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Sobre a “Crítica da Razão Pura” de I. Kant.

Aluno: Juliano Gustavo Ozga.


Filosofia UFSM-UFOP.

Palavras-Chaves: Immaneul Kant; Crítica da Razão Pura; Fenômeno e


Númeno.

“Toda mudança de lugar apreendida deve-se ou ao movimento do objeto


observado ou do observador, ou então a diferenças nos movimentos que
estão ocorrendo simultaneamente em ambos. Pois, se o objeto observado e o
observado estão se movendo com a mesma velocidade e na mesma direção,
então nenhum movimento pode ser detectado. Ora, é a partir da Terra que
apreendemos as revoluções nos céus. Então, se algum movimento é atribuído
para a Terra, este movimento irá gerar a aparência de si mesmo em todas as
coisas exteriores a ele, apesar de ocorrer na direção oposta, como se tudo
estivesse passando acima da Terra. Isto será especificamente verdadeiro da
revolução diurna. Isto parece acontecer em todo o mundo, e,
conseqüentemente, sobre tudo o que se passa em torno da Terra, apesar de
que não com a própria Terra... Como os céus, que contém e abarcam tudo,
são o lugar natural das coisas, não é de todo evidente porque o movimento
deveria ser atribuído ao que contém e não ao que é contido, ao que localiza e
não ao que é localizado. A primeira e mais elevada das esferas é aquela das
estrelas fixas, que contém a si mesma e a tudo mais, sendo imóvel,
conseqüentemente. Em resumo, ela é o locus do universo, em relação ao qual
o movimento e a posição de todos os outros corpos celestes devem ser
calculados”. (Copérnico, De Revolutionibus Orbium Coelestium, I v e x,
1543).
Com referência ao modelo de ciência empregado pelos matemáticos
desde a antiguidade (teórico-puro [a priori (necessário/universal) e
ampliativo]) e também pelos físicos (teórico, mas não totalmente puro,
devido ao fato de haver dependência de demonstração empírica dos seus
postulados), servindo-se também da lógica, como modelos formais puro de
verdade, podemos argumentar que a Revolução de Copérnico (apresentar e
tratar o conhecimento humano não sobre o objeto observado [Conhecimento
se regula pelos objetos e fracassa], mas sim, inverter o esquema, e operar
com um esquema/método que privilegia o sujeito-observador que almeja o
conhecimento dos objetos [Objetos se regulam pelo conhecimento]),
pressupõe o fato de ser importante por excelência, o limite e a possibilidade
necessária do ser humano conhecer, o que expressa o caso de ser limitado o
conhecimento humano ao fenômeno aos quais os objetos se nos apresentam
em forma de representações. Diante dessa análise, o que foi sugerido seria o
caso de tratar a ciência dentro desse esquema/método “invertido”, o que
consequentemente apresentava o problema da falta de acordo sobre os
procedimentos para atingir o objetivo comum do conhecimento sobre os
objetos do mundo físico. Dentre esses problemas está o objetivo comum do
conhecimento das ciências, ou seja, os objetos físicos, os métodos de
descoberta científica aplicados aos mesmos, e os métodos de justificação
resultantes para a validação dos resultados, o que deveria não contemplar um
modelo formal lógico, como no caso da matemática (Revolução na
Matemática, expressa pelo exemplo do triângulo eqüilátero de Tales, onde
através da criação de conceitos puros [a priori], seria possível a aplicação e
construção da figura do triângulo equilátero no mundo físico, respeitando os
conceitos inseridos nos postulados).
Nessa problematização, a Revolução Copernicana expressou sua
característica evolutiva desde Bacon, Galileu, Torricelli, Stahl, onde o que se
tentou foi “apontar/nortear” um ingresso para o caminho da ciência, podendo
se valer da Revolução Copernicana, como um dos ápices dessa tentativa, e
que veio a influenciar todo um contexto de pensamento científico e
filosófico, em evolução com o movimento da “ilustração/iluminismo” do
renascimento.
Isso implica a busca por um esquema/método aplicado às ciências, de
forma que as torne um conhecimento a priori dos fatos e objetos do mundo
físico, podendo assim ser caracterizada a ciência em conformidade com o
sistema da matemática e da física.
Dessa forma o que se propôs foi a inversão da forma/modelo de pensar,
que era focalizado na questão do objeto (podendo ou não ser conhecido, e
podendo ou não existir uma realidade exterior ao nosso intelecto subjetivo), e
que agora com a Revolução Copernicana, pretendia conhecer o que era
possível o ser humano conhecer, dentro de suas limitações e possibilidades,
onde o que era importante era o sujeito que conhecia. Essa revolução expõe o
fato de haver um limite do conhecimento humano sobre os objetos físicos e
fatos do mundo.
Assim, a questão de ser possível ao ser humano conhecer e compreender
o que ele mesmo produz e elabora intelectualmente. E através da produção
de princípios, leis constantes aplicadas à natureza, e que através de
experimentos, há a possibilidade necessária do ser humano conhecedor vir a
tornar-se um interrogador/questionador da natureza, aplicando um esquema
lógico puro, com modelo na matemática, e assim pretender tornar-se quase
um juiz, referente aos conhecimentos por ele mesmo adquirido.
Abordando a metafísica como conhecimento especulativo da razão,
sendo inteiramente isolado, e que se expressa por simples conceitos, a sua
diferença para com a matemática reside no fato de ser a metafísica aplicada
na intuição de conceitos. O resultado é a não necessidade de experiência
como critério de validação dos seus postulados e conclusões.
Dessa problemática decorre a pretensão da aplicação do esquema/método
utilizado pela Revolução Copernicana na ciência, na metafísica e assim
trabalhar o método/esquema copernicano sobre a intuição de conceitos. Por
isso houve a consequente indagação por qual motivo pelo qual a metafísica
não se tornou ciência, e se há a possibilidade de haver essa transformação.
Desse elemento podemos apontar o interesse da razão, em buscar a
verdade, através do caminho da ciência, e ver a possibilidade da metafísica
também trilhar esse caminho, demonstrando sim, que a metafísica se
expressa como um dos grandes problemas da razão humana, devido ao fato
de aspirar por um método científico, necessitar de demonstração de seus
postulados, ou pelo menos da aplicação dos mesmos. Portanto, a situação
problemática da metafísica expõe a fragilidade da própria razão frente ao
aspecto metafísico.
A consequencia é o fato de nos indagarmos se a razão nos enganar, nos
entreter com simulações e perturbações sensíveis, afetando nosso
entendimento e juízo dos fatos e objetos físicos, perante nossa validação de
verdade sobre o mundo físico tornar-se limitada, devido ao nosso limitado
aparato cognitivo. Por isso podemos elaborar um projeto para a metafísica,
como uma forma de conhecimento a priori, ao mesmo tempo necessário e
universal, e não empírico. Assim há a dependência de ser necessário o
esclarecimento e limitação dos objetos a ser abordado, o que pode ser
estabelecido como algo sobre os objetos como apenas pensados.
Isso demostra a possibilidade de sugerir a hipótese a ser analisada. Isso
mostra o caso de ser o objeto regulado pelo conhecimento e não o contrário,
podendo ser examinado se isso é possível com a metafísica e se isso lhe
causa algum progresso, de igual maneira observado nas ciências até hoje.
Portanto, se isso é possível de ser pensado, se torna possível a suposição
de poder ser possível o teste deste método/esquema na metafísica, e essa
tarefa é que se impõe ao experimento e aplicação da razão pura.
O problema gerado sobre a limitação (extensão) da razão especulativa e a
ampliação (restrição) prática da razão pura expressa a consequência da razão
pura (a priori) referente ao método de investigação e obtenção do
conhecimento interferir na ampliação prática da razão pura, sendo essa
última restritiva em relação ao agir moral humano.
Diante da tentativa de limitação (da extensão) da razão especulativa,
pode haver o impedimento para o supra-sensível e incondicionado, e isso
ocorre devido ao fato de ser projetado o procedimento crítico, que irá limitar
a extensão da razão especulativa. Isso gera a ampliação do espaço de ação da
razão pura, porém de forma restritiva, sendo o espaço especulativo limitado,
haverá um limite do conhecimento sobre o mundo físico, e isso gera a
possibilidade de restrição crítica do espaço da ciência, e ao mesmo tempo
uma ampliação da prática da razão pura, criando assim um espaço de ação
com base na razão especulativa limitada, donde pode devir um espaço
prático, operado pela metafísica de cunho moral e prático.
No entanto, sobre utilidade negativa podemos argumentar que a razão
especulativa avança com princípios teóricos, podendo ultrapassar seus
limites, nisso há uma tentativa de ampliação, mas o que se sucede é uma não
ampliação, ou seja, uma restrição dos princípios da razão especulativa, e
assim uma restrição do conhecimento teórico da ciência. O que gera a
restrição e não a ampliação dos princípios é a contradição da razão, pelo fato
de haver uma dinâmica interna no método/esquema.
O fato de haver a possibilidade de uma contradição da razão expõe um
resultado contrário ao pretendido, gerando assim os paradoxos, ou seja, a
dialética do esclarecimento. Essa dialética é entendida como lógica da ilusão,
aplicada aos objetos representados pela razão. Ao constatarmos a restrição da
razão, limitamos a extensão dos princípios da razão especulativa.
Porém, ao ampliarmos, estamos estendendo o limite para todas as coisas,
e todas essas coisas pertencem ao conjunto dos objetos físicos, sendo então
esse limite referente aos domínios da sensibilidade. Para isso, há a
necessidade de determinação temporal da limitação, que pode abranger
apenas objetos da experiência ou dados sensíveis, dentro do espaço e tempo
limitados.
Decorrente disso é o fator causalidade, que opera sobre os objetos da
experiência, na pretensão de usá-los para os objetos em geral do mundo
físico. Essa pretensão possui uma consequência imediata ao ameaçar anular
o uso prático (restrição) da razão pura, o que acarretará problemas na esfera
moral do agir. O resultado é uma disputa (teórica ou prática) entre a razão
especulativa (limitada em sua extensão) e a razão prática (ampliada em sua
restrição do agir moral).
Por outro lado, a utilidade positiva, em uma primeira análise, pode-se se
mostrar negativa, para o âmbito restritivo da ciência, mas posteriormente, se
expressa o significado positivo da limitação crítica na esfera da razão
especulativa, em favor da questão moral.
Disso decorre o exemplo no caso da liberdade da vontade, onde não há a
possibilidade de inferir liberdade ao indivíduo que está sujeito à uma lei
natural necessária e que impossibilita a sua atuação e vontade geral. Nesse
caso, ao constatar que uma lei natural limita tanto o conhecimento do
indivíduo, e consequentemente, o seu agir, não podemos inferir que o
homem é totalmente livre em seu agir, e sim, limitado em seu agir devido a
sua limitação de conhecer.
Essa limitação pode gerar a suposta conclusão de uma perda total
referente à limitação da razão especulativa (ciência), que confere uma
eliminação do conhecimento transcendente e, consequentemente do
conhecimento do absoluto/incondicionado. Dessa conclusão pode se
constatar uma suposta perda total, no qual uma perda parcial pode se mostrar
total, onde a crítica da razão pura se mostra nociva pelo fato de implicar uma
perda total.
Porém a crítica da razão pura não possui apenas uma utilidade negativa
para a razão especulativa e para a ciência, se analisarmos a sua utilidade
positiva, dentro de uma compatibilidade entre uma doutrina da natureza e
uma doutrina da moralidade. Ao haver uma perda para a razão especulativa
haverá uma utilidade para o agir moral, o que pode resolver o conflito da
razão consigo mesma, eliminando assim o obstáculo restritivo à razão
prática. Há uma restrição da necessidade natural, porém, isso possibilita a
liberdade e a moralidade.
Portanto, a limitação da razão teórica possibilita a razão prática, ou seja,
a limitação (restrição) da extensão da ciência possibilita a expansão da
moralidade. Em outras palavras, a perda teórica impede a perda prática, de
onde provém que, a perda elimina a contradição da razão.
No entanto, sobre a perda para a razão especulativa, podemos definir uma
generalização do resultado, onde pode haver o caso de pensar as ideias sem
contradição, portanto, Deus e ateísmo, Liberdade e não liberdade e
Imortalidade e fé na vida futura. Da limitação teórica a respeito desses
conceitos anteriores, há uma ampliação prática decorrente do mesmo. O que
se deve evitar é a confusão entre fenômeno e coisa em si, e isso muitas vezes
acarreta na contradição dos termos anteriores, e que consequentemente
impede a ampliação prática da razão.
Por isso mesmo, havendo uma perda parcial, gerará uma perda total. O
problema é para quem essa perda total será negativa. Nesse caso, entra o
impacto que isso gerará nas escolas (instituições), usando como argumento o
fato de que perdas teóricas no âmbito do conhecimento afetam em grande
parte o público.
Porém, o interesse geral dos humanos, esse sim permanece inalterado.
Disso decorre um mesmo estado vantajoso, onde se atinge um monopólio das
escolas e consequentemente uma arrogância das escolas em relação ao
público, não afetará o natural interesse dos homens.
Desse fato, pode-se levantar a questão sobre a metafísica e o interesse do
público, onde na maioria das vezes, os argumentos metafísicos não atingem
o interesse humano, não havendo uma influência nítida na convicção pública.
Disso decorre que as posses da razão irão influenciar os interesses do público
em relação à esperança em uma vida futura (Imortalidade), também uma
consciência (ilusória ?) de Liberdade (propriedade da vontade: Princípios
práticos situados na razão; impossíveis sem a pressuposição da Liberdade), e
por último uma fé no sábio e grande autor do mundo (Deus).
Isso, porém, decorre de uma disposição e interesse natural do ser humano
e que é provocada por uma necessidade e naturalidade, havendo o caso de
que o público não tem acesso aos argumentos metafísicos, e isso é uma
convicção não promovida pelas escolas e instituições.
A implicação é que as escolas ganham prestígio, porém, ao serem
instruídas elas não devem tomar como próprio seus conhecimentos, não
havendo compreensão mais alta para difundir, mas também havendo
compreensões relativas ao interesse geral. Desse fato levanta-se a questão
sobre o destino das escolas/instituições, onde seu âmbito não deve pretender
mais do que o cultivo de argumentos, sendo esses acessíveis a todos e
principalmente, sua excelência relativa ao propósito moral.
Partindo do pressuposto de que há um uso dos conceitos do
entendimento, podemos dividi-los em dois grupos: os de uso transcendental,
que abordam as coisas em si e as coisas em geral; e os de uso empírico, que
abordam os fenômenos e os objetos da experiência possível.
Diante disso podemos caracterizar o conceito de fenômeno como relativo
aos entes dos sentido-dados sensíveis, sendo esses relativos ao nosso modo
de intuição, bem como relativos às formas Espaço/Tempo (Estética
Transcendental), donde deriva uma distinção entre entes em relação à nossa
sensibilidade e entes não em relação à nossa sensibilidade. Isso possibilita
distinguir o modo de intuí-los e os objetos em si, sendo “a coisa”: tal como
intuída/ tal como é em si. Consequentemente, ocorre a distinção entre
fenômeno e coisa em si, que deriva das condições do sentido das categorias.
a) Fenômeno: “objetos de uma experiência possível”; “fenômeno é o que
não pertence ao objeto em si mesmo, mas se encontra sempre na relação
entre ele e o sujeito, sendo inseparável da representação que este tem dele.
Por isso mesmo, os predicados do espaço e do tempo são atribuídos aos
objetos dos sentidos como tais, e nisso não há ilusão.” (Crítica da Razão
Pura, Estética Transcendental, 8.).
b) Coisa em si: “objectos que não nos são dados em nenhuma intuição e são,
portanto, não sensíveis”.
c) Númeno/Noumeno: “O conceito de númeno/noumeno, isto é, de uma
coisa que deve ser pensada não como um objeto dos sentidos, mas como
coisa-em-si (unicamente para o intelecto puro), não é em nada contraditório,
pois não se pode afirmar que a sensibilidade é o único modo de intuição.”
Usando o conceito de númeno/noumeno com a definição: “de uma coisa
que não deve ser pensada como objeto dos sentidos, mas como coisa em si
(exclusivamente por um entendimento puro), não é contraditório, pois não
se pode afirmar que a sensibilidade seja a única forma possível de intuição.”
(B310).
Significado Positivo: Quando entendemos por númeno/noumeno “o objeto
de uma intuição não sensível”, estamos dando ao mesmo uma conotação
positiva pelo fato de ser criadora ou divina.
Significado Negativo: Porém, isso é vazio, dentro da concepção de que
nosso intelecto não pode estender-se além da experiência senão
problematicamente; não com a intuição nem com o conceito de uma
intuição possível, tornando-se assim, o conceito de númeno/noumeno, um
conceito-limite (Grenzbegriff), pretendendo circunscrever as pretensões da
sensibilidade, portanto, de uso puramente negativo. “Mas nem por isso é
uma ficção arbitrária, pelo contrário, encadeia-se com a limitação da
sensibilidade, sem, todavia poder estabelecer algo de positivo fora do
âmbito desta.” (B311).
A restrição negativa ao conceito de númeno/noumeno não apresenta
relação referente à intuição, bem como, não sendo objeto de nossa intuição,
abstraindo o modo de intuição, ao mesmo tempo sem determinar o modo de
intuição.
A extensão positiva do conceito de númeno/noumeno está relacionada ao
objeto da intuição não sensível, podendo assim ser admitido algum
modelo/modo de intuição, não sendo a nossa, e sim um modo intelectual da
intuição.
“... A idéia de uma ciência relativa ao conhecimento puro do
entendimento e da razão mediante o qual pensamos objetos de
modo inteiramente a priori. Tal ciência, que determinasse a
origem, o âmbito e a validade objetiva de tais conhecimentos,
teria que se denominar lógica transcendental porque só se ocupa
com as leis do entendimento e da razão, mas unicamente na
medida em que é referida a priori a objetos e não, como na lógica
geral, indistintamente tanto aos conhecimentos empíricos quanto
aos conhecimentos puros da razão.” (B 81-2).
Assim sendo, a lógica transcendental vai preocupar-se com “a aparência
transcendental, que influi sobre os princípios cujo uso nunca se aplica à
experiência, pois nesse caso teríamos uma pedra de toque da sua validade,
mas que, contra todas as advertências da crítica, nos arrasta totalmente para
além do uso empírico das categorias, enganando-nos com a miragem de
uma extensão do entendimento puro.” (B 352).
Partimos do pressuposto de que a lógica transcendental parte da lógica
geral (ciência das regras entendimento em geral, ou seja, regras para pensar
corretamente) para a lógica pura, onde a abstração destas condições é o foco
principal. A lógica pura também é um cânone do entendimento e da razão,
não havendo princípio empírico/Psicologia.
A lógica transcendental tomada como um esquema/método apresenta a
peculiaridade de não excluir todo o conteúdo, havendo a diferenciação do
conteúdo empírico (a posteriori) com o conteúdo puro (a priori). Desta
inferência podemos expor a suposta origem do conhecimento dos objetos,
não como coisa-em-si, mas como fenômeno, possível de conhecimento
dentro de nossas possibilidades cognitivas. Isso pode gerar a inferência à
origem não objetiva dos conhecimentos, partindo do pressuposto subjetivo
do sujeito transcendental, onde reside a origem das faculdades de
representação.
Sobre a dialética transcendental, tomamos o termo “dialética” por “não
arte, mas crítica da ilusão”, ou seja, a dialética como lógica da ilusão
transcendental, que paira na razão pura humana, sendo essa uma ilusão
especial, diferente da ilusão empírica (a posteriori: ótica; desvio pela
imaginação) e lógica (a priori: desatenção; falácias formais; atenção e
concentração), porém, apresentando uma relação especial com a ilusão
lógica.
No entanto, a dialética transcendental pretende o esclarecimento do
esquematismo que surge na razão, essa como sede da ilusão e da metafísica,
onde a crítica da ilusão tenta operar modalmente, pretendendo obter um
melhor entendimento de nossos processos cognitivos, porém afastados da
ilusão transcendental.
Portanto, essa tarefa da dialética transcendental não elimina o erro, sendo
que o erro reside fora do entendimento, como desvio das forças naturais,
sendo não espontâneo. Nesse caso, o erro atua no entendimento, sendo o
entendimento que erra, ou seja, julga erroneamente, nas ocasiões em que
sobre influência da sensibilidade, tornando-se despercebido, fundamentando
juízos subjetivos, tomados por fundamentos objetivos. E eis aí que reside o
erro, ou causa da ilusão, i.e., tomar a necessidade subjetiva como
necessidade objetiva.
Assim sendo, podemos definir a pretensão e objetivo da dialética
transcendental como sendo o “descobridor” (desocultar/mostrar) da ilusão,
esclarecendo seu mecanismo/esquema de funcionamento, podendo assim
desviar-se do erro, o que não necessariamente eliminará a ilusão, devido ao
fato de essa mesma ser natural e inevitável. Porém, a dialética
transcendental pode identificar a sede da ilusão (razão pura) que age sobre o
entendimento, donde se pode inferior a razão como não apenas faculdade de
conhecer, onde decorre consequentemente a constatação de um uso prático
da razão, residente na esfera da moralidade (liberdade) e da esperança
(imortalidade).
Esses conceitos são obtidos por conclusão, assim como os conceitos do
entendimento são pensados a priori. Os conceitos da razão possuem a
finalidade de conceber, e os do entendimento de entender. O incondicionado
é peculiar àquele (conceito da razão), não sendo esse um objeto da
experiência. Os conceitos da razão pura são designados ideias
transcendentais:
Ideias transcendentais: (A 321) “São conceitos da razão pura, porque
consideram todo o conhecimento de experiência determinado por uma
totalidade absoluta de condições.”.
“São transcendentais e ultrapassam os limites de toda a experiência, na qual,
por conseguinte, nunca pode surgir um objeto adequado à idéia
transcendental.”
Dividida em três classes:
1- Contém a unidade absoluta (incondicionada) do sujeito pensante;
2- Contém a unidade absoluta da série das condições do fenômeno;
3- Contém a unidade absoluta da condição de todos os objetos do
pensamento em geral.
“Em toda a inferência de razão concebo primeiro uma regra (maior) pelo
entendimento. Em segundo lugar, subsumo um conhecimento na condição
dessa regra (minor) mediante a faculdade de julgar. Por fim, determino o
meu conhecimento pelo predicado da regra (conclusio), por conseguinte a
priori, pela razão”. (B 361).
Em outra inferência apresentada observamos: “Por aqui se vê que a
razão, no raciocínio, procura reduzir a grande diversidade dos conhecimentos
do entendimento ao número mínimo de princípios (de condições gerais) e
assim alcançar a unidade suprema dos mesmos” (A 305).
Através de um conceito que possui a condição pela qual é dado o
predicado (asserção em geral) do juízo e, depois de subsumido o predicado
nesta condição em toda a sua extensão, determino deste modo o
conhecimento do meu objeto, como no exemplo “Caio é mortal”.
O conjunto completo da extensão, com referência a tal condição, é
chamado universalidade, sendo o conceito transcendental da razão o conceito
da totalidade das condições relativamente a um condicionado dado, sendo
que somente o incondicionado possibilita a totalidade das condições e
consequentemente a totalidade das condições é sempre em si mesma
incondicionada, do qual um conceito puro da razão pode ser definido em
geral como o conceito incondicionado, na medida em que contém um
fundamento da síntese do condicionado. (B 379).
Desse modo, o número de conceitos da razão pura depende das espécies
de relações que o entendimento se representa mediante as séries:
1. Um incondicionado da síntese categórica num sujeito;
2. Um incondicionado da síntese hipotética dos membros de uma série;
3. Um incondicionado da síntese disjuntiva das partes de um sistema.
Disso inferimos que “a conclusão é apresentada como um juízo, para ver
se este se deduz de juízos já dados, pelos quais é pensado outro objecto
completamente diferente, procuro no entendimento a asserção desta
conclusão, a fim de ver se ela não se encontra antecipadamente no
entendimento, sob certas condições, segundo uma regra geral. Se subsumir
na condição dada, a conclusão a condição é então extraída duma regra que
também é valida para outros objectos do conhecimento.” (A 305).
1- Um incondicionado da síntese categórica num sujeito (raciocínios
categóricos); Ideia em relação com o sujeito;
1. Um incondicionado da síntese hipotética dos membros de uma série (raciocínios
hipotéticos); Ideias em relação ao diverso do objeto no fenômeno;
2. Um incondicionado da síntese disjuntiva das partes de um sistema (raciocínios
disjuntivos); Ideias em relação com todas as coisas em geral.
3.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: Critica da Razão Pura. Tradução Manuela


Pinto dos Santos. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.

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