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ELAINE RODRIGUES

A (Re)Invenção da
Educação no Paraná:
apropriações do discurso democrático
(1980 - 1990)
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ:
APROPRIAÇÕES DO DISCURSO DEMOCRÁTICO (1980 – 1990)
Editora da U n i v e r s i d a d e E s ta d ua l de Maringá
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Comercialização: Norberto Pereira da Silva, Paulo Bento da Silva, Solange Marly Oshima.
Elaine Rodrigues

A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ:


APROPRIAÇÕES DO DISCURSO DEMOCRÁTICO (1980 – 1990)

Prefácio
Maria Cristina Gomes Machado

Maringá
2012
Copyright © 2012 para Elaine Rodrigues

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo mecânico,
eletrônico, reprográfico etc., sem a autorização, por escrito, da autora.
Todos os direitos reservados desta edição 2012 para Eduem.

Revisão textual e gramatical: Maria Dolores Machado


Normalização textual e de referência: Simone Lima Lopes Rafael
Projeto gráfico/diagramação: Marcos Kazuyoshi Sassaka
Capa - imagem: Bernardo Joffily (autorizado)
Capa - arte final: Hugo Alex da Silva
Ficha catalográfica: Edilson Damasio (CRB 9-1123)
Fonte: Book Antiqua, Franklin Gothic Heavy
Tiragem - versão impressa: 500 exemplares

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)


(Eduem - UEM, Maringá – PR., Brasil)

R696r Rodrigues, Elaine


A (re)invenção da Educação no Paraná : apropriações do discurso democrático (1980-1990) /
Elaine Rodrigues ; prefácio Maria Cristina Gomes Machado. -- Maringá : Eduem, 2012.
168 p. il. grafs. (algumas color.).

ISBN 978-85-7628-468-0

1. Educação - Paraná - 1980-1990. 2. História da Educação. 3. Discurso democrático. 4.


Discurso educacional. 5. Cidadão-crítico. I. II. Título.

CDD 21. ed. 370.98162

Editora filiada à

Eduem - Editora da Universidade Estadual de Maringá


Av. Colombo, 5790 - Bloco 40 - Campus Universitário
87020-900 - Maringá-Paraná - Fone: (0xx44) 3011-4103 - Fax: (0xx44) 3011-1392
www.eduem.uem.br - eduem@uem.br
Para
Cicília e Gabriela,
amores sem os quais
eu não teria conhecido
felicidade!
Agradeço a todos a quem recebi para
amar, presentes que me possibilitaram
não sucumbir diante da vida!!
Ao contrário do que parecem por vezes imaginar
os principiantes, os documentos não surgem aqui
ou acolá por artes mágicas. A sua presença ou a
sua ausência, em determinado fundo de arquivo,
em determinada biblioteca, em determinado
terreno, dependem de causas humanas que
de maneira nenhuma escapam à análise, e
os problemas que a sua transmissão levanta,
longe de se encontrarem somente ao alcance de
exercício de técnicas, respeitam eles mesmos, ao
mais íntimo da vida do passado, porque aquilo
que se encontra em jogo não é nem mais nem
menos do que a passagem da memória através
das gerações.
(BLOCH, 1997, p. 117).
Lista de abreviaturas/siglas

ABI – Associação Brasileira de Imprensa


Andes – Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior
APM Associação de Pais e Mestres
APP – Associação de Professores do Paraná
Arena – Aliança da Renovação Nacional
Embrafilmes – Empresa Brasileira de Filmes
Conseb – Conselho de Secretários de Educação do Brasil
Consed – Conselho Nacional de Secretários de Educação
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
PC do B – Partido Comunista do Brasil
PCB – Partido Comunista Brasileiro
PDS – Partido Democrático Social
PDT – Partido Democrático Trabalhista
PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PT – Partido dos Trabalhadores
PTB – Partido Trabalhista Brasileiro
MEC – Ministério da Educação e Cultura
SBPC – Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência
SEED – Secretaria de Estado da Educação
SEED/PR – Secretaria de Estado da Educação do Paraná
UBES – União Brasileira dos Estudantes Secundaristas
UNE – União Nacional dos Estudantes
Sumário

Lista de abreviaturas/siglas........................................................... 11
Prefácio.............................................................................................. 15
Situando este livro.......................................................................... 19

Parte I

1
EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E
GOVERNAMENTALIDADE DA POPULAÇÃO..................... 29
1.1 Educação para democracia no Paraná: apropriações do
discurso..................................................................................... 46
1.2 Estratégias para a ação dos Secretários Estaduais de
Educação................................................................................... 52
1.3 Qualidade na Educação, para todos!.................................... 70

Parte II

2
O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS DA
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DO
PARANÁ........................................................................................... 95
2.1 Democracia Escolar: o voto legitimador.............................. 109
2.2 Cidadão ou agente transformador, quem é o aluno?........ 123
2.3 DIA D – Debate nacional sobre Educação e Escola............ 141

Finalizando, mas não concluindo!............................................... 155


Referências....................................................................................... 159
Fontes................................................................................................ 165
Prefácio

O livro de autoria de Elaine Rodrigues, que tenho a honra


de apresentar, se intitula A (re) invenção da Educação no Paraná:
Apropriações do discurso democrático (1980-1990). Este escrito resulta
do sério trabalho realizado pela professora e pesquisadora ao longo
de sua carreira na Universidade Estadual de Maringá, provocada
inicialmente pelos cursos de formação de professores da rede
pública de ensino ministrados desde a década de 1990, quando se
buscavam elementos que fundamentassem a proposta estadual de
formação do cidadão paranaense e a necessária autonomia exigida
para o exercício da cidadania.

A preocupação de formar o aluno de modo a torná-lo uma


cidadã ou um cidadão crítico (a) levava a necessária reflexão sobre
o papel da escola como mediadora dessa formação, como destacado
por Rodrigues. Ela debruçou-se sobre essa temática e agora traz a
público os resultados de seu projeto de pesquisa História da Educação
no Paraná: a imprensa pedagógica como tema e objeto de pesquisa -1980
a 1990.

A pesquisa foi norteada pela investigação dos conteúdos


veiculados no Jornal da Educação, publicado entre os anos de 1983 a
1987, como importante veículo de comunicação da Secretaria Estadual
de Educação (SEED) e a comunidade escolar. A autora considera
que a imprensa contribui para a compreensão das diretrizes oficiais
direcionadas para as escolas, bem como para o entendimento do
espaço escolar ao propagar aspirações e concepções políticas. A
imprensa, nesse caso a imprensa pedagógica, tem se revelado como
importante fonte para os estudos históricos sobre educação. Esta é
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

cotejada com outros documentos do período, tais como relatórios


de gestores governamentais; cadernos pedagógicos; estatísticas,
entre outros.

O livro reconstruiu por meio de diferentes fontes o discurso


de Educação, Democracia e Cidadania que se colocava como desafio
para a sociedade paranaense na década de 1980 e para o Brasil
como um todo. O país lutava contra o governo militar ditatorial
que marcou as décadas precedentes. Neste contexto, o Paraná
criava estratégias para contribuir com a efetivação da democracia
no país, formando cidadãos paranaenses críticos. Estas estratégias
e o contexto em que elas foram gestadas são objeto de discussão
na primeira parte do livro. Na segunda parte, aborda-se o discurso
educacional e o trabalho realizado pela SEED para disseminar um
novo conceito de cidadão.

O livro assume como recorte espacial o estudo detalhado da


sociedade paranaense. Este se agrega aos estudos regionais que têm
crescido nas pesquisas em História da Educação. Para Alves e Mignot
(2012), o ato de nomear traz em seu bojo intenções de agregação, de
domínio, de comunhão e de afastamento que se aproximam e se
distanciam para a delimitação de uma região. Assim, “[...] região é
um território físico e simbólico, cuja invenção visa a consolidar uma
história pregressa, ao mesmo tempo em que instaura possibilidades
de uma nova história” (ALVES; MIGNOT, 2012, p. 9). O território
provoca a identificação de laços de pertencimento e terrenos
identitários.

Ler este livro provocou em mim muitas reflexões sobre nossa


identidade. Eu, tal como a Elaine, por quem tenho uma forte amizade,
marcada por muitos encontros mesmo quando a vida nos afasta
pelo turbilhão de tarefas que assumimos, tivemos nossa formação
acadêmica como estudantes de Pedagogia em meados da década de
16 E l a i n e R o d r i g u e s
PREFÁCIO

1980. São muitas lembranças, memórias recentes que, com base na


leitura de um trabalho profundo de análise crítica como este livro,
coloca em cheque o vivido e o lembrado.

Sou tentada a recorrer a Hobsbawn (1995) que, no prefácio de


seu livro A Era dos Extremos: O breve século XX 1914-1991, discorre
sobre a dificuldade de se escrever a história de nosso próprio tempo
visto que parte de nossa história coincide com nossas vidas, dela
acumulamos opiniões e preconceitos como contemporâneos que
fomos, mais do que como estudiosos. Como contemporânea, posso
recordar sobre o curso de Magistério iniciado em 1982, daí decorreu
minha inserção como professora em 1985. Era um período em que
buscávamos outras metodologias para o trabalho, lembro-me de
cursos sobre a Pedagogia Freinet e, posteriormente, sobre Emília
Ferreiro quando fora introduzido o Ciclo Básico no Paraná, no
início dos anos 1990. O clima da época colocava o livro de Dermeval
Saviani como um novo manifesto. Era comum repetirmos a frase
“Quando mais democrática se diz que a escola é, menos democrática
ela foi” (Citação livre). Discutia-se a evasão e a repetência, associada
à baixa qualidade de ensino como um problema a ser solucionado.
Os baixos salários dos professores levaram a longas greves
que culminaram em violência por parte do governo do Estado,
evidenciando as contradições do discurso que colocava a educação
como fundamental e a falta de condições para os trabalhadores do
magistério.

A leitura do livro de Rodrigues nos permite compreender


por meio de sua erudição e rigor teórico-metodológico esse rico
período da história paranaense e brasileira. São tantas as memórias
revividas na leitura desse instigante livro que preciso me concentrar
na prazerosa tarefa que fui chamada a cumprir: a de prefaciar o livro
de Rodrigues. Em síntese, é preciso reafirmar que este é escrito de
forma competente, clara e objetiva, realiza um exame cuidadoso do
E l a i n e R o d r i g u e s 17
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

passado que nos impulsiona para a compreensão de nosso tempo,


confirmando a necessidade constante dos estudos históricos como
fundamentais para que tenhamos um olhar crítico sobre as atuais
políticas educacionais.

O leitor revolverá o nosso passado com a leitura do belíssimo


texto de Rodrigues. Este não pode ser separado de sua autora.
Vasculhei em meu dicionário um adjetivo que pudesse descrevê-
la por completo. Não encontrei. Não existe uma palavra que possa
descrever a mulher, a mãe, a amiga, a profissional, a pesquisadora
que permanece em permanente mutação e amadurecimento. Sua
capacidade de renovação e superação dos desafios é admirável,
desse modo sua vida é um eterno recomeçar. Por isso surpreende e
encanta.

Desejo a todos que a leitura do texto permita uma aproximação


com as pesquisas de Elaine Rodrigues e o reconhecimento de sua
trajetória como competente profissional que é.

Maria Cristina Gomes Machado

18 E l a i n e R o d r i g u e s
Situando este livro

A ideia inicial para esta produção surgiu durante o ano de


1993, quando, prestando serviços à Secretaria de Educação do
Estado do Paraná, ministramos diversos cursos de atualização aos
professores da rede pública de ensino. O texto do projeto, escrito
para embasar o trabalho, objetivava fundamentar a formação do
cidadão paranaense, pautado pelo pressuposto de que a autonomia
conduziria diretamente à cidadania (PARANÁ, 1992).

Atuando como docente da Universidade Estadual de Maringá,


mantínhamos e, ainda hoje, mantemos contato com acadêmicos(as)
do Curso de Pedagogia que traziam, para a sala de aula, inquietações
advindas de suas atuações como professores(as) do Ensino
Fundamental e também da Educação Infantil, atividades essas
fundamentadas no Projeto: Paraná: Construindo a Escola Cidadã,
pensado para o Estado e com o qual já havíamos trabalhado. A
grande preocupação, revelada pelos(as) alunos(as), traduzia-se na
seguinte questão: qual o caminho metodológico que o profissional
de Educação deveria seguir para enfrentar o desafio de (trans)
formar o aluno(a), devolvendo-o(a) para a sociedade como um(a)
cidadão(ã) crítico(a)? (PARANÁ, 1992).

Implicitamente, o questionamento dos(as) alunos(as)


apresentava a tese de que a escola deveria ser a mediadora do
processo de formação do cidadão, compreendido como mantenedor
e construtor da democracia, capaz de exercer a cidadania plena,
fazendo uso de seus direitos político-democráticos, cabendo ao
professor o papel de facilitador desse processo. Capazes de repetir
um padrão narrativo acerca do compromisso do professorado
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

paranaense, os educandos nos levavam a perguntar: como essas


noções foram aprendidas?

O relato angustiado dos(as) alunos(as) acerca de seus


desafios cotidianos conduziu-nos a uma reflexão mais detalhada
sobre essa temática que acabou por configurar um amplo tema de
estudo, ao qual, desde então, temos nos dedicado. O mais recente
desdobramento deste estudo foi o desenvolvimento de um projeto
de pesquisa intitulado História da Educação no Paraná: a imprensa
pedagógica como tema e objeto de pesquisa – 1980 a 1990, seus
resultados estão traduzidos na descrição e problematização que
apresentamos neste livro.

O Paraná, foco de nossos interesses, não conta com um arquivo


que armazene documentação sobre o período. O que encontramos
está localizado em Curitiba, em um setor da Biblioteca Pública do
Paraná, que é denominado Divisão de Documentação Paranaense.
Embora seja um espaço criado para atender a essa finalidade, é
óbvio afirmar que não se pode catalogar e organizar o que não foi
preservado. Aí reside a questão! A SEED – Secretaria de Estado da
Educação - não preservou a documentação referente aos projetos
educacionais desenvolvidos durante as décadas de 1980 e 1990. Com
certeza, não é excessivo destacar, a Escrita da História da Educação
é realizada com base nos vestígios que conseguimos localizar.
Catalogá-los, organizá-los e dar-lhes uma forma passível de análise
é o desafio enfrentado pelos pesquisadores comprometidos com
a produção no campo da História da Educação, particularmente,
em História da Educação no Paraná (LOPES; GALVÃO, 2001;
RODRIGUES, 2010).

O acesso aos documentos nos foi, gentilmente, oportunizado


pela ex-Secretária de Educação, Gilda Poli Rocha Loures. Estavam
guardados em seus arquivos particulares. Obviamente, esse é um
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SITUANDO ESTE LIVRO

percurso pouco convencional para se angariar fontes de pesquisa,


mas cremos não termos sido a única pesquisadora a percorrê-lo. A
viabilização de nosso trabalho deu-se pela boa vontade de pessoas
que, por estarem diretamente envolvidas com a SEED no período
que pretendíamos estudar e por apresentarem o bom senso de não
destruir a memória de seus atos, como gerenciadores da educação,
possibilitaram-nos o adentrar da década de 1980, sob o prisma da
documentação oficial produzida por aquele órgão governamental.
As fontes eleitas para a pesquisa apresentam seu conteúdo em
maior concentração no Jornal da Educação, uma publicação que
permaneceu durante o período de 1983 a 1987. Esse jornal foi criado
com a pretensão de ser um veículo de comunicação entre a SEED e
a comunidade escolar.

As ações da SEED e o teor do discurso que as respaldava, no


período de 1980 a 1990, estão representados no Jornal da Educação e em
documentos, como relatórios de diferentes gestões governamentais,
planilhas estatísticas, atas, entrevistas, atlas históricos, cadernos e
projetos pedagógicos, Cadernos do Fórum Paranaense em Defesa
da Escola Pública, Resoluções dos Congressos da Associação de Pais
e Professores do Paraná nas diretrizes Setoriais 1980/1983, dentre
outros. Optamos por listá-los, ao final deste livro, com o intuito de
colaborar com outros pesquisadores que queiram adentrar esse
universo.

A (Re)invenção da Educação no Paraná: apropriações do discurso


democrático (1980 a 1990) título escolhido e considerado como uma
crítica, de certa forma, elogiosa. Em sentido específico, o termo
invenção significa ato ou efeito de criar, de engendrar, ou seja, um
novo meio pelo qual se pretende alcançar um fim. Redigimos o
texto, mantendo o plural majestático como estratégia de incursão
que objetivou manter um tom enfático, muito comum para os anos
em estudo. Amparados por essas escolhas, para interpretação das
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A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

fontes e apresentação dos resultados de pesquisa, fizemos nosso


mergulho na História da Educação Paranaense.

A Imprensa Pedagógica, quando tomada como fonte, é


significativa, dentre outras possibilidades, para conhecermos a
organização pretendida para o universo educacional escolar de um
período. O Jornal da Educação evidencia as diretrizes oficiais que a
escola recebia e necessitava atender e ao mesmo tempo permite a
identificação de outros fatores integrantes da construção do que
reconhecemos como espaço escolar. “A imprensa constitui uma das
melhores ilustrações da extraordinária diversidade que atravessa o
campo educativo” (NÓVOA, 1997, p. 12-13).

Tomando por base o que está escrito no tabloide, podemos


ampliar a compreensão que se tem construída acerca do universo
escolar, adentrando o ensino e suas características por perspectivas
outras, diferentes daquelas consideradas consolidadas. A Imprensa
Pedagógica pede que a tomemos em seus princípios como aquela
que veicula o interesse de uma pessoa, uma instituição ou um grupo,
objetivando que sua mensagem seja incorporada; ela não divulga as
informações de forma imparcial, ao contrário, propaga aspirações,
concepções políticas, ideológicas, apresenta necessidades e objetivos
específicos do grupo que propõem sua editoração e garante sua
circulação.

Amparamo-nos em Certeau (2006) para afirmar que uma


pesquisa não se faz fora de um lugar social, sem comprometer-se
com as regras e metodologias que orientam o pesquisador e fazem-
no repensar e ou readequar o seu trabalho: “[...] é em função deste
lugar que se instauram os métodos, que se delineia numa topografia
de interesses, que os documentos e as questões, que lhes serão
propostas, se organizam” (CERTEAU, 2006, p. 67).
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SITUANDO ESTE LIVRO

Reconstruir o sentido, até então, atribuído aos termos Educação,


Democracia e Cidadania, era um desafio para a década de 1980.
Para que esse novo sentido fosse incorporado, o Paraná promoveu
a circulação de um discurso, inventando ações que intencionavam
levar o homem paranaense a se compreender como cidadão crítico.
Essas palavras não apresentavam significação relevante no cotidiano
escolar paranaense daquele período, habituado que estava a ouvir
expressões que remetiam à autoridade, civismo e obediência.
Gradativamente, essas designações de comando passaram a ser
questionadas e substituídas por novas palavras de ordem, mais
sutis, porém não menos disciplinares.

Inspirando-nos em um olhar foucaultiano, que estabelece


relações entre disciplina, controle e vigilância: no nosso caso
específico, deparamo-nos com os desdobramentos dos projetos
elaborados para a nação e, em consonância com eles, a Secretaria
de Estado da Educação do Paraná cria um discurso divulgador
de estratégias promotoras de um conceito, uma concepção de
modernização educacional, criadora e vigilante, por assim dizer,
de um sujeito educacional que apresentava, naquela dimensão
espaço-tempo, uma nova identidade, a do cidadão crítico. Foucault
(1987) permite problematizarmos o uso de instrumentos simples,
como a visão hierárquica, sem dúvida, vigilante, dos dirigentes
educacionais em relação à comunidade educacional escolar, forma
mais que identificável nos documentos eleitos como fontes.

O que priorizamos para nossa análise é a premissa de que o


discurso constrói-se pela linguagem que é uma figura e, portanto,
como tal, nunca é a mesma coisa na realidade, mas sim, representação,
imagem da coisa real. O que estudamos são figuras que querem
representar ou criar imagens sobre o real, mas não coincidem com
o real concreto.
E l a i n e R o d r i g u e s 23
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Não existe sujeito pedagógico fora do discurso pedagógico, nem


fora dos processos que definem as suas posições e significados. A
existência de um sujeito pedagógico não está ligada a vontades ou
individualidades autônomas e livremente fundadoras de suas práticas.
O sujeito pedagógico está construído, é formado e regulado nos discurso
pedagógico, pela ordem, pelas posições e diferenças que esse discurso
estabelece. O sujeito pedagógico é uma função do discurso no interior
da escola e, contemporaneamente, no interior das agências de controle
(SHERIDAN, 1980, p. 75 apud VEIGA-NETO, 2003, p. 110).

O discurso moderno elege a preeminência da linguagem sobre


a experiência ou nas palavras de Foucault: “[...] se a linguagem
exprime, não o faz na medida em que imite e reduplique as coisas,
mas na medida em que manifesta e traduz o querer fundamental
daqueles que falam” (FOUCAULT, 1992, p. 306). Entendemos
ser esse um balizador para a reflexão. O projeto pedagógico para
o Paraná, dos anos de 1980 a 1990, é compreendido, por outros
estados brasileiros, como figura de vanguarda no cenário das
mudanças educacionais. O Brasil lutava por uma mudança em
seu cenário político-educacional. Cabe então perguntar: por que o
Paraná aparece como vanguarda?

O Paraná criava determinadas ações, que eram reproduzidas


em outros estados, por serem compreendidas como um modelo
para a efetivação da Educação democrática no país. As estratégias
que a SEED utilizava pretendiam levar o homem paranaense,
e, na extensão do projeto, o brasileiro, a compreender-se como
responsável pelos encaminhamentos de sua sociedade, a ser um
cidadão, mas não um qualquer, indeterminado, ele seria, agora, um
cidadão adjetivado, um cidadão-crítico!

Ser cidadão crítico, segundo o projeto da SEED, em uma


democracia, pressupunha assumir-se corresponsável pelo destino
da nação. Frases assim, quotidianamente proferidas, tão comuns
que não causam estranheza aos nossos ouvidos, foram, no início da
década de 1980, recebidas como inovadoras. O Estado Paranaense
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SITUANDO ESTE LIVRO

utiliza-se de argumentos direcionados ao convencimento, apoiando-


se em um discurso, ousamos afirmar, de tônica pietista.

A composição deste livro primou por elucidar nossa


compreensão acerca do que caracteriza a (re)invenção da Educação
no Paraná, no período compreendido entre os anos de 1980 a 1990.
Apresentamos, na primeira parte, o discurso produzido pelos
partidos de oposição em favor da democracia e em oposição ao
regime militar, uma incursão panorâmica que objetivou evidenciar
o tom enfático, característico do período.

No segundo bloco situamos a discussão no Paraná, mais


especificamente no projeto de Educação proposto pela Secretaria de
Estado. O destaque às ações pretendidas para o campo educacional
justifica-se porque nele se depositava a crença de uma educação
redentora, salvacionista. Os dois últimos itens foram, para esta
publicação, ampliados e revistos, e tiveram uma versão prévia, mas
optamos por reapresentá-los porque no processo de amadurecimento
da pesquisa acerca do tema em discussão compreendemos que
as estratégias ali discutidas muito bem representam as tensões e
intenções que circunscreveram o período recortado para nossa
descrição e problematização. Portanto, há que se considerar que,
“Malgrado a ficção da página em branco, sempre escrevemos sobre
algo escrito” (CERTEAU, 2012, p. 103).

E l a i n e R o d r i g u e s 25
Parte I
Coração de estudante
Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo
Tomar conta da amizade
Alegria e muito sonho
Espalhados no caminho
Verdes, planta e sentimento
Folhas, coração,
Juventude e fé.
(NASCIMENTO; TISO, 1980)
1
EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO
E GOVERNAMENTALIDADE DA POPULAÇÃO

Durante os anos da década de 1970, sob a égide do regime


autoritário, proferia-se um discurso que, no intuito de justificar
as ações repressivas, construía seu argumento, tomando por base
o medo. A população brasileira aprendeu que a possibilidade
de instauração do comunismo como regime político para a
administração da pátria era algo a se temer, diríamos, sem maiores
aprofundamentos, e isso se tornou quase um medo mítico no
imaginário social. A manutenção da vida desse espectro mítico
figurava como uma atitude estratégica para que a extrema direita
desenvolvesse suas táticas de poder.

Os militares, detentores das ferramentas governamentais,


criavam, como define Certeau (2012), estratégias e táticas em que
o medo, forma de ‘governamentalidade’ da população, aparecia
personificado como um saber de governo, um saber que antecedia
todos os processos referentes ao bem-estar da população, justificando
o estabelecimento de determinado cuidado para com a nação, em
defesa da soberania nacional (FOUCAULT, 2004).

As violentas atitudes contra os direitos democráticos que


caracterizaram o período ditatorial brasileiro justificavam-se em
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

nome do cumprimento do dever cívico, da manutenção da ordem


moral e dos bons costumes, palco, por excelência, de uma estrutura
altamente repressiva, evidenciada por uma forma de governo
que se reproduzia, dentre outras estratégias, por meio de eleições
não diretas para os cargos de governadores de estado, bem como
senadores e presidente da República.

O retorno ao pluripartidarismo e as eleições diretas para


governador, entre outros, são fatos que deram contornos decisivos
à política nacional da década de 1980. Assinalaram o término do
regime de exceção e apontaram para a criação de um regime que
se diferenciaria do anterior por apresentar respeito aos direitos
institucionais, valorizando as garantias democráticas, que se
encerraram nas eleições diretas à presidência da república, e a
possibilidade de diálogo entre o Executivo e o Legislativo e deles
com os movimentos sociais populares.

Os anos da década de 1980 foram marcados por movimentos


que causaram e foram causadores de mudanças consideráveis no
cenário político do país. Podemos citar como exemplo: a realização
de eleições para governadores, senadores, prefeitos e vereadores; a
campanha Diretas-já!; as greves em várias categorias profissionais.
Em caráter nacional, tivemos o movimento grevista dos professores
das Universidades Federais, dos médicos residentes, dos bancários,
dos marítimos, dos funcionários da Empresa Brasileira de Correios
e Telégrafos. O retorno ao pluripartidarismo e, com isso, a criação
de partidos declarados opositores ao regime ditatorial fizeram
nascer o PT1, PSDB, PC do B, PCB, PTB, PDT e o MDB passou a atuar

1 Marilena Chauí em entrevista coloca sua versão de como nasceu o PT, ela declara:
“[...] É. Eu digo isso literalmente: poucos intelectuais podem ter na vida o privilégio de ter
uma proposta de esquerda em que a história seja feita pelos próprios trabalhadores e não
por uma vanguarda intelectual, e dar de cara com eles. [...] O primeiro encontro foi muito

30 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

sob a legenda PMDB, a Arena transformou-se no PDS, mantendo


as características de um partido governista (RODRIGUES, 1994;
FAUSTO, 1996; SKIDMORE, 1985).

O Congresso Nacional, por intermédio do Decreto-lei nº


6.683/1979, concedeu anistia aos exilados políticos, convocou,
no ano 1987, uma Assembleia Nacional Constituinte e em 1988
promulgou uma nova Constituição para a nação – a denominada
Constituição Cidadã, em 1989. Fechando os acontecimentos políticos
desse período, ocorreu a primeira eleição direta e democrática para
suprir o cargo de Presidente da República.

Consideramos o ano de 1979 um marco importante para o


entendimento do que se convencionou denominar processo de (re)
construção democrática no Brasil. O governo militar, representado
na figura do General João Batista de Figueiredo, pretendia que a

divertido. Fomos para o ABC e os operários diziam: ‘Vieram fazer tese, professora?’. Todos
eles perguntavam porque uma das formas que a resistência tinha tomado era estudar a classe
operária, fazer tese sobre classe operária, não havia outro assunto. Todo mundo foi pra lá. E
foi maravilhoso, porque eles tiveram distanciamento com relação a nós perguntando se eram
objeto de estudo. Ficou todo mundo com a cara no chão aí a gente não tem coragem de dizer:
‘Não somos companheiros, viemos aqui para participar’. Com que cara você vai falar isso?
Então num primeiro momento eles [sindicalistas] recusaram a nossa presença [dos estudantes
e professores universitários]. [a aproximação se deu muito devagarinho] Foi então que Jacó
Bittar propôs que se criasse um partido político, e houve uma reação violenta da classe. Porque
a imagem que a classe tinha era uma imagem correta, aliás, tinha duas imagens, a imagem do
Partido Comunista e das vanguardas, e eles não queriam saber de nenhuma das duas. [...] Aí
aconteceu que os operários se cansaram das discussões [...] E havia três posições. Uma dizia:
precisa continuar a infiltração no PMDB, e transformar o PMDB; a outra era: ‘Não, é preciso
criar um partido socialista fora das hostes do PMDB; e a terceira era: Não, não se cria partido
político nenhum, vamos agir sob a forma dos movimentos sociais’. Só que a partido de um
determinado momento quando começava o esgotamento do poder das greves, e depois vem a
prisão do Lula e tudo, ele tiveram uma discussão lá no ABC e viram que o sindicato não era o
suficiente. Eles se deram conta de que o que estavam fazendo não passava só pela relação de
trabalho, era uma coisa que atingia a sociedade inteira, e que portanto só através do sindicato
ele não iam chegar a lugar nenhum. E decidiram criar um partido. E a questão que eles se
colocaram foi: ‘Que partido?’ O Lula disse: ‘Dos trabalhadores’. É assim que nasceu.” (CHAUÍ,
M. Todo mundo tem de viver uma grande paixão e uma possibilidade de revolução. Entrevista
concedida a Revista Caros Amigos, Série Grandes Entrevistas, n.3, abr. 2001, p. 5-11).

E l a i n e R o d r i g u e s 31
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

transição do regime militar para o regime democrático se fizesse


de forma lenta, gradual e segura, e os analistas2 da época a
denominavam, em transição controlada. E assim se deu, o Brasil
criou uma democracia, mas o fez de maneira assistida! (CARDOSO,
1985).

Foi concedida anistia aos punidos pelos atos de exceção, a


Lei nº 6.683/1979 beneficiou também os torturadores e não foi o
que podemos denominar de uma lei ampla, geral e irrestrita, como
a reivindicação das oposições sugeria ao regime militar, mas não
podemos deixar de considerar que ela representou o reparo, ao
menos em parte, dos males causados à sociedade pela ditadura.
Significou, também, um avanço na luta pelo fim do militarismo.
Com essa lei, o Brasil recebeu de volta alguns de seus importantes
líderes, tais como, Leonel Brizola, Miguel Arraes e Luiz Carlos
Prestes.

A Lei orgânica dos partidos políticos, nº 6.767/1979, sancionada


pelo governo federal, modificou e legalizou a formação de novas
agremiações. Essa atitude pretendia pulverizar a força oposicionista
que se concentrava na legenda do MDB (Movimento Democrático
Brasileiro). Ação que foi percebida e registrada por um dos líderes
do MDB, que declarou: “[...] apesar de os setores, mais importantes
da oposição, espernearem bastante, a reforma partidária implantou-
se dentro dos limites permitidos pelos detentores do poder”
(CARDOSO, 1985, p. 15).

2 Alguns nomes que analisavam e posicionavam-se diante dos acontecimentos políticos


da época: Fernando Henrique Cardoso, Celso Furtado, Carlos Lessa, José Serra, Maria da
Conceição Tavares, João Manuel Cardoso de Mello, estes personagens foram membros de
partidos oposicionistas e após a retomada de eleições diretas passaram a fazer parte do cenário
político nacional como membros da Assembléia Legislativa Estadual e Federal, do Senado dos
Ministérios Públicos e até mesmo da Presidência da República.

32 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

A representatividade do PMDB, maior partido de oposição,


assim caracterizado pelos analistas da época, manifestou-se nas
eleições para governadores de estado no ano de 1982. O partido
elegeu os dirigentes dos Estados de São Paulo – Franco Montoro,
Minas Gerais – Tancredo Neves, Paraná – José Richa, e Goiás – Iris
Rezende3.

A partir da posse dos novos governadores de Estado,


articulou-se uma campanha interpartidária, mas com características
oposicionistas, em prol das eleições diretas para a Presidência
da República. Essa ação foi frustrada e, assim, criou-se o que se
denominou de Aliança Democrática, reunindo ao PMDB um setor
dissidente do PDS, formando-se esforços para a eleição do então
Governador de Minas Gerais, Tancredo Neves, a Presidente, tendo
como vice o ex-Presidente do PDS, José Sarney. Essa aliança visava
à “[...] conciliação entre a sociedade e o Estado, entre o povo e o
governo” (CUNHA, 2001, p. 25).

A aliança fez ampla campanha. Como resultado, foi eleito, em


janeiro de 1985, ainda pelo colégio eleitoral, o primeiro Presidente da
República civil desde 1964. Na véspera de sua posse, em 15 de março
de 1985, Tancredo Neves foi internado com grave enfermidade,
vindo a falecer em São Paulo, a 21 de abril de 1985. “Um sentimento
geral de frustração tomou conta da nação” (CUNHA, 2001, p. 27;
FAUSTO, 1996; SKIDMORE, 1985;).

No ano de 1986 ocorreram eleições diretas para deputados


e senadores. No ano seguinte 1987, instalou-se a Assembleia
Nacional Constituinte, a partir da qual se formulou a Carta Magna

3 O objetivo de nosso trabalho não é nos aprofundarmos no tema das eleições de 1982,
mas vale lembrar que a Revista Brasileira de Estudos Políticos de n. 57 dedicou-se a publicar
uma série de artigos bastante detalhados sobre a questão.

E l a i n e R o d r i g u e s 33
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

promulgada no ano de 1988, ainda em vigor. Finalizando um ciclo


de acontecimentos importantes para a democratização do país, em
novembro e dezembro de 1989 se realizou a primeira eleição direta
para Presidente da República. Foi eleito Fernando Collor de Mello,
ex-Governador de Alagoas, sob a legenda do PRN. Depois de dois
turnos eleitorais e de vencer o candidato Luiz Inácio Lula da Silva4,
representante da Frente Popular, que era formada pelos partidos
PT, PSB e PC do B, tomou posse, em 1990, o primeiro Presidente da
República, eleito por voto direto desde o ano de 1964. Esses fatos,
inquestionavelmente, marcaram uma transformação significativa
na vida cotidiana da nação brasileira.

São fatos que transitaram em julgado na história – os de que houve


alguma transformação significativa no que diz respeito, primeiro, à
anistia, depois à reforma partidária. Enfim, os grandes temas que não
foram propostos pela oposição, ou pelo menos cujo desencadear não foi
suscitado pela oposição, e cuja forma adotada tampouco foi o que ela
queria. Tanto assim que fomos obrigados a nos opor à lei da anistia na
forma proposta pelo Governo, porque ela era restritiva. E de fato era.
Só que na aplicação não o foi, ou seja o Governo, como controlava o
processo, fez passar uma lei que era restritiva, tirou da oposição a vitória
política de ter sido a autora do processo de anistia, e depois deu por
via administrativa uma anistia que foi estendendo gradualmente ao seu
talante, ou seja, de acordo com seus interesses. O Governo deu o ritmo
da anistia (CARDOSO, 1985, p. 12-13).

Da mesma forma ocorreu com a reforma partidária, o que


prevaleceu, nos dois casos, foi o ponto de vista e os encaminhamentos
propostos e definidos pelos detentores do poder. O contexto era
de redemocratização, e palavras como conciliação, negociação
e democracia passaram a definir e integrar o vocabulário de um
processo que o poder governamental insistia que acontecesse de
forma lenta, gradual e segura.

4 Figura que desponta no cenário nacional durante as greves do ABC paulista no ano
de 1978-1979.

34 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

No interior dessa fornalha o Brasil avançava. Isso era um fato!


Parece-nos, entretanto, que a direção que o processo de transição
tomaria era algo que tanto os detentores do poder como o restante
da população descobriu à medida que caminhavam. O universo
brasileiro, e mais especificamente o paranaense desse período,
moviam-se em direção a uma posição de caráter salvacionista e o
discurso pedagógico era o meio estratégico de salvação. A crença
na ideia: ‘tudo o que se fez até aqui está errado, eu tenho a salvação’
disseminou-se, com grande aceitação popular, o que trouxe às
praças milhares de manifestantes organizados, entoando cantos5
em favor da democracia. A mídia exerceu papel fundamental,
porque assumiu a defesa desses movimentos. Cabe ressaltar que
não podemos considerar esse fato descaracterizador do espírito que
envolveu aquela década. Entendemos a mídia como veículo produtor
e produzido, ela dita regras de comportamento, mas não pode fazê-
lo sem respaldo na vida prática, vivenciada pelos cidadãos.

Era consenso admitir, no início da década de 1980, que a


identidade nacional fora estilhaçada, seus aspectos culturais,
econômicos e mesmo regionais esfacelaram-se durante os anos
de regime militar. No plano cultural, os valores artísticos,

5 “A campanha das ‘Diretas-Já’ foi coordenada pelo Comitê Nacional Pró-Diretas, órgão
suprapartidário que contou com a participação dos partidos políticos de oposição, de associações
estudantis e profissionais e das centrais sindicais. Em todo o País, entre janeiro e abril de 1984,
realizaram-se nas capitais e principais cidades comícios que reuniram multidões. O maior deles
aconteceu no Anhangabaú, em São Paulo, ao qual compareceram cerca de 1,7 milhão de pessoas
que, sob um clima de absoluto entusiasmo entoaram o estribilho ‘um, dois, três, quatro, cinco,
mil, queremos eleger o presidente do Brasil’ e o ‘Caminhando’, música de Geraldo Vandré,
quase um hino da campanha. Comprovando o dizer de Milton Nascimento, ‘todo artista tem
de ir aonde o povo está’, atores, apresentadores de TV e cantores acompanharam os políticos
aos palanques, emprestando apoio ao movimento. Os meios de comunicação, inicialmente
indiferentes, acabaram por dar cobertura total às diretas. O Hino Nacional, cantado a uma só
voz em ruas e praças, passou a significar a unidade em torno do desejo de mudanças. Vivia-se
um clima de esperança vestida de vibrante amarelo, a cor símbolo das ‘Diretas-Já’, a preferida
de qualquer brasileiro naqueles dias” (RODRIGUES, 1994, p. 18-19).

E l a i n e R o d r i g u e s 35
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

patrimoniais, hábitos e costumes haviam se diluído em meio à


repressão. Os partidos de oposição professavam e esforçavam-se
para fazer crer que se poderiam resgatar a soberania, a identidade
da nação, mas seriam necessárias clareza e consequência. Clareza,
para entender que o problema central da autonomia nacional
estava na capacidade de o povo criar e definir, segundo interesses
próprios, formas alternativas de cultura e desenvolvimento.
Atitudes consequentes! Condição prévia para o enfrentamento
dos desafios que permitiriam preservar e ampliar a capacidade
de decisão nacional.

No mês de agosto, do ano de 1982, o documento Esperança


e Mudança fora publicado como uma pretensa proposta para o
governo do Brasil (ESPERANÇA..., 1982). O documento partia do
pressuposto de que o Brasil, desde os anos 1930, não sofria uma
crise econômica e social tão profunda. A mais grave crise política
da história do país, essa afirmação, interpretativa, figurou como
constatação para justificar a proposição de um divórcio entre a
sociedade e o Estado. Havia ausência de confiança, o que se impunha
pela presença de um Estado autoritário. O documento propunha-
se ‘um instrumento para um novo Brasil democrático’, merecedor
da necessária representatividade política, ausente nos governos
formados pelo colégio eleitoral. Vislumbrava-se a criação de um
berço para o nascimento da democracia no Brasil, que se daria por
meio da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
Os partidos de oposição, e o mais representativo numericamente
era o PMDB, professavam em seus programas, divulgadores dos
discursos de seus membros, que “mudanças ocorreriam se houvesse
um re-encontro do povo com o poder político” (ESPERANÇA...,
1982, p. 8).

O projeto para o Brasil dos anos de 1980 constituía-se


com base na crença de que a população brasileira ansiava por
36 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

democracia e isso faria com que se lutasse por ela, bastando


que fosse estimulada e que se aprendesse a reivindicar direitos.
Os governos estaduais, eleitos por voto direto, posicionavam-
se como mediadores na construção desse ideal, propunham-se a
somarem esforços com a sociedade, fazendo seu papel, por meio
da promoção de estratégias de ação e convencimento, como um
canal de condensação dos interesses sociais e, para que isso se
viabilizasse, propunha-se a oferecer à sociedade um projeto global
e coerente com a situação real do país, almejando a transformação
democrática da vida nacional.

Há que se considerar, ainda, que houve um deslocamento da


população que vivia no campo para as cidades, e esse crescimento
desordenado produziu desdobramentos, nada positivos, resultando
em criminalidade e insegurança, como afirma Boris Fausto, a ‘mão
invisível’ do mercado não estabelece prioridades sociais (FAUSTO,
1996).

Planejamento democrático, essa era a proposição. O objetivo


seria garantir um conjunto de ações públicas que se estruturassem
democraticamente. As prioridades seriam definidas seguindo a
elaboração de um plano, sob controle e influência das instituições
democráticas, fixadas por lei e supervisionadas pelo Congresso
Nacional, com a interação e auxílio das organizações populares.
A máxima que moveria o plano era a crença de que o ‘Brasil era
um país rico – com um povo pobre’. A Educação, e por excelência,
as escolas seriam, nesse contexto, conclamadas como instituições
capazes de concretizar as mudanças almejadas (ESPERANÇA...,
1982).

O documento tinha como premissa que a democracia deveria


ser entendida como estado de direito, no qual houvesse garantia
de liberdade de pensamento e de organização popular, mantendo-
E l a i n e R o d r i g u e s 37
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

se respeito à autonomia dos movimentos sociais. Essas condições


somente seriam possíveis por meio de partidos políticos sólidos,
institucionalmente comprometidos com a democracia.

O conceito de Democracia6 representava-se no voto direto e


livre, restaurador da dignidade e das prerrogativas do Congresso,
do poder judiciário, da liberdade e autonomia sindical, do direito à
informação, acesso aos meios de comunicação de massa. Democracia
implicava democratização das estruturas do Estado, resgate da
soberania nacional, redistribuição de renda, criação de empregos e
bem-estar social crescente.

Diante das prerrogativas democráticas, depositava-se na


Assembleia Nacional Constituinte a honra de ser o berço da
democracia, um espaço pacífico e capaz de ser representativo dos
anseios do povo, que figuraria como uma solução-síntese para os

6 Bobbio (1999) em seu artigo Ditadura e Democracia, que foi publicado primeiramente
como verbete da enciclopédia Einaudi, e mais recentemente como capítulo de seu livro
Estado, Governo e Sociedade, faz a seguinte argumentação: “Da idade clássica a hoje o termo
‘democracia’ foi sempre empregado para designar uma das formas de governo, ou melhor, um
dos diversos modos com que se pode ser exercido o poder político. Especificamente, designa
a forma de governo na qual o poder político é exercido pelo povo. Na história do pensamento
político, o posto em que se coloca a discussão a respeito da opinião, das características, das
virtudes e dos defeitos da democracia é a teoria e a tipologia das formas de governo. Portanto,
qualquer discurso sobre a democracia não pode prescindir de determinar relações entre a
democracia e as outras formas de governo, pois somente assim é possível individualizar o
seu caráter específico. Em outras palavras, desde que o conceito de democracia pertence a
um sistema de conceitos, que constitui a teoria das formas de governo, ele não pode ser
compreendido em sua natureza específica senão em relação aos demais conceitos do sistema,
dos quais delimita a extensão e é por ele delimitado”. (BOBBIO, 1999, p. 135). Cunha (2001),
em seu livro Educação, Estado e Democracia no Brasil cita Bobbio para responder à pergunta:
Mas o que quero dizer quando utilizo o tão celebrado quanto impreciso termo democracia?
Uma definição mínima de democracia reconhece como tal o regime onde exista um “conjunto
de regras de procedimento para a formação de decisões coletivas, em que está prevista e
facilitada a participação mais ampla possível dos interessados” (CUNHA, 2001, p. 20)
[Tratando especificamente do caso brasileiro afirma:] “Tratar de democracia no Brasil é uma
atividade que remete mais ao plano das esperanças do que ao das realizações. Com efeito,
quando é que podemos dizer que houve um regime verdadeiramente democrático no Brasil”
(CUNHA, 2001, p. 20).

38 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

problemas do país. Essa máxima era apregoada pelos meios de


comunicação. Os problemas políticos, econômicos e sociais que
afligiam a nação brasileira dependiam, para seu equacionamento
e solução, da institucionalização do regime democrático,
legitimamente possível (ESPERANÇA..., 1982, p. 9).

Acreditar na democracia era crer na ruptura com o longo


passado autoritário e elitista, significava permitir a participação
autônoma dos movimentos sociais nas decisões nacionais por meio
de representação legitimada pelo voto direto. Saúde, educação,
previdência social, seguro-desemprego figuravam como elementos
de um discurso aceito e reproduzido por todos, chegando a uma
aparente homogeneidade de objetivos, como exigências mínimas
de uma sociedade democrática. Defendia-se o fim da situação de
descalabro em que se encontrava a vida social, política, econômica
e educacional do País, e, para tanto, era preciso garantir, “através
da democratização das decisões, que as novas políticas fossem
efetivamente guiadas por critérios de justiça e equidade social”
(ESPERANÇA..., 1982, p. 4).

O programa governamental do PMDB professava, como


objetivo, garantir a estada do povo na origem do poder, projetando,
na participação popular, a possibilidade de reversão do quadro
social e político vigente. Essa projeção viabilizar-se-ia por meio da
utilização de instrumentos democráticos.

Não confundir o fortalecimento do poder nacional com


o fortalecimento de qualquer força que fosse decorrente de um
caráter autoritário era uma meta. O poder nacional seria legítimo
ao significar condensação dos interesses do povo, pois os interesses
econômicos, sociais, políticos e culturais populares é que deveriam
definir os interesses nacionais. A expressão dos interesses populares
nacionais somente seria possível num estado democrático, Estado
E l a i n e R o d r i g u e s 39
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

de direito em que a sociedade, organizada e livre, expressasse, por


meio de partidos políticos, sindicatos e demais organizações, um
Estado em que o controle das decisões fosse exercido pelos cidadãos.
Esse era o discurso, esse era o enunciado!

Institucional era a democracia, instrumentalizada por uma


Constituição estruturada pela vontade política da sociedade.
Em defesa da democracia, professava-se a seguinte afirmação:
“enquanto estiver arruinada a democracia neste País, arruinadas
estarão a vida de milhares de homens, mulheres, jovens e crianças
no Brasil” (ESPERANÇA..., 1982, p. 42). O fundamental era,
institucionalmente, instaurar-se a democracia. Os males do Brasil
residiam na arruinada democracia estabelecida no país, instituída
pelo arbítrio e pelo autoritarismo.

A política ou é interprete da rua, através do veículo convencional


civilizado, democrático enfim, da sociedade ou ela, pela incompetência
cegueira e prepotência dos governantes, explode com desespero e sangue
na rua, confirmando o sombrio vaticínio de que ‘a violência é a parteira
da história (ESPERANÇA..., 1983, p. 5-6).

Os partidos favoráveis à democracia declaravam-se abertos


ao diálogo com a sociedade, com os estudantes, com a Igreja,
com entidades, como a OAB e a ABI, a mocidade e seus órgãos
representativos, como a UNE, com as mulheres e suas organizações,
com os sindicatos e empresários, inclusive as respectivas federações
e confederações, com as minorias discriminadas, os negros, os índios
e demais setores organizados (ESPERANÇA..., 1983).

Na perspectiva, ainda, do estabelecimento de um diálogo, o


discurso democrático predispunha-se a discutir, também, com as
representações institucionalmente organizadas, com o objetivo de
interferir no sentido de reverter a situação do sistema educacional
40 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

do país, que se encontrava em crise. Uma crise que deflagrava


problemas graves em todos os níveis de ensino.

Os programas do Mobral apresentavam-se insuficientes


e inadequados para reduzir os altos índices de analfabetismo
registrados no país. Cerca da quarta parte da nossa população
ainda era praticamente analfabeta. Questionava-se a padronização
dos conteúdos, por se entender que eles não atendiam à diversidade
de experiências de vida dos trabalhadores, e os métodos utilizados
não correspondiam à necessidade pedagógica e ao direito social de
participação no processo educativo. O outro argumento versava
sobre o sistema pré-escolar no país, assumindo que aquele era
altamente deficiente, pois alcançava uma parcela muito reduzida
das crianças com idade entre quatro e seis anos, praticamente
excluindo os filhos das famílias de baixa renda. A oferta de pré-
escolas públicas não atendia adequadamente às necessidades de
alimentação, saúde e higiene das crianças pobres e o objetivo do
trabalho desenvolvido era, sobretudo, instrumentalizar o educando
para que pudesse acompanhar o ciclo seguinte da etapa escolar, o
que hoje denominamos Ensino Fundamental.

Quanto ao ensino, apesar de um crescimento quantitativo


em termos absolutos, ainda era evidenciado, pelos idealizadores
do programa, como ‘insuficiente e precário’, situação que se
agravava nas regiões mais pobres. O número de crianças fora
da escola mantinha-se alto há anos, e, mesmo nas regiões onde
a renda familiar era maior, os índices de analfabetismo eram
alarmantes.

O que a seguir apresentaremos é fruto de um comparativo


sobre os índices de analfabetismo e a população eleitoreira existentes
nos quatro Estados que elegeram governadores por voto direto, sob
a bandeira democrática, no ano de 1982.
E l a i n e R o d r i g u e s 41
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Unidades da Federação e População total Taxa de


Analfabetos
municípios eleitora analfabetismo
São Paulo (Estado) 2.647.256 125.524 4,7
São Paulo 854.973 36.160 4,2
Campinas 69.649 2.452 3,5
Santo André 58.427 1.444 2,5
Guarulhos 55.297 3.043 5,5
Osasco 51.765 2.158 4,2
Paraná (Estado) 917.250 83.832 9,1
Curitiba 117.723 3.467 2,9
Londrina 35.982 1.680 4,7
Ponta Grossa 21.366 760 3,6
Maringá 20.413 636 3,1
Cascavel 20.055 1.684 8,4
Minas Gerais (Estado) 1.604.013 200.468 12,5
Belo Horizonte 213.754 10.046 4,7
Contagem 32.645 1.840 5,6
Governador Valadares 25.151 2.027 8,1
Juiz de Fora 36.614 1.351 3,7
Uberlândia 30.256 1.320 4,4
Goiás (Estado) 456.458 70.061 15,3
Goiânia 93.080 4.542 4,9
Anápolis 22.827 1.440 6,3
Luziânia 9.525 1.495 15,7
Itumbiara 9.252 1.222 13,2
Araguaina 8.228 1.699 20,6
Quadro 1 – Comparativo entre o índice de analfabetismo e a totalidade da
população eleitora, registrada no ano de 1982, nas regiões que elegeram
governadores sob a bandeira democrática.

Privilegiamos para a organização do Quadro 2 os índices


referentes às Capitais e às maiores cidades de cada um dos
Estados.
42 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

Unidades da Federação População total Taxa de


Analfabetos
e municípios eleitora analfabetismo
São Paulo 2.647.256 125.524 4,7
Paraná 917.250 83.832 9,1
Minas Gerais 1.604.013 200.468 12,5
Goiás 456.458 70.061 15,3
Quadro 2 – Comparativo entre o índice de analfabetismo e a totalidade da
população eleitora, registrada no ano de 1982, nas capitais e principais cidades
de Estados que elegeram governadores sob a bandeira democrática.

Gráfico 1 – Referente ao Quadro 2. Distribuição do índice de analfabetismo,


relacionados à população eleitoreira, por Estado brasileiro com maior apoio
aos governos democráticos (1982).
Fonte: Rodrigues (2002, p. 50).

O Paraná apresenta o terceiro maior índice de analfabetismo


em relação à população eleitoreira, por Estado brasileiro que elegeu
governadores que fizeram suas campanhas, tomando por base o
documento Esperança e Mudança.

Os problemas educacionais sustentavam grande parte


dos argumentos utilizados para a constituição do programa
dos governadores que se declaravam engajados na luta pela
democratização pretendida para o Brasil. O acesso ao saber,
E l a i n e R o d r i g u e s 43
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

privilégio de uma minoria, passou a ser motivo de luta para os órgãos


governamentais, responsáveis pela educação nacional. A renovação
da Educação seria a condição fundamental para a democratização
da sociedade brasileira. Essa era a afirmação!

A importância atribuída ao papel da Educação na construção


da sociedade requeria, segundo o programa Esperança e Mudança,
um planejamento educacional criterioso, que se norteasse
fundamentalmente pela garantia de idênticas oportunidades de
ingresso, permanência e aproveitamento, no sistema educacional,
das diferentes camadas e segmentos do povo brasileiro.

Ainda como parte das estratégias de crescimento e


fortalecimento da democracia, o Ensino Fundamental público era
convocado a realizar sua parte no processo de democratização,
atendendo à criança brasileira com o intuito de torná-la um cidadão.
Isso seria possível mediante a destinação de maiores recursos
ao ensino, a fim de garantir, para todas as crianças, condições
de ingresso, permanência e aproveitamento na escola até o final
do primeiro ciclo escolar (ESPERANÇA..., 1982). O discurso se
completava:

A redefinição da organização, estrutura e currículos da escola básica


de oito anos, com ênfase na revisão dos critérios sociais para a escolha
e dosagem dos conteúdos curriculares, tornando-os compatíveis com
as situações de vida e as condições de aprendizagem da maioria da
população. Estímulo e experiências alternativas de ensino de 1º grau,
conduzidas pelas populações de baixa renda e pelas classes trabalhadoras,
através de seus organismos representativos como sindicatos, associações
de bairro e centros comunitários. [...] Desenvolver e implantar métodos
e sistemas que aperfeiçoem a administração [...] buscando aumentar a
eficiência de sua função educativa, sem perder de vista a meta última
de sua democratização. O objetivo maior da nova política deve ser o de
promover a construção de uma educação autenticamente democrática, em
todos os níveis do sistema de ensino e nas demais atividades educativas
desenvolvidas no país (ESPERANÇA..., 1982, p. 42-43).

44 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

Acreditava-se e professava-se a máxima que afirmava: com


a implementação e viabilização desse programa, oferecer-se-iam
alternativas institucionais, econômicas e sociais que objetivavam
mudanças para a sociedade. As estratégias de ação contavam,
ainda, com a expectativa da convocação de uma Assembleia
Nacional Constituinte, com eleições diretas, de caráter universal
e secreto, que seriam mais um elemento no caminho a ser trilhado
para a conquista do direito democrático, pertencente a todos
os cidadãos em uma República, de ajudar a decidir e dirigir o
destino da nação.

Eleição livre e direta não significava apenas o direito de


escolha, mas um exercício de reflexão sobre desafios e sacrifícios
que todos enfrentariam, juntos, para a salvação do Brasil.

É só através do voto LIVRE que se poderão consubstanciar as


verdadeiras prioridades, as desejadas pela sociedade. O Voto Direto é
isso: consubstanciação, num determinado momento da vontade e das
necessidades dos cidadãos, indicação precisa e insubstituível de suas
prioridades. [...] Eleição direta é o caminho mais direto para o Estado
Democrático, para a participação nas decisões, para a Assembléia Nacional
Constituinte que haverá de assentar em novas bases a vida brasileira. [...]
O PMDB condena o colégio eleitoral. Urge recuperar a liberdade de ação
em face das pressões externas, reconstituir os instrumentos da política
econômica, e redefinir prioridades para satisfazer as necessidades mais
prementes da população. Trata-se de retomar o crescimento e ao mesmo
tempo redirecioná-lo. O País dispõe dos meios técnicos, científicos e
empresariais para realizar esta tarefa. Nossa missão imediata é convocar
a cidadania a fim de que o País se dote da vontade política sem a qual
não retomaremos o caminho da construção da Pátria próspera e justa a
que todos aspiramos (ESPERANÇA..., 1982, p. 10).

A cura para todos os males dependia da restauração da


democracia no Brasil. O povo atravessaria o deserto e, com a
democracia, chegaria à prosperidade, com bem-estar para todos os
brasileiros. Esses são, em linhas gerais, os princípios norteadores de
um programa governamental pensado para a nação brasileira e que
foi apresentado no documento Esperança e Mudança. O Paraná não
E l a i n e R o d r i g u e s 45
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

ficou à margem desse caminho e desenvolveu ações, entendidas


pela SEED-PR, como auxílio no processo de redemocratização do
país.

Tomamos o documento Esperança e Mudança como um


enunciado que é

um tipo muito especial de ato discursivo, ele constrói um campo mais ou


menos autônomo e raro de sentidos que devem ser aceitos e sancionados
numa rede discursiva, segundo uma ordem, seja em função de seu
conteúdo, tomado como verdade, seja em função daquele que praticou a
enunciação, ou ainda, da instituição que o acolhe (VEIGA-NETO, 2003,
p. 114).

Para Foucault (2005), o enunciado pode ser tomado como um


arquivo, cujo pronunciamento é sancionado porque seu conteúdo
passa a ser compreendido como uma verdade. Não se trata de
qualquer discurso, mas aquele que se reconhece como conhecimento,
em dado tempo.

1.1 Educação para Democracia no Paraná: Apropriações do


Discurso

As mudanças políticas vividas e construídas pela nação


brasileira desembocam em um apelo social cuja viabilização, assim
o discurso enunciava, dependia do sucesso conquistado ou não
pelo projeto educacional. A Educação, no bojo dos acontecimentos
políticos, é nomeada como propulsora do movimento de transição
democrática.

O Paraná, por meio da SEED, professava a tese de que a


conquista de uma democracia para o Brasil seria o suporte para a
prosperidade econômica, social e educacional de todos os Estados
da Federação. Essa máxima nos remete à seguinte afirmação:
não podemos tratar a década de 1980, no Paraná, sem considerar
46 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

o programa de Educação como um enunciado intimamente


relacionado à dada compreensão do processo de (re)democratização
pelo qual passou o país. As circunstâncias que envolveram a criação
ou recriação de um universo político democratizado foram, por uma
ação governamental, vinculadas às mudanças que se pretendiam
ocorressem na Educação.

O fazer pedagógico, os projetos educacionais, a formação


dos profissionais da área, bem como de seus educandos, passavam
pela incorporação dos ideais políticos traduzidos na esperança
que se alimentava na ideia de um novo país, e a Educação era,
prioritariamente, assumida como formadora de homens capazes
de realizar o novo. Nova consciência, nova postura política,
novos homens, nova república, nova sociedade, mais justa, mais
comprometida com melhorias sociais, enfim, mais democrática. Esse
era o ideal que se apresentava como novo, mas, decididamente, não
o era!

Nesse período, a Educação era dimensionada de maneira


excessivamente positiva. Todos os males sociais eram explicados pela
fragilidade do sistema educacional e político do país. O governo do
Paraná hasteava essa bandeira. A SEED tornou-se a Secretaria mais
importante do governo José Richa (1983 – 1987) e a mais evidente
no Governo Álvaro Dias (1987 – 1990). Naquela década, a Educação
era, mais uma vez na história republicana brasileira, a destacada
vedete, o grande atrativo!

A Educação foi redescoberta, aclamada como processo e


não mais como forma acabada de atividade técnica, respondendo
pela consciência de que caminhar juntos era mais seguro do que
sozinhos, de que descobrir juntos era mais garantido do que
acertar sozinhos, de que discutir juntos era mais criativo e livre do
que reproduzir sozinho o oficial e o pré-estabelecido (PARANÁ,
1985b, p. 3).
E l a i n e R o d r i g u e s 47
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

A descoberta da utopia educacional, de uma educação livre e democrática


para homens livres e democráticos, respondia [...] pela lucidez de que
somente quando os professores descobrissem que viviam num mundo
de coisas feitas e produzidas e que, por isso mesmo, poderiam ser feitas
e produzidas de maneira diferente é que descobririam a liberdade de
criar e de buscar alternativas coletivas para a sociedade e a educação.
Não se poderia criar democracia sem que se aprendesse a fazer uso
da liberdade, e não se pensava nenhuma possibilidade de se produzir
democratas sem a vivência da liberdade de assumir um projeto comum
e histórico que redimisse para as novas gerações os 20 anos de regime
autoritário e despótico que o Brasil até então vivenciava (PARANÁ,
1985b, p. 3).

Representada na figura da Secretária de Educação, a SEED


publicava suas expectativas, declarando que o Brasil deveria
depositar seus anseios de mudança na Assembleia Nacional
Constituinte, que fora instalada no dia 1º de fevereiro de 1987,
e na Constituição democrática, esperando que as subcomissões
e comissões7 fossem capazes de produzir condições legais para a
viabilização de mudanças que se faziam urgentes. Nesse contexto,
educadores e educandos não poderiam estar ausentes. Esse era
um entendimento que se baseava no argumento de que a escola,
como parte integrante da sociedade, deveria contribuir para
redenção das mazelas antidemocráticas que, ainda, assolavam o
país.

Todo o esforço se fazia porque não se tinha como hábito


estabelecer momentos de discussão acerca dos caminhos do

7 O estudo que deu origem aos temas abarcados pela Assembléia Nacional Constituinte
foi assim estruturado: “O método aprovado de elaboração da Constituição baseou-se em ouvir
inicialmente as sugestões dos Constituintes, bem como de representantes da sociedade civil
e do Estado, e com base nessa consulta, que resultaria na votação de anteprojetos, construir
o texto Constitucional. Os constituintes fariam suas propostas, ouviriam as demandas da
sociedade civil e formulariam o projeto final de Constituição. Para esse fim, a Assembléia
Nacional Constituinte aprovou uma estrutura de funcionamento dividida em quatro etapas: as
subcomissões, as comissões Temáticas, a Comissão de Sistematização e o Plenário constituinte.”
(PINHEIRO, 1996, p. 266). O CONSED compôs uma dessas subcomissões caracterizadas como
espaço de reivindicação.

48 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

país, principalmente quando os civis, estudantes, professores e


pais estavam envolvidos, pois uma das sequelas da longa noite
autoritária vivida pelo Brasil é que as gerações mais jovens,
asfixiadas em sua liberdade, em sua iniciativa, acabavam órfãs de
referências sobre um regime democrático. Entendia-se ser preciso
extirpar das relações sociais qualquer vestígio autoritário. Fazia-
se indispensável que os conceitos democráticos viessem à tona e
que as pessoas o praticassem para assimilá-los em profundidade.
Na escola, intentava-se o aprofundamento do relacionamento
democrático entre os diversos segmentos sociais que ali se
faziam presentes. A retomada da democracia nos corações e
mentes se daria por um prolongado processo educativo e de
experimentação.

Os documentos apresentam, com exaustiva convicção, a


crença na redemocratização do país. Toda a ação da SEED em
prol da construção de um comportamento democrático se deu,
nomeando-se a comunicação como mediadora. O caminho
trilhado pelo Governo do Paraná, representado aqui pela SEED,
apresentou como discurso a tese de que o investimento na
Educação, com vistas à formação de um cidadão politicamente
esclarecido e capaz de contribuir com o destino da nação, seria a
saída que levaria ao rompimento absoluto com qualquer forma
de autoritarismo.

Para que os professores tivessem ciência da realidade, eram


oferecidos dados estatísticos, pelos quais se evidenciava como
estava caminhando a Educação e, como consequência, esperava-
se que o rendimento desta melhorasse. Era necessário que, pela
conscientização, se sentisse a necessidade de mudança. Mudança
era palavra de ordem! A seguir, destacaremos os índices de
analfabetismo de 1982 referentes ao Paraná.
E l a i n e R o d r i g u e s 49
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Total da População Taxa de


Municípios Analfabetos
eleitora analfabetismo
Curitiba 117.723 3.467 13,0
Londrina 35.982 1.680 21,0
Ponta Grossa 21.366 760 16,0
Maringá 20.413 636 14,0
Cascavel 20.055 1.684 36,0
Quadro 3 – Índice de analfabetismo, em relação à população eleitoreira,
registrado nas principais cidades do Estado do Paraná em 1982.

Gráfico 2 – Referente ao quadro 3. Demonstrativo do índice de analfabetismo


registrado, em relação à população eleitoreira, das principais cidades do
Estado do Paraná (1982).
Fonte: Rodrigues (2002, p. 51).

EVENTOS EDUCACIONAIS REALIZADOS NO PARANÁ EM 1984


Eventos Participantes Docentes envolvidos
Seminários: A
dimensão política da 136 15.494 127
Educação.
Outros Seminários,
154 26.194 459
Encontros e Cursos.
TOTAL 290 41.688 596
Quadro 4 – Eventos educacionais ocorridos no Paraná durante o ano de
1984. – segundo ano da administração de governadores eleitos pelo voto
direto.
50 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

Gráfico 3 – Referente ao Quadro 4. Demonstrativo de eventos educacionais


realizados no Paraná (1984).
Fonte: Rodrigues (2002, p. 52)

Gráfico 4 – Referente ao Quadro 4. Demonstrativo da participação de


docentes em eventos educacionais realizados no Paraná em 1984, sobre um
total de 596 docentes participantes.
Fonte: Rodrigues (2002, p. 53)

Os gráficos demonstram o grau de carência, com relação


à educação formal, em que se encontrava a população.
Representativamente, esses índices serviam como argumento para
o reforço da tese de que a Educação deveria ser priorizada por ser
E l a i n e R o d r i g u e s 51
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

a mola propulsora para o desenvolvimento social e democrático do


país. Interessante observar que, no Quadro 4, há o registro de 41.688
participantes em eventos educacionais, dos quais apenas 596 eram
docentes, não há especificação de quem seriam os outros 41.092 e
ainda o que eram esses encontros e cursos. A falta de objetividade
na apresentação de dados estava relacionada à necessidade de
convencimento acerca da ideia de que a Educação paranaense era
modelar, haja vista que a divulgação desses números ocorreu por
meio do Jornal da Educação, que circulava, principalmente, em meio
à comunidade escolar (RODRIGUES, 2007).

1.2 Estratégias de Ação dos Secretários Estaduais de Educação

Na década de 1980, o foco das atenções daqueles que


formulavam as estratégias de circulação do discurso educacional
resumia-se em duas questões fundamentais. A primeira era a
expansão do sistema de ensino do país e a segunda era a melhoria
da qualidade de ensino.

A mudança no foco do discurso que embasaria a formulação


das estratégias educacionais ocorreu tanto por pressões da sociedade
civil quanto pela ação de forças que se institucionalizaram sob a
égide de uma nascente democracia.

No contexto da transição democrática e de formulações de


projetos educacionais, surgiu o Fórum Nacional de Secretários
de Educação. Ele nasceu num ambiente fortemente marcado pelo
centralismo e autoritarismo. A luta pela descentralização do poder,
relacionado ao gerenciamento da Educação, desenvolvida nos
Estados, deveria ser o principal ponto de negociação destes com o
governo federal.
52 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

Os Secretários de Educação uniram-se em torno do objetivo


de criar um sistema educacional nacional que correspondesse
às aspirações democráticas manifestas. Reivindicavam maior
autonomia aos Estados na execução das políticas educacionais,
posicionamentos esses consonantes com as políticas estaduais dos
governos de oposição que haviam sido, recentemente, eleitos.

No caso do Paraná, a Secretaria de Educação8 conquistou uma


representatividade bastante considerável nos encaminhamentos
e decisões governamentais, e essa condição alicerçava a crença
depositada na tese de que a Educação era um meio para se chegar
a atingir as finalidades democráticas. Os Secretários Estaduais
de Educação reivindicavam maior autonomia na definição de
parâmetros político-educacionais, e essa atitude pressupunha a
demarcação de responsabilidades das diferentes esferas de governo
e a garantia das transferências dos recursos necessários ao seu
cumprimento.

A primeira tentativa de criação de uma representação


dos Secretários de Educação aconteceu em 1981. Nesse ano, foi
realizado em Brasília (DF) um encontro de dirigentes da Educação,
cultura e desporto. O evento recebeu a marca da oficialidade por
ser promovido pelo MEC e sua abrangência foi nacional. Aprovou-
se, no referido evento, uma proposta de criação de um conselho
de Secretários de Educação. A finalidade seria assessorar e prestar
consultoria ao MEC para que se formulasse uma política de
Ensino Básico. O Conselho também atuaria como órgão mediador
das reivindicações regionais; seria sua responsabilidade, ainda,
funcionar como catalisador do processo de mudanças pelos quais

8 A Secretária de Educação do Paraná Gilda Poli Rocha Loures foi vice-presidente do


CONSED (dez/86 a nov/87) e presidente (ago/89 a jul/90).

E l a i n e R o d r i g u e s 53
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

passaria a Educação nos diferentes Estados nacionais. Previa-se,


ainda, que esse conselho fosse composto por representantes das
cinco regiões geográficas brasileiras. Essa iniciativa consolidou-
se quando os Secretários de Educação, reunidos em Olinda (PE),
assinaram um protocolo para a constituição do Conselho de
Secretários de Educação do Brasil – Conseb.

O protocolo definia, como objetivo do Conseb, a soma de


esforços na defesa de interesses comuns. Partindo dessa proposta,
a maioria dos Secretários de Educação do país reuniu-se em defesa
de interesses comuns, de realização do projeto educacional, do
fortalecimento e da participação dos Estados na definição das linhas
básicas da Educação brasileira.

Assumir posições em torno dos problemas fundamentais da


Educação nacional, intensificando o intercâmbio de experiências
que subsidiassem o Ministério da Educação e Cultura na busca
de soluções mais adequadas às diversidades regionais, era uma
atribuição que o MEC imputava ao Conseb.

Nesse evento os Secretários de Educação assinaram um


documento denominado carta de Olinda, cujo conteúdo primordial
se definia na afirmativa: “[...] a dívida social somente será resgatada
quando a educação for convertida na prioridade de todas as
prioridades” (Carta de Olinda, 17/08/1981 apud CONSELHO DOS
SECRETÁRIOS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO, 1996, p. 7).

O documento reivindicava maior participação da esfera


educacional nos orçamentos públicos e afirmava que o compromisso
com a Educação deveria ser o componente ético, por excelência,
base para ação de governar.

O Conseb reuniu-se por mais três vezes. No penúltimo


encontro, realizado em novembro de 1981, o Conselho assumiu
54 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

posição de defesa para acabar com a universalização compulsória


da habilitação profissional no 2º grau, hoje denominado Ensino
Médio.

Os secretários reivindicaram, ainda, que os sistemas estaduais


de Educação pudessem, autonomamente, definir a forma curricular
de direcionamento do ensino para o trabalho, sempre considerando
as diferenças regionais. Finalizando o rol de propostas, o Conseb
entendia que a Educação pré-escolar deveria ser acoplada ao ensino
de 1º grau.

No último encontro, realizado em fevereiro de 1982, houve


um esforço para incrementar a incipiente representação política
dos Secretários de Educação junto ao MEC. Entretanto, com a
desincompatibilização de diversos secretários, postulantes a
mandatos eletivos daquele ano, o Conseb sofreu um esvaziamento
e acabou desativado.

Em março de 1983, com a posse dos novos governos


estaduais eleitos pelo voto popular, a proposta seria retomada
com base em novos compromissos políticos e numa perspectiva
de independência e contestação ao centralismo do MEC. Assim,
podemos afirmar que o Conseb não prosperou por ter nascido
em condições transitórias.

Em 1983, com a criação do Fórum Nacional de Secretários de


Educação, fundava-se um espaço institucionalizado para a reflexão
sobre as ações educacionais estaduais e federais. Esse era o objetivo.
O Fórum se propunha a formular propostas, eleger temas para
discussão, cooperar na elaboração de estudos técnicos e promover
a troca de experiências educacionais. Assumindo-se, em termos
documentais, cientes das responsabilidades que os caracterizariam
como mentores e executores de ações educacionais.
E l a i n e R o d r i g u e s 55
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

O Fórum objetivava reforçar a interação com os órgãos


do Governo Federal, basicamente com o MEC, responsável
pelo gerenciamento, formulação e implantação das metas
educacionais nacionais, oferecendo-se a contribuir efetivamente
na definição de estratégias e prioridades. Inserindo-se na
dinâmica da transição democrática, o Fórum pretendia alcançar a
descentralização das táticas e estratégias a serem definidas para
o campo educacional.

A descentralização do poder que reivindicavam respondia


aos interesses tanto do projeto oficial de abertura política, que se
pautava no lema, lento, gradual e seguro, idealizado pelo regime
militar, quanto das forças oposicionistas ao regime vigente. Ao
primeiro deles, porque ajudava a reforçar as bases, que ainda foram
eleitas pela situação, e que eram focos locais de poder. Ao segundo,
porque contribuía para fomentar os espaços conquistados pelos
governos oposicionistas recém-eleitos. No caso do Paraná, intentava-
se o fortalecimento da construção democrática por meio de ações
educativas que punham a circular um discurso de valorização de
termos como cidadania e liberdade.

A estratégia e descentralização pautavam-se em argumentos


que, contraditoriamente, respondiam aos interesses de manutenção
da ordem militarista, ainda vigente, mas quase sem apresentar
possibilidades de reorganização, bem como de mudança. O que
deveras ocorria era uma luta, por assim dizer, entre o poder central
e os governos estaduais.

A democratização da Educação escolar, preconizada pelo


Fórum, pressupunha o dever do Estado de assegurar o acesso
universal à escola, bem como o provimento de conteúdos básicos
que garantissem a qualidade do ensino. O slogan: ‘Ensino público
e gratuito: direito de todos, dever do Estado’ estaria a serviço das
exigências de segmentos sociais que se empenhavam na luta pela
56 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

democratização e pela Educação como base para a cidadania, ainda


que o ideal parecesse nobre. Há que se considerar uma relação
entre o avanço da redemocratização e o recuo progressivo da
centralização promovida durante o regime autoritário, situação que
apresentou seu ponto de inflexão no ano de 1983, com a posse dos
governadores eleitos pelo voto direto. A legitimidade que lhes foi
conferida nas urnas permitia que exercessem sua influência junto ao
governo central, reivindicando, sobretudo, autonomia às Secretarias
de Estado da Educação.

Os argumentos em defesa da construção de uma escola pública


forte e capaz de atender às necessidades da maioria da população e
o anúncio de que os Secretários de Educação dos Estados saberiam
como efetivar tal objetivo figuraram como finalidade maior, com
um saber capaz de promover poder. Segundo Foucault (2004, p.
X–XI), os saberes se engendram e se organizam permeados por
uma vontade de poder. O poder é uma prática social e, como tal,
constituída historicamente, ainda que seja fundamental sublinhar
que não é possível reduzir a multiplicidade de práticas geradas a
uma teoria global que subordine sua variedade e descontinuidade a
um conceito universal.

Não seria demais rememorar que, até o início da década de


1980, prevaleceu, como padrão dominante das ações educacionais,
a centralização, tendo como foco a expansão do sistema. Construir
prédios escolares era a principal preocupação dos governantes
adeptos da Pedagogia do Tijolo. Com a mudança desencadeada
pelas eleições de 1982, a ênfase recairia sobre a popularização da
educação básica, com melhoria da qualidade de ensino. Tijolo,
termo utilizado por Paulo Freire (1921-1997) na construção de uma
Pedagogia que se opunha ao método tradicional de alfabetização,
fora apropriado pelos Secretários de Estado da Educação e
ressignificado sob forma de protesto; a tentativa era afirmar que
E l a i n e R o d r i g u e s 57
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

o foco não deveria ser a construção de escolas no sentido literal,


mas a construção de um ensino de qualidade. O longo percurso de
transição entre o regime autoritário e centralizado para o regime
democrático e descentralizado teve, nas lutas travadas no campo
educacional, um ator fundamental.

O primeiro Fórum de Secretários de Educação do Brasil


realizou-se em 13 de junho de 1983. Sua convocação partiu da
Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior – Andes -
que apresentou proposta aos Secretários de Educação oposicionistas
recém-empossados. A Andes articulou-se com São Paulo (Paulo de
Tarso Santos), Minas Gerais (Otávio Elísio Alves de Brito), Paraná
(Gilda Poli Rocha Loures) e Rio de Janeiro (Yara Lopes Vargas) e
teve o apoio da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência –
SBPC.

O encontro debateu e firmou posição sobre as principais


questões que, naquele momento, faziam parte da pauta de
reivindicações dos segmentos da área educacional e mobilizavam
a opinião pública: ensino público e gratuito em todos os níveis,
restabelecimento da dignidade da escola pública, democratização
das universidades e apoio à cultura e à pesquisa científica. Os
secretários firmaram compromisso em defesa da Educação
pública e reivindicaram um papel ativo na formulação da política
educacional do país. O secretário de São Paulo propôs a criação de
um organismo institucional independente, de caráter nacional e
suprapartidário, capaz de exercer influências nas decisões da área
educacional e de romper com a submissão dos Estados ao poder
central. A crença no ideário de que a Educação era o meio pelo
qual a redemocratização social aconteceria foi o impulso criador
do Conselho Nacional de Secretários de Educação – Consed, que
funcionou até o ano de 1986, de maneira informal.
58 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

O Consed representou a continuidade da experiência


desenvolvida pelo Fórum Nacional dos Secretários de Educação
no período de 1983 a 1986. A partir de 1987, com a posse da segunda
geração de governadores eleitos por voto direto, aconteceu a troca
dos titulares das Secretarias Estaduais de Educação. A interação
entre os antigos secretários e os novos membros do Consed deu-
se mediante a apresentação da memória dos fóruns anteriores,
realizada pela ex-Secretária 9 de Educação do Paraná.

Em setembro de 1986, durante a realização do XIV Fórum,


em Belém (PA), foi criado, formalmente, o Consed, uma iniciativa
que objetivava evitar a descontinuidade que poderia advir nas
mudanças periódicas dos governos estaduais. O Consed, em termos
institucionais, resulta da experiência acumulada pelo Fórum no
período de 1983-86.

Em julho do ano 2000, Gilda Poli Rocha Loures, a ex-Secretária,


relatou-nos, de maneira bastante informal, como nasceu o Consed e
aqui transcrevemos suas palavras:

[...] o CONSED nasceu do seguinte [...] como nós fomos eleitos em 83,
(82) e de repente houve uma surpresa, porque nem agente esperava
que alguma oposição ganhasse [...] ganhou no Paraná o Richa [...] em
São Paulo o Montoro, no Rio de Janeiro, o Brizola [...] três estados [...]
então eram Paraná, São Paulo, e Minas, PMDB, e Rio de Janeiro, PDT,
mas nós resolvemos nos reunir, aí o convite partiu do Rio de Janeiro,
a Iara que era secretária da educação do Brizola. Então nós fomos ao
Rio, (Minas, São Paulo e Paraná), nos reunimos com a Iara a convite
dela, passamos uma tarde conversando sobre a necessidade de estarmos
unidos, porque teríamos um trabalho muito grande e importante diante
do país, e aí que nasceu a idéia de criarmos um fórum de discussões. E o
primeiro contato que nós tivemos foi com a Leda que era do Maranhão
e era secretária do Sarney, governador do Maranhão. Ela foi a primeira
secretária que se uniu a nós. Estes cinco estados começaram a preparar
documentos, baseados na nossa filosofia de educação e começamos a

9 Gilda Poli, neste momento, deixa a secretaria, mas no ano seguinte, por circunstâncias
políticas, ela retorna ao cargo.

E l a i n e R o d r i g u e s 59
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

convocar os outros estados para discutir as nossas preocupações [...] a


questão da centralização da merenda que era toda em Brasília [...] e que,
por exemplo, mandava sardinha enlatada lá para o Ceará [...] absurdos
[...] que passeavam pelo Brasil, uma corrupção danada! [...] e a nossa
primeira grande vitória, foi que nós ainda não formávamos um conselho,
formávamos apenas fórum, porque a gente se reunia de acordo com a
necessidade [...] foi com uma reunião do MEC, no governo autoritário
[...] que nós pedimos a presença do coordenador da APAE que era
naquela época quem distribuía a merenda, e nós o irritamos tanto com
os nossos questionamentos [...] ele quase arrebentou a mesa [...] nós
ficamos assustadíssimos com a reação dele, mas o resultado é que ele
caiu, e aí começou a mudar a política do MEC em relação à merenda
[...] muito lentamente, muito devagar [...] hoje ela é descentralizada [...]
completamente diferente do que era naquela época. Nós secretários
começamos a perceber que tínhamos forças se estivéssemos reunidos,
o que era muito difícil de acontecer. Porque na primeira reunião o MEC
nos chamou a Brasília [...] convocou à Brasília [...] e aí Minas e Paraná
começaram a brigar, dizendo que nós não éramos serviçais do MEC e
que nós não os tínhamos escolhido. Menina! Você não imagina a guerra
que isso representou [...]10 (LOURES, 2000).

Gilda Poli continuou relatando os embates travados junto


ao MEC em favor da descentralização e do reconhecimento dos
Secretários Estaduais de Educação como parceiros da União e
não apenas cumpridores de ordens. Em essência as reivindicações
poderiam, segundo ela, ser definidas pela expectativa em superar o
papel simplesmente homologatório que cabia aos Estados, quando
entendidos como extensão do poder central.

Junto ao MEC e no Congresso Nacional, o Consed defendia


que existissem respeito às diferentes ideologias que permeavam
o universo da escola pública, descentralização administrativa e,
consequentemente, financeira, o que levaria a uma integração maior
nos três graus de ensino. Valorizar os profissionais do magistério
com um salário que fosse um piso nacional também figurava entre
suas metas.

10 Entrevista com Gilda Poli gravada em julho de 2000.

60 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

A participação do Consed nos debates realizados pela


Comissão de Educação e no Senado Federal, para o estabelecimento
dos princípios a serem incorporados na Constituição de 1988,
foi avaliada pelos seus membros como uma conquista que se
desdobraria na permissão para que houvesse a participação do
estudante na vida escolar e nas definições acerca das metas para o
fortalecimento de uma política educacional mais democrática. O
maior entrave para o desenvolvimento de um projeto educacional
democratizante estava, segundo os membros daquele colegiado,
na relação do MEC com os Estados. A falta de parceria fazia com
que a relação avançasse em passos muito lentos, por vezes, quase
imperceptíveis.

Sedimentavam-se a concepção de educação como direito social


básico e a noção da escola como instância de formação e exercício
da cidadania, importando, por conseguinte, a formulação de
políticas educacionais favoráveis à democracia. A democratização
da Educação deveria ser entendida, segundo os membros do
Consed, como expansão de oportunidades educacionais. O Estado,
como aglutinador de interesses dos diversos segmentos sociais em
consonância com um ideal de sociedade democrática, arrogava para
si o dever de dar provimento e atendimento à demanda escolar,
garantindo o acesso universal de todos aqueles que tinham o direito
de frequentar a escola.

A análise das questões assinaladas pelos conselheiros foi a


base para a composição de argumentos, levando em consideração o
debate que versava sobre as propostas para a Constituição Federal,
o que conduziu, inclusive, à instituição do Fórum Nacional em
Defesa da Escola Pública e Gratuita, sendo o Consed uma das 14
unidades dele integrantes.
E l a i n e R o d r i g u e s 61
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Um tema que esteve presente durante esse período foi o


financiamento da educação, não somente motivado pelo debate
sobre a vinculação de recursos para a Educação, durante o
processo de formulação da Constituição Federal, mas também
pela grande ineficiência das instâncias ministeriais no tocante
ao repasse regular de verbas, como, por exemplo, a relativa ao
salário educação.

Duas outras discussões caracterizaram o período focalizado.


A primeira dizia respeito às linhas que deveriam presidir a
realização de acordos internacionais, propugnando o Consed
que as mesmas significassem reforço e apoio ao desenvolvimento
de políticas educacionais formuladas no âmbito de Estados e
municípios. A segunda referia-se à importância atribuída ao
envolvimento da sociedade nas questões educacionais.

A Secretária de Educação do Paraná, como membro


do Consed, encampava as duas discussões e, na tentativa de
viabilização, passava a proferir um discurso que se pretendia
viesse amparar ações criadas como formas de descentralização
e flexibilização administrativa. Intencionando democratizar a
gestão escolar, promoveram-se a realização e criação de eleições,
colegiados, grupos gestores, conselhos, o que tornaria a escola
participante ativa do debate educacional e da execução de
políticas educacionais.

Nas páginas que se seguem, objetivando expor as


preocupações dos Secretários de Educação dos Estados,
apresentamos dois quadros: o primeiro, quadro 5, é demonstrativo
da ordem cronológica das reuniões realizadas pelo Fórum e o
seguinte, quadro 6, sintetiza os temas discutidos, além de elencar
o título dos documentos produzidos como resultado das reuniões,
a fonte dos dados é Rodrigues (2002, p. 246–260).
62 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

Nº LOCAL dia mês ano

I Rio de Janeiro 13 06

II São Paulo 27 07

III Maranhão 26 e 27 08 1983

Extraordinário Brasília 26 09

IV Minas 24 a 26 11

V Goiás 02 a 03 02

VI Brasília 23 e 24 05

VII Ceará 12 e 13 07 1984

Extraordinário I Brasília 23 08

Extraordinário II Brasília 18 11

VIII Paraná 07 e 08 02

Extraordinário III Brasília 08 e 09 04

Extraordinário IV Brasília 23 05

IX Amazonas 01 a 04 06 1985

Extraordinário V Brasília 04 07

Extraordinário VI Brasília 19 08

X Santa Catarina 21 e 22 10

XI Alagoas 15 a 17 01

Extraordinário VII Rio de Janeiro 10 e 11 03

XII Rondônia 24 e 25 04
1986
XIII Rio Grande do Sul 02 a 05 07

XIV Pará 24 a 27 09

XV Brasília 18 a 20 12

Quadro 5 - Ordem cronológica das reuniões do Fórum de Secretários de


Educação do Brasil, 1983 a 1986.

E l a i n e R o d r i g u e s 63
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

DOCUMENTOS
ASSUNTOS DISCUTIDOS
RESULTANTES
Reunião I
1. Ensino público e gratuito em todos os níveis.
2. Restabelecimento da dignidade da escola
pública. Declaração conjunta dos
Secretários em defesa da
3. Democratização da Educação.
Educação, da Ciência e
4. Valorização dos profissionais da Educação e da Cultura em face das
qualidade de ensino. propostas de cortes de
5. Necessidade de definição da política gastos público.
educacional.
6. Participação da comunidade universitária e
apoio à cultura e pesquisa científica.
Reunião II
1. Relato de cada Secretário sobre a situação da Normas de procedimento do
Educação no Estado. FÓRUM DE SECRETÁRIOS
2. Discussão sobre modificações introduzidas no DE EDUCAÇÃO NO
Salário Educação pelo Decreto nº 88.374, de BRASIL.
07/06/83.
Reunião III
1. Termo de protocolo celebrado entre os
Secretários de Educação das Unidades Termo de Protocolo,
Federadas para constituição do Conselho celebrado entre os
de Secretários de Educação do Brasil. Secretários de Educação das
Descentralização da merenda. Unidades Federadas, para
2. Livros descartáveis. constituição do Conselho de
3. Apoio ao Convênio Único como forma eficaz Secretários de Educação do
de repasse de recursos pelo MEC aos Estados. Brasil.
4. Apoio ao Decreto Federal nº 88.374, de
07/06/83.
I Fórum Extraordinário
Preparação para o Encontro Nacional de
Dirigentes de Educação, Cultura e Desporto.
Reunião IV
1. Emenda Constitucional 24/83 (discussão com
o Senador João Calmon).
2. A questão do financiamento da Educação.
3. Alfabetização (palestra e debate com Zaia
Brandão).
4. Projetos Educacionais dos Estados na área da
alfabetização.

64 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

DOCUMENTOS
ASSUNTOS DISCUTIDOS
RESULTANTES
Reunião V
1. Política de alfabetização. Relatório do Encontro
2. Alternativas e barateamento de construções Nacional sobre Política de
escolares. Alfabetização nos Estados.
3. Alimentação escolar.
Reunião VI
1. A crise financeira e a questão educacional:
alternativas de solução.
2. A Emenda João Calmon.
3. Recursos financeiros para a ampliação de vagas
no 1º e 2º graus.
4. Recursos para a Assistência ao Educando.
5. Documento sobre Alternativas de Construções
Escolares.
Reunião VII
1. Recursos financeiros: captação, alocação e
recursos e fontes alternativas.
2. Apresentação de experiência dos Secretários em
torno do relacionamento com o poder público e
a comunidade.
3. Subsídios para a elaboração do IV Plano Setorial
de Educação, Cultura e Desporto.
Estabelecimento de
critérios preliminares
II Fórum Extraordinário de operacionalização do
sistema de manutenção do
1. Decreto Federal nº 90.88, de 21/08/84, que ensino.
deu garantia de continuidade aos “bolsistas da
comunidade”. Roteiro para avaliação
2. Política Setorial de Educação. do III Plano Setorial de
3. Regulamentação da Emenda João Calmon. Educação, Cultura e
Desporto, 1980/1985, e para
4. Liberação de recursos para os Estados. formulação de subsídios
à elaboração do IV Plano
Setorial de Educação.
III Fórum Extraordinário
Por uma Política Nacional
Documento de avaliação do III PSEC e subsídios de Educação.
para o IV PSEC.

E l a i n e R o d r i g u e s 65
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

DOCUMENTOS
ASSUNTOS DISCUTIDOS
RESULTANTES
Reunião VIII
1. A Escola da Nova República: Democratização
da Escola Pública, Educação e Constituinte,
alternativas para mudanças estruturais na
Educação. “Carta de Curitiba: A
2. Melhoria da Qualidade do Ensino: alternativas vontade política de mudar”
para mudanças curriculares, alternativas para
capacitação docente.
3. Elaboração da Carta de Curitiba: A vontade
política de mudar.
IV Fórum Extraordinário
Preparação do I Encontro do Fórum de
Secretários de Educação com o Senhor Ministro
da Educação.
V Fórum Extraordinário
Articulação do IX Fórum.
Interferência do MEC, provocando alterações
da data programada para o IX Fórum.
Reunião IX
1. O Ensino de 1º Grau e suas prioridades:
salário e habilitação dos professores na zona
rural; construções escolares/material escolar/ “Decálogo de Manaus”
merenda; alfabetização (relato de experiência).
2. Elaboração de documento: “Decálogo de
Manaus”.
VI Fórum Extraordinário
1. Discussão do documento “Exposição de
Motivos dos Ministérios da Educação e da
Fazenda sobre o Mobral”.
2. Elaboração de moção contra a definição “Contribuição ao I PND/
de atribuições do Mobral, em virtude de NOVA REPÚBLICA”
compromisso do MEC, de consultar o Fórum
antes de qualquer decisão.
3. Elaboração do documento: “Contribuições ao I
PND/NOVA REPÚBLICA”.

66 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

DOCUMENTOS
ASSUNTOS DISCUTIDOS
RESULTANTES
Reunião X
1. Relato de Experiências Educacionais em Santa
Catarina.
2. Proposta de ação do Mobral.
3. Ensino Supletivo.
4. Relacionamento do MEC com as Secretarias de
Educação.
Reunião XI
1. Política da FAE.
2. Política da Fundação EDUCAR.
VI I Fórum extraordinário
1. Política da FAE.
2. Política da Fundação Educar.
Reunião XII
1. Reflexos do deflacionamento em 30% no PTA.
2. Recursos Federais para
pagamento de professores e
para construções escolares em regiões de
imigração intensa.
3. Eliminação de EMC, OSPB e Programas de
Saúde.
4. Re-estudo da LDB.
5. Programas – Alimentação Escolar, Saúde Escolar,
Sala de Leitura, Livro Didático, Integração
Escola- Comunidade.
6. Municipalização do Ensino.
7. Relacionamento MEC/SÉC/CFE/CEE/
DEMEC/FAE/Seduc.
8. Fundação Educar/Escolas Técnicas Federais.
9. Salário do Magistério.
10. Alteração da idade para ingresso no Supletivo.
11. Aceleração de Estudos.
12. Políticas de Educação Física e Educação
Especial.
13. Proposta Pedagógica Pré-Escolar de Alagoas.
14. Recursos extraorçamentários Finsocial.
15. Relação FÓRUM/MEC.

E l a i n e R o d r i g u e s 67
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

DOCUMENTOS
ASSUNTOS DISCUTIDOS
RESULTANTES
Reunião XIII
1. Lei de Diretrizes e Bases.
2. Educação e Constituinte.
3. Municipalização do Ensino.
4. Relação com o MEC:
- Projeto de criação das Escolas Técnicas
Federais;
- Ingerência das Delegacias do MEC;
- Utilização Político-Partidária do MEC;
- Representação do Fórum em Brasília.
Reunião XIV
1. Proposta de Estruturação do Conselho de
Secretários de Educação.
2. Lei de Diretrizes e Base.
3. Educação e Constituinte.
4. Relação com o MEC:
- Escolas Agrotécnicas;
- Educação Física e Desportos;
- Salário Educação.
5. Re-estruturação da Secretaria de Educação do
Pará.
Subsídios Para Alteração
Do Decreto-Lei Nº
1422/75. Sobre O
Reunião XV SALÁRIO EDUCAÇÃO.
1. Princípios constitucionais para a Nova
Constituição Nacional. Estatuto do Conselho
2. Estatuto do Conselho Nacional de Secretários de Nacional de Secretários
Educação – Consed. de
3. Salário Educação – sugestões para reformulação Educação – Consed.
do Decreto-Lei nº 1422/75.
Princípios Educacionais
para a Nova
Constituição.
Quadro 6 – Assuntos discutidos nos fóruns de Secretários de Educação do
Brasil, 1983 a 1986.

Dentre assuntos discutidos e documentos resultantes das


15 reuniões de Secretários de Educação brasileiros, ocorridas
68 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

no período de 1983 a 1986, ordenados no Quadro 6, escolhemos


evidenciar o conteúdo do VIII Fórum , por ter sido realizado em
Curitiba - PR e também porque dele resultou o documento, Carta
de Curitiba: A vontade política de mudar (PARANÁ, 1985b), que, pelo
padrão narrativo apresentado, muito bem representa as tecnologias
de disseminação de um novo disciplinar social, o democrático
(CERTEAU, 2012).

A Secretária da Educação do Estado Paraná presidiu o


trabalho que aconteceu nos dias 7 e 8 de fevereiro de 1985. O tema
central: A Escola da Nova República desdobrou-se, essencialmente,
em: Democratização da Escola Pública, Educação e Constituinte,
alternativas para mudanças estruturais na Educação e Melhoria
da Qualidade do Ensino: alternativas para mudanças curriculares,
alternativas para capacitação docente.

Nesse documento os Secretários reafirmaram como princípio


estabelecer objetivos no sentido de garantir a todos os brasileiros um
ensino público de qualidade, como fator essencial à consolidação da
democracia.

O sistema educacional deverá ser garantia de democracia e não


instrumento de poder arbitrário e, para tanto, será necessário erradicar
da educação nacional aquelas agencias e aqueles conteúdos que serviram
ao autoritarismo. A escola da Nova República deve se caracterizar
como espaço de vivência dos valores democráticos e corresponder aos
anseios das grandes camadas marginalizadas da população brasileira,
assegurando-lhes um ensino crítico, que lhes possibilite a superação dos
problemas sociais dentro de uma sociedade democrática (PARANÁ,
1985b, p. 9).

Durante o regime ditatorial vivemos um período em que o


controle social dava-se por um tipo de panoptismo (FOUCAULT,
1987, p. 162), um dispositivo que Veiga-neto (2003, p. 80) define como
uma inversão do espetáculo, “[...] ao invés da multidão assistir ao
E l a i n e R o d r i g u e s 69
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

que acontece com uns poucos, são uns poucos que assistem ao que
acontece com a multidão”. A sociedade brasileira democratizava-
se, o Estado de bem-estar-social, característico do período pós-
militarismo, mandava para casa os militares, ainda assim, resistia
uma aliança entre a soberania militar e a recém-assumida disciplina
democrática.

O poder disciplinar tomava a população como um ‘corpo’,


utilizando-se da ‘norma’ como articuladora dos mecanismos que
sobre ele atuariam. Disso resultou a defesa da Educação para todos!
Uma atitude quase panfletária, defendida pelos membros do Consed,
e encampada pela comunidade educacional. A escola exercia o papel
de reguladora social, detentora da rede disciplinar que, aos poucos,
fabricava corpos dóceis porque maleáveis, não à força, ao contrário,
passamos a nos enxergar como sujeitos nessa teia, quase invisível,
o disciplinamento parecia natural. A disciplina funciona como uma
matriz de fundo que permite a inteligilibilidade, a comunicação e a
convivência total na sociedade (VEIGA-NETO, 2003).

1.3 Qualidade na Educação, Para Todos!

O uso do slogan como forma de mobilização junto à


comunidade educacional tornou-se comum para o período Scheffler
(1974) explica que os slogans possibilitam a criação de símbolos
que permitem a unificação de ideias e atitudes nos movimentos
educacionais, ao mesmo tempo, reforçam a confiança e firmeza
dos veteranos e atraem novos adeptos, aproximando-se, por assim
dizer, dos princípios e slogans religiosos.

O que pretendia comunicar o slogan Qualidade na Educação,


para todos!?, O que se caracterizava como um ensino melhor? Foi
70 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

a própria Secretária de Educação quem delineou os preceitos de


uma reposta.

A qualidade do ensino se vincula a possibilidade da não reprodução


da sociedade injusta tal como se apresenta: de um lado os que sabem
e detém o poder, de outro os que não sabem e obedecem ao poder. A
qualidade de ensino se liga à possibilidade de fazer com que a maioria
da população possa dominar a soma de conhecimentos já acumulados
através dos tempos, para que todos possam se incumbir de criar uma
nova sociedade (PARANÁ, 1983b, p. 5).

A citação acima transcrita possibilita perguntar: O que


é educar? Pergunta célebre ao educador de e em formação e
considerada clássica pelos autores da década de 1980. Um texto
bastante popularizado e escrito na referida década traz o título O
que é Educação? Brandão (1984) conceitua educar como o moldar
do sujeito dentro de uma cultura, o que acontece inicialmente
no ambiente familiar, “[...] primeiro sem classes de alunos, sem
livros e sem professores especialistas; mais adiante com escolas,
salas, professores e métodos pedagógicos” (BRANDÃO, 1984,
p. 10).

Educar pode, ainda, ser definido como uma ação naturalizada


entre os sujeitos sobre seus pares e constitui-se como uma extensão
dos indivíduos ou de determinado grupo, com o objetivo de
transmitir hábitos e costumes que preservem a identidade social
(CHARTIER, 1990) que os mantém ‘iguais’ socialmente, sem a
utilização de técnicas pedagógicas escolares.

A Educação escolar é intencional, uma obviedade que se torna


afirmação necessária para podermos nos apropriar da afirmativa
do antropólogo Laraia (2001), que defende serem os conteúdos
escolares reveladores de uma seleção de conhecimentos que a
unidade biológica da espécie humana, em sua diversidade, deve
adquirir. A máxima iluminista, a Educação é o meio pelo qual
E l a i n e R o d r i g u e s 71
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

o homem se torna homem, foi amplamente divulgada entre os


educadores da década de 1980 e amparou Brandão (1984, p. 12) a
fazer a seguinte ressalva: “[...] na prática, a mesma educação que
ensina pode deseducar, e pode correr o risco de fazer o contrário do
que pensa que faz, ou do que inventa que pode fazer”. A Educação
escolar assume uma forma prescritiva, denominada disciplina ou
matéria escolar, com o objetivo de legitimar ações, comportamentos,
discursos formalizados, de não permitir um possível deseducar
do sujeito.

Diretamente ligado ao campo educacional escolar, o francês


Chervel (1990) escreve que o termo disciplina apresenta quatro
formas de definições. A primeira designa vigilância, a segunda,
ginástica intelectual, na terceira a noção de disciplina passou do
geral para o particular e na quarta o termo disciplina ficou designado
como genérico. O autor explica que em alguns lugares do mundo
o termo disciplina reduziu-se à metodologia e o pedagogo foi
encarregado, com sua pedagogia, de lubrificar a máquina escolar e
fazê-la girar.

Segundo Chervel (1990), a disciplina escolar tem que ser


reconhecida de um modo mais amplo e não abranger nada mais do
que práticas docentes de sala de aula, mas com as grandes finalidades
que presidiram sua constituição e o fenômeno de aculturação de
massa que ela determina.

Chervel (1990) lembra que as disciplinas são o preço


que a sociedade deve pagar a sua cultura letrada, para poder
transmiti-la no contexto escolar. Bittencourt (2004, p. 47) afirma
que a “[...] disciplina ou matéria escolar visa formar um cidadão
comum que necessita de ferramentas intelectuais variadas para
situar-se na sociedade e compreender o mundo físico e social em
que vive”.
72 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

É oportuno salientar que, em nenhum momento, Chervel (1990)


desconsidera que as instituições escolares não estão totalmente
livres dos mecanismos que forjam a reprodução de conhecimentos.
Para esse intelectual, enquanto o sistema educacional recusar-se
a compreender as especificidades que compõem as disciplinas, os
historiadores devem olhar esse sistema como uma instância que
apenas “[...] recebe e põe em contato dois tipos de população e de
acordo com tal política educacional ou tal orientação pedagógica, ele
ensina certo número de matérias da qual a natureza não é de modo
algum problemática” (CHERVEL, 1990, p. 183). Adverte-nos, ainda:
se a “escola for mesmo reprodutora de saberes, deve ser tratada como
uma vulgarizadora das ciências, mas se a escola for criadora”, essa
instância merece ser estudada, conforme acredita Chervel (1990,
p. 181).

Evidências empíricas ao alcance de pais, professores e alunos


mostravam que a escola estava ‘esperneando’ para, ao menos,
manter-se em diálogo com a sociedade, nos anos iniciais do período
em estudo. O discurso articulado como tentativa de estímulo à
mudança desse quadro apresentava sentenças afirmativas que
remetiam o professor a um fazer pedagógico que se propunha a atingir
o desenvolvimento integral e harmonioso de todas as capacidades
do indivíduo. Paradoxalmente, a prática educativa mantinha-se,
desde a modernidade, como um processo de adestramento seletivo
da ‘formação de si’. Lembrando-nos de Nietzsche (1991), educar
vinha sendo sinônimo de tornar o cidadão dócil, frágil e obediente
aos valores em curso. Adestrar significava formar o indivíduo para
obedecer a regras e incorporar novos hábitos; então, qual o papel da
boa escola? O que seria Educação de qualidade?

Diante do princípio de que educar era sinônimo de adestrar,


o papel de uma boa escola seria moldar o estudante, adequando-o,
conformando-o como agente articulador em sua sociedade e
E l a i n e R o d r i g u e s 73
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

cultura. Tomando por princípio essa vertente analítica, a Educação


proposta pela SEED, amparada pelo Consed, arrogava para si a
intenção de criar um homem teórico como modelo do resultado
de práticas educacionais, de um ideal de Educação, de uma
ilusão constituída sob o pretexto da formação crítica. Mas, uma
nova Educação deve contemplar a formação de novos hábitos?
Isso significaria construir uma nova natureza? Pressupõe-se
que durante o processo educacional o aluno consiga desfazer-se
de sua primeira natureza? Deve abandonar os hábitos antigos
de pensar e de ser? O que caracteriza o homem adestrado na
sociedade democrática?

Enquanto no panorama geral as discussões em torno da


Educação versavam sobre temas de ordem filosófica, histórica,
sociológica, em sala de aula o dilema do professor resumia-se em
manter a disciplina, trabalhar impondo a ditadura da ordem e a
disciplina do silêncio. Para Barreiro (1998), a tarefa de ensinar acaba
implicando, ainda que paradoxalmente, a destruição da liberdade.
Afinal, qual é a liberdade possível?

As últimas décadas do século XX, no Paraná, apresentam


duas posturas com relação ao ensino de História e seus conteúdos.
A primeira, relacionada ao período ditatorial, é apresentada por
meio dos objetivos da disciplina Educação Moral e Cívica. Seus
ensinamentos, portadores de forte carga ideológica, caracterizaram-
se por permitir a formação de um homem pacífico, moralmente
correto, patriota, um cidadão súdito. A segunda, referente ao
período democrático, seria tratada, tomando-se por base o programa
disciplinar de História, por meio do qual, acreditava-se, formaríamos
o cidadão-crítico.

O espírito cívico, imposto pelo Decreto-lei nº 869, de 12


de setembro de 1969, visava à inclusão de Moral e Cívica como
74 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

disciplina obrigatória nas escolas de todos os graus e modalidades


dos sistemas de ensino no país. A intenção era inserir suas finalidades
em todas as atividades escolares, inclusive no que dizia respeito ao
desenvolvimento dos atos cívicos, valorizados na prática educativa.
As relações entre os valores humanos considerados superiores
e a Educação permitiriam que os cidadãos fossem integrados
na sociedade, dela participantes como produtos culturais, como
ilustrações no culto à nação, na identificação com a família e na
dignidade do trabalho. A Educação Moral e Cívica permaneceu
no currículo oficial como disciplina escolar e prática educativa em
todos os níveis de ensino por 24 anos, até 1993, quando foi revogada
pela Lei n° 8.663.

O propósito de inclusão da Educação Moral e Cívica


seria, sinteticamente, a incorporação de seus ideais à sociedade,
perpassando gerações, e isso deveria realizar-se como o próprio
saber. A finalidade da Educação Moral e Cívica seria preparar o
homem para a vida e, sobretudo, formar o cidadão para a sociedade,
de acordo com as proposições do decreto que a criara. “Referir-
se à formação do cidadão será admitir não ser possível realizá-la
sem enfatizar a formação moral e cívica do educando para servir
à sociedade e à família; sobressairão às atividades cívicas que –
centradas no culto à nação – têm origem na valorização do caráter
nacional” (IBRASA, 1982, p. 43-44).

O segundo momento configura-se como pós-abertura política,


caracterizado por uma democracia (re)nascente, no qual o Estado
do Paraná depositou suas expectativas no ensino de História,
conteúdo fundamental , por meio do qual se pretendia “[...] repensar
os conteúdos básicos das disciplinas no que se refere aos aspectos
teórico-metodológicos de cada área de conhecimento” (PARANÁ,
1990, p. 13).
E l a i n e R o d r i g u e s 75
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

A qualidade do ensino, no início da década de 1980, entendia


que a Secretaria de Estado da Educação do Paraná, vinculava-se
à possibilidade da não-reprodução da sociedade injusta tal como
se apresentava: de um lado os que sabiam e, que por deterem
o conhecimento exerciam o poder, e, de outro, os que não
sabiam e por isso obedeciam aqueles que se arrogavam ‘donos’
do saber. A qualidade de ensino se vinculava à possibilidade
de fazer com que a maioria da população pudesse dominar a
soma de conhecimentos já acumulados no decorrer dos tempos,
para que todos pudessem se incumbir da tarefa de criar uma
nova sociedade.

O enfoque dado à questão da melhora na qualidade de ensino


a ser oferecido pelo Estado estava no conteúdo a ser trabalhado.
Uma proposta que fixava suas bases naquilo que se ensinaria e não
no como se ensinaria, tecendo críticas severas à visão tecnicista
de Educação e de ensino que era imperativa nos procedimentos
didáticos de até então. Aparentemente um novo e diferente olhar
para a questão da qualidade de ensino estaria nascendo, pois
se projetava em ações que exigiriam do educador assumir um
compromisso político com a Educação, por meio do ato de ensinar,
e esses pressupostos se especificariam como metas para o ensino de
História.

Conteúdos sociais, como o ato de a pessoa aprender a lutar por


seus direitos, eram entendidos, pelos dirigentes educacionais, como
uma nova postura social, que também deveria estar à frente dos
projetos educacionais, o que imputava à problemática da qualidade
de ensino a responsabilidade pela melhoria do panorama geral da
Educação paranaense.

A Secretaria de Educação do Estado do Paraná passou a editar


o Jornal da Educação, fazendo valer o espaço de comunicação que esse
76 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

folhetim significava, publicou matérias para justificar o pedido de


que novos comportamentos fossem assumidos, pelos professores,
diante de velhos e enraizados costumes.

Quando se trata de romper com determinadas posturas


pertinentes a propostas pedagógicas específicas, torna-se importante
destacar quais eram as finalidades disciplinares, e aqui nos interessa
o ensino da História no contexto escolar. A História, como disciplina
escolar, sempre trabalhou com as noções de ‘Identidade Nacional’,
‘Cidadania’, ‘Estado’ e ‘Nação’. Historicamente, o ensino de História
foi marcado, em outros países e no Brasil, pelo ideal nacionalista.

O ideal nacionalista, somos redundantes ao afirmar, permeou


o período militarista no Brasil. Alguns críticos11 da escola na década
de 1980 evidenciavam o golpe militar de 1964, e sua correspondente
ação relativa ao aspecto educacional, como um marco. O conteúdo
das ciências humanas, e particularmente o da História, haviam
se esvaziado de seu aspecto crítico. A crítica e a contestação,
características inerentes ao ensino de História, haviam se perdido, e
era manifesto o seu caráter de instrumento de veiculação e formação
do espírito cívico, entendido como aquele capaz de glorificar os
feitos dos autoproclamados heróis do dia12.

11 Neidson Rodrigues foi colaborador do Jornal da Educação editado pela SEED. Uma de
suas matérias foi publicada no ano 2, n. 5, p. 6, jul./ago. 1984; publicou também Por uma nova
escola: o transitório e o permanente na educação. São Paulo, Cortez, 1985 e ainda, Lições de Príncipe
e outras lições. São Paulo: Cortez, 1987. Da mistificação da Escola a escola necessária. São Paulo:
Cortez, 1987.

12 ZAMBONI, Ernesta discute essa questão no texto: Projeto pedagógico dos parâmetros
curriculares nacionais: identidade nacional e consciência histórica. Caderno CEDE, v. 23, n. 61,
dez. 2003. A autora também discorda da idéia de que tenha havido uma ruptura na forma e no
conteúdo do ensino de História em relação ao período anterior a 1964 e em sua sequência após
o Golpe de 1964.

E l a i n e R o d r i g u e s 77
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Anteriormente a esse período, o que acreditamos, portanto,


é que teria existido um ensino de História diferente do apregoado
pelas disciplinas de Organização Social e Política do Brasil e
Educação Moral e Cívica, inclusas no currículo em substituição
àquela. Da mesma forma, no período que se seguiu, momento de
abertura política no país, a crença era a de que a tarefa do educador
seria romper com os ideais tradicionalmente presentes no ensino
de História para construir uma escola democrática, uma escola
que deixasse de formar o cidadão-súdito e passasse a construir um
cidadão-participante (LAVILLE, 1999).

Uma dessas situações esteve relacionada a um dos conteúdos


do ensino de História: as comemorações cívicas ligadas ao dia
sete de setembro. O dia da independência era tradicionalmente
comemorado, no calendário escolar, com um ‘garboso’ desfile,
um culto à nação. Era um feito que se realizava para atender às
expectativas de um projeto de ensino que visava à formação moral e
cívica do educando, que compreendia a essência da nacionalidade,
sintetizada em armas, brasões e símbolos, denotando as aspirações
militares, para a construção da nação brasileira com ordem,
progresso e igualdade entre os homens (FERRARINI, 1979).

Se um decreto-lei inseriu na escola conteúdos de moral e de


civismo, caracterizando um ato de determinação hierarquicamente
superior e inquestionável, no ano de 1983, em pleno processo de
abertura política e finalização do regime militar, os professores,
mais uma vez por determinação superior, foram avisados de que
não mais seria necessário que o ato cívico acontecesse.

A Secretaria de Educação ‘sugeria’ que as comemorações


se dessem no interior da escola. Sobre as comemorações afetas à
Semana da Pátria, as diretrizes propunham que esse momento
passasse a ser considerado um momento de reflexão em torno da
78 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

questão da cidadania. O ato cívico do sete de setembro passaria


a ter características reflexivas que partiam do pressuposto de que
a ação pedagógica deveria ser aliada ao compromisso político do
cidadão para com a nação.

Dentro do ideal democrático assumido e professado pela SEED


– Secretaria de Estado da Educação, no seu Projeto Pedagógico,
todos os envolvidos no fazer educacional seriam responsáveis
politicamente pela formação do cidadão, entendido como um ser
capaz de, conscientemente, responder pelos seus atos (PARANÁ,
1984).

Não mais se admitia, segundo os princípios da SEED, que


os participantes das comemorações falassem sobre as atividades
que tivessem desenvolvido como se fossem alheios aos fatos,
comportando-se como expectadores passivos no processo. O ato de
questionar, de emitir opiniões não era habitual no projeto político
em que o professor estava, por costume, inserido. O ser civicamente
instruído era um agente passivo, pois a passividade havia sido
estimulada durante os anos de militarismo como uma virtude.
O cidadão, passivo ou ativo, continuava sendo requisitado como
conformador de um ideal para a nação. Um ideal que culturalmente
continuava a forjar heróis nacionais.

A Secretaria de Educação do Paraná, por meio do seu Projeto


Político-Pedagógico, pedia uma participação consciente, livre,
crítica e profunda, que fosse capaz de despertar professores, alunos
e a comunidade para pensar e agir sobre a realidade. A passividade
diante dos fatos representava um problema a ser discutido. Porém,
a maior dificuldade para se conseguir desenvolver um projeto
educacional que primasse pelo ensino de boa qualidade derivava,
de acordo com a opinião dos dirigentes educacionais, precisamente
E l a i n e R o d r i g u e s 79
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

da falta de uma metodologia e das respectivas práticas elaboradas


para essa tarefa.

O ensino de História ganhou especial destaque na proposta


da SEED, e isso se deu por ter sido despertado, por intermédio
dos conteúdos de Educação Moral e Cívica que se veiculavam nas
escolas, o ideal nacionalista militar. O que se pretendia nos idos
de 1980, em contraposição ao nacionalismo moralizante, era que
o ensino de História fosse um aliado consciente do compromisso
político do professor, que socialmente deveria objetivar com o ato
educativo a igualdade entre os homens.

O ato educativo objetivava equalizar os homens, de modo que


não houvesse divisão social entre intelectuais e ignorantes. Dirigida
a esse objetivo, a instrução alteraria a constituição da sociedade,
tornando-se um elemento político de mudança. A perspectiva
educacional que objetivava a igualdade de todos os cidadãos exigia
que diferentes formas e estímulos fossem encaminhados para instruir
aqueles que já tinham sido prejudicados pelo sistema econômico
e político. Parecia ser lógico, aos dirigentes educacionais, que essa
opção levaria a uma melhor qualidade de ensino, a qual não se
restringia à exigência de fornecer, a todo e qualquer usuário da
educação, o mesmo conjunto de conhecimentos. Essa opção exigia,
ainda segundo seus idealizadores, a não simplificação ou o não
barateamento dos conteúdos ministrados nas instituições escolares
aos alunos das classes populares.

O ideal de cumprir esses objetivos não poderia prescindir de


uma formulação adequada das atividades escolares. O discurso
da SEED anunciava-se comprometido com os que necessitavam
aprender. Declarava crer que a vida escolar deveria ser organizada
em torno das atividades dos alunos e pedia que o ambiente da escola
oferecesse a maior variedade possível de situações produtoras de
80 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

ensino. Pressupunha-se que a pessoa se apropriaria dos saberes por


força da própria atividade, e não segundo a concepção de modelos
e programas pré-fixados.

Tal discurso convidava o professor a participar da construção


da prática escolar, partilhando com os demais interessados a
premissa de que

Importa todo o universo de conhecimentos, já acumulados e sistematizados


pela humanidade. Mas muito mais importa que o aprendiz incorpore o
conhecimento das regras de funcionamento da sociedade, sua origem,
formação e reprodução. Importa também trabalhar um novo perfil do
educador que leve em conta: a capacidade de trabalhar politicamente
com outros educadores e animadores sociais; a visão pedagógica global
e não somente de especialista; a capacidade de construir o ensino com os
aprendizes, excluindo toda forma de condicionamento e dependência. Um
educador crente e esperançoso numa sociedade de relações equânimes,
construtor da educação como prática social, hábil em produzir ciência
comprometida com o ganho cumulativo de vida e liberdade (PARANÁ,
1985, p. 12).

Os conteúdos pretendidos, propostos pela Secretaria de Estado


da Educação para o ensino de História, eram sistematizados por
ocasião da formulação do Currículo Básico do Paraná e de materiais
didáticos como os cadernos intitulados Lições do Professor, que
pretendiam deixar claro que a proposta de trabalho compreendia
que a História poderia ser apreendida em três dimensões (PARANÁ,
1990, p. 81):

A História vivida: aquela que é vivida por nós, no presente e foi vivida
por todos os homens no passado (organizados em classes, grupos e em
sociedade). Essa História é objeto de estudo dos historiadores. A História
produto da reflexão dos pesquisadores, estudiosos. É o conhecimento
histórico acumulado – a historiografia. A História como matéria de ensino,
isto é, o conteúdo que já foi selecionado do conjunto histórico produzido e
que foi sistematizado para ser ensinado nas escolas. Nós, professores, ao
trabalharmos com os nossos alunos, devemos ter consciência da necessidade
da relação entre estas três dimensões: relacionando o conteúdo que estamos
ensinando com a produção historiográfica mais avançada e ao mesmo

E l a i n e R o d r i g u e s 81
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

tempo com a História que vivemos e com uma proposta de ensino de


História.

A Secretaria de Educação defendia, insistentemente, a


obrigatoriedade de o professor priorizar, em suas ações pedagógicas,
seu compromisso político, imprimindo uma diretriz ao seu fazer
pedagógico. Essa postura, de certa forma imposta ao professor,
pretendia ser uma força iluminadora na atuação de todos os
envolvidos com o cotidiano escolar.

O discurso da SEED alicerçava-se na premissa de que a


educação estava sendo repensada e resgatada como um ato político,
suas consequências sociais não poderiam deixar de ser consideradas,
e que os resultados do ensino eram resultados políticos e a atividade
do professor, ensinar na escola, necessitava ser realizada como um
compromisso firmado junto à sociedade. A ação educativa estava
sendo discutida e determinada pela Secretaria, que a pressupunha
como um ato político, porque sua prática tinha consequências. “É
um ato político porque orienta a ação humana, que é, e sempre foi,
inspirada em opções políticas, filosóficas e ideológicas” (PARANÁ,
1984, p. 8).

De maneira coerente com essa postura, tomada mediante


o ato de ensinar e suas consequências, a SEED definia, assim nos
parece, pressupostos que intencionavam estimular o entendimento,
pelo professor, do compromisso político que as atividades
escolares significavam e reiterava essa ideia em todos os espaços de
comunicação, tal como a seguir:

[...] como sabemos, a fonte de todos os tormentos na área educacional


é essencialmente política e hoje situa-se no projeto político, de caráter
nacional, responsável pela educação vigente no País. Resolver em
profundidade os problemas candentes que a todos angustiam significa
atacar a fonte primeira de sua ocorrência (PARANÁ, 1984, p. 3).

82 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

A disciplina de História fora resgatada, por esse projeto,


como uma aliada. Recebeu destaque como detentora de saberes
indispensáveis ao projeto político de sociedade que se formulava
no período pós-ditadura militar. Caracterizá-la como uma solução
milagrosa de libertação seria um descuido analítico; entretanto,
destacamos que, ao seu ensino, se atribuíam potencialidades
capazes de elevar, diretamente, o nível de consciência dos
educandos, caso recebessem aulas de História. Por meio de seus
conteúdos, fazia-se possível tomar contato com uma forma de
pensamento esclarecedor com relação à classe social a que se
pertencia, e, de posse desses conhecimentos, caberia ao educando
interferir na sociedade, como sujeito histórico, contribuindo para a
transformação desta. Qualitativamente, se estaria oportunizando
o conhecimento de “[...] níveis mais elaborados de abstração, o
que é um dos requisitos para o exercício da cidadania” (PARANÁ,
1984, p. 10).

O discurso que embasava o Projeto Político-Pedagógico da


SEED era coerente; entretanto, se isso fosse relacionado às ações
concretas, efetivamente realizadas, essas eram mais modestas do que
as intenções anunciadas. O conteúdo das propostas, veiculado nos
documentos, era bastante repetitivo, chegando a ser enfadonho.

Os argumentos propostos como estratégias reflexivas,


objetivando a elevação do nível educacional, remetiam o leitor a
um raciocínio de caráter solidário; o pedido era de participação,
comunhão, humildade, dedicação, responsabilidade. Essa era
a tônica do discurso. O teor argumentativo do projeto, quando
discutia qualidade de ensino, era messiânico, como se, respondendo
às expectativas da SEED, a população pudesse conquistar uma
nova sociedade, mais justa, mais fraterna, mais livre, com níveis de
consciência mais elaborados.
E l a i n e R o d r i g u e s 83
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Dentro da mesma lógica, o discurso proferido por um padre


era tomado pelo jornal como parâmetro e levado até as escolas.
Dessa vez a palavra força era justiça, e nesse contexto os problemas
educacionais iam, pela imposição da linguagem, tomando contornos
nos quais a busca de solução para os problemas educacionais parecia
ser possível, se efetivada como problema de fé. Esperava-se que o
educador se posicionasse como uma pessoa presente na vida de
seus alunos. Tal como numa profissão de fé, anunciava-se:

A educação para a justiça implica num compromisso com a construção


de uma sociedade onde ‘prevaleçam a participação e a comunhão [...]
mas, se durante todo o processo de educação formal, a criança e o jovem
são tratados como incapazes de decidir sobre as coisas que lhes dizem
respeito, não estaremos preparando pessoas dispostas a buscar essa
mesma participação e comunhão em sociedade’ (PARANÁ, 1985a, p. 6).

O sonho, algo tão particular, também foi resgatado de forma


social, como argumento para reflexão sobre as questões educacionais.
Se o homem estivesse completamente privado da capacidade de
sonhar, se não pudesse de vez em quando se adiantar a contemplar
em sua imaginação o quadro inteiramente acabado da obra que
esboçava em suas mãos, não poderia imaginar o que o obrigaria a
empreender e levar a termo, vastas e penosas, empresas no terreno
das artes, das ciências e da vida prática. O desacordo entre os sonhos
e a realidade não produz dano algum, sempre que a pessoa que
sonha creia sinceramente em seu sonho (PARANÁ, 1985a).

Construir a realidade a partir de seus sonhos, crer sinceramente


nos sonhos. As afirmações nos levam a pensar que, durante o
processo de administração, o entusiasmo e a crença na nascente
democracia como solução para todos os problemas era uma premissa
que começava a ficar nos sonhos; ou ainda, dito de outra forma,
mantinha-se como elemento do discurso. Mas, e a tão sonhada
decantada qualidade de ensino, que figurou no discurso educacional
84 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

dessa época como elemento transformador da sociedade, continuou


a figurar? Não mais como poderes revolucionários, transformadores,
mas como possibilidade de formação moral, de conduta ética.
Reforçamos, com a própria trajetória do Projeto Pedagógico dos
anos 1980, a premissa de que não houve rompimento significativo
na forma tampouco no conteúdo, com o que se ensinava em História:
a busca continuou a ser moralizante e nacionalista.

A importância atribuída à disciplina de História, diante dos


princípios humanistas e não mais políticos, foi estrategicamente
substituída por uma súbita relevância dada à disciplina de Desenho,
por meio da qual se pretendia que o aluno, no conjunto das
aquisições que a escola lhe proporcionava, pudesse interagir com o
mundo, e não ser dominado por ele. Na perspectiva de uma atuação
diferenciada do período ao qual se opunha o ditatorial, a SEED ia
criando ações em que o debate acerca de questões educacionais
pudesse, segundo seu entendimento, melhorar o ensino, ainda que a
saída estivesse na fé. O que se passava a procurar já não era a glória
de um projeto que se opunha aos ‘famigerados’ anos da ditadura
militar, mas uma identidade.

Na busca por essa identidade, o tema cidadania ocupava lugar


de destaque, não somente nas discussões acadêmicas como também
nos discursos políticos veiculados em defesa dos movimentos
populares, tornando-se um dos conceitos mais utilizados à época.
Nunca se falou tanto em cidadania!

A nossa Constituição, em seu Título VIII, capítulo III, traz


um artigo que faz alusão à questão da cidadania, em seu art. 205,
determinando que a

[...] educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será


promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando

E l a i n e R o d r i g u e s 85
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da


cidadania e sua qualificação para o trabalho (VITA, 1989, p. 182).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais indicam, como um dos


objetivos do Ensino Fundamental, que os alunos sejam capazes de

[...] compreender a cidadania como participação social e política, assim


como exercício de direito e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no
dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças,
respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito; bem como, a
necessidade de conhecerem as características fundamentais do Brasil
nas dimensões sociais, materiais e culturais como meio para construir
progressivamente a noção de identidade nacional (BRASIL, 1998, p. 7).

Diante de proposições e pareceres acerca do tema, é preciso


que alertemos para o risco da excessiva utilização do termo
cidadania. Conceitos aplicados de forma indiscriminada, sem que
se considerem as circunstâncias culturais, políticas e históricas que
o envolvem, acabam por sofrer um esvaziamento em seu sentido.
As noções de cidadania, democracia e política eram conceitos/
categorias que, por frequentarem assiduamente o discurso
modernizante do século XX, assumiram significados, por vezes,
com características excessivamente positivas. Quase como magia,
esses termos se especificavam no interior de projetos pedagógicos e
contextos sociais diferentes.

A relação entre o discurso proferido e a ação efetivada não é


simples. A prática efetiva está entrecortada por motivos conflitantes
entre os personagens implícitos no discurso que fundamenta o
projeto político. As políticas formuladas por um órgão oficial
estatal e as publicações da SEED são repostas oficialmente dadas
às demandas geradas por grupos, por facções da sociedade. O
teor do discurso é esperado. O conteúdo é redigido para atender
a demandas específicas. Essas necessidades podem ser gestadas
por vários segmentos, mas o projeto atenderá a apenas um deles.
86 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

A equipe da Secretaria de Educação privilegiou um discurso que se


propunha a optar pelas maiorias carentes, pelos excluídos.

A equipe pedagógica, constituída pela SEED, após o regime


militar, orientou-se, num primeiro momento, pelas denominadas
pedagogias progressistas. Entretanto, na contramão do discurso,
as outras instâncias governamentais não se mantiveram em
consonância com a Secretaria de Educação, ou seja, não houve o
aparato necessário à manutenção dos compromissos assumidos
em campanha. Utilizamos, como exemplo, o arrocho salarial
vivido pelos professores. Com a sobrevivência ameaçada, como
construir cidadania, como sentir-se, positivamente, participante
de um projeto, quando se era a parte desfavorecida desse? Diante
desses desafios, o discurso tomou nova formatação e se misturou
a conteúdos de fé, trazendo à tona a velha ideia de que a profissão
do educador se confunde com um sacerdócio; portanto, pleno de
resignação, determinação, humildade, com menos exigências, para
ser exercido em prol do bem comum.

Houve, na década de 1980, uma tentativa de descartar o


componente conservador da Educação Moral e Cívica, incorporando
nos programas de História uma perspectiva mais comprometida
com a participação democrática, por meio de um discurso que
pretendia trabalhar com conteúdos mais significativos à sociedade.
Os significados eram construídos, e essa significação não era
desarticulada dos interesses que a compunham e propunham. A
questão se colocava para além da intencionalidade grupal.

Culturalmente, somos frutos da mentalidade que engendrou


os conteúdos de História, como matéria escolar, na formação dos
educandos no final do século XIX, no Brasil, cujo objetivo à época
era legitimar a formação da Nação. No final do século XX, novas
demandas surgiram e a escola lhes atendeu, propondo-se a formar
E l a i n e R o d r i g u e s 87
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

o seu educando criticamente, atitude que, mais uma vez, o fazia


adequado.

Especificamente relacionada ao campo disciplinar da


História, a proposta paranaense propunha-se desenvolver um
trabalho em que ensinar História fosse sinônimo de educar para a
cidadania democrática, tornando os jovens capazes de participar.
Em consonância com o período anterior, e não rompendo com ele,
mantinha-se o ideal de conformação dos sujeitos à nação no Estado
em que se encontrava, legitimando a ordem social e política, fosse
ela ditatorial ou democrática.

É representativo destacar que, tomadas como referência,


quer a disciplina de História, quer a disciplina de Educação
Moral e Cívica não são diferentes; existe um processo contínuo
de conformação de seus conteúdos ao ideal de formação do
cidadão. A seleção de conteúdos, nas duas disciplinas, prima
pela manutenção da tradição do ensino nacionalista e patriótico,
calcado na História da civilização ocidental e no modelo
eurocêntrico. Ainda buscamos o herói! O modelo pode ser
conservador ou revolucionário, mas a tarefa é a mesma: redimir
a sociedade de seus males.

A re-estruturação do sistema brasileiro de proteção social


esteve no centro dos discursos sobre possíveis reformas a serem
executadas durante os anos de 1980. Embora essa década nascesse
com o sonho de uma sociedade democrática, ela morreu em meio
ao pesadelo de não ter realizado as promessas que a inauguraram.
Essa constatação, frequentemente exposta aos olhos dos educadores,
fez nascer um período de desencanto, contrariando a aposta na
suposição de que o processo de democratização da escola aceleraria
o caminho para a democratização da sociedade, com o consequente
acesso à cidadania, o que não se efetivou, muito embora o discurso
88 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

tenha se reconstituído durante as duas últimas décadas do século


XX.

A instituição educativa não é um espaço neutro. Essa não é


uma constatação nova. Seu espaço é disputado como palco para
discursos ora de manutenção da ordem ora para sua mudança. Nesse
contexto de disputa pelo poder político, a educação se manifesta
como elemento catalisador. Entendê-la como aceleradora de um
processo faz com que seja constantemente resgatada. Nessa lógica,
os conteúdos pertinentes ao ensino de História durante as últimas
décadas, na forma ditatorial ou na da democracia representativa,
sempre atenderam ao ideal de nacionalidade.

O Estado, ao definir uma política educacional, percorreu um


longo processo de elaboração, até o fazer-se na prática educativa,
nas unidades escolares. No caminho, o discurso por uma escola
pública, gratuita, democrática e universal e de qualidade manteve-
se, mas a prática que a efetivaria se segmentou nas esferas em que a
educação se reproduziu e se diferenciou nas formas de apropriação
desse discurso (CHARTIER, 1990).

Não podemos desconsiderar, como elemento dificultador de


uma prática educacional mais próxima das expectativas dos agentes
nela envolvidos, a ação de uma política clientelista, que permeia a
distribuição e a gestão dos recursos para a Educação, em todos os
seus níveis. Educa-se para atender a interesses. Educar é sempre
criar adequação ‘a’. Ou, dito de outra forma, é o aprendizado de um
sistema de valores em curso, o que, a nosso ver, o sistema de ensino
brasileiro tem tentado realizar, qualquer que seja a forma política
de configuração do Estado, ditatorial ou democrático.

Atualmente, pede-se à escola e ao professor que conceba seu


fazer pedagógico com base na transmissão de valores, objetivando
E l a i n e R o d r i g u e s 89
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

à inter e a transdiciplinaridade em seus currículos e programas.


Aprender valores em curso pode também ser definido como
adestramento, formação do indivíduo para a obediência a regras
e a incorporação de hábitos. Não é possível ser independente do
mundo em que vivemos. Somos o que conseguimos criar, inventar
como sociedade. Não estamos fazendo apologia da condenação
a uma forma de vida, como se ela fosse estagnada. Como nunca
vivenciamos o mundo da velocidade, do movimento, não há espaços
nem definições que possam dar conta do que se denomina atual.
Existe o espaço tangencial, aquele que foge à lógica da ciência, à
formação acadêmica, e o encontro desse espaço é que nos desafia
como pesquisadores, professores e alunos.

A escola, a despeito de ter sido aclamada durante as décadas


de 1980 e 1990 como uma possível redentora dos problemas sociais,
definitivamente não o é. Em nossos dias ser detentor de saber
sistematizado não garante a sobrevivência, o emprego, nem sequer
a adequação dos indivíduos ao seu meio, o que nos permite afirmar
que o ensino de História tem ou teve pouquíssimas chances de
exercer o poder que os vários projetos educacionais, derivados de
um único projeto de nação, o de criação de uma identidade nacional,
lhe conferiram.

As entidades brasileiras, formalmente organizadas em prol


de uma Educação pública, universal, gratuita e de qualidade,
reclamam insistentemente, junto aos seus governantes, uma ação
que mantenha a oferta de educação para todos. Entra governo, sai
governo e as promessas eleitoreiras não saem dos palanques. No caso
das políticas educacionais, elas se definem como uma sofisticação
dessas promessas. Constatação que nos faz lembrar que

[...] a democracia é um mecanismo para escolher e autorizar governos, a


partir da existência de grupos que competem pela governança, associados

90 E l a i n e R o d r i g u e s
1 EDUCAÇÃO, DISCURSO DEMOCRÁTICO E GOVERNAMENTALIDADE...

em partidos políticos e escolhidos pelo voto; a função dos votantes não


é a de resolver problemas políticos, mas a de escolher homens que
decidirão quais são os problemas políticos e como resolvê-los (CHAUÍ,
1997, p. 138).

A crença em uma concepção teórica universal, totalizante,


para se pensar, compreender e interferir na sociedade se revelou, ao
longo do desenvolvimento do Projeto Político-Pedagógico proposto
pela SEED, como um simulacro. Falou-se tanto em social que o social
se perdeu no social. Tentou-se, por meio de uma concepção teórico-
metodológica, imputar tudo ao social, exprimir todo o social, quis-
se retirá-lo da dimensão representativa, e com isso ele se diluiu.
Centrifugou-se. O ensino das disciplinas é mutável no tempo, seu
exercício pedagógico também o é; seu conteúdo é que tem resistido
a todas essas mutações, o que caracteriza as continuidades desse
fazer.

E l a i n e R o d r i g u e s 91
Parte II
Brasil!
Mostra a tua cara
Quero ver quem paga
Pra gente ficar assim
Brasil!
Qual é o teu negócio?
O nome do teu sócio?
Confia em mim...
Brasil!!
(CAZUZA, 2012).
2
O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS DA
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO PARANÁ

A especificidade deste capítulo incide sobre o Jornal da Educação,


um periódico educacional publicado pela Assessoria de Imprensa e
Relações Públicas da Secretaria de Estado da Educação (SEED) e
pela Assessoria de Comunicação Social da Fundação Educacional
(Fundepar), ambas do Estado do Paraná. A edição de número um
foi publicada em junho de 1983, e, a partir de então, essa publicação
circulou durante três anos e meio – junho de 1983 a setembro de
1986.

O jornal contou, em seu primeiro ano, com apenas duas


edições: uma em junho e outra em outubro. A circulação se dava
por meio de distribuição gratuita, diretamente nas escolas mantidas
pelo governo estadual. A partir do segundo ano, essa publicação
passou a ser bimestral, com tiragem anunciada de 50 mil exemplares
a partir da edição nº 6. No terceiro ano, na edição nº 11, a mensagem
da primeira página anunciava: ‘Estamos indo mais longe. Nesta
edição a tiragem foi de 70.000’. Manteve-se, apesar do alto volume,
a mesma maneira de distribuição. O objetivo que amparou a criação
do Jornal da Educação era, segundo seus editores, ter um “[...]
amplo, variado e fluido canal de comunicação entre a comunidade
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

escolar – professores, alunos, pais e funcionários – e os organismos


governamentais” (PARANÁ, 1985d, p. 1).

Num primeiro e decisivo aspecto que explica a escolha da


SEED pelo uso da materialidade impressa de um jornal como
vínculo de comunicação entre os dirigentes educacionais e os
professores, entendemos não haver pré-determinação quanto ao
número de páginas, os conteúdos poderiam ser mais ou menos
extensos de acordo com os objetivos propostos para cada edição.
Um segundo aspecto seria o caráter informativo e ao mesmo
tempo formativo. Os conteúdos formativos, no caso do jornal
aqui estudado, foram escolhidos de acordo com a necessidade dos
conteúdos que contribuiriam para a formação do professorado,
adequando-se à proposta educacional que então se desenhava.
Quanto ao conteúdo informativo, limitava-se a apresentar, ao
leitor, o que já havia sido feito e o que estava por se fazer na
administração estatal, marcando forte presença de um discurso
sobre a atuação político-partidária do grupo em exercício de
representação.

A impressão que temos, colhida por intermédio da leitura dos


exemplares do jornal, é de que as informações estavam, na maior
parte das vezes, divulgando positivamente o trabalho da SEED,
promovendo uma propaganda democrática, sem dúvida, mas sob o
grifo do partido que elegera o governador. Chartier (2002b) explica
que há uma intencionalidade dirigida nos impressos, objetivando
uma indução na forma de apropriação, consonante com os objetivos
que os criam.

No Jornal da Educação, o papel de editor e o de quem escrevia não


se faziam tão diferenciados, já que todos os membros representantes
participavam ativamente na elaboração do projeto educacional e, por
meio de artigos, cartas, sugestões de leituras e outros, expressavam,
96 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

igualmente, a concepção educacional e o discurso político da


Secretaria Municipal de Educação. Por isso não acreditamos que
houve significativos recortes nos escritos originais, fosse em artigos
ou editoriais. O espaço que pode contrapor o que dissemos estaria
nos textos escritos por convidados, conforme os conteúdos de suas
palestras e ou cursos ministrados. Esses, possivelmente, poderiam
sofrer alguma alteração por seus editores.

Os textos impressos são os mesmos para todos os que dele


fazem uso, independente de ‘classificação’ social, cultural, religiosa
ou situação econômica. Todavia, as diferenças de apropriação se
fazem presentes na forma como cada leitor estabelece entendimento
sobre o que está escrito no impresso, o diálogo que estabelecerá com
o seu vivido, com a sua realidade e na forma como pode ou não
incorporar o que leu no seu cotidiano. Em suma, o texto pode ter
significado diferenciado, cada leitor ou grupo pode apropriar-se
do conteúdo do texto de forma diferenciada. Tendo isso em vista,
explicamos a preocupação com a Identidade Social a ser formada
no grupo para que objetivos, metas, concepção pedagógica e outros
sejam aproximados, buscando direcionar a apropriação de todos
dos conteúdos elencados e escritos, levando-se ao convencimento e
à aceitação do que propõe o grupo, no momento, em representação
(CHARTIER, 2002b).

Dois dos números publicados no período de junho de 1983 a


abril de 1984 privilegiavam em seus editoriais temas que permitem
identificar o mote das reflexões que seriam propostas para os anos de
editoração e circulação desse periódico. Ciclicamente as narrativas
reiteravam quais atitudes eram esperadas, de toda a comunidade
educacional, para suprimir o passado – militar - em favorecimento
do novo – a democracia.
E l a i n e R o d r i g u e s 97
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

O editorial da edição nº 1 denominou-se Comunicação Base


para a Democracia e registrava textualmente:

O JORNAL DA EDUCAÇÃO nasce com a proposta de desempenhar um


papel importante na democratização do ensino no Paraná [...] seguramente
ele representa um eixo fundamental do processo, que estará realizado se
conseguir, ao longo de sua existência, e com a colaboração sistemática dos
seus leitores, sepultar de vez o teor laudatório, mistificador, estimular o
espírito crítico, a convivência democrática e um crescimento comunitário
decorrente do exercício cada vez mais plano da cidadania [...] na busca de
um ensino verdadeiramente democrático, nacional e popular (PARANÁ,
1983a, p. 1).

O editorial nº 3 intitulava-se Liberdade para Agir e deflagrava


uma posição contrária a qualquer atitude vinculada à tecnocracia
vigente em anos anteriores àquela administração, porque entendia
que uma de suas principais características era valer-se também da
escola

[...] como instrumento privilegiado para transmitir sua ideologia, seu


saber e, assim, inocular nos cidadãos uma adesão incondicional, acrítica
e servil ao sistema. [...] Um projeto democrático tem diante de si o
desafio de enfrentar as profundas seqüelas que o autoritarismo deixou
no coração e na mente das pessoas. Massacradas pelo vírus tecnocrático
por muitos, muitos anos, elas parecem cheias de medo e insegurança,
sentindo-se impotentes e até mesmo desinteressadas diante das ricas
exigências de uma dinâmica democrática. A tecnocracia instalou o reino
da apatia, da ausência da crítica, da pobreza de idéias, da covardia
intelectual (PARANÁ, 1984a, p. 3).

A comunicação, ação que se pretendia realizar a partir


da data de editoração do primeiro tabloide, foi uma atitude
impulsionadora da democracia, assim avaliava a SEED.
Patrocinado pelo Estado, o Jornal da Educação não se pretendia
imparcial, fez-se valer como uma estratégia que defendia posições
e proposições; sua forma primava pela sensibilização para o
convencimento e o sentimento de esperança fossem o aliado com
o qual se acreditava poder contar. Uma de suas chamadas fazia
98 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

alusão à criação de uma coluna que seria editada para divulgação


de cartas recebidas da comunidade educacional. Na primeira
página, com bastante destaque, escrevia-se: “Este Jornal Também
é Seu. Escreva, Participe. O convite à participação é a novidade!”
(PARANÁ, 1983a, p. 1).

Fonte: Paraná (1983a, p. 1).

Em geral, os editoriais não são assinados, por indicar uma


tradução de linha de pensamento e argumentação dos seus
idealizadores desde seu processo de edição até a publicação e
circulação, atitude que por si denota autoria. Organizamos um
quadro demonstrativo dos 15 títulos de editoriais publicados pelo
Jornal da Educação.

Identificamos, no Quadro 7, que os títulos dos editoriais


eram entendidos como importantes pelo grupo que organizava
o jornal, eram construídos por meio de frases impactantes,
base de sustentação do foco da edição. Eram informações que
previamente anunciavam os assuntos que foram considerados de
maior interesse para o cumprimento dos objetivos, quer fossem
mais gerais, representativos do projeto da própria Secretaria,
quer mais específicos, porque organizados para uma edição do
tabloide.
E l a i n e R o d r i g u e s 99
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Ano / Nº / Bimestre de Editoração Títulos dos Editorias


Ano 1, nº1, junho ,1983 Comunicação base para a democracia
Ano 1, nº2, outubro, 1983 O problema é político
Ano 2, nº3, mar/abril, 1984 Liberdade para agir
Ano 2, nº4, maio/junho, 1984 Uma reforma para comunicar melhor
O jornal cresce com a participação dos
Ano 2, nº5, julho/agosto, 1984
leitores
A oportunidade histórica para mudar a
Ano 2, nº6, set/out., 1984
educação
O professor paranaense não pode ficar órfão
Ano 2, nº7, nov/dez., 1984
de bandeiras de luta
Ano 3, nº8, jan/fev., 1985 Ocupar os espaços na transição democrática
Preparar a constituinte para discutir a
Ano 3, nº9, março/abril, 1985
democracia
A nova República e a “Educação para
Ano 3, nº10, maio/junho, 1985
Todos”
Educação para todos, compromisso inadiável
Ano 3, nº11, jul/agosto, 1985
da nova República
Ano 3, nº12, set/out., 1985 O passado não requer saudade
Comunicação em favor da Educação
Ano 3, nº13, nov/dez., 1985
democrática
Ano 4, nº14, jan/fev., 1986 Transformar as esperanças em realidade
Ano 4, nº15, março/abril, 1986 Uma escola no rumo das mudanças
As mudanças interessam a todo o nosso
Ano 4, nº16, maio/junho, 1986
povo
Ano 4, nº17, agosto/set., 1986 Agente da História
Quadro 7 – Jornal da Educação: Editoriais. 1983 a 1986.

No comportamento do grupo representante em relação ao


grupo representado, percebemos que expressavam, em nome de
todos os professores da Rede Estadual de Ensino, dados levantados e
também apresentavam hipóteses e cobranças, compreendidas como
necessárias ao trabalho do profissional da educação. Para manter a
força discursiva, era preciso uma identificação com o leitor. Para isso,
os idealizadores do jornal escolhiam estratégias que abordavam o
100 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

tema de forma leve e apontavam culpados, de forma generalizada,


para os fracassos na educação. Gradativamente, eram evocados os
objetivos a serem alcançados, estabelecendo-se as melhorias a serem
feitas e como deveriam ser feitas.

A organização dos conteúdos publicados pelo tabloide,


também presentes nos temas dos editoriais, expressava
as preocupações educacionais da Secretaria e ajudava os
profissionais com ela envolvidos a reverem e reformularem suas
concepções diante da nova proposta de educação, criando assim,
o sentimento de pertença, fundamental para que a comunidade
educacional passasse a entender-se como partícipe das mudanças
pretendidas.

Essas proposições objetivavam que o profissional da


Educação passasse a compreender-se como um agente educacional.
Seu fazer deveria ser um fazer político, dotado de intenções pré-
estabelecidas, visando à democratização do ensino. Para que esse
profissional pudesse criar identificação com a nova perspectiva,
a SEED propunha-se a ensiná-lo, fazendo com que apreendesse o
significado de termos como política, democracia e cidadania. Esse
era o desafio de toda a sociedade civil, que se tornaria aprendiz
do fazer democrático, e a Secretaria de Educação tomava para si,
por intermédio das reflexões propostas pelos editoriais e por outras
seções do Jornal da Educação, a tarefa de mediar o aprendizado.

Nessa perspectiva, tornam-se interessantes os títulos das


matérias que eram destaque na diagramação do jornal. Os assuntos
em circulação, por meio da publicação da seção artigo, estavam de
acordo com os editoriais. Os conteúdos tornavam-se, por vezes,
redundantes. Isso acontecia porque cada um dos jornais estava
organizado sob um único tema. A imagem publicada destaca o
título de um dos editoriais:
E l a i n e R o d r i g u e s 101
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Fonte: Paraná (1984d, p. 1)

Os títulos que compunham os editoriais ou a seção artigos eram


um chamamento em nome do despertar para a democracia, para a
participação, de todos, em prol do bem comum. Apresentamos, a
seguir, a síntese de dois artigos publicados pelo tabloide, cuja autoria
fora identificada. Escolhemos os mais enfáticos em relação à crença
na Educação como forma de alavancar a renascente democracia
brasileira.

O primeiro artigo selecionado, Educação: Liberdade real


para todos, assinado por Lílian Anna Wachowics, versava
sobre a demanda crescente das populações rurais e urbanas por
escolas de 1º Grau e 2º Grau, atualmente denominados Ensino
Fundamental do 1º ao 9º ano e Ensino Médio. Propunha que todos
se organizassem para administrar suas próprias necessidades,
como deve ser numa sociedade livre e soberana. Sendo assim,
escola, Igreja, imprensa, sindicatos, associações de sala e os
partidos políticos, juntos, fortaleceriam a sociedade, articulando
seus direitos.

O artigo intitulado: Professor: um convite à reflexão, Gilda


Poli Rocha Loures afirmava que
102 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

O caminho da superação é o caminho do realismo que sintetiza a


consciência critica de atuação e possibilidades de ação concreta. Uma
estratégia nos parece, por isso inevitável: a da solidariedade, a do
diálogo e da mediação, quando emergem divergências de opinião,
conflitos de interesses ou diferenças de percepção e, principalmente, a
da participação consciente (PARANÁ, 1983b, p. 1).

Segundo as citadas autoras, era urgente compreender


que a democracia, para ser conquistada, seria fruto de esforço,
de engajamento e da luta dos cidadãos. O que se almejava
insistentemente era a participação do professor na conquista de
novos rumos para a educação do país. Elencamos no Quadro
8 – Jornal da Educação: artigos - todos os títulos publicados no
período de 1983 a 1987.

ANO, NÚMERO DO
TÍTULO DO ARTIGO AUTOR
EXEMPLAR E MÊS
ANO I – Nº. 01 – junho EDUCAÇÃO: LIBERDADE Lílian Anna
de 1983 REAL PARA TODOS Wachowicz
ANO I – Nº. 02 – outubro PROFESSOR: UM CONVITE À Gilda Poli Rocha
de 1983 REFLEXÃO Loures
AS COMEMORAÇÕES CÍVICAS
ANO I – Nº. 02 – outubro
REQUEREM UMA NOVA Léo Kessel
de 1983
POSTURA
ANO I – Nº. 02 – outubro APM: É PRECISO GARANTIR A
Sonia Kessel
de 1983 LIBERDADE E AUTONOMIA
ANO 2 – Nº. 03 – março/ ENSINO DE 1º GRAU: João Josué da
abril – 1984 DRAMÁTICA REALIDADE Silva Filho
IGUALDADE DE DIREITOS
ANO 2 – Nº. 03 – março/ ENTRE CRIANÇAS
Flávio José Arns
abril – 1984 EXCEPCIONAIS E AS DO
ENSINO REGULAR
Maria do Carmo
ANO 2 – Nº. 03 – março/ EM BUSCA DE FONTES
Marcondes
abril – 1984 CULTURAIS PARA O ENSINO
Brandão Rolim
RESGATE DO COMPROMISSO
ANO 2 – Nº. 04 – maio/
POLÍTICO NA AÇÃO Nercélio Zabot
junho – 1984
PEDAGÓGICA
LEITURA PARA CRIANÇA DE
ANO 2 – Nº. 04 – maio/ Manuel Nunes
BAIRRO: A NOVA AVENTURA
junho – 1984 da Silva
DA NOVA ESCOLA

E l a i n e R o d r i g u e s 103
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

ANO 2 – Nº. 04 – maio/ REFLEXÕES SOBRE O LIVRO Pura Domingues


junho – 1984 DIDÁTICO Bandeira
E AS AULAS (RE)
ANO 2 – Nº. 05 – julho/ Teófilo Bacha
COMEÇAM...!
agosto – 1984 Filho

ANO 2 – Nº. 05 – NO CES, A GRANDE Beatriz Peixoto


julho/agosto – 1984 OPORTUNIDADE Mezzadri
ANO 2 – Nº. 05 – julho/ REPENSAR A EDUCAÇÃO Carmem Lúcia
agosto – 1984 FÍSICA Soares
ANO 2 – Nº. 05 – julho/ O FRACASSO DA ESCOLA Maria Helena
agosto – 1984 PÚBLICA NO PARANÁ Carvalho
ANO 2 – Nº. 06.
NOVA CHANCE DE VOLTAR Marlene Marçal
setembro/outubro de
À ESCOLA Gonzaga Roch
1984
ANO 2 – Nº. 06.
REORGANIZAÇÃO DO 2º Denise Fabri
setembro/outubro de
GRAU Cezar
1984
ANO 2 – Nº. 07. BARATEAR AS CONSTRUÇÕES:
L e o p o l d o
novembro/dezembro de UMA DECISÃO DE NATUREZA
Ostertog Berger
1984 POLÍTICA
ANO 2 – Nº. 07.
PRIMEIRO GRAU, ESCOLA Manuel Nunes
novembro/dezembro de
DAS MAIORIAS da Silva Neto
1984
ANO 3 – Nº. 08. janeiro/ EDUCAÇÃO FÍSICA, UMA Carmem Lúcia
fevereiro de 1985 PRÁTICA EDUCATIVA Soares
ANO 3 – Nº. 08. janeiro/ PRÉ-ESCOLAR, A BUSCA DE Eloisa Candal
fevereiro de 1985 NOVAS ALTERNATIVAS Rocha
ANO 3 – Nº. 09. março/ CONSTITUINTE: A
Raymundo
abril de 1985 CONSTITUINTE E A
Faoro
EDUCAÇÃO
ANO 3 – Nº. 09. março/
CONSTITUINTE E EDUCAÇÃO Nicélio Zabot
abril de 1985
CURRÍCULO: O CURSO DA
ANO 3 – Nº. 09. março/ Manuel Nunes
ESCOLA NO CURSO DA VIDA
abril de 1985 da Silva Neto

NA EDUCAÇÃO O
ANO 3 – Nº. 10. maio/ Gino Azzoli
COMPROMISSO POLÍTICO É
junho de 1985 Neto
INDISPENSÁVEL
L u c i a n o
ANO 3 – Nº. 10. maio/
A ESTIMA CONSTICIONAL Benévolo de
junho de 1985
Andrade
PAPEL DA EDUCAÇÃO
ANO 3 – Nº. 10. maio/
ESCOLAR NA LUTA CONTRA A Nicélio Zabot
junho de 1985
MARGINALIZAÇÃO SOCIAL

104 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

E PUR SI MUOVE: CECIPINHOS


ANO 3 – Nº. 10. maio/
(OU O LÚDICO DA CIÊNCIA Paulo Botas
junho de 1985
NA DEMOCRACIA CIVIL)
ALFABETIZAÇÃO: UM
ANO 3 – Nº. 11. julho/ Regina Leite
PROCESSO QUE SE PROLONGA
agosto de 1985 Garcia
POR TODA A VIDA
ANO 3 – Nº. 11. julho/ CRIANÇAS ONTEM,
Paulo Botas
agosto de 1985 PROFESSORES HOJE
ANO 3 – Nº. 12.
setembro/outubro de CUIDADO! ELEIÇÕES À VISTA Paulo Botas
1985
ANO 3 – Nº. 12. A REPRESENTAÇÃO DA
setembro/outubro de LINGUAGEM E O PROCESSO Emília Ferreiro
1985 DE ALFABETIZAÇÃO
ANO 3 – Nº. 12.
MÃE E ESPOSA: É A MULHER
setembro/outubro de Télia Negrão
NA EDUCAÇÃO
1985
ANO 3 – Nº. 13.
UM ANO DE TROCA DE
novembro/dezembro de Paulo Botas
ESPERANÇAS
1985
RE-EDIÇÃO DE EXPERIENCIA
ANO 3 – Nº. 13. DEMOCRÁTICA ABRE
novembro/dezembro de CAMINHO PARA NOVAS Nircélio Zabot
1985 CONQUISTAS NA ESCOLA
PÚBLICA
ANO 3 – Nº. 13. TRABALHO E PARTICIPAÇÃO,
novembro/dezembro de CAMINHO PARA A Télia Negrão
1985 IGUALDADE
ANO 3 – Nº. 13. QUEM TEM MEDO Lia Vargas Triba
novembro/dezembro de DOS CONTEÚDOS e Gilson Carlos
1985 EDUCACIONAIS? Sant’Anna
ANO 4 – Nº. 14. janeiro/ “COMEÇAR DE NOVO VAI
Nircélio Zabot
fevereiro de 1986 VALER A PENA...”
QUANDO O QUE ACONTECE
ANO 4 – Nº. 14. janeiro/ Paulo Bragato
NAS ESCOLAS INTERESSA
fevereiro de 1986 Filho
AOS PAIS
ANO 4 – Nº. 14. janeiro/ A FUNÇÃO DE LIDERANÇA Antônio João
fevereiro de 1986 COMUNITÁRIA DO DIRETOR Mânfio
ANO 4 – Nº. 15. março/ ECONOMIA, EDUCAÇÃO E Teófilo Bacha
abril de 1986 CIDADANIA Filho
ANO 4 – Nº. 15. março/ RATOS E CRIANÇAS. UMA
Mariella Righini
abril de 1986 EXPERIÊNCIA REVELADORA
Marco Antônio
ANO 4 – Nº. 15. março/ A EDUCAÇÃO FÍSICA E A
M o r a e s
abril de 1986 MULHER
Sarmento

E l a i n e R o d r i g u e s 105
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

ANO 4 – Nº. 15. março/ COM A PALAVRA O M a r l u s


abril de 1986 ESTUDANTE Geronasso
ANO 4 – Nº. 15. março/ SOCIEDADE INJUSTA AFASTA
Nircélio Zabot
abril de 1986 ALUNO DA ESCOLA
ANO 4 – Nº. 16. maio/ CONSTITUIÇÃO E Hermógenes
junho de 1986 CONSTITUINTE Lazier
ANO 4 – Nº. 16. maio/ QUEM TEM MEDO DA Teófilo Bacha
junho de 1986 POLÍTICA ESTUDANTIL? Filho
ANO 4 – Nº. 16. maio/ EDUCAÇÃO RURAL, UM Maria do Carmo
junho de 1986 GRANDE DESAFIO Brandão
ANO 4 – Nº. 17. julho/
CONSTITUINTE NA ESCOLA Nircélio Zabot
agosto de 1986
Quadro 8 – Jornal da Educação: artigos com autoria identificada. 1983 a
1986.

Lembrando que o discurso em pauta era o da democratização,


colocava-se como responsável a, então, atual administração, para
promoção de tais mudanças. A democratização, tema desenvolvido
para ser discutido entre os administradores da escola, justificava-
se por exigir, dos dirigentes escolares, uma postura exemplar, que
deveria entender e pôr em prática o sentido do que seria e como
seria a democratização por meio da escola. O diretor era considerado
uma peça de apoio para o desenvolvimento do projeto da SEED,
por isso recebia a responsabilidade de ser exemplo, para todos, na
empreitada democratizante.

A promoção de ações de aproximação entre comunidade, escola


e SEED visava conquistar o apoio da população, particularmente
daqueles mais carentes, o que ajudaria na tarefa de se realizar
mudanças educacionais, levando-se ao conhecimento popular o
trabalho da administração estatal, consequentemente, esperava-
se que essas atitudes fossem valorizadas. Almejava-se envolver
a comunidade escolar, especialmente os professores, para que
houvesse maior comprometimento com a educação que estavam
propondo, conforme as novas perspectivas. Apoiando a nova
106 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

proposta, a comunidade educacional, se sentiria partícipe de uma


identidade social.

Chartier (2002a) apresenta dois entendimentos para se


pensar a construção das Identidades Sociais. O primeiro ampara-
se na compreensão das relações de forças entre as representações
impostas por quem detém o poder de classificar, nomear e a definição
submetida ou resistente que cada um produz de si. A outra considera
a formação do grupo como tradução de crédito concedido, assim,
o reconhecimento da existência do indivíduo, como integrante do
conjunto, se dá com base na exibição, mais aproximada possível, da
identidade-modelo. Essa possibilidade de que todos os integrantes
da escola entendessem e apoiassem o trabalho desenvolvido pelos
órgãos educacionais ancorava-se, sobretudo, no sentimento de
pertencimento e valorização do seu espaço, de seus conhecimentos
e de sua vida.

Um olhar panorâmico sobre as edições do Jornal da Educação


permite-nos destacar a vontade dos organizadores do jornal
em fazer desse impresso um veículo para o convencimento do
leitor, utilizando argumentos voltados à demonstração de boa
vontade e esforço empenhado por todos os envolvidos em prol da
transformação da educação. Paralelo a isso, a SEED promovia-se,
evidenciando que muito estava sendo feito para que os professores
trabalhassem com qualidade.

Os editoriais e artigos que circulavam no jornal insistiam na


máxima: cabe ao professor fazer ecoar na escola a nova proposta
e, com ela, promover as condições de melhorias educacionais, na
prática. O tabloide frisava que o professor estava recebendo todo
amparo necessário ao bom trabalho, e as condições estruturais
e formação pedagógica, aplicadas na prática, seriam as novas
motivações educacionais que passariam a fazer parte da realidade.
E l a i n e R o d r i g u e s 107
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Em resumo, faltaria apenas boa vontade do professor para melhorar


o que lhe cabia fazer para transformar a educação, uma vez que
as condições estruturais, técnicas e metodológicas já haviam sido
proporcionadas pela ação governamental.

Era perceptível nos textos o esforço em passar uma imagem,


ao leitor, de luta constante em favor do povo. Entendemos que os
proponentes do projeto educacional, assumido pela SEED, sentiam
necessidade de apoio e aceitação de todos, como estímulo para
desenvolver esse trabalho. Para isso, utilizaram o argumento da
democratização e, como consequência, a busca pela cidadania,
bases para que as transformações ocorressem. Seria necessário que
as pessoas lutassem, pelos mesmos objetivos, os democráticos,
assumidamente, assim como a administração. Como demonstração
de competência, a SEED afirmava ter se proposto a fazer muito em
pouco tempo.

O Jornal da Educação, por sua constituição, deveria representar


um dos eixos no processo de democratização pretendido pela
SEED, realizando a comunicação, fator decisivo na conquista de um
patamar democrático satisfatoriamente alcançado. Outra intenção
existente, ao se criar o jornal como canal de comunicação, foi a
de que, durante sua trajetória em que contou com a colaboração
dos seus leitores, o Paraná pudesse sepultar o teor mistificador
presente nos conteúdos curriculares e nas estratégias educacionais,
contrapondo-se às orientações tecnicistas que prevaleceram na
década anterior. Havia o estímulo ao espírito crítico, à convivência
democrática e, como consequência, o crescimento comunitário, um
ensino verdadeiramente nacional e popular decorrente do exercício
cada vez mais amplo da cidadania.

O esforço para efetivação de um ideal democrático e


a suposição de que o Jornal da Educação seria um eixo nessa
108 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

construção era um postulado visivelmente declarado desde


o primeiro número do periódico. Assim, a manutenção de um
argumento discursivo ligado à participação da comunidade
escolar nas decisões que envolviam a Educação era recorrente
nas edições.

O espírito dos anos 1980, representado pelo discurso que


veiculava o Jornal da Educação, entusiasticamente defendia o poder
pelo voto, a participação, a comunicação, a desburocratização,
a formação do cidadão-crítico e outros termos que se tornaram
bandeiras de luta na realização de um ideal democrático. Essa
imprensa, pela qual optou a SEED, a pedagógica, anuncia discursos
e expressões de diferentes protagonistas, possibilitando diálogos
que evidenciam características de determinados grupos sociais, o
que permite realizar a tarefa de questionar e destacar diferentes
formas de apropriação evidenciadas em meio aos acontecimentos
ou ainda acerca da própria criação destes e ainda pode-se conhecer
a organização pretendida para o universo escolar (NÓVOA, 1997;
CATANI, 1997).

O tabloide evidenciava as diretrizes oficiais que a escola


recebia e às quais necessitava atender e ao mesmo tempo permitia
a identificação de outros fatores integrantes da construção do
que denominamos espaço escolar. Tomando por base o que está
registrado no impresso, podemos ampliar a compreensão que se
tem construída acerca do universo dos anos de 1980.

2.1 Democracia Escolar: O Voto Legitimador

Eleições Diretas para Diretor Escolar é um título e um objetivo


que figurava dentre as matérias do jornal, pressupunha uma ação
que ajudaria a construir um universo em que a viabilização dos
E l a i n e R o d r i g u e s 109
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

ideais democráticos se fizesse possível. O exercício do direito de


escolha se daria, antes de tudo, como um exercício de convivência
social. Fomentar a discussão e o debate, como base para a mudança,
fazia parte do universo educacional pretendido pela SEED, assim
se afirmava.

Discutir os caminhos de crescimento de uma comunidade,


ensejar uma gestão participativa, que fosse representativa
do consenso comunitário escolar, em torno de princípios e
procedimentos de uma política educacional que defenderia uma
Educação popular que devolveria o ideal democrático à sociedade
era considerado um ‘fato gerador de mudanças’ (PARANÁ, 1983a,
p. 1).

Fonte: Paraná (1983a, p.6).

A imagem, de maneira estilizada, remete ao eleitor, que estaria


depositando seu voto em uma urna, com a forma de um livro aberto.
A democracia exercida, também, na escola, teria o voto como seu
legitimador. De maneira representativa, todos os segmentos sociais
fariam parte de uma assembleia deliberativa acerca das questões
que envolviam a comunidade educacional. No caso da escola, seus
110 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

membros – pais, alunos, professores e funcionários - passariam a


decidir sobre os problemas referentes à Educação.

Na origem, democracia significa ‘poder do demos’, este sendo uma


unidade territorial que se configura como unidade política quando
definido como ‘comunidade de homens livres’. Duas são pois, as
determinações básicas do conceito: a idéia de comunidade e de liberdade
[...] A igualdade é um valor necessário a toda e qualquer cidade, pois
sem a igualação dos desiguais não há sociedade ou política, mas ao
mesmo tempo é um valor derivado ou subordinado, isto é, sua definição
depende da determinação do valor dos valores, pelo qual a natureza da
sociedade e da política se definem. Na democracia, o valor dos valores é a
liberdade e é ela quem determinará a natureza da igualdade democrática
e a diferencia das demais em outras sociedades (como as aristocráticas e
as monárquicas) é a afirmação de que todos os membros do demos são
absolutamente iguais porque todos são livres. É esta igualdade absoluta
(que não é econômica, mas social e política) que permite a democracia,
isto é, o poder do demos (CHAUÍ, 1997, p. 201).

O Paraná, segundo a Secretaria de Educação, estava oferecendo


a todo o Brasil uma grande e inesquecível lição de democracia
quando tomava a decisão de encaminhar eleições diretas para
diretores de escolas. Atitude que projetou o Estado como referência
no aprendizado do fazer democrático em prol da nação. Eleição
direta para diretor escolar era uma reivindicação da classe docente,
que fora atendida pela SEED. De acordo com o Decreto 455/83
de 13/04/1983, poderiam votar os professores e especialistas,
funcionários estatutários ou celetistas, os alunos de 2º grau e o pai
ou a mãe do aluno de 1º e 2º graus, mesmo os analfabetos. O voto,
assim definia a Lei, seria apenas um, independentemente do número
de filhos que os pais mantivessem regularmente matriculados e
frequentando a escola.

Destacava o Jornal da Educação (PARANÁ, 1983a, p. 1) o


fato de que o diretor, por essas regras eleito, teria seu mandato
encerrado em 31 de dezembro de 1984. A justificativa para tal
definição estava na intencionalidade de se convocar novas eleições,
E l a i n e R o d r i g u e s 111
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

o que ocorreu no final de 1985, quando o diretor eleito foi nomeado


pelo governador, conforme o Decreto-lei nº 7.961/84. Pelo voto da
comunidade educacional seriam escolhidos três candidatos para
compor uma lista tríplice, um deles seria nomeado pelo Secretário
de Educação. Todos os professores ou especialistas lotados e em
exercício no estabelecimento de ensino seriam, em princípio,
candidatos. Esse processo substituía a forma de nomeação em
que a direção das escolas era considerada um cargo político,
obviamente, indicada por alguém que detivesse poder político.
Segundo a Secretária, Gilda Poli Rocha Loures, ainda não era o
ideal, mas se chegaria lá.

Apesar da forma como ocorreu a eleição e de esta ter sido


duramente criticada pelo uso da lista tríplice, porque se associava
essa prática às estratégias utilizadas durante o regime militar, o
feito tomou proporções consideráveis, dois milhões de pessoas em
3.500 escolas da rede estadual participaram das eleições. Os pais
compareceram massivamente, cerca de 70% do total (PARANÁ,
1983a, p. 1).

A campanha para a direção das escolas seguiu os trâmites


de uma eleição comum. Debates, cartazes, faixas, planos de ação,
‘santinhos’ e outros aparatos compuseram o cenário eleitoral da
primeira realização de eleições diretas nas escolas. Vale ressaltar
que os 128 primeiros colocados nas eleições foram escolhidos pela
Secretária para ocuparem o cargo de diretores, assim como somente
14 segundos lugares e um terceiro (CUNHA, 2001; RODRIGUES,
2002; 2007).

O nível de abrangência das eleições para diretores de escolas


seria dimensionado pelo grau de envolvimento da comunidade, era
o que se pretendia. Esperava-se que a comunidade aproveitasse o
112 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

momento para pensar e avaliar a escola que queria e que deveria


defender:

[...] uma escola aberta e democrática, portadora de uma política


educacional que despertasse a consciência dos cidadãos para os
valores da liberdade, da democracia e da nacionalidade. Ela deveria
ser um espaço de comunicação onde os educadores, os alunos e seus
pais pudessem exercer a liberdade de convivência social, de vivência
cultural, de experimentação e de pesquisa científica (PARANÁ, 1983a,
p. 1).

O Jornal da Educação publicou que a UBES (União Brasileira


dos Estudantes Secundaristas) prestou seu apoio às eleições,
enviando à secretária uma moção, na qual seu presidente afirmava:
“Nós, estudantes, achamos que esta eleição marca o início da
democratização da escola” (PARANÁ, 1983a, p. 1). Explicava
sua afirmação, afirmando que, em sua opinião, começava-se a
cumprir a reivindicação, toda a comunidade escolar participaria
das decisões que envolviam a escola. Os alunos teriam uma
participação e um peso muito importantes. Declarava que
seus pares votariam em candidatos comprometidos com suas
expectativas e reivindicações.

A democracia exercida no interior da escola ecoaria


positivamente, funcionando como base para melhor formar o
cidadão, e o Paraná estaria servindo de exemplo para toda a nação,
mais uma vez se reforçando a ideia de execução de um projeto
democrático.

Neste período de exame da realidade nacional, com vistas a compor


um novo projeto de desenvolvimento político, social, econômico e
cultural para o Brasil, a Educação deve também assumir à irrecusável
tarefa de devassar implacavelmente os entraves que a vem asfixiando,
especialmente ao longo das duas últimas décadas. [...] As gerações mais
jovens, asfixiadas em sua liberdade, em sua iniciativa, acabam órfãs de
referências sobre um regime democrático. [...] É preciso que se extirpe
das relações sociais qualquer vestígio autoritário. É indispensável que

E l a i n e R o d r i g u e s 113
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

os conceitos democráticos venham à tona e as pessoas o pratiquem


para assimilá-lo em profundidade. Na escola, é preciso aprofundar
o relacionamento democrático entre os diversos segmentos sociais
que ali se fazem presentes. A retomada da democracia em nossos
corações e mentes, é na verdade, prolongado processo educativo e de
experimentação. [...] Se conseguirmos, na prática cotidiana, realizar estas
tarefas, estaremos prestando inestimável contribuição ao futuro deste
País (PARANÁ, 1985b, p. 3).

Acreditava-se na força das mudanças políticas que o país


vivenciava, falava-se em não mais servir a um projeto tecnocrático
de Educação, mas em se desenvolver, na contrapartida, um projeto
democrático a partir do qual as elites sociais não mais fossem
privilegiadas. Categoricamente, publicava-se: “[...] o problema
é político” (PARANÁ, 1983a, p. 1) e, nessa lógica de raciocínio,
complementava-se: “Se o problema básico é político, a solução
obviamente será política” (PARANÁ, 1983a, p. 1).

O pressuposto de que a solução dos problemas passava por


uma questão política também se colocava como princípio para
a discussão e proposição de possíveis resoluções das situações
educacionais. Outra série de fatores, entre os quais se destacava
a organização política dos segmentos sociais da escola, de sua
afirmação social e política dentro e fora do limite escolar, também
faria parte desse contexto. Acreditava-se que as ações no plano
político poderiam atingir a matriz do sistema educacional, da
qual se obteria, ou desencadearia, necessidades que levariam
à mudança, sempre em termos qualitativos. Insistentemente,
os princípios do projeto democrático para a Educação foram
reafirmados, demonstrando-se o caminho para a sua viabilização.
Essa era a pretensão!

Opor-se à tecnocracia era um projeto caracterizado como


desafiador. O argumento se construía por oposição. Se as sequelas
do autoritarismo faziam com que seus cidadãos configurassem um
114 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

contingente de profissionais e de educandos apáticos, medrosos e


sem iniciativa para agir, o novo projeto seria A semente de uma nova
sociedade, e ela germinaria se o terreno fosse adubado com liberdade,
o que geraria criatividade e iniciativa. Ousadia para mudar, esse era
o objetivo.

Pressionadas pela prática tecnocrática, as pessoas, segundo


os editores do jornal, pareciam cheias de medo e insegurança. O
sentimento de impotência e, até mesmo, o desinteresse diante das
exigências de uma dinâmica democrática era o grande obstáculo a ser
enfrentado. Vencer os entraves causados pela vivência e manutenção
de uma cultura tecnocrática, vencer o reino da apatia, da ausência
de capacidade crítica, da pobreza de ideias, da covardia intelectual,
enfrentar as profundas sequelas deixadas pelo autoritarismo eram
desafios inerentes a um projeto democrático (PARANÁ, 1984e, p.
3).

Para que a democracia encontrasse possibilidades reais de


implantação e o projeto democrático se viabilizasse, exigiam-
se liberdade, iniciativa e criatividade para mudar e coragem
para avançar. Isso era indispensável para que se rompesse
o comportamento burocrático. E valia para todos os que
participavam da comunidade escolar. A escola não poderia ser
a mesma.

Imputava-se à escola um caráter salvacionista. Entendia-se


que a batalha contra a tecnocracia autoritária tinha, na escola,
um espaço de relevância ou, nos termos dos editoriais do jornal,
um palco da maior importância. O indivíduo era conclamado a
assumir, ‘conscientemente, a efetiva liberdade para criar e agir’. O
chamamento acerca da responsabilidade de cada um no processo
de construção democrática foi, mais uma vez, reafirmado: “a
democracia é uma conquista e um processo. Conquista porque
E l a i n e R o d r i g u e s 115
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

ninguém a recebe de graça; é preciso lutar por ela. Processo,


porque não vem pronta e acabada; urge construí-la” (PARANÁ,
1984e, p. 3). Esse espírito de emulação estava presente também
nas imagens que ilustravam as divulgações feitas pela SEED.

Fonte: Paraná (1984e, p. 3)

‘Estamos plantando a semente de uma nova sociedade’,


frase de impacto, em tempos finais do regime ditatorial, que
estava em destaque na imagem que nos permite ver homens
trabalhando em uma construção, fazendo alusão à democracia
como construção.

O esforço para a criação de um universo coletivo em prol


da democratização exigia da SEED, idealizadora do projeto, a
descoberta de meios que funcionassem como estímulo para que
os envolvidos no processo educacional tomassem consciência de
suas responsabilidades como agentes sociais. Os recursos para
se chegar à conquista democrática poderiam ser inventados,
116 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

mas o caminho para essa jornada baseava-se na manutenção da


esperança. O terreno da esperança era fértil porque envolvia
crenças e desejos.

Foucault (1987, 2004) afirma, quando trata da


governamentalidade, que a população é o objetivo final do
governo e explica que ela aparece como sujeito de necessidade,
de aspirações, mas também como objeto porque é inconsciente em
relação àquilo que se quer que ela faça. Os interesses individuais ou
gerais constituem o alvo e o instrumento fundamental do governo
da população (FOUCAULT, 1987, 2004).

A poesia, forma artística de comunicação, também foi utilizada


com meio de convencimento da população. A finalidade era manter
um discurso que trouxesse o revigoramento da esperança. Com
estímulos renovados, os membros da comunidade educacional não
desistiriam da árdua tarefa de construírem uma nova sociedade,
apesar da dura e difícil caminhada, de o caminho ser estreito e
coberto de neblina, de não se conseguir ver direito o que estaria à
frente (PARANÁ, 1985c).

PARA REFLETIR
‘Eu quero, quero,
quero ouvir a voz do povo
Todo povo tem boca pra falar
Inda tem gente aí que se faz de mudo
Fica num canto calado
e não se mexe do lugar’
(de um canto popular)
Com fé e muita coragem,
Prosseguiu-se a caminhada.
Tombando as pedras pesadas
Que têm no meio da estrada,
Vimos que a força da luta
Tá no gesto de mão dadas.
Continuando o trabalho
Com muita perseverança,
Numa marcha muito lenta.

E l a i n e R o d r i g u e s 117
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Mas o povo não se cansa


Celebrando os sofrimentos
Na força da esperança’.
(PARANÁ, 1985c, p. 7).

O conteúdo da poesia está calcado no mesmo princípio que


regia os editoriais e também os artigos, a sensibilização do indivíduo
com o intuito de despertar sua capacidade de ser crítico, de ser
agente, de ser responsável por seu destino e, portanto, ser capaz de
modificar seu quotidiano intermediado por suas ações. O pedido
era para que o espírito da transição democrática, que requeria uma
escola libertadora, que despertasse a autoconfiança, estimulando o
senso crítico, tomasse corpo e forma.

Os diretores de escolas, então eleitos pelo voto direto,


assumiam como responsabilidade as metas que eram: a recuperação
do que se compreendia por legítimo papel da escola, a formação
de brasileiros sujeitos de sua história, conscientes e responsáveis,
alertas para o dinamismo social. O que se efetivaria com a ajuda
de instrumentos que possibilitassem à comunidade escolar obter
essa consciência, e a comunicação seria a pedra angular nesse
fazer. Uma maquinaria de um poder furtivo (FOUCAULT, 1987,
p. 168).

Pressupondo o quão dificultoso era o caminho para a


construção de uma nova, porque democrática, sociedade, a SEED
reforçava seu compromisso com a democratização, afirmando
que duas ferramentas eram indispensáveis para esse fazer, a
educação e a política, e que o ‘facão’ para a abertura do caminho
era a participação popular. A educação seria o viés pelo qual se
adquiriria conhecimento: “sem a foice da educação, o povo não tem
conhecimento para cobrar da sociedade aquilo que é seu direito”
(PARANÁ, 1985d, p. 7). E a política?
118 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

[...] não se deve ter medo de entrar na política, a ação política é o machado
que derruba as grandes árvores que impedem a caminhada do povo. Ela
é a grande arma que temos para poder construir uma sociedade justa.
Alguns podem usá-la para explorar o povo, quando este é ignorante
e não está organizado. A ação política boa é tudo aquilo que fazemos
para nos organizar na justiça e para criarmos um novo relacionamento
entre as pessoas e os grupos. Ação política boa é quando nos unimos
para defender a nossa vida e os nossos direitos contra os mentirosos
e os exploradores, através das várias formas de organização popular
(PARANÁ, 1985d, p. 7).

Perguntas, tais como, o que devemos fazer para melhorar a


nossa participação? Existe preconceito contra a política entre nós?
Como temos participado da política? A nossa escola tem sido
ferramenta para plantar a semente de uma nova sociedade? O que é
preciso fazer para que ela seja o ensaio e o espelho da sociedade que
queremos?, acompanhavam as matérias do jornal e apresentavam
o mesmo intuito da poesia citada, o propiciar de uma reflexão
dirigida.

O chamamento para se refletir trazia consigo o recado da


responsabilidade que os homens daquela década, segundo as
diretrizes políticas propostas pela SEED, deveriam assumir. A
bandeira da participação havia sido desfraldada, era necessário que
se consolidasse como prática, essa seria uma resposta às necessidades
de informação e aprendizagem.

Lutava-se para que a comunidade educacional aprendesse


a reivindicar que as regras do jogo educacional fossem públicas e
a comunicação era evidenciada como a grande arma. Uma escola
democrática precisava contar com uma comunidade capaz de fazer
críticas e sugerir saídas. Inclusive os não-letrados deveriam ser
conclamados a contribuir não apenas com o bom-senso para ensinar
verdades como também exercer o direito e o dever de buscar, na
escola, respostas para os seus problemas (PARANÁ, 1985f).
E l a i n e R o d r i g u e s 119
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Os problemas reais e cotidianos que revelava a maioria da


população educacional advinham de impasses sociais, políticos
e econômicos vividos do país. A SEED declarava que fugir do
enfrentamento significava confirmar a ideia de que a educação
e a escola não passavam de formalidades, e o esforço era o de
rompimento com essa verdade.

Romper com a realidade tecnocrática passava, por oposição,


pela negação de uma imposição político-pedagógica, de uma
estrutura administrativa não discutida, de uma linguagem e um
saber que corresponderiam à ideologia herdada do autoritarismo.
Era fundamental considerar os valores e as atribuições das maiorias,
eles deveriam ser fatores de desestruturação e desintegração de uma
cultura tecnicista, antes absorvida e disseminada pela escola. Nessa
escola, o futuro cidadão aprendia a se calar, a se autodesvalorizar,
submetendo-se a um sistema social que negava suas realizações,
valores, aspirações, dificuldades e direitos.

A perspectiva de uma transição democrática requeria uma


escola libertadora, que resgatasse o sentido de autoconfiança e da
iniciativa, estimulando o senso crítico e a superação do fatalismo
por intermédio do pensamento científico, respeitando a criança
e sua família, com suas vivências e problemas, não alimentando
privilégios. A cultura do aluno e a da comunidade seriam o suporte
para a definição pedagógica, abrindo espaço para o mundo do
trabalho, o mundo das maiorias, para as quais se pretendia estar
atuando.

Reforçando a importância de sua principal arma de luta, a


comunicação, a SEED entrava em seu quarto ano administrativo
e, com ela, o Jornal da Educação, com a mesma disposição que fora
criado, estando aberto a todos quantos se dispusessem a contribuir de
forma crítica, séria, preocupada, especialmente com a circulação de
120 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

ideias, pressuposto básico para o processo educativo e democrático.


Isso não seria bom apenas para os jornalistas que compunham o corpo
editorial, mas para todos aqueles que, ensinando ou aprendendo, enfim,
relacionando-se, dedicavam “[...] suas energias e seus sonhos em favor
de uma sociedade livre e justa neste grande e amado país” (PARANÁ,
1985f, p. 3).

A Secretaria de Educação assumiu o desafio de levar o


homem a compreender-se e comportar-se como agente da História,
como um ser capaz, consciente de suas responsabilidades e de
seus direitos como cidadão. A viabilização solicitou a invenção
de meios, e o ato de comunicar-se foi comparado a um feito
revolucionário.

As intenções da Secretaria de Educação para com o ensino


de primeiro grau não foram modestas, ela pretendia mudar todo o
ensino no Paraná e intencionava fazê-lo em todos os aspectos, desde
o administrativo, passando pelo didático, até atingir o conteúdo. O
projeto era o de uma escola revolucionária, uma escola que primasse
pela importância do que se estava ensinando, pois a premissa que
norteava todas as ações era a de que a educação era um direito de
todos. Colocar todos na escola, sem perder a qualidade, seria o
ponto essencial para a alteração definitiva das condições estruturais
da sociedade.

A escola foi, no início da década de 1980, entendida como um


organismo de mudança social, por isso, precisava formar cidadãos,
que, nessa ótica, seriam comprometidos com a construção contínua
de uma sociedade que se democratizava.

Até que ponto esse discurso, que se baseava na liberdade


de ação, no compromisso político do educador, constituía-se em
atendimento às demandas da comunidade escolar? E, ainda, uma
E l a i n e R o d r i g u e s 121
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

terceira questão: o conteúdo desse jornal chegava à escola na


forma de um parâmetro de discussão dos problemas cotidianos
ou como material oficial da Secretaria e, por sua oficialidade,
assumiria junto a seus leitores o caráter de ordenador do trabalho
pedagógico?

Iniciaremos nossa tentativa de resposta a esses nossos


questionamentos pela última das indagações. Defendemos a
ideia de que o conteúdo do jornal chegava à escola como um
meio ordenador do trabalho. Assim o fazemos, tomando alguns
exemplos em nossa defesa. A Semana Pedagógica, item que
discutiremos mais detalhadamente nas páginas seguintes,
adentrou as escolas com nada menos do que roteiro para discussão,
texto básico a ser discutido, perguntas para reflexão, condições
listadas e entendidas como pré-requisitos humanos para que o
evento fosse produtivo etc. Essa prática demonstra a direção que
a SEED impunha à escola. A participação era exigida, na forma
do ‘pedido’ e do ‘estímulo’.

As duas primeiras questões nos levam a afirmar que o


educador, segundo a lógica do discurso da SEED, deveria se
pensar um agente de transformação social, mas o modelo de escola
do qual efetivamente participava pouco ou nada havia mudado
em relação ao que antecedia os governos eleitos pelo voto direto.
Assim, a comunidade envolvida no processo educativo vivenciava
a contradição presente na contramão do discurso oficial. Dito de
outra forma, a responsabilidade imputada à comunidade pelo
conteúdo argumentativo do jornal era a de conscientizar-se, a de
ser um cidadão corresponsável pela construção da democracia
no Paraná e, partindo de sua construída consciência, reverter
os novos princípios político-pedagógicos em ações. Mais uma
vez o discurso oficial decidia a forma e o conteúdo do processo
educacional. “São as táticas de governo que permitem definir a
122 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

cada instante o que deve ou não competir ao Estado, o que é


público ou privado, o que é ou não estatal, etc” (FOUCAULT,
2004, p. 292).

As eleições diretas para diretores escolares funcionaram


como uma prática sem-número, compreendidas como menores,
quase inexpressivas porque não criavam grande impacto, no
momento em que aconteciam, no entanto, estavam sempre
presentes porque eram divulgadoras de um conjunto de ideias
que possuíam dupla característica, a do poder, ora minúsculo,
ora majoritário, e a organização de espaços e linguagens, parte
de uma formação disciplinar contemporânea que colonizava as
instituições, dentre elas, a escolar, lentamente, por procedimentos,
extremamente visíveis, mas absolutamente silenciosos
(CERTEAU, 2012, p. 109).

2.2 Cidadão ou Agente Transformador, quem era o aluno?

Uma estratégia de ação que merece destaque foi a publicação


do GIBI do Grêmio Livre, porque denotava com maior ênfase
o princípio libertário que era assumido pela Secretaria de
Estado da Educação do Paraná (SEED) como fomentador das
discussões propostas no campo educativo quando o assunto era
a formação do aluno. Mas quem era o aluno? Cidadão ou agente
transformador?

Construa seu grêmio livre é a frase de capa de um gibi criado no


ano de 198513, por iniciativa do Estado do Paraná em parceria com

13 Um outro número do GIBI foi publicado no ano de 1994 – Arte e texto são de Bernardo
Joffily, também autor da edição de 1985.

E l a i n e R o d r i g u e s 123
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES). Por meio


de uma narrativa visual e textual, objetivava estimular no estudante
secundarista a necessidade de vivenciar a experiência de acesso a
um grêmio estudantil.

Os grêmios estudantis existiram ou coexistiram com o


período ditatorial militar no Brasil. No ano de 1968 foram extintos
pelo Decreto-lei - AI-5 – Ato Institucional nº 5, publicado em maio
do ano supracitado. A substituição se deu por meio da criação dos
Centros Cívicos. Entre as propostas do grêmio estudantil e dos
centros cívicos existem importantes diferenças nas bases de suas
formulações.

Os grêmios foram resultado da luta dos estudantes por


maior liberdade, da consciência política que o aluno secundarista
adquiria a partir da vivência que as contradições presentes no
regime militar proporcionavam. Na base de constituição dos
Centros Cívicos estava a ideia de culto à Pátria, de valorização
de símbolos e signos ‘patrioticamente’ escolhidos para figurar
na memória do estudante. O fim das agremiações estudantis
significou o aprendizado do ‘silêncio’ para toda uma geração.
Resgatar o direito a ter direitos era uma das finalidades que
podemos depreender da proposta que está descrita pelo gibi. A
atitude da Secretaria de Educação, ao criar o Gibi, é um exemplo
de invenção de um tempo, de reforço para uma memória histórica,
nesse caso, pretensamente, democrática.

O impresso, como imagem sintética, agregava informações


ao utilizar elementos comuns, como os esteriótipos – expressões
corporais, cores e foi utilizado, no Paraná, na década de 1980, como
instrumento pedagógico, como meio para se atingir o objetivo de
politizar o aluno, o cidadão do futuro. A forma de um gibi, muito
simpática, atingia todos e trazia, implícita ou explicitamente, um
124 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

conteúdo eminentemente doutrinário. Sua composição pretendia


comunicar, por meio de aproximações, os objetivos que moviam a
SEED.

A capa do documento era bastante colorida, as cores azul,


branco e verde eram predominantes, essas também são as cores da
nossa Bandeira Nacional, reforçando uma memória histórica, espírito
de um tempo. Ao fundo, visualiza-se uma escola, seu formato era o
de uma construção antiga, existiam muitas árvores à sua volta, o que
nos faz pensar em um lugar tranquilo, facilitador da convivência
harmônica e democrática. As estratégias de composição das imagens
revelam o uso de cores como códigos. Cada elemento iconográfico se
destaca por sua cor, pelas analogias que elas permitem. Silva (2011)
afirma que a capa é legível porque comunica, porque aproveita
modelos prévios, comuns de entendimento, contribuindo para o
seu reforço.

Adolescentes felizes - o destaque da capa de 1985! -


representavam, marcadamente, diferenças! Físicas: louros,
morenos, gordos, magros, baixos, altos; raciais: negros, brancos.
À esquerda, o estudante segura uma bandeira tecida em azul, ao
centro o mapa do Brasil e a legenda da UBES atravessando todo o
território nacional. Uma forma de dizer: o Brasil é dos estudantes!
Um deles segura uma colher de pedreiro na mão direita, à sua
frente existe uma mureta em construção e sobre ela uma garota
oriental, com as mãos levantadas ao alto e unidas, seu semblante
é de felicidade. Os outros reproduzem a mesma ideia, fazendo
gestos que simbolizam vitória e união de todos em prol de uma
conquista, nesse caso, democrática! É o que Moles (1987, p. 44)
denomina um estímulo forte, o que tem o poder e a função de
reter a atenção, de fisgar o leitor num anzol.
E l a i n e R o d r i g u e s 125
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Figura 1 - Capa de 1985.


Fonte: Paraná, 1985, p. I.

126 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

Figura 2 - Capa de 1994.


Fonte: Paraná, 1994, p. I.

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A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Figura 3 - Miolo do Gibi Construa seu Grêmio Livre (1).


Fonte: Paraná, 1985.

128 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

Figura 4 - Miolo do Gibi Construa seu Grêmio Livre (2).


Fonte: Paraná, 1985.

E l a i n e R o d r i g u e s 129
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Figura 5 - Miolo do Gibi Construa seu Grêmio Livre (3).


Fonte: Paraná, 1985.

130 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

Figura 6 - Miolo do Gibi Construa seu Grêmio Livre (4).


Fonte: Paraná, 1985.

E l a i n e R o d r i g u e s 131
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Figura 7 - Miolo do Gibi Construa seu Grêmio Livre (5).


Fonte: Paraná, 1985.

132 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

Figura 8 - Miolo do Gibi Construa seu Grêmio Livre (6).


Fonte: Paraná, 1985.

E l a i n e R o d r i g u e s 133
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Figura 9 - Miolo do Gibi Construa seu Grêmio Livre (7).


Fonte: Paraná, 1985.

134 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

Nas palavras do redator e capista, Bernardo Joffily14, a


primeira versão do gibi foi assim produzida: “[...] o roteiro, texto e
arte saíram de uma só esticada - o feriadão de natal – Ano novo de
1985/1986. Os recursos eram limitados, sem possibilidade de cor no
miolo, exceto o preto e o azul” (PARANÁ, 1994, p. II).

Registremos: uma edição confeccionada, quase artesanalmente,


à base de penas, pincéis, papel, tinta látex e acetato para a capa. O
formato, 21 X 27 cm. Sobre a tiragem, afirma Joffily “[...] foram várias
edições dessa versão pioneira. Porém as edições se esgotaram, ao
fim de certo tempo, o Gibi virou raridade. A galera passou a apelar
até para as cópias de xérox” (PARANÁ, 1994, p. II, grifo nosso).

O gibi publicava, no verso de sua capa e em sua contracapa,


o posicionamento de três importantes nomes envolvidos na sua
criação. Interessante observar que os depoimentos eram ilustrados
com fotos dos depoentes. O texto verbal consagrado como forma
prioritária de expressão, ocidental e moderna, era retomado como
protagonista.

O primeiro texto é da Secretária de Educação da época, Gilda


Poli Rocha Loures. Ela iniciava sua argumentação, destacando a ideia
de que a organização livre dos estudantes resgataria o sentido político
da educação. Estimular formas para que a participação democrática
de todos os segmentos da comunidade escolar acontecesse seria
uma prerrogativa sua e do governo que representava. Afirmava que
a participação dos estudantes organizados livremente nos grêmios
estudantis constituía-se em fator de fundamental importância na
transformação da escola em instrumento eficiente de exercício para a

14 Bernardo Joffily é um brasileiro, jornalista, e exercia à época da produção do GIBI do


Grêmio Livre o cargo de chefe de redação do semanário Tribuna da Luta Operária, circulou de
1979 a 1988 e é entendido, hoje, como um lugar de memória.

E l a i n e R o d r i g u e s 135
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

aquisição da cidadania e transmissão de conhecimentos socialmente


acumulados. O discurso enfatizava a transformação social como
bandeira a ser assumida pela educação. A escola, conclamada
como espaço de criação das condições necessárias ao exercício da
cidadania e ao conhecimento socialmente acumulado, configurava
o alicerce para a construção democrática (PARANÁ, 1985, p. 11).

A Secretária rememorava, em seu depoimento, um pouco


da história brasileira e declarava que ela teria sido “[...] vivamente
marcada pela participação vibrante e ardorosa dos jovens”
(PARANÁ, 1985, p. 11). A frase denota a intenção de que o feito
se repetisse. Parece-nos intrigante que a Secretaria de Educação do
Estado trouxesse para si a tarefa de ensinar a viver democraticamente.
Formar cidadãos capazes de atuar em prol da democracia era algo
que os dirigentes educacionais declaravam priorizar, acreditando
poder inventar esse novo homem e nele despertar a vontade de
mudar politicamente os rumos da nação.

Segundo o Governador do Estado, José Richa – 1982 a 1985:

AS ENTIDADES ESTUDANTIS AJUDAM A FORTALECER A


DEMOCRACIA. A democratização do poder pela participação da
comunidade organizada tem sido uma diretriz fundamental do nosso
Governo. No setor educacional, além da democratização na escolha dos
dirigentes escolares, através de eleições diretas, dois instrumentos têm
sido eficazmente utilizados com importantes reflexos para a educação
escolar: a organização livre de associações de pais e mestres e a organização
dos grêmios estudantis. Não existe avanço social sem o crescimento
político. As entidades estudantis – nas quais militei quando estudante
e onde assimilei os fundamentos da minha formação política – são
instrumentos valiosos no crescimento político dos jovens. Representam
o espaço democrático da participação crítica e consciente, significativo
aprendizado de civismo, via indispensável para o fortalecimento de uma
democracia estável em nosso país (PARANÁ, 1985, p. II).

A crença professada, por esse depoimento político, era a


de que os jovens organizados nos grêmios poderiam, a despeito
136 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

de forças retrógradas, presentes no arbitrário autoritarismo,


lutar por estar à frente de movimentos políticos em prol das
transformações sociais. A liberdade, uma bandeira de luta
na década de 1960, até meados dos anos 1980, figurava nos
discursos políticos, intelectuais, educativos como uma conquista
a ser realizada para que o direito, no caso dos estudantes, de
expressar seu posicionamento diante dos acontecimentos fosse
preservado ou, ao menos, respeitado (PARANÁ, 1985). Tal
questão estava representada no universo social e cultural dos
jovens. A música, o teatro, o cinema nacional, apesar de sua
produção estar vinculada à Embrafilmes e ser retalhada pela
censura, ainda assim, traduziam-se como espaço de resistência
aos desmandos do autoritarismo. Esse conteúdo fazia parte da
formação do jovem estudante no período militar.

Na década de 1980, o sentido de uma organização estudantil


que registrasse a palavra livre como princípio não figurava no
vocabulário dos secundaristas. A criação do gibi objetivava, segundo
seus idealizadores, um esforço na direção da politização do jovem
paranaense. As mensagens visuais ou verbais tinham algo a dizer
sobre nós mesmos, sobre como éramos, como pensávamos ou como
deveríamos pensar. Havia um sujeito ideal a ser alcançado, a ser
formado. Um alguém a priori constituído, com a responsabilidade
de ser o futuro da nação.

A almejada democracia dependia da formação de um ser


idealmente criado para protagonizar o futuro do país. O meio para
se conquistar esse fim? A educação. Normalizadora, conformadora
de um homem movido por sua razão conscientizada, capaz de
intervir em seu meio social. A transformação social dar-se-ia pelo
bom uso da razão e pela capacidade humana de aplicá-la em favor
do bem comum. A utilização dessas estratégias, constituintes
do denominado sujeito-crítico, ancorava-se na “[...] própria
E l a i n e R o d r i g u e s 137
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

noção moderna, iluminista, segundo a qual existe um sujeito


transcedental a ser ‘alcançado’ pela prática de uma razão crítica,
pela conscientização” (VEIGA-NETO, 2003, p. 96).

Todo o esforço governamental para que a transição democrática


se efetivasse fazia com que o jovem entendesse liberdade como
oferecimento, e aquilo que nos é dado, mesmo que aparentemente,
não precisa ser conquistado. Segundo esse documento, os jovens se
movimentaram para que o grêmio voltasse a existir, mas não havia
uma conotação política nessa atitude. A intencionalidade política foi
imputada ao fato. O fato – recriação dos grêmios estudantis – não
foi desencadeado por um ideal político-estudantil. Os dirigentes
educacionais é que o transformaram em algo feito em prol da vivência
política, em favor da formação crítica do cidadão ou, ainda, como
resultado dela. Esse feito amparou-se na propagação de discursos
visuais e verbais, transmitidos pela imprensa pedagógica oficial.

Segundo o texto que acompanha o gibi, a existência de um


grêmio ‘ajudava em quase tudo’, na organização de ‘festas’, no
‘esporte’, na ‘cultura’. Também havia o registro de que ele poderia
ser uma ‘forma de representação’ dos alunos, por meio dele
se poderia ‘trabalhar para melhorar a escola’, ‘ficar de olho no
mundo’, batalhando para ‘transformá-lo’, e terminava-se o roteiro
com palavras de ordem habitualmente utilizadas nos movimentos
sociais da década de 1970: “o grêmio somos nós, a nossa força, a
nossa voz!” (PARANÁ, 1985, p. 3).

O caráter de um grêmio é reforçado em todo o texto visual


e verbal que compõe o gibi, exploravam-se suas possibilidades de
atuação, afirmava-se:

Um grêmio pode fazer um monte de coisas: Torneios de futebol,


Cineclube, Festival de música, Excursões, Bailinhos, Biblioteca, e o
principal: o grêmio nos une para defender os direitos e os interesses dos

138 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

alunos. É uma ferramenta e também uma boa! (PARANÁ, 1985, p. 4,


grifo nosso).

A redação era um convite ao fazer, um estímulo. A Presidenta


da UBES15 posicionava-se com um discurso que não destoava da
argumentação que a Secretária de Educação defendia. De maneira
bastante partidária, ela iniciou seu depoimento, denominando seus
colegas como companheiros. Fez alusão à lei que garantia o retorno
dos grêmios estudantis como uma conquista, como a consolidação
de um sonho, pelo qual, segundo ela, apesar de uma primeira
conquista, ainda era hora de batalhar, saindo em campo para
construir, em todos os lugares do país, os grêmios.

Sobre a especificidade do gibi, a Presidenta da UBES


tomava como verdade a noção de que ele havia sido elaborado
com o intuito de estimular o debate em cada escola. Defendia
as questões por ele abordadas e suas certezas ancoravam-se na
crença de que o conteúdo que ele trazia estava na ordem do dia:
como vamos construir o Grêmio? Por que vamos construí-lo?
Qual o papel do Grêmio na escola? etc. Falava de sua alegria em
participar da campanha de reconstrução dos grêmios e declarava
seu desejo propondo que

[...] a juventude continue na luta por um Brasil livre, soberano e com


uma educação voltada para os interesses de nosso povo. Vamos sacudir
o Brasil, organizando atividades esportivas, debates de cultura, sobre
Constituinte e principalmente discutiremos a escola que queremos.
Com eleições diretas para diretores, com redução das mensalidades nas
escolas pagas, com ampliação de vagas nas públicas, enfim queremos
melhoria na qualidade de ensino, com isto estaremos construindo a nova
escola e um novo país (PARANÁ, 1985, p. X).

15 Presidenta da UBES – União Brasileira dos Estudantes Secundarista – Selma de


Oliveira.

E l a i n e R o d r i g u e s 139
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Nos três depoimentos, temos a fala da Secretária de


Educação, do Sr. Governador de Estado e da aluna presidenta
da UBES, e a interação entre suas falas é perceptível. Eles
apresentavam um objetivo comum: alicerçar o processo
democrático que o país vivenciava para, e por consequência,
construir uma educação diferenciada. Obviamente, uma educação
que se diferenciasse pela qualidade e ajudasse no fazer de uma
nação qualitativamente avançada, politicamente engrandecida.
Ideais que não se sustentaram, ainda que fossem mantidos
por meio de palavras e imagens que caracterizavam a força do
argumento político.

Cabe aqui lembar Scheffler (1974), considerando que os slogans


possibilitam a criação de símbolos que permitem a unificação das
ideias e atitudes nos movimentos educacionais, ao mesmo tempo,
reforçam a confiança e firmeza dos veteranos e atraem novos
adeptos. Aproximam-se, por assim dizer, dos princípios e slogans
religiosos.

Sob o slogan, FAÇAM VOCÊS MESMOS, outra parte da


narrativa, contada pelo gibi, aquele conclamava os alunos a criarem
um grêmio forte. A base para isso seria o nascimento da instituição
a partir da luta e da participação de todo o pessoal da escola. O
texto afirmava:

Agora, ficou fácil formar o grêmio da sua escola. Quem participa? Todo
mundo!!! Quem decide são os estudantes!!! Todos à assembléia geral!!
Terça-feira às 8 horas no auditório. O Grêmio é nosso!!! A assembléia
marca também a eleição para a diretoria do grêmio. Na eleição qualquer
aluno tem o direito a se candidatar... E todos são eleitores... com a
diretoria eleita, o grêmio está pronto para funcionar. O grêmio é Livre
por isso: só se submete à vontade soberana dos estudantes que ele
representa. ‘A UNIÃO FAZ A FORÇA. Os grêmios estudantis são a base
de todo o movimento secundarista, das uniões municipais, estudantis e
da UBES, criem logo um na escola de vocês! Todos juntos somos mais
fortes!’ (PARANÁ, 1985, p. 7).

140 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

Paralelamente à publicação do gibi, o Jornal da Educação


editava:

QUEM TEM MEDO DA POLÍTICA ESTUDANTIL? [...] como poderão


os nossos jovens estudantes preparar-se para o exercício da cidadania
plena e responsável, senão através da prática política que significa,
fundamentalmente, consciência de um projeto de construção de uma
nova sociedade? Impedir a participação política dos jovens, temer seus
movimentos de organização é castrar a vitalidade cívica de todo o povo
(PARANÁ, 1986b, p. 6).

O conteúdo desse editorial somava esforços para a realização


da tarefa de politizar o aluno, visando à formação do cidadão do
futuro, aquele que, de posse de uma consciência mais criticamente
constituída, defenderia o projeto de uma democrática e, por isso,
nova sociedade. Não se tratava, nesse documento, de se estimular
a geração para novos significados, ao contrário, explorava-se o que
se conseguira forjar de vocabulário, visual e textual, comum em um
longo tempo-realidade-história.

2.3 DIA D – Debate Nacional Sobre Educação E Escola

O Dia D foi mais uma estratégia utilizada pela SEED na


tentativa de formar cidadãos comprometidos com seu meio
social, foi a participação do Paraná no denominado Dia D –
Debate Nacional sobre Educação e Escola na constituição da
democracia. Entendendo-se que melhorar o meio social do qual
se fazia parte, nesse período, significava somar esforços em prol
da democratização.

O denominado Dia D, Dia do Debate Nacional sobre Educação


e Escola, ocorreu em 18 de setembro de 1985. A estratégia pretendia
que, nesse dia, o país parasse para discutir educação. O Paraná não
E l a i n e R o d r i g u e s 141
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

esteve alheio a esse acontecimento e, por estímulo e patrocínio da


SEED, planejou formas de participação.

O Jornal da Educação posicionava-se positivamente em relação


ao Dia D e pedia que seu leitor refletisse. Estimulava essa ação com
mensagens que falavam em união do povo, garantindo que lutar era
preciso e que não se poderia fazê-lo sozinho, que os companheiros
eram muitos e que deveriam estar juntos na caminhada e, novamente,
depositavam-se esperanças na construção de uma sociedade mais
justa e fraterna.

As manchetes do Jornal da Educação reforçavam ideias como


‘O Brasil está sendo chamado para debater a Educação’, ‘O Brasil
vive um momento de grande esperança’. Nesse clima, verbalmente
caracterizado como positivo, o Dia D foi preparado. Algumas táticas
foram utilizadas para que o Dia D transcorresse com sucesso.

Discussões em grupo foram propostas com base nos seguintes


questionamentos: quais os principais problemas e dificuldades
da nossa escola? O que é que nós – pais, professores, alunos,
funcionários – podemos fazer para tornar a escola mais voltada
para o povo? Que mudanças devem ser introduzidas para que a
escola ajude a nossa libertação e o nosso crescimento como pessoas?
Quais sugestões enviar para que as autoridades governamentais nos
ajudem a construir uma escola nova, a escola para a mudança?

Os questionamentos pretendiam que o Dia D fosse um


momento marcante para a comunidade. A SEED esmerava-se
em seu discurso, reforçando, insistentemente a importância da
participação da comunidade nas discussões. Esse motivo figurava
como uma premissa para o Dia D ser bem preparado.

Antecipadamente ao acontecimento denominado Dia D,


foram enviadas ‘tarefas’ para serem cumpridas para as escolas
142 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

pela Secreatira. Propunha reuniões para se debater as expectativas


que permeavam o surgimento de uma escola nova; segundo os
organizadores do evento, o engajamento político, da comunidade
educacional, aconteceria como efeito da conscientização surgida
por intermédio das discussões realizadas, das palestras proferidas,
do convívio entre pares.

A promoção de discussões, exposições, manifestações


visavam à conscientização de todas as pessoas com relação à
importância de uma educação para todos. Os resultados das
discussões deveriam transformar-se num documento, por meio
do qual, o compromisso assumido pela comunidade escolar
paranaense se desdobrasse em sugestões a serem enviadas
ao Governo Federal. Isso realmente se efetivou. O documento
resultante desse dia foi discutido no Conselho dos Secretários
Estaduais de Educação (CONSED) e apreciado juntamente com
planos advindos de outros Estados nacionais.

Como parte das tarefas, os grupos de discussão deveriam


apresentar um documento que contemplasse sugestões acerca
de preocupações com os principais problemas da educação e
da escola que se conheciam, intenções de interferências acerca
das decisões que a comunidade local viesse a tomar quando
envolvida nesse pedido de reflexões e encaminhamentos para
uma nova escola.

Importante era, ainda, reiterar, junto aos pais, alunos e


professores, a noção do dever, do compromisso que assumiam no
intuito de valorização da escola como semente de um futuro novo. A
SEED elaborou e enviou para as escolas subsídios para a discussão
com a comunidade educativa. Esses subsídios, juntamente com um
texto-base, apresentavam-se como facilitadores na preparação do
Dia D.
E l a i n e R o d r i g u e s 143
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

As aulas, as discussões com os pais, as reuniões realizadas entre


os professores estavam carregadas de expectativas, depositavam-se
esperanças, vislumbravam-se possibilidades de mudança, era um
momento de mobilização nacional. O Dia D deveria ser preparado
por meio de uma série de debates e atividades com o objetivo de
repensar a escola: fazer um exame de consciência de como ela
estava e pensar em atitudes novas. Alguns ‘atores’, componentes
do cenário escolar, eram considerados fundamentais.

O Diretor, segundo a SEED, era, ou necessitava ser, o


grande ‘animador’ da comunidade educativa. A ele cabia o
papel de incentivador e coordenador da preparação do Dia D:
mais responsabilidade assumida pelo diretor, mais frutífera
a discussão. O discurso ‘cartesianamente’ propunha uma ação
operacional que se desenvolvesse por meio de uma liderança
oficial. Idealmente, sugeria-se que fosse formada uma comissão
que coordenasse todas as atividades, desde a preparação até o
dia de debates. A SEED pedia, por assim dizer, uma preparação,
uma ação que deveria envolver toda a comunidade: escola,
associações, movimentos, igrejas etc.

Com os alunos, o importante seria explorar os temas nas aulas


de Estudos Sociais ou das outras disciplinas, criando um clima de
debate franco e aberto, com respeito e atenção à opinião de todos.
Esse era o ideal a ser atingido com os alunos! Para que tudo ocorresse
da melhor forma, contava-se, também, com o comprometimento
dos professores. Sugeria-se aos alunos que fizessem pesquisas
em jornais, entrevistassem pessoas, confeccionassem cartazes ou
músicas. Sem qualquer constrangimento, a SEED receitava fórmulas
de comportamento e ação.

Registrava como bom que os professores não dessem


nota para as atividades realizadas pelos alunos, justificava-
144 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

se, defendendo o desenvolvimento do gosto e do prazer pelas


discussões, pela pesquisa e pelo debate e, de forma quase
ostensiva, seu discurso finalizava-se. Segundo a SEED, as
escolas deveriam seguir as novas ‘orientações’, avaliando sem
as tradicionais chantagens que se costumavam usar no período
militar, o que viciou alunos e professores.

A forma ostensiva, com que a SEED referenciava a questão


das chantagens, possibilita-nos entender que ela pretendia atacar a
administração exercida pela coerção autoritária presente no recém-
destituído governo militar. Uma maneira mais branda, mas não
menos diretiva. O discurso e as práticas eram promovidos como
inovação, e o que efetivamente se alterou, foi a dinâmica com que
a autoridade governamental passou a ser exercitada, considerando,
para nossa ponderação, os elementos escolhidos pela SEED para a
elaboração de suas estratégias e slogans políticos.

Sem qualquer modificação, seu discurso seguia e pedia


a adaptação dos temas de trabalho à vivência, sendo essa uma
preocupação direcionadora do planejamento de trabalho a ser
desenvolvido com as crianças da 1ª à 4ª série. A saber, as crianças,
desde pequenas, também têm ideias e opiniões sobre a escola e as
aulas, advertia, mais uma vez, a equipe de educação do governo do
Estado.

Os mesmos temas deveriam ser discutidos com os pais


em grupos de debate, enfocando também o papel da família, a
convivência familiar, os conflitos entre pais e filhos, o modo como
educar, a relação da família com a escola. O pedido era que se
considerassem as mudanças que estavam ocorrendo na sociedade
e a responsabilidade dos pais com a educação. Com os alunos das
séries mais adiantadas, sugeria-se que fossem promovidos encontros
com pais e professores.
E l a i n e R o d r i g u e s 145
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Alguns subsídios foram apresentados como fundamentação de


uma dinâmica que se desdobraria em momentos de reflexão durante
o Dia D. Observar a realidade, entendê-la e procurar as causas das
situações percebidas, confrontá-la com os direitos humanos, com o
respeito à vida e à pessoa, com os ideais e valores de uma sociedade
nova e procurar os modos concretos para se começar a transformar
a realidade, na sala de aula, na escola, na família. Ver, avaliar e agir
constituíam etapas. Antes, durante e depois. Aquilo que antecedia
o evento estava posto na obrigação de ver. Durante o Dia D se
avaliaria, por meio de reflexões, o quadro em que a escola estava
inserida. O depois configuraria o novo, o vir a ser que dependia
da ação, mas não de qualquer atitude e sim daquela que se fizesse
como resultado de mudanças ocorridas por conta da conscientização
vivida e permitida pelo Dia D.

Essa dinâmica, pretendida pela SEED, para a realização do Dia


D, primava por um ‘tom’ religioso, mais uma vez, a noção de começo,
meio e fim. O começo se tornaria possível por um desconforto do
indivíduo ou da comunidade, o meio, a conversão se faria real
pela conscientização e comoção e a finalidade se objetivaria nas
mudanças que, daquele período para frente, ocorreriam.

Essa dinâmica se formulava, ainda, por alguns temas/


questionamentos. A escola está nos educando para a liberdade ou
para a submissão? Com esse questionamento, a Secretaria esperava
dirigir a reflexão da comunidade para que ela procurasse ver se a
escola se ajustava à vida dos seus alunos, especialmente daqueles
mais pobres.

O modo de ser da escola, a disciplina imposta, os conteúdos


ministrados, as atividades privilegiadas no cotidiano ajudariam a
formar de fato para a liberdade e a responsabilidade, ou não? Em
que a escola deveria mudar para ser a libertadora das pessoas? Esses
146 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

questionamentos imputavam à escola um papel que não lhe cabia.


A escola não é uma instituição assistencial por definição.

Essa escola libertadora, idealizada pela Secretaria, pautava


seus contornos por uma corrente educacional vinculada à Teologia
da Libertação; um de seus expoentes e idealizadores, Frei Leonardo
Boff16 , era conclamado em chamadas feitas pelo Jornal da Educação, na
tentativa de amparar seu discurso em algo ou alguém que pudesse,
por ser acreditado, exercer autoridade sobre a comunidade escolar.

À escola não cabe o papel de libertar nem aprisionar seus


educandos, não há argumentos que possam, em uma escola de
caráter laico, exercer tão grande influência, por isso o argumento
vinha da fé. O dogma não é questionável! O que era justo ou injusto,
libertador ou aprisionador, certo ou errado continuava a servir de
argumento para, durante o acontecimento do Dia D, pedir a reflexão.
Um Frei era convocado, em suas palavras, a crença na mudança
pela humanização do indivíduo.

É da maior importância que profissionais lúcidos e comprometidos com


a causa da justiça estejam presentes nos grandes órgãos da imprensa
e nas agências de publicidade, cujas atividades exercem poderosa
influência na opinião pública. Não penso que o meio e a mensagem se
confundam. Todavia, é preciso ter sempre a coragem e a dignidade de
pensar pela própria cabeça, vivenciando a liberdade de consciência e
opinião, que sempre reivindicamos como um dos direitos elementares
da nova sociedade justa e fraterna. Podemos ter bons empregos, ótimos
salários, excelentes mordomias e, no entanto, perder a nossa dignidade,
tornando-nos meros oráculos do sistema. Falar o que se pensa e viver

16 “No fundamento da Teologia da Libertação se encontra: o encontro do Senhor no pobre


que hoje é toda uma classe de marginalizados e explorados de nossa sociedade caracterizada
por um capitalismo dependente, associado e excludente. Uma teologia – qualquer que seja –
que não possua em sua base uma experiência espiritual é sem fôlego e tagarelice religiosa [...] é
preciso dizer claro e vigoroso: a libertação é a emancipação social dos oprimidos” (BOFF, 1982,
p. 11) F. L. Da libertação: o teológico das libertações sócio-históricas. Petrópolis, RJ: Vozes, 1982,
p. 11).

E l a i n e R o d r i g u e s 147
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

o que se fala – eis a regra básica de nossa coerência pessoal e do nosso


compromisso com a verdade. (PARANÁ, 1985d, p. 2 grifo nosso).

No segundo tema, a pergunta feita pela Secretaria era: A


escola está nos educando para a fraternidade ou para o egoísmo?
O raciocínio realizado para responder ao questionamento, que,
por sua vez, fora proposto como estímulo à reflexão, iniciava-se
com o verbo parecer – ‘Parece que’, expressão que denota pouca
certeza, uma forma tangencial de posicionar-se, o que se explicaria,
pelo objetivo a ser alcançado com o Dia D. A indagação era sobre
fraternidade, não se poderia pronunciar um discurso sobre esse
tema, emitindo-se opiniões acerca da escola que fossem categóricas
a ponto de serem compreendidas como imposições. A coerção,
quando o princípio anunciado é fraternal, somente pode se dar pela
sedução, pelo convencimento.

Esse empenho da Secretaria em desenvolver uma escola mais


fraterna, menos egoísta, dava-se, porque nos itens do roteiro de
discussão existiam constantes advertências ao caráter competitivo
desenvolvido entre as pessoas, e a escola era entendida como a mais
atuante estimuladora desse comportamento, em suma, não cristão.
Em uma frase de pé de página, publicada no Jornal da Educação
advertia-se o profissional da educação, afirmando-se: “Ao educador
de hoje compete mais que cantar a flor, olhar para o jardineiro que
passa fome e para o florista que é explorado” (PARANÁ, 1986a,
p. 5).

Na mesma linha de construção do discurso sobre as


competências da nova escola, reiterava-se a tese: se quiser, a velha
escola, cheia de vícios, poderá ser instrumento de transformação da
sociedade, para isso será necessário estimular a criação de grupos de
representação e formas de participação para todos os membros da
comunidade, os pais, alunos, professores e funcionários, eliminando-
148 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

se as formas de competição em sala de aula e as desigualdades de


tratamento entre pobres e ricos.

O terceiro tema se constituía de várias indagações, todas


elas sem respostas, mas sempre dirigindo a reflexão para o campo
dos problemas sociais. A responsabilidade individual acerca
das respostas que essas indagações pediam era, mais uma vez,
sublinhada, indiretamente. À pergunta inicial: A escola está nos
educando para uma sociedade nova? seguia-se esta: o ensino, os
currículos, os livros que são usados na escola servem para que a
gente descubra a vida do povo como ela é, ou nos torna alienados,
distantes da realidade? Reiteravam-se os questionamentos
anteriores, arrolando-se mais alguns: os currículos e livros servem
para criar a discussão sobre as dificuldades na saúde, educação,
alimentação, habitação, custo de vida, ajudando a procurar formas
de resolver tudo isso? Como a educação pode contribuir para
que os alunos se sintam responsáveis pela construção de uma
sociedade mais justa e humana e descubram o seu compromisso
social? Nossa escola está nos preparando para as provas ou para o
futuro da sociedade?

Nossa escola está nos preparando para as provas ou para o


futuro da sociedade? Nem para uma coisa nem para a outra. A
prática pedagógica e o cotidiano de sala de aula não se alteraram,
ao contrário, mantiveram-se encastelados em uma dinâmica
quase inerte, mas o discurso oficialmente proferido tornou-se de
todos!

Os problemas foram cruamente verbalizados, sem maquiagem


alguma eram explicitados, mas a tarefa do professor, como
regente de sala de aula, não deixou de ser realizada nos moldes já
conhecidos. O corpo docente da escola, do início década de 1980
até meados dela, pode ser comparado a um recém-nascido, todas
E l a i n e R o d r i g u e s 149
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

as informações eram recebidas como novidade, inclusive o fato de


receberem informações - o professorado acabara de sair do regime
autoritário ou de descobrir que estivera nele.

Uma chamada: “IMPORTANTE: O documento final dever


ser uma síntese desta caminhada da comunidade em busca de
UMA ESCOLA PRA A MUDANÇA e de uma EDUCAÇÃO PARA
TODOS!” (PARANÁ, 1985d, p. 2). Das discussões que aconteceram
no dia 18 de setembro de 1985 – Dia D – resultaram algumas
proposições que foram publicadas no Jornal da Educação. A chamada
era explícita quando falava em síntese e sugestões oriundas das
discussões sobre o Ensino Básico, realizadas no Estado do Paraná –
propostas do Dia D.

Prioridade ao ensino público e gratuito de 1º e 2º graus. Nesse


ponto das propostas, nada poderia ser considerado novo. Esse era
um objetivo já estabelecido desde o primeiro documento publicado
pela SEED. Valorização e aperfeiçoamento do magistério. A defesa
da classe dos professores era uma proposta que, também, não poderia
ser denominada de inovadora, menos ainda de modernizadora. Essa
era uma reivindicação que datava, desde aquela época, de muito
tempo. Outras propostas foram organizadas, o pedido de oferta
de cursos de atualização e aperfeiçoamento para professores; de
implantação de hora/permanência para os professores; de criação
de um plano de carreira para o magistério municipal; de concurso
público para os professores municipais; de maior frequência na
realização de concurso público para o ingresso de professores na
rede estadual; de melhoria dos cursos de formação de professores
de 1º e 2º graus.

Essas foram propostas que, se levadas a termo, significariam


uma valorização do quadro docente, mas não se poderia afirmar que
haveria uma reação significativa com relação à melhoria do ensino.
150 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

Com relação à qualidade e melhorias efetivas na educação, não se


poderiam considerar os parâmetros da lógica formal como base de
análise, na forma causa/consequência. O documento reivindicava
uma melhoria das condições de trabalho, isso não necessariamente
significaria uma nova escola, concatenada com o futuro e atuante
no processo de transição democrática.

No item do documento, melhoria da prática pedagógica,


os grupos de discussão propuseram algumas estratégias de
viabilização para suas propostas. A reformulação dos conteúdos
curriculares, a redução do número de alunos por sala de aula
nas 1ªs séries, o aumento de horas/permanência da criança nas
escolas multisseriadas, a subdivisão das classes, pelo menos em
duas, reunindo 1ª e 2ª séries e 3ª e 4ª séries, e a mais instigante das
sugestões era o pedido de apoio ao professor, e que este suporte o
desobrigasse das funções de merendeiro e servente. Os professores
seguiam com suas reivindicações, pedindo manutenção adequada
das escolas e, para isso, era importante manter o pessoal contratado
para os serviços gerais.

Enquanto os argumentos listados pela SEED, nos três pontos


que serviram de base para as discussões do Dia D, formularam-se
sobre bases filosóficas, de fundamentação das teorias educacionais
e formação do educando, registrando-se enfaticamente o que
se esperava da nova escola, os grupos de estudo, por sua vez,
reduziriam suas reivindicações às melhores condições de trabalho,
leia-se, basicamente, salários dignos, bem como a componentes
básicos para o desenvolvimento de qualquer função, quais sejam,
a manutenção da higiene e da alimentação, e que isso fosse feito
por outro profissional que não ele, educador. A distância entre
os argumentos, nas duas formas de discurso, evidencia o quanto
a linguagem da SEED apresentava-se sofisticada diante das reais
expectativas da comunidade escolar paranaense.
E l a i n e R o d r i g u e s 151
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

A discussão resultou em propostas de maior participação dos


pais na escola, estímulo às Associações de Pais e Mestres (APM),
congregando-se esforços para a melhoria do ensino; criação de
bibliotecas escolares e/ou ampliação do acervo e instalação de
bibliotecas públicas municipais; maior fiscalização do Ministério
da Educação e Cultura (MEC) junto às faculdades de fim de
semana; canalização das ações de pesquisa, extensão e ensino das
instituições de educação superior na qualificação e aperfeiçoamento
dos docentes de 1º e 2º graus. A assistência ao escolar carente e suas
estratégias de viabilização da proposta foram assim discriminadas:
merenda, assistência de saúde, material escolar (incluindo-se 5ª à 8ª
série); reformulação das estratégias dos programas de assistência ao
escolar, incluindo-se a descentralização do programa de alimentação
escolar.

A ampliação da oferta de escolarização básica: maiores recursos


para construção, conservação, reparos e ampliação da rede física
estadual e da municipal de 1º e 2º graus; áreas cobertas para recreação
e canchas desportivas nas escolas; equipamento das escolas de zona
urbana e rural com material de ensino em quantidade e qualidade
suficientes; transporte escolar para professores e alunos de distritos
e zona rural; oferta de educação pré-escolar; atendimento à criança
deficiente17 pelo Estado.

A democratização da estrutura escolar: substituição da


atual legislação de ensino – maior autonomia para as escolas –
redefinição da proposta político-pedagógica da escola, situando-a
como instituição transmissora de conhecimento e incentivadora
do senso crítico e reflexivo (PARANÁ, 1985f). Essa listagem

17 Termo usado à época para referir-se aos portadores de necessidades educativas


especiais.

152 E l a i n e R o d r i g u e s
2 O DISCURSO EDUCACIONAL E AS PRÁTICAS...

de propostas, que, aqui, de certa maneira, reproduzimos, foi


organizada na forma de constatações, que, ao serem revisitadas
pelo tempo presente, permitem a afirmação de que reivindicavam
melhorias.

A apresentação de resultados representativos das discussões


que viessem a sugerir formas para se conseguir a mudança que
levaria a educação para todos não se oficializou como documento.
Os professores sabiam dizer onde estavam os problemas que
cotidianamente os afligiam. O direito de voz que lhes fora concedido
foi uma das ações que a SEED conseguiu empreender, esse benefício
não imputou no agente educacional sinais que evidenciassem, em
seu discurso, qualquer absorção que demonstrasse concordância/
compreensão para com o entendimento da Secretaria sobre as
mesmas questões.

Os representantes governamentais tentaram, por meio do


Jornal, de suas seções e também de outras publicações de caráter
informativo e ao mesmo tempo formativo, criar uma identidade
entre o grupo, aproximando representados e representantes. O
interesse maior era colocar seu projeto educacional/curricular
em prática, e valeram-se de estratégias para que seus objetivos
fossem alcançados. Portanto, o sentimento de identidade
social entre todos os envolvidos era fundamental para que o
projeto tivesse andamento e se sentissem corresponsáveis pela
implantação e possível sucesso deste. O sucesso era confiado e
induzido pela circulação de uma propaganda quase panfletária.
Podemos entender o ‘discurso’, proferido por esse projeto de
governo não tinha espaço para o erro, tudo, até então, realizado
ou idealizado era considerado por seus propositores ‘indiscutível
e incomparável’.
E l a i n e R o d r i g u e s 153
Finalizando, mas não concluindo!

O discurso documental, que descrevemos e problematizamos,


é enfático e estratégico e, ao mesmo tempo, apresenta um padrão
narrativo que afirma os valores democráticos acima de qualquer
contestação. Para o convencimento, cria táticas que se valem da
emulação para a manutenção de uma hierarquia, sem dúvida,
vigilante. Com a marca da oficialidade, aquele modelo de educação
e sociedade circulou e, hoje, segunda década do século XXI, ainda
está presente na busca da ‘salvação’ prometida, sendo quase
onipresente nas concepções vigentes, no campo das representações,
afeto ao que compreendemos por ser-professor/ser professora, ser-
aluno, ser-criança-aluno. Suas identidades, ainda que múltiplas,
apresentam determinada forma que, ainda, é a mais aceita, por isso,
recorrente e entendida como mais verdadeira para o campo, figura
como a escolhida para a formação do bom professor, o engajado, e
do bom aluno, o crítico.

O cuidado e a vigilância exercidos pela SEED pressupunham


um tipo de incapacidade, de restrição em relação àqueles que seriam
objeto do cuidar. Essa lógica funcionava dentro de um quadro mais
geral como um binômio associado professor ativo participante
- professor passivo receptivo e da mesma forma para os alunos:
cidadãos críticos - cidadãos súditos.

A década de 1980 é um marco para o surgimento de um discurso


fundador que amparou a formulação de práticas pedagógicas,
pseudo-formadoras do cidadão crítico. A elaboração e circulação de
teorias pedagógicas de caráter progressivo ampararam-se e foram
amparadas pelo discurso democrático libertário que se firmou
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

como uma identidade pedagógica, por assim dizer, paranaense.


O cuidado e a vigilância da SEED foram exercidos por meio das
ações pretendidas, democratizadoras, e que deveriam ocorrer nas
escolas; em dada dimensão de tempo e de lugar, de certa maneira,
regulava-se o ritmo em que a democracia seria aprendida, sempre
se pontuando a forma e a finalidade das atividades, disciplinando e
estabelecendo seus avanços e limites.

A SEED do Paraná apropriou-se e recriou o teor discursivo de


um projeto democrático pensado para a nação brasileira e tomou
como objeto de seu cuidado a promoção e aproximação controlada
do professorado junto à liderança administrativa da educação. A
identidade social de grupo, o apoio convencido dos agentes escolares
eram objetivos pelos quais todas as ações se justificavam, a fim de
que os acontecimentos se desenvolvessem de forma mais pacífica e a
contento da maioria. A bandeira desse governo era a democracia, para
tanto, tornava-se importante o sentimento de pertença para que as
decisões a serem tomadas no campo educacional se ‘decidissem’ em
parceria. Havia identificação daqueles que escreveram formalmente
ao Jornal da Educação, por meio de suas seções, com aqueles que não o
fizeram, identificação que se exercia em meio à função e posição que
pais, alunos e dirigentes educacionais eram convidados a manter no
grupo denominado comunidade educacional paranaense.

A sofisticação do discurso oficial não foi suficiente para


melhorar a simplicidade com que o professor mantinha suas
reivindicações. A criticidade exigida pelos organizadores, com
relação ao comportamento de toda a comunidade envolvida
na educação, não considerava esse processo como tendo e
apresentando limites. A leitura dos documentos faz observar um
grau quase contagiante de esperança depositada em um projeto que
se caracterizou como um processo que escolheu circular como um
jornal informativo, que se pretendia formativo-educativo. Há que
156 E l a i n e R o d r i g u e s
FINALIZANDO, MAS NÃO CONCLUINDO!

se considerar: a fórmula foi acertada, o grau de idealização presente


no discurso dos administradores da SEED era quase arrebatador,
o conteúdo do discurso era, substancialmente, populista e o tom
era religiosamente humanizador, pertencente e muito próximo do
universo cultural em que a comunidade educacional estava(estaria)
inserida.

A situação de produção do discurso pedagógico, fundado


e posto em circulação, nos anos de 1980, almejava o cidadão,
educador ou educando, como sustentáculo de uma sociedade
democrática. Estabeleceu-se uma legibilidade mútua, representantes
e representados identificavam-se ou aprenderam a identificar-se
com o ideal de homem democrático então profetizado. O quadro
desenhado por essas estratégias resumia-se com a ideia de que o
institucional, representado pelo Estado, estaria incorporando a
mentalidade de uma época tipificada pelo resgate dos direitos
que, acreditava-se, somente a democracia poderia consolidar. A
universalização da escola, com qualidade para todos, objetivos
fundamentais do projeto educacional em questão, fez e faz parte dos
princípios modernos de sociedade, mantenedores de um discurso
que denota crença na cidadania, o que talvez explique seu caráter
popular, de aceitação quase inquestionável, criando-se, assim, como
uma tradição!

As estratégias revelaram-se e arrogaram-se direcionadoras do


entendimento do universo social daquele momento, fazendo uso da
memória histórica, forjando vocabulários, evocando tradições para
fazê-las renascer ou morrer. Por meio da divulgação de slogans,
imputava-se o dever de organizar o pensamento e as ações dos
leitores/consumidores, propondo ritmos às vidas que circulavam
na comunidade educacional daquele período.
E l a i n e R o d r i g u e s 157
A (RE)INVENÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PARANÁ

Longe de estabelecer uma conclusão cabal esteve o nosso


objetivo. Manter a tensão no campo das problematizações traduzidas
em objetos de pesquisa foi o intento. Assim, no decorrer do percurso,
cremos, foi possível, apresentar, ao leitor, um mapeamento do projeto
sobre o qual construímos interesses e, ainda, registrar continuidades
mais do que descontinuidades acerca do fazer proposto.

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PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Jornal da Educação, Curitiba,


ano 4, n. 14, jan./fev. 1986a.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Jornal da Educação, Curitiba,


ano 4, n. 15, mar./abr. 1986b.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Jornal da Educação, Curitiba,


ano 4, n. 16, maio/jun. 1986c.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Jornal da Educação, Curitiba,


ano 4, n. 17, ago./set. 1986d.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Jornal Escola Aberta, Curitiba,


ano 3, out. 1986e. Edição Especial.

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168 E l a i n e R o d r i g u e s

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