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Capítulo 7

Funções deriváveis

7.1 Definição e primeiras proprieda-


des
DEFINIÇÃO 7.1.1. Dizemos que uma função f : X ! R é derivável no ponto a 2 X \ X 0
quando existe o limite

f(x) - f(a) f(a + h) - f(h)


lim = lim .
x!a x-a h!0 h
Quando uma função f é derivável no ponto a, escrevemos

f(x) - f(a)
f 0 (a) = lim
x!a x-a
e chamamos o número real f 0 (a) de derivada de f no ponto a. Se f é derivável em todos
os pontos x 2 X \ X 0 dizemos simplismente que f é uma função derivável.

EXEMPLO 7.1.1. Seja f : R ! R dada por f(x) = cx, onde c 2 R está fixado. Então, para
qualquer a 2 R temos
f(x) - f(a) cx - ca
= = c,
x-a x-a
para todo x 6= a. Consequentemente,

f(x) - f(a)
lim = c.
x!a x-a
Por definição, segue que f 0 (a) = c, para todo a 2 R.

TEOREMA 7.1.1. Uma função f : X ! R é derivável no ponto a 2 X \ X 0 se, e somente se,


existe c 2 R tal que

a + h 2 X ) f(a + h) = f(a) + c · h + r(h),

onde limh!0 r(h)


h
= 0. No caso afirmativo, tem-se f 0 (a) = c.

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DEMONSTRAÇÃO: Suponha que existe f 0 (a). Seja Y = {h 2 R : a + h 2 X} e defina
r : Y ! R por
r(h) = f(a + h) - f(a) - f 0 (a) · h.
Então
r(h) f(a + h) - f(a) r(h)
= - f 0 (a) ) lim = 0.
h h h!0 h

Reciprocamente, suponha que a condição é válida. Então

r(h) f(a + h) - f(a) - c · h f(a + h) - f(a)


0= = lim = lim - c,
h h!0 h h!0 h
ou seja, f 0 (a) = c. ⌅

COROLÁRIO 7.1.1. Se f : X ! R é derivável no ponto a 2 X \ X 0 , então f é contínua no


ponto a.

DEMONSTRAÇÃO: De fato, note que para h 6= 0 tal que a + h 2 X podemos escrever

r(h)
f(a + h) - f(a) = f 0 (a) · h + · h.
h
Logo, limh!0 f(a + h) - f(a) = 0 e, portanto, f é contínua no ponto a. ⌅

O resultado anterior pode ser utilizado para determinar quando uma função real
não é derivável.

EXEMPLO 7.1.2. Seja f : R ! R dada por f(0) = 0 e f(x) = x sen (x-1 ), quando x 6= 0.
Note que
f(0 + h) - f(0) h sen (h-1 )
= = sen (h-1 ).
h h
Logo, não existe
f(0 + h) - f(0)
lim ,
h
h!0

donde segue que f não é derivável em 0. Por outro lado, a função g(x) = xf(x), x 2 R,
é derivável em 0. Basta observar que

g(0 + h) - g(0) g(0 + h) - g(0)


= h sen (h-1 ) ) g 0 (0) = lim = 0.
h h!0 h
O resultado a seguir estabelece as regras de derivação. Sua demosntração é simples
e pode ser encontrada, por exemplo, em livros de cálculo.

TEOREMA 7.1.2 (Operações com derivadas). Sejam f, g : X ! R deriváveis no ponto


a 2 X \ X 0 . As funções f + g, f · g e f/g, caso g(a) 6= 0, são deriváveis no ponto a, com

• (f + g) 0 (a) = f 0 (a) + g 0 (a);

• (f · g) 0 (a) = f 0 (a) · g(a) + f(a) · g 0 (a);

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⇣ ⌘0
f 0 (a)·g(a)-f(a)·g 0 (a)
• f
g
(a) = g(a)2
.

TEOREMA 7.1.3 (Regra da Cadeia). Sejam f : X ! R derivável no ponto a 2 X \ X 0 ,


g : Y ! R derivável no ponto b = f(a) 2 Y \ Y 0 e suponha que f(X) ⇢ Y. Então
g f : X ! R é derivável no ponto a 2 X e

(g f) 0 (a) = g 0 (f(a)) · f 0 (a).

DEMONSTRAÇÃO: Considere uma sequência de pontos xn 2 X \ {a} com lim xn = a.


Fazendo yn = f(xn ) temos lim yn = b. Sejam N1 = {n 2 N : f(xn ) 6= f(a)} e N2 = {n 2
N : f(xn ) = f(a)}. Ora, para n 2 N1 temos yn 2 Y \ {b} e

g(f(xn )) - g(f(a)) g(yn ) - g(b) f(xn ) - f(a)


= · .
xn - a yn - b xn - a

Portanto, se N1 é infinito temos

g(f(xn )) - g(f(a))
lim = g 0 (f(a)) · f 0 (a).
n2N1 xn - a
Por outro lado, se N2 é infinito então

f(xn ) - f(a)
lim = 0,
n2N2 xn - a
donde f 0 (a) = 0 e, consequentemente,

g(f(xn )) - g(f(a))
lim = 0 = g 0 (f(a)) · f 0 (a).
n2N2 xn - a
Como N = N1 [ N2 segue que, em qualquer hipótese,

g(f(xn )) - g(f(a))
lim = g 0 (f(a)) · f 0 (a).
n2N xn - a

EXEMPLO 7.1.3. Seja f : R ! R dada no Exemplo 7.1.2. Usando a Regra da Cadeia


vemos que para qualquer x 6= 0 vale

f 0 (x) = sen (x-1 ) - x-1 cos(x-1 ).

COROLÁRIO 7.1.2. Seja f : X ! Y uma bijeção entre os conjuntos X, Y ⇢ R. Suponha que


f é derivável no ponto a 2 X \ X 0 e que g = f-1 : Y ! X é contínua em b = f(a). Então g
é derivável no ponto b se, e somente se, f 0 (a) 6= 0. No caso afirmativo vale

g 0 (b) = 1/f 0 (a).

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DEMONSTRAÇÃO: Suponha que g é derivável no ponto b. Considere uma sequência
de pontos xn 2 X \ {a} com lim xn = a. Como f é injetiva e contínua segue que
yn = f(xn ) 2 Y \ {b} e lim yn = b, donde, b 2 Y \ Y 0 . Ora, para todo x 2 X vale a
igualdade g(f(x)) = x. Logo, usando a Regra da Cedeia temos
g 0 (f(a)) · f 0 (a) = 1 ) g 0 (b) = 1/f 0 (a).
Em particular, f 0 (a) 6= 0.
Reciprocamente, suponha que f 0 (a) 6= 0. Para qualquer sequência de pontos yn =
f(xn ) 2 Y \ {b} com lim yn = b, a injetividade de g juntamente com sua continuidade
no ponto b garantem que lim xn = a e xn 2 X \ {a}. Assim,
 -1  -1
g(yn ) - g(b) yn - b f(xn ) - f(a)
= = .
yn - b g(yn ) - g(b) xn - a
Portanto,  -1
g(yn ) - g(b) f(xn ) - f(a) 1
lim = lim = .
yn - b xn - a f 0 (a)

EXEMPLO 7.1.4. Dado n 2 N, considere a função f(x) = xn , x > 0. Então f 0 (x) =


nxn-1 6= 0, para todo x 6= 0. Consequentemente, a função g : [0, 1) ! [0, 1) dada por
p
g(y) = n y é derivável para todo y 6= 0. Fazendo y = xn temos
1 1 1
g 0 (y) = = = p .
f 0 (x) nxn-1 n
n yn-1

7.2 Derivadas e crescimento


DEFINIÇÃO 7.2.1. Dizemos que uma função f : X ! R possui um máximo local no ponto
c 2 X se existe > 0 tal que f(x) 6 f(c), para todo x 2 (c - , c + ) \ X.
A noção de mínimo local é definida de maneira análoga.
TEOREMA 7.2.1. Suponha que f : [a, b] ! R possui um máximo local no ponto c 2 (a, b).
Se existe f 0 (c) então f 0 (c) = 0.
DEMONSTRAÇÃO: Seja > 0 tal que a < c - < c < c + < b e f(x) 6 f(c), para
todo x 2 (c - , c + ). Por um lado, se c - < x < c então
f(x) - f(c) f(x) - f(c)
>0 ) f 0 (c) = lim- > 0.
x-c x!c x-c
Por outro lado, se c < x < c + então
f(x) - f(c) f(x) - f(c)
60 ) f 0 (c) = lim+ 6 0.
x-c x!c x-c
Consequentemente, temos f 0 (c) = 0. ⌅

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OBSERVAÇÃO 7.2.1. O resultado anterior também é válido para o caso de um mínimo
local.

O próximo teorema mostra que a derivada sempre possui a propriedade do valor


intermediário, mesmo quando ela não é contínua.

TEOREMA 7.2.2 (Darboux). Seja f : [a, b] ! R derivável. Se f 0 (a) < d < f 0 (b) então
existe c 2 (a, b) tal que f 0 (c) = d

DEMONSTRAÇÃO: Suponha inicialmente que d = 0, isto é, f 0 (a) < 0 < f 0 (b). Pelo
Corolário 6.1.3, a função f possui um máximo num ponto c 2 [a, b]. O teorema anterior
garante que f 0 (c) = 0. Como f 0 (a) < 0 segue que c 6= a. Da mesma forma, como
0 < f 0 (b) temos c 6= b. Logo, devemos ter c 2 (a, b).
O caso geral reduz-se a este considerando a função g(x) = f(x) - dx, x 2 [a, b]. De
fato, g 0 (x) = f 0 (x) - d, donde, g 0 (c) = 0 , f 0 (c) = d. Além disso,

g 0 (a) < 0 < g 0 (b) , f 0 (a) < d < f 0 (b).

TEOREMA 7.2.3 (Teorema do valor médio generalizado). Suponha que f, g : [a, b] ! R


são funções contínuas. Se f e g são deriváveis em (a, b) então existe x 2 (a, b) tal que

[f(b) - f(a)]g 0 (x) = [g(b) - g(a)]f 0 (x).

DEMONSTRAÇÃO: Seja h : [a, b] ! R dada por

h(t) = [f(b) - f(a)]g(t) - [g(b) - g(a)]f(t).

Então h é contínua em [a, b], derivável em (a, b) e h(a) = f(b)g(a) - f(a)g(b) = h(b).
Note que, para provar o teorema, basta mostrar que existe x 2 (a, b) tal que h 0 (x) = 0.
Ora, se h é constante então h 0 (x) = 0, para todo x 2 (a, b). Se h(t) > h(a), para
algum t, então, pelo Corolário 6.1.3, podemos considerar x 2 [a, b] um ponto onde h
possui um máximo. Como h(t) > h(a) = h(b), segue que x 2 (a, b). Pelo teorema
anterior temos h 0 (x) = 0. Se h(t) < h(a), para algum t, então o mesmo argumento
pode ser utilizado no ponto onde h possui um mínimo local. ⌅

COROLÁRIO 7.2.1 (Teorema do valor médio). Suponha que f : [a, b] ! R é contínua. Se


f é derivável em (a, b) então existe x 2 (a, b) tal que

f(b) - f(a) = (b - a)f 0 (x).

DEMONSTRAÇÃO: No teorema anterior basta considerar g(x) = x. ⌅

COROLÁRIO 7.2.2. Suponha que f : (a, b) ! R é derivável. Então:

(i) se f 0 (x) > 0, para todo x 2 (a, b), então f é não-decrescente;

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(ii) se f 0 (x) = 0, para todo x 2 (a, b), então f é constante;

(iii) se f 0 (x) 6 0, para todo x 2 (a, b), então f é não-crescente;

DEMONSTRAÇÃO: Provaremos o item (i). Os demais são provados de forma análoga.


Sejam x1 , x2 2 (a, b), com x1 < x2 . Então f : [x1 , x2 ] ! R é contínua e f é deriválvel em
(x1 , x2 ). Pelo Teorema do Valor Médio, existe x 2 (x1 , x2 ) tal que

f(x2 ) - f(x1 ) = (x2 - x1 )f 0 (x) > 0 ) f(x2 ) > f(x1 ).

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