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Autobiografia

Autobiografia é um relato retrospectivo que a própria pessoa faz de sua vida,


ou seja, o autor-narrador-personagem tem um papel de destaque nos
acontecimentos do passado e do presente. A reconstituição memorialista, em uma
autobiografia, ocorre em dois níveis: o nível dos acontecimentos e o do seu
significado. Quanto à função desse gênero, quem tem acesso a uma autobiografia,
pode, por meio dela, identificar-se com as experiências de outra pessoa e, a partir
daí, ampliar a percepção que tem de determinado universo cultural, refletir sobre a
realidade à sua volta e sobre si mesma.
Qual o interesse em conhecer a história de outras pessoas. Muitas vezes,
revelamos esse interesse em conversas com amigos (quando pedimos notícias de
algum conhecido), na curiosidade pelas reportagens que envolvem pessoas
famosas ou na vontade de ler livros sobre a trajetória de alguém.

* Você já ouviu falar de Lázaro Ramos, conhece sua trajetória de ator, sabe alguma
coisa sobre a vida pessoal dele? Lázaro Ramos já participou de diversos filmes,
séries, novelas e espetáculos teatrais. Começou sua carreira no Bando de teatro
Olodum. casado com a atriz Taís Araújo, é um dos artistas mais engajados na luta
pela valorização da cultura negra.

Leia, a seguir, um trecho da sua autobiografia.

Levávamos uma vida simples na casa em que minha tia orgulhosamente dizia
ter projetado. Naquela época, eu morava com meus cinco primos, que viraram meus
irmãos postiços. Não tínhamos autorama, Playmobil ou Atari, mas tínhamos ele, o
quintal. Ali nos divertíamos com brincadeiras de custo zero: esconde-esconde,
pega-pega, garrafão. Também gostávamos de construir brinquedos com latas de
óleo, pedaços de pau. Como criança cansa rápido de tudo, desenvolvemos uma
criatividade enorme, sempre inventando coisas novas pra fazer.
Claro que tínhamos TV. Quando não se tem dinheiro, a falta de livros e de
brinquedos é preenchida pela televisão, que ocupa boa parte do tempo. O curioso é
que minha referência infantil não foi a Xuxa. Não sei se por corporativismo
baiano, preferíamos o programa da Mara Maravilha. Outro ídolo era o Jairzinho, do
Balão Mágico. Durante a infância, toda criança quer ser “alguém”: elege um
super-herói, um personagem de série preferido. Pois eu queria ser o Jairzinho.
Queria usar aquele macacão vermelho, ter aquele olhar de criança vivida e pegar
carona na cauda do cometa com a turma que eu achava a mais legal do mundo.
Acho que isso acontecia porque existia uma identificação visual; por ser um dos
poucos negros no universo televisivo infantil, Jairzinho parecia mais próximo de
mim.
Na minha infância, não tinha esse papo de ancestralidade. Mais
recentemente, numa conversa com o professor Muniz Sodré, percebi que, mais do
que a filosofia e a ciência, o que traz mudança mesmo são as representações
coletivas, e a ficção tem o papel fundamental nessa construção. “A literatura sempre
disse mais sobre o homem no Brasil que a sociologia – até hoje, muito preocupada
apenas com lutas de classes. O cinema e a novela, com a força que têm hoje em
nosso país, podem trazer um ataque forte aos preconceitos”, me disse o Muniz em
uma entrevista para o Espelho. Eu incluiria a literatura infantil e as biografias nesse
rol e acho que ele concordaria comigo.
Até a quarta série (hoje quinto ano) estudei em um colégio particular na
Federação. As turmas tinham um número equilibrado de negros e brancos. O
curioso é que nessa escola, tão mista, ignorava-se a história dos negros. Aprendi
sobre a luta de Zumbi de forma muito superficial e breve. Nas aulas sobre a
escravidão no Brasil, ele aparecia como um rebelde. E ponto. Em 1995, quando já
tinha dezessete anos, vivi Zumbi no teatro.
Curiosamente, esse não era o meu papel no início da montagem. O
espetáculo do Bando de Teatro Olodum estabelecia uma relação direta entre uma
favela e os quilombos, e eu fazia um garoto com poucas falas, o que me deu mais
tempo para assimilar as informações da pesquisa: a importância de Zumbi dos
Palmares; que a história negra é repleta de lutas e que eu não devia chamar meus
ancestrais de escravos, e sim de africanos escravizados; que a liberdade não veio
de uma canetada da princesa imperial, mas após muita luta. Esse foi mais um salto
na compreensão sobre de onde vim e para onde podia ir.

Após ler o trecho da autobiografia, responda as questões:


1) Os fatos narrados focalizam a infância, a adolescência ou a vida adulta de Lázaro
Ramos? Justifique sua resposta.
2) O ator, além de contar o que viveu, faz reflexões sobre suas experiências. Aponte
um desses comentários.
3) Quando ele fala da infância, o leitor é transportado para o final dos anos 80 e
início dos anos 90. O que você descobriu sobre essa época que é diferente dos
tempos de hoje?
4) O que o autor diz sobre a infância dele que, em sua opinião, continua valendo
para as crianças de hoje?

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