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6º Curso Nacional de Atualização em Obstetrícia e

Ginecologia

Aula 1: Conceitos, classificações, predição


e prevenção das síndromes hipertensivas

Módulo 2: Intercorrências
clínicas e obstétricas I

Prof. Dr. Soubhi Kahhale


Importância: principal causa de
morte materna

Khan. Who. Lancet, 367: 1066-74, 2006.


Vega, Kahhale, Zugaib. Clinics 62:679-84, 2007
Síndromes hipertensivas na gravidez
Classificação

A - Doença hipertensiva específica da gravidez (DHEG)


• Pré-eclâmpsia leve
• Pré-eclâmpsia grave
• Eclâmpsia
B - Hipertensão arterial crônica (HAC)
• Não complicada
• Complicada
• Hipertensão arterial com DHEG superajuntada
• Insuficiência renal
• Insuficiência cardíaca

Zugaib & Kahhale 1985


Formas graves

DHEG HAC
Pré-eclâmpsia grave Complicada
Síndrome HELLP DHEG superajuntada
Iminência de eclâmpsia Insuficiência renal
Eclâmpsia Insuficiência cardíaca
Pré-eclâmpsia

Desenvolvimento de hipertensão
acompanhada de proteinúria e/ou edema
generalizado após a 20ª semana de
gestação

Comissão de Terminologia do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas.


Hughes, 1972.
Edema: de mãos, face e genitais
Proteinúria: igual ou maior 300 mg/24h
Pré-eclâmpsia grave

Pressão arterial > 160 / 110 mmHg


Proteinúria > 5 g / 24h
Oligúria
Cefaleia, dor epigástrica e transtornos visuais
Cianose e edema pulmonar

Comissão de Terminologia do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas.


Hughes, 1972
Síndrome HELLP

Diagnóstico
H emolysis Bilirrubina total > 1,2 mg%

E levated TGO ≥ 60-70 UI/L


L iver enzymes
L ow Plaquetas ≤ 100.000/mm3

P latelet count

Louis Weinstein, 1982


Critérios de gravidade da pré-eclâmpsia
1. Pressão arterial > 160/110 mmHg
2. Proteinúria > 5 g / 24h
3. Oligúria
4. Cefaleia, dor epigástrica e transtornos
visuais
5. Cianose e edema pulmonar
Comissão de Terminologia do Colégio Amer. de Obstetras
e Ginecologistas . Hughes, 1972

6. Síndrome HELLP
Weinstein, 1982
Conceito de pré-eclâmpsia

A pré-eclâmpsia caracteriza-se pela elevação


da pressão arterial, acompanhada de proteinúria,
que usualmente ocorre após a 20a semana de
gestação.

(Report of the National High Blood Pressure Education Program Working Group on High
Blood Pressure in Pregnancy Am J Obstet Gynecol 2000;183:S1-22).
Conceito de pré-eclâmpsia

“(...) Para protocolos de pesquisas, esse conceito poderia


ser válido, pois haveria chance maior de incluir pacientes
com verdadeira pré-eclâmpsia. O edema generalizado deve
ser considerado sinal clínico de grande importância. (...)
Como consequência, aguardar a proteinúria para
caracterizar clínicamente a pré-eclâmpsia pode apresentar
implicação clínica grave, retardando o tratamento ou a
prevenção de complicações materno-fetais.

Kahhale & Zugaib, 2005.


HYPERTENSION
in PREGNANCY
2013

“ The task force chose to continue using the classification schema


first introduced in 1972 by the College and modified in the 1990
and 2000 reports of the Working Group of the National High Blood
Pressure Education Program.”

“ In recognition of the syndromic nature of preeclampsia, the task


force has eliminated the dependence of the diagnosis on
proteinuria.”
ACOG 2013
ACOG 2013
Classificação – Principais diferenças

1. Inclusão do edema generalizado como critério diagnóstico;


2. Inclusão ou exclusão de hipertensão gestacional sem proteinúria como pré-eclâmpsia.
3. Os valores de proteinúria que separam a forma leve da grave.
4. Diferenciação entre definições clínicas e definições para pesquisa do grupo da Austrália
e da Nova Zelândia.
5. A restrição do crescimento fetal ou alterações nas provas de vitalidade como critério de
gravidade.
6. Uso de instalação precoce da pré-eclâmpsia como um critério de gravidade no Canadá
(< 34 semanas) e nos Estados Unidos (< 35 semanas).
7. Importância clínica da hipertensão do jaleco branco.
8. Definição de hipertensão grave: o debate entre a fixação do valor da pressão sistólica
para definição da hipertensão como grave sendo 160 ou 170 mmHg precisa ser
resolvido devido às crescentes preocupações sobre os riscos de AVC materno ao
menor limiar de pressão sanguínea.
9. O conhecimento dos níveis pressóricos precocemente na gestação.
Pré-eclâmpsia

Desenvolvimento de hipertensão
acompanhada de proteinúria e/ou
edema generalizado após a 20ª semana
de gestação

Comissão de Terminologia do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas.


Hughes, 1972
Pré-eclâmpsia grave

Pressão arterial > 160 / 110 mmHg


Proteinúria > 5 g / 24h
Oligúria
Cefaleia, dor epigástrica e transtornos visuais
Cianose e edema pulmonar

Comissão de Terminologia do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas.


Hughes, 1972.
Diagnóstico de hipertensão arterial crônica

Antecedentes pessoais de HAC e nefropatias antes da gestação


Hipertensão arterial antes de 20ª semanas de gestação
Outros dados:
Hipertensão arterial sem edemas, proteinúria e hiperuricemia
Função renal alterada e proteinúria no começo da gestação
Fundo de olho e Eletro/Ecocardiograma alterados
Hipertensão induzida pelo uso de anticoncepcional oral
Persistência de hipertensão, 6 meses após o parto
Antecedentes familiares de HAC
Diagnóstico de pré-eclâmpsia superajuntada

Aumento dos níveis pressóricos associado a:

Proteinúria anteriormente ausente

Aumento da uricemia (≥ 6 mg%) em gestante

sem uso de diuréticos


Testes preditivos
• Infusão de angiotensina II • Volume plasmático
• Roll-over test • Antitrombina III
• Dopplervelocimetria • Fator VIII da coagulação
• PA média no 2º trimestre • Beta-tromboglobulina
• Calciúria
• Alfa-fetoproteína
• Excreção urinária da PGI2
• Cácio intraplaquetário
• Beta-hCG
• Receptores plaquetários de
angiotensina II • Proteína plasmática-PAPP-A
• Fibronectina
• Proteína placentária-pp13
• PLGF
• Concentração de Fe sérico
• sFlt-1
• Endoxina
• sFlt-1/PlGF
• Ácido úrico
Fisiopatologia da pré-eclâmpsia
FATOR IMUNOGENÉTICO

INVASÃO TROFOBLÁSTICA INADEQUADA

PERFUSÃO PLACENTÁRIA DIMINUÍDA

AUMENTO DA REATIVIDADE VASCULAR

VASOESPASMO ARTERIOLAR

REPERCUSSÕES SISTÊMICAS

HEMODINÂMICAS HEPÁTICAS RENAIS PLACENTÁRIAS UTERINAS HEMATOLÓGICAS CEREBRAIS


Estresse e pré-eclâmpsia

A demonstração da lesão endotelial, associada


à resposta inflamatória e ao envolvimento do
estresse são as mais recentes teorias para a
ocorrência da pré-eclâmpsia.

Redman. Am J Obstet Gynecol 180:499-506, 1999.


Takiuti, Kahhale, Zugaib. Am J Obstet Gynecol 186:544-50, 2002.
Takiuti, Kahhale, Zugaib. Med Hypotheses 60:328-31 2003
Etiologia – Etiopatogenia

Leslie K e col. 2011


Steegers, Lancet 2010
Takiuti, Kahhale, Zugaib. AJOG 2002
Peraçoli MTS e col. hypertens pregn 2008
Wang A. Physiology 2009
Teste da angiotensina II

Gant e Col. 1973


Teste pressórico de Gant

≥ 20 mmHg

Sens(%) Esp(%)
Gant & Col 1974 90 95
Kahhale & Zugaib 1983 67 94
Zugaib, 2012
Predição da pré-eclâmpsia pela
dopplervelocimetria

Avaliação 645 gestantes de baixo risco (11 a 13 e 20 a 24 semanas)


Sens(%) Esp(%) VPP(%) VPN(%)

Índices dopplervelocimétricos 36 92 20 97
Incisura 33 93 13 96

Índices acima do percentil 95 e incisura bilateral indicam


risco significativamente aumentado para pré-eclâmpsia.
Entretanto, a sensibilidade e o valor preditivo são baixos
e não encorajam o uso na população geral.

Liao e Zugaib, 2007.


Predição da pré-eclâmpsia pela
dopplervelocimetria

Revisão sistemática de 79.547 gestantes


de baixo e alto risco

Sens(%) Esp(%)
Baixo risco 23 99
Alto risco 83 96

Gnossen e col., 2008


Quais parâmetros utilizar no rastreamento?

Sensibilidade para PE precoce


Marcadores isolados 11 – 13 sem. + 6 dias
Marcadores Falso positivo 5% Falso positivo 10 %
História materna 32 % 45 %
Pressão arterial média 43 % 58 %
Doppler uterinas 38 % 68 %
PAPP- A 22 % 38 %
PLGF 33 % 47 %
PP13 39 % 51 %

Poon et al., 2009; Cuckle H.,2011.


Akolekar et al, Fetal Diagn Ther 2013
Quais parâmetros utilizar no rastreamento?

Sensibilidade rastreamento: 11–13 sem. + 6 dias


N = 33.602; Falso-positivo = 5%
História materna História materna+Doppler uterina História materna+Doppler+bioquímica

91 %

80 %

54 %
37 %

33 % 28 %

PE precoce (n = 112) PE tardia (n = 453)

Akolekar et al., 2011


Predição da pré-eclâmpsia 11 – 136/7 semanas

Como solicitar o rastreamento no 1º trimestre?


Rastreamento ampliado do 1º trimestre
Ultrassonografia morfológica do 1º trimestre + bioquimica do 1º trimestre
betahCGlivre, PAPP-A e PlGF

Qual idade gestacional da ultrassonografia?


11 semanas e 3 dias a 13 semanas e 6dias. Preferencialmente, 12 semanas

Qual idade gestacional da bioquímica?


A partir de 10 semanas até 13 semanas e 6 dias. Preferencialmente entre 10 e 11
semanas
Medidas automáticas da razão sFlt/PlGF

Estudo
Razão sFlt-1/PlGF

multicêntrico
n = 339

PE, n = 71
Controles, n=268

Semanas de gestação

Verlohren et al, AJOG 2010


Medianas das dosagens dos fatores reguladores de angiogênese
em diferentes idades gestacionais (HC-FMUSP, 2011-2014)

sFlt-1 PlGF sFlt-1/PlGF


pg/mL pg/mL

20 sem 26 sem 32 sem 36 sem 20 sem 26 sem 32 sem 36 sem 20 sem 26 sem 32 sem 36 sem

Costa RA, 2014


Predição e Diagnóstico

Pré eclâmpsia Precoce – 20 a 33 sem 6 dias

SFlt-1/PlGF Intepretação Predição

> 85 Diagnóstico E :99,5% S: 88%


Tem pré-eclâmpsia

< 85 Predição, reavaliar em 4 semanas VPP: 38,6%


> 38 alto risco pré eclâmpsia
dentro de 4 semanas

< 38 Predição, afastado por 1 semana VPN 99,1%, baixo risco para
pré eclâmpsia em 1 semana

Zeisler H et. al. The Prognosis study, COGI, Paris, 2014


Predição e Diagnóstico

Pré eclâmpsiaTardia – a partir de 34 semanas

SFlt-1/PlGF Intepretação Predição

> 110 Diagnóstico E :95,5% S: 58,2%


Tem pré-eclâmpsia

< 110 Predição, reavaliar em 4 semanas VPP: 38,6%


> 38 alto risco pré eclâmpsia
dentro de 4 semanas

< 38 Predição, afastado por 1 semana VPN 99,1%, baixo risco para
pré eclâmpsia em 1 semana

Zeisler H et. al. The Prognosis study, COGI, Paris, 2014


Exames prognósticos

Zeisler H et. al. The Prognosis study, COGI, Paris, 2014


Relação sFlit/PlGF

Como solicitar a relação sFlit/PlGF?


Marcadores/ fatores angiogênicos para pré eclâmpsia
Relação Sflit/PlGF

Qual idade gestacional dos marcadores angiogênicos?


A partir de 20 semanas

É um teste de rastreamento ou diagnóstico?


É útil tanto para predição de risco, confirmação diagnóstica da pré-eclâmpsia e norteia a
conduta obstétrica
Testes preditivos para pré-eclâmpsia

A baixa sensibilidade dos testes


preditivos para pré-eclâmpsia
compromete sua utilização na prática
clínica (A).

National Institute for Health Research (NIHR), 2008.


Prevenção da pré-eclâmpsia

Repouso Suplementação de óleo de


Nutrição peixe
Restrição de sódio e água Vitamina C e E
Diuréticos Heparina e antiagregantes
Anti-hipertensivos plaquetários
Suplementação Suplemetação de cálcio
de Mg, Zn Aspirina em doses baixas
Tratamento preventivo da pré-eclâmpsia

Revisões Sistemáticas da Biblioteca Cochrane


Repouso (Meher e Duley 2010)
Ingestão de Sal (Duley e col 2012)
Diuréticos (Churchill e col 2010)
Suplementação de Magnésio (Makrides e Crowther 2010)
Ingestão de Proteínas (Kramer 2003)
Óleo de Peixe (Makrides e col 2009)
Vitaminas C e E (Rumbold e Crowther 2010)

Nenhum real benefício (A)


Vitamina D: um novo marcador?

Estudos recentes sugerem que a deficiência materna de vitamina


D atuaria como um fator de risco independente para a pré-
eclâmpsia, principalmente nas suas formas mais graves.

Baker AM et al. (J Clin Endocrinol Metab. 2010)


51 casos de pré-eclâmpsia grave e 204 controles.
dosagem da vitamina D materna entre 16 e 19 semanas.
níveis menores que 50 nmol/L associaram-se a aumento de
5X no risco de pré-eclâmpsia, em comparação com níveis
superiores a 75 nmol/L (OR 5.41; 95% CI, 2.02 – 14.52).

Resultados ainda iniciais e controversos, embora demonstrem


uma tendência favorável à associação.
Prevenção da pré-eclâmpsia com doses baixas de
AAS

Dose Tratadas Controle


Autor Critério de inclusão Placebo
mg/dia n N
Beaufils et al.,
Mau passado obstétrico 150 48 45 Não
1985

Wallenburg et al.,
Teste da Angiotensina II + 60 23 23 Sim
1986

História obstétrica e
Benigni et al.,1989 60 17 16 Sim
hipertensão crônica

Schiff et al., 1989 Teste de Gant + 100 34 31 Sim

McParland et al.,
Dopplerfluxometria alterada 75 48 52 Sim
1990

Uzan et al., 1991 Mau passado obstétrico 150 156 73 Sim


Metanálise dos estudos com AAS

Hipertensão

Proteinúria

CIUR

Mortalidade perinatal

0,05 0,1 0,2 0,4 1 2

Imperiale e col., 1991


Ensaios randômicos com dose baixa de aspirina
para prevenção de pré-eclâmpsia

N. pacientes Pré-eclâmpsia (%)

Autor Fator risco I.G. Aspirina Placebo Aspirina Placebo

Sibai et al. Nulíparas 13-26 1485 1500 4.6 6.3

Italian Study Hist. Obst. 16-32 565 477 2.9 2.7

CLASP Hist. Obst. 12-32 4659 4650 6.7 7.6

ECPPA Hist. Obst. 12-32 476 494 6.7 6.1

Jamaica Nulíparas 12-32 3022 3024 7.1 6.3

Caritis et al Alto risco 12-26 1254 1249 18.4 20.3

Barbados Não 12-32 1819 1822 2.2 2.5


Aspirina em dose baixa

PARIS Collaborative Group (Perinatal Antiplatelet Review of


International Studies) – 31 estudos, 32.217 pacientes

A terapêutica antiplaquetária produz moderada mas


consistente redução de pré-eclâmpsia e suas consequências,
principalmente o nascimento antes de 34 semanas, entretanto,
não ficou claro se tal terapêutica é mais ou menos efetiva na
redução do risco relativo em qualquer subgrupo de alto risco.
Sugerem que o efeito preventivo é maior em gestante de alto
risco quando a aspirina é usada antes da 20 semana (A).

Askie e col. Lancet 2007;369:1791-8


Aspirina em dose baixa
A utilização de AAS em pacientes de risco está associada
com 19% de redução de desenvolvimento da pré-
eclâmpsia (A).
Redução de 8% de parto prematuro e RCF (A).
Redução de 16% de mortalidade perinatal (A).

O uso de AAS em dose baixa é segura para o feto,


mesmo quando usada no primeiro trimestre (A).

Knight e col. Revisão Sistemática 2007. (n. 32000)


Duley e col. Revisão Sistemática 2007. (n. 36000)
Kozer e col. Meta-análise AJOG, 2002.
Uso de aspirina em baixas doses

Grupo Aspirina Comentários

Nulípara – baixo risco Não Benefício mínimo


Nulípara – alto risco Sim Necessita + testes
de rastreamento
Alto risco – clínico Não
Alto risco – obstétrico Sim
Alto risco – gemelar Opcional Necessita + estudos

Heyborne, KD. Am J Obstet Gyn 2000; 183(3), 523


Coomarasamy e col. Obstet Gynecol 2003; 6, 1319
Protocolo da Clínica Obstétrica FMUSP

Indicação: no grupo de risco

Dose: 100 mg/dia

Início: 12ª semana de gestação

Interrupção: 7 a 14 dias antes do parto


Indicações

História anterior de eclâmpsia e síndrome HELLP (A)

Pré-eclâmpsia recorrente (A)

Hipertensão arterial crônica com morte perinatal (A)

Nefropatias e doenças do colágeno (D)

Transplante renal (D)

Presença de anticorpos antifosfolípides (A)

Zugaib M, 4 10 1991.
Kahhale & Zugaib, 1995.
Obrigado!

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