlem (1973), Foxy Brown (1974),
Truck Turner (1974), Sheba, Baby (1975), Cornbread, Earl, and Me
(1975), Cooley High (1975) e Friday Foster (1975).
35. Stenger (46).
36. Lawrence (18).
37. Young (Black Frankenstein 190).
38. Young (Black Frankenstein 191).
39. Young (Black Frankenstein 196).
40. O documentário The 50 Worst Movies Ever Made (2004) cita O
monstro de duas cabeças. O documentário em DVD foi produzido
por Dante Pugliese para o estúdio Passport Video. O filme é
frequentemente incluído em várias listas feitas por fãs do terror,
como visto em Blackhorrormovies.com.
41. Worland (97).
42. No filme, não fica explícito que a casa é localizada numa
vizinhança branca, nem que as limpezas que sua mãe faz são
para prostitutas brancas. Em vez disso, o dr. Pryde faz alusão às
cores das prostitutas ao chamá-las ironicamente de “damas da
noite”, enquanto prostitutas negras que trabalham na rua são
“putas” e “vadias”. Elas não trabalham em bordéis. Além disso, o
filme se esforça em mostrar uma grande diferença
socioeconômica entre Watts e o local em que o dr. Pryde mora,
mostrando sequências que intercalam as vizinhanças. As casas
ficam maiores, os carros, melhores, as ruas, mais limpas, e os
rostos negros desaparecem.
43. “Domestic Violence: Domestic Violence in the African American
Community”. Nabsw.org. National Association of Black Social
Workers, 2002. Web. 9 abr. 2010.
44. Cleaver, Eldridge. Soul on Ice. Nova York: Dell Publishing, 1968.
191. Impresso.
45. Cleaver (28).
46. Pinedo, Isabel Cristina. Recreational Terror: Women and the
Pleasure of Horror Film Viewing. Albany, NY: SUNY Press, 1997. 53.
Impresso.
47. Wallace, Michele. Black Macho and the Myth of the Superwoman,
Nova York: Verso Classics, 1999. 66. Impresso.
48. Wallace (67).
49. Bogle (Toms, Coons 240).
50. Esta cena é uma precursora da decisão vida-por-meio-da-morte
feita pelas personagens Thelma e Louise no filme de mesmo
nome.
51. Clover, Carol. Men, Women, and Chainsaws: Gender in the
Modern Horror Film. Princeton, NJ: Princeton University Press,
1992. 35. Impresso.
52. Clover (Chainsaws 37).
53. Clover (Chainsaws 39).
54. Claro, quando esses filmes se tornaram franquias, não houve
mais paz.
55. Diawara, Manthia e Phyllis Klotman. “Ganja and Hess: Vampires,
Sex, and Addictions”. Black American Literature Forum 25.2
(1991): 299. Jstor. N.p. Web. 21 jun. 21 2005. http://jstor.org/.
Diawara e Klotman citam outros elogios ao filme. De acordo com
os autores, a produção foi saudada no Amsterdam News como “o
filme mais importante produzido por negros desde Sweet
Sweetback’s Baadasssss Song”, e também é descrito como “um
grande filme negro underground […]. Se Sweet Sweetback é
Native Son, Ganja and Hess é o Homem invisível”.
56. Diawara e Klotman (300).
57. Hasan, Mark. “Ganja & Hess [Review]”. Rue Morgue (2007): 47.
Impresso.
58. Sharrett (“Neoconservative Culture” 100).
59. Diawara e Klotman (299).
60. Black Mama, White Mama (1973); Coffy (1973); Os gritos de
Blácula (1973); Foxy Brown (1974); Sheba, Baby (1975);
Bucktown (1975); Friday Foster (1975).
61. Dunn, S. ‘Baad Bitches’ and Sassy Supermamas: Black Power
Action Films. Urbana and Chicago: University of Illinois Press,
2008. 109. Impresso.
62. Hill Collins, Patricia. Black Feminist Thought. Nova York:
Routledge, 2009. 91. Impresso.
63. Hill Collins (89).
64. Dunn (111).
65. Dunn (113).
66. Lawrence (18).
67. Clover (Chainsaws 65).
68. Bogle (Toms, Coons 252-253).
69. Clover (Chainsaws 35, 36).
70. Em relação a O exorcista, a Warner Bros. achou que o filme
serviu mais do que apenas um molde para o filme de terror negro
Abby, e a corte concordou.
71. Benshoff (40).
72. Weiler, A.H. (1974). “‘Abby’, About a Black Family and Exorcism”.
New York Times, 26 dez. 1974: 53. Impresso.
73. Sharrett, Christopher. Mythologies of Violence in Postmodern
Media. Detroit, MI: Wayne State University Press, 1999. 103.
Impresso.
74. “Black-oriented Films Produced since Mid-1970s”. Jet 42 (1972):
58-59. 58. Impresso.
75. Guerrero, E. Framing Blackness: The African American Image in
Film. Filadélfia, PA: Temple University Press, 1993. 86. Impresso.
76. Dunn.
77. Semedi é um guardião dos mortos, um “grande amante” e um
espírito avarento que valoriza o dinheiro, presentes e mulheres.
No filme, seu nome é pronunciado como Barão Samdi.
78. Benshoff (32).
79. Murray, J. “Now a Boom in Black Directors”. The New York Times,
8 jun. 1972: D11. Impresso.
80. Harris, M. “Scary Sistas: A Brief History of Black Women in Horror
Films”. Prettyscary. net. Pretty Scary: For Women in Horror By
Women in Horror, 4 jun. 2006. Web. 17 mar. 2010.
81. Yearwood, Gladstone L. Black Film as a Signifying Practice:
Cinema, Narration and the African-American Aesthetic Tradition.
Trenton, NJ: Africa World Press, Inc., 2000. 44. Impresso.
82. Null (219).
83. Marlene Clark se tornou um ícone do terror, aparecendo em
Ganja & Hess e A fera deve morrer, assim como em outros dois
filmes filipinos de língua inglesa, A mulher cobra (1972) e Black
Mamba (1974).
84. Benshoff (39).
85. Rudy Ray Moore. “Petey Wheatstraw, the Devil’s Son-in-Law”.
The Cockpit. Kent Comedy Series, 1973. CD.
86. O seriado Kung Fu (1972-1975) apresenta um jovem estudante
de artes marciais chamado “Gafanhoto”, que é treinado por seu
Mestre Shaolin, Po.
87. Rudy Ray Moore, no documentário Macked, Hammered,
Slaughtered, and Shafted (2004).
88. Cripps, Thomas. Black Film as Genre. Bloomington: Indiana
University Press, 1978. 129. Impresso.
89. Cripps (Genre 129).
90. George, N. Blackface: Reflections on African Americans in the
Movies. Nova York: Harper Collins, 1994. 87. Impresso.
91. West, Hollie I. “Black Films: Crossovers and Beyond
blaxploitation”. Washington Post, 8 fev. 1976: 119. Impresso.
92. West (119).
93. West (119).
94. West (119).

6 NÓS SEMPRE MORREMOS PRIMEIRO —


INVISIBILIDADE, SEGREGAÇÃO RACIAL
ECONÔMICA E O SACRIFÍCIO VOLUNTÁRIO: OS
ANOS 1980
1. Nama, Adilifu. Black Space: Imagining Race in Science Fiction
Film. Austin: University of Texas Press, 2008. 137. Impresso.
2. Sobchack, Vivian. “Cities on the Edge of Time: The Urban Science
Fiction Film”. East-West Film Journal (dez., 1988): 4-19. Impresso.
3. Avila, Eric. “Dark City: White Flight and the Urban Science Fiction
Film in Postwar America”. Classic Hollywood, Classic Whiteness.
Ed. Daniel Bernardi. Mineápolis: University of Minnesota Press,
2001. 68. Impresso.
4. Avila (53).
5. Venkatest, Sudhir Alladi. American Project: The Rise and Fall of a
Modern Ghetto. Cambridge, MA: Harvard University Press, 2000.
7. Impresso.
6. Até mesmo a música pop explorou a moda, com Paul McCartney
e Stevie Wonder se unindo para cantar “Ebony and Ivory” (1982),
uma ode ao trabalho em conjunto entre raças.
7. Guerrero, E. “The Black Images in Protective Hollywood’s Biracial
Buddy Films of the Eighties”. Black American Cinema. Ed. M.
Diawara. Nova York: Routledge, 1993. 237. Impresso.
8. Avila (65).
9. Jamieson, Kathleen Hall. “Context and the Creation of Meaning in
Advertising of the 1988 Presidential Campaign”. American
Behavioral Scientist 32 (1989): 416, 417. Impresso.
10. Crane, Jonathan. Terror and Everyday Life: Singular Moments in
the History of the Horror Film. Thousand Oaks, CA: Sage, 1996. 8.
Impresso.
11. Benjamin, Rich. Searching for Whitopia: An Improbable Journey
to the Heart of White America. Nova York: Hyperion, 2009. 1.
Impresso.
12. Clover, Carol. Men, Women e Chainsaws: Gender in the Modern
Horror Film. Princeton, NJ: Princeton University Press, 1992. 222.
Impresso.
13. Mathijs, Ernest. “Threat or Treat: Film, Television, and the Ritual
of Halloween”. Flow TV, University of Texas at Austin, 30 out.
2009. Web. 6 mar. 2010.
14. Crane, Jonathan. Terror and Everyday Life. Thousand Oaks, CA:
Sage Publications, 1994. 8. Impresso.
15. Rathgeb, Douglas L. “Bogeyman from the Id: Nightmare and
Reality in Halloween and A Nightmare on Elm Street”. Journal of
Popular Film and Television (primavera, 1991): 36-43. Impresso.
16. Riley, Michael J. “Trapped in the History of Film: Racial Conflict
and Allure in The Vanishing American”. Hollywood’s Indian: The
Portrayal of the Native American in Film. Eds. Peter C. Rollins e
John E. O’Connor. Lexington: The University of Kentucky Press,
1998. 64. Print.
17. Maddery, Joseph. Nightmares in Red, White, and Blue: The
Evolution of the American Horror Film. Jefferson, NC: McFarland &
Company, Inc., 2004. 71. Impresso. Isso pontua que o filme falava
mais mais sobre a situação financeira complicada da família do
que sobre fantasmas. Ou seja, suas vidas já eram perturbadas
muito antes dos horrores aparecerem, já que eles haviam
investido tudo o que tinham na casa. O estresse os deixa
nervosos e vulneráveis.
18. Maddery (73).
19. Freeman, Lance. There Goes the ’Hood: Views of Gentrification
from the Ground Up. Filadélfia, PA: Temple University Press, 2004.
51. Impresso.
20. Em 1975, a banda de funk e soul Parliament lançou o álbum
Chocolate City. A faixa-título fala sobre Washington, D.C., como
uma “cidade de chocolate”, isto é, com uma população
predominantemente negra, e não apenas a população, mas sua
cultura, política e recursos. Também reconhece o aumento dos
subúrbios “de baunilha”.
21. Williams, Tony. “Trying to Survive on the Darker Side: 1980s
Family Horror”. The Dread of Difference: Gender and the Horror
Film. Ed. Barry Keith Grant. Austin: University of Texas Press,
1996. 164. Impresso.
22. Nas sequências de filmes de terror com negros no final da
década, muito criticados pela crítica, há personagens negros de
menor importância que chegam vivos até o fim do filme, como
em A hora do pesadelo 3: os guerreiros dos sonhos (1987) ou
Tubarão 4: a vingança (1987).
23. As imagens são estranhamente incongruentes para o
personagem de Dick; entretanto, elas funcionam para reafirmar
que seu interesse em Danny é “seguro” e assexuado.
24. Pinedo, Isabel Cristina. Recreational Terror: Women and the
Pleasure of Horror Film Viewing. Albany, NY: SUNY Press, 1997. 53.
Impresso.
25. Hughey, Matthew. “Cinethetic Racism: White Redemption and
Black Stereotypes in ‘Magic Negro’ Films”. Social Problems 56
(2009): 544. Impresso.
26. Hicks, Heather J. “Hoodoo Economics: White Men’s Work and
Black Men’s Magic in Contemporary American Film”. Camera
Obscura 53 (18) (2003): 18. Impresso.
27. Hicks, Heather J. (28).
28. Clover (Chainsaws 86).
29. Heffernan, Kevin. Ghouls, Gimmicks, and Gold: Horror Films and
the American Movie Business, 1953-1968. Durham, NC: Duke
University Press, 2004. 225. Impresso.
30. Heffernan (Ghouls 225).
31. Mesbur + Smith Architects. Multiplex Cinema and Theater
Architecture. Web. 29 maio 2008.
32. Harris, Martin. “You Can’t Kill the Boogeyman: Halloween III and
the Modern Horror Franchise”. Journal of Popular Film and
Television 32(3) (outono, 2004): 98. Impresso.
33. Crane (3).
34. Mercer, Kobena. “Monster Metaphors: Notes on Michael
Jackson’s ‘Thriller’”. Screen 27 (1986): 31. Impresso.
35. “The Academy of Science Fiction Fantasy & Horror Films”. Saturn
Awards. Web. 26 jan. 2010. saturnawards.org.
36. Lapeyre, Jason. “The Transformation: Filmmaker John Landis
Created a Monster with Michael Jackson’s Thriller”. Wax Poetics
37 (out.-nov. 2009). 77. Impresso.
37. Certamente os anos 1950 não eram apenas sobre bailes para
afro-estadunidenses, que estavam lutando por seus direitos civis.
38. Jones, Steve. “Michael King of Pop dies; Music icon, 50, helped
shape a generation”. USA Today, 26 jun. 2009. Web. 6 mar. 2010.
usatoday. com.
39. Lapeyre (77).
40. “MTV Video Music Awards”. MTV.com. Web. 26 jan. 2010.
mtv.com.
41. Lapeyre (78).
42. Avila, Eric. “Dark City: White Flight and the Urban Science Fiction
Film in Postwar America”. Classic Hollywood Classic Whiteness.
Ed. Daniel Bernardi. Mineápolis: University of Minnesota Press,
2001. 59. Impresso.
43. “MTV Music Television Profile”. Web. 26 jan. 2010.
cabletvadbureau.com.
44. Skal, David J. The Monster Show: A Cultural History of Horror. Ed.
revisada. Nova York: Faber and Faber, Inc., 2001. 230. Impresso.
45. Skal (318). Mercer (40) também faz uma analogia desse tipo a
Chaney.
46. Mercer (29).
47. O jardineiro imediatamente reconhece que o cachorro é um “cão
branco”, um cachorro treinado para atacar negros. Ele revela que
tais cães são comuns, mostrando cicatrizes de um ataque de
anos atrás.
48. O filme na ficção Chien Blanc (1970), escrita por Romain Gary. O
livro, escrito em francês, é uma acusação aos liberais brancos
(especialmente celebridades de Hollywood) que participaram do
Movimento pelos Direitos Civis nos anos 1960.
49. Scott, Vernon. “Minority Group Wins Cancellation of Television
Movie”. UPI Hollywood Reporter, 12 jan. 1984: seção Domestic
News. Impresso.
50. “NBC Drops Plan to Show Film ‘White Dog’”. New York Times, 20
jan. 1984: seção C23. Impresso.
51. Katzman, Lisa. “‘White Dog’ Is Set Loose at Last”. New York
Times, 7 jul. 1991: seção 2.17. Impresso.
52. Katzman (seção 2.17).
53. Hicks, Chris. “Wide Release of ‘White Dog’ Is Long Overdue”.
Deseret News, 23 jan. 2009. Web.
www.deseretnews.com/article/705279597/Widerelease-of-White-
Dog-is-long-overdue.html.
54. Em 2009, o filme foi lançado em DVD.
55. Guerrero, Edward. “AIDS as Monster in Science Fiction”. Journal
of Popular Film & Television 18.3 (outono, 1990): 88. Impresso.
56. Doherty, Thomas. “Genre, Gender, and the Aliens Trilogy”. The
Dread of Difference: Gender and the Horror Film. Ed. Barry Keith
Grant. Austin: University of Texas Press, 1996. 181-199. Impresso.
57. Clover, Carol J. “Her Body, Himself: Gender in the Slasher Film”.
The Dread of Difference: Gender and the Horror Film. Ed. Barry
Keith Grant. Austin: University of Texas Press, 1996. 79. Impresso.
58. Hutchings, Peter. The Horror Film. Londres: Pearson, 2004. 18.
Impresso.
59. Guerrero (“AIDS”).
60. Sharrett, Christopher. “The Horror Film in Neoconservative
Culture”. Journal of Popular Film & Television 21.3 (outono, 1993):
100-110, 108. Impresso.
61. Hudson, Dale. “Vampires of Color and the Performance of
Multicultural Whiteness”. The Persistence of Whiteness: Race and
Contemporary Hollywood Cinema. Ed. Daniel Bernardi. Nova York:
Routledge, 2008. 134. Impresso.
62. Pinedo (111).
63. Crane (9).
64. Foley, Kevin. “Spike Lee Speaks to Spring Fest”. The University
of Vermont, University Communications 24 (abr. 2002). Web. 5
jan. 2010. www.uvm.edu/~uvmpr/?Page=article.php&id=409.
65. Sharrett (“The Horror Film” 100).
66. Snead, James. White Screens, Black Images: Hollywood from the
Dark Side. Nova York: Routledge, 1994. Impresso.
67. Neale, Steve. “Masculinity as Spectacle: Reflections on Men and
Mainstream Cinema”. Screen 24(6): 2-17. 19. Impresso.
1. Harris, Mark. “Yelling at the Screen: The Black Die Young”.
PopMatters, 6 set. 2005. 1999-2009 PopMatters.com. 13 ago.
2010.

7 ESTAMOS DE VOLTA! A VINGANÇA E O TERRENO


URBANO: OS ANOS 1990
1. Abbott, Stacey. “High Concept Thrills and Chills: The Horror
Blackbuster”. Horror Zone. Ed. Ian Conrich. Londres: I. B. Tauris,
2010. 29. Impresso.
2. Abbott (29).
3. Ndalianis, Angela. “Dark Rides, Hybrid Machines and the Horror
Experience”. Horror Zone. Ed. Ian Conrich. Londres: I. B. Tauris,
2010. 1. Impresso.
4. Kaufmann faz esses comentários em uma mensagem do
presidente (que são frequentes na Troma Entertainment) no início
do lançamento do VHS de Temptation. Def by Temptation. Dir.:
James Bond III. Atuação: James Bond III, Cynthia Bond, Samuel L.
Jackson. Bonded Filmworks, 1990. Filme. Como Jones explica de
forma sucinta, “existem filmes ruins e existem filmes Troma”. Não
é difícil ser o melhor na Troma. Essa é a companhia que troca
filmes “por amendoins” e já começa a “contar o dinheiro”. Ver:
Jones, Alan. The Rough Guide to Horror Movies. Londres: Penguin,
2005. 42. Impresso. Ainda assim, Def By Temptation é um filme
benfeito, esperto e parece deslocado em meio aos filmes de
terror apelativos da Troma.
5. Reid, Mark A. Black Lenses, Black Voices: African American Film
Now. Lanham, MD: Rowman & Littlefield, 2005. 66. Impresso.
6. De acordo com Gregory M. Herek, “entre março e abril de 1989,
o San Francisco Examiner encomendou, com os associados da
Teichner, entrevistas por telefone para uma amostragem da
população de gays e lésbicas (n = 400), assim como uma
amostragem dos gays residentes na área da baía de São
Francisco (n = 400). Aproximadamente 27 mil ligações foram
feitas e obtidas oitocentas respostas; 6.2% dos entrevistados
nacionais e 10% dos entrevistados na área da baía de São
Francisco se identificaram como lésbicas, gays ou bissexuais
(Herek). Embora a amostragem seja tendenciosa, pois nem todos
os entrevistados se sentiram confortáveis em responder à
pergunta por telefone, o resultado apresentou o primeiro estudo
desse tipo publicado nos Estados Unidos”. Ver: Herek, Gregory M.
“Stigma, Prejudice, and Violence Against Lesbians and Gay Men”.
Homosexuality: Research Implications for Public Policy. Eds. John
C. Gonsiorek e James D. Weinrich. Newbury Park, CA: Sage, 1991.
60-61. Impresso.
7. Em O sangue de Jesus, de Spencer Williams, Martha está
igualmente deslocada, e sua tentação, Judas, precisa até mesmo
prover trajes adequados para ela.
8. Hill Collins, Patricia. Black Feminist Thought. Nova York:
Routledge, 2009. 197-198. Impresso.
9. Picart, Caroline Joan e Cecil E. Greek. “The Compulsions of
Real/Reel Serial Killers and Vampi res: Toward a Gothic
Criminology”. Monsters in and Among Us: Toward a Gothic
Criminology. Eds. Caroline Joan Picart e Cecil E. Greek. Cranbury,
NJ: Associated University Presses, 2007. 236. Impresso.
10. Gateward, Frances. “Daywalkin’ Night Stalkin’ Bloodsuckas:
Black Vampires in Contemporary Film”. Genders Online Journal 40
(2004): n.p. Web. 19 jul. 2010.
www.genders.org/g40/g40_gateward.html.
11. Harrington, Richard. “Def by Temptation”. Washington Post, 5
jun. 1990. Web. 20 jul. 2010. www.washingtonpost.com/wp-
srv/style/longterm/movies/videos/defbytemptationrharrington_a0
aae9.htm.
12. Harrington.
13. Guerrero, Ed. “Framing Blackness: The African American Image
in Film”. Filadélfia, PA: Temple University Press, 1993. 179.
Impresso.
14. Yearwood, Gladstone L. Black Film as a Signifying Practice:
Cinema, Narration and the African-American Aesthetic Tradition.
Trenton, NJ: Africa World Press, Inc., 2000. 135. Impresso.
15. Yearwood (113).
16. Avila, Eric. “Dark City: White Flight and the Urban Science Fiction
Film in Postwar America”. Classic Hollywood, Classic Whiteness.
Ed. Daniel Bernardi. Mineápolis: University of Minnesota Press,
2001. 53. Impresso.
17. Forman, Murray. The ’Hood Comes First: Race, Space, and Place
in Rap and Hip-Hop. Middletown, CT: Wesleyan University Press,
2002. 65. Impresso.
18. Welch, William M. “Former Senator Thurman Dies”. USA Today,
26 jun. 2003. Web. 12 ago. 2010.
www.usatoday.com/news/washington/2003-06-26-strom_x.htm.
19. Ver: “Jesse Helm’s ‘Hands’ Ad”. YouTube.com. YouTube, LLC,
2010. Web. 9 ago. 2010.
20. Pinedo, Isabel Christina. Recreational Terror: Women and the
Pleasures of Horror Film Viewing. Albany, Nova York: SUNY Press,
1997. 128. Impresso.
21. Denzin, Norman K. Reading Race. Londres: Sage, 2002. 112.
Impresso.
22. A NWA se descreve como uma “gangue” em sua música
“Straight Outta Compton” (1988).
23. Fulmer, J. “Men Ain’t All” — A Reworking of Masculinity in Tales
from the Hood, or, Grandma Meets the Zombie”. Journal of
American Folklore 115(457/458) (2002): 423. Impresso.
24. “Demon Knight”. IMDb.com. Box Office Mojo, s.d. Web. 23 jul.
2010. Ver também: Reid (Black Lenses 69).
25. “Def by Temptation”. IMDb.com. Box Office Mojo, s.d. Web. 23
jul. 2010.
26. Para uma estimativa das finanças, ver: “Vampire in Brooklyn”.
IMDb.com. Box Office Mojo, s.d. Web. 23 jul. 2010. Ebert, Robert.
“Vampire in Brooklyn”. Chicago Sun-Times , 27 out. 1995. Web. 20
jul. 2010. Para uma compilação de resenhas do filme, ver:
“Vampire in Brooklyn”. Metacritic. CBS Interactive Inc., 2010.
Web. 20 jul. 2010.
27. Hutchings, Peter. The Horror Film. Essex, Inglaterra: Pearson,
2004. 109. Impresso.
28. Com um furo significativo de roteiro, nunca é explicado quem
são essas mulheres, ou o que elas são. Só ficamos sabendo que
elas têm poderes em virtude de rituais religiosos e que podem
falar com os mortos e expulsar espíritos maus. Nos créditos, uma
dessas mulheres é listada como uma sacerdotisa iorubá, mas o
filme não confirma essa informação.
29. Yearwood (95).
30. Scott, Ellen C. “The Horrors of Remembrance: The Altered Visual
Aesthetic of Horror in Jonathan Demme’s Beloved”. Genders On-
Line Journal 40 (2004): 6. Web. 8 ago. 2010.
31. Wardi, Anissa J. “Freak Shows, Spectacles, and Carnivals:
Reading Jonathan Demme’s Beloved”. African American Review
39 (inverno, 2005): 513. Impresso.
32. Scott, Ellen.
33. Wardi (525).
34. Em O predador (1987), as vítimas são pessoas de pele escura —
geralmente sul-americanas.
35. Pinedo (112-113).
36. Baseado na história de Clive Barker, “The Forbidden”, presente
na coletânea Books of Blood. Londres: Penguin Group, 1984. A
história se passa na Inglaterra moderna e não tem um enfoque
negro. Fazer de Candyman um homem negro foi ideia de Rose.
37. Lott, Eric. Spirit of the Ghetto: Postindustrial City Space and the
Specter of Race. American Research Seminar, University of Leeds.
Leeds, Reino Unido, 5 fev. 2007. Palestra.
38. Candyman. Dir.: Bernard Rose. Atuação: Tony Todd, Virginia
Madsen, Xander Berkeley. Edição especial. Polygram, 1992. DVD.
39. Pinedo (131).
40. Contudo, era Candyman quem os fãs amavam, e ele retornou
em três outros filmes. Candyman: dia dos mortos (1999) foi
lançado diretamente em DVD. No momento em que escrevo este
livro, há rumores sobre um quarto filme, com o título Candyman:
The Tribe.
41. Creed, Barbara. The Monstrous-Feminine: Film, Feminism,
Psychoanalysis. Londres: Routledge, 1993. 69. Impresso.
42. Helbig, Bob e Mark Edmund. “Family of Konerak Sues City”.
Milwaukee Journal, 20 jan. 1995. NEWS: 1. NewsBank. Web. 12
ago. 2010; Stanford, Gregory D. “A Paper Trail of Intolerance”.
Milwaukee Journal, 25 jan. 1995. OPED: 11. NewsBank. Web. 12
ago. 2010; Davis, Don. The Milwaukee Murders: Nightmare in
Apartment 213-The True Story . Nova York: St. Martin, 1995.
Impresso.
43. Oates, Joyce. Zombie. Nova York: Plume, 1996. Impresso.
44. Crane, Jonathan. Terror and Everyday Life: Singular Moments in
the History of the Horror Film. Thousand Oaks, CA: Sage, 1994.
113. Impresso.
45. O héroi negro Hancock (Will Smith) tem um destino parecido em
Hancock (2008). No filme, o personagem dá adeus à ex-esposa e
à vida suburbana. Ele poder viver em qualquer lugar, desde que
não seja perto dela, pois seus poderes se anulam, e então ele
acaba indo para as ruas mais sujas de Nova York.
46. Sobchack, V. “Bringing It All Back Home: Family Economy and
Generic Exchange”. The Dread of Difference: Gender and the
Horror Film. Ed. B.K. Grant. Austin: University of Texas Press,
1996. 150. Impresso.
47. Hutchings (109).
48. Sharrett, Christopher. “The Horror Film in Neoconservative
Culture”. Journal of Popular Film and Television 21 (outono, 1993):
107. Impresso.
49. Abbott (39).
50. Schneider, Steven Jay. “Mixed Blood Couples: Monsters and
Miscegenation in U.S. Horror Cinema”. The Gothic Other: Racial
and Social Constructions in the Literary Imagination. Eds. Ruth
Bienstock Anolik e Douglas L. Howard. Jefferson, NC: McFarland &
Co, Inc., 2004. 85. Impresso.
51. Sharrett (104).
52. Jones, Alan (46).

1. Benjamin, Walter. “A Small History of Photography”. One-Way


Street and Other Writings. Ed. Edmund Jephcott e Kingsley
Shorter. Londres: NLB, 1979. 256. Impresso.

CONCLUSÃO
1. De acordo com o site Box Office Mojo.com, a bilheteria
doméstica total de A bruxa de Blair (1999) foi de 140.539.009
milhões de dólares, enquanto Serpentes a bordo (2006) teve uma
bilheteria doméstica total de 34.020.184 milhões. “A bruxa de
Blair”. “Serpentes a Bordo”. Box Office Mojo.com. IMDb.com Inc.,
s.d. Web. 10 ago. 2010.
2. Esses remakes aconteceram junto do aumento da serialização.
Por exemplo, oito filmes da franquia Halloween foram feitos antes
que o diretor Rob Zombie recomeçasse seu Halloween. O efeito
narrativo da serialização fez com que a audiência começasse a
pensar que, independentemente do que acontecesse, o monstro
nunca morreria realmente, uma ferramenta considerada um
clichê, uma tapeação usada como desculpa para fazer mais
filmes, além de uma inovação pós-moderna que prejudica a
morte ou até mesmo o (anti)heroísmo.
3. Bowles, Scott. “Horror Glut Killing off Part of the Pack”. USA
Today, 30 abr. 2007: D1. Impresso.
4. Hutchings, Peter. The Horror Film. Essex, Inglaterra: Pearson,
2004. vii. Impresso.
5. Fischoff, Stuart, Joe Antonio e Diane Lewis. “Favorite Films and
Film Genres as a Function of Race, Age, and Gender”. Journal of
Media Psychology 3.22 (inverno, 1998). Web. 10 ago. 2010.
6. Carvajal, Doreen. “How the Studios Used Children to Test-Market
Violent Films”. New York Times, 27 set. 2000: A1, A21. Impresso.
7. O teste foi recebido com protesto pela Federal Trade Commission
e pelo estúdio, embora a Motion Picture Association of America
tenha prometido repensar seus métodos. Ver: Carvajal, Doreen.
“How the Studios Used Children to Test-Market Violent Films”.
New York Times, 27 set. 2000: A1, A21. Impresso.
8. Giroux, Henry A. Fugitive Cultures: Race, Violence, and Youth.
Londres: Routledge, 1996. 55. Impresso.
9. Para uma extraordinária e compreensiva contabilidade de
“filmes negros” de terror e filmes de terror “com negros”, ver:
Mark Harris. Web. 25 jul. 2010. Blackhorrormovies.com. 2005-
2009.
10. “Are You Ready for Freddy?”, do grupo de rap Fat Boys, tocada
nos créditos finais. “A Nightmare on Elm Street 4: The Dream
Master”. IMDb.com, IMDb.com Inc., 1990-2010. Web. 12 ago.
2010.
11. É notável como atualmente o terror está repleto de todos os
tipos de caçadores de monstros negros (na sua maioria, homens),
especialmente em filmes lançados diretamente em DVD. Por
exemplo, Cidade dos vampiros (2001), coestrelado por Bokeem
Woodbine como um policial caçador de vampiros em um universo
alternativo, que, ironicamente, possui um vampiro como parceiro
na polícia. Vegas Vampires (2004) traz de volta ícones da era
blaxploitation dos anos 1970, Fred Williamson, Richard Roundtree
e Bernie Casey, que se juntam a estrelas conhecidas dos filmes
negros urbanos como Tiny Lister e Glenn Plummer, além do
rapper Kurupt, para atrair uma diversidade de público. O filme
Vampiros assassinos (2005) teve um orçamento bem apertado,
mas conseguiu atenção com a participação do ícone da
blaxploitation dos anos 1970 Rudy Ray Moore, e com uma arte de
capa no DVD que apresentava um personagem parecido com
Blade que sequer aparece no filme.
12. Jones, Eileen. “Will Smith’s Hancock Fiasco”. Alternet, 5 jul.
2008. Web. 25 jul. 2010.
www.alternet.org/story/90473/will_smith/27s_%27hancock%27_fia
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13. Há também Soy Leyenda (1967) e o filme de ficção científica A
batalha dos mortos (2007).
14. Harvey, Ben. Night of the Living Dead. Nova York: Palgrave
Macmillan, 2008. 10. Impresso.
15. Urban Gothic. Dir.: Michelle Palmer. Atuação: Ernest Dickerson,
Adam Simon. Automat Pictures, 2002. Filme.
16. “Bones”. Box Office Mojo.com.IMDb.com Inc., s.d. Web. 26 jul.
2010; “Bones”. IMDb.com, IMDb.com Inc., 1990-2010. Web. 26 jul.
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17. Urban Gothic. Dir.: Michelle Palmer. Atuação: Ernest Dickerson,
Adam Simon. Automat Pictures, 2002. Filme.
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19. Denzin, Norman K. Reading Race. Londres: Sage, 2002. 113.
Impresso.
20. Alexander, George. Why We Make Movies: Black Filmmakers Talk
about the Magic of Cinema. Nova York: Harlem Moon, 2003. 114.
Impresso.
21. As esperanças para o filme eram altas, com todos os envolvidos
no projeto esperando que o filme se tornasse uma franquia como
Crypt ou, mais recentemente, a série Todo mundo em pânico. O
objetivo extra, de acordo com o coprodutor Christopher Tuffin, era
“ousar com a combinação de humor e sanguinolência”. “Snoop
Scraps: Rapper to Produce/Star in Horror Pic”. Eurweb.com, 20
abr. 2006. Web. 25 jul. 2010.
22. Richards, Chris. “Va. Slayings Spur Harder Look at Horrorcore”.
Washington Post, 25 set. 2009. Washington Post Company. Web.
25 jul. 2010.
23. Na verdade, a qualidade de Now Eat é bem pequena, e Lynch faz
seu rap no quarto, num microfone de baixa qualidade. Logo,
precisei pegar as letras das músicas do CD da trilha sonora de
Now Eat. Ver: Brotha Lynch Hung. Now Eat. Siccmade Records,
2000. CD.
24. Bulwa, Demian. “Bay Area Suspect Allegedly Bludgeoned
Victims”. San Francisco Chronicle. Hearst Communications Inc.,
23 set. 2009. Web. 25 jul. 2010.
25. Arnold, Thomas K. “Coming Back for Seconds, Thirds …”. USA
Today, 26 set. 2005. Web. 26 jul. 2010. Além dos lançamentos em
todos os cinemas, há também os festivais de filmes e aluguéis
sob demanda.
26. Bick, Julie. “Attack of the Sequel King!”. Fast Company 77 (1 dez.
2003). 33. Impresso.
27. Goldstein, Gregg. “Filmmakers Take Direct Flight to DVD”.
Hollywood Reporter 393 (30 mar. 2006). 1, 10. Web. 26 jul. 2010.
28. Hoag, Christina. “Maverick Entertainment Reaches Direct-to-
Video Urban Movie Market”. Knight Ridder Tribune Business News,
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29. Kurutz, Steven. “The Star Rapper Paul Wall’s New Video: The
iPhone 3gs”. Wall Street Journal, 24 set. 2009. Web. 12 ago. 2010.
30. “Holla’ for Halloween: Urban Horror Film Weaves in Comedy for a
Scary Time”. Eurweb.com, 29 out. 2007. Web. 29 out. 2007.
31. Horror Dance Film Festival: escolha do diretor; Denver
International World Cinema Film Festival: melhor filme e melhor
ator; Chicago Horror Film Festival: melhor diretor (segundo lugar),
todos em 2006.
32. Sobchack, V. “Bringing It All Back Home: Family Economy and
Generic Exchange”. The Dread of Difference: Gender and the
Horror Film. Ed. Barry Keith Grant. Austin: University of Texas
Press, 1996. 148. Impresso.
33. Skal, David J. The Monster Show: A Cultural History of Horror. Ed.
revisada. Nova York: Faber and Faber, Inc., 2001. 294. Impresso.
34. Em Predador 2: a caçada continua, a heroína recebe uma valiosa
arma antiga. Alexa é marcada pelo predador como uma algo
“dele” — do seu time, parte de seu clã — no rosto.
35. Zimmerman, B. “Daughters of Darkness: The Lesbian Vampire on
Film”. The Dread of Difference: Gender and the Horror Film. Ed.
B.K. Grant. Austin: University of Texas Press, 1996. 385. Impresso.
36. No final do filme, o “branquelo” é mostrado com a máscara do
assassino na mochila, fazendo uma alusão de que talvez ele
tenha participado dos assassinatos ao lado de “Carlton”.
37. Fulmer, J. “‘Men Ain’t All’ — A Reworking of Masculinity in Tales
from the Hood, or, Grandma Meets the Zombie”. Journal of
American Folklore 115(457/458): 433. Impresso.
38. Fulmer (433).
39. Vencedor do New York International Independent Film and Video
Festival em 2006.
40. Barackula: The Musical. Dir.: Mike Lawson. Barackula.com, 2008.
Web. 25 jul. 2010.
41. Klein, Aaron e Brenda J. Elliott. The Manchurian President: Barack
Obama’s Ties to Communists, Socialists and Other Anti-American
Extremists. Washington, DC: World-NetDaily Books, 2010.
Impresso.
42. Jason Mattera on Obama Zombies. Simon and Schuster Videos.
YouTube.com. YouTube LLC, 2010. Web. 27 jul. 2010.
43. “Barakula Full Latex Mask”. Halloween Express.com, 1999-2010.
Web. 27 jul. 2010.
44. Delonas, Sean. Cartoon. New York Post, 18 fev. 2009: 12.
Impresso.
45. HorrorHound Weekend 2010, 26 mar. 2010. 11320 Chester Rd,
Cincinnati, oh 45246.
46. Watkins, Craig S. Representing: Hip Hop Culture and the
Production of Black Cinema. Chicago, il: The University of Chicago
Press, 1998. 24. Impresso.
47. HorrorHound Weekend 2010, 26 mar. 2010.
48. Gilroy, Paul. “Race Ends Here”. Ethnic and Racial Studies 41
(1998): 838-847. Impresso. St. Louis, Brett. “Post-Race/Post-
Politics? Activist-Intellectualism and the Reification of Race”.
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49. Ver também: Gallagher, Charles. “Color-Blind Privilege: The
Social and Political Functions of Erasing the Colorline in Post Race
America”. Race, Gender, Class 10 (31 out. 2003): 22. Web. 25 fev.
2008.
50. Hicks, Heather. “Hoodoo Economics: White Men’s Work and
Black Men’s Magic in Contemporary American Film”. Camera
Obscura 53 18 (2003): 28. Impresso.
51. “Scary Movie”. Box Office Mojo. com. IMDb.com Inc., s.d. Web.
10 ago. 2010.
52. Os Wayans não estão mais relacionados com a franquia Todo
mundo em pânico.
53. Em 1° de junho de 2009, um incêndio atingiu os estúdios da
Universal e consumiu o set de King Kong, destruindo um artefato
histórico que era também um monumento ao tratamento racista
dispensado aos negros.
54. Hobson, Janell. “Digital Whiteness, Primitive Blackness:
Racializing the ‘Digital Divide’ in Film and New Media”. Feminist
Media Studies 8 (2008): 111-126. Impresso.
55. Burnett, Charles. Comunicação pessoal, 29 jan. 2009.
56. Coakley, H. M. Comunicação pessoal, 27 nov. 2006.
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HORROR
NOIRE
AGRADECIMENTOS

Ao longo dos anos, vários amigos, colegas e até mesmo estranhos me


ajudaram a levar este projeto adiante ao me oferecer apoio e contribuição
com suas ideias. Me arrependo de não ser capaz de identificar cada um de
vocês aqui. Contudo, saibam disso: eu sou muito, muito grata por suas
pérolas de sabedoria.
Para minha mãe, Patty — a mulher que me ajudou a entender que lições
sobre o bem e o mal, consciência moral e despertar cultural podem ser
encontradas nos lugares mais improváveis. Patty continua a ser uma das
melhores e mais interessantes companhias no cinema desde sempre.
Eu nem posso começar a detalhar aqui o tremendo apoio que o meu
marido, Randy, me proporcionou. Ele leu cada trecho de pesquisa. Ele
vasculhou arquivos. Ele assistiu a cada filme. Ele criticou meus argumentos.
Ele foi incrivelmente heroico em seus esforços, se dedicando com um
extraordinário sacrifício pessoal e profissional. Randy, parafraseando Billie
Holiday: Fish got to swim, and birds got to fly/ Can’t help lovin’ that man of
mine.*
A Editora Routledge tem um time incrível de pessoas trabalhando para
assegurar que trabalhos acadêmicos como este sejam apresentados da
melhor forma. Estou em dívida com Matthew Byrnie, editor sênior de
estudos culturais e midiáticos, por ter visto um grande potencial neste livro.
Não consigo agradecer Matthew o suficiente pela sua advocacia. Da mesma
forma, preciso agradecer Carolann Madden, assistente editorial, Stan Spring,
(antigo) assistente editorial sênior, e Gail Newton, editor de produção, por
cuidar do projeto deste livro. Para Lisa Williams, preparadora de texto: não
canso de agradecer por você ter ajudado a fazer este livro “cantar!”. Sua
atenção detalhada é invejável. Eu realmente gostei de trabalhar com você.
Para aqueles que trabalharam na produção do livro, meu muito obrigada.
Sou particularmente grata à Photofest por ter me ajudado a adquirir as
imagens que aparecem neste livro. Este é o quarto projeto de livro em que a
Photofest me auxilia. É maravilhoso poder trabalhar com profissionais tão
eficientes.
Claro, sou especialmente grata a três revisores anônimos deste livro por
suas leituras cuidadosas e atentas, assim como pelos seus pareceres
astutos. Suas sugestões foram precisas e tornaram este trabalho mais forte.
Meus sinceros agradecimentos aos meus colegas no Departamento de
Estudos da Comunicação e no Centro de Estudos Afro-Americanos e
Africanos (CAAS) da Universidade de Michigan. Quero agradecer
expressamente aos meus chefes de departamento, Susan Douglas (Estudos
da Comunicação) e Kevin Gaines (CAAS), pelo encorajamento e apoio. O
Departamento de Estudos da Comunicação, muito generosamente, financiou
este projeto por meio da Bolsa de Pesquisa e Tecnologia Constance F. e
Arnold C. Pohs para o Estudo da Comunicação e Mudança Social. O CAAS foi
igualmente generoso ao oferecer um escritório e um pesquisador-assistente.
De fato, a Universidade de Michigan está cheia de pessoas dispostas a
se doarem em apoio a esta pesquisa. Eu gostaria de agradecer Lester
Monts, vice-reitor sênior de assuntos acadêmicos, pelo Prêmio Harold R.
Johnson de Serviço em Diversidade de 2010. Agradeço a Evans Young, reitor-
assistente do Ensino de Graduação, por recomendar o título incrível. A Evans
Young, Catherine Shaw, vice-reitora assistente de assuntos acadêmicos, e a
equipe do projeto Women of Color in the Academy (Robin Wilson, Mieko
Yoshihama, Ixchel Faniel), obrigada por simplesmente compreenderem…
tudo. Um agradecimento muito especial a Rebecca Sestili, a conexão autora-
editora. Rebecca, eu existo neste momento por sua causa. Philip Hallman, o
bibliotecário da Screen Arts and Cultures Film, que foi incansável em sua
busca por alguns dos filmes de terror mais raros, obscuros ou banidos que
são discutidos aqui. Igualmente, Jeffrey Pearson, bibliotecário da Askwith
Media Library, que também foi um incrível recurso para a aquisição de
filmes. Jeff é um verdadeiro fã de terror, e a Universidade de Michigan talvez
possua uma das melhores coleções de filmes de terror do país graças à
atenção de Jeff ao gênero. Eu gostaria de agradecer Michael McLean por me
mandar para casa com dezenas de filmes de terror para assistir toda
semana. Membros da equipe da Universidade de Michigan, Elizabeth James,
Chaquita “Quita” Willis, Faye Portis, Chris Gale e Orlandez Huddleston foram
todos inventivos e diligentes ao me ajudar a conseguir os recursos de que
eu precisava para trazer este livro à sua conclusão vitoriosa. A risada e o
amor deles são profundamente apreciados.
Will Youmans, um candidato a doutorado no Departamento de Estudos
da Comunicação da Universidade de Michigan, me ajudou a empurrar os
pensamentos para novas direções. Charles Gentry, um candidato a
doutorado em Cultura Americana, é um intelectual incrível. A profundidade e
o escopo de seu conhecimento acerca da cultura popular negra é
inigualável. Para Charles: Robeson e Poitier estariam orgulhosos!
Para Mark H. Harris, criador do BlackHorrorMovies.com. Você nem pode
imaginar o quão incrível e útil o seu site é! É o lugar perfeito para qualquer
um que afirme ser um fã de terror. Sim, Mark, eu não me esqueço de dizer
uma oração em nome do santo padroeiro da morte negra, Scatman
Crothers.
Um agradecimento especial para a minha querida amiga e heroína
Bambi Haggins, diretora dos Estudos de Filme e Mídia na Universidade do
Estado do Arizona. Eu gostaria que ter um “NAAA” fosse o meu problema!
E a você, querido leitor — obrigada. Agora, olhe para aquele espelho e
repita comigo: “Candyman. Candyman. Candyman. Candyman…
Candyman!”.

* Em tradução livre: O peixe tem que nadar, e os pássaros têm que


voar / Esse homem eu não posso deixar de amar [NT]
Para Rosalind Cash e Spencer Williams Jr.
Este livro foi um trabalho árduo, porém prazeroso.
Aprecio muito as perguntas perspicazes que recebo
sobre os negros e a mídia. Sou questionada o tempo todo
se, após toda esta pesquisa, eu consegui identificar quais
são meus filmes de terror favoritos. Para mim, essa é
uma pergunta ridiculamente difícil. No entanto, tentarei
listar meus preferidos. Então, aqui estão, em nenhuma
ordem particular: J.D.’s Revenge - Blaxpoitation (1976), A
noite dos mortos-vivos (1968), Def by Temptation (1990),
A vingança dos mortos (1974), Sangue de Jesus (1941),
Despertar dos mortos (1978), Chloe, Love Is Calling You
(1934), Abby (1974), O mistério de Candyman (1992),
Lucky Ghost (1942) e Son of Ingagi (1940).

DRA. ROBIN R. MEANS COLEMAN é professora adjunta no Departamento de


Estudos da Comunicação e no Centro de Estudos Afro-Americanos e
Africanos da Universidade de Michigan. Seus trabalhos anteriores incluem
African Americans and the Black Situation Comedy: Situating Racial Humor e
a edição da coletânea Say It Loud! African Americans, Media and Identity, e,
mais recentemente, a coedição do volume Fight The Power! The Spike Lee
Reader.
HORROR
NOIRE
“Eles sabem que agora estamos aqui.”
— BEN, A NOITE DOS MORTOS-VIVOS (1968) —

DARKSIDEBOOKS.COM
HORROR NOIRE: BLACKS IN AMERICAN HORROR FILMS FROM THE
1890S TO PRESENT
Copyright © Taylor & Francis, 2011
Todos os direitos reservados.

Authorised translation from the English language edition


published by Routledge, a member of the Taylor & Francis Group LLC

As imagens são cortesia da Photofest.


Arte de Horror Noire na capa © Gary Pullin, cortesia da Shudder

Tradução para a língua portuguesa


© Jim Anotsu, 2019

Diretor Editorial
Christiano Menezes
Diretor Comercial
Chico de Assis
Gerente de Novos Negócios
Giselle Leitão
Gerente de Marketing Digital
Mike Ribera
Editores
Bruno Dorigatti
Raquel Moritz
Editores Assistentes
Lielson Zeni
Nilsen Silva
Adaptação de capa e projeto gráfico
Retina78
Designers Assistentes
Aline Martins / Sem Serifa
Arthur Moraes
Finalização
Sandro Tagliamento
Revisão
Cecília Floresta
Isadora Torres
Retina Conteúdo
Leitura Sensível
Anne Caroline Quiangala
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO
(CIP)
Angélica Ilacqua CRB-8/7057

Coleman, Robin R. Means


Horror noire: a representação negra no cinema de terror /
Robin R. Means Coleman ; tradução de Jim Anotsu. — Rio de
Janeiro : DarkSide Books, 2019.

ISBN: 978-65-5598-071-4
Título original: Horror Noire: Blacks in American Horror Films
from the 1890s to Present

1. Cinema 2. Filmes de terror 3. Negros no cinema 4. Negros


— Filmes — Aspectos sociais I. Título II. Anotsu, Jim

19-0452 CDD 791.436164

Índices para catálogo sistemático:

1. Filmes de terror

[2019]
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