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A GEOGRAFIA DAS FINANÇAS:

DEPOIS DA CRISE

Seminário: LEMTe – Laboratório de Estudo de Moeda e Território.


Richard O’Brien and Alasdair Keith
Cambridge Journal of Regions, Economy and Society 2009, 2, 245–265
A GEOGRAFIA DAS FINANÇAS:
DEPOIS DA CRISE
Este artigo examina a idéia de que a geografia está sendo menos
importante nas finanças sendo resultado da revolução na tecnologia
informação e comunicação (ICT) e da desregulamentação, tendo
conseqüência as crises econômicas e financeiras de 2008.
Analisando quatro cenários para o futuro das finanças, parece
provavelmente que o caminho em direção ao fim da geografia será
retardado pelas crises, quando o cenário de que mercados se auto-
regulam é considerado. Futuros desenvolvimentos da tecnologia da
informação e comunicação devem ajudar melhorar a gestão
(administração) da informação, combatendo uma das
características da recente falha de mercado.
O fim da geografia nas finanças
• Hipótese central do fim da geografia: A localização
geográfica não importa nas finanças ou importou
muito menos até agora (antes das crises).
• Os controles (regulações financeiras estão longe de
assegurarem total influência sobre as regulações nos
seus países (territórios).
• Forças que ainda mantém o controle geográfico
• Diferenciação dos produtos
• Intensas batalhas entre as bolsas de valores
• Proximidade dos clientes (decisões locais) – ponto fundamental
da geografia
O fim da geografia nas finanças
• Moeda, sendo fungível, continuará tentar evitar e
será em bem sucedida em escapar dos limites da
geografia.
• A tese do fim da geografia afirma que a geografia
das finanças seria menos e menos importante mesmo
que não seja seu fim (Martin, 1994).
• O artigo examina essa tese do fim da geografia e o
futuro das finanças quando a economia mundial
combate sua pior crise atual.
O fim da geografia nas finanças
• Suposição inicial do fim da geografia – moeda é um
item de informação governada por regras. Ela é
moldada pelo desenvolvimento e adoção de ICT
(como a informação é administrada) e regulação
(como a informação é controlada).
• O desenvolvimento e adoção de ICT é uma condição
necessária mas não suficiente para o fim da
geografia.
• A liberalização financeira (desregulamentação) é
requerida também para o fim da geografia
O fim da geografia nas finanças
• O desenvolvimento e adoção de ICT e
desregulamentação permitem o capital fluir mais
livremente do que antes e tem conduzido a um mundo
consistente como estabelecido no fim da geografia.
• A crise econômica e financeira de 2008, sem dúvida,
foi facilitada pelo “fim da geografia” com o rápido
fluxo de capitais, e a leve regulamentação financeira
entre as fronteiras dos países.
• Essa crise é também determinante da futura geografia
das finanças (reações regulatórias)
A crise financeira global e o fim da
geografia
• Os desequilíbrios comerciais entre países deficitários
(EUA, UK) e países superavitários (china e
exportadores de petróleo) – A poupança dos países
superavitários foi reciclada em investimentos nos
países deficitários.
• A poupança permitiu taxas de juros de longo prazo
muito baixas (excesso de liquidez- grande volume de
poupança )
• A era da moeda barata facilitou a alavancagem
financiando o boom consumo e as bolhas imobiliárias
A crise financeira global e o fim da
geografia
• A causa particular da bolha imobiliária era os
empréstimos subprime os quais eram reempacotados
(repackaged) pelo setor financeiro através de hipotecas
(mortage backed securities – MBS) e dívidas feitas com
colaterais ( collaterized debt obligations – CDOs)
• Excesso de liquidez canalizado diretamente nas
compras de instrumentos financeiros complexos
(derivativos) indiretamente permitia a geração de
fundos das hipotecas subprime sendo empacotados em
MBSs e CDOs
A crise financeira global e o fim da
geografia
• Quando a bolha imobiliária estourou ficou claro que os
valores de MBSs e CDOs não refletiam precisamente os
balanços dos bancos.
• O colapso do mercado de hipotecas subprime gerou um
grande efeito contágio no sistema financeiro global como
resultado da distribuição dos complexos instrumentos
financeiros e derivativos entre as firmas financeiras
globalmente interconectadas (ICT).
• A bolha dos preços dos ativos e a maneira de como os riscos
eram repassados no sistema financeiro mostrou como os
instrumentos financeiros foram responsáveis pela crise.
A crise financeira global e o fim da
geografia
• Em que medida a crise foi facilitada pelo fim da geografia
em razão das condições que se desenvolveram nas décadas
passadas? Três fatores
• Habilidade de empacotar os riscos (produtos financeiros
devido ICT) e enviá-los para os investidores em qualquer
parte do mundo (desregulamentação financeira)
• Muitas instituições financeiras estavam muito dependentes
de financiamento dos mercados de atacado, sem uma sólida
base de financiamento local (caso dos bancos da UK)
• Colapso da confiança - as pessoas perceberam o quanto eles
confiaram na confiança em vez de conhecimento real sobre as
suas relações financeiras
A crise financeira global e o fim da
geografia
• A forma de como as crises são administradas tem uma
correlação com o grau da importância da dimensão
geográfica das finanças.
• Proteção dos mercados financeiros locais e instituições.
• Nacionalização dos bancos (controles nacionais)
TIC e desregulamentação: uma mistura
de Promessas
• Avanços na área das TIC tornam os mercados financeiros
mais integrados e conectados. Essa integração tem sido
reforçada pela desregulamentação (liberalização dos fluxos
de capitais entre os países)
• Redefinição significativa do papel da moeda e dos
intermediários financeiros perante um mercado globalizado
• O livre fluxo de capitais levou a desequilíbrios em conta
corrente (excesso de poupança investidas nos setores
financeiros dos EUA e UK)
• Alta alavancagem das famílias (bolha imobiliária) e a do
setor bancário impulsionou o crescimento da inovação
financeira em busca de oportunidades de investimento.
TIC e desregulamentação: uma mistura
de Promessas
• A elevada mobilidade dos capitais e os desequilíbrios da conta
corrente são associadas a crises financeiras. “Os períodos de
elevada mobilidade dos capitais internacionais produzem,
historicamente, crises bancárias internacionais" (Reinhart e Rogoff,
2008)
• A mobilidade do capital elevada não é a única característica da
recente crise de 2008.
• Outro elemento importante da crise é a má gestão de informação
(má precificação do risco e a incapacidade de entender para onde
os riscos estavam indo)
• Avanços na tecnologia da informação permitem criar inovações
financeiras radicais (Shiller, 2003)
• A síntese entre a computação e economia digital está acontecendo
tão rápido que não é de estranhar os desequilíbrios ( Dyson, 2008 )
TIC e desregulamentação: uma mistura
de Promessas
• Avanços na tecnologia da computação têm gerado
inovação financeira onde o risco é “desemenbrado e
transferido”. O problema é que os reguladores não tem
controle das operações financeiras e nem os investidores
compreendem completamente onde os riscos
propriamente se encontram (informação imperfeita).
• A ICT e a desregulamentação permitem operações off-
balance e a utilização de veículos de investimento
estruturado para ocultar perdas e inflar os preços das
ações aumentando a desconfiança entre as instituições
até eclodir numa crise financeira global.
TIC e desregulamentação: uma mistura
de Promessas
• A integração financeira poderia melhorar a administração dos
riscos e reduzir o risco do efeito contágio (Greenspan, 2003),
na realidade ocorreu o oposto (aumento do risco sistêmico e
do efeito contágio).
• A integração financeira estimulou práticas de empréstimos
liberais e maior acesso aos mercados de crédito de atacado.
As atividades dos bancos tornaram-se globalizadas e
dependentes dos mercados de atacados mundiais, ao invés de
depender de depositantes locais
• A ICT e a desregulamentação criaram as condições para o
"fim da geografia" aumentando a vulnerabilidade do sistema
que poderá resultar num colapso da confiança financeira.
Tecnologia e o futuro das finanças
• i) A melhor gestão da informação para superar os desafios da
informação imperfeita – problema da informação imperfeita deve-
se a interação humana, a tecnologia sozinha supera tal problema ao
unir ICT com inteligência artificial (AI)
• ii) Avanços na neurociência – superação da irracionalidade
humana- economia comportamental – neuroeconomia – homo
economics ( incerteza e egoismo)
• iii) Velocidade de adoção da tecnologia – incentivo (lucratividade)
e fatores limitativos (fraudes, perda de dados, hackers)
• iv) A analogia da Internet – internet exemplo perfeito do fim da
geografia. A solução não é mais regulação e sim inovações.
• v) Manutenção do fluxo de comunicações - o fim da geografia e a
integração de mercado são dirigidos por melhorias na ICT.
A trajetória da direção das regulamentações
• A desregulamentação é uma parte da globalização: o fim da
geografia nas finanças é o processo de globalização
• O fim da geografia direciona um sistema regulatório global e
regas globais? Para responder, examina-se os cinco fluxos da
globalização: os fluxos de capitais, mercadorias, serviços, pessoas
e informações e conhecimento,
• i) O fluxo de capital - primazia dos EUA baseado no dólar. O que
leva o maior controle dos fluxos de moeda? Pressões sobre a
globalização das propriedades (investimentos estrangeiros),
regulação das finanças ("multiplicador financeiro internacional” e
regulação global das finanças- Bretton Woods 2.0- Krugman),
adoção de modelos mais restritivos de livre mercado (China)
• O fluxo livre de capital está sendo mudado por questões de
controle e com nova estrutura de poder liderada por países não
aderentes ao livre mercado
A trajetória da direção das regulamentações
• ii) Os fluxos de bens, serviços, pessoas e informações e
conhecimento – representa um papel secundário na
regulamentação das finanças apesar de serem
importantes
• Fluxos de bens – rodadas de negociações de comércio
(trade rounds). Isso significa o espírito de livre comércio
de bens? Talvez em termos teóricos, na realidade, temos
novas forças com os mercados emergentes, liderados por
Brasil, Rússia, Índia e China (BRICs). Protecionismo
clássico não terminou.
• O livre fluxo de serviços também é restringido
A trajetória da direção das regulamentações
• Os fluxos de pessoas - tanto entre fronteiras dos países e de
campo para a cidade cresceu até 2008. Mesmo assim, as restrições
estão reaparecendo ao longo da fronteira mexicana, em torno do
Canal da Mancha, entre Israel e Palestina e os regimes de visto
estão apertando
• O fluxo de informação e conhecimento - também é vulnerável à
possibilidade de novos controles. Temos proteção das
informações (propriedade intelectual) e uma explosão de
informações obtidas numa plataforma totalmente
desregulamentada: Internet.
• O "fim da geografia" depende fortemente dos fluxos de
informação mais rápidos. Mas se somos limitados ou controlados
para capturar o benefício econômico das informações devido
questões de segurança, fraude on-line; estamos num mundo mais
restrito poderia surgir.
A trajetória da direção das regulamentações

• As possibilidades de uma reversão do fluxo de


mercadorias, serviços, capitais, pessoas e dinheiro
são muito reais
• Inseguranças econômicas e políticas podem reforçar
as barreiras e reconstruir a importância da geografia
por meio de regulamentação. Um mundo menos
globalizado ou a reversão de qualquer um dos
fluxos da globalização tende a aumentar a
importância da geografia na área financeira.
Quatro cenários (mundos) para
o futuro da finança
• i) My word is my chip (Minha informação é o meu
chip): rápida mudança tecnológica, leve regulação
• ii) Cybureaucracy (Burocracia cibernética): rápida
mudança tecnológica, e severa (alta) regulação
• iii) Safety first (Prioridade na segurança ): lenta
(baixa) mudança tecnológica, alta regulação
• iv) Brave old world (Admirável mundo velho):: lenta
(baixa) mudança tecnológica, leve regulação
• Todos esses cenários refletem a incerteza da futura
direção no desenvolvimento e adoção de ICT e
desregulamentação
Quatro cenários para o futuro da finança
O futuro da geografia das finanças

• Dados os quatros cenários, analisamos o futuro da


geografia das finanças sobre três perspectivas:
i) Localização - do poder e governança, locais físicos dos
centros financeiros e de infra-estrutura, mercados,
instituições financeiras, clientes e finanças online.
ii) Relacionamentos - como os agentes se conectam entre
os vários locais, como clientes, produtores e governos se
interrelacionam (network).
iii) A estrutura das firmas financeiras e dos mercados
A geografia dos cenários futuros

• i) My word is my chip: rápida mudança tecnológica, (leve)


branda regulação
O fim da geografia dependerá se o impacto regulatório da
presente crise for transitório, ou no mínimo não reintroduzir
novos poderes que reconstruam o poder de regras baseadas
geograficamente. Essas regras serão baseadas na cooperação
global ao invés de ações de proteção estilo BretonWoods.
os reguladores terão de reconhecer que a cooperação entre eles é
necessária para sustentar a abertura e restabelecer formas de
regulação mais brandas que permitam o mercado tomar
decisões de risco
Aprendizagem com seus erros e permissão de um mercado livre
para impulsionar a inovação e a consolidação das firmas e
mercados além das fronteiras.
A geografia dos cenários futuros
Para a regulação branda funcionar, ela necessitará se baseada na
confiança. Relacionamentos em finanças precisam ser baseados
em fortes níveis de confiança. Deve haver a confiança das
empresas entre elas e entre os clientes assim como entre os
agentes financeiros e os reguladores - em última análise, a
confiança no sistema.
O retorno da geografia estaria ligado ao nível de confiança.
Assim, os agentes buscarão compreender melhor e se
relacionar com a identidade dos locais
Neste cenário, os mercados continuarão moldados por novas
invenções tecnológicas.
Enfoque no relacionamento humano e na criação de maior nível
de confiança que não esteja nas máquinas. Confiança numa
gestão eficiente da informação aliadas com o avanço da
tecnologia de informação de gestão (não confiar nos cálculos
ao invés do julgamento humano.
A geografia dos cenários futuros

• ii) Cybureaucracy: rápida mudança tecnológica, e


severa (alta) regulação
Aumento das incertezas em torno dos tipos de
regulação e quem são os reguladores e onde eles
pretendem conduzir a abordagem do livre mercado.
Importância da localização no que tange as regras
estabelecidas pelos reguladores e governos. Mesmo
que os fundos ainda se movem rapidamente, os
investidores vão querer saber mais sobre a geografia
para ter segurança (determinação do risco no tempo
e espaço).
A geografia dos cenários futuros
• iii) Safety first: lenta (baixa) mudança tecnológica, alta
regulação
Se este cenário dominar, haverá maior controle de risco,
limitação das fronteiras em torno da propriedade. O ritmo de
mudança tecnológica é lento com um retorno a métodos
experimentados e testados e a falta de confiança nos modelos
e mercados baseados em equações. O espaço (local) é a base
da confiança, e as regulações reinforçam a importância da
geografia.
• iv) Brave old world: lenta (baixa) mudança tecnológica,
leve (branda) regulação
Cenário menos provável de ocorrer. Necessidade de
compreender as relações à moda antiga. Confiança com base
em tecnologias que conhecemos e aversão à inovação.
O ritmo lento da tecnologia é uma condição necessária para o
restabelecimento da confiança numa regulação branda.
Conclusões

• A crise financeira de 2008 é definidora do futuro – é


a maior influência para a geografia das finanças
• Crises podem ser analisadas usando os macro
caminhos – o desenvolvimento e adoção de ICT e
desregulamentação – que estabelecem a tese do fim
do geografia.
i) avanços em ICTs permitiram mercados financeiros
globais serem crescentemente integrados (condição
necessária nas não suficiente para integração dos
mercados
Conclusões

ii) A crescente integração dos mercados


financeiros globais tem sido iniciado por um clima
político desde 1970 conduzindo ao aumento da
desregulamentação nos mercados financeiros
globais.
iii) Integração financeira tem facilitado
grandes desequilíbrios de capitais os quais estão
associados com as crises financeiras e que
conduziram ao excesso de liquidez
Conclusões

iv) Avanços em ICTs tem conduzido as


inovação financeira – incluindo instrumentos
financeiros progressivamente complexos – dentro
os quais o excesso de liquidez foi canalizado,
ambos diretamente nas compras de produtos de
derivativos mas também indiretamente – ao
permitir fundos de hipotecas sub prime os quais
eram então reempacotados (repackaged) como
MBS e CDO
Conclusões

v) Enquanto os produtos derivativos tinham o


objetivo de melhor administração dos riscos, eles
criaram uma situação inversa resultando numa
informação imperfeita - não sabendo onde risco
ocorre (origem) sendo descrito como o risco
geográfico desconhecido (através outsourcing
(terceirização, transferência) e delocalisation
(deslocalização, distribuição em todo mercado
financeiro) )
A conseqüência desta inovação tecnológica foi o
aumento do risco de instabilidade no setor financeiro
Conclusões

vi) Em outubro de 1987, a falência (crash) do


mercado de valores (bolsas de valores) era, em
parte, atribuída ao comércio (programme trading).
Atualmente, o excesso de volatilidade nas bolsas
de valores é atribuído ao papel da negociação ou
operações eletrônicas (computerised trading) e
algoritmos (Grant e Gangahar, 2008)
vii) É também provável que a crescente integração
dos mercados financeiros permitiu ampliação do
risco de contágio no sistema financeiro.
Conclusões

As crises significam o fim da geografia ainda está


em curso?
os empréstimos dos governos aos bancos nacionais
sugerem que a geografia deve ser reinstalada por si
mesmo.
No mundo My word is my chip reformas tem sido
adotadas par superar os riscos por meio da alta
tecnologia (high-tech construct)
i) Inovações tecnológicas adicionais para superar as
limitações das decisões de jogos baseadas na matemática
– soluções microeconômicas do melhor funcionamento
dos mercados individuais
Conclusões
ii) Regulação de acordo com o grau (leading to the
tempering) de inovações tecnológicas –explicitamente foco
sobre o downside de inovação tecnológica
iii) Regulação global para superar o risco sistemático
inerente devido ao fim do mundo geográfico - uma solução
macroeconômica com uma nova ordem global: um Bretton
Woods 2.0
Os desequilíbrios de capitais unidos com o desenvolvimento da
ICT criaram a primeira crise financeira de uma era
interconectada. A tendência é menos confiança nas
tecnologias, ou nas inovações que separam os riscos. Isso
sugere uma confiança e dependência na geografia: uma
realocalização dos riscos (relocalization of risk).
No longo prazo, a habilidade da tecnologia ajudará a remover os
erros humanos através das novas ondas da ciência
(inteligência artificial etc).

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