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Marx, Williams, Wood
Marx, Williams, Wood
Ainda na seara crítica sobre a metáfora do “espelho”, um dos autores a propor uma
nova teoria da cultura e dos estudos culturais sob o prisma marxista foi Raymond Williams
(1921-1988). Em um ensaio publicado em 1973, Williams reconhece que a visão
predominante nas análises marxistas sobre a cultura durante segunda metade do século XX foi
“[...] a noção de prefiguração, previsão ou controle [...]”,2 não eliminando, inclusive, o papel
de teóricos renomados que se dedicaram a refletir sobre as correlações entre cultura, literatura
e sociedade na reprodução (consciente ou não) desses sentidos, como no caso do filósofo
húngaro György Lukács (1885-1971) e sua defesa do “realismo” literário. Para Williams, uma
saída profícua seria a ressignificação em termos teórico-empíricos sobre os conceitos de
“superestrutura” e “base” em Marx, atentando, sobretudo, para o fato de que a última, no
próprio bojo da teoria marxiana, faz menção a “[...] um processo, e não de um estado. E não
podemos atribuir a esse processo algumas propriedades fixas a serem posteriormente
traduzidas aos processos variáveis da superestrutura.”.3
Para o autor galês, isso significava uma profunda alteração nos significados até então
atribuídos a essas duas categorias de análise, pois, seria imperativo “[...] reavaliar a
1
MARX, Karl. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858. Esboços da crítica economia política.
[Trad.: Mário Duayer; Nélio Schneider]. São Paulo: Boitempo; Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2011, p. 60.
2
WILLIAMS, Raymond. Base e superestrutura na teoria da cultura marxista. [1973]. In: __________. Cultura e
materialismo. [1980]. [Trad.: André Glaser]. São Paulo: Editora Unesp, 2011, p. 44.
3
Ibid., p. 47.
‘determinação’ para a fixação de limites e o exercício de pressões, afastando-a de um
conteúdo previsto, prefigurado e controlado. Temos de reavaliar a ‘superestrutura’ em direção
a uma gama de práticas culturais relacionadas, afastando-a de um conteúdo refletido,
reproduzido ou especificamente dependente. E, fundamentalmente, temos de reavaliar a
‘base’, afastando-a da noção de uma abstração econômica e tecnológica fixa e aproximando-a
de atividades específicas de homens em relações sociais e econômicas reais, atividades
específicas de homens e relações sociais e econômicas reais, atividades que contêm
contradições e variações fundamentais e, portanto, encontram-se sempre num estado
dinâmico.”4
Wood comenta que “[...] para quem considera a ‘base’ como alguma coisa ‘material’
por oposição a ‘social’ – o que geralmente significa que a base consiste nas forças técnicas de
produção e que a história é um determinismo tecnológico [...].”, 6 chegando a concluir que a
originalidade do pensamento de Thompson e sua contribuição para repensarmos o dilema
“base/superestrutura” consiste em notar “[...] o fato de a distinção analítica entre os vários
‘níveis’ ou ‘casos’ poder encorajar a ideia de que eles ‘existem substantivamente como
4
Ibid., p. 47, grifo meu. Sobre Lukács, o realismo e os estudos literários do filósofo, ver LUKÁCS, György.
Marxismo e teoria da literatura. [Trad.: Carlos Nelson Coutinho]. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010.
5
WOOD, Ellen Meiksins. Democracia contra capitalismo: a renovação do materialismo histórico. [1995].
[Trad.: Paulo Cezar Castanheira]. São Paulo: Boitempo, 2003, p. 51.
6
Ibid., p. 66.
objetos separados, fisicamente divisíveis um dos outros no mundo real’, criando uma
confusão entre ‘procedimentos epistemológicos’ e ‘categorias ontológicas’.”7
7
Ibid., p. 72.
que se tomarmos o texto pelo texto, por exemplo, ou seja, apenas em sua própria
dimensão interna, reduziríamos sua existência e sobrevida apenas à época do qual
é produto, correndo o risco de obliterar qualquer dimensão referencial externa e
suas condições reais e materiais de produção. Portanto, devemos ter em mente que
a busca pela objetividade e a cientificidade da História está no entendimento final
que “[...] estudar a realidade como texto deveria se somar a advertência de que
texto nenhum pode ser entendido sem uma referência a realidades
extratextuais.” (GINZBURG, 2011, p. 349, grifos meus).