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Tradução

e
Literatura como
alicerces no Ensino
GABRIELA ZETEHAKU ARAUJO
GISELE TYBA MAYRINK REDONDO ORGADO

X Semana Acadêmica de Letras da UFSC – 2016


ST17: LETRAS ESTRANGEIRAS E VERNÁCULAS: PESQUISA NA GRADUAÇÃO EM LÍNGUA, L ITERATURA, TRADUÇÃO E ENSINO
Sumário
§ As multiplicidades presentes na
LITERATURA

§ FERNANDO PESSOA: um poeta


multifacetado

§ TRADUÇÃO – um ofício
multicultural
TÓPICOS HISTÓRICOS E LITERÁRIOS
§ “Contar histórias é tão
antigo quanto a própria
humanidade”
§ Influência da escrita no
ser social
(ex. textos religiosos e sagrados)

§ A Poética de Aristóteles
§ Séc. XV: A prensa de
Gutenberg
“UMA PALAVRA APÓS UMA PALAVRA
APÓS UMA PALAVRA É PODER.”
(Margaret Atwood)
Por que estudar Aristóteles: katharsis
(purificação)

Literatura?
Horácio: dulce & utile

§ Antoine Compagnon (1950): “A


literatura dota o homem moderno de uma
visão que o leva para além das restrições
da vida cotidiana.”

§ Marisa Lajolo (1993): “Lê-se para


entender o mundo, para viver melhor.” “A LEITURA É A ÚNICA
MANEIRA PELA QUAL
§ Antônio Cândido (1995): “A leitura VESTIMOS, DE FORMA
literária nos permite a refletir sobre o INVOLUNTÁRIA, E MUITAS
mundo em nossa volta, abrindo nossos VEZES DESAMPARADA,
horizontes e ampliando os OUTRA PELE, OUTRA VOZ,
conhecimentos, possibilitando novas OUTRA ALMA.”
(Joyce Carol Oates)
perspectivas.”
Interconexões com a Arte
§ Roman Jakobson:
tradução intersemiótica
interpretações dos signos
verbais por meio de
sistemas de signos não-
verbais Madame Bovary (1991) Porta do Inferno –
– Claude Chabrol Auguste Rodin

§ Ingedore Koch:
intertextualidade de
forma
textos dialogam-se entre si

Mapa do Inferno - Botticelli


Fernando Pessoa
e a Literatura

“Escrever é
esquecer. A
literatura é a
maneira mais
agradável de
ignorar a vida.”
Uma multidão
chamada Pessoa
AUTOPSICOGRAFIA Álvaro de Campos
“O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.”

PASSAGEM DAS HORAS Ricardo Reis


“Multipliquei-me, para me sentir
Para me sentir, precisei sentir tudo,
Transbordei, entreguei-me,
E há em cada canto da minha alma
Um altar a um deus diferente.”
Alberto Caeiro
“Criei em mim várias personalidades. Crio
personalidades constantemente. Cada sonho meu é
imediatamente, logo ao aparecer sonhado,
encarnado numa outra pessoa, que passa a sonhá-
lo, e eu não. Para criar, destruí-me; tanto me
exteriorizei dentro de mim, que dentro de mim não
existo senão exteriormente. Sou a cena nua onde
passam vários atores representando várias peças”
(Livro do Desassossego)
multiplicidade & niilismo
TABACARIA, Álvaro de Campos (1928)
“Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser
nada. À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do
mundo.”

“Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de


Nada”.

“Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo


fosse nada.”

“Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou? Ser o que
penso? Mas penso ser tanta coisa! E há tantos que pensam ser a
mesma coisa que não pode haver tantos!”
Fernando Pessoa:
tradutor e traduções
«A minha pátria é a língua portuguesa», escreveu,
profeticamente, Fernando Pessoa. O seu génio
expressou-se também, inúmeras vezes, em língua
inglesa – mas aquele que viria a tornar-se o mais
internacional dos escritores portugueses sabia que
cada língua tem a sua cor, a sua luz e a sua
música própria, e que a arte da escrita consiste
em levar para lá dos limites convencionais os dons
expressivos de cada língua.
Inês Pedrosa
(http://casafernandopessoa.cm-lisboa.pt/)
• Algumas de suas traduções mais conhecidas:

ü Russell Lowell, Luís de Góngora, Francisco de Quevedo, William


Wordsworth, Elizabeth Browning, Garcilaso de la Vega, Shelley, T. S.
Coleridge, Edgar Allan Poe, C. W. Leadbeater, e postumamente foram
publicadas traduções suas de Walter Landor, Thomas Gray e
Nathaniel Hawthorne.
ü Foram encontradas em seu espólio, listas extensas de obras e autores
que pretendia traduzir e publicar numa editora que projetava fundar
– a “Empreza Íbis”– com o intuito primordial de levar os portugueses
ao conhecimento dos clássicos estrangeiros: de Homero a
Shakespeare, de Poe a Oscar Wilde, de Goethe a Mallarmé, entre
tantos outros.
ü Além de ser e exigir rigor nas traduções, o poeta também fez sua
autotradução.
Tradução
A Tradução apresenta-se como um alicerce no ensino
da literatura para que os textos literários possam
alcançar seu público-alvo.

A linguagem, de modo geral, e a língua de modo


específico, se torna possível com base na
interpretação e, de forma mais ampla, através da
tradução, que exerce o papel de ferramenta
preponderante de união entre culturas, para que estas
se permitam ultrapassar fronteiras não somente
geográficas, mas formativas.
Tradução
(Roman Jakobson)

• Intralinguística (reformulação): consiste na


interpretação de signos verbais por meio de outros
signos de uma mesma língua;

• Interlinguística (tradução propriamente dita): a


mais comum, que seria a interpretação dos signos
verbais de uma língua por meio de alguma outra
língua distinta;

• Intersemiótica (transmutação): caracterizada pela


interpretação dos signos verbais por meio de
sistemas de signos não-verbais.
Tradução Interlinguística

Tabacaria, escrito em 1928, foi considerado por muitos


críticos como o poema mais importante do Século XX.
TABACARIA

Não sou nada.


Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,


Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

(Álvaro de Campos / Fernando Pessoa)


THE TOBACCO SHOP

I am nothing
I shall always be nothing
I cannot wish to be anything.
Aside from that, I have within me all the dreams of the world.

Windows of my room,
The room of one of the world's millions nobody knows about
(And if they knew about me, what would they know?)
Open onto the mystery of a street continually crossed by people,
To a street inaccessible to any thought,
Real, impossibly real, certain, unknowingly certain,
With the mystery of things beneath the stones and beings,
With death making the walls damp and men's hair white,
With the Destiny driving the wagon of everything down the road of
nothing.

(Tradução de Richard Zenith)


BUREAU DE TABAC

Je ne suis rien.
Jamais je ne serai rien.
Je ne puis vouloir être rien.
Ceci dit, je porte en moi tous les rêves du monde.

Fenêtre de ma chambre,
de ma chambre dans la fourmilière humaine unité ignorée
(et si l’on savait ce qu’elle est, que saurait-on de plus ?),
vous donnez sur le mystère d’une rue au va-et-vient continuel,
sur une rue inaccessible à toutes les pensées,
réelle, impossiblement réelle, précise, inconnaissablement précise,
avec le mystère des choses enfoui sous les pierres et les êtres,
avec la mort qui parsème les murs de moisissure et de cheveux
blancs les umains,
avec le destin qui conduit la guimbarde de tout sur la route de rien.

(Tradução de Armand Guibert)


TABAQUERÍA

No soy nada.
Nunca seré nada.
No puedo querer ser nada.
Aparte eso, tengo en mí todos los sueños del mundo.

Ventanas de mi cuarto,
de mi cuarto de uno de los millones del mundo que nadie sabe quién es
(y si supiesen quién es, ¿qué sabrían?),
dais al misterio de una calle cruzada constantemente por gente,
a una calle inaccesible a todos los pensamientos,
real, imposiblemente real, cierta, desconocidamente cierta,
con el misterio de las cosas por debajo de las piedras y de los seres,
con la muerte poniendo humedad en las paredes y cabellos blancos en los
hombres.
Con el Destino conduciendo la carroza de todo por el camino de nada.

(Tradução de Miguel Ángel Viqueira)


TABACCHERIA

Non sono niente.


Non sarò mai niente.
Non posso voler essere niente.
A parte questo, ho dentro me tutti i sogni del mondo.

Finestre della mia stanza,


della stanza di uno dei milioni al mondo che nessuno sa chi è
(e se sapessero chi è, cosa saprebbero?),
vi affacciate sul mistero di una via costantemente attraversata da gente,
su una via inaccessibile a tutti i pensieri,
reale, impossibilmente reale, certa, sconosciutamente certa,
con il mistero delle cose sotto le pietre e gli esseri,
con la morte che porta umidità nelle pareti e capelli bianchi negli uomini,
con il Destino che guida la carretta di tutto sulla via del nulla.

(Tradução de Antonio Tabucchi)


TABAKLADEN
Ich bin nichts.
Werde nie etwas sein.
Kann nie etwas sein wollen.
Und trage dennoch die Träume der Welt allesamt in mir.
Fenster meines Zimmers,
Fenster eines der zahllosen Fenster der Welt, um dessen Wesen niemand
Bescheid weiss,
(Und wüsste einer Bescheid, was wüsste er schon?),
Ihr geht aufs Geheimnis der Strasse hinaus, aufs unaufhörliche Auf und Ab ihrer
Menschen,
Und unter allen Gedanken ist keiner, der dieser Strasse beikommt:
So wirklich ist sie, so ungemein wirklich, so über die Massen genau,
Mitsamt ihren Steinen und Wesen, mitsamt dem Geheimnis der Dinge darunter,
Mitsamt dem Tod, die die Mauern mit Schimmel, die Menschen mit weissen
Haaren bedeckt,
Mitsamt dem Karren des Ganzen zum Nichts hin kutschierenden Schicksals.

(Tradução de Paul Celan)


煙草屋

ぼくはなにものでもない。
そしてこれからもなにものでもないだろう。
なにもの かでありたいと のぞむこともない。
その一方で、ぼくの中にはこの世のあらゆる夢がある。

ぼくの部屋の窓よ、
だれであるのかだれもわからないこの世界の数百万人の中の一人であるぼくの部屋よ
(だれであるのかわかったところで、なにがわかったことになるのか)
お前は絶えず人の行き交う道路の神秘に面している
あらゆる思考もよせつけない道路に
現実の あり得ないほど現実の 確かな 知り得ないほど確かな道路に
石と人間の下に事物の神秘をかかえ
死が壁に湿気をあたえ、人の髪を白くし
運命があらゆるものをのせた車を虚無の道に走らせている道路に。
Tradução Intersemiótica
Cinema
Tradução Intersemiótica
Cinema
Filmes baseados nas obras de Fernando Pessoa:
Conversa Acabada
Portugal (1981). De João Botelho. Realizado nos 120 anos do nascimento de
Fernando Pessoa.

La gentilezza del tocco (A Suavidade do Toque)


Itália (1987). De Francesco Calogero. Inspirado no Livro do Desassossego.

Filme do Desassossego
Portugal (2010). De João Botelho. O filme baseia-se no Livro do Desassossego.
Tradução Intersemiótica
Teatro
Tradução Intersemiótica
Pintura

Retrato de Fernando Pessoa, Encontro com Fernando Pessoa,


por Almada Negreiros por André Shan Lima
Tradução Intersemiótica
Doodle

2011 – 123º Aniversário de Fernando Pessoa


Tradução Intersemiótica
Cartoon / HQ
Fernando Pessoa e outros Pessoas (2011)
Ilustrações: Guazzelli – Roteiro: Davi Fazzolari
2015
Tradução Intersemiótica
História em Quadrinhos
Reflexões
Através da literatura o estudante pode
desenvolver diversas competências e
habilidades, sendo-lhe permitido assumir
uma atitude crítica em relação ao mundo,
advinda das diferentes mensagens e
indagações que a literatura oferece.
“A ideia de que um jovem quando sai do
liceu tem ‘que’ saber literatura é uma das
mais absurdas que conheço; a literatura,
para a maior parte das pessoas, não há de
ser um objeto de conhecimento concreto,
mas um instrumento de cultura e uma fonte
de prazer. Há de servir ao aperfeiçoamento
intelectual e há de produzir um prazer
intelectual. Portanto não se trata de ‘saber’;
trata-se de ler literatura e amá-la.”

Gustave Lanson, 1894


Referências:
• BARTHES, R. A aula. Tradução de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Cultrix,
1978. Título original: Leçon.
• ______________. O prazer do texto. Tradução de J. Guinsburg. São Paulo:
Perspectiva, 2006.
• CEREJA, William Roberto. Ensino de literatura: uma proposta dialógica para o
trabalho com literatura. São Paulo: Atual, 2005.
• COELHO, Jacinto de Prado. Como ensinar literatura. In Ao contrário de
Penélope. Lisboa: Livraria Bertrand, 1976.
• COELHO, Nelly Novaes. Literatura: Arte, conhecimento e vida. São Paulo:
Peirópolis, 2000.
• JAKOBSON, R. “Aspectos Linguísticos da Tradução”. In: Linguística e
Comunicação. Tradução de Izidoro Blikstein e José Paulo Paes. (p. 63-72). São
Paulo: Cultrix, 1969.
• TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.
• http://basenacionalcomum.mec.gov.br/

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