Você está na página 1de 2

"Conseguimos decorar uma letra de música, mas ela será muito mais facilmente memorizada se no momento que a

escutamos estamos em um encontro romântico. Outro exemplo é quando estamos conversando com alguém, porém
com muitas perturbações ao redor (barulhos, outra pessoa falando, ou mesmo uma preocupação na nossa cabeça).
Nossa atenção pode ficar mais dispersa e a memória daquela conversa ser mais difícil de ser guardada ou evocada",
explica Juliana Luchin, médica neurologista do Hospital Santa Paula. Além das informações que têm forte apelo
emocional, para Marcio Luiz Figueredo Balthazar, neurologista do Hospital das Clínicas da Unicamp (Universidade
Estadual de Campinas) e professor da Faculdade de Ciências Médicas da mesma universidade, as que são repetidas
várias vezes também são memorizadas. Já informações pouco relevantes tendem a ser esquecidas mais rapidamente.
Segundo ele, esta é a explicação para, muitas vezes, lembrarmos de algumas coisas mais facilmente, à medida que
esquecemos de outras. "Há diferentes sistemas de memória no cérebro, com o envolvimento de diferentes regiões. Por
exemplo, dirigir ou andar de bicicleta faz parte de um tipo de memória que não exige ev

Essas são as memórias de procedimento. Podemos separar nossa memória em dois tipos principais: a declarativa, que
é responsável por eventos e experiências pessoais, assim como conceitos que adquirimos, e a de procedimentos, que
é responsável pela aquisição de habilidades, hábitos e comportamentos. "Como exemplos de memória declarativa
temos a lembrança de uma história curta da sua vida, o que foi comido no café da manhã, como é o desenho de um
coração. Já a memória de procedimentos é a que nos faz lembrar como é andar de bicicleta, saber dirigir um carro", diz
Luchin. A diferença entre elas, ainda segundo Luchin, é a forma como as adquirimos, mas também como a evocamos.
"A memória declarativa é evocada conscientemente e mais fácil de ser formada, porém a esquecemos com mais
facilidade, já que demanda mais nossa atenção. A memória de procedimentos exige a repetição de uma atividade que
segue sempre o mesmo padrão para ser consolidada e assim é mais difícil de ser perdida

Máquina de memórias

O cérebro tem uma capacidade incrível de aprender coisas novas e adquirir informações novas, o que chamamos de
aprendizado. "A memória é a capacidade de reter o aprendizado. Isso acontece devido à plasticidade neural ou
neuroplasticidade, uma habilidade que o sistema nervoso tem de reorganizar os neurônios e os seus circuitos e formar
novos neurônios. A formação de memórias envolve uma região do cérebro chamada hipocampo e o armazenamento a
longo prazo depende de diversas regiões corticais", diz Comoli. Assim, podemos dizer que há uma divisão temporal de
memória de curto prazo e de memórias de longo prazo. "A memória a curto prazo é muito fundamental para viver
algumas situações e contextos, como deixar o carro ou a bicicleta estacionada num local enquanto você faz compras e
após alguns minutos ou horas você se lembra e volta para o local para pegar o carro ou a bicicleta. Depois essa
memória é descartada e esquecida. No entanto, as nossas vivências podem se transformar em memórias de longa
duração e são muito importantes. Nossas memórias nos dizem quem somos e influenciam o nosso comportamento",
destaca Comoli. Memórias de curto prazo duram minutos ou horas e envolvem mudanças mais simples na estrutura
neural (muitas vezes, mudanças neuroquímicas apenas). Já as memórias de longo prazo envolvem uma mudança
mais robusta dos circuitos neurais, como aumento da ramificação neuronal, formação de sinapses, formação de novos
neurônios e circuitos. "O efeito do componente emocional tem um peso enorme e facilita a formação e consolidação de
memórias de longa duração". No entanto, a neurocientista aponta, emoções associadas ao medo têm mais relevância
que emoções prazerosas, por tratarem de relações de sobrevivência e riscos. "É como se formasse uma arquitetura
cerebral que sinaliza para que não coloquemos a nossa vida em risco. Nesse sentido, o sistema é muito protetor em
relação às emoções aversivas. As memórias relacionadas ao medo são evocadas muito rapidamente em
circunstâncias de ameaça para facilitar as estratégiasde defesa que serão utilizadas para se defender da ameaça

Cérebro saudável

O cérebro pode perder a capacidade de memorização ao longo dos anos devido à degeneração natural dos neurônios
pelo envelhecimento ou por algum fator patológico. "Devemos lembrar que o cérebro também envelhece junto com o
corpo. Portanto, é natural que haja um declínio cognitivo ao longo do tempo (assim como o coração, pele, cabelos
ossos), mesmo sem haver doença em atividade", comenta Edson Issamu Yokoo, neurologista da Rede de Hospitais
São Camilo de São Paulo. Segundo ele, o declínio cognitivo natural, geralmente, é mais observado a partir dos 70
anos, podendo variar de caso a caso. Algumas atividades, no entanto, podem ajudar a manter o cérebro ativo e fazer
com que nos lembremos mais regularmente de coisas e situações. Mas é bom ressaltar que não existe fórmula
milagrosa para manter o cérebro saudável. "De maneira genérica, recomendamos as medidas de saúde geral, que
servem para prevenção de qualquer doença: equilíbrio na dieta, evitar sedentarismo, praticar atividades físicas, evitar
uso de álcool, tabaco ou substâncias sabidamente tóxicas, manter o equilíbrio da mente, evitar o estresse. De maneira
específica, recomendamos atividades que estimulam o cérebro, como leitura, prática ou aprendizado de idiomas, de
instrumentos musicais, desafios cerebrais variados, mas desde que sejam prazerosas para a pessoa. Não
recomendamos prática de idiomas para quem que não se adapta a línguas, por exemplo, o que tornaria a atividade
mais estressante do que benéfica, perdendo então a sua utilidade", diz Yokoo. Para Keila Narimatsu, neurologista
clínica do Hospital Moriah, ainda vale ter boas noites de sono, ter atenção e concentração nas atividades do dia a dia,
e o mais importante de todos: fazer exames de check up rotineiramente. "A memória ainda pode ser desenvolvida e
estimulada com técnicas mentais, boa alimentação, cuidados com a ingestão de medicamentos, atenção à saúde
mental e técnicas de relaxamento. É necessário também o controle dos fatores de risco de doenças cardiovasculares,
como hipertensão arterial, dislipidemia (colesterol elevado) e combate ao sedentarismo

Você também pode gostar