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A F R OF U T U R I S M O: O E S P E L H A M E N T O N E G R O Q U E N OS I N T E R E S S A

por Lu Ain-Zaila (Luciene Marcelino Ernesto

Resumo
1
Este ensaio apresenta o movimento Afrofuturismo tanto nos Estados Unidos como no Brasil
e qual suas diretrizes existenciais pelo viés da literatura, especificamente da ficção
especulativa que é um passo novo sendo dado por autores negros e negras no Brasil.
Também se discute a universalidade nada universal da ficção científica como um todo e as
formas como o seu mainstream reflete e pratica o racismo. E diante disso, se torna
indispensável esclarecer os propósitos e objetivos afrofuturistas brasileiros como a cor da
mão e o tipo de consciência que o define, rege e possibilitará efetivamente a construção de
um afrofuturo, antídoto contra o nevoeiro hipnótico do mito da democracia racial.

Este ensaio é introdutório e busca apresentar um panorama geral do Afrofuturismo


AFROFUTURISMO: O ESPELHAMENTO
NEGRO QUE NOS INTERESSA

Nunca tive a chance, ou melhor, o direito de ser efetivamente influenciada por uma
literatura negra e não tenho dúvidas sobre o quanto isso me impediu de me ver tão humana
quanto uma pessoa branca, e inclusive, me impediu de acreditar que minha escrita valia a
2
pena por muito tempo, pois o direito a ser humano, bonito e heroico na literatura sempre
pertenceu a outro. Mas felizmente tive a sorte de ter acesso, mesmo que tardiamente a autores
negros de vários gêneros e letras suficientemente fortes para me encorajar a escrever
realidades onde a minha face negra é a que também molda o discurso que desbrava o
desconhecido e desconstrói o eterno sentimento trágico e de incapacidade que rabiscaram
sobre nós.
E sim, preciso falar de raça, de ser negra/negro e do quanto ainda é revolucionária
uma escrita por essas mãos1 no Brasil, assim como sua presença no audiovisual2.

Escrevi este extenso ensaio introdutório sob um título incômodo, mas realista que
reafirmo em voz alta e vejo como necessário ser alardeado, pois sua menção causa estranheza
e cutuca “lugares felizes” nunca antes pisados por uma pessoa negra. Prazer, sou Lu Ain-
Zaila, a primeira autora, mulher negra a escrever ficção científica na história da literatura
nacional.

Essa nomenclatura me foi conferida em cada passo que dei, desde aquela viagem à
Bienal 2015 onde abracei uma jornada que não esperava, mas que estava disposta a enfrentar
e daí por diante eventos literários de todo o porte e o mundo digital me veem e dizem o
mesmo, nunca vimos alguém como você antes. E resumindo, sou a fissura que suscita a pergunta –
mas como assim? – e desnaturaliza a visão de futuros onde nunca existimos. Agora, eu também
escrevo futuros, afrofuturos.

1
- Entrevista | Regina Dalcastagnè - Radiografia da literatura brasileira -
http://www.candido.bpp.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=617
2
Informe Diversidade de Gênero e Raça nos Lançamentos Brasileiros de 2016 (ANCINE)
https://oca.ancine.gov.br/sites/default/files/repositorio/pdf/informe_diversidade_2016.pdf
O termo Afrofuturismo surgiu durante entrevistas de Mark Dery (branco) com
Samuel R. Delany, Greg Tate e Tricia Rose para o seu ensaio Black to the Future3, depois
capítulo do livro Flame Wars: The Discourse of Cyberculture (1994), onde busca interpretar
a pequena presença de escritores afroamericanos na ficção científica oficial, a mainstream.
A partir daí o que até então atendia pelo nome de ficção especulativa negra oficializou
seu extenso guarda-chuva de possibilidades, cresceu e se aprofundou vendo nas experiências
mescladas de Sun Ra a essência do movimento através do filme Space is the Place (1974)
onde se mistura jazz, ancestralidade, protagonismo negro e crítica ao racismo.
3
Esse desenvolvimento mostra como o movimento cresce e suscita através das letras,
artes, cinema, música etc. o protagonismo negro por mãos negras conscientes de sua
identidade reconstruída perante pilares humanos com os quais se reconhece e identifica, o
que por si só já causa um cruzar de olhares onde fica explícito que o diferente, ou seja, nós
negros, não costumamos figurar por tais lugares, muito menos sendo a voz de uma
humanidade sempre tolhida e reduzida a um eco de passado limitado e deturpado. E ser um
afrofuturista muda tudo, pois o passado é muito maior e mais extenso, servindo para explicar
e elucidar o presente, possibilitando assim que desenhemos um futuro no qual nos
reconheçamos sujeitos de nossas vozes e defensores deste poder.

Ficção Especulativa Negra são textos especulativos com ênfase nas


pessoas e na cultura da diáspora africana. Embora seja chamada de
"preta"[negra], que é uma escolha puramente estética, como o rótulo inclui
TODAS as pessoas da diáspora (não apenas os negros americanos) e
coloca sua cultura, experiências e ELAS na vanguarda dessas obras
imaginativas. Para um povo que foi informado constantemente de que eles
não têm história ou futuro, que nunca poderiam ser super ou um herói, e
que a própria existência deles é um pesadelo, a Ficção especulativa preta
permite que eles se imaginem fora do que o mundo diz que devem ser. As
pessoas da diáspora africana podem não acreditar que podem ser essas
coisas, então a ficção especulativa preta [negra] permite que elas se vejam
imaginando.4

É importante citar que a expansão deste movimento até seguiu para a Europa, mas é
na África que atinge um novo impulso, onde rever a visão de futuro do povo negro é urgente
e necessária para o protagonismo de suas novas gerações, o que podemos ver no curta
afrofuturista Pumzi (2009). Já no caso da América Latina, ainda é complexo, embrionário e
fragmentado, pois nossos racismos “cordial” e “cósmico” naturalizaram nossa ausência

3 - Mark Dery, Black to the Future: Interviews with Samuel R. Delany, Greg Tate, and Tricia Rose (1993).

Acessível em https://www.uvic.ca/victoria-colloquium/assets/docs/Black%20to%20the%20Future.pdf
4 M. Haynes, Black Speculative Fiction Definitions. Acessível em http://www.mhaynes.org/black-

speculative-fiction-definitions
discursivamente com palavras como desinteresse e incapacidade, camuflando práticas
cotidianas de exclusão (racismo, racismo científico, eugenia, branqueamento, democracia
racial, etc.), mas ainda assim as experiências positivas são contundentes e estão sendo
construídas principalmente de forma independente, no estilo tijolo que faço, tijolo que piso,
construo meu caminho.
Sempre que leio algo sobre ficção especulativa (fantasia, terror, ficção científica, etc.),
os Estados Unidos são referência, mas caso não tenham percebido até aqui, faço a pergunta:
quando oficialmente você ouviu falar de autores negros nesses gêneros? Nos últimos 5 anos,
4
muito provavelmente, mas acredito que foi realmente em 2016 que o mundo parou para ver
a vitória histórica de duas mulheres negras no Hugo Awards, o mais aclamado prêmio do
gênero, e claro, o racismo estava lá para mostrar todo o seu descontentamento com aquelas
presenças levando as mais cobiçadas categorias, o que não demoraram a afirmar ir contra os
bons costumes e escritos de uma “ficção de raiz”.
Mas, as presenças e vitórias de (Nora) N. K. Jemisin e Nnedi Okorafor naquele ano
escancararam algo mais, a previsão de Samuel R. Delany, o primeiro escritor negro a vencer
o Nebula em 1968, que descreveu em seu ensaio biográfico Racismo e Ficção Científica5,
como o mesmo opera dentro e fora da “cordialidade”, especialmente na noite em que ganhou
o Nebula.

Nova foi comprada pela Doubleday & Co. três meses após o banquete de
premiação, em junho, eu enviei Nova para a serialização com o famoso
editor da Analog Magazine, John W. Campbell, Jr. E Campbell rejeitou
com uma nota e telefonema ao meu agente, explicando que ele não achava
que seus leitores seriam capazes de se relacionar com um protagonista,
personagem negro. Esse foi um dos meus primeiros encontros diretos
como escritor profissional com a forma escorregadia e sempre
comercializada do preconceito liberal americano: Campbell não tinha nada
contra eu ser negro, você entende… [Há irrefutavelmente, uma carta dele
para o escritor de terror Dean Koontz, apenas um ou dois anos depois, na
qual Campbell argumenta com toda a seriedade que uma civilização negra
tecnologicamente avançada é uma impossibilidade social e biológica …].

Delany corretamente profetizou, ele (o racismo) só será contundente sobre nós


quando ocuparmos lugares de prestígio e começarmos a abalar o mercado editorial, o que
ficou nítido através das práticas vexatórias e subterfúgios rasteiros aplicados no Hugo
Awards6 2017 que Jemisin venceu novamente na categoria mais cobiçada e desde então é

5 Samuel R. Delany, Racism and Science Fiction, NYRSF Issue 120, August 1998. Acessível em
http://brasil2408.com.br/index.php/2018/09/21/race-scifi-ptbr/, traduzido.
6 Blog Cheiro de Livro, série Prêmio Hugo (4 artigos sobre a premiação dos “diferentes”, histórico, racismo,

misoginia, enfrentamentos e mudanças). Acessível em http://cheirodelivro.com/premio-hugo-parte-1/


alvo de ameaças veladas e diretas que denuncia publicamente em suas entrevistas7. E deixo
por conta da imaginação de quem lê este ensaio, o terror que foi para “eles” vê-la vencer em
2018 novamente, fazendo história como a única pessoa a vencer três vezes seguidas na
mesma categoria, a categoria. E mais, em seu discurso Nora deixa claro que a ficção científica
ainda é um microcosmos do mundo com práticas racistas, misóginas, mas que é possível ver
mudanças acontecendo, mas no Brasil poucos foram aqueles e aquelas, blogs e pessoas que
debateram o seu conteúdo, todos com perfil antimisógino, antirracista e outros anti que não
deveriam existir neste gênero.
5
Mas o que isso tem a ver com Afrofuturismo no Brasil? Tudo, pois o movimento
veio de lá e pegá-lo apenas por cima sem conhecer minimamente a história afroamericana é
ignorar os sinais desta literatura como um movimento de resistência, um erro fatal na
compreensão do racismo como um sistema efetivo lá, mas muito mais efetivo aqui, pois a
ficção especulativa negra, mesmo que não tivesse esse contexto bem definido já era presente
na metade do século 19, onde podemos destacar a publicação serializada no jornal Anglo-
African Magazine de Blake, or the Huts of America8 (Blake, ou Cabanas da América) cujo
o tema é uma revolta de escravos bem-sucedida nos estados do sul e a fundação de um país
negro em Cuba, que podemos facilmente ler como uma distopia diante da realidade da época,
pois a escravidão só encontrou seu fim a partir de 1866, um ano após o fim da guerra norte
(vitorioso) x sul, que criou-unificou os Estados Unidos da América.

A obra Blake, or the Huts of America é um clássico e ato revolucionário de Martin


Robison Delany (1812-1885), negro, militar e ativista. Mas quando alguém em algum

7 Ima Sanchís, “He sufrido amenazas por ser mujer, negra, escritora y con éxito”. Acessível em
https://www.lavanguardia.com/lacontra/20170726/4386826696/he-sufrido-amenazas-por-ser-mujer-negra-
escritora-y-con-exito.html .
8
Leia (em inglês) - http://utc.iath.virginia.edu/africam/blakehp.html
momento viu ou leu sobre este livro em qualquer lista top qualquer coisa, ou de clássicos
para ler vivo ou antes de morrer?
Pensem a respeito, o que efetivamente conhecemos desta linha temporal de ficção?
Você sabe quem é o Chip? Já ouviu falar do épico Imaro? Conhece o conto clássico de W.E.
Dubois, pois ele é sempre citado nas leituras históricas da ficção científica, certo? Também
acredito que todo o debate ao redor de #BlackSpecFic te deixa feliz, pois o acesso de autores
passou de 2% para quase 5% nas revistas do gênero? E os autores da América Latina, com
certeza existe um nome na sua mente agora, não é? Duvido muito...
6
Minha insistência em citar fatos americanos se deve ao maior acesso de informações
vindas de lá e porque é o lugar de surgimento do Afrofuturismo, onde temos mais dados e
registro da ficção especulativa negra. Enfim, os motivos estão por todos os lugares (lá) e
mesmo que passe por chata, não é o Pantera Negra que elevou a ficção negra. É a ficção
negra que alavancou o Pantera Negra. Precisamos entender que o fortalecimento da leitura,
inspiração e imaginação insistente de décadas de resistência e escrita de autores de ficção
negra produziram a longo prazo não apenas o consciente Ta-Nehisi Coates, escritor
reconhecido no meio literário que escreveu a série HQ do herói, mas um público que há
tempos produz seus eventos, atividades e reforça seu mercado nas margens sem deixar de
criticar e expor o “oficial” que exclui não-brancos maciçamente.
Existe um fato interessante sobre o fim da escravidão americana, quem já pesquisou
sabe que ela foi costurada por Abraham Lincoln do modo como aparece no filme Lincoln
(2012) de Steven Spielberg, mas o que muitos não sabem é que a abolição documental de
alguns estados só veio a fazer parte do documento oficial muitos anos depois: Delaware
(1901), Kentucky (1976) e o um último em 2013. Sim, você leu certo, em 2013.
Tudo começou quando o professor de neurobiologia da Universidade de Medicina
deste estado, Ranjan Batra (de origem indiana, naturalizado americano em 2008) foi ao
cinema assistir ao filme de Spielberg, Lincoln e saiu de lá como muitos se perguntando
quando os outros estados assinaram o fim da escravidão (Em 1866, a lei foi assinada por
metade dos estados, por aí...). E resumindo, ele acabou descobrindo que a escravidão no
Mississipi ainda não tinha sido abolida, uma história que vale conhecer os detalhes9.
E voltando à ficção especulativa negra, não podemos abrir mão da citação clássica
sobre Mary Shelley, a primeira mulher branca a escrever ficção científica (Frankenstein),
sempre muito comentada, o que me faz perguntar por que Pauline Hopkins, a primeira
mulher negra (atriz, escritora, jornalista, historiadora com carreira iniciada em 1877) a

9
Leia sobre o episódio tardio da abolição da escravatura no Kentucky - http://glo.bo/ZtVSKO
escrever ficção científica e terror, nunca teve sequer metade desta aclamação? Nunca foi
traduzida? São perguntas que respondem, em parte, a existência do Afrofuturismo.
Em 1901 Pauline publicou Talma Gordon no jornal Colored American Magazine,
depois Contending Forces: A Romance Illustrative of Negro Life North and South
(Conflito de Forças) que em seu prefácio deixa uma mensagem para seus leitores
afroamericanos em tempos de leis Jim Crown, linchamentos e pseudônimos para escrever e
viver mais um dia10.

Ninguém fará isso por nós; precisamos desenvolver os homens e mulheres 7


que retratarão fielmente os pensamentos e sentimentos mais íntimos do
negro com todo o fogo e o romance que permanecem latentes em nossa
história e, até agora, não reconhecidos por escritores anglo-saxões.

Pauline também inaugura a ficção científica escrita pelas mãos de uma mulher negra
com On of Blood11, um marco. A obra narra a vida do jovem negro Reuel Briggs, criado
sobre o racismo tão difundido nos Estados Unidos de sua época, e que passa a acreditar em
sua própria inferioridade. Esse é um dos motivos para seguir numa viagem exploratória pela
África, mas tudo muda quando chega na Etiópia e encontra a cidade de Telessar com seus
6.000 anos de idade, tecnologia futurista baseada em cristais, animação suspensa e até mesmo
um tipo de telepatia. A obra aborda assuntos como raça, branquitude e enganos raciais, assim
como pensamentos e acontecimentos da época.

10 Ler o ensaio Racismo e Ficção Científica de Samuel R. Delany, que também fala do assunto.
11 Pauline Hopkins, On of Blood. Acessível em https://archive.org/details/HopkinsOfOneBlood
Tudo isso nos traz de volta ao “limbo Brasil”, pois assim como fazem com a literatura
negra em geral, no caso da ficção científica Machado de Assis é citado como o autor do conto
O Imortal, algo mais e então faz-se silêncio por um século inteiro e mais um pouco, e daí
por diante ninguém viu ou ouvir falar em tempo algum de negros escrevendo ficção
especulativa ou que nome queiram dar. Deste modo se faz necessário revisitar a história
negra da África às diásporas, reconectar a alma e a memória com quem somos e dar valor
aos nossos milhões de ancestrais perdidos na história.
8
Essa problematização existencial é importantíssima para entendermos porque o
Afrofuturismo onde quer que esteja tomando corpo, incluindo o Brasil não pode abrir mão
do que gosto de chamar de -- Consciência dos três círculos do Afrofuturismo – tomando
como inspiração o ideograma Adinkrahene12.
1- A origem intelectual é negra, o protagonismo da produção é indissociável.
2- O renascer consciente de si mesmo, pois não existe visão afrofuturista sem
passado esclarecido e presente compreendido (pensamento afrocentrado).
3- Ter uma consciência histórica, social e política é mote, pois mesmo que não esteja
presente tão diretamente na produção, indiscutivelmente estará na sua construção
criativa em termos de cultura, construção de personagem/obra/arte/etc. O que
exige também a formulação uma psiquê que corresponda ao discurso direto e/ou
indireto construído por seus autores.

Adinkrahene

E com esses fatores em mente, podemos ter um olhar mais amplo à várias questões
que atravessaram nossa trajetória, positiva e negativamente:

12 IPEAFRO, acervo digital. Acessível em http://ipeafro.org.br/acervo-digital/imagens/adinkra/


• Políticas nacionais de apagamento da população negra no Congresso Mundial
das Raças em 1911 e Imigração europeia
• Eugenia Racial13
• Movimentos negros atravessando a história 14 15 16 17
• Afirmação e rejeição ao Projeto Unesco18
• Democracia racial (institucionalizada) persistente até os dias de hoje19
• Ditadura20 21 que tem uma história direta com a literatura, incluindo a ficção
científica no atendimento de seus “interesses nacionais”), perseguição 9
assertiva das organizações políticas e informativas negras, efervescentes em
produção literária documental e de resistência.
• A dinâmica das Relações Raciais no Brasil22 23

Mas apesar de todas as tentativas, ainda estamos aqui, resistindo e fazendo resistir
um e mais um, mais uma sem parar, pois, o que nos mantém é a consciência ancestral da
linha temporal da qual fazemos parte. Sem isso não nos representamos efetivamente.
É preciso compreender que narrativas negras que nos identificam não surgem do
nada, não podem surgir do nada. Precisamos pegar toda a nossa história e fazer dela
narrativas literárias inspiradoras como as da ativista afroamericana Harriet Tubman, e não

13
STEPAN, NL. Eugenia no Brasil, 1917 – 1940
http://books.scielo.org/id/7bzx4/pdf/hochman-9788575413111-11.pdf
14
Teatro experimental do negro: trajetória e reflexões
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142004000100019
15
Teatro Experimental do Negro: Testemunhos
http://ipeafro.org.br/acervo-digital/leituras/obras-de-abdias/ten-testemunhos/
16
Movimento Negro Brasileiro: alguns apontamentos históricos
http://www.scielo.br/pdf/tem/v12n23/v12n23a07.pdf
17
Um "templo de luz": Frente Negra Brasileira (1931-1937) e a questão da educação
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782008000300008
18 Projeto Unesco no Brasil: textos críticos (2007), acesso em 2 out 2018,

http://biblioteca.clacso.edu.ar/Brasil/ceao-ufba/20130403104247/projeto.pdf
19
O mito da democracia racial e a mestiçagem em São Paulo no pós-abolição (1889-1930)
http://e-revista.unioeste.br/index.php/temposhistoricos/article/view/8019
20
Comissão da Verdade – Perseguição da população e movimentos negros
http://comissaodaverdade.al.sp.gov.br/relatorio/tomo-i/parte-ii-cap1.html
21
Relatório Final: A verdade sobre a Escravidão Negra no DF e Entorno
https://www.yumpu.com/pt/document/view/59458823/relatorio-final-a-verdade-sobre-a-escravidao-
negra-no-df-e-entorno
22
Relações Raciais: Referências Técnicas para atuação de psicólogas/os
https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2017/09/relacoes_raciais_baixa.pdf
23
Ivair Augusto A. dos Santos - Direitos humanos e as práticas de racismo
https://www.defensoria.sp.def.br/dpesp/repositorio/39/Direitos_humanos_e_as_praticas_de_racismo.
pdf
apenas utilizar, mas inspirar histórias ficcionais, pois são nossa mitologia urbana de
resistência.

10

Isso nos mostra o quanto o Afrofuturismo à brasileira, a ficção como um todo é


importante, pois o discurso que chama a ficção especulativa de menor, curiosamente não
perde a chance de se estampar “em branco” numa pulsante visibilidade de si mesmo em cada
oportunidade que surge. Isso nos mostra o poder estratégico da narrativa, pois influi
diretamente na psiquê de nosso consciente e subconsciente.

A literatura possui um grande poder de influência sobre os


indivíduos. Podemos dizer que este seria em semelhança um poder
mitológico que encurte na pessoa um ímpeto, uma inspiração que a
estimula a acreditar ser uma voz na multidão ao invés de calar, desejar
ser protagonista ao invés de seguir, resistir ao invés de fugir.
Toda essa dimensão é importante e por séculos negros foram impedidos de enxergar
isso em sua própria mitologia e literatura como nos aponta os estudos que Clyde W. Ford
faz das mitologias africanas, onde uma pessoa comum ou nascida especialmente, a escolhida
é chamada a enfrentar desafios através de inúmeras histórias (metáforas) que envolvem seres,
submundos, poderes, renascimento, e este último é muito presente em mitos sobre a época
da escravidão, que o afrofuturismo lê como um rasgo na linha temporal. Nos tornamos
estranhos numa terra estranha, resistindo e sobrevivendo, o que a mitologia africana lê como
11
um renascimento de quem sobrevive à barriga da besta que o aprisiona, a quem Frantz Fanon
em seus estudos sobre negritude chamará de desterrado, não só da sua terra em si, mas de
seus valores e consciência de quem é num mundo que para silenciar o surgimento da
consciência negra individual, massacra-a com a balela de somos todos humanos, de sangue
vermelho, mas que não gosta de ver uma face negra como espelhamento de protagonismo
em filmes, séries de canais abertos à de streaming, revistas, livros e vê traços de negritude
como um perigo, fugindo da passividade que pregava tão seguramente.

E como estamos a falar do poder do afrofuturismo no campo literário é preciso


apresentar o poder que uma narrativa afrofuturista possui, como ela toca o nosso interior:
Na Duologia Brasil 240824, composta por (In)Verdades e (R)Evolução com uma
protagonista (a primeira na história nacional) negra.
Ena é uma mulher negra de black power curto em busca de uma verdade que causará
uma reviravolta no país que vive numa realidade pós-apocalipse climático (causa humana) e
limitado em recursos no século 25. E toda a trama gira em torno de elementos de cultura
negra africanos e diaspóricos: os Adinkra, provérbios, Cheik Anta Diop, questionamentos
históricos e ainda há o seu poder de argumentação e discurso que move as pessoas ao seu
redor.
Já em O Caçador Cibernético da Rua 1325 do autor Fábio Kabral, temos João
Arolê, metade ciborgue, longos dreads e morador da metrópole Ketu Três, um universo
construído tendo como base a cultura yorubá e a afroreligiosidade com seu protagonista
imerso no desejo de rever seu lugar no mundo e diante de si mesmo.
E em Sankofia26 temos uma coletânea de contos que expande o universo
afrofuturista, mesclando elementos diversificados que usam a essencialidade negra como um

24 Lu Ain-Zaila, autora (2016 e 2017)


25 Fábio Kabral, autor.
26 Lu Ain-Zaila, autora (2018)
mote e faz surgir narrativas com ficção científica/terror social e empregadas domésticas,
mistério e patrimônio histórico africano, mitologia africana e fantasia, maracatu e alta fantasia
com espadas, ficção científica discutindo humanidade negra através de contatos alienígenas
e até passeios a museu afrofuturistas que revisitam ritos de autoconhecimento.

Esses são exemplos de um movimento afrofuturista literário brasileiro que dá seus


primeiros passos consciente do seu interesse num protagonismo negro para além das páginas
de seus livros. O objetivo maior é abrir mentes e propiciar uma influência que nos permita
12
reconhecimento diante de uma face de heroína e herói negro que sente em seu ímpeto que
pode vencer os desafios e as bestas tanto ficcionais quanto reais, a partir do momento em
que sabe de onde veio, está e para onde vai, seu afrofuturo interior.

palavras-chave: afrofuturismo, raça, negros, literatura


Biografias

Lu Ain-Zaila é Luciene Marcelino Ernesto, formada em Pedagogia/UERJ, escritora


afrofuturista autopublicada, da baixada fluminense do Rio de Janeiro, escreve artigos sobre
ficção especulativa (resenha, ensaios e pesquisas) e é autora da Duologia Brasil 2408 e
Sankofia.
Site – http://brasil2408.com.br

13
Fábrio Kabral, formado em Letras/UFRJ. É autor dos romances “Ritos de passagem”
(Giostri, 2014) e “O Caçador Cibernético da Rua 13” (Malê, 2017). Cofundador do site “O
Lado Negro da Força” Escreve artigos e ensaios sobre afrofuturismo.
Site - https://fabiokabral.wordpress.com

Além do site, visite as redes sociais dos autores e acesse os conteúdo abaixo que dá uma introdução bem legal
sobre o Afrofuturismo.

Conhecendo o Afrofuturismo via Blog Ficções Humanas - 13º Ficções Live (Podcast)
Papo com Lu Ain-Zaila e Fábio Kabral - https://youtu.be/-_e3ZJm-kjE

Afrofuturismo e a Construção do Amanhã (vídeo – Flip 2018)


Matilda.My (Youtube - https://youtu.be/jK3rr6LnJNY
27
Facebook - https://m.facebook.com/matilda.my.br/videos/1810734189008230/

Afrofuturismo: Cinema e música em uma numa diáspora intergaláctica (Evento,


2015). Curadora: Kênia Freitas
pdf - http://www.mostraafrofuturismo.com.br/Afrofuturismo_catalogo.pdf

Galeria Afrofuturista de Sankofia - http://brasil2408.com.br/index.php/artes-sankofia/

Artigo finalizado em 3 out 2018.


Revisado em jan 2019.

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Vídeo com mais de 5 mil visualizações.

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